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foi precisamente a propria obra de arte viva, cujo sur- gimento ceve que suprimir inteiramente da vida as condigdes que tornaram necesséria a existéncia e pros- peridade dessa pintura enquanto modalidade artistica auténoma. A pintura, enquanto arte de representayio do dumano, nao pode ter uma vida saudavel, regida pela necessidade, quando 0 homem belo a si proprio se representa em toda a perfeigio, sem pincel nem tcla, na ‘mais viva moldura artistica. Aquilo a que aspira com o seu esforgo sincera, alcanca-o do modo mais perfeito que Ihe ¢ possivel quando transfere as suas cores e 0 seu entendimento para a escultura viva do actor dramético reals quando abandona a tela ¢ 0 gesso fresco e desce 20 paleo trégico, para que o artista possa levar a cabo em si mesmo aquilo que cla baldadamente se esforca por obter & custa dé uma acumulagio de riquissimos meios sem vida e sem realidade. A pintura paisagistica, porém, enquanto culminagio tiltima e perfeita de toda a arte da imagem, tornar-se-d a alma prépria e viva da arquitectura; ensinar-nos-4 assim a dispor 0 palco para a obra de arte dramética do futuro, palco no qual ela prépria, com a sua viva- cidade, representaré 0 caloroso fiundo da natureca, destinado a0 homem, a um homem vivo, que nao seja jo produto de uma mera cépia.. Se assim, por via da superior forga da arte plistica, nos € permitido considerar jd ganha a cena da obra de arte colectiva do futuro, ¢ nela porcanto também a natureza intimamente reconhecida e entendida, podere- ‘mos entéo agora tirar algumas conclusées mais espectficas sobre essa obra de arte Peero me t L Wagmen, ®. (fea). obne Je ewk tey Clsreas bari Sone Iv FUNDAMENTOS DA OBRA DE ARTE DO FUTURO | | Jubal iS: OBSERVARMOs a posigao da arte moderna — tanto Jquanto cla consiga ser verdadeiramente arte — em relagio a vida publica, reconhecemos antes de mais a incapacidade total de a primeiza influenciar a segunda, no sentido das aspirages mais nobres da arte. A razio 0 brorou realmente da vida, ¢ agora, transformada em planta de estufa, nao consegue langar Talzes nod natural do presente. A arte passou a ser propriedade privada de uma classe de artistas; oferece prazer apenas Aqueles que a entendem, ¢ para ser entendida exige uum estudo particular, distante da realidade da vida: 0 estudo da erudigio artistica. Hoje em dia, todo aquele que (© para pagar os prazeres antisticos do mercado facilme a que pode apropriar-se deste estudo ¢ do entendimento que dele decorre; no entanto, quanto 2 questéo de saber se a € que a arte, enquanto mero produto de cultura, dinhciro sufici maioria dos amantes das artes consegue ou nao enten- der o artista nos seus melhores esforgos, € coisa que, se pergunrarmos a este artista, obterd por resposta apenas sta contemporaineo um longo suspito Porém, s¢ 0 aftista c considerar a multidio infinitamente maior daqueles 75 que em virtude do desfavor das condigdes sociais sé0 totalmente exclufdos da possibilidade de entender e, inclusivamente, de desfrutar a arte moderna, teré que admitir que toda a sua actividade na arte é, no fundo, um trabalho egoista, inteiramente virado para 0 seu agrado pessoal, ¢ que a sua arte, em face da vida publica, mais no & do que luxo, desperdicio, passa tempo interesseiro. E tio monstruosa a d constantemente verificivel e tao amargamente deplo: ada por alguns — a separar, como se costuma dizer, gente cultivada e gente inculta, é tio impensavel um elo de ligaao entre estes campos, tio impossivel a reconciliaco entre ambos, que, havendo franqueza suficiente, a arte moderna, fundada que esta sobre essa cultura nao-natural, teria que confessar com a mais profunda vergonha que fica a dever a sua existéncia a um elemento vital que, por seu turno, s6 pode encon- tar apoio para a sua existéncia na mais profunda auséncia de formagdo cultural daqueles que constituem propriamente o grosso da humanidade. A tinica coisa que, nesta posicao que lhe é atribuida, a arte moderna devia conseguir — e que, no seu sentimento mais sin- cero, procura conseguir —, ou seja, a ampliagto da formagio humana, & precisamente aquilo que nfo pode fazer, pela simples razio de que a arte para poder ter qualquer eficdcia sobre a vida tem que ser ela mesma a flor visivel de um processo de formagio natural, cres- cendo a partir de baixo, e, pelo contedrio, nunca esté em condigées de verter a formagio cultural a partir de cima. E.