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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – UESPI

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS - CCSA


CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO
DIREITO PENAL I
PROF.ª: LYA RACHEL BRANDÃO E MENDES PINHEIRO

RESUMO DE DIREITO PENAL I

UNIDADE I – Introdução

Introdução ao Direito Penal

1. Conceito de Direito Penal


2. Características
3. Princípios Limitadores do Poder Estatal

___________________________________________________________________________

INTRODUÇÃO AO DIREITO PENAL

1. CONCEITO DE DIREITO PENAL

Direito Penal é o ramo do direito público que define as infrações penais, estabelecendo as penas e
as medidas de segurança aplicáveis aos infratores. É o conjunto de normas e disposições jurídicas que
regulam o exercício do poder sancionador e preventivo do Estado.

Distingue-se, ainda, o Direito Penal em DP Objetivo e DP Subjetivo.

- Direito Penal Objetivo é o conjunto de normas editadas pelo Estado, definindo crimes e
contravenções, isto é, impondo ou proibindo determinadas condutas sob a ameaça de sanção ou
medida de segurança, bem como outras que cuidem de questões de natureza penal (exclusão de
crime, isenção de pena ...)
- Direito Penal Subjetivo é a possibilidade que tem o Estado de criar e fazer cumprir suas normas,
executando as decisões condenatórias proferidas pelo Poder Judiciário. É o próprio jus puniendi. É o
poder-dever que o Estado tem de exercer seu direito de punir caso as normas por ele editadas venham
a ser descumpridas.

2. CARACTERÍSTICAS

São características da lei penal:


- Exclusividade: somente a norma penal define crimes e comina penas (princípio da legalidade).
- Imperatividade: a norma penal é imposta a todos, independentemente da sua vontade. Assim,
praticada uma infração penal, o Estado, obrigatoriamente, deverá buscar a aplicação da pena.
- Generalidade: a norma penal vale para todos (erga omnes).
- Impessoalidade: a norma penal é abstrata, sendo elaborada para punir acontecimentos futuros e
não para punir pessoa determinada.

3. PRINCÍPIOS LIMITADORES DO PODER ESTATAL

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3.1 PRINCÍPIO DA INTERVENÇÃO MÍNIMA

O Direito Penal somente deve intervir nos casos de ataques muito graves aos bens jurídicos mais
importantes. As perturbações mais leves do ordenamento jurídico são objeto de outros ramos do
Direito.

A interferência do Direito Penal só se dará quando os demais ramos do Direito se mostrarem,


comprovadamente, incapazes de proteger aqueles bens relevantes na vida do indivíduo e da própria
sociedade.

3.2 PRINCÍPIO DA LESIVIDADE

Juntamente com o Princípio da Intervenção Mínima limita de uma forma mais rigorosa o poder do
legislador, indicando quais são as condutas que poderão ser incriminadas pela lei penal, orientando
quais as condutas que afetem gravemente a direitos de terceiros.

As quatro principais funções do princípio da lesividade são:


a) proibir a incriminação de uma atitude interna – ninguém pode ser punido por aquilo que pensa
ou mesmo por seus pensamentos pessoais.
b) proibir a incriminação de uma conduta que não exceda o âmbito do próprio do autor – o DP não
poderá punir aquelas condutas que não sejam lesivas a bens de terceiros, pois que não excedem ao
âmbito do próprio autor (autolesão / tentativa de suicídio).
c) proibir a incriminação simples de estados ou condições existenciais – impede que o agente seja
punido pelo o que ele é e não pelo o que fez.
d) proibir a incriminação de condutas desviadas que não afetem qualquer bem jurídico

3.3 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

Apesar de uma conduta se subsumir ao modelo legal não será considerada típica se for
socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se estiver de acordo com a ordem social da vida
historicamente condicionada.

3.4 PRINCÍPIO DA FRAGMENTARIDADE

O Direito Penal só deve intervir quando houver ofensa a bens fundamentais para a subsistência
do corpo social.

A norma penal exerce uma função suplementar da proteção jurídica em geral, só valendo a
imposição de suas sanções quando os demais ramos do direito não mais se mostrem eficazes na
defesa dos bens jurídicos, sendo a pena (sanção) o último recurso para a proteção do bem jurídico

3.5 PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Tem por finalidade auxiliar o intérprete quando da análise do tipo penal, para fazer excluir do
âmbito da incidência da lei aquelas infrações consideradas como “bagatela”

O Direito Penal, por sua natureza fragmentária, só vai aonde seja necessário para a proteção do
bem jurídico.

3.6 PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

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Ocorre com a seleção feita pelo legislador, quando escolhe as condutas positivas ou negativas,
que atacam nossos bens mais importantes. Feita a seleção, o legislador valora as condutas,
cominando-lhes penas que variam de acordo com a importância do bem a ser tutelado.

Os condenados serão classificados segundo os seus antecedentes e personalidade para orientar


a individualização da execução penal

Art. 5º, CF c/c art. 59, CP.

3.7 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Para não ser um ato de violência contra o cidadão, a pena deve ser, de modo essencial, pública,
pronta, necessária, a menor das penas aplicável nas circunstâncias referidas, proporcional ao delito e
determinada pela lei. (Marquês de Beccaria – 1764)

O princípio da proporcionalidade exige que se faça um juízo de ponderação sobre a relação


existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato) e o bem que pode
alguém ser privado (gravidade da pena).

O princípio da proporcionalidade rechaça o estabelecimento de cominações legais


(proporcionalidade em abstrato) e a imposição de penas (proporcionalidade em concreto) que careçam
de relação valorativa com o fato cometido considerado em seu significado global.

Possui duplo destinatário: o legislador e o juiz.

3.8 PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PESSOAL

“Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a


decretação do perdimento dos bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles
executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido” (art. 5º, XLV, CF)

Somente o condenado irá se submeter à sanção imposta pelo Estado.

“Nunca se pode interpretar uma lei penal no sentido de que a pena transcenda da pessoa que é
autora ou partícipe do delito. A pena é uma medida de caráter estritamente pessoal, haja vista ser uma
ingerência ressocializadora sobre o condenado”. (Zaffaroni)

3.9 PRINCÍPIO DA LIMITAÇÃO DAS PENAS

Art. 5º, XLVII – Não haverá penas:


a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados; (não exclui a volitividade)
d) de banimento;
e) cruéis. (que desconsidere o homem como pessoa – tortura)

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_________________________________________________________________

UNIDADE I – Introdução

Norma Penal

1. Norma Penal
2. Fontes
3. Interpretação
4.Integração da Lei Penal
5. A Lei no Tempo e no Espaço
6. Princípio da Legalidade
7. Conflito Aparente de Normas
8. Princípio da Especialidade
9. Princípio da Subsidiariedade
10. Princípio da Consunção
___________________________________________________________________

1. NORMA PENAL

Normas Penais são aquelas cuja execução é garantida por uma sanção externa e
institucionalizada. (Norberto Bobbio)

A proibição e o mandamento que vêm inseridos na lei, são reconhecidos como normas penais.

A norma jurídico-penal tem a natureza imperativa e endereça-se a todos os cidadãos


genericamente considerados, através de mandados ou proibições, implícita e previamente formulados,
visto que a lei penal não contém ordem direta, mas sim vedação indireta, na qual se descreve o
comportamento humano pressuposto da conseqüência jurídica.

1.1 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS PENAIS

I – NORMAS PENAIS INCRIMINADORAS


- Reservam-se à função de definir as infrações penais, proibindo ou impondo condutas, sob a
ameaça de pena. É a norma penal por excelência, sendo considerada normas penais em sentido
estrito.

II – NORMAS PENAIS NÃO INCRIMINADORAS


- tornam lícitas determinadas condutas;
- afastam a culpabilidade do agente, erigindo causas de isenção de pena;
- esclarecem determinados conceitos;
- fornecem princípios gerais para a aplicação da lei penal.

As normas penais não incriminadoras, subdividem-se em:

A) PERMISSIVAS
- permissivas justificantes: quando têm por finalidade afastar a ilicitude (antijuridicidade) da
conduta do agente (arts. 23 a 25, CP)
- permissivas exculpantes: destinam-se a eliminar a culpabilidade, isentando o agente de pena
(arts. 26, caput, e 28, §1º, CP)

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B) EXPLICATIVAS – visam esclarecer ou explicitar conceitos (arts. 150, §4º e 327, CP)

C) COMPLEMENTARES – fornecem princípios gerais para a aplicação da lei penal (art. 59, CP)

1.2 PRECEITOS DA NORMA PENAL INCRIMINADORA

I – Preceito Primário
- É o encarregado de fazer a descrição detalhada e perfeita da conduta que se procura proibir ou
impor.

II – Preceito Secundário
- cabe a tarefa de individualizar a pena, cominando-a em abstrato.

- Aquele que praticar a conduta descrita no preceito primário, terá como consequência a
aplicação da pena também nele prevista.

1.3 NORMAS PENAIS EM BRANCO

São aquelas em que há uma necessidade de complementação para que se possa compreender o
âmbito de aplicação de seu preceito primário.
Assim, embora haja uma descrição da conduta proibida, essa descrição requer, obrigatoriamente,
um complemento extraído de outro diploma para que possam ser entendidos os limites da proibição ou
da imposição feitos pela lei penal, uma vez que, sem esse complemento, torna-se impossível sua
aplicação.

Ex.: art. 237, CP / art. 16, Lei 6368/76.

2. FONTES DA NORMA PENAL

2.1 CONCEITO
Fonte é o lugar de onde provém o direito.

2.2 ESPÉCIES

a) Material, de produção ou substancial


- Refere-se ao órgão incumbido de sua elaboração.
- A União é a única fonte de produção de DP no Brasil.

b) Formal, de cognição ou de conhecimento


refere-se ao modo pelo qual o DP se exterioriza.

2.3 ESPÉCIES DE FONTE FORMAL

a) Imediata – lei

b) Formal – costumes e princípios gerais de direito


- COSTUME: conjunto de normas de comportamento a que as pessoas obedecem de maneira
uniforme e constante, pela convicção de sua obrigação;
- PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO: tratam-se de princípios que se fundam em premissas éticas
extraídas do material legislativo.

Os costumes podem ser de três espécies:

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- Contra Legem – inaplicabilidade da norma jurídica em face do desuso, da inobservância
constante e uniforme da lei;
- Secundum Legem – traça regras sobre a aplicação da lei penal;
- Praeter Legem – preenche lacunas e especifica o conteúdo da norma.

O costume não cria delitos, não os revoga e nem comina penas (princípio da reserva legal ou da
legalidade)

3. INTERPRETAÇÃO DA LEI PENAL

3.1 CONCEITO
- É a atividade que consiste em extrair da norma penal seu exato alcance e real significação

3.2 NATUREZA
- A interpretação deve buscar a vontade da lei, desconsiderando a de quem a fez. A lei terminada
independe de seu passado, importando apenas o que está contido em seus preceitos.

3.3 ESPÉCIES
I - Quanto ao SUJEITO que a elabora
a) Autêntica ou Legislativa: feita pelo próprio órgão encarregado da elaboração do texto. Pode ser:
contextual, quando feita dentro do próprio texto interpretado (art. 327, CP), ou posterior, quando a lei
interpretadora entra em vigor depois da interpretada.

OBS.: A norma interpretativa tem efeito ex tunc uma vez que apenas esclarece o sentido da lei.

b) Doutrinária ou Científica: feita por estudiosos e cultores do Direito.

OBS.: A Exposição de Motivos é interpretação doutrinária e não autêntica, uma vez que não é lei.

c) Judicial: feita pelos órgãos jurisdicionais (não tem força obrigatória)

II – Quanto aos MEIOS empregados


a) Gramatical, literal ou sintática: leva-se em conta o sentido literal das palavras.
b) Lógica ou Teleológica: busca-se a vontade da lei, atendendo-se aos seus fins e à sua posição
dentro do ordenamento jurídico.

III – Quanto ao RESULTADO


a) Declarativa: há perfeita correspondência entre a palavra da lei e a sua vontade.
b) Restritiva: quando a letra escrita da lei foi além da sua vontade (a lei disse mais do que queria
e, por isso, a interpretação vai restringir o seu significado).
c) Extensiva: quando a letra escrita da lei ficou aquém da sua vontade (a lei disse menos do que
queria e, por isso, a interpretação vai ampliar o seu significado).

3.4 O PRINCÍPIO “IN DUBIO PRO REO”

- Esgotada a atividade interpretativa sem que se tenha conseguido extrair o sentido da norma, a
solução será dar a interpretação mais favorável ao acusado.

3.5 INTERPRETAÇÃO PROGRESSIVA, ADAPTATIVA OU EVOLUTIVA

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É aquela que, ao longo do tempo, vai adaptando-se às mudanças político-sociais e às
necessidades do momento.

4. INTEGRAÇÃO DA LEI PENAL

4.1 ANALOGIA
Consiste em aplicar-se a uma hipótese não regulada por lei disposição relativa a um caso
semelhante. Na analogia, o fato não é regido por qualquer norma e, por essa razão, aplica-se uma de
caso análogo.
No Direito Penal, não se admite o uso da analogia para reger condutas não tipificadas na lei penal,
uma vez que não se pode ferir o princípio da reserva legal.

EXCEÇÃO: É possível o uso da analogia quando a situação não envolver norma incriminadora.

Ex.: O art. 128, II, CP, dispõe que o aborto praticado por médico não é punido “se a gravidez
resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu
representante legal”.
Nesse caso, como não se trata de norma incriminadora, mas PERMISSIVA, é possível estender o
benefício, analogicamente, à gravidez resultante de atentado violento ao pudor.

4.2 DISTINÇÃO ENTRE ANALOGIA, INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA E INTERPRETAÇÃO


ANALÓGICA

- ANALOGIA: na analogia não há norma reguladora para a hipótese;


- INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA: existe uma norma regulando a hipótese, de modo que não se
aplica a norma do caso análogo; contudo, tal norma não menciona expressamente essa eficácia,
devendo o intérprete ampliar seu significado além do que estiver expresso.

- INTERPRETAÇÃO ANALÓGICA: após uma seqüência casuística, segue-se uma formulação

genérica, que deve ser interpretada de acordo com os casos anteriormente elencados.

4.3 ESPÉCIES DE ANALOGIA


- Legal ou “legis”: o caso é regido por uma norma reguladora de hipótese semelhante;

- Jurídica ou “juris”: a hipótese é regulada por princípio extraído do ordenamento jurídico em seu

conjunto;
- “In bonam partem”: a analogia é empregada em benefício do agente;

- “In malam partem”: a analogia é empregada em malefício do agente.

5. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Art. 1.º, CP - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação
legal. (nullum crimen, nulla poena sine praevia lege.)

5.1 ASPECTOS DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

I. ASPECTO POLÍTICO
Trata-se de garantia constitucional fundamental do homem.
Protege o cidadão contra toda e qualquer invasão arbitrária do Estado em seu direito fundamental
de liberdade.

