You are on page 1of 22
deta ee ane cod. PIDDOPAY RURAL DEVELOPMENT IN EASTERN AMAZON Henkel, Karl (Universidade Federal do Ps (Universidade Federal do Par, Brasil) Brasi ; Almeida, Jimnah de 1, Introdugio Conflitos da terra na fronteira agricola ainda & uma caracteristica decisiva do desenvolvimento rural na Amazénia, Eles se baseiam numa falta de politicas piblicas na zona rural. Por causa do declino da produgdio agricola, facilidade de trabalhar em matas nativas © tamanho grande das familias, a populagdo rural migra para as fronteiras agricolas, que slo caracterizadas por falta de demarcago das propriedades agricolas ¢ ordem estatal, Além disso, terra 6 um objeto de especulagio para investimento, Como conseqiiéncia, surge um conflito de interesses entre pequenos proprietérios, fazendeiros, migrantes ¢ indios. O objetivo deste trabalho & a anilise das posigdes diferentes dos envolvidos, ¢ mostrar possiveis solugdes entre os grupos sociais. O estudo utilizou centrevistas qualitativas com representantes das agéncias estatais brasileiras IBAMA. (agéncia ambiental), INCRA (agéncia de regulamento de terra), FUNAI (agéncia de protecio india), posseiros e comunidade indigena Tembé ¢ Urubu. 0 estudo mostrou que as agéncias estatais ainda ndo so preparadas para um planejamento integral, mas também ha poucas possibilidades para uma solugio porque leis ndo podem resolver a fome para terra, 2, A direa indigena Alto Rio Guamé-Tembé e Urubu A Aldeia Indigena (Al) Alto Rio Guamé apresenta uma extensdio de 278.000 hae est entre as de porte médio existentes no Estado do Pard. Localizada na regidio SBENTAL fronteiriga ao Estado do Maranhfo, a aldeia tem como limites os muni Capito Pogo, Santa Luzia do Par, Nova Esperanga do Pirid, Garraffio do Norte, Paragominas, bem como os rios Guamé e Gurupi. A dea da AI é habitada por Tembé, Guajajara, Urubu-Kadpor © Awa-Guajés. Os Tembé ¢ os Guajajara compdem a raiz-tupi ‘Tenetéhara. A etnologia classifica os Tembé ao grupo cultural Pindaré-Gurupi. Antes do contato com brancos, os grupos no mantinham qualquer relacionamento fisico ou cultural entre si. Antigamente, cada aldeia era representada por uma familia e em cada regio vivia somente uma tribo. Hoje as tribos vivem juntas na Al, mas os proprios interesses das familias continuam, o que dificulta o trabalho da FUNAI. De acordo com DODT (1873, p. 172), em 1873 moravam em toda a regio, cerca de 9.000 Tembé, HURLEY (1932, p. 35) informa que em 1920 havia 17 aldeias com 1.091 pessoas, BRITTO et alii (1966, p. 93) cita 146 pessoas sem, no entanto, fazer indicagées de lugares. A grande redueZo da populagdo até 0 ano de 1920 deveu-se, quase que exclusivamente, & ocorréncia de epidemias de gripe e sarampo. Hoje, a populagio tem tendéncia crescente, isto é, 0 mimero dos Tembé ve aumentando, totalizando ca. 1.400 indios. Ao longo da histéria, os Tembé sempre estiveram envolvidos com os brancos, tanto 0s Tembé no rio Gurupi como no rio Guam. Em decorréneia, muitas familias, ‘Tembé, especialmente a partir de 1920 e ao longo do tempo, misturaram-se com a Populagio branca © negra. E durante 0 periodo colonial, a miscigenagdo ocorreu, principalmente, com escravos negros fugitivos, vindos da regio de Grajai de Maranhio ou de fuzendas da regio Nordeste Paraense. A FUNAI foi criada na década de 50, ¢ uma politica foi isolar os Tembé dos brancos, um relacionamento que jé existia ha bastante tempo. A lingua dos Tembé quase desapareceu, & apenas os habitantes mais velhos ainda falam tupi, Os jovens entendem a lingua, porém se comunicam mais em portugués. Presume-se que ormamentos e pinturas na pele, nunca foram usados pelos Tembé. Essa diferenca em relagéo ds outras tribos ja havia sido detectada por ‘TSCHUPELI (1898, p. 206). Quanto aos Urubu, esses ainda hoje conservam sua lingua ¢ apenas os jovens falam portugues. Os Urubu, a0 contrério dos Tembé, nio se misturaram com