You are on page 1of 16

38

O AUTOR

Olá, estudantes. Sou o professor Regys Rodrigues da Mota. Sou bacharel (2007)
e licenciado (2008) em Ciências Sociais e mestre em Sociologia (2011) pela
Universidade Federal de Goiás. Durante os próximos meses, estaremos juntos
realizando uma série de atividades acadêmicas para que possamos aprofundar o
conhecimento sobre alguns dos temas abordados pela disciplina de Antropologia
e Cultura oferecida pela Faculdade Araguaia.

Vamos iniciar a disciplina de Antropologia e Cultura Brasileira. Acompanhe cada


unidade e leia com atenção todos os materiais. A interação e a troca de experiências
são muito importantes para a consolidação do conhecimento, sendo assim participe
de forma intensiva dos fóruns propostos.

É muito importante que você se dedique à leitura, às atividades e se comprometa em


realizar os exercícios propostos. Lembre-se de trocar informações com o tutor(a) e
com os colegas do curso. Tenho certeza de que juntos vamos alcançar o sucesso!

Bons estudos!

Professor Mestre Regys Rodrigues da Mota

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação - CIP

M917a Mota, Regys Rodrigues da


Antropologia e Cultura Brasileira / REGYS Rodrigues da
Mota – Goiânia: NUTEC, 2016.
65 p. : il. - (Educação a distância Araguaia).

Possui bibliografia.

1. Antropologia. 2. Educação a distância – Antropologia.


3. Educação superior. I. Faculdade Araguaia. II. Título.

CDU:
39(07)

Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Marta Claudino de


Moraes CRB-1928

39
FACULDADE ARAGUAIA - FARA
1º Edição - 2016

É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio e para qualquer
fim. Obra protegida pela Lei de Direitos Autorais

DIRETORIA GERAL:
Professor Mestre Arnaldo Cardoso Freire
DIRETORIA FINANCEIRA:
Professora Adriana Cardoso Freire
DIRETORIA ACADÊMICA
Professora Ana Angélica Cardoso Freire
DIRETORIA ADMINISTRATIVA
Professor Hernalde Menezes
DIRETORIA PEDAGÓGICA:
Professora Mestra Rita de Cássia Rodrigues Del Bianco
VICE-DIRETORIA PEDAGÓGICA
Professor Mestre Hamilcar Pereira e Costa
COORDENAÇÃO GERAL DO NÚCLEO DE TECNOLOGIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
Professora Especialista Terezinha de J. Araújo Castro
REVISÃO DE LÍNGUA PORTUGUESA
Isabel C. Melo Alencar
COORDENAÇÃO E REVISÃO TÉCNICA DE PRODUÇÃO DE CONTEÚDO EM VÍDEO E WEB
Professora Doutora Tatiana Carilly Oliveira Andrade
DESIGN GRÁFICO E EDITORIAL
Bruno Adan Vieira Haringl

FACULDADE ARAGUAIA
Unidade Centro – Polo de Apoio Presencial
Endereço: Rua 18 nº 81 - Centro - Goiânia-GO, CEP: 74.030-040
Fone: (62) 3224-8829
Unidade Bueno
Endereço: Av. T-10 nº 1.047, Setor Bueno - Goiânia-GO, CEP: 74.223-060
Fone: (62) 3274-3161
Site Institucional
www.faculdadearaguaia.edu.br

NÚCLEO DE TECNOLOGIA EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA


Polo Goiânia: Unidade Centro
Correio eletrônico: nutec@faculdadearaguaia.edu.br

40
SUMÁRIO

UNIDADE 3: IDENTIDADE E SIGNIFICADOS ......................................................... 42


3.1 Raça ou etnia? .................................................................................................... 44
3.2 As definições do racismo, do preconceito e da discriminação ............................ 47
3.3 Identidade racial e a estigmatização ................................................................... 48
3.4 Identidade étnica ................................................................................................. 50
Síntese da unidade ......................................................................................... 51
Atividade 3 ..................................................................................................... 52
Glossário ........................................................................................................ 52
BIBLIOGRAFIA BÁSICA DA UNIDADE .................................................................. 53
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR ......................................................................... 53

