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LLG aT ORO eaT A an] ——— . fF ale | ‘F - - er c 2 a oe | — IM (AOTUCR INGLE ISBN: F2-644-317-9 FELIX NETO 1. Introdugio ‘SS RFI SEES SR SISOS a OSESBOCOS IESE Hamk Do you see that cloud, that’s almost in shape like a camel? Polonius: By the mass, and ‘tis like a camel indeed. Hamlet: Methinks, it is like a weasel Polonius: It is backed like a weasel. Hamlet: Or, like a whale? Polonius: Very like a whale. Shakespeare Imagine a quantidade de vezes que mudou de opinido ou alterou 0 seu comportamento no sentido de se tornar mais semelhante a alguma pessoa ou grupo de pessoas. Essa modificacdo pode ter ocorrido porque durante uma discussdo & mesa do café ficou convencido(a) da exactidao da outra perspectiva, Pode também ter acontecido que houve mudanga porque tomou consciéncia que se estava a desviar de um padrio comportamental generalizado. Efectivamente os pensamentos e os comportamentos dos outros Tevestem-se de suma importéncia para nés, donde o frequente confronto com os das outras pessoas. Nao é por acaso que certos grupos de pessoas usam roupas semelhantes, tém ideias semelhantes acerca da educagio das criangas, so simpatizantes de um partido ou emigram para um outro pais As situagSes evocadas so exemplos de influéncias sociais.A influéncia social envolve 0 exercicio de poder social por uma pessoa ou grupo para mudar as atitudes ou o comportamento de outras pessoas numa determinada direcgio. © poder social refere-se & forga dispontvel no influenciador para motivar esta mudanga. Abordaremos neste capitulo alguns dos fenémenos mais importantes que tém sido estudados a propésito da influéncia soci condescendéncia, a normalizagao, a conformidade, a obediénciae a inovagio. Em primeiro lugar, examinaremos situagdes gerais de influéncia social (condescendéncia), interrogando-nos como é que uma pessoa pode fazer ara influenciar outra. A condescendéncia ocorre quando as pessoas agem publicamente de acordo com um pedido directo. O que caracteriza a condescendéncia é que estamos a responder a um pedido de outro sujeito ou grupo. Na condescendéncia as pessoas que respondem a um pedido directo podem concordar ou discordar em privado com a acgiio com que se ‘comprometeram, ou podem ter ou nio ter opinido sobre um ou outro assunto acerca do comportamento em aprego. Pode ocorrer em diversos contextos, ‘eomo por exemplo, quando uma organizagao de voluntirios pede donativos ‘ou quando um amigo nos pede para o levarmos ao aeroporto. Examinaremos algumas dessas técnicas de influéncia social que se tém revelado particu- Earmente eficazes. 393 394 A normalizagao implica uma influéncia recfproca dos elementos de um grupo em situagdes em que nao existe consenso da maioria sobre uma resposta «correcta», estando 0s individuos incertos quanto as suas respostas. Os individuos fazem um compromisso aproximando as suas posigdes uns dos outros o que evita 0 conflito. A conformidade ocorre quando os individuos modificam os seus compor- tamentos ou atitudes para aderirem as normas sociais existentes, isto é, regras amplamente aceites que indicam como as pessoas devem comportar-se em ccertas situagdes e nas circunstancias especfficas. Trata-se de um meio crucial através do qual grupos, ou mesmo todas as sociedades, moldam as acgGes dos seus membros. ‘Veremos, seguidamente, uma situagao particular de influéncia, a obediéncia, que ocorre em situagdes em que as pessoas mudam 0 seu comportamento em resposta a ordens directas dos outros. Uma pessoa ou um grupo tem a autoridade legitima para influenciar o nosso comportamento em certas situages sociais. O governo tem o direito de nos pedir para pagarmos impostos; os pais tém o direito de pedirem aos seus filhos para fazerem os deveres da escola. Se muitas vezes as pessoas investidas de autoridade fazem pedidos razoaveis e apropriados, nem sempre é 0 caso. Durante os julgamentos de crimes de guerra cometidos pelos Nazis muitos sujeitos acusados de assassinarem civis tentaram desculpabilizar-se dos seus comportamentos porque estavam «a seguir ordens» dos que mandavam. A inovagao refere-se ao processo de criagdo de novas normas com o intuito de substituir as existentes. Se bem que a inovagao possa vir de cima, em resultado dos que possuem crédito, poder e autoridade para impé-la (Hollander, 1958), mais frequente & que proceda de individuos ou grupos minoritérios que carecem de toda a competéncia social (Moscovici, 1979). Finalmente examinaremos até que ponto as comunicagées transmitidas pelos meios medisticos efectuam mudangas nas crengas ¢ atitudes de um grande niimero de pessoas. BRS a ASSESSED A condescendéncia ocorre em situagdes em que é feito um pedido directo e a pessoa concorda em comportar-se de acordo com esse pedido. Pedir directamente a alguém para fazer algo é um dos modos mais bésicos que se utilizam para influenciar outras pessoas. Tais pedidos fazem parte da nossa vida quotidiana. Por exemplo, um amigo pode pedir-nos para Ihe pagarmos as facturas da agua e da electricidade, caso nao esteja em casa, para nao fumar no carro, o que pensa da exposi¢o do trabalho feito na sala de aula, 0 que pensa do novo penteado, para fazer parte de uma associagio de volun- trios, etc. A investigago sobre a condescedéncia tentou compreender alguns dos processos que levam as pessoas a condescender ou recusar condescender com pedidos. Examinaremos quatro estratégias utilizadas para se obter condescendéncia: 1, aassociagdo de um pedido com situagées positivas ou bom humor, 2. a norma de reciprocidade em que é feito um pedido apés se ter prestado um favor; 3. a criagio de compromisso, muitas vezes levando uma pessoa a concordar primeiro ou com um pedido inicial mais pequeno ou sob condigSes falsas; 4. o recurso A reactancia psicolégica. 