os negros dos quilombos, devido provavelmente sua indole guerre. AA situagao juridica desse grupo, no passado, nio ficou bem definida, por nio se saber se os Tembé eram indios ou se j seriam aculturados. A lingua e 0 costume nio fazem a diferenga, porque os Tembé comegaram a incluir em sua alimentago produtos como sal, café, arroz ou feijo, que so alimentos bésicos do homem branco. Ha indios que hoje apresentam barba c bigode, € os indios, geralmente, sio imberbes. Também na hierarquia ndo ha uma diferenga entre indios e brancos, porque os indios posstem um capitio e os colonos brancos tém lideres comunitarios ou vereadores, que representarn grupos. Por causa de mudangas no govemo a lei nfo foi aplicada. Os préprios Tembé consideram-se ainda éndios, apesar do alto grau de miscigenagzo, A principal diferenga entre indios e brancos é a vivéneia em grupos pelos indios, enquanto os brancos vivem também isolados. O indio trabalha em grupos, enquanto 0 branco trabalha sozinho e decide, o que ele quer plantar ¢ faz o que ele quer. Os indios ou os representantes decidem em conjunto, 0 que eles fazem, planta ou organizam, Os {ndios podem excluir outros indios das comunidades, enquanto que isso nio é possivel numa comunidade branca, Outra diferenga é o senso comercial. Os indios sempre viveram com o extrativismo, isto é, consumiram sem plantar ao contrério dos brancos, que desde vedo aprendem com os pais a ganhar dinheiro pensar economicamente. 3. Invasio expulsio Ainda ndo se cesenvolveu um processo, que possibilite o convivio harm@nico com sociedades que sdo diferenciadas em termos de etnia, cultura ¢ tecnologia sem domina-las ou destrui-las fisica e/ou culturalmente. £ nesse contexto que vivem, hoje, no Brasil 329 mil indios (0.2 % da populagao brasileira) distribuidos em 212 etnias, que falam 170 linguas diferentes, dispersos em 554 terras indigenas, corespondentes a 11 % do terrtério nacional, das quais 51 % esto demarcadas e, segundo dados da FUNAI, 80 ‘% estio invadidas. De acordo com o CEDI (1985, p. 183), nos anos quarenta e cingiienta, cagadores, rea das pescadores ¢ madeireiros comegaram a ingressar nessa regio aleangand aldeias indigenas. A regio sempre foi campo migratstio para nordestinos que fugiam das secas, Essa afluéncia aumentou com a construgio das rodovies Belém-Brasilia € Paré-Maranhiio, Uma conseqiiéncia disso, foram fundados municipios, entre os quais, Capitio-Pogo e Garrafio do Norte, que fagam fronteira com &AL Com a abertura da Amazénia para o capital privado, através dos programas de financiamento da Superintendéncia para o Desenvolvimento da Amazénia —- SUDAM, a empresa COMPANHIA AGROPECUARIA DO PARA atuava na AI ¢ adquiriu 11.000 hz dentro da reserva. Como ARNAUD (1984/85, p. 333) observa, isto 56 poderia ter acontecido com aprovagio da FUNAI em Brasilia, que declarou estar desocupada essa parte da aldeia indigena Em 1976, a empresa agropecudria MEJER & CIA iniciou a instalagio de uma fazenda, localizada na parte leste da fronteira com a aldeia indigena, ¢ através de um acordo com a FUNAI, teve permissio para construir uma estrada que atravessou toda @ AL. Dai em diante, essa estrada tomou-se porta de entrada para os posseiros que acreditavam numa suposta doacio de terras para fins de colonizagdo. Nesse mesmo ano, © governador do Estado solicitou ao Ministto do Interior em Brasilia, uma redugio na area da aldeia, com 0 argumento de que esta excedia as necessidades dos indios (ARNAUD, 1984/85, p. 335). Atualmente, j4 existem dentro da Al povoagées de possciros, e a FUNAI registrou oficialmente 1.012 familias que vivem nessa area, 0 que pode significar em tomo de 5.000 pessoas. Segundo declaragdes dos Tembé, cerca de 10,000 familias fazem. rogados no interior da aldeia, e aproximadamente 3.000 familias moram na rea da aldeia, 4. © problema a partir da perspectiva da FUNAT Em 1945, 0 interventor do Estado do Para