II. ASPECTO JURÍDICO


- Somente haverá crime quando existir perfeita correspondência entre a conduta praticada e a
previsão legal; dessa forma, só haverá crime nas hipóteses taxativamente previstas.
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- As medidas de segurança, apesar do seu caráter essencialmente preventivo, também estão
sujeitas ao princípio da legalidade.

5.2 PRINCÍPIOS INERENTES AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

a) PRINCÍPIO DA RESERVA LEGAL: somente a lei, em seu sentido mais estrito, pode definir
crimes e cominar penas.

- RESERVA ABSOLUTA DA LEI: nenhuma outra fonte “subalterna” pode gerar a norma penal. A
matéria penal compete estritamente ao Poder Legislativo.

OBS.: A Medida Provisória, apesar de ter força de lei, não é lei e, segundo a maioria dos
doutrinadores, não pode dispor sobre matéria penal, sob pena de ofender o Princípio da Separação dos
Poderes com a invasão do Poder Executivo na esfera de competência do Poder Legislativo.

Entretanto, autores há que defendem a possibilidade de uma MP dispor sobre matéria penal
desde que sua vigência fique submetida à condição suspensiva de sua conversão em lei pelo
Congresso Nacional. Assim, tão logo deixem de existir como ato normativo do Poder Executivo, terão
plena eficácia na esfera criminal.

- TAXATIVIDADE E VEDAÇÃO AO EMPREGO DA ANALOGIA: a lei penal deve ser precisa, uma
vez que um fato só será considerado criminoso se houver perfeita correspondência entre ele e a norma
que o descreve. Não se admite que o tratamento punitivo adotado para uma ação específica possa ser
estendido para uma conduta que se mostre aproximada ou assemelhada.

O princípio da legalidade, estatui que não há crime sem lei anterior que o defina. Dessa forma,
exige que a lei determine (descreva) a conduta delituosa em todos os seus elementos e circunstâncias,
a fim de que somente no caso de integral correspondência pudesse o agente ser punido.

- TAXATIVIDADE E DESCRIÇÃO GENÉRICA: a reserva legal impõe também que a descrição da


conduta criminosa seja detalhada e específica, não se coadunando com tipos genéricos,
demasiadamente abrangentes.

Deve-se evitar expressões vagas e de sentido equívoco, capazes de alcançar qualquer


comportamento humano e, por conseguinte, aptas a promover a mais completa subversão no sistema
de garantias da legalidade.

Ex.: qualquer conduta contrária aos interesses nacionais; qualquer vilipêndio à honra alheia.

Distinção entre analogia e descrição genérica.

6. CONFLITO APARENTE DE NORMAS

Configura-se o conflito aparente de normas quando existe uma pluralidade de normas regulando
um mesmo fato criminoso, sendo que, na realidade, apenas uma delas é aplicável.

Para que exista o conflito aparente são necessários os seguintes elementos:


a) pluralidade de normas;
b) unicidade ou unidade de fatos;
c) aparente aplicação de todas as normas ao fato;
d) efetiva aplicação de apenas uma norma.

6.1 PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE


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De acordo com o Princípio da Especialidade se, no caso concreto, houver duas normas
aparentemente aplicáveis e uma delas puder ser considerada como especial em relação à outra, deve o
julgador aplicar esta norma especial (lex specialis derrogat generali).

Considera-se norma especial aquela que possui todos os elementos da lei geral e mais
alguns, denominados “especializantes”.

Ex.: Homicídio e Infanticídio.

Para se avaliar a especialidade de uma norma em relação à outra, basta compará-las


abstratamente, sem que seja necessário avaliar-se o caso concreto. Basta uma leitura dos tipos penais,
para se saber qual deles é especial.

6.2 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE


Em havendo duas normas aplicáveis ao caso concreto, se uma delas puder ser considerada
subsidiária em relação à outra, aplica-se a norma principal, denominada primária, em detrimento da
norma subsidiária (lex primaria derrogat subsidiariae).

Ao contrário da especialidade, a subsidiariedade não pode ser avaliada abstratamente. O


intérprete deve analisar o caso concreto e verificar se, em relação a ele, a norma é ou não subsidiária.

A norma subsidiária é menos ampla que a norma primária. Dessa forma, primeiro se deve
tentar encaixar o fato na norma primária, e não sendo possível, encaixa-lo na norma subsidiária.

Norma subsidiária é aquela que descreve um grau menor de violação de um bem jurídico, ficando
absorvida pela lei primária, que descreve um grau mais avançado dessa violação.

Ex.: estupro e constrangimento ilegal.

6.3 PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO


A relação de consunção ocorre quando um fato definido como crime atua como fase de
preparação ou de execução, ou ainda, como exaurimento de outro crime mais grave, ficando, portanto,
absorvido por este.

Difere da subsidiariedade, pois nesta enfocam-se as normas (uma é mais ou menos ampla que a
outra), enquanto que na consunção enfocam-se os fatos, ou seja, o agente efetivamente infringe duas
normas penais, mas uma deve ficar absorvida pela outra.

Hipóteses em que se aplica o princípio da consunção:


a) Crime Progressividade: ocorre o crime progressivo quando o agente, desejando desde o ínicio
a produção de um resultado mais grave, mediante diversos atos, realiza sucessivas e crescentes
violação ao bem jurídico. Nessa hipótese, o agente responderá apenas pelo resultado final e mais grave
obtido, ficando absorvidos os atos anteriores.

Ex.: para cometer o homicídio, o agente precisa passar pela lesão corporal. Nesse caso, só
responde pelo resultado final (homicídio) que era o resultado por ele pretendido desde o início.

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UNIDADE II – APLICAÇÃO DA LEI PENAL (12h/a)


1. Princípios Reguladores do Direito Penal
1.1 Princípio da Legalidade (art. 1.º)
1.2 Retroatividade da Lei Mais Benéfica (art. 2.º)
1.3 Lei Excepcional ou Temporária (art. 3.º)
1.4 Tempo do Crime (art. 4.º)
1.5 Lugar do Crime (art. 6º)
1.6 Territorialidade (art. 5.º)
1.7 Extraterritorialidade (art. 7.º)
1.8 Pena Cumprida no Estrangeiro (art. 9.º)
1.9 Contagem de Prazo (art. 10)
1.10 Frações Não Computáveis da Pena (art. 11)
1.11 Legislação Especial (art. 12)
_______________________________________________________________________

UNIDADE II – APLICAÇÃO DA LEI PENAL (12h/a)

1. Princípios Reguladores do Direito Penal

I. RETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA (ART. 2.º)

- Art. 2.º:Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando
em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.
- Parágrafo único: A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos
anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

- A lei penal (art. 5.º, XL, CF / art. 2.º, CP) é irretroativa; a lei penal que beneficia o agente é
retroativa, excepcionando a regra acima.

OBS.:
- O princípio de que a lei não pode retroagir, salvo para beneficiar o acusado, restringe-se às
normas de caráter penal.
- A lei processual não se submete ao princípio da retroatividade em benefício do agente. Nos
termos do art. 2.º do CPP, a norma de caráter processual terá incidência imediata a todos os processos
em andamento, pouco importando se o crime foi cometido antes ou após sua entrada em vigor ou se a
inovação é ou não mais benéfica.
- Importa apenas que a norma esteja em andamento, caso em que a regra terá aplicação, ainda
que o crime lhe seja anterior e a situação do acusado, agravada.
- Por norma processual entende-se aquela cujos efeitos repercutem diretamente sobre o
processo, não tendo relação com o direito de punir do Estado (ex.: liberdade provisória – exigências e
conveniências do próprio processo)
- Será de caráter penal toda norma que criar, ampliar, reduzir ou extinguir a pretensão punitiva
estatal, tornando mais intensa ou branda sua satisfação.
- Assim, normas que criam novos tipos penais incriminadores ou ampliam o rol das causas
extintivas da punibilidade têm conteúdo nitidamente penal; e a lei que proíbe a liberdade provisória ou
transforma uma infração em inafiançável, certamente, possui caráter restritivo da liberdade – em razão
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do processo -, sem causar aumento correspondente no direito de punir do Estado, sendo puramente
norma processual.

- No caso de normas penais híbridas, onde uma parte da norma é processual e a outra é
nitidamente penal (art. 366, CPP), não será possível “dividir” a aplicação da norma em duas partes.
Assim, deverá prevalecer o caráter penal, para fins de retroatividade em benefício do agente.

- HIPÓTESES DE LEI POSTERIOR

a) “Abolitio Criminis”: lei posterior deixa de considerar um fato como criminoso, revogando
o tipo penal incriminador. Como o comportamento deixou de constituir infração penal, o Estado perde a
pretensão de impor ao agente qualquer pena, operando-se, aqui, a extinção da punibilidade (art. 107, II,
CP). Como conseqüência, cessarão todos os efeitos penais, principais e secundários. Os efeitos
extrapenais, entretanto, subsistem (art. 2.º, CP), cessando, apenas, os efeitos penais da condenação.
b) “Novatio Legis in Mellius”: é a lei posterior que, de algum modo, traz um benefício para o
agente. Nesse caso, bem como no anterior, a norma penal retroage e aplica-se imediatamente aos
processos em julgamento, aos crimes cuja perseguição não se iniciou e, também, aos casos já
encerrados por decisão transitada em julgado.
c) “Novatio Legis in Pejus”: é a lei posterior que, de qualquer modo, venha a agravar a
situação do agente no caso concreto.
d) “Novatio Legis” Incriminadora: é a lei posterior que cria um tipo incriminador, tornando
típica conduta considerada irrelevante penal pela lei anterior.

- COMBINAÇÃO DE LEIS

A maioria dos autores entende não ser possível a combinação de leis ou a divisão de uma norma
para aplicar somente a parte mais benéfica, sob o argumento de que o juiz estaria invadindo a esfera de
competência do legislador, criando uma nova lei (imposição de sursis sem condições – lei anterior, ou a
pena de multa).

- “LEX MITIOR” E O PERÍODO DA “VACATIO LEGIS”

Durante a vacatio legis, a lei ainda não começou a propagar seus efeitos, logo, não pode ter
eficácia imediata, nem retroativa, até porque é possível a sua revogação antes mesmo de entrar em
vigor (art. 263, da Lei 8069/90, revogado pela Lei dos Crimes Hediondos). Por essa razão, não haverá
aplicação retroativa até a entrada em vigor da lei.

II. LEI EXCEPCIONAL OU TEMPORÁRIA (ART. 3.º)

- Art. 3.º: A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou
cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

a) LEI EXCEPCIONAL: é a feita para vigorar em períodos anormais, como guerras,


calamidades etc. Sua duração coincide com a do período incomum.
b) LEI TEMPORÁRIA: é feita para vigorar em um período de tempo previamente fixado pelo
legislador. Traz em seu bojo a data de cessação de sua vigência. É uma lei que desde sua entrada em
vigor tem data marcada para sair do ordenamento jurídico.

- São leis ultra-ativas, pois regulam os fatos ocorridos durante sua vigência, mesmo após sua
revogação. Assim, mesmo que a lei posterior, vigente à época do julgamento do fato, seja mais
benéfica, não retroagirá.

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- São leis de curta duração que perderiam toda a sua força intimidativa se não tivessem a
ultra-atividade.

- Somente será admitida a retroatividade de lei mais benéfica posterior a uma lei excepcional ou
temporária se aquela fizer expressa menção ao período anormal ou ao tempo de vigência, passando a
regular o fato praticado sob a égide das leis ultra-ativas.

III. TEMPO DO CRIME

- Art. 4.º: Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o
momento do resultado.

TEORIAS SOBRE O MOMENTO DO CRIME


a) Atividade: O crime considera-se praticado no momento da conduta comissiva ou omissiva;
b) Resultado: O crime é praticado no momento da produção do resultado;
c) Ubiqüidade ou Mista: O crime considera-se praticado no momento da conduta e no
momento do resultado.

TEORIA ADOTADA PELO CÓDIGO PENAL


- O CP adotou a teoria da Atividade. Como conseqüência principal, a imputabilidade do agente
deve ser aferida no momento em que o crime é praticado, pouco importando a data em que o resultado
venha a ocorrer.

OBS.: Em matéria de prescrição, o CP adotou a teoria do resultado. O lapso prescricional


começa a ocorrer a partir da consumação, e não do dia em que se deu a ação delituosa (art. 111, I, CP)

IV. LUGAR DO CRIME

- Art. 6.º: Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou
em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir o resultado.

- O CP adotou a Teoria da Ubiqüidade, segundo a qual o lugar do crime é tanto o da conduta


quanto o do resultado. Deve-se observar que os meros atos preparatórios não constituem objeto de
cogitação para determinar o lócus delicti, pois não são típicos.

- Outras teorias foram levantadas a respeito do local do crime


a) Teoria da Atividade: lugar do crime é o da ação ou omissão, sendo irrelevante o local da
produção do resultado;
b) Teoria do Resultado: lugar do crime é aquele em que foi produzido o resultado, sendo
irrelevante o local da conduta;

- Já o CPP, ao contrário, adotou como regra para a fixação da competência a que estabelece ser
competente o foro (comarca) no qual o crime se consumou (art. 70,CPP) - Teoria do Resultado.

V. TERRITORIALIDADE DA LEI PENAL

- Art. 5.º: Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito
internacional, ao crime cometido no território nacional.
(...)

a) Princípio da Territorialidade: a lei penal só tem aplicação no território do Estado que a editou,
pouco importando a nacionalidade do sujeito ativo ou passivo.
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b) Princípio da Territorialidade Absoluta: só a lei penal brasileira é aplicável aos crimes cometidos
no território nacional.
c) Princípio da Territorialidade Temperada: a lei penal brasileira aplica-se, em regra, ao crime
cometido no território nacional. Excepcionalmente, porém, a lei estrangeira é aplicável a delitos
cometidos total ou parcialmente em território nacional, quando assim determinarem tratados e
convenções internacionais.

- A lei penal brasileira adotou o princípio da Territorialidade Temperada. Assim, aplica-se o DP


brasileiro nos crimes cometidos no território nacional, de modo que, todos os que aqui estiverem,
brasileiros, estrangeiros ou apátridas, residente ou em trânsito pelo Brasil, serão submetidos à nossa
legislação por fatos criminosos aqui praticados.

- Exceção: No caso de normas de direito internacional (tratados, convenções e regras) dispuserem


em sentido contrário.

- Território Nacional:
a) aspecto material: compreende o espaço delimitado por fronteiras geográficas (abrange o
solo e o subsolo, sem solução de continuidade e com limites reconhecidos, as águas interiores, o mar
territorial, a plataforma continental e o espaço aéreo).
b) aspecto jurídico: abrange todo o espaço em que o Estado exerce sua soberania.

- O art. 5.º, §1.º, do CP considerou, para efeitos penais, como extensão do território nacional, as
embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer
que se encontrem, bem como as aeronaves e embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade
privada, que se acharem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar.

- Assim, onde não houver soberania de qualquer país (alto-mar e espaço aéreo) se ocorrer uma
infração penal a bordo de aeronave ou embarcação mercante ou de propriedade privada, de bandeira
nacional, será aplicada a legislação brasileira.