2.1 Humor positivo Quando as pessoas fazem pedidos muito rapidamente descobrem que os outros siio mais susceptiveis de condescender quando esto de bom humor, em especial se 0 pedido é de natureza pro-social (Isen, 1987). Uma das razies para tal € que as pessoas que esto de bom humor séo mais susceptiveis de estar activas e por isso mais inclinadas a comprometer-se num leque de comportamentos (Bason et al., 1979). Uma segunda razo é que um humor agradavel pode activar pensamentos € recordagdes agradaveis que provavelmente fardio com que as pessoas se sintam mais favordveis em relagao a alguém que esté a fazer pedidos (Forgas e Bower, 1987). Dada esta consciéncia geral de que 0 bom humor ajuda a criar condes- cendéncia, antes de se fazer um pedido, muitas vezes dizem-se coisas agradéveis, acerca dessa pessoa. Como j4 vimos no capitulo 2, a insinuagdo é uma estratégia de auto-apresentagdo em que se procura levar os outros a verem-nos de modo favordvel. Muito embora as pessoas possam desconfiar das 397 398 motivagdes dos insinuadores apés receberem os seus pedidos, o lisonjeamento que precede o pedido é ainda muitas vezes eficaz para se obter condescendéncia (Kacmar, Delery, e Ferris, 1992), 2.2 Reciprocidade Muitas vezes somos obrigados a condescender com pedidos porque j4 recebemos um beneficio da pessoa que faz 0 pedido. Quando fazemos isso estamos a seguir a norma de reciprocidade (Gouldner, 1960). A norma de reciprocidade diz que pagaremos favores aos que nos ajudaram. Pode parecer surpreendente ver com que facilidade e frequéncia esta norma é explorada. 2.2.1 Grande pagamento por um pequeno favor A utilizagdo mais simples da norma de reciprocidade usar um pequeno favor para obter uma concessio muito maior. Investigago de laboratério demonstrou claramente que fazer um pequeno favor pode efectivamente abrir caminho para a condescendéncia reciproca. Regan (1971) fez apelo a dois sujeitos ao mesmo tempo em que um era compadre do experimentador. Em metade das situagdes, o compadre comportava-se de modo amavel, ao paso que na outra metade das situagdes era um colega de trabalho detestavel. Durante uma pausa, 0 compadre ausentou-se ¢ voltou com uma coca-cola paraele e para o outro sujeito (nas duas outras condigdes, nada era oferecido ou entio a coca-cola era dada pelo experimentador). Ao fim da experiéncia, ‘© compadre anunciou que vendia bilhetes cada um a 0,25 $ para uma rifae propés a sua compra ao sujeito. Em média, os sujeitos compraram mais bilhetes apés receberem um favor (mais quando provinha do compadre do que do experimentador) que quando nao receberam. A norma de reciprocidade era tio forte que os sujeitos até pagavam o favor (comprando bilhetes) a0 compadre desagradavel. Efectivamente os sujeitos desta tiltima condigo compraram em média 0,43 $ de bilhetes. Tendo em conta que uma coca-cola nessa altura custava menos de 0,25 $, esta téctica foi uma boa estratégia de investimento. 2.2.2 Nao é tudo! A técnica do «ndo é tudo» também recorre 4 norma de reciprocidade para induzir condescendéncia (Burger, 1986). No recinto universitério instalou- ‘SRN RSS RIE SSE A OE -se uma banca para vender bolos. A certos clientes que eram informados sobre 0 seu prego dizia-se que cada um custava 0,75 $. A um outro grupo dizia-se que cada um custava | $, mas mesmo antes que os sujeitos pudessem esbogar qualquer resposta, reduzia-se o prego para 0,75 $ cada um. Como o prego dos bolos era finalmente o mesmo nas duas condigdes nao deveria haver diferengas, Observou-se, no entanto, que na condigao de controlo (em que o prego era fixo desde 0 comego a 0,75 $) houve 44% de vendas. Pelo contrério, na situago em que os sujeitos acreditavam numa redugio stibita dos pregos, as vendas foram de 73%. Numa variante desta experiéncia, Burger (1986) obteve os mesmos resultados, ndo através da diminuigdo répida dos pregos, mas do ajuntamento de produtos pelo mesmo prego. Talvez. jé tenha visto esta técnica na televiso. Em primeiro lugar o prego «habitual» € reduzido, e depois acrescentam-se varios bénus adicionais. O vendedor parece estar a fazer uma concessio que os potenciais compradores se sentem entio obrigados a retribuir. 2.2.3 A técnica da porta na cara Fazer em primeiro lugar um grande pedido e depois um mais pequeno pode aumentar a condescendéncia com o pequeno pedido (Price Dillard, 1991). Tem-se chamado a esta técnica da porta na cara, pois o primeiro pedido é {io grande que as pessoas podem ser tentadas a fechar a porta na cara da pessoa que pede. Num estudo (Cialdini et al., 1975) foram abordados estudantes na rua e apresentou-se-Ihes um pedido enorme: ocupar-se de um jovem delinquente duas horas por semana durante os préximos dois anos sem ser pago. Como era de prever ninguém acedeu a esse pedido. Quando o ‘experimentador fez um pedido muito mais baixo— acompanharia um grupo de delinquentes para um passeio de duas horas ao jardim zool6gico ~ 50% concordara. Todavia quando se fez este pequeno pedido nao tendo sido precedido do grande pedido menos de 17% concordaram. O uso desta técnica pode ser observada em muitas situagdes da vida quotidiana. E 0 caso de muitas negociages sindicais e politicas. Por exemplo, atécnica da porta na cara é muitas vezes utilizada em politica quando grupos que procuram fundos para os seus projectos comegam por solicitar orgamentos que excedem as necessidades reais. Entdo quando esse orgamento € rejeitado, 0 pedidos so reduzidos substancialmente, mas sendo ainda adequado. Por conseguinte, a técnica da porta na cara permitiu triplicar o ntimero de pessoas que aceitaram acompanhar um grupo de jovens delinquentes ao jardim zo0l6gico. OE 399 2 SEeanasceroxe nants DEED A ETT 400 TE OD A semelhanga da estratégia «nao é tudo», a técnica da porta na cara também parece assentar em sentimentos de reciprocidade. Passando de um grande pedido para um pequeno pedido, a pessoa que pede parece ter feito uma concesso. A pessoa alvo sente-se entio obrigada a fazer uma concessio recfproca condescendendo. Dois