€ por isso que a nossa arte cultural, no melhor dos casos, se parece com aquele individuo que se ditige @ uma populagao falando uma lingua estrangeira des- conhecida dessa gente: tudo o que exponha, sobretudo ancia — 6 % Wiiaanssguioiiatinieescvcngs.~ © que nessa exposi¢ao houver de mais espiritual, s6 pode conduzir as confusées ¢ mal-entendidos mais ridiculos. Comecemos entio por expor come teria que proce- der a arte moderna para progredir teoricamente até & redencéo que a liberrasse da posicao solicéria da sua esséncia nao compreendida, caminhando em direccao ao entendimento mais universal por parte da vida publica: tornar-se-4 entao facilmente compreensivel que essa redencao s6 pode ser possiilitada pela media- do pritica da vida publica. Como vimos, a arte plistica s6 pode prosperar cria- tivamente se, nas suas obras, se colocar em alianga com © homem artista, ¢ néo com o homem exclusivamente orientado para a mera utilidade. © homem artista s6-pode-satisfazer-se_perfeita- mente tinigo de todas as modalidades artisticas na obra de-arte cotecriva no Tsolamento de uma das suas capavilades atisticas sera ndo-livre, serd ndo-inteira- mente aquilo que pode ser; pelo contrério, na obra de arte colectiva ser4 livre e sera inteiramente aquilo que pode s ‘A verdadeira aspiragao da arte , pois, aquela que tudo abrange: todo aquele que se encontra animado pelo verdadeiro émpulso para a arte quer alcangar por intermédio do méximo desenvolvimento da sua capa- cidade particular, nao a glorificagio desta eapacidade particular, mas simplesmente a glorificacio do homem todo na arte. A obra de arte colectiva superior € 0 drama: na riqueza que Ihe ¢ possivel, o drama s6 pode existir quando nele cada modalidade artistica existir na sua mdxima rigueza. O drama verdadeiro s6 & pensével enquanto pro- duto do impulto colectivo de todas as artes para a mais imediata comunicagio a um puiblico colectivo: cada modalidade artistica singular sé consegue abrir-se ao completo entendimento do pilico colectivo por meio da sua comunicagéo colectiva com as restantes modali- dades artisticas no drama, pois que a intengio de cada modalidade artistica singular s6 se obtém inteiramente no agit conjunto de todas as modalidades artisticas, no qual elas se do a entender e se entendem mutuamente. ‘A arquitectura nao pode ter intencio mais elevada do que a de criar — em vista de uma comunidade de homens que a si mesmos artisticamente se dio pot objecto da sua representacio — o envolvimento espacial de que a obra de arte humana tem necessidade para se apresentar, Uma construcio s6 é edificada em acordo com a nccessidade se estiver maximamente ao servigo de uuma finalidade humana: a suprema finalidade do homem €a da arte, e a suprema finalidade da arte é 0 drama. No edificio utilicério vulgar, 0 arquitecto limita-se a ter que corresponder a finalidade mais inferior da humanidade: ai, a beleza é luxo. No edificio que se inscreve no ambito do luxo, 0 arquitecto trata de corresponder a uma carén- cia nao-natural ¢ nio-imperativa: a sua criatividade é portanto arbicréria, nio-produtiva e nio-bela, Pelo con- ttitio, na construgao do edificio que em todas as suas partes constituintes houver de corresponder unicamente uma finalidade artstica colectiva, ou seja, na constru- ‘40 do teatro, 0 arquitecto tem unicamente que proceder enquanto artista e em atengio da obra de arte. No edifi- cio teatral perfeito, a medida ¢ a lei sao ditadas, até aos 178 ‘mais infimos pormenores, exclusivamente por aquilo de que se carece. Este carecimento é de duas ordens, é 0 do dar ©. do receber, eas duas ordens de carecimento inter- penetram-se ¢ condicionam-se miitua e amente. A cena tem, antes de mais, que