41
UNIDADE 3: IDENTIDADE E SIGNIFICADOS

Após a análise do desenvolvimento e da consolidação da antropologia


enquanto ciência, da compreensão de suas especificidades e métodos de
investigação e da compreensão da concepção da cultura a partir do prisma do
etnocentrismo e a partir da perspectiva relativista, é importante aprofundar o
conhecimento a respeito da formação da identidade sociocultural.
Falar de identidade sociocultural é falar em um processo histórico e cultural. O
presente se transforma a cada momento e se relaciona sempre com o passado, com
a ancestralidade e com a hereditariedade. Com isso é possível observar a identidade
cultural de uma nação ao analisar fatos que marcaram sua história, pois tais fatos
ecoam no presente e ecoarão no futuro. Significados são construídos a partir de
acontecimentos passados.
Significar consiste em atribuir sentido a algo. Os sentidos se encontram
presentes, por exemplo, na forma como utilizamos determinadas expressões
linguísticas, na maneira como compreendemos certas práticas sociais, certos rituais
religiosos ou mesmo os estereótipos que se associa a cor da pele de grupos de
indivíduos.
Segundo Durkheim (1960 apud ARON, 2002), todos esses significados são
provenientes do consciente coletivo que a sociedade possui. Quando nascemos, as
regras socioculturais já estão colocadas e nós as interiorizamos acreditando que
fazem parte da nossa natureza. Consequentemente, reproduzimos tais regras com o
decorrer da vida.
Esse consciente coletivo é construído historicamente e tende a buscar sempre
o equilíbrio com espaço para que poucas mudanças ocorram com o passar do tempo.
Dessa forma criam-se uma psique social e uma identidade cultural que perdura com
o passar de algumas gerações.

42
Durante a colonização, a cultura e os conhecimentos indígenas foram
determinantes para a formação de uma identidade nacional incorporando
na cultura brasileira elementos que perduram até hoje. Tanto que o
principal destaque nesse período foi a influência indígena na chamada
língua geral, uma língua derivada do tupi-guarani com termos da língua
portuguesa que serviu de língua franca no interior do Brasil até meados do
século XVIII, principalmente nas regiões de influência paulista e na região
amazônica. Atualmente, o português brasileiro guarda inúmeros termos de
origem indígena, especialmente derivados do tupi-guarani. Dentre eles
estão os nomes na designação de animais e plantas nativos como o jaguar,
a capivara e o ipê.

Um país como o Brasil com um histórico de escravidão indígena e negra tem a


sua identidade cultural construída em torno desse fato. A partir desse acontecimento,
constrói-se uma gama de significados muitas das vezes marcados por teor
racista/preconceituoso/discriminatório. Consequentemente, tais significados
influenciam na forma como grupos sociais operam com as suas identidades raciais.

Também recebeu forte influência indígena o folclore das regiões do interior


do Brasil, com os seres fantásticos como o curupira, o saci-pererê, o boitatá
e a Iara. Na culinária, a herança indígena está na mandioca, na erva-mate,
no açaí, na jabuticaba, nos inúmeros pescados e em pratos típicos como o
pirão. Apesar desses legados terem uma boa representatividade no país, a
influência indígena se faz mais forte em certas regiões brasileiras como o
Norte do Brasil, em que os grupos conseguiram se manter mais distantes da
ação colonizadora.

Mesmo com a integração na identidade nacional muitos dos elementos


oriundos da cultura indígena e da cultura africana, o fato de ter existido um longo
período de escravidão exercida pelos portugueses em relação ao índio e ao negro no
Brasil deixou marcas incorporadas na construção das identidades raciais no país.
A cultura e os conhecimentos dos povos indígenas acabaram por influenciar

43
parcialmente a língua, a culinária, o folclore e o uso de objetos, como as redes de
descanso. No entanto, a colonização europeia praticamente destruiu tribos nativas
não só fisicamente, com guerras e escravidão, como também culturalmente, pela ação
da catequese e intensa miscigenação com outras etnias. Por sua vez, os negros foram
trazidos ao país para servirem de mão de obra escrava. A abolição da escravidão não
representou uma mudança real desse status, pois foram marginalizados na
sociedade.
As consequências da colonização foram tamanhas que atualmente apenas
algumas nações indígenas ainda existem e conseguem manter parte da sua cultura
original. As consequências da escravidão foram tão profundas que ainda hoje é
possível constatar marcas traduzidas em diferenças impostas a brancos e negros em
vários setores econômicos e sociais.
Portanto, torna-se necessário discutir nessa Unidade 3 a utilização dos termos
raça e etnia dentro da antropologia, bem como as concepções de racismo, preconceito
e de discriminação. Na Unidade 4, iremos tratar das bases históricas de discursos que
engendraram na cultura brasileira algumas formas de racismo que interferiram na
formação da identidade da população brasileira.