outros factores parecem também contribuir para o efeito da porta na cara: auto-apresentagio e contraste perceptual. Preferimos ser vistos de modo favordvel pelos outros e as pessoas podem acreditar que os outros as veriam ‘como pouco implicadas ¢ amigaveis se recusassem os dois pedidos (Pendleton € Batson, 1979). Por consequéncia, as pessoas sentem-se pressionadas para concordar pelo menos com um dos dois pedidos para manter uma auto- apresentagdo positiva. Para além disso, os sujeitos podem ver 0 abaixamento do pedido como uma concessio da outra pessoa e sentir-se pressionados para também fazerem uma concessao. O contraste perceptual desempenha um papel na medida em que o segundo pedido pode parecer mais pequeno em comparagJo com o grande pedido inicial, 2.3 Compromisso Em geral nfo gostamos de mudar quando j4 nos tinhamos comprometido com uma posigdo ou acgao. Examinaremos duas estratégias importantes para obter condescendéncia que assentam no compromisso das pessoas com a acgio: as técnicas do pé na porta e do favor disfargado. 2.3.1 A técnica do pé na porta Uma maneira de se aumentar a condescendéncia é levar a pessoa a concordar em primeiro ugar com um pequeno pedido. Apés haver concordado com essa pequena acgdo é mais facil concordar com um pedido maior. Ea isso gue se chama técnica do pé na porta, Esta técnica derivou da estratégia do marketing, mas tem arborescéncias mais amplas na vida quotidiana. Amigos, colegas de trabalho, namorados comegam muitas vezes por pequenos pedidos que sabem que nio sero recusados e s6 gradualmente aumentam 0 objectivo dos pedidos. Seré esta técnica eficaz? Muitos estudos sugerem uma resposta positiva (Beaman et al., 1983; Dillard, 1991). Talvez no estudo mais famoso sobre este t6pico, Freedman e Fraser (1966) entraram em contacto telefénico com donas de casa num primeiro momento e pediam-Ihe que respondessem a uma pergunta sobre o sabdo que utilizavam. ‘Tratava-se de um pedido sem importancia. Seguidamente perguntavam & dona de casa se permitiria a sua visita ao domicilio para fazer, durante duas horas, uma classificagio dos produtos de limpeza que utilizava. Verificou-se que 53% das donas de casa que tinham acedido ao primeiro pedido, também acederam ao segundo, enquanto que somente 22% das donas de casa do grupo de controlo acederam ao mesmo pedido. Mesmo se noutros estudos no foram encontrados resultados tdo contrastantes (Beaman et al., 1983), hd provas de que a técnica do pé na porta é eficaz para aumentar a condescendéncia num amplo leque de contextos como sejam 0 pedido para assinar uma peti¢ao (Baron, 1973), para contribuir para obras de caridade (Schwarzwald, Bizman, e Raz, 1983). Nao € completamente claro porque € que esta técnica funciona. Uma explicagao baseia-se na teoria da autopercepcao (Bem, 1972). Pode acontecer que uma vez que os individuos concordam com um pequeno pedido inicial, mudario subtilmente as suas autopercepgdes. Podem crer-se como uma pessoa que faz essa coisa, isto é, que dé ajuda a pessoa que Iha pede. Por isso quando for contactada de novo e Ihe seja apresentado um pedido muito maior concordard para ser consistente com a sua auto-imagem mudada (Snyder ¢ Cunningham, 1975). ‘Uma segunda interpretago sugere que depois de as pessoas concordarem em ajudar, as suas percepgGes de ajuda podem alterar-se de modo a verem a ajuda como algo de mais agradével e menos ameagador, e por essa razio manifestardio uma maior propensio a ajudar ulteriormente (Rittle, 1981). Actualmente ndo é possivel optar por uma destas interpretagdes. Pode efectivamente ndo ser necessério efectuar uma op¢ao, pois quer as mudangas na autopercepgdo quer nas reacgdes gerais as situagdes de ajuda contribuem para que a técnica do pé na porta funcione com éxito. Em suma, aeficdcia da estratégia do pé na porta é simultaneamente excitante e inguietante. E excitante para o proprietatio do pé e inquietante para o proprietério da porta. 2.3.2 A técnica do favor disfarcado Foi em 1978, somente alguns anos apés ter dado a conhecer a técnica da porta na cara, que Cialdini propds uma nova técnica de condescendéncia: atécnica do favor disfargado (tradugao nio literal da expresso anglo-saxénica low- ball). 402 = SOROS SRSA SRE SO principio do favor disfargado consiste em levar um sujeito a tomar uma decisio, quer escondendo-Ihe alguns dos seus inconvenientes (primeira forma de disfarce), quer apontando vantagens ficticias (segunda forma de disfarce), a verdade s6 sendo revelada ulteriormente. Trata-se portanto de um «engodos fazendo-se uma proposta inicial interessante, antes de voltar A verdadeira proposta. pressuposto da técnica do favor disfargado é que uma vez que um compromisso foi feito, pode ser mais dificil para uma pessoa desdizé-lo do que manté-lo apesar de custos adicionais. Varios estudos tém comprovado 0 sucesso desta técnica, Num estudo efectuado por Cialdini e colaboradores (1978), os investigadores pediram a um grupo de estudantes para participar num estudo que comecaria as sete da manhi. Aos sujeitos na condigdo de controlo foi-lhes pedido para participar no estudo ¢ indicou-se a hora. Nacondigio de disfarce pediu-seprimeiro aos sujeitos se participariam e, se concordavam, dizia-se-Ihes entdo que a experiéncia ocorreria as 7 da manha. Foram obtidas duas medidas de condescendéncia — a percentagem de sujeitos em cada condigao que concordaram em participar, e a percentagem dos sujeitos que apareceram como previsto no laboratério. Os resultados do estudo, mostrados no quadro 11.1 indicam que uma percentagem muito maior de estudantes a quem se Ihes apresentou o disfarce concordaram em participar e apareceram como previsto no laboratério, Quadro 11.1 — Percentagem de sujeitos que aceitaram participar e apareceram Condigio Controle | Disfarce Aceitaram participar na experiéncia 31 56 Apareceram como previsto no laboratério 4 33 Fonte: Cialdini et al., 1978. Esta técnica de condescendéncia tem sido utilizada em diversos contextos. Por exemplo, esteve amplamente espalhada na inddstria automével (Cialdini et al., 1978). Se bem que esta técnica seja em muitos aspectos semelhante & do pé na porta, hé pelo menos uma diferenga importante entre ambas as técnicas. Na técnica do favor disfargado 0 compromisso inicial refere-se a um comportamento a realizar, enquanto que na técnica do pé na porta, o compromisso é antes demais em relagdo a um comportamento diferente ¢ menos exigente. A explicagao inicialmente proposta por Cialdini et al. (1978) nunca foi seriamente contestada. Assenta na teoria do compromisso (Kiesler, 1971). Para este autor © compromisso comresponderia simplesmente ao lago que liga um individuo aos seus actos. 