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AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DO FUNDÃO

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS
PROVA DE ESCOLA DE PORTUGUÊS 10º ANO
fevereiro de 2023

EDUCAÇÃO LITERÁRIA
A
Lê o texto seguinte. Consulta o vocabulário apresentado.

Lia. […] Inês está concertada Ainda que eu vos vi


pera casar com alguém? est'outro dia folgar
Mãe Até 'gora com ninguém e nam quisestes bailar
não é ela embaraçada.1 40 nem cantar diante mi...»
5 Lia. Em nome do anjo bento
eu vos trago um casamento. Inês Na voda de seu avô,
Filha, não sei se vos praz.2 ou onde me viu ora ele?
Inês E quando, Lianor Vaz? Lianor Vaz, este é ele?
Lia. Já vos trago aviamento.3 Lia. Lede a carta sem dó,8
Inês Porém, não hei-de casar 45 que inda eu sam contente dele.
10 senão com homem avisado.4
Ainda que pobre e pelado, Prossegue Inês Pereira a carta:
seja discreto em falar. «Nem cantar presente mi.
Eu vos trago um bom marido, Pois Deos sabe a rebentinha9
Lia. rico, honrado, conhecido. 50 que me fizestes então.
15 Diz que em camisa vos quer.5 Ora, Inês, que hajais benção
Primeiro eu hei-de saber de vosso pai e a minha,
Inês se é parvo, se sabido. que venha isto a concrusão.
Nesta carta que aqui vem
Lia. pera vós, filha, d'amores, Inês Vistes tão parvo vilão?
20 veredes vós, minhas flores, 55 Eu nunca tal cousa vi
a descrição que ele tem. Nem tanto fora de mão.
Mostrai-ma cá, quero ver.
Inês Tomai. E sabedes vós ler? Lia. Queres casar a prazer
Lia. Hui! ela sabe latim, no tempo d'agora, Inês?
25 Mãe e gramáteca, e alfaqui6 Antes casa em que te pês,10
e tudo quanto ela quer! 60 que não é tempo d'escolher.
Sempre eu ouvi dizer:
Lê Inês Pereira a carta: «ou seja sapo ou sapinho,
ou marido ou maridinho,
«Senhora amiga Inês Pereira, tenha o que houver mister.» 11
30 Pero Marques, vosso amigo, Este é o certo caminho.
que ora estou na nossa aldea
mesmo na vossa mercea NOTAS
m' encomendo7. E mais digo, 1
comprometida; 2agrada; 3 arranjo de vida; 4
digo que benza-vos Deos, discreto; 5 diz que vos aceita sem dote; 6 a Mãe
35 que vos fez de tão bom jeito. pretende mostrar que a filha é culta; 7
recomendo-me a vossa mercê; 8 sem vos
Bom prazer e bom proveito
agastardes; 9 fúria; 10 casa mesmo contrariada;
veja vossa mãe de vós. 11
tenha o que necessário for.
Responde, de forma clara e completa, às questões sobre o texto.

1- Indica as características que Inês Pereira considera essenciais no homem que escolherá para
marido, justificando com expressões textuais. (25 pontos)

2- Demonstra de que modo a carta de Pero Marques revela traços da sua personalidade. (25
pontos)

3- Esclareça a reação de Inês à carta recebida. (25 pontos)

4- Associa as personagens (referidas na coluna A) às respetivas características (coluna B), de


modo a obter afirmações verdadeiras. (10 pontos)
COLUNA A COLUNA B
[1] elogia os clérigos por serem bons conselheiros.
[2] é um homem honesto, puro e simples, mas rude e ingénuo.
[3] é preguiçosa, caprichosa e vê o casamento como uma forma
de libertação.
[4] simboliza o poder económico.
(A)Pero Marques
[5] é um homem adulador, simpático e astuto. Contudo, acaba
por se revelar intolerante, desrespeitador e cobarde.
(B) A mãe de Inês
[6] é conselheira, consciente dos problemas que o casamento
poderá acarretar, mas não impõe a sua vontade.
(C) Lianor Vaz
[7] aproveita-se da leviandade de Inês e leva-a a cometer
adultério.
[8] é persistente no seu ofício de casamenteira.
[9] aceita casar com Pero Marques, numa atitude de desafio à
Mãe.

