Professional Documents
Culture Documents
ANTROPOLOGIA E CULTURA DIAGRAMADO - Unidade 3
ANTROPOLOGIA E CULTURA DIAGRAMADO - Unidade 3
O AUTOR
Olá, estudantes. Sou o professor Regys Rodrigues da Mota. Sou bacharel (2007)
e licenciado (2008) em Ciências Sociais e mestre em Sociologia (2011) pela
Universidade Federal de Goiás. Durante os próximos meses, estaremos juntos
realizando uma série de atividades acadêmicas para que possamos aprofundar o
conhecimento sobre alguns dos temas abordados pela disciplina de Antropologia
e Cultura oferecida pela Faculdade Araguaia.
Bons estudos!
Possui bibliografia.
CDU:
39(07)
39
FACULDADE ARAGUAIA - FARA
1º Edição - 2016
É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio e para qualquer
fim. Obra protegida pela Lei de Direitos Autorais
DIRETORIA GERAL:
Professor Mestre Arnaldo Cardoso Freire
DIRETORIA FINANCEIRA:
Professora Adriana Cardoso Freire
DIRETORIA ACADÊMICA
Professora Ana Angélica Cardoso Freire
DIRETORIA ADMINISTRATIVA
Professor Hernalde Menezes
DIRETORIA PEDAGÓGICA:
Professora Mestra Rita de Cássia Rodrigues Del Bianco
VICE-DIRETORIA PEDAGÓGICA
Professor Mestre Hamilcar Pereira e Costa
COORDENAÇÃO GERAL DO NÚCLEO DE TECNOLOGIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Professora Especialista Terezinha de J. Araújo Castro
REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA
Isabel C. Melo Alencar
COORDENAÇÃO E REVISÃO TÉCNICA DE PRODUÇÃO DE CONTEÚDO EM VÍDEO E WEB
Professora Doutora Tatiana Carilly Oliveira Andrade
DESIGN GRÁFICO E EDITORIAL
Bruno Adan Vieira Haringl
FACULDADE ARAGUAIA
Unidade Centro – Polo de Apoio Presencial
Endereço: Rua 18 nº 81 - Centro - Goiânia-GO, CEP: 74.030-040
Fone: (62) 3224-8829
Unidade Bueno
Endereço: Av. T-10 nº 1.047, Setor Bueno - Goiânia-GO, CEP: 74.223-060
Fone: (62) 3274-3161
Site Institucional
www.faculdadearaguaia.edu.br
40
SUMÁRIO
41
UNIDADE 3: IDENTIDADE E SIGNIFICADOS
42
Durante a colonização, a cultura e os conhecimentos indígenas foram
determinantes para a formação de uma identidade nacional incorporando
na cultura brasileira elementos que perduram até hoje. Tanto que o
principal destaque nesse período foi a influência indígena na chamada
língua geral, uma língua derivada do tupi-guarani com termos da língua
portuguesa que serviu de língua franca no interior do Brasil até meados do
século XVIII, principalmente nas regiões de influência paulista e na região
amazônica. Atualmente, o português brasileiro guarda inúmeros termos de
origem indígena, especialmente derivados do tupi-guarani. Dentre eles
estão os nomes na designação de animais e plantas nativos como o jaguar,
a capivara e o ipê.
43
parcialmente a língua, a culinária, o folclore e o uso de objetos, como as redes de
descanso. No entanto, a colonização europeia praticamente destruiu tribos nativas
não só fisicamente, com guerras e escravidão, como também culturalmente, pela ação
da catequese e intensa miscigenação com outras etnias. Por sua vez, os negros foram
trazidos ao país para servirem de mão de obra escrava. A abolição da escravidão não
representou uma mudança real desse status, pois foram marginalizados na
sociedade.
As consequências da colonização foram tamanhas que atualmente apenas
algumas nações indígenas ainda existem e conseguem manter parte da sua cultura
original. As consequências da escravidão foram tão profundas que ainda hoje é
possível constatar marcas traduzidas em diferenças impostas a brancos e negros em
vários setores econômicos e sociais.