2.4 ReactAncia psicolégica A teoria da reactncia psicolégica diz que quando as pessoas sentem ameagada a sua liberdade de escolha, experienciam activagiio desagradavel (isto é, reactincia), que as motiva a restaurar a sua liberdade (Brehm e Brehm, 1981). ‘Se alguém Ihe tira a liberdade de comprar um automével, como pode restaurar essa liberdade? E Sbvio que tem de comprar 0 automével. Estudantes universitdrios parecem reagir contra restrigdes legais desejando comprometer-se com actividades proibidas. Por exemplo, estudantes encontram um livro mais atractivo quando é considerado «reservado a pessoas com 21 ou mais anos» (Zellinger, Fromkin, Speller, e Kohm, 1974). Estudos deste género sugerem que a censura pode muitas vezes ser contraproducente, pois torna o material banido ainda mais atraente para muitas pessoas (Worchel, 1992). Quer vender um livro ou um video? Diga &s pessoas que néo o podem comprar! No documento 11.1 é ilustrada a eficdcia da utilizagéo conjunta de duas técnicas e no quadro 11.2 passam-se em revista as técnicas de condescendéncia que se apresentaram. Documento 11.1 - Duas técnicas sao melhores do que uma? Reingen (1982) testou um procedimento para induzir condescendéncia que combinasse um pedido directo com uma manipulagao da conformidade. Por exemplo, num estudo, pediu-se a estudantes para darem dinheiro para a associagao do coragio. Nalguns casos, s6 era feito 0 pedido; noutros casos, apresentava-se uma lista de oito dadores enquanto se fazia o pedido. Quando 403 404 8 ESO ISEB OSCE OAD havia evidéncia de que outros também tinham dado, 43% dos sujeitos deram dinheiro, em comparagao com s6 25% quando tal informagao nao era dada. Pessoas adultas contactadas nas suas casas mostraram 0 mesmo padrio de condescendéncia: 73% deram quando conheciam que outros tinham dado, em comparagdo com 47% que nio tinham recebido uma manipulagio da conformidade. Por isso a combinagio de técnicas pode ser mais eficaz que qualquer téctica uti ada sozinha. Quadro 11.2 ~ Estratégias para obter condescendéncia — Estratégia Prinefpio Exemplo Humor Fazer 0 pedido num contexto que crie humor | Fazer 0 pedido no decurso de um jantar positive | positive no alvo agradével num restaurante aprazivel Insinuagéo | Dizer coisas lisongeiras ao alvo Elogiar a inteligéncia, a aparéncia, ou a personalidade do alvo, e entio fazer o pedido Favores | Pedir um pequeno favor ao alvo (faz-se uso | Oferecer um café ao alvo, e entéo tentar da norma de reciprocidade) vender 0 produto Portanacara | Apds um grande pedido que 0 alvo pode | Pede-se a0 sujeito para ser voluntério recusar fazer um mais pequeno (faz-se uso | durante dois anos para uma obra de da norma de reciprocidade) caridade; apés haver recusado pede-se-Ihe para ser voluntério durante o fim de semana Nao é tudo] Oferecer um produto com um prego elevado | Oferecer para vender um bolo por cem © antes da pessoa ter a oportunidade de | escudos, ¢ entdo rapidamente baixar o prego recusar, abaixar ligeiramente 0 prego ou dar | para 75 escudos algum bénus (faz-se uso da norma de reciprocidade) Pénaporta | Apés um pequeno pedido inicial avangar | Pedir para se assinar uma petigio a favor de com um segundo pedido maior (faz-se uso | uma obra de caridade; voltar mais tarde do compromisso e de autopercepgio) pedir uma doagao para essa obra Favor disfar- | Obter 0 compromisso de condescender sob | O vendedor de um carro leva o comprador a ado ccondigdes muito favordveis, ento mais tarde | concordar com a compra com muitas renega-se alguma das condigées (faz-se uso | opgGes, ¢ ento mais tarde informa o cliente do compromisso) ue nem todas as opedes esto inclufdas Reactincia | Levar a pessoa a condescender pela ameaga | O vendedor informa o cliente de que o da sua liberdade de escolha, muita vezes ctiando uma ilusio de escassez. produto € 0 dltimo € apés estar vendido 0 Cliente seréincapaz de o comprar 3. Normalizacaio ERIS ESS Foi a partir dos trabalhos de Sherif (1936) que o estudo do processo de normalizago adquiriu importancia no seio da Psicologia Social. Desde entio, a partir das suas conclusées, outros estudos experimentais tém sido realizados com 0 intuito de se aprofundar a compreensao deste fendmeno. ‘A questio principal de Sherif, era o problema da elaboraco de uma norma colectiva. Este autor define norma social como uma escala avaliativa que indica uma margem aceitével e uma margem nfo aceit4vel para 0 comportamento, a actividade, os acontecimentos, as crencas, ou outro qualquer assunto dizendo respeito aos membros de uma unidade social. Sublinha ainda que todo o grupo que tem uma certa continuidade possui um sistema de atitudes, de valores, de leis e normas que regem as relagdes entre 0 individuos (Sherif, 1936). 