EDUCAÇÃO LITERÁRIA
C

Num texto expositivo, em português padrão europeu, apresenta as cantigas de escárnio e


maldizer presentes na época trovadoresca.

Notas –texto B

1.joelhos; 2. queixavam; 3. desaventurada, infeliz; 4. desgraças; 5. zonas limítrofes da cidade; 6. olhai; 7.


confiança; 8. libertação; 9. não teve quinhão de, não tomou parte em.
EDUCAÇÃO LITERÁRIA
B
Lê o excerto da Crónica de D. João I, de Fernão Lopes, retirado do capítulo 148 («Das tribulações que Lisboa
padecia per míngua de mantimentos») que se refere à situação vivenciada pelo povo de Lisboa dentro das muralhas
da cidade durante o cerco castelhano.
Ó quantas vezes encomendavam nas missas e pregações que rogassem a Deus
devotamente por o estado da cidade! E, ficando os geolhos 1, beijando a terra, bradavam a Deus
que lhes acorresse, e suas prezes nom eram compridas! Uns choravam antre si, maldizendo
seus dias, queixando-se por que tanto viviam, como se dissessem com o Profeta: «Ora viesse a
5 morte ante do tempo, e a terra cobrisse nossas faces, pera nom vermos tantos males!» Assi que
rogavam a morte que os levasse, dizendo que melhor lhe fora morrer, que lhe serem cada dia
renovados desvairados padecimentos. Outros se querelavam 2 a seus amigos, dizendo que
foram desaventuirada3 gente, que se ante nom deram a el-Rei de Castela que cada dia padecer
novas misquindades 4, firmando-se de todo nas piores cousas que Fortuna em isto podia obrar.
10 Sabia porém isto o Mestre e os de seu Conselho, e eram-lhe dolorosas d’ouvir tais novas. E
vendo estes males a que acorrer nom podiam, cerravam suas orelhas do rumor do povo.
Como nom quereis que maldissessem sa vida e desejassem morrer alguns homens e
mulheres, que tanta diferença há d’ouvir estas cousas àqueles que as entom passaram , como
há da vida à morte?
15 Os padres e madres viam estalar de fame os filhos que muito amavam, rompiam as faces
e peitos sobr’eles, nom tendo com que lhe acorrer, senom planto e espargimento de lágrimas; e
sobre todo isto, medo grande da cruel vingança que entendiam que el-Rei de Castela deles
havia de tomar. Assi que eles padeciam duas grandes guerras, uma dos imigos que os cercados
tinham, e outra dos mantimentos que lhes minguavam, de guisa que eram postos em cuidado
20 de se defender da morte per duas guisas
Pera que é dizer mais de tais falecimentos? Foi tamanho o gasto das cousas que mester
haviam que soou um dia pela cidade que o Mestre mandava deitar fora todolos que nom
tivessem pão que comer, e que somente os que o tivessem ficassem em ela; mas quem poderia
ouvir sem gemidos e sem choro tal ordenança de mandado àqueles que o nom tinham? Porém
25 sabendo que nom era assi, foi-lhe já quanto de conforto.
Onde sabei que esta fame e falecimento que as gentes assi padeciam, nom era por ser o
cerco prelongado, ca nom havia tanto tempo que Lisboa era cercada; mas era per azo das
muitas gentes que se a ela colheram de todo o termo 5; e isso mesmo da frota do Porto quando
veio, e os mantimentos serem muito poucos.
Ora esguardai6 como se fosseis presente, uma tal cidade assi desconfortada e sem
30
nenhuma certa fiúza7 de seu livramento8, como viveriam em desvairados cuidados quem sofria
ondas de tais aflições! Oh geraçom que depois veio, povo bem aventuirado, que nom soube
parte de tantos males, nem foi quinhoeiro de 9 tais padecimentos! Os quais a Deus por Sua
mercê prougue de cedo abreviar doutra guisa, como acerca ouvires.
Crónica de D. João I de Fernão Lopes (ed. de Teresa Amado), Lisboa, Editorial Comunicação, 1992.

Responde, de forma clara e completa, às questões sobre o texto.

5. Relê o primeiro parágrafo do excerto.


5.1 Explicita duas atitudes dos habitantes perante as dificuldades que se lhes deparam.

6. Relaciona as referências ao Mestre com a intenção de fornecer desta personalidade uma


imagem de humanidade.