reservou via decreto, a faixa de terra a margem direita do Rio Guamé e esquerda do Rio Gurupi aos Tembé, Timbira, Urubu- Kadpor e Guajéra. Esses grupos tiveram, a partir de ento, um territério fechado. A demareaciio de terras indigenas esti prevista na Constituigdo de 1988, no artigo 231, mas 4 politica indigena do governo modificou a lei com o decreto 1.75/96, que permite a revisiio das terras indigenas demarcadas e a intervengao nos grupos aculturados, como critério para demarcar as terras indigenas. Neste aspecto, hé uma grande diferenga entre {ndios ¢ brancos: indios no conhecem terras demarcadas, porque para eles nunca houve a necessidade de demarcar. Os brancos, neste caso 08 colons, necessitam de uma demarcagio das terras para ter 0 dircito de usufruto. Um colono s6 investe em producio se obtiver os direitos sobre a produgio. No que se refere aos conflitos de terra nas aldeias indigenas, no Estado do Paré ¢ em toda a Amaz6nia, 0 problema da AI Alto Rio Guamé representa apenas um dos muitos problemas enfrentados pela FUNAL. Acrescenta-se a isso o dilema em que a FUNAI se encontra: representar 0s interesses dos indios sem possibilidades para atendé- los melhor, uma vez que antigamente tanto a FUNAI como o INCRA eram subordinados ao Ministério do Interior, ¢ entre os diversos interesses desse ministério, incluiam-se a protegio das aldeias indigenas, a colonizagdo e a reforma agriria. Nesse contexto os problemas indigenas no tiveram a devida relevancia. No cendrio politico atual, a FUNAI perdeu importincia © influéncia politica, enquanto os aspectos econémicos ganharam maior peso nas decisses politicas. Além disso, a discussio sobre 2 politica indigena foi substituida, em parte, pela discussio sobre 0 Movimento dos Trabathadores sem Terra — MST e discussio ecologica. Os indios no tém, como minoria que so, 0 mesmo poder de mobilizago que outros segmentos da sociedade, para reagir por meios legais em caso de invaso e depredagdo do seu patrimdnio. ARNAUD (1984/85, p. 339) atribui & FUNAI, a responsabilidade principal pela situagio atual. Segundo a posigio do CEDI (1985, p. 195), os acordos entre a FUNAI ¢ (05 fazendeiros no pasado, com a excluséo dos demais envolvidos, tém contribuido, a0 ‘mesmo tempo, para uma desmoralizagio ¢ desmobilizagao dos indios. Por esse motivo, os priprios Tembé ja fizeram criticas contra a FUNAI, ¢ achavam que ela nio os representava, Para conscientizar 05 indios, a FUNAI mudou a politica indigena de atendimento assistencial, que significa doagdo de ferramentas, sementes, medicamentos, etc., € hoje pretende conscientizar ¢ treinar os indios. Um dos projetos prevé a capacitagao dos indios na area de saiide € ensino. No aspecto educacional, os jovens indios receber educago na propria lingua, aprendem a resistir contra a substituigao da sua cultura © procuram manter suas tradigdes. Além do que, sua educago esti sob a responsabilidade da Secretaria de Estado de Educado-Seduc, que contrata pessoas no Indios para lecionar em Areas indigenas. Por outro lado, os proprios indigenistas da FUNAT nunca possufam uma opinido indigena tinica. Esta situagio se reflete também no caso dos Tembé, onde 0s representantes dos postos sempre tinham opinides diferentes sobre as ages necessérias. Atualmente, a AT esté dematcada, reconhecida na sua extensio total, regularizada © pertence integralmente aos indios para usuftuto, porque as terras tradicionalmente ocupadas por eles so bens piblicos de dominio da Unido. Sto inalienaveis ¢ indisponiveis, ¢ os direitos sobre elas, imprescritiveis. Enquadradas como ‘bens piiblicos de uso especial, essas terras destinam-se a posse permanente dos indios, cabendo-thes 0 usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios ¢ dos lagos nelas existentes. O atual texto constitucional reafirmou a competéncia da Unido para demarcar e proteger as terras de ocupagao tradicional dos