3.1. Investigagiio de Sherif sobre a formagéio de normas Neste sentido, varias questdes levaram Sherif 3 elaborago de uma experiéncia que considerou ser o protétipo do processo psicolégico da formagao de uma norma no grupo: O que faz. um indivéduo colocado numa situagao ambigua, objectivamente indefinida e em relagdo & qual nao existe um quadro de referéncia extemno? Produziré uma norma individual? Embora esta primeira interrogagio parega distanciar-se da problematica da formagiio de uma norma colectiva, era importante, segundo Sherif, conhecer as reacgdes dos individuos isolados face a estimulos, obtendo-se assim pontos de comparagao que permitiriam delinear o processo de produgdo colectiva de normas. O que se passard entio com um grupo de pessoas na mesma situagio ambigua? Se cada individuo estabelece uma norma, trata-se de uma norma subjectiva individual ou é uma norma comum, especifica ao grupo e independente da influéncia miitua dos sujeitos? Haverd uma norma interindividual? E se hd elaboragiio de uma norma colectiva esta ser4 mais forte do que a norma individual? Sherif utilizou nas suas experiéncias situagdes objectivamente indefinidas, possibilitando a sua estruturagdo de varias maneiras em fungo dos quadros de referéncia estabelecidos subjectivamente. Sherif escolheu para a sua experiéncia uma situagdo em que se podia produzir © efeito autocinético. Este efeito manifesta-se quando um estimulo visual no tem quadro de referéncia: basta colocar, na obscuridade total, uma pequena fonte luminosa ¢ esta parece mover-se de forma mais ou menos caética em diferentes direcgdes. Mesmo quando se sabe que a luz est imével, o efeito continua a manifestar-se. O efeito autocinético nao é um fenémeno a SS ESS EISEN 407 Sn A IESE TN EESTI EE EY 408 novo e artificial inventado pelos psic6logos, mas € jé anterior & psicologia experimental. Como este efeito aparece muitas vezes na observagao dos astros, {40s astrénomos o tinham notado, elaborando teorias para o explicar. As experiéncias decorreram nas salas escuras do laboratério de Psicologia da Universidade de Columbia. Os sujeitos eram todos do sexo masculino e cestudantes universitérios. Nao tinham estudos em psicologia, no conheciam a organizacio fisica da experiéncia nem o seu objectivo. Dezanove sujeitos participaram em experiéncias individuais e quarenta sujeitos participaram nas experiéncias de grupo. Nas varias situagdes experimentais realizadas nesta experiéncia e relativa- mente ao efeito autocinético estudou-se a amplitude do movimento percebido pelos sujeitos. Sherif criou duas condigdes experimentais: uma condigio em que o sujeito estd s6 com o experimentador e uma condigo em que © sujeito est4 em grupo. O sujeito € introduzido nesta situagio de grupo de duas maneiras diferentes: a) Sujeitos que estiveram isolados na mesma experiéncia so postos depois em presenga uns dos outros. Esta situago permite determinar oefeito da interacgao social uma vez estabelecida a norma individual. b) Osujeito € primeiro introduzido numa situagao de grupo sem passar pela experiéncia individual anterior e é depois submetido a uma experiéncia individual. Esta condigdo permite verificar em que medida anormalizagio colectiva continua a determinar as reacgdes do sujeito ‘uma vez isolado, face ao mesmo estimulo, isto é, se a norma colectiva, se mantém como norma individual. Os sujeitos estavam sentados num quarto escuro com 3,3 m de largura e a 5 metros da fonte luminosa. A luz estimulo era um ponto luminoso proveniente de um pequeno buraco numa caixa de metal. A luz, imével, era exposta a0(s) sujeito(s) abrindo um postigo controlado pelo experimentador. Em frente a cada sujeito encontrava-se um manipulador que permitia indicar a partir de que momento o deslocamento do ponto luminoso era percebido. Apés 0 desaparecimento da luz, os sujeitos comunicavam oralmente a amplitude do deslocamento do ponto luminoso; o experimentador registava imediatamente as respostas. Cada sujeito fazia virias séries de 100 avaliagdes distribufdas por varios dias. As avaliagdes eram feitas em centimetros. Em relagdo a situagdo em que o sujeito estava em grupo foram necessérias certas técnicas adicionais no dispositivo experimental para ser possivel a0 experimentador estar atento a dois ou mais sujeitos simultaneamente. Assim SSCS SSSESORSESERISSSEN quando os sujeitos emitiam as suas avaliages em voz alta, carregavam num botiio que produzia um sinal luminoso fraco, duma determinada cor, permitindo ao experimentador saber de quem era a voz. Foi dito aos sujeitos que podiam emitir as suas avaliagdes segundo uma ordem arbitréria, Os quarenta sujeitos que realizaram as experiéncias de grupo distribuiram- -se em varios grupos pelas duas situagdes altemativas: formaram-se oito grupos de dois sujeitos cada e oito grupos de trés sujeitos cada. Quatro grupos de cada uma das categorias comegavam pela situago individual, participando depois na experiéncia em grupo; os outros quatro comegavam pela situagio de grupo, sendo depois dissociados e estudados em situagio individual, As instruges que resumem o procedimento geral da experiéncia, foram dadas pelo experimentador por escrito e foram as seguintes: «Quando a sala estiver completamente escura, darei o sinal pronto; de seguida, mostrar-vos-ei um ponto luminoso. Depois de um certo instante a luz comecaré a deslocar-se. A partir do momento em que a virem deslocar-se, carreguem no manipulador. Alguns segundos depois, a luz desapareceré. Entdo deverdo dizer qual a distincia que ela se destocou. Deverdio tentar fazer a vossa avaliag’io do modo mais exacto possivel.» A duragio de exposigio do ponto luminoso depois do sujeito ter carregado no manipulador para indicar que tina comegado a ter consciéncia do movimento, foi de dois segundos em todos os casos. A luz permaneceu sempre fisicamente imével ao longo de todas as sessGes. As vérias condigdes experimentais reuniram assim determinadas caracte- risticas que é importante definir e sao as seguintes: - ocontexto fisico é ambiguo: a situagdo nfo esté estruturada; ~ no hé normas constituidas colectivamente antes da experiéneia: a situagdo € nova para os sujeitos ¢ estranha as suas actividades habituais; ~ no hé cboas» nem «més» respostas: a resposta de qualquer sujeito é incerta; ~ pode-se