Portanto, torna-se necessário discutir nessa Unidade 3 a utilização dos termos
raça e etnia dentro da antropologia, bem como as concepções de racismo, preconceito
e de discriminação. Na Unidade 4, iremos tratar das bases históricas de discursos que
engendraram na cultura brasileira algumas formas de racismo que interferiram na
formação da identidade da população brasileira.
Em certa medida o conceito de etnia surgiu, entre outros fatores, para substituir
o conceito de raça aplicado aos seres humanos. A ideia de raças humanas foi muito
difundida até o início do século XX justamente pela perspectiva
positivista/evolucionista na tentativa de justificar o domínio europeu exercido nas
colônias.
A palavra “raça” era utilizada tanto pelo senso comum quanto nos meios
acadêmicos para designar que diferentes grupos étnicos (negros, amarelos, índios e
brancos) possuíam diferenças genéticas, biológicas, intelectuais. Acreditava-se que
grupos sociais se desenvolveram isoladamente ou com pouco contato entre si, não
havendo espaço para a miscigenação e esse desenvolvimento havia ocorrido de
modo desigual, o que causou uma hierarquia entre as raças.
Esse pressuposto foi um terreno fértil para a elaboração de um conjunto de
ideias deterministas e etnocêntricas que afirmava que o homem branco era mais hábil,
44
mais inteligente, com maior capacidade de adaptação aos diferentes meios e
situações. Seguindo tal raciocínio, a Europa predominantemente branca contava
“naturalmente” com as condições mais adequadas para se apresentar como a
sociedade mais desenvolvida por possuir uma população com grande potencial de
inteligência, capacidade de trabalho e de desenvolvimento, que podia inclusive
escravizar ou dizimar outros povos em benefício da sua superioridade.
No entanto, essa prática não foi aplicada apenas pela Europa no período da
sua expansão territorial. A ideia de raça ajudou a conformar o pensamento de
dominação econômica, social, cultural e política que algumas sociedades
desenvolveram em todos os continentes do mundo em diferentes momentos da
história humana.
Hoje a ciência biológica já conta com evidências de que esse conceito não se
aplica aos seres humanos. A concepção de raça entendida como indivíduos com
patrimônios genéticos diferentes não existe, a menos que se adote a expressão “raça
humana”, expressão esta facilmente substituível por “espécie humana”.
Essa nova forma de ver as coisas ocorre, pois sabe-se hoje que todos os
grupos humanos contêm elementos genéticos de diferentes grupos étnicos (uns com
maior incidência que outros). Não se pode pensar em grupos geneticamente isolados
3MARTINS, Miguel. O racismo em números: A esmagadora maioria dos beneficiários do Brasil sem
Miséria é de negros, comprova levantamento do governo federal. Carta Capital, número 767, Janeiro
47
Falsos valores são reproduzidos na consciência social e falsas verdades são
interiorizadas na identidade dos grupos sociais e na identidade da sociedade como
um todo. Dessa forma o racismo acaba por ser um conjunto de discriminações e
exclusões que buscam ser ideologicamente justificadas a partir de deficiências físicas,
morais e intelectuais atribuídas aos indivíduos discriminados (DAMATTA, 1987).
No entanto, o que determina o preconceito e o O IBGE divulgou no ano de
que caracteriza a discriminação racial? Preconceito 2013 que cerca de três
se refere a construção mental originária de uma quartos dos beneficiários
predisposição a uma ideia e julgamento do programa Brasil Sem
preconcebidos a respeito de uma pessoa ou grupo de Miséria, que inclui o Bolsa
pessoas, ou seja, é o julgamento de algo sem a Família, o Brasil Carinhoso
realização de nenhuma ponderação, baseado na e o Pronatec, entre outros,
suspeita, na intolerância, na aversão ou ódio são negros.4
irracional.
A discriminação racial, por sua vez, é a manifestação comportamental do
preconceito. Consiste na materialização da separação, no ato em si de segregar. Tais
atos podem ser materializados em práticas individuais ou mesmo em práticas
institucionalizadas que violam os direitos sociais e humanos. O racismo brasileiro e a
identidade do “jeitinho brasileiro” foram historicamente construídos respectivamente a
partir do que DaMatta (1987) acredita ser a fábula das 3 raças e do que Sérgio
Buarque de Holanda (1995) acredita ser as raízes da colonização brasileira 5.
