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Fichamento/resumo

Nietzsche: a genealogia e a história In: Microfísica do poder - Michel Foucault

I
 Genealogia: marcar a singularidade dos acontecimentos sem se preocupar com a sua
finalidade, buscar compreender aquilo que não é considerado história (sentimentos,
amor, consciência, instintos).
 A genealogia exige paciência, detalhamento, a busca pela erudição.

II
 Ursprung (pesquisa da origem): lógica do conhecimento, o objeto da pesquisa é
definido como a origem dos preconceitos morais.
 Origem: lugar de verdade, anterior a todo conhecimento positivo.
 Fazer a genealogia dos valores, da moral, do asceticismo, do conhecimento, será
demorar de forma meticulosa nos acasos dos começos, voltar-se para a maldade,
retirar as máscaras. É preciso conhecer a História e os acontecimentos.

III
 Herkunft: é a proveniência, origem do grupo.
 Descobrir as marcas sutis, singulares, não com o objetivo de reencontrar uma ideia
característica de um povo.
 Seguir o filão complexo da proveniência é, ao contrário, manter o que se passou na
dispersão que lhe é própria: é demarcar os acidentes, os ínfimos desvios – ou a
contrario as inversões completas – os erros, as falhas na apreciação, os maus cálculos
que deram nascimento ao que existe e tem valor para nós, é descoberta na raiz
daquilo que nós conhecemos e daquilo que nós somos – não existem a verdade e o
ser, mas a exterioridade do acidente. Eis porque, sem dúvida, toda origem da moral, a
partir do momento em que ela não é venerável – e a Herkunft nunca – é critica – o
corpo - e tudo o que diz respeito a corpo, a alimentação, o clima, o solo – é o lugar da
Herkunft. Sobre o corpo se encontra o estigma dos acontecimentos passados do
mesmo modo que dele nascem os desejos, os desfalecimentos e os erros, nele
também eles se desatam, entram em luta, se apegam uns aos outros e continuam seu
inseparável conflito.
 A genealogia, como análise da proveniência está, portanto no ponto de articulação do
corpo com a história. Ela deve mostrar o corpo inteiramente marcado da história
arruinando o corpo.

IV
 Entestehung: designa de preferencia a emergência, o ponto de surgimento. É o
principio e a lei singular de um aparecimento. Do mesmo modo se tenta muito
frequentemente procurar a proveniência em uma continuidade sem interrupção,
também seria errado dar conta da emergência pelo termo final.
 Em certo sentido, a peça representada nesse teatro sem lugar é sempre a mesma;
é aquela que repete indefinidamente os dominadores e os dominados. Homens
dominam outros homens e é assim que nasce a diferença dos valores: classes
dominam classes e é assim que nasce a ideia de liberdade, homens se apoderam
de coisas das quais eles tem necessidade para viver, eles lhe impõem uma duração
que elas no tem, ou eles as assimilam pela forca – e é o nascimento da logica.
 A humanidade não progride lentamente, de combate em combate, até uma
reciprocidade universal em que as regras substituam para sempre a guerra, ela
instala uma de suas violências em um sistema de regras, e prossegue assim de
dominação em dominação.
 Em si mesmos as regras são vazias, violentas, não finalizadas, elas são feitas para
servir s isto ou aquilo, elas poder ser burladas ao sabor da vontade de uns ou de
outros. O grande jogo da história será de quem se apoderar das regras, de quem
tomar o lugar daqueles que as utilizam, de quem se disfarçar para pervertê-las,
utilizá-las ao inverso e volta-las contra aqueles que as tinham imposto; de quem,
se introduzindo no aparelho complexo, o fizer funcionar de tal modo que os
dominadores encontrar-se-ão dominados por suas próprias regras.
 A genealogia dever ser a sua história; história das morais, das ideias, dos conceitos
metafísicos, história do conceito de liberdade ou de vida ascética, como
emergências de interpretações diferentes. Trata-se de fazê-las aparecer como
acontecimentos no teatro dos procedimentos.