3.1 Raça ou etnia?

Em certa medida o conceito de etnia surgiu, entre outros fatores, para substituir
o conceito de raça aplicado aos seres humanos. A ideia de raças humanas foi muito
difundida até o início do século XX justamente pela perspectiva
positivista/evolucionista na tentativa de justificar o domínio europeu exercido nas
colônias.
A palavra “raça” era utilizada tanto pelo senso comum quanto nos meios
acadêmicos para designar que diferentes grupos étnicos (negros, amarelos, índios e
brancos) possuíam diferenças genéticas, biológicas, intelectuais. Acreditava-se que
grupos sociais se desenvolveram isoladamente ou com pouco contato entre si, não
havendo espaço para a miscigenação e esse desenvolvimento havia ocorrido de
modo desigual, o que causou uma hierarquia entre as raças.
Esse pressuposto foi um terreno fértil para a elaboração de um conjunto de
ideias deterministas e etnocêntricas que afirmava que o homem branco era mais hábil,

44
mais inteligente, com maior capacidade de adaptação aos diferentes meios e
situações. Seguindo tal raciocínio, a Europa predominantemente branca contava
“naturalmente” com as condições mais adequadas para se apresentar como a
sociedade mais desenvolvida por possuir uma população com grande potencial de
inteligência, capacidade de trabalho e de desenvolvimento, que podia inclusive
escravizar ou dizimar outros povos em benefício da sua superioridade.
No entanto, essa prática não foi aplicada apenas pela Europa no período da
sua expansão territorial. A ideia de raça ajudou a conformar o pensamento de
dominação econômica, social, cultural e política que algumas sociedades
desenvolveram em todos os continentes do mundo em diferentes momentos da
história humana.
Hoje a ciência biológica já conta com evidências de que esse conceito não se
aplica aos seres humanos. A concepção de raça entendida como indivíduos com
patrimônios genéticos diferentes não existe, a menos que se adote a expressão “raça
humana”, expressão esta facilmente substituível por “espécie humana”.

Figura 6: Espécie humana

Fonte: Blogspot1 (2016)

Essa nova forma de ver as coisas ocorre, pois sabe-se hoje que todos os
grupos humanos contêm elementos genéticos de diferentes grupos étnicos (uns com
maior incidência que outros). Não se pode pensar em grupos geneticamente isolados

1 Disponível em: http://1.bp.blogspot.com/_jjm-


Ybx269Y/TLmpwYZ41QI/AAAAAAAAADY/LSkv0Wdx8Fk/s1600/art_racas.jpg. Acesso em out.2016.
45
porque, desde os primórdios, o ser humano viajou, desbravou terras longínquas, se
relacionou e se reproduziu com aqueles que encontrou.
Alguns segmentos das ciências sociais, por considerarem o conceito de raça
carregado de ideologias opressivas, e que seu uso poderia perpetuar e reificar as
justificativas naturalistas para as desigualdades entre grupos humanos, também
rejeitam essa expressão e preferem falar de etnia quando se referem a temáticas
relacionadas à questão racial.

Figura 7: Não existe justificativa genética para se considerar


que existem diferentes raças humanas

Fonte: História do Mundo2 (2016)

A perspectiva adotada por essas ciências sociais e ciências biológicas é que


há milhares de anos a humanidade vem se miscigenado e esse longo processo de
encontros e desencontros resultou na espécie humana, composta por inúmeras
etnias.
No entanto, vale ressaltar que não existe um consenso sobre essa substituição
de termos. Muitos trabalhos antropológicos se utilizam do conceito de raça, pois é esta
a classificação usual identificada pela população que possui formas próprias de
percepção e classificação social. O “não cientista” tipifica os indivíduos de acordo com
suas características perceptiv́ eis e, mais particularmente, visíveis fenotipicamente.