7. Exemplifica e interpreta, no contexto em que surgem, os seguintes aspetos textuais:


7.1- interrogação retórica
7.2- exclamação
7.3- citação

GRUPO I

TEXTO A

1. Inês Pereira ambiciona casar com um homem cortesão, isto é, que frequente ambientes palacianos,
que saiba falar bem, que lhe permita levar uma vida aprazível, (“Porém, não hei-de casar / senão
com homem avisado”. vv.10-11) (”seja discreto em falar”, v.13)”
Inês aceita-o mesmo que não possua bens materiais, como se depreende da seguinte passagem:
“Ainda que pobre e pelado, (v. 11)
Impõe ainda como condição ser um homem instruído e perspicaz “Primeiro eu hei-de saber / se é
parvo, se sabido.” (vv. 16-17).

2. A carta de Pero Marques revela a sua simplicidade, a sua ingenuidade e a sua rudeza de
espírito; dirige-se a Inês chamando-lhe “Senhora amiga” (v. 28), pede a Deus que a abençoe e que
dê à sua mãe “bom prazer e bom proveito” (v. 35).
Tem poucos modos pois, de forma um pouco rude, lamenta que Inês o tenha ignorado num
baile. (“nam quisestes bailar /nem cantar diante mi” vv40-41)
Apesar de ser um homem pouco cortês e expressando-se de forma desajeitada, ele é puro e com
boas intenções, pois, de forma séria, pede Inês em casamento.

3. Inês rejeita determinantemente a proposta.


Ela fica incrédula (“este é ele?”, v. 43), demonstrando claramente que Pero Marques não é o
homem que ela deseja ter como marido, pois considera-o grosseiro, imbecil e disparatado (“Vistes
tão parvo vilão?/ Eu nunca tal cousa vi/ Nem tanto fora de mão.” vv. 53-55)

4-
A– 2
B– 6
C– 8

Correção Fernão Lopes

5. Os habitantes tomam duas atitudes, perante as dificuldades que se lhes deparam.


Primeiro, revelam uma postura introvertida, em que as pessoas choravam sozinhas e se
lamentavam dizendo que preferiam a morte às desgraças que viviam.
Depois, têm uma postura diferente da anterior, dirigida para o exterior, pois havia habitantes que
se queixavam aos amigos, concluindo que sofriam por não se terem rendido ao exército castelhano.

6. Notam-se duas referências ao Mestre de Avis: na primeira, ele comove-se com o sofrimento da
população (mostrando a sua fragilidade e sensibilidade); na segunda referência, relata-se um rumor
que circulava pela cidade, de que o Mestre quereria expulsar de Lisboa quem já não tivesse pão, sendo
que este rumor não se confirmou.
As duas referências mostram que o Mestre de Avis era um bom estratega e se preocupava, de
facto, com a população.

7.1-Exemplo de interrogação retórica: “Como nom querees que maldissessem sa vida e desejassem
morrer alguũs homẽes e molheres, que tanta diferença há d’ouvir estas cousas aaqueles que as
entom passarom , como há da vida aa morte?” (ll.12-14)

7.2- Exemplo de exclamação: Destaca-se a do último parágrafo: “Ó geeraçom que depois veo,
poboo bem aventuirado, que nom soube parte de tantos males, nem foi quinhoeiro de taes
padecimentos!” (ll 30-33)
7.3- Exemplo de citação: «Ora veese a morte ante do tempo, e a terra cobrisse nossas faces, pera
nom veermos tantos males!» (ll. 4-5)

Os três recursos contribuem para a compreensão dos protagonistas e assim aprofundar a empatia do
leitor.

C-
A sátira trovadoresca constitui uma poesia com caráter social e lúdico. O seu objetivo primordial é
criticar os costumes e vícios da sociedade, constituindo, pois, uma fonte documental bastante
importante, uma vez que revela aspetos cruciais do quotidiano de então. O cómico e a ironia
constituem-se, igualmente, como instrumentos que concorrem para essa missão de denúncia,
tornando-a mais divertida, mas também mais mordaz. Essa crítica pode ser individual e subjetiva ou
representativa de tipos sociais.

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