- O art. 5.º, §2.º, CP determinou também a aplicação da lei brasileira aos crimes praticados a
bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em
pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar
territorial do Brasil.

- Componentes do Território

a) Solo ocupado pela corporação política;


b) Rios, lagos, mares interiores, golfos, baías e portos;
c) Mar territorial: faixa de mar exterior ao longo da costa, que se estende por 12 milhas de
largura, medidas a partir da baixa-mar do litoral continental e insular brasileiro (Lei n.º 8.617/93). Aqui, o
Brasil exerce sua soberania plena (exceção: direito de passagem inocente);
d) Zona contígua: faixa que se estende das 12 às 24 milhas marítimas, na qual o Brasil
poderá tomar medidas de fiscalização, a fim de evitar ou reprimir infrações às leis e regulamentos
aduaneiros, fiscais, de imigração ou sanitários, no seu território ou mar territorial (não é território
nacional).
e) Zona econômica exclusiva: faixa que se estende das 12 às 200 milhas marítimas, contadas
da mesma base que serve ao mar territorial, onde o Brasil tem direitos de soberania para fins de
exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos, das
águas sobrejacentes ao leito do mar, deste e seu subsolo, e ainda no que se refere a outras atividades
visando à exploração e aproveitamento da zona para finalidade econômica (não é território nacional).
f) Espaço aéreo: parte integrante do território nacional, possuindo o Brasil exclusiva soberania
sobre ele, inclusive por imperativos de segurança nacional Lei n.º 7.565/86);
13
g) Espaço cósmico: o espaço cósmico poderá ser explorado e utilizado livremente por todos
os Estados, em condições de igualdade e sem discriminação, não sendo objeto de apropriação nacional
por proclamação de soberania, por uso ou ocupação, nem por qualquer outro meio.
h) Navios e aeronaves: quando públicos consideram-se extensão do território nacional;
quando privados, também, desde que estejam em mar territorial brasileiro, alto-mar ou no espaço aéreo
correspondente.

VI. EXTRATERRITORIALIDADE DA LEI PENAL BRASILEIRA

- É a possibilidade de aplicação da lei penal brasileira a fatos criminosos ocorridos no exterior.

- Princípios Norteadores
a) Princípio da Nacionalidade Ativa: aplica-se a lei nacional do autor do crime, qualquer que
tenha sido o local da infração;
b) Princípio da Nacionalidade Passiva: aplica-se a lei no nacional do autor do crime quando
este for praticado contra bem jurídico de seu próprio Estado ou contra pessoa de sua nacionalidade.
c) Princípio da Defesa Real: prevalece a lei referente à nacionalidade do bem jurídico lesado,
qualquer que tenha sido o local da infração ou a nacionalidade do autor do delito (princípio da
proteção);
d) Princípio da Justiça Universal: todo Estado tem direito de punir qualquer crime, seja qual
for a nacionalidade do agente ou da vítima e o local da infração, desde que o sujeito ativo esteja dentro
de seu território;
e) Princípio da Representação: a lei nacional é aplicável aos crimes cometidos no estrangeiro
em aeronaves e embarcações privadas, desde que não julgados no local do crime.

- Observando-se o art. 7.º, CP, percebe-se que:


- no art. 7.º, I, a, b, c e d, foi adotado o princípio da defesa real;
- no art. 7.º, II, a, foi adotado o princípio da justiça universal;
- no art. 7.º, II, b, foi adotado o princípio da nacionalidade ativa;
- no art. 7.º, II, c, foi adotado o princípio da representação;
- no art. 7.º, § 3.º, foi adotado o princípio da defesa real;

VII. PENA CUMPRIDA NO ESTRANGEIRO

- Art. 8.º: A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime,
quando diversas (as penas) ou nela computada, quando idênticas.

VIII. EFICÁCIA DE SENTENÇA ESTRANGEIRA

- A homologação de sentença estrangeira no Brasil compete ao STF e somente será possível


quando a aplicação da lei brasileira produzir os mesmos efeitos da lei estrangeira (vide arts. 787 a 790,
CPP).

- A homologação depende:
a) de pedido da parte interessada, na hipótese de reparação de danos
b) para outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade
judiciária emanou a sentença, ou na falta de tratado, de requisição do Min. Da Justiça.

IX. CONTAGEM DE PRAZO (art. 10, CP)

X. FRAÇÕES NÃO COMPUTÁVEIS DA PENA (art. 11, CP)

XI. LEGISLAÇÃO ESPECIAL (art. 12, CP)


14
- Segundo o art. 12 do CP, as regras da Parte Geral do CP aplicam-se aos fatos incriminados por

lei especial, se esta não dispuser de modo contrário (aplicação subsidiária da parte geral do CP).

UNIDADE III – Do Crime


1. Do Fato Típico
1.1 A Ação
1.2 Teorias Sobre a Ação
1.2.1 A Conduta da Teoria Clássica
1.2.2 A Conduta na Teoria Finalista
1.2.3 Teoria Social da Ação
1.2.4 Outros Aspectos da Conduta
1.3 Tipos Penais Dolosos, Culposos e Preterdolosos
2. Do Sujeito e Objeto do Delito
1.1 Sujeito Ativo e Passivo
1.2 Objeto do Crime: Jurídico e Material
2. A Relação de Causalidade
2.1 Nexo Causal e Nexo Normativo
2.2 A Superveniência Concausal
2.3 Espécies de Causa
2.3.1 Causa Absolutamente Independente
2.3.2 Causa Relativamente Independente
2.3.3 Omissão como Causa do Resultado

DO CRIME

1. CONCEITOS DE CRIME

1.1 CONCEITO FORMAL


- São definições que alcançam apenas um dos aspectos do fenômeno criminal – a contradição do
fato a uma norma de Direito, sua ilegalidade como fato contrário à norma penal.

- Crime é o fato humano contrário à lei.


- Crime é qualquer ação legalmente punível.
- Crime é toda ação ou omissão proibida pela lei sob a ameaça de pena.
- Crime é uma conduta (ação ou omissão) contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena.

1.2 CONCEITO MATERIAL


- Indaga sobre a razão que levou o legislador a prever a punição dos autores de certos fatos e não
de outros, como também conhecer o critério utilizado para distinguir os ilícitos penais de outras
condutas lesivas.

- A melhor orientação para a obtenção de um conceito material de crime é aquela que tem em
vista o bem protegido pela lei penal. Para que o Estado possa manter a ordem, a harmonia e o
equilíbrio social, a paz interna, segurança e a estabilidade coletiva deve, inicialmente valorar os bens ou

15
interesses individuais ou coletivos, protegendo através da lei penal aqueles que são mais atingidos
quando da transgressão do ordenamento jurídico.

- Crime é a conduta humana que lesa ou expõe a perigo um bem jurídico protegido pela lei penal.
- Crime é a ação ou omissão que, a juízo do legislador contrasta violentamente com valores ou
interesses do corpo social, de modo a exigir seja proibida sob a ameaça de pena, ou que se considere
afastável somente através de sanção penal.
- Crime é qualquer fato do homem, lesivo de um interesse, que possa comprometer as condições
de existência, de conservação e de desenvolvimento da sociedade.

1.3 CONCEITO ANALÍTICO


- Busca estabelecer os elementos estruturais do crime, sob um prisma jurídico.
- Crime é todo fato típico, antijurídico e culpável.
- Crime é todo fato humano típico e ilícito, em que a culpabilidade é o pressuposto da pena e a
periculosidade é o pressuposto da medida de segurança.

1.4 DIFERENÇA ENTRE CRIME E CONTRAVENÇÃO


- Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer
isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa.
- Contravenção (ou “delito-anão”) é a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de
prisão simples ou multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.

DO FATO TÍPICO

1. CONCEITO

- É o fato material que se amolda perfeitamente aos elementos constantes do modelo previsto na
lei penal.

- Fato material é aquele que existe independentemente de se enquadrar ou não ao modelo


descritivo legal. A tipicidade é, portanto, irrelevante para a existência do fato material.

2. ELEMENTOS

16
a) conduta dolosa ou culposa;
b) resultado;
c) nexo causal;
d) tipicidade.

2.1 CONDUTA

- É a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a uma finalidade.


- O pensamento enquanto não exteriorizado não representa nada para o Direito Penal. Assim,
somente quando a vontade se liberta é que a conduta se exterioriza no mundo concreto e perceptível,
por meio de um comportamento positivo, a ação (um fazer), ou de uma inatividade (um não fazer o que
era preciso).
- Entretanto, somente quando a conduta for motivada por uma vontade terá relevância para o
Direito Penal (exclui-se o caso fortuito, a força maior, nem os atos derivados de puro reflexo ou de
coação física).
- Ao DP só interessam as condutas que poderiam ter sido evitadas, por essa razão, onde não
houver vontade, não existirá conduta perante o ordenamento jurídico repressivo.

- Conduta penalmente relevante é toda ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dolosa
ou culposa, voltada a uma finalidade, típica ou não, mas que produz ou tenta produzir um resultado
previsto na lei penal como crime.

2.1.1 TEORIAS SOBRE A CONDUTA

a) TEORIA CAUSALISTA – para a teoria causalista ou clássica, a conduta é um comportamento


humano voluntário no mundo exterior, que consiste em fazer ou não-fazer. É um processo mecânico,
muscular e voluntário em que se prescinde do fim a que essa vontade se dirige. Basta que se tenha a
certeza de que o agente atuou voluntariamente, sendo irrelevante o que queria, para se afirmar que
praticou ação típica.
Aqui, aprecia-se o comportamento sem qualquer indagação a respeito de sua ilicitude ou de sua
culpabilidade; consideram que a ação é a manifestação da vontade sem conteúdo finalístico.
A análise do dolo e da culpa fica para um momento posterior, na aferição da culpabilidade. Em
suma, conduta é toda ação que provoca um resultado, independentemente de se questionar a
finalidade do agente.
Por isso, considerando que a conduta integra o fato típico, é possível que se conclua que este (o
fato típico) existe, ainda que o sujeito não tenha agido com dolo ou com culpa.

b) TEORIA FINALISTA – para a teoria finalista da ação é preciso que se busque, ao lado do
evento produzido, a finalidade perseguida pelo agente, ou seja, qual a intenção do sujeito. Dependendo
do elemento subjetivo do agente, de sua finalidade, a qualificação jurídica do crime muda
completamente (dolo, culpa, preterdolo), e não se pode, à vista disso, desconhecer que a finalidade, o
dolo e a culpa estão na própria conduta.
Assim, a finalidade passa a ser elemento inseparável da conduta, e sem exame da vontade
finalística não se sabe se o fato é típico ou não. Conclui-se que não existe conduta típica sem vontade e
finalidade e que não é possível separar-se o dolo e a culpa da conduta típica, como se fossem
elementos distintos. Não existe conduta relevante para o DP se não for animada pela vontade humana.

c) TEORIA SOCIAL - para essa teoria, a ação é conduta socialmente relevante, dominada ou
dominável pela vontade humana. Conduta socialmente relevante é aquela socialmente danosa, porque
atinge o meio em que as pessoas vivem. Por esse motivo, se, embora objetiva e subjetivamente típico,
um comportamento não afronta o sentimento de justiça, o senso de normalidade, ou de adequação
social do povo, não se pode considerá-lo relevante para o DP.
17
2.1.2 CARACTERÍSTICAS E ELEMENTOS DA CONDUTA
- Conduta é a ação ou omissão humana consciente e dirigida a uma determinada finalidade.

CARACTERÍSTICAS:
a) É um comportamento humano, não estando incluídos os fatos naturais (raio, chuva,
terremoto), os do mundo animal e os atos praticados pelas pessoas jurídicas.
b) Necessidade de uma repercussão externa da vontade do agente. O querer e o pensar
humanos não preenchem as características da ação enquanto não se tenha a manifestação exterior
dessa vontade. Não constituem conduta o simples pensamento, a cogitação, o planejamento intelectual
da prática de um crime.

ELEMENTOS:
a) vontade (não constituem conduta os atos em que não intervém a vontade);
b) finalidade ;
c) exteriorização;
d) consciência.

OBS.: Ato voluntário não implica que a vontade seja livre, que seja querido o resultado. O
ato é voluntário quando existe uma decisão por parte do agente, quando não é um simples
resultado mecânico. A conduta é voluntária ainda quando a decisão do agente não tenha sido
tomada livremente, ou quando este a tome motivado por coação ou por circunstâncias
extraordinárias, uma vez que isso se resolve no campo da culpabilidade e não no da conduta,
pois em ambas as situações a conduta sempre existirá.
- não constituem condutas os atos em que não intervém a vontade (coação física
irresistível) e movimento ou abstenção de movimento em casos de sonho, sonambulismo,
hipnose, embriaguez completa, desmaio e outros estados de inconsciência.

2.1.3 FORMAS DA CONDUTA


a) Comissão: ação, movimento corpóreo, um fazer, um comportamento ativo.

b) Omissão: abstenção de movimento; não fazer alguma coisa que é devida. O fundamento
de todo comportamento omissivo constitui-se em uma ação esperada e na não-realização de um
comportamento exigido do sujeito.

- Enquanto as condutas comissivas desatendem a preceitos proibitivos (a norma mandava não


fazer e o agente fez), as condutas omissivas desatendem mandamentos imperativos (a norma mandava
fazer e o agente não fez, se omitiu).

2.1.4. DA CONDUTA OMISSIVA


a) Crimes omissivos próprios: inexiste o dever jurídico de agir. Assim, o omitente só praticará
crime se houver tipo incriminador descrevendo a omissão como infração (art. 135 e 269, CP e art. 304
da Lei n.º 9.503/97).
b) Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão: o agente tinha o dever jurídico de
agir, ou seja, não fez o que deveria ter feito. Há uma norma dizendo o que ele deveria fazer, passando a
omissão a ter relevância causal. Neste caso o omitente não responde só pela omissão como simples
conduta, mas pelo resultado produzido, salvo se este não lhe puder ser atribuído por dolo ou culpa.
c) Participação por omissão: ocorre quando o omitente, tendo o dever jurídico de evitar o
resultado, concorre para ele ao permanecer inerte. Neste caso responderá como partícipe. Entretanto,
quando não existe o dever de agir não se fala em participação por omissão, mas em conivência (crime
silenti) ou participação negativa, hipótese em que o omitente não responde pelo resultado, mas por sua
mera omissão (art. 135, CP).

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2.1.5. REQUISITOS DA OMISSÃO
a) conhecimento da situação típica;
b) consciência, por parte do omitente, de seu poder de ação para a execução da ação omitida
(dolo da omissão);
c) possibilidade real e física de levar a efeito a ação exigida.

2.1.6 CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR


a) Caso Fortuito: é aquilo que se mostra imprevisível, quando não inevitável (incêndio
provocado por cigarro que é derrubado pelo vento, carro que se desgoverna pela quebra da barra de
direção...)
b) Força Maior: trata-se de um evento externo ao agente tornando inevitável o acontecimento
(coação física).

2.2 RESULTADO

É a modificação do mundo exterior provocado pelo comportamento humano voluntário.