preencher todas as condiges de espago para a acc4o dramitica colectiva que nela hé-de representar-se; em segundo lugar, porém, tem que resolver estas condigdes na intengao de levat essa acgio & percepcio e 4 compreensio dos olhos ¢ dos ouvidos dos espectadores. Na organizacao do expao dos espectadores € a exigéncia de comprcensio da obra de arte que, no plano dptico ¢ no plano actistico, dita a lei necesséria, 2 qual sé a beleza da disposicao dos elementos — a par da adequagio aos fins — pode cor- responders porque o desejo do espectador colectivo é precisamente o desejo da obra de arte, para cuja apreen- so ele ter que ser decerminado por tudo 0 que Ihe surge perante os olhos*. E assim, pelo ver e pelo ouvit, 0 espectador colectivo transporta-se inteiramente para 0 palco; s6 pela completa absorsio por parte do puiblico, © actor é artista. Tudo o que no paleo respira e se move, respira e move-se por intermédio de um desejo maxima. * A rarefa de construsto do edifcio de teatro do futuro no esté de ‘modo algum resolvida pelos teatros modernos: neste, organizagio & dlcada por pressupostose les tradicionais que nada tém em comum com 4 cxigéncias da arte pura, Onde forem determinantes a especulagio do lucro, por um lado, e a luxuosa ostentaczo que Ihe anda associada, por utto, 0 inteesseabsoluto da arte siréIetado da mancra mais seastve, © por isso que nenhum arquiteco deste mundo seré capa, por exem plo, de elevar ao estaturo de lei da beleea a divsso do nosso publica pela ‘compartimentagio e pela distibuigio cm camadas propria das instala- ‘es destinadas aos espectadores, dvisio que decorte da diferenciagi0 «entre as clases socias e caregorias de cidadios. Se nos imaginarmos dentro dos espagos do teatro colectiva do futuro, em esorgo reconhece- emos que ase abre um campo de invengio de wma riquera insspeitada, 179 SSeS mente expressivo de comunicagio, desejo de ser visto ¢ ouvido naqucle espago que, ainda que sendo relativas a suas dimensées, parece contudo ao actor, do ponto de vista da cena, conter toda a humanidade; porém, © publico, esse representante da vida social, desaparece cle priprio do espago destinado aos espectadores; 0 piiblico passa a viver e respirar apenas na obra de arte que Ihe surge como sendo a prépria vida, na cena que Ihe parece ser 0 mundo inteiro, Tais maravilhas floririo da obra do arquitecto, tais prodigios poderio dele obter fundamento terreno real, se cle tomar sua a intengao da suprema obra de arte humana, se, com base na sua especifica faculdade artis- tica, trouxer & existéncia as condigées em que ela pode tomar-se coisa viva, Mas, inversamente, que fria, que inerte, que destituida de vida nao se apresentard a sua obra, se, sem outra intengio mais elevada que a do luxo, sem a necessidade artistica, que Ihe permita organizar ¢ inventar no teatro aquilo que em todos os aspectos for mais apropriado, o arquitecto se limitar a proceder de acordo com 0 capricho especulativo do seu préprio arbftrio, amontoando volumes, enfileirando ornatos, para hoje materializar 0 louvor de um ricago petulante, amanha o de um qualquer Jeové modernizado...! Contudo, & obra de arte dramatica, para que este jam perfeitamente preenchidas as condigées espaciais do seu surgimento, também nao basta uma forma superiormente bela ou uma alvenatia sumptuosissima, Accena, que hé-de por perante o espectador a imagem da vida humana, teré que conseguir também, para que haja completo entendimento da vida, apresentar uma imagem que seja odpia viva da natureza, a tinica ima- gem em que o homem artista pode dar-se totalmente 180 enquanto tal. As paredes desta cena — que, se forem frias c sem participaco, mais parecerao olhar fe, mente actor e © piiblico — tém que se embelezar com as frescas cores da natureza, com a luz quente do Eter, para serem dignas de tomar parte na obra ce ante humana. A arguitectura pldstica expetimenta aqui os seus limites, a sua falta de liberdadc, ¢ langa-se, sequiosa de amor, nos bragos da pintura que a redimind na beleza fmpar de ser absorvida na natureza, Aqui entra a pintura