indios, Na verdade, a terra nilo adquire seu cardter indigena com 0 ato demarcatério do poder piiblico, pois este apenas a reconhece como tal, A terra pertence aos indios, e o Estado reconhece esse cariter pela demarcagio, que no d4 nem tira direito, apenas evidencia os limites a que se aplica a protegao constitucional 5. O problema a partir da perspectiva dos posseiros ‘A partir dos anos 40, colonos provenientes de antigas areas de colonizagio das, MRH Salgado, Guamé Bragantina penetraram na area indigena. Em poucos anos, surgiram areas de produgdo agricola através do sistema usual de corte-queima, em fungio da existéncia de grandes areas de floresta priméria. Uma pequena propriedade agricola em amplo espaco da AI permitia, deste modo, a utilizagio da terra tanto por posseiros como por indios, porém a migragio posterior ameagava 0 proceso de consolidagiio. ‘Um outro aspecto negativo, a partir da perspectiva dos colonos, é o surgimento das fazendas. As areas nas quais se estabeleceram pastagens, ultrapassam em termos de tamanho, em muito as antigas dreas de procedéncia dos fazendeiros. A utilizagio extensiva leva, com 0 tempo, & uma concorréncia entre propriedades agricolas © propriedades agropecuatias, posseiros e fazendeiros. 5 posseiros das vilas localizadas fora da area indigena, nao véem sua presenca, como perigo para os indigenas, posto que, das aproximadamente 10,000 familias que trabalham nessa érea, somente 3.000 vivem permanentemente ali, e exploram junto com madeireiros e fazendeiros ca. de 40 % das terras. Das restantes 7.000 familias, muitas provém de vilas localizadas fora da AI, onde a fertilidade do solo diminuiu ¢ 0 trabalho no rogado aumentou, sendo que muitos colonos, por causa do vaivém entre suas casas € 0s rogados, nos quais eles trabalhavam apenas durante o tempo da queima, plantagdo © colheita, a estada inicialmente tempordria acabava se tornando permanente. Os colonos estiio conscientes de ferem penetrado indevidamente na érea indigena, mas argumentam que existe muita terra disponivel e atribuem a culpa da invasio aos fazendeiros, que invadem grandes éreas. Muitos colonos tém a esperanga de ‘que as terras dentro da AT, nas quais tem os seus rogados, sejam legalizadas e por isso permanecem na area. Ademais existe também a grilagem, em que os rogados so colocados para verda em uma etapa posterior. Por outro lado, dois fatores impedem o deslocamento acelerado de mais posseitos: o dificil acesso a rea devido as precérias, condigdes de trafegabilidade durante a época das chuvas, bem como a falta de uma infra-estrutura que faz muitos colonos de antigas areas de colonizagio, nfo se fixarem nem temporariamente nas dreas indigenas. Em geral, 08 colonos no véem 0s indios como inimigos. Os colonos vivem, da mesma forma que os indios, com a necessidade de ter que cultivar. Muitos lideres comunitarios das vilas no véem em decisdes tomadas no ambito oficial, seja através da FUNAI ou do Estado, nenhuma solugdo, uma vez que ha outros interesses. Em ‘contrapartida, eles consideram necessiria ¢ também viavel uma solugo em conjunto com os indios: "Os indios sdo os verdadeiros brasileiros, mas nés somos os descendente: argumentam os colonos. Politicamente, os posseiros representam um potencial de votos bastante significativo e so apoiados por politicos locais de todos os partidos. Muitos vereadores nas sedes municipais possuem 0 maior reduto eleitoral entre 0 colonos que vivem dentro da Al. Seria dificil acreditar que os colonos abandonariam os rogados na Al. Os colonos que penetram na frea indigena, no se consideram invasores, ¢ sim colonos que procuram ter uma coexisténcia pacifica com os indios. Por outro lado, a tensio dos colonos ¢ latente; dificilmente conseguem entender que poucos indios possuem tantas torras ¢ recebem ainda a protegdo e ajuda do governo. Em 1996, colonos de Garraftio do Norte tomaram como reféns um grupo de indios, inclusive espancando-os, quando eles queimaram estoques de madeira deixados por madcirciros na margem da estrada, dentro da reserva. 