considerar que o sujeito é pouco afectado pelas suas respostas: 6 uma situago em que o compromisso pessoal € fraco; ~ 08 sujeitos nio se conhecem antes de serem reunidos em grupo. Na condigdo individuo isolado, quando os sujeitos percepcionam o movi- ‘mento dum ponto luminoso sem ter nenhum quadro de referéncia externo, SE TT SSE 409 410 produz-se uma normalizagao subjectiva individual. Assim cada sujeito estabelece um desvio de variagdo e um ponto de referéncia (ou norma), no interior desse desvio, que Ihe é proprio e pode diferir do desvio de variagio e do ponto de referéncia estabelecidos por outros individuos. Este ponto de referéncia (ou norma) estabelece-se ao longo duma sucesso de apresentagdes do estimulo luminoso. Uma vez estabelecido, ele serve de ponto de referéncia em relago ao qual, cada movimento seguinte € comparado ¢ julgado como sendo curto, longo, médio, dentro do desvio de variagao proprio do sujeito, Cada avaliagdo sucessiva é feita nos limites desse desvio de variagdo e relativamente ao ponto de referéncia. A realizagio de varias séries de experiéncias para um mesmo sujeito permitiu verificar que quando 0 individuo estabelece um ponto de referéncia e limites de variagdo nas suas avaliagdes, ele tende a conservar a norma elaborada subjectivamente, mas a variabilidade reduz-se. As observagies introspectivas escritas por cada observador no fim da expe- rigncia esto de acordo com as conclusées tiradas a partir dos dados quantitativos. Os exemplos seguintes, indicam que os sujeitos, num primeiro momento tiveram dificuldade em avaliar a distancia, devido & falta de um ponto de referéncia ou de norma fomecida pelo exterior: «A obscuridade no permite nenhum sinal de referéncia para avaliar adistancia.» «Foi dificil avaliar que distancia a luz se desloca, devido A auséncia de objectos préximos». «Nao havia nenhum ponto fixo a partir do qual julgar a distancia». Osexemplos seguintes indicam que os sujeitos criaram normas pessoais uma vez que objectivamente elas ndo existiam: «Eu comparei com a distincia precedente». «Eu utilizei a primeira estimago como ponto de referéncia». Nacondigiio individuo em grupo quando o sujeito que comecou pelasituago individual, em que elaborou o seu proprio desvio de variagio no interior do qual se situa a sua norma subjectiva, € colocado depois numa situagdo de grupo com outros sujeitos (tendo eles também a sua prépria norma e desvio de variagio), os desvios de variagao e as normas tendem a convergir. Noutros termos, quando um sujeito € colocado em presenga doutros sujeitos que estabeleceram anteriormente uma margem de variagdo individual ¢ uma norma subjectiva, as suas respostas tendem a convergir para uma margem de variago e uma norma colectivas. Quando os sujeitos comegam a experiéncia por situagées de grupo, estabelecem uma margem de variagdo e uma norma préprias ao grupo. Nesta condigdo, mais do que na anterior, a norma comum emerge rapidamente ois que os sujeitos nao dispdem a partida de normas individuais, De seguida, quando um membro do grupo se confronta isolado com a mesma situagao, as suas avaliagdes so relativas & margem de variago ¢ & norma que o seu grupo tinha elaborado, O sujeito conserva a norma ¢ o desvio de variagao elaborados anteriormente pelo grupo, indicando que a norma colectiva é verdadeiramente interiorizada pelos sujeitos. A figura 11.1 ilustra esses resultados. O efeito de funil no painel da esquerda revela a convergéncia no julgamentos (medianas) dos trés sujeitos quando julgavam em primeiro lugar s6s (I), e mais tarde na presenga de outras pessoas (II, II, IV). O painel da direita mostra os julgamentos de um grupo com trés sujeitos em que se recorre a uma ordem inversa. Aqui a convergéncia ja esta presente na primeira sessdo do grupo e nio ha sinal de afunilamento na sesso final «s6>. Polegadas z 2 Sessoes Sessoes jura 11.1 ~ Medianas dos julgamentos do movimento nas condigdes s6 (1) ou grupo GI, I, 1V) @ esquerda), ¢ nas condigées grupo (I, II, IH) ou s6 (IV) direita) no estudo de Sherif sobre formagao de normas, InvestigagZo ulterior mostra que a normalizagdo pode persistir muito tempo apés o desaparecimento das raz6es originais para o comportamento. Quando 08 sujeitos foram novamente testados, um ano apés a participagdo no tipo de experiéncia que acabamos de descrever, ainda deram respostas que apoiavam anorma do grupo (Rohrer et al., 1954). aul 412 Jacobs e Campbell (1961) efectuaram investigagdo que mostra a persisténcia da normalizagdo ao longo do tempo. Os compadres deram avaliagdes extremas da distincia em que a luz se movia, Cada grupo comegava com um sujeito ingénuo e trés compadres. Os autores encontraram que as avaliagdes extremas dos compadres influenciavam os sujeitos ingénuos para dar avaliagdes muito maiores que os sujeitos do grupo de controlo que nao foram expostos aos compadres. Seguidamente, Jacobs e Campbell criaram varias «geragdes» com grupos de quatro pessoas. Apés os membros do grupo terem dado os seus julgamentos em trinta ensaios, os autores retiraram um compadre ¢ juntavam. ‘um outro sujeito ingénuo. Apés trinta ensaios, os experimentadores retiraram ‘outro compadre e acrescentaram novamente um sujeito ingénuo. Gradualmente toda a composigiio do grupo mudara. E 0 que aconteceu com as avaliagdes? ‘Muito embora as avaliagdes diminufssem gradualmente, os sujeitos ingénuos varias geragdes mais tarde ainda davam julgamentos mais extremos que os sujeitos do grupo de controlo. A influéncia dos compadres persistia muito tempo apés terem deixado o grupo e mesmo aps 08 sujeitos que tinham influenciado directamente terem também deixado 0 grupo (Figura 111.2). toh ae a g «4 \ & Sw a gos 2 3 6 < Zz 4 z ——— 2 123456789 01 GERAGOES — Compadres — Sujeitos ingénuos — Controle Figura 11.2 - Transmissio de uma norma arbitréria ao longo de «geragdes» de sujeitos. Fonte: Jacobs ¢ Campbell (1961). Como mostra a figura, as normas extremas criadas pelos compadres persistem durante um certo niimero de eragies apds os compadres se retirarem do grupo. O conjunto destes estudos indica que quando se est perante a incerteza acerca de como interpretar ou julgar acontecimentos nas nossas vidas, somos susceptiveis de ser influenciados pelos outros, sobretudo se eles aparecem confiantes. Nao s6 somos susceptiveis de aderir aos seus pontos de vista da realidade, como também de continuar a usar a sua perspectiva quando efectuamos julgamentos mesmo na sua auséncia. Esta adesdo a normas da realidade de outras pessoas constitui o alicerce do proceso de socializagdo em todas as sociedades. 