paisagisica, requisitada por uuma caréncia colectiva & qual s6 ela pode corresponder. A obra unificada de todas as artes o Pintor vem juntar, como seu valioso contributo, aquilo que o seu afortu. nado olhar vai buscar & natureza, aquilo que, enquanto homem artista, quer apresentar & comunidade toda para deleite artstico desta. Por seu intermédio a cena torna, “$e verdade artstica total: 0 tragado, as cores, a uilizacdo ‘uence, vivifcante, que faz da luz, obrigam a natures 2 servira suprema intengio artstica. Aquilo que até agora © pintor paisagistico, no sew impulso para a comunicagao do que observava ¢ apreendia, confinava nos estreivos limices da moldura do quadro, aquilo que até agora Pendurava sobre a parede solitéria da sala do egosta ou ue entregava & acumulacio incomunicante, desconexa < deformante, de um depésito de tla, seré 0 que agora lhe permitisé preencher a ampla molduta do palco tré- sico, dando configuragao a taco o espago da cena, em testemunho da sua forga criativa que parte da natureza. Aquilo que até agora, com o seu pincel, com as mais finas misturas de tintas, s6 podia sugerir ou que 56 Podia levar as proximidades dailusio, € 0 que ele agora Poderd conduzir até & mais perfeita intuigao ilusiva, Pela aplicagio artstica de todos os meios da Sptica e da 18 utilizagio das luzes, que lhe serio proporcionados. Nao sofrerd mais 0 uleraje da evidente rudeza dos seus ins- trumentos artisticos, do aparente grotesco dos seus processos de trabalho na chamada pintura decorativa, pois que agora terd a nogao de que, em face da obra de arte perfeita, até o mais fino pincel nao passa de um 6rgi0 humilhante, ¢ terd presente que o artista sé tem que estar orgulhoso quando é livre, ou seja, quando a sua obra de arte estiver completada e for viva, € quando ele e todos os seus inscrumentos auxiliares tiverem pas- sado para dentro da obra. A obra de arte perfeita que do paleo vem até ele, saindo de uma tal moldura 20 encontro do ptiblico colectivo, satisfi-lo-4 infinica- mente mais do que todo o seu trabalho anterior produzido com instrumentos porventura mais refina- dos; em yerdade, nao poderd arrepender-se de ter substituido 0 pedago de tela lisa que antes tinha & sua disposigao pela utilizagio do espago cénico em benelfi- cio desta nova obra de arte, porque, no pior dos casos, 9 seu trabalho permanecerd 0 mesmo seja qual for a moldura em que é dado a ver, desde que oferega o res- pectivo objecto a uma apreensio compreensiva, mas em qualquer caso a sua obra dentro desta moldura desenca- deard sempre uma impressio mais plena de vida e uma compreensio mais ampla ¢ mais universal do que 0 quadro paisagistico que antes pintava. O Sérgio de toda a compreensio da nai homem: a tarefa do pintor paisagista foi ndo apenas a de comunicar essa compreensio aos homens, mas tam- bem a de a cornar finalmente distinta por via da representacio do homem no seu quadro da natureza. Agora, pelo facto de colocar a sua obra na moldura do palco trégico, ampliard o homem a quem quer comuni- 182 | car-se ao homem colectivo do paiblico na sua totalidade, e teré a satisfacio de ter estendido a sua compreensio a esse mesmo homem colectivo que com ele partilha sentimento da sua alegria; ao mesmo tempo, porém, s6 chegaré a fazer com que ocorra perfeitamente esta com- preensio piblica na medida em que subordinar a sua obra a uma intengio artistica colectiva suprema e maxi- mamente compreensiva, intengio que se abre de modo infalivel & compreensio colectiva pot acgao do homem real, corpéreo, com todo o calor do seu ser. Ora, 0 que hi de mais compreensivo é a acco dramética, precisa- ‘mente porque ela s6 esté artisticamente perfeita quando, no drama, todos os meios auxiliares da arte foram, por assim dizer, ultrapassados e a realidade da vida consegue oferecer-se ca maneira mais fiel e mais crivel a apreen- sao imediata. Cada uma das diferentes modalidades artisticas comunica-se & compreensao na exacta medida fem que o respectivo micleo central — que 56 por via da sua referéncia ao homem ou na sua derivaséo a partir dele pode vivificar ou