Teoria Naturalística: resultado é a modificação provocada no mundo exterior pela conduta (perda
patrimonial no furto; conjunção carnal no estupro; a morte no homicídio; a ofensa à integridade corporal
nas lesões etc.). Entretanto, nem todos os crimes possuem resultados naturalísticos, uma vez que há
infrações penais que não produzem qualquer alteração no mundo natural. De acordo com esse
resultado as infrações classificam-se em crimes materiais, formais e de mera conduta.
- Crime material: é aquele cuja consumação só ocorre com a produção do resultado naturalístico,
como o homicídio, que só se consuma com a morte;
- Crime formal: é o que se consuma independentemente da produção do resultado naturalístico,
como a extorsão mediante seqüestro, que se exaure com a exigência de resgate, sendo irrelevante seu
recebimento;
- Crime de mera conduta: é aquele que não admite em hipótese alguma resultado naturalístico,
como a desobediência, que não produz nenhuma alteração no mundo concreto.

OBS.: no crime formal, o resultado naturalístico é irrelevante, embora possível ; no mera conduta,
não existe tal possibilidade.

Teoria Jurídica ou Normativa: resultado é toda lesão ou ameaça de lesão a um interesse


penalmente relevante. Todo crime tem resultado jurídico porque sempre agride a um bem jurídico
tutelado. Quando não houver resultado jurídico não existe crime. Assim, o homicídio atinge o bem vida;
o furto e o estelionato, o patrimônio etc.

Existem crimes, entretanto, em que não existe tal modificação no mundo exterior (injúria oral, ato
obsceno, violação de domicílio...). Nesses casos, devemos entender o resultado como lesão ou perigo
de lesão de um interesse juridicamente protegido pela norma penal.

O resultado pode ser físico (dano), fisiológico (lesão, morte) ou psicológico (temor da ameaça,
sentimento do ofendido na injúria...).

2.3 RELAÇÃO DE CAUSALIDADE

Para haver fato típico é ainda necessário que exista relação de causalidade entre a conduta e o
resultado.

Nexo causal é o elo de ligação concreto, físico, material e natural que se estabelece entre a
conduta do agente e o resultado naturalístico, por meio do qual é possível dizer se aquela deu ou não
causa a este.
19
Nexo normativo: para a existência do fato típico, no entanto, não basta a mera configuração do
nexo causal. É insuficiente para tanto aferir apenas a existência de um elo físico entre a ação e o
resultado.
De acordo com a interpretação do art. 19 do CP, é imprescindível que o agente tenha concorrido
com dolo ou culpa (quando admitida), uma vez que sem um ou outro não haveria fato típico.

Assim, para a existência do fato típico são necessários: o nexo causal físico ou concreto e o nexo
normativo, que depende da verificação do dolo e da culpa.

O nosso CP adota como teoria para apontar o nexo causal a Teoria da Equivalência dos
Antecedentes, também conhecida como conditio sine qua non.

Segundo esta teoria, causa é toda ação ou omissão anterior que contribui para a produção do
resultado (art. 13, caput). Tudo o que concorre para isso deve ser considerado sua causa. Todas as
causas são igualmente contributivas para a produção do resultado.

Ex.: se o fabricante da arma não a tivesse fabricado, não haveria o crime; se os pais do agente
não o tivessem gerado, não teria acontecido o crime...

Dessa forma, para saber se algo é causa do resultado basta excluí-lo da série causal, se o delito,
ainda assim, teria ocorrido, não é causa; se teria ocorrido, então é causa.

Assim, para que se possa reconhecer se a condição é causa do resultado, utiliza-se o processo
hipotético de eliminação, segundo o qual causa é todo antecedente que não pode ser suprimido in
mente sem afetar o resultado (ex.: se a vítima se fere na fuga quando procura fugir da agressão, há
relação de causalidade, pois se, hipoteticamente, se suprimisse a agressão, a vítima não fugiria e,
portanto, não sofreria lesão.

Entretanto, somente serão punidos pelo crime aqueles que tenham agido com dolo ou culpa em
relação à provocação específica de certo resultado. Por isso, é óbvio que nos exemplos supracitados o
fabricante da arma e os pais não respondem por homicídio, pois não agiram com dolo e culpa na
produção do resultado.

Observe-se que a simples dúvida a respeito da existência do nexo de causalidade impede a


responsabilização do agente pelo resultado.

O CP manteve a disposição em que se afirma que a omissão também é causa do resultado. Não
há, contudo, nexo causal entre a omissão e o resultado, uma vez que de nada, nada surge. O omitente
responde pelo resultado não porque o causou, mas porque não agiu para impedi-lo, realizando a
conduta a que estava obrigado.

2.3.1. CAUSA SUPERVENIENTE

- Causa: é toda condição que atua paralelamente à conduta, interferindo no processo causal.
Assim, qualquer conduta que, de algum modo, ainda que minimamente, tiver contribuído para a eclosão
do resultado deve ser considerada sua causa. Dessa forma, aplicando-se o critério da eliminação
hipotética, se, desaparecido um fato, o resultado deste também desaparecer, aquele deverá ser
considerado como causa deste.

- Concausas: são as causas distintas da conduta principal, que atuam ao seu lado, contribuindo
para a produção do resultado. Podem ser anteriores, concomitantes ou supervenientes à ação e
concorrem com esta para a produção do resultado.
20
2.3.2 ESPÉCIES DE CAUSAS

a) Causa dependente: é aquela que, originando-se da conduta, insere-se na linha normal de


desdobramento causal da conduta. (homicídio – atirar – perfuração do órgão vital – lesão – hemorragia
aguda interna – parada cardíaca – morte). Há uma relação de interdependência entre os fenômenos, de
modo que sem o anterior não haveria o posterior, e assim por diante.

- A causa dependente contém dois fatores: I) origina-se da conduta, sem a qual não existiria; II)
atua com absoluta dependência da causa anterior, da qual resulta como conseqüência natural e
esperada.
- A causa dependente, por óbvio, não exclui o nexo causal, ao contrário, integra-o como parte
fundamental, de modo que a conduta estará indissoluvelmente ligada ao resultado naturalístico.

b) Causa independente: é aquela que refoge ao desdobramento causal da conduta,


produzindo por si só o resultado. Seu surgimento não é uma decorrência esperada, lógica, natural do
fato anterior, mas, ao contrário, um fenômeno totalmente inusitado, imprevisível (ex.: morte por parada
cardíaca causada por um simples susto).

- As causas independentes possuem ainda duas subespécies:


I) Causa absolutamente independente – não se origina da conduta e comporta-se como se por si
só tivesse produzido o resultado, não sendo uma decorrência normal e esperada. Não tem nenhuma
relação com a conduta, tendo origem diversa desta.
II) Causa relativamente independente – origina-se da conduta e comporta-se como se por si
só tivesse produzido o resultado, não sendo uma decorrência normal e esperada (não se situa dentro
da linha de desdobramento causal da conduta). Tem relação com a conduta apenas porque dela se
originou, mas é independente, uma vez que atua como se por si só tivesse produzido o resultado.

2.3.3. ESPÉCIES DE CAUSAS ABSOLUTAMENTE INDEPENDENTES

a) Preexistentes: existem antes de a conduta ser praticada a atuam independentemente de


seu cometimento, de maneira que com ou sem a ação o resultado ocorreria do mesmo jeito. Exemplo:
genro atira em sua sogra, mas ela não morre em conseqüência dos tiros, e sim de um envenenamento
anterior provocado por sua nora, por ocasião do café matinal.
b) Concomitantes: não tem qualquer relação com a conduta e produzem o resultado
independentemente desta, no entanto, por coincidência, atuam exatamente no instante em que a ação
é realizada. Exemplo: no exato momento em que o genro está inoculando veneno letal na artéria de sua
sogra, dois assaltantes entram na residência e efetuam disparos contra a velhinha, matando-a
instantaneamente.
c) Supervenientes: atuam após a conduta. Exemplo: após o genro ter envenenado sua
sogra, antes de o veneno produzir efeito, um maníaco invade a casa e mata a adorada senhora a
facadas.

2.3.4. CONSEQÜÊNCIAS DAS CAUSAS ABSOLUTAMENTE INDEPENDENTES

- Rompem totalmente o nexo causal, e o agente só responde pelos atos até então praticados. Em
nenhum dos três casos o genro deu causa à morte de sua sogra, logo se não a provocou, não pode ser
responsabilizado por homicídio consumado. Responderá apenas por tentativa de homicídio, com a
qualificadora do veneno ou não, conforme a hipótese.
21
2.3.5. ESPÉCIES DE CAUSAS RELATIVAMENTE INDEPENDENTES

a) Preexistentes: atuam antes da conduta. Exemplo: genro desfere um golpe de faca em sua
sogra, que é hemofílica e vem a morrer em face da conduta, somada à contribuição de seu peculiar
estado fisiológico. No caso o golpe isolado seria insuficiente para produzir o resultado letal, de modo
que a hemofilia atuou de forma independente, produzindo por si só o resultado. Entretanto, o processo
patológico só foi detonado a partir da conduta, razão pela qual sua independência é apenas relativa.
Como se trata de causa que já existia antes da agressão, denomina-se preexistente.
b) Concomitantes: Genro atira em sua sogra, que, assustada, sofre um ataque cardíaco e
morre. O tiro provocou o susto e, indiretamente, a morte. A causa do óbito foi a parada cardíaca e não a
hemorragia traumática provocada pelo disparo. Trata-se de causa que por si só produziu o resultado
(independente), mas que se originou a partir da conduta (relativamente), tendo atuado ao mesmo tempo
desta (concomitante).
c) Superveniente: sogra, baleada por seu genro é levada ao hospital e sofre acidente no
trajeto, vindo a falecer. A causa é independente, porque a morte foi provocada pelo acidente e não pelo
atentado, mas essa independência é relativa, já que, se não fosse o ataque, a vítima não estaria na
ambulância acidentada e não morreria.

- O CP adotou para os casos de causa superveniente relativamente independente a Teoria da


Condicionalidade Adequada, onde, por opção do legislador, rompe-se o nexo de causalidade, pois, a
conduta, isoladamente, não teria idoneidade para produzir o resultado. Entretanto, esta teoria só se
aplica aos casos de causa superveniente relativamente independente; nos demais casos (causas
anteriores e concomitantes) fica mantido o nexo causal, aplicando-se a regra geral da equivalência dos
antecedentes.

2.3.6. CONSEQÜÊNCIA DAS CAUSAS RELATIVAMENTE INDEPENDENTES

- No caso das causas preexistentes e concomitantes, como existe nexo causal, o agente
responderá pelo resultado, a menos que não tenha concorrido para ele com dolo ou culpa.
- Na hipótese de causa superveniente, embora exista nexo físico-naturalístico, a lei, por expressa
disposição do art. 13, §1.º, que excepcionou a regra geral, manda desconsiderá-lo, não respondendo o
agente jamais pelo resultado, mas tão-somente por tentativa (teoria da condicionalidade adequada).

2.4. TIPICIDADE

- Tipo é um molde criado pela lei, em que está descrito o crime com todos os seus elementos, de
modo que as pessoas sabem que só cometeram algum delito se vierem a realizar uma conduta idêntica
à constante do modelo legal.

- Tipicidade é a correspondência exata, a adequação perfeita entre o fato natural, concreto e a


descrição contida na lei. É a subsunção, justaposição, enquadramento, amoldamento ou integral
correspondência de uma conduta praticada no mundo real ao modelo descrito constante da lei (tipo
legal).

- Para que a conduta humana seja considerada crime, é necessário que se ajuste a um tipo legal.
Temos, pois, de um lado, uma conduta da vida real e, de outro, o tipo legal de crime constante da lei
penal. A tipicidade consiste na correspondência entre ambos.

- Como o tipo penal é composto não só de elementos objetivos, mas também de elementos
normativos e subjetivos, é indispensável para a existência da tipicidade que não só o fato,
objetivamente considerado, mas também sua antijuridicidade e os elementos subjetivos se subsumam a
22
ele. Ex.: matar alguém (elem. objetivo); violação de segredo profissional – sem justa causa (elem.
normativo); rapto – fim libidinoso (elem. subjetivo). Só existe fato típico quando o fato natural estiver
também preenchido pelo tipo subjetivo.

2.4.1. FUNÇÕES DO TIPO PENAL: garantia – já que aperfeiçoa e sustenta o princípio da


legalidade. Indicar a antijuridicidade do fato – dizer que o fato é contrário ao ordenamento jurídico. A
tipicidade é o indício da antijuridicidade do fato. Praticado um fato típico, presume-se também a sua
antijuridicidade, presunção que somente cessa diante da existência de alguma causa que a exclua.

2.4.2. ESPÉCIES DE TIPO QUANTO AOS ELEMENTOS

a) Tipo normal: só contém elementos objetivos (descritivos);


b) Tipo anormal: além dos elementos objetivos, contém elementos subjtivos e normativos.

2.4.3. TIPO FUNDAMENTAL E TIPOS DERIVADOS

a) Tipo fundamental ou básico: é o que nos oferece a imagem mais simples de uma espécie de
delito. É o tipo que se localiza no caput de um artigo e contém os elementos essenciais do crime, sem
os quais este desaparece (atipicidade absoluta) ou se transforma em outro (atipicidade relativa).

Exemplo: São elementos constitutivos no delito de homicídio:


I – sujeito ativo (pessoa humana);
II – conduta ( ação ou omissão);
III – dolo (voluntariedade consciente da ação);
IV – sujeito passivo (pessoa humana);
V – resultado (evento morte)
VI – nexo de causalidade.

- Se retirarmos qualquer destes elementos, o delito de homicídio desaparece.

b) Tipos derivados: são os que se formam a partir do tipo fundamental, mediante o destaque de
circunstâncias que o agravam ou atenuam. Se a agravação consistir em um dos novos limites abstratos
de pena, como no caso do art. 121, §2.º, do CP, em que a pena passa a ser de 12 a 30 anos, tem-se o
tipo qualificado; se consistir em um aumento em determinado percentual, como 1/3, ½ ou 2/3, ocorre a
chamada causa de aumento (art. 155, §1.º); no caso da atenuação, surge o tipo privilegiado (art. 121,
§1.º). Nesses tipos encontram-se os componentes secundários do tipo, que não constituem sua
essência. Localizam-se nos parágrafos dos tipos fundamentais.

As causas de aumento e diminuição são totalmente dependentes e vinculadas, aplicando-se todas


as regras incidentes sobre o delito básico previsto no caput.

As qualificadoras têm certa autonomia do tipo fundamental – tipos derivados autônomos – sendo
previstos, para eles, novos limites abstratos de pena, fazendo com que se apareçam tipos
independentes, ao qual não se aplicam os dispositivos regradores do caput. Exemplo: furto qualificado,
que não se beneficia do privilégio previsto no §2.º, do art. 155, aplicável somente ao tipo fundamental
do furto (art.155).

2.4.4. ELEMENTOS DO TIPO

a) Objetivos: referem-se ao aspecto material do fato. Existem concretamente no mundo dos


fatos e só precisam ser descritos pela norma. São elementos objetivos: o objeto do crime, o lugar, o
tempo, os meios empregados, o núcleo do tipo (verbo) etc.