3.2. Explicagées Estas experiéncias permitiram, segundo Sherif, estudar a formagao dum quadro de referéncia especifico numa situagao de grupo, mostrando (de uma forma simples) 0 processo psicol6gico fundamental implicado na elaboragao das normas sociais. Poderia esperar-se que tendo todos os sujeitos o mesmo peso na formagio da norma colectiva, esta ndo seria mais do que a média resultante das diferentes normas individuais. Tal nao foi verificado pelos resultados de Sherif: se as posigdes individuais convergem para o estabelecimento de uma norma colectiva, nao € forgosamente para uma posigao média. As relages entre individuos dum grupo podem nfo ser simétricas, podendo entio os sujeitos nao ter todos 0 mesmo peso de influéncia. Isto nao quer dizer que 0 processo de normalizacao se reduza a um fenémeno de lideranga, ‘em que a norma colectiva é a norma do lider. Sherif conclui que mesmo quando a norma se estabelece em fungo das respostas dum sujeito cuja influéncia € dominante, as suas respostas também sio influenciadas pelos outros membros do grupo; se o lider modifica a sua norma uma vez a norma de grupo estabelecida, os outros podem deixar de o seguir. A norma resultante depende assim do processo de interacgdes proprio a cada grupo. Neste sentido, estudos ulteriores isolaram e estudaram certos factores, tais como relagdes de amizade, estatuto ou prestigio, posigdes ideolégicas, que podem afectar, modelar ou mesmo eliminar a convergéncia dos diferentes sujeitos. Sherif salienta ainda que a convergéncia para uma norma comum nio é provocada instantaneamente pela influéncia de uma ou duas avaliagdes pelos outros membros do grupo, mas estabelece-se segundo um processo temporal. A influéncia de uns elementos sobre os outros vai-se manifestando nas observagSes ulteriores sem que os préprios sujeitos estejam conscientes dessa influéncia. 413 414 autor refere assim a existéncia de qualidades novas e supra-individuais nas situagdes de grupo, sendo estas as principais respons4veis pelo processo de normalizago, sem deixar de referir que o principio psicol6gico subjacente as situagdes individuais e as situagGes de grupo € 0 mesmo: nos dois casos tende-se para um valor padrdo. Mas este valor padrio nao integra os mesmos factores na situago individual ou de grupo. Para Sherif, no caso da normalizacao individual, este valor padrao é resultante da situacdo fracamente estruturada, dos estados psiquicos e das caracteristicas inerentes ao sujeito considerado; no caso da situago colectiva, anorma resulta destes factores combinados numa situagdo de interacgao particular. Embora © principio psicolégico seja o mesmo, as normas colectivas resultam desse proceso de interaccio. Assim, segundo Sherif, a norma que aparece numa situagao de grupo nao é a média das normas individuais. E um resultado que no pode ser referido apenas a partir das situagdes individuais; é preciso também introduzir as, caracteristicas préprias do processo de interacgao particular que af se desenrola. As experiéncias de Sherif foram criticadas em varios aspectos, quer em termos metodolégicos, quer em termos de conclusdes acerca dos resultados experi- mentais. Tais aspectos nao serio aqui apresentados sendo no entanto importante enunciar outras explicagdes, além das apresentadas por Sherif, relativas ao processo de normalizagio. Allport (1924) parte de um processo um pouco diferente embora se trate também dum fenémeno de nivelamento de respostas: a moderagio dos julgamentos em copresenga. Nas experiéncias que realizou, verificou que em presenga de outrém, as respostas dos sujeitos mudam em relagdo & condigao individual: elas moderam-se. Allport explica esta moderagio dos julgamentos dizendo que em situagio de copresenga os sujeitos créem ter julgamentos que esto em desacordo com os dos outros. Assim hesitam em dar respostas extremas tomando antes uma atitude de submissao em presenga do grupo. Concluiu que a interacgao entre individuos s6 € possfvel por um sistema de concessdes recfprocas. $6 assim os individuos se aceitam mutuamente tornando possivel a emergéncia de uma estrutura colectiva. ‘Montmollin (1965) testou através de uma experiéncia a proposigao segundo a qual os sujeitos tendem a aproximar-se da tendéncia central da distribuigao das respostas do seu grupo, seja por esta resposta aparecer como tendo mais hipéteses de ser exacta, seja por aparecer como sendo a mais susceptivel dum acordo no grupo. Segundo este autor os sujeitos comportam-se como «estatisticos» que tém em conta as caracteristicas da distribuigo das respostas do seu grupo. Fala também na nogao de «margens de probabilidade»: cada sujeito, além de um certo desvio, nfo tem em conta as respostas mais extremas relativamente & sua avaliago. Por fim, Moscovici (1979) interpreta 0 processo de normalizagio como um mecanismo de evitamento do conflito, através do compromisso. A heterogeneidade das avaliagdes torna impossivel um acordo imediato: os diferentes sistemas individuais de respostas entram em conflito. Os sujeitos, tentando evitar o conflito, convergem as suas estimagdes a negociagio evolui em fungio de «concessdes equivalentes e reciprocas». Esta conver- géncia é tanto maior quanto menor for o efeito das respostas