clucidar a obra de arte — encontrar no drama 0 seu préprio amadurecimento, O trabalho de criagéo artistica torna-se_universalmente com- preensivel, perfeitamence apreensivel e justificado, na proporgio em que, sendo absorvide no drama, é atra- vessado pela luz que dele irradia*... * Para © pintor paisagisea moderno no pode ser indiferente o facto de se aperceber de como sio poucos os que hoje em dia entendem a sua ‘obra e de como ¢ imbecile estipida a astude com que o mundo dos filseus que the pam se limita a artepalar os olhos perante imagem da atures que o seu quad Ihes is de como aquila a que se chama um «bela enpuadvamenton proporcions satisfagio & mera curiosidade ociosa € varia dos mesmos individuos detizuddot de caréncias cujo sentido do ‘uvido ¢ igualmente excitado peas fabricasBes modetnas, sem conteddo, «da misica do nosso tempo, até aingirem aquele estado de alegria parva 183 E assim, o homem artista entra no palco do teatro, obra do arquitecto do pintor, como © homem natural se movimentava no palco da natureza. Aquilo que o escultor ¢ 0 pintor historica se esforgavam por fazer na pedra ou na tela é agora configurado por eles em si pré- pias, com a sua figura, com os membros do seu corpo, ‘com os tragos do seu rosto, em vida consciente que é arte. O mesmo sentido que conduzia o escultor na apre- ensio ¢ na reproducio da figura humana, conduz agora © actor no tratamento ¢ no comportamento do seu corpo real. © mesmo olhar que tornava possivel que 0 pintor histérico, no desenho ou nas tintas, a0 ordenar 2 vestes e compor 0s grupos, pusesse a descoberto um elemento belo, um factor grécil ou caracteristico, orga- niiza agora a riqueza do fendmeno humano real. Em tempos, o escultor ¢ o pintor haviam separado do tré gico grego 0 corurno ¢ a mascara, sobre 0 qual ¢ sob a qual o verdadcico homem s6 continuava a mover-se na dependéncia de uma convencio religiosa. Tinham razao estas duas artes plisticas 20 abolirem essa tltima desfi- guragao do homem puramente artista e a0 consticuirem antecipadamente, em pedra e sobre a tela, 0 actor tré- gico do futuro. E, tal como souberam entrevé-lo na sua ie para oar epresena una eb tanco mals epugnane do Se eco quant es sega crresponde pfetamente A inenglo do industrial Enc o sce enquadamento na oss smisca que soso bere cena um este parents, cj lode Tigao deze nfo pensamentosnst, ma sm agua epéie de ign oor des borane que esa oolhar egos do sfrimente humane &sua vl, pats it pga lager de um curnkoprvad nes vapors de ura Sicada natura univer: ens als conforadas gota de ouvir cdo, de ver tudo, menos ofomen veal, no-defurado, qu ra adverténcia coloatia aa do eno dos seus soon, One pcan ese home are gos trees qe elmo princi plano! 184, verdade indeformada, também agora deverdo lancar-se a tarefa de, na realidade, dar representagio corpérea € plena de movimento & sua figura que, cm alguma medida, conseguiram em tempos desctever. E assim, no drama, a ilusio da arte plistica trans- formar-se-4 em verdade: 20 bailarino, 20 mimo, 0 artista plistico estende a mio, deixando-se absorver nele ¢ passando ele mesmo a ser bailarino e mimo. Tanto quanto esta no ambito das suas capacidades, este trataré de comunicar aos olhos o homem interior, 0 seu sentir e 0 seu querer. O espaco cénico, em toda a respectiva largura e profundidade, pertence-lhe para af dar a ver plasticamente a sua figura e 0 seu movimento, sorinho ou em unio com os companheiros da repre- sentagio. Porém, onde as suas capacidades terminam, onde a plenitude do seu querer e do seu sentir 0 obriga 2 fazer uso da linguagem para dar manifestagio a0 homem interior, af a palavra anunciaré a sua intencio- nalidade distintamente consciente: passard entio a ser (poeta c, para ser poeta, passaré a set misice. Enquanto bailarino, misico € poeta seré, contudo, um sé ¢ 0 mesmo, nada mais do que homem representando, homem artista, comunicando-se, na suprema plenitude das suas capacidades, & suprema energia receptora. Nele, nesse actor imediato, unem-se as trés artes inmas numa eficécia conjunta em que a capacidade suprema de cada