23
b) Normativo: seu significado prescinde de um juízo de valoração jurídica, social, cultural,
histórica, política, religiosa, bem como de qualquer outro campo do conhecimento humano (ex.: “sem
justa causa”, “”indevidamente”, “mulher honesta”, “documento”, “dignidade”, “decoro”,
“fraudulentamente” etc.).
c) Subjetivo: pertencem ao campo psíquico-espiritual e ao mundo da representação do autor.
Encontram-se, antes de tudo, nos denominados “delitos de intenção”, em que uma representação
especial do resultado ou do fim deve ser acrescentada à ação típica executiva como tendência íntima
transcedente (ex.: intenção de enriquecimento do estelionatário, a intenção de se apropriar do ladrão...).
No elemento subjetivo do tipo, o legislador destaca uma parte do dolo e a insere expressamente no tipo
penal. Essa parte é a finalidade essencial, a qual pode ou não estar presente na intenção do autor.
Quando o tipo incriminador contiver elemento subjetivo, será necessário que o agente além de realizar
o núcleo da conduta (o verbo), tenha também a finalidade especial descrita explicitamente no modelo
legal (art. 219).

2.4.5. ADEQUAÇÃO TÍPICA

- É o enquadramento da conduta no tipo legal. Não existe utilidade em diferenciar tipicidade de


adequação típica. Aquela é conseqüência desta, e ambas dependem da correspondência objetiva entre
fato e tipo e da ocorrência de dolo ou culpa.

- Adequação Típica de Subordinação Imediata: ocorre quando há uma correspondência integral,


direta e perfeita entre conduta e tipo legal;
- Adequação Típica de Subordinação Mediata: ocorre quando, cotejados o tipo e a conduta, não
se verifica entre eles perfeita correspondência, sendo necessário o recurso a uma outra norma que
promova a extensão do tipo até alcançar a conduta (não existe correspondência entre fato humano
doloso ou culposo e qualquer descrição contida em um tipo incriminador).

2.4.6. TIPICIDADE CONGLOBANTE

- Teoria que inclui tipicidade e ilicitude na mesma fase, como elementos fundidos. O fato para ser
típico também deve ser ilícito, ou seja, a ilicitude integra o tipo penal como um de seus elementos.
- Assim, se o fato corresponder ao que está descrito no tipo (tipicidade legal), mas não for ilícito,
não haverá juízo de tipicidade (tipicidade penal), pois o tipo não pode proibir o que o direito ordena. O
fato jurídico exige a antijuridicidade como seu requisito.

- Tipicidade legal: ocorre quando o fato corresponde a uma descrição típica;


- Tipicidade penal: tipicidade legal + ilicitude da conduta.

- Um fato somente será típico se presente a tipicidade penal.

- Tipo Total do Injusto: teoria segundo a qual as causas de exclusão da ilicitude são elementos
negativos do tipo, fazendo com que, por exemplo, o tipo de homicídio ficasse assim: matar alguém +
não estando em legítima defesa, estado de necessidade etc. Quem age em legítima defesa pratica um
fato atípico, pois lhe falta a ilicitude, que é um dos elementos da tipicidade.

3. SUJEITOS DO CRIME

3.1. SUJEITO ATIVO

- É aquele que pratica a conduta descrita na lei, ou seja, o fato típico.

- Só o homem, isoladamente, ou associado a outros (co-autoria ou participação) pode ser sujeito


ativo do crime, pois somente este é capaz de executar ações com consciência do fim. Assim, lastreia-se
24
o DP na voluntariedade da conduta humana, na capacidade do homem para um querer final. Desse
modo, o âmbito da normatividade jurídico-penal limita-se às atividades finais humanas.

- A capacidade para praticar crimes existe em todos os homens. Capaz em sentido jurídico é toda
pessoa natural, independentemente de sua idade ou do seu estado psíquico, portanto também os
menores e os doentes mentais.

3.1.1. CAPACIDADE PENAL DO SUJEITO ATIVO

- Capacidade penal é o conjunto das condições exigidas para que um sujeito possa tornar-se
titular de direitos ou obrigações no campo penal.

- Deve-se distinguir capacidade penal (que se verifica inclusive em momentos anteriores ou


posteriores ao crime) e imputabilidade (contemporânea do delito). Um imputável, nos termos do art. 26
do CP, pode não ter capacidade penal se passar a sofrer de doença mental após o delito (art. 41).

- A incapacidade penal ocorre quando se faz referência aos mortos, aos entes inanimados e aos
animais, que podem ser apenas objeto ou instrumentos do crime.

- A pessoa jurídica, que antes não podia ser sujeito ativo de crimes, possui hoje capacidade penal.
Isto implica dizer que ela poderá responder penalmente por crimes que porventura venha a praticar.

- Instituiu-se essa possibilidade, prevendo que a lei estabeleça a responsabilidade da pessoa


jurídica, sem prejuízo daquela dos dirigentes, para sujeitá-la às punições compatíveis com sua natureza
“nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular” (art. 173,
§5.º) e nas “condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente” (art. 225, §3.º).

- Entre as penas compatíveis com a natureza da pessoa jurídica estão, na previsão constitucional,
a perda de bens, a multa, e a suspensão ou interdição de direitos (como a do exercício de atividades
financeiras, comerciais, industriais etc.), podendo outras penas serem criadas por lei.

3.1.2. CAPACIDADE ESPECIAL DO SUJEITO ATIVO

- A maioria dos crimes pode ser praticada por qualquer pessoa, bastando para isso a capacidade
geral. Para alguns delitos, entretanto, é necessária a existência de uma capacidade especial, ou seja,
uma certa posição jurídica (funcionário público – 312, médico – 269) ou posição de fato (gestante – 124,
mãe da vítima – 123).

- Nesses casos, os sujeitos ativos são chamados pessoas qualificadas, não se podendo falar em
peculato quando não é autor, co-autor ou partícipe funcionário público.

- Essa distinção dá origem às espécies de crimes próprios ou especiais e de delitos de


mão-própria ou de atuação pessoal. Às vezes, a qualidade do sujeito ativo constitui: qualificadora do
delito (ascendente, descendente, cônjuge da vítima – 148, §1.º, I / 227, §1.º); causa especial de
aumento da pena (133, §3.º,II / 168, parag. un., I,II,III); causa especial de diminuição da pena (primário
– 155, §2.º e 170); normas permissivas de exclusão de crime ou isenção da pena
(médico-aborto-estupro, 128,II; 142, II; 142, III. 181).

3.2 SUJEITO PASSIVO

- É o titular do bem jurídico lesado ou ameaçado de lesão. É o homem, protegido pela lei mesmo
antes de seu nascimento, já que punido o aborto. A pessoa jurídica também pode ser sujeito passivo de
crimes, como no caso dos delitos patrimoniais.
25
- Há duas espécies de sujeito passivo: sujeito passivo formal ou constante – o Estado, que sendo
titular do mandamento proibitivo, é lesado pela conduta do sujeito ativo; sujeito passivo eventual – titular
do interesse penalmente protegido (homem, pessoa jurídica, Estado – crimes contra a AP, e uma
coletividade destituída de personalidade jurídica – arts. 209, 210).

3.2.1. CASOS ESPECIAIS

- Incapaz: recém-nascido (123); menor em idade escolar (246)


- Pessoa jurídica: crimes contra o patrimônio, difamação cometida através da imprensa.
- Estado: crimes contra a AP (312 em diante).
- Coletividade (incolumidade pública, sentimento religioso, respeito aos mortos) – crimes vagos.
- Mortos e animais não são sujeitos passivos.
- Diferença entre vítima e prejudicado.

4. OBJETOS DO CRIME

4.1. OBJETO JURÍDICO

- Objeto jurídico é tudo aquilo contra o que se dirige a conduta criminosa. É o bem-interesse
protegido pela lei penal.

- Bem é tudo aquilo que satisfaz a uma necessidade humana, inclusive as de natureza moral,
espiritual etc. Interesse é o valor que tem o bem para seu titular.

4.2. OBJETO MATERIAL

- Objeto material ou substancial do crime é a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta
criminosa, ou seja, aquilo que a ação delituosa atinge. Está ele direta ou indiretamente indicado na
figura penal.

- Há casos em que se confundem na mesma pessoa o sujeito passivo e o objeto do crime. Nas
lesões corporais a pessoa que sofre a ofensa à integridade corporal é, ao mesmo tempo, sujeito
passivo e objeto material do crime previsto no art. 129.

- Existem crimes sem objeto material (ato obsceno, falso testemunho...)

5. CRIME DOLOSO

- Três são as teorias que procuram estabelecer o conteúdo do dolo:

I. Vontade: age dolosamente quem pratica a ação consciente e voluntariamente. É necessário


para sua existência, portanto, a consciência da conduta e do resultado e que o agente a pratique
voluntariamente.
II. Representação: o dolo é a simples previsão do resultado. Embora não se negue a
existência da vontade na ação, o que importa para essa posição é a consciência de que a conduta
provocará o resultado.
III. Assentimento: faz parte do dolo a previsão do resultado a que o agente adere, não sendo
necessário que ele o queira. Para essa teoria existe dolo simplesmente quando o agente consente em
causar o resultado ao praticar a conduta.

- O Código Penal adotou a teoria da vontade quanto ao dolo direto e a teoria do assentimento
ao conceituar o dolo eventual.
26
- Ao se examinar a conduta, verifica-se que, segundo a Teoria Finalista, é ela um comportamento
voluntário (não reflexo) e que o conteúdo da vontade é o seu fim. Nessa concepção, a vontade é o
componente subjetivo da conduta, faz parte dela e dela é inseparável (ex.: A mata B – art. 121 – exige a
vontade).

- Toda ação consciente é dirigida pela consciência do que se quer e pela decisão de querer
realiza-la, ou seja, pela vontade. A vontade é querer alguma coisa e o dolo é a vontade dirigida à
realização do tipo penal.

- DOLO é a consciência e a vontade na realização da conduta típica, ou a vontade da ação


orientada para a realização do tipo.

- São elementos do dolo (também chamado de dolo natural):


a) Consciência: conhecimento do fato – que constitui a ação típica). Deve referir-se a todos
os elementos do tipo, prevendo ele o resultado causal;
b) Vontade: elemento volitivo para realizar este fato.

5.1. ESPÉCIES DE DOLO

a) Dolo Direto: refere-se ao agente que quer, deseja o resultado. O agente realiza a conduta
com o fim de obter o resultado;
b) Dolo Eventual: a vontade do agente não está dirigida para a obtenção do resultado; o que
ele quer é algo diverso, mas, prevendo que o evento possa ocorrer, assume assim mesmo o risco de
causá-lo. Essa possibilidade de ocorrência do resultado não o detém e ele pratica a conduta,
consentindo no resultado (ex. atirar em outrem para assustá-lo, causando-lhe a morte; praticar roleta
russa; praticar racha em via pública). Age também com dolo eventual quem na dúvida a respeito de um
dos elementos do tipo, arrisca-se em concretizá-lo (manter conjunção carnal com mulher tendo dúvidas
quanto à sua idade);
c) Dolo de Dano: intenção de causar efetiva lesão ao bem jurídico tutelado (ex.: homicídio,
furto);
d) Dolo de Perigo: intenção de expor a risco o bem jurídico tutelado (ex.: crime de periclitação
da vida e da saúde – 132; crime de rixa – 137);
e) Dolo Genérico: vontade de realizar a conduta descrita na lei, sem um fim especial.
f) Dolo Específico: vontade de realizar a conduta, visando um fim especial. Ocorre quando o tipo
exige determinada finalidade (ex.: extorsão mediante seqüestro – 159)
g) Dolo Geral: ocorre quando o agente, supondo já ter alcançado o resultado por ele visado,
pratica nova ação que efetivamente o provoca. (ex.: efetuar disparos contra vítima e, supondo já estar
ela morta, atirar o corpo ao mar, provocando sua morte).

6. CRIME CULPOSO

- Quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia (art. 18, II,
CP).

- Age com culpa quem realiza o fato legalmente descrito por inobservância do dever de cuidado
que lhe incumbe, de acordo com as circunstâncias e suas condições pessoais, e, no caso de
representá-lo como possível, se conduz na confiança de poder evitá-lo.

- Conduta voluntária (ação ou omissão) que produz o resultado antijurídico não querido, mas
previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, com a devida atenção (dever a todos imposto no
convívio social), ser evitado.
27
6.1. ELEMENTOS DA CULPA

a) Conduta: o que importa em um crime culposo não é a finalidade da conduta do agente,


mas o resultado que ela provoca e o desvalor da conduta a que ele deu causa. O que importa não é o
fim do agente, mas o modo e a forma imprópria como ele atua no caso concreto;
b) Dever de Cuidado Objetivo: para saber se houve ou não a inobservância desse cuidado
objetivo, deve-se confrontar a conduta do agente com a conduta que teria, nas mesmas condições, um
homem prudente e de discernimento (homem médio). A inobservância do cuidado objetivo pode se
manifestar de várias formas:
I. Imprudência: conduta positiva, ação. Tomar uma atitude com falta de cuidado, com afoiteza, sem
as cautelas necessárias (ex.: brincar com revólver municiado);
II. Negligência: conduta negativa, omissão (quando o caso impunha uma ação preventiva).
Há uma inércia psíquica, uma indiferença do agente, que, podendo tomar as cautelas exigíveis, não o
faz por “preguiça”. É a ausência de uma precaução que dá causa ao resultado (ex. dirigir veículo sem
freios ou com pneu careca);
III. Imperícia: incapacidade ou falta de conhecimentos técnicos no exercício de arte ou ofício.
A imperícia pressupõe sempre a qualidade ou habilitação legal para a arte ou ofício. Não havendo tal
habilitação para o desempenho da atividade, a culpa é imputada ao agente por imprudência ou
negligência.
c) Resultado: a mera inobservância do dever de cuidado não basta para caracterizar o crime
culposo. É necessária a ocorrência do resultado descrito na lei (e não desejado pelo agente). Só haverá
crime culposo se, da ação ou omissão contrária ao dever de cuidado, resultar lesão a um bem jurídico.
d) Previsibilidade: é a possibilidade de conhecimento do perigo que sua conduta gera para os
bens jurídicos alheios e também a possibilidade de prever o resultado, conforme as condições pessoais
do agente. Assim, para a punição do autor de crime culposo é necessário que se demonstre a
existência de previsibilidade objetiva e subjetiva.

6.2. ESPÉCIES DE CULPA

a) Culpa Consciente: o agente prevê o resultado mas espera que ele não ocorra, supondo
que possa evitá-lo com sua habilidade;
b) Culpa Inconsciente: o agente não prevê o resultado, que, era objetiva e subjetivamente
previsível;
c) Culpa Própria: o agente não quer e não assume o risco de produzir o resultado;
d) Culpa Imprópria: também chamada de culpa por extensão, assimilação ou equiparação. O
agente supõe estar acobertado por uma excludente de ilicitude e, em razão disso, provoca
intencionalmente um resultado ilícito. Apesar se a ação ser dolosa, o agente responde por crime
culposo na medida em que sua avaliação da situação fática foi equivocada.