2 Disponível em: <http://historiadomundo.uol.com.br/upload/ProjetoGenoma.jpg> Acesso em out. 2016.


46
Acredita-se ainda que, ao se discutir a situação do negro na sociedade brasileira, por
exemplo, o termo raça é o mais apropriado, pois é o que consegue dar a verdadeira
dimensão do racismo que acontece nessa situação.
Os defensores da utilização dos dois termos como duas categorias distintas
consideram que etnia não se resume apenas a “cor da pele” ou outras características
físicas visíveis.
Etnia estaria muito mais ligada a
ideia de um grupo social cuja identidade é É possível afirmar que a invenção e
a persistência da noção de raça é
definida pelo compartilhamento da língua,
uma construção elaborada nas
da cultural, das tradições, etc. relações sociais que contém vários
Consequentemente, tendo essa componentes históricos e
econômicos que não podem ser
perspectiva por base, membros de grupos ignorados.
raciais diferentes poderiam pertencer a
um mesmo grupo étnico e membros de grupos étnicos distintos poderiam pertencer a
uma mesma raça.
No entanto, fazer a diferenciação dos conceitos de raça e etnia é importante,
pois permite a investigação de duas formas de identidade presentes na vida em
sociedade, a identidade racial e a identidade étnica.

3.2 As definições do racismo, do preconceito e da discriminação

O racismo consiste, por sua vez, em um movimento onde um determinado


grupo é colocado na posição de superioridade frente a outro(s) grupo(s). Acentuam-
se os atributos positivos do grupo que se acha superior e os atributos negativos do
grupo que é inferiorizado, retirando a humanidade deste último.
Ao analisar dados fornecidos pelo IBGE é possível constatar que o racismo
brasileiro, sustentado em três séculos de escravidão, é um fato incontestável.
A relação entre a miséria e a origem racial é tão profunda no país que
programas de transferência de renda destinados a eliminar a extrema pobreza
só poderiam fazê-lo ao beneficiar os negros. Isso ocorre, pois as camadas
sociais mais pobres são compostas majoritariamente pela parcela negra da
população do Brasil.3

3MARTINS, Miguel. O racismo em números: A esmagadora maioria dos beneficiários do Brasil sem
Miséria é de negros, comprova levantamento do governo federal. Carta Capital, número 767, Janeiro
47
Falsos valores são reproduzidos na consciência social e falsas verdades são
interiorizadas na identidade dos grupos sociais e na identidade da sociedade como
um todo. Dessa forma o racismo acaba por ser um conjunto de discriminações e
exclusões que buscam ser ideologicamente justificadas a partir de deficiências físicas,
morais e intelectuais atribuídas aos indivíduos discriminados (DAMATTA, 1987).
No entanto, o que determina o preconceito e o O IBGE divulgou no ano de
que caracteriza a discriminação racial? Preconceito 2013 que cerca de três
se refere a construção mental originária de uma quartos dos beneficiários
predisposição a uma ideia e julgamento do programa Brasil Sem
preconcebidos a respeito de uma pessoa ou grupo de Miséria, que inclui o Bolsa
pessoas, ou seja, é o julgamento de algo sem a Família, o Brasil Carinhoso
realização de nenhuma ponderação, baseado na e o Pronatec, entre outros,
suspeita, na intolerância, na aversão ou ódio são negros.4
irracional.
A discriminação racial, por sua vez, é a manifestação comportamental do
preconceito. Consiste na materialização da separação, no ato em si de segregar. Tais
atos podem ser materializados em práticas individuais ou mesmo em práticas
institucionalizadas que violam os direitos sociais e humanos. O racismo brasileiro e a
identidade do “jeitinho brasileiro” foram historicamente construídos respectivamente a
partir do que DaMatta (1987) acredita ser a fábula das 3 raças e do que Sérgio
Buarque de Holanda (1995) acredita ser as raízes da colonização brasileira 5.

3.3 Identidade racial e a estigmatização

A partir do preconceito e da discriminação criam-se os estereótipos. Os


estereótipos fazem referência às opiniões predeterminadas que criam “marcas”
imputadas às pessoas que possuem algo em comum. Discursos como “todo baiano é

de 2014. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/767/o-racismo-em-numeros-


6063.html> Acesso em out. 2016.
4MARTINS, Miguel. O racismo em números: A esmagadora maioria os beneficiários do Brasil sem

Miséria é de negros, comprova levantamento do governo federal. Carta Capital, número 767, Janeiro
de 2014. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/767/o-racismo-em-numeros-
6063.html> Acesso em out. 2016.
5 Ver mais sobre a “Fábula das 3 raças” e “Raízes do Brasil” na Unidade 4.