uma delas atinge o seu supremo desenvolvimento. Ao agitem em conjunto, cada uma delas ganha a faculdade de poder ser e poder produzir exactamente aquilo que as trés, de acordo com a sua mais especifica esséncia, desejam ser e produit. Pois que cada uma, no ponto onde a sua faculdade termina, pode ser absorvida na outra, que desse ponto em 8s diante é eficaz, entio conserva-se pura, livre ¢ autd- noma, enquanto exactamente aguilo que é. O bailarino mimico vé-se liberto da sua incapacidade logo que pode cantar e falar; as eriagGes da musa ganham interpreta Gio inteiramente compreensivel tanto no movimento mimico como na palavra poética, € ganham-na preci- samente na medida em que a propria music conseguc transpor-se para o movimento do mimo ¢ pars 3 pslavn do poeta. O poeta, esse, 56 se torna verdadeiramente hhomem ao transpor-se para a carne c 0 sangue do actor, se este consegue conferir a cada fenémeno artistico a intencionalidade que a todos liga ¢ conduz a um objec tivo comum, entéo essa intencionalidade passaré do plano do querer-ser ao do poderset logo que predie mente esse querer-ser pottico se dissolua no poder-ser da itaciao. Pao haved ona capacidade ricamente desenvolvida das artes singulares que fique nao usilizada na obra de fate otal do futuso; antes serd precisamente nesta que tay capacidades obterdo a sua integral vigorasio “Assim, nomeadamente, a arte musical, tio especifica € diversificadamente desenvolvida na miisica instrumen- tal, poderd desabrochar nessa obra em acordo com ‘a sua mais rica faculdade, estimulando por seu tutno a danga mimica a alcangar invengdes completamente novas ¢ ampliando de igual modo o respitar da poesia aué 4 mais insuspeitada exuberdncia. A miisica, no seu estado solitério, conseguiu contudo desenvolver um Sérgio capaz da mais imensa expresso, a onguctas ‘A linguagem sonora de Beethoven, introduzida no drama pela orquestra, € um momento intciramente novo para a obra de arte dramatica. Se a arquitecrura ¢ em especial a pincura paisagistica cénica conseguem 186 colocar no contexto da natureza fisica 0 artista dramé- tico que representa, e, a partir da nascente inesgotével dos fenémenos naturais, dar-the um fundo sempre rico € prenhe de sentido relacional, na orquestra — nese corpo vi ivo de harmonia incomensuravelmente diversa ndividual na sua actividade de representacio a sélida base de uma indestruttvel fonte de elementos nacurais, mas também humanos e artisticos. A orquestra &, por assim dizer, o terreno de finito sencimento universal do qual consegue crescer até 4 mais elevada abundancia o sentimento individual do actor singular: em certa medida, a orquestra trans- forma o terreno imével, hirto, da cena propriamente dita numa superficie branda, maledvel, receptiva is impressoes, etérea, cujas inexploradas profundezas so as do préprio oceano do sentimento. A orquescra é, pois, como a Terra que, logo que Ansew a tocava com os pés, the conferia renovada forca viva, imortal. De acordo com a sua esséncia, esta em perfeita oposicio com 0 contexto cénico, natural, em que o actor se move, e daf que, quanto & sua localizacao, esteja muito apro- priadamente sicuada fora do enquadramento cénico, num plano avangado ¢ afundado; mas, ao mesmo tempo, a orquestra constitui também o remate perfeito que vem complementar esse contexto cénico do actor, ampliando o inesgotavel elemento natural, fisico, a0 no menos inesgotdvel elemento artistico, /umano e sensivel, que, assim unificado, como que integra 0 actor no anel atmosférico da alianga entre 0 elemento natural ¢ © clemento artistico, anel no qual ele se moverd no maximo esplendos, como se fora um corpo celeste, ¢a partir do qual poder expandir em todas as direcgbes os seus sentimentos ¢ intuigGes, até ao infi- — oferece-se a0 homem 187 nito, tal como 0 corpo celeste consegue enviar os seus raios de luz até &s mais inexploradas lonjuras. E assim, complementando-se nas alternancias da roda do seu dancar, as ares irmés, agora unidas, mos- trar-se-4o ¢ fario valer os seus atributos, ou todas em simultineo, ou duas delas, por