6.3. GRAUS DE CULPA

6.4. COMPENSAÇÃO DE CULPAS

6.5. CONCORRÊNCIA DE CULPAS

28
7. CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES 

7.1. CRIMES INSTANTÂNEOS, PERMANENTES E INSTANTÂNEOS DE EFEITOS


PERMANENTES

- Essa classificação se refere à duração do momento consumativo.

a) Crime Instantâneo: é aquele cuja consumação ocorre em um só instante, sem continuidade


temporal. Ex.: no crime de estupro, o crime se consuma no instante em que é praticada a conjunção
carnal

b) Crime Permanente: é aquele cujo momento consumativo se prolonga no tempo por vontade do
agente. Ex.: seqüestro (art. 148, CP) – a consumação ocorre no momento em que a vítima é privada da
sua liberdade, mas a infração continua consumando-se enquanto a vítima permanecer em poder do
seqüestrador.

c) Crime Instantâneo de Efeitos Permanentes: é aquele cuja consumação se dá em determinado


instante, mas seus efeitos são irreversíveis. Ex.: homicídio.

7.2. CRIMES COMISSIVOS E OMISSIVOS

- Essa classificação diz respeito ao meio de execução empregado para a prática do crime.

a) Crime Comissivo: é aquele praticado através de uma ação.


b) Crime Omissivo: o agente deixa de fazer alguma coisa. Os crimes omissivos podem ser

I. Próprios (ou puros) – que se perfazem pela simples abstenção, independentemente de um


resultado posterior. Ex.: omissão de socorro (135, CP), que se aperfeiçoa pela simples ausência de
socorro.

II. Impróprios (ou comissivos por omissão) – quando o agente, por uma omissão inicial, dá causa a
um resultado posterior, que ele tinha o dever jurídico de evitar. Ex.:mãe que deixa de amamentar o filho,
causando-lhe a morte.

6.3. CRIMES MATERIAIS, FORMAIS E DE MERA CONDUTA

- Essa classificação se refere ao resultado do crime como condicionante de sua consumação.

a) Crimes Materiais: são aqueles em relação aos quais a lei descreve uma ação e um resultado, e
exige a ocorrência deste para que o crime esteja consumado. Ex.: estelionato (171, CP).

b) Crimes Formais: são aqueles em relação aos quais a lei descreve uma ação e um resultado,
mas a redação deixa claro que o crime consuma-se no momento da ação, sendo o resultado mero
exaurimento do delito. Ex.: extorsão mediante seqüestro (159, CP).

c) Crimes de Mera Conduta: são aqueles em relação aos quais a lei descreve apenas uma
conduta e, portanto, consumam-se no exato momento em que ela é praticada. Ex.: violação de domicílio
(150, CP) – mera conduta de ingressar ou permanecer em domicílio alheio sem a autorização do
morador.

29
7.4. CRIMES DE DANO E DE PERIGO

- Crimes de Dano: são aqueles que pressupõem uma efetiva lesão ao bem jurídico tutelado. Ex.:
homicídio, furto.

- Crimes de Perigo: são os que se consumam com a mera situação de risco a que fica exposto o
objeto material do crime. Ex.: periclitação da vida e da saúde (132, CP), rixa (137, CP). Os crimes de
perigo, subdividem-se em:

I. Crimes de perigo abstrato (ou presumido): quando a lei descreve uma conduta e presume que o
agente, ao realizá-la expõe o bem jurídico a risco. Essa presunção é absoluta, bastando a acusação
provar que o agente praticou a conduta descrita no tipo para que se presuma ter havido a situação de
risco. Ex.: omissão de socorro (135, CP).
II. Crimes de perigo concreto: a acusação tem de provar que pessoa certa e determinada foi
exposta a uma situação de risco em face da conduta do agente. Há que se provar que o perigo
efetivamente ocorreu, pois este não é presumido. Ex.: periclitação da vida e da saúde (132, CP).
III. Crimes de perigo individual: são os que expõem a risco o interesse de uma só pessoa ou
de grupo limitado de pessoas. Ex.:130 a 137, CP.
IV. Crimes de perigo comum (ou coletivo): são os que expõem a risco o interesse de número
indeterminado de pessoas. Ex.: 250 a 259,CP

7.5. CRIMES COMUNS, PRÓPRIOS E DE MÃO PRÓPRIA

- Dizem respeito ao sujeito ativo da infração penal

a) Crimes Comuns: são aqueles que podem ser praticados por qualquer pessoa. Ex.: furto, roubo,
homicício.

b) Crimes Próprios: são os que só podem ser cometidos por determinadas categorias de pessoas,
por exigir o tipo penal certa qualidade ou característica do sujeito ativo. Ex.: infanticídio (123,CP),
corrupção passiva (317, CP).

c) Crimes de Mão Própria: são aqueles cuja conduta descrita no tipo penal só pode ser executada
por uma única pessoa, não admitindo co-autoria, apenas participação. Ex.: falso testemunho (342, CP)

7.6. CRIMES PRINCIPAIS E ACESSÓRIOS


a) Principais: são os que não dependem de qualquer outra infração penal para que se
configurem. Ex.: homicídio, furto.

b) Acessórios: são os que pressupõem a ocorrência de um delito anterior. Ex. receptação


(180, CP)

7.7. CRIMES SIMPLES E COMPLEXOS


a) Simples: protegem um único bem jurídico. Ex.: homicídio – vida; furto – patrimônio.

b) Complexos: ocorrem da fusão de dois ou mais tipos penais, ou quando um tipo penal funciona
como qualificadora de outro. Ex.: extorsão mediante seqüestro (159 = 148 + 158), latrocínio (157,§3.º =
121 + 157)

7.8. CRIMES PROGRESSIVOS

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- Ocorrem quando o sujeito, para alcançar um resultado mais grave, passa por um crime menos
grave. Ex.: para causar a morte da vítima o agente tem que lesioná-la.

7.9. PROGRESSÃO CRIMINOSA

- o agente pretende praticar um crime e, em seguida, resolve praticar outro. Há duas ou mais
infrações penais, dois fatos e não um só. Há pluralidade de condutas delitivas encadeadas por uma
seqüência causal e certa unidade de contexto.

7.10. DELITO PUTATIVO

- Dá-se quando o agente imagina que a conduta por ele praticada constitui crime, mas em
verdade, é um fato atípico.

7.11. CRIME FALHO

- Ocorre quando o agente percorre todo o iter criminis, mas não consegue consumar o crime. É
também chamado de tentativa perfeita.

7.12. CRIME EXAURIDO

- Quando após a consumação, que ocorre quando estiverem preenchidos no fato concreto o tipo
objetivo, o agente o leva a conseqüências mais graves. Ex.: extorsão mediante seqüestro – o
recebimento do resgate exaure o crime que se consumara com o arrebatamento da vítima. O crime é o
mesmo, embora as conseqüências dele sejam mais graves e o juiz deva levar essa circunstância em
conta na aplicação da pena.

7.13. CRIMES VAGOS

- são os que têm como sujeito passivo entidades sem personalidade jurídica, como a família, a
sociedade...

7.14. CRIMES SIMPLES, PRIVILEGIADOS E QUALIFICADOS

- Crimes Simples: é aquele em cuja redação o legislador enumera as elementares do crime em


sua conduta principal. Ex.: matar alguém – homicídio simples – art. 121, caput.

- Crime Privilegiado: quando o legislador após a descrição do delito, estabelecer circunstância


com o condão de reduzir a pena. Ex.: 121, § 1.º, CP.

- Crime Qualificado: quando a lei apresenta circunstâncias que alteram a própria pena em
abstrato. Ex.: 121, §2.º, CP.

7.15. CRIME HABITUAL

- É aquele cuja caracterização pressupõe uma reiteração de atos. Ex.: curandeirismo (284, CP). A
prática de um ato isolado é atípica.

7.16. CRIME PROFISSIONAL

- É qualquer delito praticado por aquele que exerce uma profissão, utilizando-se dela para a
atividade ilícita. Ex.: aborto praticado por médico ou parteira.
31
7.17. CRIME UNISSUBSISTENTE E PLURISUBSISTENTE

a) Crime Unissubsistente: realiza-se com apenas um ato, ou seja, a conduta é uma e indivisível
como na injúria ou ameaça orais, uso do documento falso. A tentativa é inadmissível.

b) Crime Plurisubsistente: é composto de vários atos, que integram a conduta. Admitem a


tentativa, e constituem a maioria dos delitos: homicídio, furto, roubo.

________________________________________________________________

UNIDADE IV – DA ANTIJURIDICIDADE
1. Das Excludentes de Criminalidade
2. Causas Supra Legais de Exclusão
2.1 Estado de Necessidade
2.2 Legítima Defesa
2.3 Estrito Cumprimento do Dever Legal
2.4 Exercício Regular de Direito
2.5 Consentimento do Ofendido
3. Hipóteses Putativas

UNIDADE V – DA CULPABILIDADE
1. Conceito
2. Teorias
2.1 Teoria Normativa
2.2 Teoria da Ação Final
2.3 Teoria Social da Ação
3. Hipóteses Exculpantes
3.1 Potencial Consciência sobre a Ilicitude do Fato
3.2 Exigibilidade de Conduta Diversa

UNIDADE VI – DO CONCURSO DE PESSOAS


1. Introdução
1.1 Requisitos para o Concurso de Pessoas
2. Autoria
3. Co-autoria
4. Participação
5. Autoria Mediata
6. Autoria Colateral
7. Teorias
8. Nos Crimes Culposos
_________________________________________________________________________

01. Antijuridicidade

1.1. Conceito: Antijuridicidade é a qualidade daquilo que contraria o Direito, que é ilícito. Quando
ocorre um fato humano que se enquadra em um tipo incriminador tem-se presente a tipicidade. Assim,
cometido um fato típico, presume-se que ele é ilícito, a menos que exista uma causa excludente de
antijuridicidade expressamente prevista na lei.
As causas de exclusão da antijuridicidade são também chamadas causas de justificação do fato
típico ou descriminantes.
32
1.2. Antijuridicidade Material e formal: Todo fato típico é formalmente antijurídico; mas pode ser
materialmente lícito. A antijuridicidade material consiste na ofensa a bens jurídicos (vida, patrimônio,
integridade física, etc.). A antijuridicidade formal decorre da definição legal de um fato como crime.

1.3. Antijuridicidade subjetiva e objetiva: A antijuridicidade subjetiva entende que as ordens e


proibições contidas na lei são dirigidas à vontade das pessoas imputáveis (Petrocelli), assim, o
inimputável não pode realizar condutas antijurídicas. Pela antijuridicidade objetiva, adotada pela maioria
dos doutrinadores, v.g. Damásio de Jesus, resolve-se na lesão de um bem penalmente protegido,
independentemente da culpabilidade do sujeito.

1.4. Requisitos Objetivos e Subjetivos de Justificação


Damásio de Jesus escreveu:
A ausência do elemento objetivo ou subjetivo no fato praticado leva à ilicitude da conduta. Essa
incongruência, ensina Zaffaroni, pode operar de duas maneiras:
1) o sujeito satisfaz a tipicidade objetiva permissiva, mas não satisfaz a parte subjetiva (falta a
intenção de defender-se, p.ex.);
2) o sujeito satisfaz a finalidade justificante, mas estão ausentes as elementares objetivas do
tipo permissivo.

1.5 Causas Supralegais de Exclusão da Antijuridicidade


É possível a existência de causas supralegais de exclusão de antijuridicidade porque essa norma
é não incriminadora, permissiva, portanto, pode-se aplicar a analogia, a equidade e os princípios gerais
de Direito.
Ex.: a perturbação dos sentidos nos crimes passionais; a legítima defesa da honra.
Segundo o filósofo Perelman: a equidade, as ficções jurídicas e até mesmo a caridade são muitas
vezes necessárias à obtenção da justiça quando a lei mostra-se inflexível.

I) Estado de Necessidade
Art. 24 do Código Penal:
Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não
provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir-se.
§ 1º Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo.
§ 2º Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida
de um a dois terços.

REQUISITOS FUNDAMENTAIS DO ESTADO DE NECESSIDADE (sem qualquer um deles fica


excluído o estado de necessidade)
1) situação de perigo ( situação de necessidade)
2) prática de conduta lesiva (fato necessitado)

A situação de perigo compreende:


a) perigo atual (não se inclui o perigo iminente)
b) ameaça a direito próprio ou alheio;
c) perigo não causado voluntariamente pelo agente;
d) inexistência do dever legal de arrostar o perigo.

A prática de conduta lesiva exige:


a) inevitabilidade do comportamento lesivo;
b) inexigibilidade de sacrifício do interesse ameaçado;
c) conhecimento da situação de fato que justifique a conduta.

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Somente o perigo causado dolosamente impede o reconhecimento do fato necessitado. Há hoje
jurisprudência e doutrina entendendo que o perigo causado culposamente também impede o
reconhecimento do fato necessitado.

Inexiste estado de necessidade contra legítima defesa. (agressão injusta)

É possível estado de necessidade contra estado de necessidade. Ex.: A disputa por tábua de
salvação por dois náufragos.

Estado de necessidade putativo (art. 20, § 1º, 1ª parte, do CP)


Ex.: A mulher grávida que furta doces, por não possuir numerário, sob a crença de que não
comê-los poderá prejudicar o filho.
Um homem supondo o navio afundar agride outro para ficar com o colete salva-vidas.

Estado de necessidade exculpante: bem de igual ou maior valor jurídico, exclui a culpabilidade.

Indenização no estado de necessidade: o estado de necessidade não elide a responsabilidade


civil.
Outros exemplos:
- Furto famélico;
- Violação de domicílio para acudir vítimas de desastre;
- Antropofagia entre sobreviventes ou perdidos;
- Subtração de automóvel para transportar doente.

II) Legítima Defesa

Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários,
repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

REQUISITOS DA LEGÍTIMA DEFESA


Requisito subjetivo: é preciso que o agente tenha consciência da situação de agressão injusta
para justificar o propósito de se defender da agressão. A falta do reconhecimento da necessidade de
repulsa exclui a legítima defesa.

Requisitos objetivos:
a) necessidade defender-se de agressão injusta;
b) agressão atual ou iminente;
c) direito do agredido ou de terceiro atacado ou ameaçado;
d) repulsa com os meios necessários;
e) uso moderado dos meios necessários.

- é possível a legítima defesa contra alguém que – sob coação moral irresistível (art. 22, CP),
obediência hierárquica (art. 22, CP) ou embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior
(art. 28, § 1º, CP) – está prestes ou agride a vítima, que, assim, pode tranqüilamente reagir em legítima
defesa.

- não há legítima defesa contra legítima defesa (legítimas defesas recíprocas)

- admite-se, contudo, a legítima defesa sucessiva.

- não se admite legítima defesa contra estado de necessidade

- legítima defesa subjetiva: é o excesso por erro de tipo escusável.