V
 A genealogia é designada por vezes como “Wirkliche Historie”, em várias ocasiões ela
é caracterizada pelo “espirito” ou “sentido” histórico. De fato, a que Nietzsche não
parou de criticar desde a segunda parte das Considerações Extemporâneas é essa
forma histórica que reintroduz (e supõe sempre) o ponto de vista supra-histórico; uma
história que teria por função recolher em uma totalidade bem fechada sobre si mesmo
a diversidade, enfim reduzida, do tempo; uma história que nos permitiria
reconhecermos em toda a parte e dar a todos os deslocamentos passados a forma da
reconciliação; uma história que lançaria sobre o que esta atrás dela, um olhar de fim
do mundo.
 Essa história dos historiadores constrói um ponto de apoio fora do tempo; ela
pretende tudo julgar segundo uma objetividade apocalíptica; mas é ela que supôs uma
verdade eterna, uma alma que não morre uma consciência sempre idêntica a si
mesma.
 A história “efetiva” se distingue daquela dos historiadores pelo fato de que ela não se
apoia em nenhuma constância: nada no homem – nem mesmo em seu corpo – é
bastante fixo para compreender outros homens e se reconhecer neles.
 A história será “efetiva” na medida em que ela reintroduzir o descontínuo em nosso
próprio ser. Ela dividira nossos sentimentos; dramatizara nossos instintos; multiplicará
nosso corpo e a oporá a si mesmo.
 A história “efetiva” faz ressurgir o acontecimento no que ele pode ter de único e
agudo. É preciso entender por acontecimento não uma decisão, um tratado, um reino,
ou uma batalha, mas uma relação de forcas que se inverte, um poder confiscado, um
vocabulário retomado e voltado contra os seus utilizadores, uma dominação que se
enfraquece, se distende, se envenena e uma outra que faz entrada, mascarada.
 Mas o verdadeiro sentido histórico reconhece que nós vivemos sem referencias ou
sem coordenadas originarias, em miríades de acontecimentos perdidos.
 A história “efetiva”, em contrapartida lança seus olhares ao que está próximo: o corpo,
sistema nervoso, os alimentos e a digestão, as energias, ela perscruta as decadências;
e afronta outras épocas e é com a suspeita - não rancorosa – mas alegre - de uma
agitação bárbara e inconfessável.
 A história “efetiva” olha para o mais próximo, mas para dele se separar bruscamente e
se apoderar a distancia (olhar semelhante ao do medico que mergulha para o
diagnóstico e dizer a diferença).
 A história tem mais a fazer do que ser serva da Filosofia e do que narrar o nascimento
necessário da verdade e do valo; ela tem que ser o conhecimento diferencial das
energias e desfalecimentos, das alturas e desmoronamentos, dos venenos e
contravenenos. Ela tem que ser a ciência dos remédios.
 Finalmente, a última característica desta história “efetiva”: ela não teme um saber
perspectivo. Os historiadores procuram, na medida do possível, apagar o que pode
revelar, em seu saber, o lugar de onde eles olham o momento em que eles estão o
partido que eles tomam – o incontrolável de sua posição.

VI
 O demagogo é levado a negação do corpo, para melhor estabelecer a soberania da
ideia intemporal; o historiador é levado a aniquilamento de sua própria
individualidade para que os outros entrem em cena e possam tomar a palavras.
Ele terá, portanto que se obstinar contra si mesmo, calar suas preferencias e
superar o nojo, embaralhar sua própria perspectiva para lhe substituir uma
geometria ficticiamente universal, imitar a morte para entrar no reino dos mortos,
adquirir uma quase existência sem roso e sem nome.
 A objetividade do historiador é a interversão das relações do querer no saber e ao
mesmo tempo a crença necessária na providência, nas causas finais e na teologia.
 O sentido histórico comporta res usos que se opõem, palavra por palavra, as três
modalidades platônicas da História. Um é o uso paródico e destruidor da realidade
de que se opõe ao tema histórico-reminiscência, reconhecimento, o outro é uso
dissociativo e destruidor da identidade que se opõe a história-conhecimento. De
qualquer modo de se trata de fazer da história um uso que a liberte para sempre
do modelo, ao mesmo tempo, metafisico e antropológico da memoria. Trata-se de
fazer da história uma contra-memória e de desdobrar consequentemente toda
uma outra forma do tempo.

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