48
preguiçoso” tratam de reduzir grupos de indivíduos a um elemento em comum (o fato
de ser baiano, no exemplo citado). Como possui uma dimensão de preconceito, são
atribuídas a essas pessoas características negativas (a preguiça, no caso do exemplo
utilizado).
Os indivíduos que “olham de fora”, ao entrarem em contato com esse tipo de
discurso, adquirem e reproduzem um olhar preconcebido que os impedem de
perceber a totalidade da pessoa ou grupo observado. O estereótipo aparece como
uma forma rígida, anônima, que reproduz imagens e comportamentos racistas, separa
os indivíduos em categorias aceitáveis e não aceitáveis, constrói discursos e
identidades pejorativos. A identidade não é algo inato. Ela é construída em
determinado contexto histórico e cultural, com a incorporação pelo indivíduo de
referências, significados, formas de reconhecimento e representações simbólicas
coletivas. A partir dela é construída gradativamente a personalidade (DAMATTA,
1987).

No programa Brasil Carinhoso, que atende famílias com filhos de até 15 anos
de idade, a proporção de negros ou pardos chega a 77%. O número pode ser
explicado pela taxa de fecundidade6. Segundo estudo do Ipea7, enquanto entre
os negros a média de filhos por mulher é de 2,1, na população branca é de 1,6.
A diferença entre a média de filhos está associada, dentre outros fatores, aos
menores níveis de escolaridade e renda impostos historicamente à camada
negra da sociedade brasileira. Tais dados corroboram que a explicação para a
construção de uma identidade cultural passa antes de tudo pela constatação
dos elementos históricos e econômicos que caracterizam o contexto
sociocultural em que determinado grupo racial está inserido.

As interações sociais são os instrumentos de propagação das referências


coletivas e são a partir das interações que as crianças se percebem como parte do

6MARTINS, Miguel. O racismo em números: A esmagadora maioria os beneficiários do Brasil sem


Miséria é de negros, comprova levantamento do governo federal. Carta Capital, número 767, Janeiro
de 2014. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/revista/767/o-racismo-em-numeros-
6063.html> Acesso em out. 2016.

7IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Retrato das desigualdades de gênero e raça. 4ª
edição. Brasília, 2011. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/revista.pdf>. Acesso em out.
2016.
49
mundo social, adquirindo uma autoimagem a partir da forma como são tratadas e
identificadas pelas demais pessoas.
Quando tais referências coletivas são marcadas por componentes raciais
presentes nos estereótipos, a identidade do indivíduo pode refletir tais componentes
e construir uma autoimagem estereotipada. O mesmo ocorre com a identidade racial
de diferentes grupos sociais.
Ao tratar da influência do consciente coletivo sobre as consciências individuais,
Durkheim acredita que instituições/categorias como escola, família e religião
funcionam como instrumentos para a interiorização das regras socioculturais. É por
meio de tais instituições que interações são formadas, discursos/referências são
reproduzidos e, consequentemente, identidades individuais e coletivas são formadas.

3.4 Identidade étnica

Ao adotar a definição de que etnia trata muito mais de um grupo de pessoas


que compartilham elementos culturais é possível falar também na existência de
identidade étnica.
Essa forma de identidade repousa em princípios indispensáveis para que haja
a atração e a separação das populações. Esses princípios são conhecidos e
compartilhados pela maioria dos componentes do grupo em questão e fazem com que
os indivíduos se identifiquem como iguais, pertencentes ao mesmo grupo, aliados nos
momentos de conflito externo, portadores de um mesmo discurso a respeito de temas
pertinentes para o grupo, acreditando que possuem vários elementos em comum
(MELLO, 2003).
Mesmo nessa dimensão não necessariamente presa a elementos raciais existe
a construção de uma forma de segregação. Os integrantes de um grupo procuram, ao
mesmo tempo, se diferenciar daqueles que julgam diferentes e marcarmos a linha
divisória entre o “nós” e os “outros”.
É importante notar que a formação dessa forma de identidade passa pela
autodefinição das pessoas que fazem parte do grupo. Pertence a uma unidade étnica
quem se autodefine como tal, aquele que quer estar associado aos atributos de um
grupo, sejam eles relacionados a características físicas, econômicas, políticas, opção
sexual, relações de trabalho, etc.