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DIFERENÇAS ENTRE LEGÍTIMA DEFESA E ESTADO E ESTADO DE NECESSIDADE
1) No estado de necessidade há conflito entre bens jurídicos. Na legítima defesa há ataque
ou ameaça de lesão a bem jurídico;
2) No estado de necessidade o perigo pode advir de conduta humana ou força da natureza.
Na legítima defesa há sempre o pressuposto da agressão humana;
3) No estado de necessidade o necessitado pode dirigir sua conduta contra terceiro alheio ao
fato. Na legítima defesa o agredido deve dirigir seu comportamento contra o agressor;
4) No estado de necessidade o fato necessitado (ação ou reação) não constitui agressão
injusta e sim ato lícito. Na legítima defesa a agressão deve ser injusta.

LEGÍTIMA DEFESA PUTATIVA

ERRO DE TIPO (ART. 20, § 1º, DO CP) ERRO DE PROIBIÇÃO (ART. 21, DO CP)
É possível a legítima defesa real contra a legítima defesa putativa
É admissível também a legítima defesa putativa contra a legítima defesa real

AGRESSÃO - ATO HUMANO

ATUAL OU IMINENTE

INJUSTA - PRISÃO EM FLAGRANTE, ORDEM LEGAL DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO.


Não é preciso que a agressão injusta seja dolosa.
Não é fundamental também que a agressão constitua uma contrariedade à lei penal.
Imputabilidade do autor da ofensa

DIREITO PRÓPRIO OU ALHEIO - vida, integridade física, patrimônio, honra


Legítima defesa de outrem
Uso moderado dos meios necessários.
Vontade de se defender
A reação atingindo pessoa diversa da pretendida.
Indenização na legítima defesa: em decorrência de legítima defesa cabe ação cível para
ressarcimento contra aquele em defesa de quem danificou a coisa (art. 1.520, parágrafo único, do CC).

III) Estrito Cumprimento do Dever Legal


Para que o agente aja sob o manto da excludente é preciso que atue, não apenas no cumprimento
do dever, mas no estrito cumprimento do dever.

Dever legal é aquele que decorre de lei, decreto, regulamento ou qualquer outro ato normativo
emanado do poder competente.
Exs.: prisão em flagrante; policial que atira em invasor de quartel.

Excesso no estrito cumprimento do dever: punível, art. 23, parágrafo único.

Estrito cumprimento do dever legal putativo, é possível por erro de tipo ou erro de proibição. Ex.:
prisão de gêmeo; prisão de homônimo.

IV) Exercício Regular de Direito


A palavra direito está empregada no sentido amplo. O possuidor turbado que, por desforço
próprio, mantêm-se na posse.
Ex.: Correção dos pais nos filhos; proteção do esbulho; expulsar de clube; prisão em flagrante por
qualquer do povo.
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Se o exercício não for regular, haverá abuso.

- Estupro na mulher casada por seu marido.


- Violência esportiva.

- Intervenções médicas ou cirúrgicas: dispor do próprio corpo para realizar cirurgias: vasectomia,
ligadura de trompas, plásticas, etc.

- Excesso doloso - responde pelo resultado


- Culposo - pelo excesso
- Exercício regular do direito putativo

OFENDÍCULOS – significa aparato ou obstáculo para defender o patrimônio ou qualquer bem


jurídico. Ex.: cerca elétrica; cacos de vidros; arame farpado.

A predisposição do ofendículo é exercício regular do direito. No momento em que o ofendículo


entra em funcionamento, em virtude de um ataque, deve-se reconhecer a excludente da legítima
defesa, visto que há uma agressão injusta.

2. Culpabilidade

2.1. Conceito – conjunto de pressupostos que viabilizam a condenação penal.

2.2. Teorias

A) Teoria psicológica – A culpabilidade é um liame psicológico que se estabelece entre a


conduta e o resultado, por meio do dolo ou da culpa. O nexo psíquico entre conduta e resultado
esgota-se no dolo e na culpa, que passam a constituir, assim, as 2 únicas espécies de culpabilidade.

B) Teoria psicológica-normativa ou normativa da culpabilidade – Para essa teoria a


culpabilidade era composta, além do dolo e da culpa, também pela imputabilidade e pela inexigibilidade
de conduta diversa. O dolo era normativo, tendo em seu conteúdo a consciência atual da ilicitude, ou
seja, o conhecimento de que a ação ou omissão é injusta aos olhos da maioria.

C) Teoria normativa pura da culpabilidade


A culpabilidade, no finalismo, não é elemento do conceito de crime, porém mero pressuposto da
pena, constituindo um juízo de responsabilidade, de censura social por ter o agente praticado um fato
típico e antijurídico, quando podia se determinar conforme a ordem jurídica, por ter capacidade de
entender, de querer, de conhecer a ilicitude do fato, daí ser razoável lhe exigir um comportamento
conforme o Direito.

Desse modo, os elementos da culpabilidade para a doutrina finalista, ou seja, para a teoria
extrema ou normativa pura, são os seguintes:
a) imputabilidade;
b) potencialidade de consciência da ilicitude;
c) exigibilidade de outra conduta.

Para bem entendermos o pensamento de Welzel, tomemos por base o raciocínio de que, ao
definir o homicídio no art. 121, o Código está fazendo referência ao tipo de crime que só pode ser
praticado dolosamente, daí Welzel dizer que o tipo abrange o dolo, que é elemento subjetivo do tipo.

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Assis Toledo também ilustra essa posição com o seguinte exemplo: “o que torna atípico o
auto-aborto culposo é a falta de dolo na ação praticada. Como o tipo penal é doloso, isto é, contém o
dolo, a ação praticada culposamente não se subsume, não confere com a do tipo legal do crime. Ora,
se o dolo do delito em exame não estivesse no tipo, teríamos de concluir que, para o tipo de delito de
auto-aborto, é indiferente que a mulher grávida pratique o fato dolosa ou culposamente”.

D) Teoria limitada da culpabilidade


A teoria limitada da culpabilidade é uma variação da Teoria Normativa Pura da Culpabilidade,
que vimos anteriormente.

Os pontos fundamentais defendidos por essa teoria limitada são:


a) o dolo constitui elemento subjetivo do tipo;
b) a consciência da ilicitude fica no domínio da culpabilidade;
c) é correta a exigência da mera possibilidade de conhecimento do ilícito;
d) o erro de proibição não exclui o dolo, mas exclui a culpabilidade;
e) o erro de tipo, quando o agente supõe situação de fato amparada por uma excludente da
antijuridicidade (como a legítima defesa putativa), exclui o dolo.

Foi essa a teoria dotada por nosso Código.

E) Teoria Extremada da culpabilidade


Tem as mesmas caraterísticas da teoria normativa pura da culpabilidade e dela deriva, divergindo
da teoria normativa limitada da culpabilidade apenas no tratamento do erro, quando considera ambos
como erro de proibição, não fazendo a divisão entre erro de tipo e erro de proibição.

2.3. Imputabilidade
Elemento da culpabilidade, capacidade de nos conduzir.
Biológico
Psicológico – o instante do crime
Biopsicológico

Dois requisitos:
a) Intelectivo: capacidade para compreender
b) Volitivo: dirigir o comportamento

Desenvolvimento Mental Retardado


Oligofrenias – idiotia, imbecilidade e debilidade mental.

Estado mental Idade mental


Idiota Um a Três anos
Imbecil Três a Oito anos
Débil mental Oito a Treze anos

Quociente de Inteligência
Limítrofe – 68 a 85
Leve - 52 a 67
Moderado - 36 a 51
Grave - 20 a 35
Profundo - inferior a 20

Desenvolvimento mental incompleto


Menores de 18 anos;
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Surdos-mudos;
Silvícolas.

Doença mental
Psicoses orgânicas:
Senilidade
Alcoólica
Parto
Psicoses não orgânicas:
Esquizofrenia
Transtornos afetivos principais – melancolia maníaco-depressivo.
Paranóides – superior e único.

NEUROSES:
Ansiedade
Histérica
Fóbica
Depressiva
Neurastênica – debilidade crônica

PERSONALIDADES PSICOPÁTICAS
Paranóide – ciúmes, inveja.
Ciclotímica – períodos de euforia e alternados com depressão.
Esquizóide – Caracteriza por reserva, hipersensibilidade, isolamento, evitação de relações íntimas
ou competitivas e excentricidade.
Explosiva.

DESVIOS SEXUAIS: Homossexualismo – uranismo: masculino – tribadismo: feminino; Fetichismo;


Sadismo.

ALCOOLISMO E DEPENDÊNCIA DE DROGAS

2.4. A exigibilidade de conduta diversa


Conforme foi explicado, a culpabilidade é composta dos seguintes elementos:
a) imputabilidade;
b) consciência da ilicitude;
c) exigibilidade de conduta diversa.
Entende-se por essa expressão "exigibilidade de outra conduta diversa" o princípio de que o
comportamento do agente só é responsável quando, podendo realizar conduta diferente, que estaria em
consonância com a ordem jurídica, vem a realizar outra proibida por lei.
Exemplificando-se, a assinatura de um documento falso, simplesmente para facilitar o agente a
ganhar um prêmio, tem a mesma relação psicológica entre o autor e o resultado, como a que se v6e na
situação do agente que, sob ameaça de morte, é constrangido irresistivelmente a assinar um
documento. Mas, no segundo caso citado, torna-se inexigível a conduta diversa, porque está excluída a
culpabilidade, ou seja, a responsabilidade do comportamento, considerando a imperiosa circunstância
da coação moral irresistível.

2.5. A potencial consciência da ilicitude e erro de proibição


Funda-se “na concreta ausência do agente, no momento da atuação, da consciência da ilicitude
de uma certa conduta” (Eduardo Correa, Direito criminal, Coimbra, Almedina, 1963, vol. 1, p. 419).

Pouco importa se agente conhecia ou não a lei, pois esse desconhecimento ele não poderá
alegar, em face da presunção de que ninguém ignora o texto legal. O que se indaga é do conhecimento
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do caráter injusto do ato, da consciência de que se está fazendo algo errado em contrariedade ao que
todos considerariam como justo.

No erro de proibição, o agente pensa agir plenamente de acordo com o ordenamento jurídico,
mas, na verdade, pratica um ilícito em razão de equivocada compreensão do Direito. Mesmo
conhecendo o Direito, pois todos presumivelmente o conhecem, em determinadas circunstâncias as
pessoas podem ser levadas a pensar que agem de acordo com o que o ordenamento jurídico delas
exige.

Fernando Capez escreveu:


“O erro de proibição não possui relação com o desconhecimento da lei. Trata-se de erro sobre a
ilicitude do fato e não sobre a lei.
Pouco importa se o agente conhecia ou não a lei, pois esse desconhecimento ele não poderá
alegar, em face da presunção de que ninguém ignora o texto legal. O que se indaga é do conhecimento
do caráter injusto do ato, da consciência de que se está fazendo algo errado em contrariedade ao que
todos consideram justo.
O erro de proibição só exclui a culpabilidade quando inevitável. Porque tem como elemento a
potencial e não a atual consciência da ilicitude. Assim, o fato de estar presente o erro de proibição
apenas indica que o agente não conhecia a ilicitude do fato praticado, ou seja, não tinha a consciência
atual da ilicitude. Isso não basta. A potencial consciência da ilicitude só é eliminada quando o agente,
além de não conhecer o caráter ilícito do fato, não tinha nenhuma possibilidade de fazê-lo. Todo erro de
proibição retira, portanto, a consciência atual da ilicitude, mas só o erro que não podia ser evitado
(inevitável) excluirá a potencial consciência e, consequentemente, a culpabilidade”.

3. Erro de tipo permissivo

Quando o objeto do erro for pressuposto de uma causa de justificação, afirma-se, ocorre erro de
tipo permissivo.
A) teoria dos elementos negativos do tipo: considera causas de justificação como integrantes
do tipo e, conseqüentemente, seus pressupostos como características negativas do tipo. Assim,
qualquer erro sobre elas constitui erro de tipo.
B) teoria do erro orientada às conseqüências, equipara esse erro ao erro de tipo somente
quanto às conseqüências jurídicas.

4. Erro de Tipo (art. 20)

É aquele que faz com que o agente, no caso concreto, imagine não estar presente uma elementar
ou uma circunstância componente da figura típica. Conforme já estudado, para que haja dolo é
necessário que o agente queira realizar todos os elementos constitutivos do tipo. Assim, como
conseqüência do erro de tipo, temos a exclusão do dolo. Excluído este estará também excluída a
conduta e, conseqüentemente, o fato típico. Exs.: uma pessoa se casa com pessoa já casada, sem
conhecer a existência do casamento anterior. Ela não responde pelo crime, por não ter agido com dolo,
uma vez que desconhecia o fato de já ser casada a outra pessoa; alguém recebe um veículo idêntico ao
seu das mãos do manobrista e o leva embora. Não comete crime de furto, pois imaginou que o veículo
era o seu.

A) Erro de tipo e delito putativo por erro de tipo. No erro de tipo, o agente não quer praticar o
crime, mas por erro acaba cometendo-o. O agente não sabe que está cometendo o delito e, portanto,
não responde por este.

No delito putativo (imaginário) por erro de tipo ocorre a situação inversa, ou seja, o sujeito quer
praticar o crime, mas por uma errônea percepção da realidade, executa uma conduta

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atípica. Ex.: uma pessoa quer furtar um objeto que supõe ser alheio, mas se apodera de um objeto
que lhe pertence. Nessa hipótese não se aperfeiçoa a figura típica do furto, que exige a subtração de
coisa alheia móvel e, por isso, também não há crime. Segundo a doutrina, podem ocorrer as seguintes
hipóteses:
a) Delito putativo por erro de tipo. Conforme acima mencionado, ocorre quando o agente, por
equívoco, imagina estar praticando todas as elementares de um crime, quando, na verdade, não está.
O erro aqui se refere ao fato.
b) Delito putativo por erro de proibição. Ocorre quando o agente supõe estar praticando um crime,
mas, na realidade, não há norma incriminadora definindo o fato. O erro aqui se refere à existência da
norma penal incriminadora.
c) Delito putativo por obra de agente provocador. Pela Súmula 145 do Supremo Tribunal Federal,
não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia toma impossível sua consumação.