0 problema a partir da perspectiva dos colonos, seré provavelmente, sotucionado se para tanto, eles tiverem a permissio para permanecer na drea indigena ¢ se suas propriedades forem tegalizadas posteriormente. A Area indigena deverd ser reduzida, porém 0 espaco vital dos indios deverd ser garantido. A exigéncia para uma retirada dos colonos da drea, se dé pelo ndo conhecimento de que os colonos habitam ha bastante tempo, © que a questo do remanejamento nao pode ser solucionada de maneira satisfatéria. Os colonos migram para as éreas indigenas no porque se trata de uma érea indigena, e sim porque la existem dreas disponiveis para cultivo. 6. O problema a partir da perspeetiva dos indios Para os Tembé hi, sobretudo, dois aspectos importantes: a retirada dos posseiros € 0 efeito psicolégico. A demarcagdo da AI em propriedades de 200 ha, para cada familia india, como foi sugerido pela FUNAT no passado, € categoricamente recusada. Ao contrério das tiltimas décadas a popula: indigena da AI, que estima-se hoje em 1.500 indios distribuidos em 22 aldeias, das quais situam-se 12 és margens do rio Gurupi, esté aumentando. Isto significa dizer, que no futuro os Tembé precisario de ‘mais terra que atualmente. Mais importante do que a questio da terra, & 0 efeito psicoligico dessa invasio sobre os Tembé, 0 andamento do processo de resolugao do conflito, deixa aos Tembé pouca esperanga por uma solugo vinda de fora, de modo que a invasio deveré continuar ameagando 0 espago de reprodugao fisica e econémica dos Tembé. Deve ser considerado, que entre ¢ na mesma familia, existem opinides diferentes sobre as agdes. Com a eriagio da FUNAI, se fez. uma politica indigenista de separagdo entre brancos ¢ indios, que na verdade desde século passado mantinham uma certa ligagao. ‘Além disso, a FUNAI comegou a atender aos interesses dos indios, o que provocou uma certa dependéncia dos indios em relagio aquele érgio. Os velhos indios nunca aprenderam a negociar com as entidades como INCRA, Prefeituras ou Estado. Sempre 10 n ‘quando cles precisavam de produtos ou servigos como ferramentas, 6leo para 0 motor, lanchas, medicamentos ou assisténcia a saiide, recebiam isso da FUNAI, sem ter a preocupagio de como comercializar produtos para auferir renda. ‘Nés ficamos como empregados da FUNAI”, explica 0 ex-capitio Beatriz Tembé, De acordo com esta politica, os membros mais antigos da tribo ndo esto cientes, da situagio, ¢ acham que a FUNAI resolve os problemas. Porém, os mais jovens sabem. que a FUNAL niio pode resolver o problema da invasto e sentem a necessidade de agir. Para tanto, delegagdes de indios jovens jé viajaram para Belém com a finalidade de reunirse na Assembléia Legislativa do Estado do Paré com deputados estaduais, viajaram para Brasilia, onde juntamente com o presidente da FUNAI, participaram de encontros com 0s presidentes do INCRA, IBAMA ¢ Superintendéncia da Policia Federal ¢ vigjaram para Bahia, para participar das manifestagdes respeito dos 500 anos de descobrimento. Sao principalmente os jovens, que comegam a perceber novamente seu sentido de vida, que & a sua cultura, Voltaram a se pintar, dangat, e & vezes lidar com arco & flecha como simbolos da cultura indigena e reaprendem a lingua, Isso é, um processo de auto-identificacio, autogestiio, manutengdo da rede social e revalorizagdo da propria cultura para obter uma identidade, que serve como a resisténcia contra a influéncia destruidora. Nos escombros dessa batalha nao resta apenas a saudade, que no caso dos ‘Tembé tentam reconstruir a cultura indigena, em vlo pela necessidade de sobrevivéncia, pois algumas de suas eriangas jé nfo querem mais manter as tradigdes. Eles comegaram a se organizar na década de 1980, escotheram lideres que eram. mais