50
Mesmo que os elementos dessa autodefinição sejam fruto de uma construção
social que não pode ser verificada empiricamente, eles servem de marco divisório
entre o “nós” e os “outros”.
No entanto, esses elementos podem ser variáveis com o passar do tempo, pois
eles podem ser modificados de acordo com as relações desenvolvidas. Novos perfis
podem ser desenvolvidos, pois significados são mudados de acordo com o contexto
(político, econômico, social, etc.), com o interlocutor, com os interesses envolvidos ou
os possíveis conflitos presentes na unidade étnica.

SÍNTESE DA UNIDADE

A formação da identidade cultural deve ser localizada no contexto em que é


produzida e de acordo com a história que carrega consigo. Fatos passados
influenciam nos significados atribuídos no presente. Um país como o Brasil com um
histórico de escravidão negra, tem a sua identidade cultural construída em torno desse
fato. A partir desse fato constrói-se uma gama de significados muitas das vezes
marcados por teor racista/preconceituoso/discriminatório. Consequentemente, tais
significados influenciam na forma como grupos sociais operam com as suas
identidades raciais.
A partir das interações sociais, referências construídas coletivamente tendo os
acontecimentos passados como base, são reproduzidas e instauram discursos
marcados muitas vezes por elementos racistas, preconceituosos e discriminatórios,
criando identidades raciais estigmatizadas.
Uma forma mais ampla de identidade consiste na identidade étnica. Ela não
leva em consideração apenas a cor da pele e sim os diferentes elementos
compartilhados por uma variedade de pessoas. O compartilhamento de tais elementos
confere a essas pessoas o sentimento de pertencimento a um mesmo grupo. No
entanto, apesar de mais ampla, essa forma de identidade também possui um
dimensionamento de segregação já que existe normalmente uma diferenciação entre
o “nós” e os “outros”.

51
Os dados apresentados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE)8 e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA)9 são indicadores
para se analisar de forma contextualizada a questão da formação da identidade
(racial, cultural e étnica). Os discursos produzidos pelo senso comum
necessitam de respaldo e muitas vezes produzem identidades estigmatizadas.
Construir uma opinião com base em dados que realmente traduzem a realidade
contribui para se derrubar conceitos pré-formados carregados de racismo e
que estimulam diversas formas de discriminação.

Atividade 3: Fórum de discussão

A diferenciação dos conceitos de raça e etnia permite a investigação de duas formas


de identidades presentes na vida em sociedade, a identidade racial e a étnica. Procure
discutir a respeito das características constituitivas dessas identidades abordando os
elementos segregatórios presentes em cada uma delas (máximo de 20 linhas).

Para a participação no fórum é necessária a leitura da Unidade 3

Glossário da Unidade 3

Estigmatizar: marcar, tachar, classificar, criticar, condenar, censurar.

Etnia: grupo de indivíduos que se diferencia por suas especificidades socioculturais


(MELLO,2003)

8Você pode acessar o banco de dados do IBGE pelo endereço eletrônico:


<http://www.ibge.gov.br/home/>.
9Você pode acessar o banco de dados do IPEA pelo endereço eletrônico:
<http://www.ipea.gov.br/portal/>.
52
BIBLIOGRAFIA BÁSICA

DAMATTA, Roberto. Relativizando: Uma introdução à antropologia social. Rio de


Janeiro: Editora Rocco, 1987.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Editora Companhia
das Letras, 1995.

LAPLANTINE, François. Aprender Antropologia. São Paulo: Editora Brasiliense,


1988.

MAZZOLENI, Gilberto. O Planeta Cultural: para uma antropologia histórica. São


Paulo: Editora USP, 2008.

MELLO, Luiz Gonzaga de. Antropologia Cultural: iniciação, teoria e temas.


Petrópolis: Editora Vozes, 2003.

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. São Paulo: Editora


Martins Fontes, 2002.

53

You might also like