Miséria é de negros, comprova levantamento do governo federal. Carta Capital, número 767, Janeiro
de 2014. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/767/o-racismo-em-numeros-
6063.html> Acesso em out. 2016.
5 Ver mais sobre a “Fábula das 3 raças” e “Raízes do Brasil” na Unidade 4.
48
preguiçoso” tratam de reduzir grupos de indivíduos a um elemento em comum (o fato
de ser baiano, no exemplo citado). Como possui uma dimensão de preconceito, são
atribuídas a essas pessoas características negativas (a preguiça, no caso do exemplo
utilizado).
Os indivíduos que “olham de fora”, ao entrarem em contato com esse tipo de
discurso, adquirem e reproduzem um olhar preconcebido que os impedem de
perceber a totalidade da pessoa ou grupo observado. O estereótipo aparece como
uma forma rígida, anônima, que reproduz imagens e comportamentos racistas, separa
os indivíduos em categorias aceitáveis e não aceitáveis, constrói discursos e
identidades pejorativos. A identidade não é algo inato. Ela é construída em
determinado contexto histórico e cultural, com a incorporação pelo indivíduo de
referências, significados, formas de reconhecimento e representações simbólicas
coletivas. A partir dela é construída gradativamente a personalidade (DAMATTA,
1987).
No programa Brasil Carinhoso, que atende famílias com filhos de até 15 anos
de idade, a proporção de negros ou pardos chega a 77%. O número pode ser
explicado pela taxa de fecundidade6. Segundo estudo do Ipea7, enquanto entre
os negros a média de filhos por mulher é de 2,1, na população branca é de 1,6.
A diferença entre a média de filhos está associada, dentre outros fatores, aos
menores níveis de escolaridade e renda impostos historicamente à camada
negra da sociedade brasileira. Tais dados corroboram que a explicação para a
construção de uma identidade cultural passa antes de tudo pela constatação
dos elementos históricos e econômicos que caracterizam o contexto
sociocultural em que determinado grupo racial está inserido.
7IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Retrato das desigualdades de gênero e raça. 4ª
edição. Brasília, 2011. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/revista.pdf>. Acesso em out.
2016.
49
mundo social, adquirindo uma autoimagem a partir da forma como são tratadas e
identificadas pelas demais pessoas.
Quando tais referências coletivas são marcadas por componentes raciais
presentes nos estereótipos, a identidade do indivíduo pode refletir tais componentes
e construir uma autoimagem estereotipada. O mesmo ocorre com a identidade racial
de diferentes grupos sociais.
Ao tratar da influência do consciente coletivo sobre as consciências individuais,
Durkheim acredita que instituições/categorias como escola, família e religião
funcionam como instrumentos para a interiorização das regras socioculturais. É por
meio de tais instituições que interações são formadas, discursos/referências são
reproduzidos e, consequentemente, identidades individuais e coletivas são formadas.
50
Mesmo que os elementos dessa autodefinição sejam fruto de uma construção
social que não pode ser verificada empiricamente, eles servem de marco divisório
entre o “nós” e os “outros”.
No entanto, esses elementos podem ser variáveis com o passar do tempo, pois
eles podem ser modificados de acordo com as relações desenvolvidas. Novos perfis
podem ser desenvolvidos, pois significados são mudados de acordo com o contexto
(político, econômico, social, etc.), com o interlocutor, com os interesses envolvidos ou
os possíveis conflitos presentes na unidade étnica.
SÍNTESE DA UNIDADE
51
Os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE)8 e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)9 são indicadores
para se analisar de forma contextualizada a questão da formação da identidade
(racial, cultural e étnica). Os discursos produzidos pelo senso comum
necessitam de respaldo e muitas vezes produzem identidades estigmatizadas.
Construir uma opinião com base em dados que realmente traduzem a realidade
contribui para se derrubar conceitos pré-formados carregados de racismo e
que estimulam diversas formas de discriminação.
Glossário da Unidade 3
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Editora Companhia
das Letras, 1995.
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR
53