conscientes da situacdo. No inicio do ano 2000 na aldeia Tekohaw foram orgenizados c ministrados Cursos de Capacitago de Liderangas Indigenas por consultores de Brasilia, nos médulos Gestio Administrativa, Meio Ambiente ¢ Elaboragio de Projetos. Esses cursos tinham como objetivo ensinar aos indios a agir de modo auto-sustentével, isto & sem a ajuda da FUNAL. Entretanto, os indios serio usados por algumas ONG’s como objeto para executar projetos do chamado desenvolvimento sustentivel na frea indigena, que com os projetos desenvolvidos nessa rea, fazem propaganda no exterior, visando adquirir mais recursos financeiros para as proprias instituigdes. A principal fonte de alimentagéo dos indios & a agricultura, através do cultivo de culturas anuais como mandioca, feijéo, milho e arroz, além da caga e da pesca. Com a ‘ocupagio da area indigena, essas duas iltimas fontes de alimentagdo tomaram se escassas. Um grande problema, de modo geral, & a producdo para a subsisténcia, uma voz que as aldeias sio de dificil acesso ¢ locatizam-se bem distante das sedes municipais, (© que dificulta 0 escoamento da produgio. Num passado recente, alguns lideres indigenas venderam madeira para madeireiros ou autorizaram a retirada de cip6 nas matas da AL, 0 que provocou um estimulo maior nos colonos para penetrar ainda mais na AL Como conseqiiéncia, esses indios foram expulsos das aldeias. Projetos de avicultura ou piseicultura iniciados alguns anos atris, mas que fracassaram, mostram que os Tembé também pretendem mudar a produgio, para se tornar autosustentivel ¢ independentes do programa assistencial do governo. ‘Atualmente, existe nas aldeias a discusséo sobre a construgao de uma estrada, que liga o assentamento rural CIAP do INCRA com a reserva, para iniciar a comercializagio de cipé ¢ madeira, mas os indios tém opinides divergentes. Além da FUNAI, os Tembé receberam no pasado um certo apoio dos municipios, como mudas de laranjas ou a cessio de enfermeiras para ajudar as B comunidades do municipio de Capitto Pogo. Mas segundo os indios, a contratagio de enfermeiras & dificil, pois sdo poucos os técnicos de satide que querem trabelhar numa rea indigena. Um dos projetos preve a realizagio de cursos de capacitagdo dos proprios {ndios para assumir 0 trabalho assistencial na area, ¢ alguns indios jd estio assumindo essas unidades, mas com um minimo de conhecimento. Um dos Tembé recebeu treinamento no Instituto de Doengas Tropicais Evandro Chagas em Belém, para analisar casos de maliria nas aldeias. Os casos mais graves sto transferidos para Belém, onde os indios se hospedam na Casa dos {ndios em Icoaraci. Com a mvdanga de responsabilidade da FUNAI para a Fundagio Nacional de Saiide — FNS, no que se refere ao atendimento dos indios, agravou-se sua situagio, isto é, um servigo basico que {6 era deficiente, mas ainda havia vontade para executé-lo, se tornou bem pior. Além da tuberculose, 2 maliria especialmente, j4 cansou mortes entre os indios, ¢ os Tembé receberam medicamentos doados, somente pelo governo estadual Também a situagdo escolar ¢ preciria: alguns alunos vivem nos outros ‘municipios para completar o ensino fundamental, porque nas aldeias faltam professores. No caso da aldeia Cachocira, a professora do ensino basico foi contratada pela prefeitura de Paragominas, mas nilo sabe ensinar na lingua indigena. As dificuldades stio enormes para alguém que tem de viver distante da prépria familia, num ambiente quase desconhecido, sem o minimo conforto da cidade. As aldeias nfo possuem o mesmo nivel s6cio-econdmico e hé grandes diferencas entre si. Enquanto na Aldeia Grande ou Tekohaw e Canindé se concentra a maioria desses servigos, na aldeia Cachozira ou aldeia Aldeia Nova existem somente escolas. Até o presente, 0 desenvolvimento do processo da ocupago nem sempre se dew de forma pacifiea. Cansados de esperar por solugées oriundas de fora da reserva, os