nos sujeitos. A normalizagdo nesta perspectiva é um «mecanismo de negociagao activo que conduz a aceitagdo do mais pequeno denominador comum». Refira-se, para concluir, que sugestibilidade tem por vezes aspectos dramé- ticos. Os desvios de avides, as visdes de OVNI e até mesmo suicfdios tm tendéncia a produzir-se por vagas. Phillips (1985) refere que os acidentes fatais de automéveis, os desastres de avides privados € os suicidios disfargados aumentam no seguimento de suicfdios a que se faz grande publicidade. Por exemplo, depois do suicidio de Marilyn Monroe ocorrido a 6 de Agosto de 1962 houve para o més de Agosto 200 suicidios a mais que o habitual nos Estados Unidos. Além disso, o nimero de mortes aumenta unicamente nas regides em que se publica a histéria do suicidio. Quanto mais os jornais consagram espaco a hist6ria, mais o ntimero de mortes aumenta. Phillips cré que tal denota o poder da sugestZo, bem como o facto de varios «acidentes» de automéveis e de aviGes serem muito provavelmente suicfdios. E por isso que os suicfdios que ocorrem no metropolitano de Montréal, por exemplo, nio so anunciados publicamente desde hd um certo nimero de anos. 2 seen eS RGO oS A eS SSR eC aS 415 2 eS EE SEE ESSE 4. Conformidade e Independéncia Seas SERRE tS EPR ROT: ISRO A conformidade é algo que acontece com uma frequéncia incrfvel. E muito mais facil deixar-se levar pela corrente de um rio que nadar contra ela. E mais facil vestir-se ¢ pentear-se como toda a gente ¢ até comportar-se que enfrentar a opiniao geral e fazer algo de diferente. Entende-se geralmente por conformidade «uma mudanga de sentimentos, de opinides e de ‘comportamento por parte de uma pessoa em resultado de presses fisicas ou simbélicas exercidas por um Ifder ou por um grupo» (Moscovici, 1985, p. 376). A conformidade diferencia-se de condescendéncia em dois aspectos: envolve a) uma mudanga no comportamento em relago a um grupo, e b) pressio de ‘um grupo de pessoas endo tanto um pedido de um individuo. Contrariamente ao que sucede na normalizagao, a conformidade diz respeito a situagdes em que existe uma norma maioritéria claramente definida. E importante lembrar que na normalizacao os individuos esto pouco implicados no seu sistema de respostas e os varios pontos de vista convergem na medida em que a negociagao instaurada nao privilegia nenhuma norma individual. Ao invés, na conformidade existem duas perspectivas mutuamente exclusivas, a de uma maioria «legitima» e a de uma minoria «desviante», sendo a influéncia da maioria responsdvel pela redugo do conflito interindividual com a correspondente adesdo do grupo minoritério ao grupo maioritério. Abordaremos sucessivamente as primeiras experiéncias sobre a conformidade, algumas explicagSes que tém sido avangadas pelos psicélogos sociais sobre porque € que as pessoas se conformam e os factores que afectam a conformidade 4.1 O paradigma experimental de Asch As investigagGes sistemiticas sobre a conformidade tiveram inicio no comego dos anos 50 mediante os estudos cléssicos de Solomon Asch (1951, 1955, 1956). O seu objectivo primordial era estudar as condigdes sociais e pessoais que levam os individuos a resistir ou a conformar-se as presses de grupo quando esse grupo tem um ponto de vista contratio a evidéncia perceptiva. Numa das descobertas mais perturbadoras da psicologia social, Asch péde provar de que as pessoas imitavam um julgamento que sabiam ser contritio aos factos, contrario ao que percepcionavam, ou ambos. Asch encetou os seus estudos com 0 intuito de compreender um dos dilemas morais que se colocam ao homem contemporaneo: a dependéncia intelectual do homem em sociedade. 419 Asch, na sua experiéncia de 1956, em que repete a experiéncia de 1951- experiéncia «princeps»- interrogou, em condigées experimentais, 123 jovens de 17 a 25 anos, com uma média de idade de 20 anos, estudantes de trés Universidades; 37 sujeitos de controlo foram igualmente estudados. Foram utilizados grupos de ito sujeitos em que apenas um era testado, desconhecendo este os objectivos da experiéncia —sujeito «ingénuo».Ao longo das experiéncias foram testados 50 sujeitos «ingénuos». Os restantes individuos dentro de cada grupo emitiam respostas programadas, a priori, pelo experimentador~ sujeitos compadres. Asch mediu quantitativamente os efeitos do grupo sobre os individuos através da andlise da frequéncia do niimero de erros dos sujeitos que iam na direcgao das estimativas erradas da maioria. Interessou-se também pela percepgio que © sujeito fazia do grupo em que estava inserido, Cada grupo de 8 sujeitos realizou 18 ensaios experimentais, sendo cadaensaio realizado da seguinte forma: 0 grupo de 8 estudantes colocava-se a uma distancia de um metro, frente a um quadro no qual eram dispostos dois cartes contendo linhas desenhadas. Estas linhas tinham um comprimento que variava entre 5 ¢ 22 cm, de ensaio para ensaio. Apenas uma linha era desenhada no cartdo da esquerda (em relago & posiga0 do sujeito), enquanto que no cartéo da direita havia trés linhas de tamanho nitidamente diferentes. Uma destas tinha comprimento igual & linha do cartio da esquerda (linha padrdo) (Figura 11.3) Figura 11.3 Um exemplo de estimulos apresentados na experiéncia de Asch (1955). Pedia-se aos sujeitos para julgar qual das tréslinhas que ob viamente tinham tum comprimento desigual (mostradas a direita do painel) era igual em ‘comprimento com a linha padrio (mostrada & esquerda do painel). Fonte: Asch (1955). O experimentador dizia aos sujeitos que iam participar numa experiéncia destinada a testar a exactid’o da sua percepco visual e, em cada ensaio, perguntava-Ihes qual das trés linhas do cartdo da direita era equivalente & linha padrao, Os sujeitos emitiam os seus julgamentos uns a seguir aos outros, em voz alta, sempre na mesma ordem, comecando pela esquerda. O sujeito «

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