B) Formas de erro de tipo


a) Essencial: É o que incide sobre elementares ou circunstâncias do crime, de forma que o agente
não tem consciência de que está cometendo um delito.
O erro de tipo essencial, por sua vez, pode ser:
a1) Vencível ou inescusável. Quando o agente poderia tê-lo evitado se agisse com o cuidado
necessário no caso concreto. Nessa modalidade, o erro de tipo exclui o dolo, mas o agente responde
por crime culposo (se compatível com a espécie de delito praticado). Temos aqui a chamada culpa
imprópria.
a2) Invencível ou escusável. Quando se verifica que o agente não poderia tê-lo evitado, uma vez
que empregou as diligências normais na hipótese concreta. Nesse caso, excluem-se o dolo e a culpa.
Assim, se o erro recai sobre uma elementar, exclui-se o crime. Se recai sobre uma qualificadora
ou causa de aumento de pena, desconsideram-se estas.
b) Acidental. É aquele que recai sobre elementos secundários e irrelevantes da figura típica e não
impede a responsabilização do agente, que sabe estar cometendo uma infração penal. Por isso, o
agente responde pelo crime.
Oerro de tipo acidental possui as seguintes espécies:
b1) Erro sobre o objeto. O agente imagina estar atingindo um objeto material, mas atinge outro.
Ex.: uma pessoa, querendo furtar um aparelho de videocassete, entra na casa da vítima e, por estar
escuro o local, acaba pegando um aparelho de som. O erro é irrelevante e o agente, conforme já
mencionado, responde pelo crime.
b2) Erro sobre a pessoa. O agente com a conduta criminosa visa a certa pessoa, mas por
equívoco atinge outra. Ex.: querendo matar João, o sujeito efetua um disparo contra Antonio, que muito
se assemelha fisicamente a João. Nesse caso, o sujeito responde pelo homicídio.
Oart. 20, § 32, do Código Penal faz apenas uma ressalva:
devem-se levar em conta, para fim de aplicação da pena, as qualidades da pessoa que o agente
pretendia atingir e não as da efetivamente atingida. Assim, imagine-se que a mãe, sob a influência do
estado puerperal, resolve matar seu próprio filho, logo após o parto. Dirige-se para o berçário e lá
provoca a morte de outro recém-nascido, supondo ser o seu. Nos termos do art. 20, § 32, deve a mãe
ser responsabilizada por infanticídio (morte do próprio filho) e não por homicídio.
b3) Erro na execução (aberratio ictus). Ocorre quando o agente, querendo atingir determinada
pessoa, efetua o golpe, mas, por má pontaria ou por outro motivo qualquer (desvio do projétil, desvio da
vítima), acaba atingindo pessoa diversa da que pretendia. Nesse caso, o art. 73 do Código Penal
estabelece que o sujeito responderá pelo crime, levando-se em conta, porém, as condições da vítima
que o agente pretendia atingir.
Além disso, pode acontecer de o agente efetivamente atingir quem pretendia e, por erro na
execução, atingir também outra pessoa. Nesse caso, haverá crime doloso em relação a quem o sujeito
queria acertar e crime culposo em relação à outra vítima, em concurso formal (é o que determina o art.
73, 2ª parte, denominada aberratio ictus com duplo resultado). Assim, suponha-se que A efetue vários
disparos contra B, mas, por erro, acerte e mate também C. Nesse caso, responderá por um homicídio

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doloso em relação a B e por um homicídio culposo em relação a C (aplicando-se a regra do concurso
formal no tocante à aplicação da pena).
Não se confunde o erro na execução (art. 73) com o erro quanto à pessoa (art. 20, § 3º). Neste, o
agente supõe que uma pessoa é outra e efetua o disparo atingindo a pessoa que foi mirada. Ex.: uma
pessoa é contratada para matar Francisco, mas não o conhece pessoalmente (apenas por fotografia).
Assim, no momento do crime, o matador vislumbra Paulo e imagina que este é Francisco, efetuando
disparo que atinge efetivamente Paulo. No erro de execução, o agente não se confunde em relação à
vítima. Ele efetua o disparo contra a pessoa certa, mas o projétil atinge outra pessoa. Ex.: o matador
contratado para matar Francisco, identifica-o e efetua um disparo contra este. Acontece que Francisco
desvia e o projétil atinge Paulo, que se encontrava atrás dele.
b4) Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis). O agente quer atingir um bem jurídico,
mas atinge bem de natureza diversa. Ex.: uma pessoa, querendo cometer crime de dano, atira uma
pedra em direção ao bem, mas, por erro de pontaria, atinge uma pessoa que sofre lesões corporais.
Nesse caso, o agente só responde pelo resultado provocado na modalidade culposa, e, ainda assim, se
previsto para a hipótese (art. 74), ou seja, responde por crime de lesões culposas, que absorve a
tentativa de dano. Veja-se, entretanto, que, se não existir previsão legal de crime culposo para o
resultado provocado, não se aplica a regra da aberratio criminis, respondendo o sujeito pela tentativa de
dano (pois, caso contrário, o fato ficaria sem punição).
Ressalte-se, por outro lado, que, se o agente atinge o bem jurídico que pretendia e, por erro,
atinge também outro bem jurídico, responde pelos dois crimes, em concurso formal. Assim, no exemplo
acima, se o sujeito, querendo cometer crime de dano, atira uma pedra que atinge o bem (uma vidraça,
p. ex.) e atinge também uma pessoa que se encontra no interior da residência (que ele não queria
atingir), responde pelo crime de dano consumado em concurso formal com o delito de lesões corporais
culposas.
b5) Erro sobre o nexo causal (aberratio causae). É a hipótese do chamado dolo geral, que já foi
estudado. Ocorre quando o agente, imaginando já ter consumado o crime, pratica nova conduta, que
vem a ser a causa efetiva da consumação. Ex.: supondo já ter matado a vítima com emprego de
veneno, o agente cava um buraco no quintal de sua casa e a enterra, vindo esta a falecer apenas nesse
instante, em razão de asfixia. Na hipótese, o agente responde por homicídio doloso consumado (dolo
geral) e não por tentativa de homicídio doloso em concurso com homicídio culposo.

2.6. A Culpabilidade Funcionalista

Luiz Flávio Gomes disserta: Três correntes funcionalistas no âmbito do Direito penal poderiam ser
distinguidas com certa clareza: o funcionalismo reputado (por alguns críticos) como radical, o
funcionalismo moderado e o limitado.

Na primeira linha inscrever-se-ia a obra de JAKOBS, que sustenta a tese de que o Direito penal
existe para reafirmar a norma e revigorar as expectativas dos seus destinatários. A pena, em
conseqüência, tem finalidade preventiva geral positiva (afirmação da vigência da norma, garantia da
funcionalidade do sistema social).

ROXIN, por seu turno, um dos mais reputados penalistas na atualidade, funda a linha do
funcionalismo moderado. É de sua criação o sistema teleológico-funcional e racional do delito» (1970),
que sustenta a necessidade de a política criminal penetrar na dogmática. O tipo constitui o primeiro
degrau de valoração do crime, a antijuridicidade é o segundo. O terceiro está constituído pela
responsabilidade, que engloba a culpabilidade e a necessidade preventiva geral e especial de pena.
Injusto, de um lado, e responsabilidade, de outro, seriam as bases do fato punível.

Dolo e culpa estão no tipo, mas deles se extrai uma diferente atitude interior —Gesinung - que
determina o tipo de culpabilidade (dolosa direta = atitude pessoal contrária ao bem jurídico; dolosa
eventual = atitude pessoal indiferente ao bem jurídico; culposa = atitude pessoal descuidada ou leviana
frente ao bem jurídico). Cada espécie de culpabilidade leva a um diferente grau de reprovação. A
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culpabilidade funda-se na reprovação ética do agente; na realização pessoal do ilícito. A punibilidade
fundamenta-se no conceito de merecimento.

Em conclusão: crime significa um comportamento ilícito-típico, culpável e digno de pena.

Questão - Prova de Juiz Federal Substituto da 2ª Região

X, piloto italiano de uma empresa aérea estrangeira, residente em Roma, vem ao Brasil pela primeira
vez para aqui permanecer apenas 02 (dois) dias. Em Copacabana, defronte ao hotel onde estava
hospedado, adquire quatro (04) gramas de maconha, para uso próprio, de uma pessoa que oferecia a
droga a todos os que entravam e saiam daquele estabelecimento, sem que fosse molestado pela
polícia. No outro dia, sem haver consumido a droga, X é preso pela Polícia Federal, no Aeroporto
Internacional do Rio de Janeiro, quando se encontrava no interior da aeronave. A droga estava
acondicionada em uma pequena caixa de remédio no bolso do seu paletó. Submetido a julgamento, X
alega que na Itália, seu país de origem, a posse de pequena quantidade de maconha, para uso próprio,
não é punível e ele, evidentemente, pelo pouco de tempo em que aqui esteve e não falando português,
imaginava que a Legislação Brasileira lhe dispensava o mesmo tratamento. Como deve o Juiz do caso
Interpretar a suposição de X? Fundamente a resposta.

VIII – CONCURSO DE PESSOAS

A expressão "concurso de pessoas", então, como está no art. 29 do Código Penal, não é sinônimo
de co-autoria. É mais ampla, envolvendo quem concorre para o crime de qualquer modo, seja principal
ou acessoriamente; daí se dizer que, apesar de o Código não falar em cumplicidade, ele admite a figura
do cúmplice, que nada mais é do que o colaborador, o auxiliar, o conivente. Assim, o partícipe de um
crime pode ser chamado também de cúmplice.

O concurso de pessoas não altera a unidade do crime. Esse é o mesmo para todos os
concorrentes. E a participação deve ser anterior à consumação do crime. Assim não há falar em
cumplicidade, mas delito autônomo na ação de quem adquire a coisa já furtada por outrem.

I - Vínculo psicológico
Entre os vários autores e partícipes de um crime deve haver um vínculo subjetivo: é preciso que
haja entre eles um acordo prévio ou, pelo menos, uma convergência de intenções no momento da
execução.

II - Alcance do subjetivo no concurso de pessoas


Não é necessário combinação nem o acordo prévio entre o autor e o partícipe, bastando que os
comportamentos revelem que uma vontade aderiu à outra. Se a empregada doméstica abre a porta
para facilitar a entrada do ladrão na casa do patrão, apenas para se vingar deste, configura-se a
participação criminosa da empregada, ainda que o ladrão desconhecesse a razão da atitude dela. É o
mesmo caso do seguinte exemplo: o agente, sabendo que seu cunhado vai matar a esposa e
desejando também a morte desta, subtrai-lhe o revólver com que ela poderia se defender. Se o
cunhado, nessas circunstâncias, vem a matar a esposa, o agente é partícipe do homicídio.

Não se admite a participação dolosa em crime culposo. Se o agente faz supor a uma pessoa que
uma arma está descarregada e induz essa pessoa a acionar o gatilho na direção de um terceiro, não há
participação criminosa, porém dois crimes: homicídio doloso em relação ao agente que induziu e
homicídio culposo em relação ao que disparou.

Não se pode considerar, igualmente, participação culposa em crime doloso. Se a empregada, por
negligência, deixa aberta a porta da casa do patrão, disso se aproveitando o ladrão, não vai responder
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por crime algum, porque não existe no Código Penal o furto culposo, sendo esse fato atípico. O mesmo
não ocorrendo em relação ao peculato, pois, há previsão legal para essa figura penal.

III - Circunstâncias incomunicáveis


"Art. 30. Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo
quando elementares do crime."
As circunstâncias de que trata o art. 30, podem ser: a) subjetivas ou pessoais, b) objetivas ou
factuais.

a) Circunstâncias subjetivas ou pessoais


São circunstâncias subjetivas ou pessoais próprias: a reincidência, o desenvolvimento mental
incompleto ou retardado, a perturbação da saúde mental e a menoridade.
São circunstâncias subjetivas ou pessoais elementares do crime aquelas que dizem respeito aos
elementos da figura típica. Essas circunstâncias só se comunicam ao concorrente quando ingressam na
esfera de seu conhecimento.

b) Circunstâncias objetivas ou factuais


As circunstâncias objetivas ou factuais são as relacionadas à materialidade, aos meios e modos
de execução, ao tempo, ao lugar, ao objeto do crime e qualidade da vítima. Exemplos: traição,
emboscada, emprego de veneno, ocasião de torpeza, tortura, embriaguez preordenada.

c) Condições de caráter pessoal


"Condição de caráter pessoal" diz respeito à situação do agente. Por exemplo: condição de
funcionário público, de médico, de advogado, de casado.

A condição de caráter pessoal só se comunica ao concorrente quando é elementar do crime


praticado, isto é, se relaciona a um dos elementos da figura típica, desde que tenha ingressado na
esfera de conhecimento do co-autor ou partícipe. Um funcionário público comete crime de peculato (art.
312 do CP) ajudado por um terceiro, que não é funcionário público. Nesse caso, a condição elementar
de natureza pessoal (funcionário público) só vai se comunicar ao partícipe, se este conhecia a
qualidade pessoal do funcionário. É por isso que o Código, na regra genérica da co-delinquência, no art.
29, caput, consagra o princípio de que cada um dos concorrentes do crime será responsável na medida
de sua culpabilidade, daí resultando a dosimetria das penas impostas. Para ilustrar, apresentamos a
seguir mais dois exemplos: se Tício, sabendo que Caio é funcionário público, ajuda-o a exigir vantagem
indevida, em razão da função, Tício será punido pelo crime de concussão (art. 316 do CP), embora não
seja funcionário público. O agente, que induz o companheiro casado a praticar ato de bigamia (art. 235
do CP), responderá também por esse crime, ainda que não seja casado.

Espécies de crimes quanto ao concurso de pessoas:


- Monossubjetivos: Podem ser praticados por uma única pessoa.
- Plurissubjetivos: Somente podem ser praticados por mais de uma pessoa. Ex.: Rixa.

Espécies de concurso de pessoas:


- Concurso necessário: Dá-se nos crimes plurissubjetivos. Ex.: Quadrilha.
- Concurso eventual: Quando ocasionalmente reúnem-se pessoas para a prática de um delito que
poderia ser praticado por uma única pessoa.

Natureza jurídica do concurso de pessoas:

- Teoria unitária: todos os que contribuem para a integração do delito cometem o mesmo crime. Há
unidade de crime e pluralidade de agentes. É a aceita pelo Código Penal Brasileiro.
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- Teoria dualista: Há delito único entre os autores e outro crime único entre os partícipes

- Teoria pluralística: cada um responde por delito próprio.

- Exceção pluralística: crimes de corrupção ativa e passiva (CP, arts. 317 e 333); falso testemunho
e corrupção de testemunha (CP, arts. 342 e 343).

Autoria mediata: Aquele que se serve de outra pessoa sem condições de discernimento.
Imputável; coação moral irresistível; provocação de erro de tipo escusável; obediência hierárquica.

Não há autoria mediata nos crimes de mão própria, nem nos crimes culposos.

Inexiste concurso de agentes entre o autor mediato e o executor usado.

Autoria colateral: mais de um agente realiza, cada qual, a sua conduta, sem que exista liame
subjetivo entre eles. A e B executam simultaneamente a vítima, sem que um conheça a conduta do
outro;

Autoria incerta: ocorre quando, na autoria colateral, não se sabe quem foi o causador do
resultado. Veja bem: sabe-se quem realizou a conduta, mas não se sabe quem deu causa ao resultado.
A e B atiram mas não se sabe qual revólver.

Autoria ignorada: não se sabe quem foi o autor da conduta.


Participação de participação: uma conduta é acessória de outra conduta acessória. É o auxílio do
auxílio.

Participação sucessiva: após uma conduta acessorando a principal ocorre outra. Ex.: o partícipe
induz o autor a praticar um crime e depois o auxilia;

Conivência ou participação negativa: é a participação por omissão.

Participação impunível: art. 31 do CP.

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