proprios indios comegaram @ agir Um grupo de Anambés, procedente da regio do rio ‘Capim, que morava temporariamente na dea indigena dos Tembé, atacou os posseiros © matou alguns deles, Depois dessa ocorréncia, os colonos retiram-se repentinamente ¢ no houve 0 perigo de invasio durante algum tempo. Somente mais tarde que eles foram lentamente voltando para a regio. Alguns Tembé demonstram estar dispostos a atacar novamente os posseiros. Para se ibilizar as autoridades, em 1996 os Tembé tomaram como reféns quatro funciondrios da FUNAL Em 1997, ameagaram colonos para que desocupassem a AI, sob pena de serem expulsos a forga, tendo suas casas © benfeitorias saqueadas © queimadas. Numa dessas agdes de resgate, porque ndo se trata de ages organizadas permanentes praticadas pelos érgios responsaveis, um indio foi baleado. O caso foi denunciado na sede da FUNAL, mas os érgios competentes néo fizeram nada, mas no & somente nesta drea que a Policia Federal pouco pode fazer, também fora da AI, a policia enfrenta dificuldades. 4 no caso dos Unubu a situagio é diferente. Devido a sua aculturagao tardia, 0 seu contato ainda hoje continua restrito a poucos brancos, o que os leva a resolver os seus problemas por si mesmos. Os Urubu devido a profunda desconfianga, nio permitem que desconhecidos penetrem nos seus territérios, ¢ postos de vigilincia nos ‘caminhos que dio acesso a sua drea, impedem a entrada, Os Urubu se constituiam ainda até hd algumas décadas atris, numa das poucas tribos ndmades da regido € somente muito tempo depois se tommaram semi-sedentarios. Estima-se que no caso dos Unubu-Kaapor serdo necessatios menos de 30 anos para que seu territério seja totalmente cercado pelos colonos. Varios caminhées de madeireiros, que entraram por Imperatriz, Maranhio, jé foram apreendidos dentro da Al 4 15 pelos Urubu-Kadpor © queimados. O problema se repete sempre, com outros madeirciros tentando roubar a madeira. Ao contririo do Estado do Paré, a AI Alto Tariagu no Estado do Maranhdo, alvo muito mais freqiiente de fazendeiros & madeireiros pelo isolamento da mesma, O problema nio é o choque entre duas culturas opostas e estranhas entre si, ¢ sim a invasio, cuja solugdo depende unicamente da justica 7, Asagdes do governo A firea dos Tembé no foi incluida no Projeto Integrado de Protegio és Populagdes © Terras Indigenas da Amazénia Legal — PPTAL, talvez por causa da invasdo que ja esté bastante avancada, Demarcada a terra indigena, com a materializagio de seus limites fisicos ¢ a exirusio dos possiveis ocupantes nao indios, 0 procedimento é levado & homologagdo da Presidéncia da Repiblica, que o aprova mediante decreto. ‘Com base no ato homologatério, a FUNAI faz 0 registro da terra indigena no cartério imobilidrio da comarca correspondente € na Secretaria de Patriménio da Unido, concluindo assim, o procedimento administrativo de regularizacao da terra indigena, © governo do Estado, através do decreto n° 3419, instituiu um programa de defesa dos direitos dos indios, mas as agdes limitam-se ao assistencialismo. Porém, 0 governo estadual possui a forga policial para a retirada dos invasores, a lei proibe isso, porque a reserva é dominio da unio. Com a criagdo da agéncia estadual de meio ambiente SECTAM, 0 governo pretende aleangar uma solugdo viével para ambos os lados, isto & protende ajudar os indios, mas também no quer nenhum prejuizo econdmico para a regio. A estrutura do programa Zoneamento Ecoldgico-Econémico do Estado do Pari — ZEEPA (HENKEL, 2000), que pretende realizar planejamento regional, demonstra que o governo estadual deseja uma solugtio favorivel a todos, e no Juridica, [Nao apenas pela falta de estrutura ¢ condigdes financeiras, mas principalmente pela pressio popular, os municipios, nfo podem e nfo querem resolver situago, Uma reintegragio excluiria mais que a metade do municipio de Nova Esperanga do Pirid e

You might also like