veres uma sé, segundo as necessidades da acgio dramética, que, s6 ela, pode dar a medida ¢ a intencionalidade. Umas veres sera a mimica plistica a espreitar as consideragbes desa- paixonadas do pensamento; outras, sera a vontade do pensamento decidido a verter-se na expresso imediaca do gesto; outras, serd apenas a misica a ter que dar expressio & torrente do sentimento, & comocao estreme- cida; outras vezes, porém, serio as trés, no seu abrago conjunto, a clevar a vontade do drama ao plano do agit imediato, eficaz. Porque, para as trés artes assim reuni- das, h4 uma s6 coisa que todas tém que querer para poderem rornar-se livres naquilo que conseguem: € pre- cisamente o drama; as trés tém, pois, que estar apostadas cm alcangar a intengao do drama. Sc as trés tiverem consciéncia dessa intengéo, se todas dirigirem a sua von- tade somente no sentido da respectiva execusao, entéo serlhes-4 dado alcancar a forca necesséria para que cada uma pelo respectivo lado possa podar 0 seu ramo dos rebentos egofstas da sua esséncia particular, de modo a que a drvore nao cresca desconfigutadamente em todas as direcgbes, e possa sim orientar-se orgulhosamente para a extremidade da sua copa, pata a coroa sob a qual se retinem todos os seus ramos, galhos ¢ folhas. ‘A natureza do homem ou a de cada uma das moda- lidades artisticas é, em si mesma, exuberante ¢ diversa porém, ser sempre simica a alma de cada existéncia indi- vidual, tinico 0 seu impulso mais intimo, 0 seu impeto 188 mais enérgico, oriundo da caréncia que experimenta. Se uma dada existéncia individual consegue reconhecer nesse sinico a sua propria esséncia fundamental, entéo conseguiré também, em prol do impreterivel encalgo desse tinico, afastar todo e qualquer apetite mais fraco, sccundirio, todo ¢ qualquer descjo impotente cuja satis- fagao pudesse tolher-lhe a obtengao do tinico. $6 uma existéncia incapaz, débil, nao enconcrard em si um desejo de alma superiormente necessério, maximamente enérgico: no fraco, predomina em cada momento este ou aquele apetite casual, despertado por qualquer cit- cunstancia exterior, apetite que, precisamente por ser apenas apetite, ele nunca conseguiré apaziguar, vendo- -se arrastado arbitrariamente de um para 0 outro, sem nunca alcangar um gozo real. Se, porém, um individuo, assim destituido do imperativo da caréncia, detiver 0 poder de perseguir obstinadamente a satisfagao dos seus, petites casuais, entdo, quer na vida, quer na arte, surgirZo precisamente aqueles fenémenos abjectos, anti-naturais, cessas excrescéncias de um fazer louco e egoista que nos enchem de indiaivel repulsa, seja na luxtiria sanguindria de um déspota, seja na lascivia da miisica operdtica moderna. Se, pelo contritio, o individuo reconhece em si mesmo um desejo potente, um impeto, que dentro de si faz. recuar todos os outros apelos, ou seja, se reco- nhece o impulso interior necessfrio que constitui a sua propria alma, a sua esséncia, e se coloca toda a sua forga 20 servico da satisfagao deste impulso, entao elevard também a sua forga ¢ a faculdade mais espectfica que nele houver 2 maxima altura € & mdxima poténcia que Ihe forem alcangéveis. Porém, o homem individual, de corpo, coragio ¢ entendimento sdos, no poder experimentar careci- 189 mento mais clevado do que aquele que tem em comum com todos os seus semelhantes; porque, enquanto verdadeira caréncia, ela s6 poderd set tal que cle a consiga satisfazer apenas na comunidade. Ora, a caréncia mais vigorosa, maximamente necesséria, do homem artista perfeito € 2 de comunicar-se ele ‘mesmo, na suprema plenitude da sua esséncia, & mais ampla comunidade, coisa que, com compreensio uni- versal ¢ necesséria, somente alcanga no drama. No drama, ele amplia a sua esséncia particular a esséncia universal humana, por via da representacéo de uma petsonalidade individual que nao é cle proprio. Terd que sair completamente de si mesmo para aprender, naquilo que é especifico da respectiva esséncia, uma personalidade que Ihe é alheia, conseguindo-o tao integralmente quanto preciso for para poder repre- senté-la; ¢ sé chegaré a consegui-lo se estudar esse individuo rigorosamente, apreendendo-o no contacto, nna interpenctragao ¢ na complementagao dele com e através de outras individualidades — ¢ portanto apreendendo também a esséncia dessas outras indivi- dualidades —, fazendo-o téo vivamente que se Ihe torne possivel interiorizar simpateticamente na sua esséncia esse contacto, essa interpenetragao ¢ essa complementacio; ¢ € por isso que o actor perfeita- mente artista é o homem singular capaz de sc ampliar a si mesmo até & esséncia do género segundo a maxima plenitude da sua esséncia particular prépria. Ora, 0 espaco em que se executa este processo maravilhoso é © paleo reatral, ea obra artistica colectiva que esse pro- cesso traz a luz € 0 drama. E em tal obra, supetion, una, 0 artista singular — tal como acontece com cada modalidade artistica —, para conduzir ao maximo flo- 190 rescimento a sua particular esséncia, ter que, dentro de si mesmo, reprimir toda e qualquer tendéncia egofsta arbitraria que possa ampliar-se inoportuna- mente num sentido que nao sirva o todo, de modo a poder com o maximo vigor participar na ac¢io con- junta que leva & obtengio da suprema inten¢do colectiva, a qual, por seu curno, nunca conseguiré rea- izar-se sem 0 individuo singular e sem a limitagao atempada dessa sua singularidade. Ora esta intengio, a do drama, é 20 mesmo tempo a tinica intengao verdadeiramente artistica que alguma vex pode ser realizada: tudo 0 que dela se afaste ter que necessariamente perder-se no oceano do indeter- minado, do incompreensivel, do nao-livre. Porém, uma tal intengo nao a alcanga wma modalidade artis- tica por si sé*, mas apenas todas colectivamente, ¢ € por 0 poeta cénico moderno ter a maior dificuldade em admitir que 0 drama no deva pertencerexclusivamente & sua modalidade artstica, a poesia: em particular, n2o acta rer que paril-lo com o compesitor, desgnadamente deixar — como ditd — que o especticulo eeatral se dis solva na dpera, Enquanco subsite a dpers, est cerissimo que subssta 0 ‘especticulo ceatal, ta como a pantomimas ¢ enquanco existirem estas disputas,ndo seré pensivel a efectivagio do drama do Fucuro. Contudo, se divida por parce do pocta residir mais fando, se ele se obstina em ‘io compreender como poderiao canto assumir totalmente e em todos 1s casos o lugar do diflogo reciado, entio teré que se Ihe responder que ccileu wna, cin duis mpecios,o cadcter da obra de ace do facuro. Em primero lugs, nfo ancevé que nessa obra a masica trd que adopear um posicionsmento ineiramente diferente daquele que tem na pera moderna: a misica s6 se apresentard em coda a sua amplitude rnaqueles momentos em que ¢ ela 0 factor mais praduiv,e, pelo contré- Fio, sempre que for, por exemplo, a linguagem dramética 0 factor mais necescrio, enti a rsa era que se lhe submeser completamente; mas ssucede também que a mica tem precisamente a faculdade de, sem emu- cdecer por inteio, adaprarse ao clemento conceptual da lingua de modo to despercebido que, embora esando de fcto 4 apoii-ls, quse a deisa 191 al é simultanea- isso que a obra de arte mais uni mente a tinica que € real e livre, ou seja, a obra de arte universalmente compreenstvel vigorar por sis6. Seo poeta reconhecee que assim é entfa hi um segundo aspecto que precsané de encarar: as situagiese a ideas slacvamente 3s ‘quas seria prejudicial eimpertinente qualquer apoio da musica, ainda que pianissimo, maximamente contido, #6 poderiam ser resutantes do explrito do nosso espectéculo teattal moderno, espirita esse que, ra obra de arte do futuro, ji no encontraeérigorosamente neahum espago pare respirar, O homem que asi mesmo nada cerd aver jé com a barafunda prossicamente intriguita, imposta representard no drama do fieuro pelas les estatais da moda, que os nosos poctas modernos trata de cnredar e desenredar até 20 paroxismo da pedanteria. A acgio e 0 dis- curso desse homem obedecerio lei natural: Sim, sim! Nioyno!+ Tudo ‘© mais € petniciovo, ou seja, € modemo, supéluo. 192 Vv O ARTISTA DO FUTURO

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