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Apostila de Libras -

Língua de Sinais
Brasileira

Profª Jaqson Alves Santos


Libras, ou Língua Brasileira de Sinais (LSB), é a língua materna dos surdos
brasileiros e, como tal, poderá ser aprendida por qualquer pessoa interessada pela comunicação
com essa comunidade. Como língua, esta é composta de todos os componentes pertinentes às
línguas orais, como gramática semântica, pragmática sintaxe e outros elementos, preenchendo,
assim, os requisitos científicos para ser considerada instrumental linguístico de poder e força.
Possui todos os elementos classificatórios identificáveis de uma língua e demanda de prática
para seu aprendizado, como qualquer outra língua. Foi na década de 60 que as línguas de sinais
foram estudadas e analisadas, passando então a ocupar um status de língua. É uma língua viva
e autônoma, reconhecida pela linguística. Pesquisas com filhos surdos de pais surdos
estabelecem que a aquisição precoce da Língua de Sinais dentro do lar é um benefício e que
esta aquisição contribui para o aprendizado da língua oral como segunda língua para os surdos.

Os estudos em indivíduos surdos demonstram que a Língua de Sinais apresenta uma


organização neural semelhante à língua oral, ou seja, que esta se organiza no cérebro da mesma
maneira que as línguas faladas. A Língua de Sinais apresenta, por ser uma língua, um período
crítico precoce para sua aquisição, considerando-se que a forma de comunicação natural é
aquela para o qual o sujeito está mais bem preparado, levando-se em conta a noção de conforto
estabelecido diante de qualquer tipo de aquisição na tenra idade, ou seja, esta linguagem pode
ser ensinada e para os mais novos (crianças) trazendo em seu contexto as noções básicas. Uma
semelhança entre as línguas é que todas são estruturadas a partir de unidades mínimas que
formam unidades mais complexas, ou seja, todas possuem os seguintes níveis linguísticos: o
fonológico, o morfológico, o sintático e o semântico. No nível fonológico estão os fonemas.
Os fonemas só têm valor contrastivo, não têm significado mas, a partir das regras de cada
língua, eles se combinam para formar os morfemas e estes, as palavras. Na língua portuguesa,
por exemplo, os fonemas /m/ /n/ /s/ /a/ /e/ /i/ podem se combinar e formar a palavra meninas.
No nível morfológico, esta palavra é formada pelos morfemas {menin-} {-a} {-s}.
Diferentemente dos fonemas, cada um destes morfemas tem um significado: {menin-} é o
radical desta palavra e significa "criança", "não adulto"; o morfema {-a} significa "gênero
feminino" e o morfema {-s} significa "plural". No nível sintático, esta palavra pode se
combinar com outras para formar a frase, que precisa ter um sentido e coerência com o
significado das palavras em um contexto, o que corresponde aos níveis semântico (significado)
e pragmático (sentido no contexto: onde está sendo usada) respectivamente. Assim o nível
semântico permeia o morfossintático. Outra semelhança entre as línguas é que os usuários de
qualquer língua podem expressar seus pensamentos diferentemente, por isso uma pessoa que
fala uma determinada língua utiliza essa língua de acordo com o contexto, portanto o modo de
se falar com um amigo não é igual ao de se falar com uma pessoa estranha; assim, quando se
aprende uma língua está aprendendo também a utilizá-la a partir do contexto. Outra
semelhança também é que todas as línguas possuem diferenças quanto ao seu uso em relação
à região, ao grupo social, à faixa etária e ao gênero. O ensino oficial de uma língua sempre
trabalha com a norma culta, a norma padrão, que é utilizada na forma escrita e falada e sempre
toma alguma região e um grupo social como padrão. Ao se atribuir às línguas de sinais o status
de língua é porque elas, embora sendo de modalidade diferente, possuem também estas
características em relação às diferenças regionais, sócio-culturais, entre outras, e em relação
às suas estruturas porque elas também são compostas pelos níveis descritos acima.
O que é denominado de palavra ou item lexical nas línguas orais-auditivas, são
denominados sinais nas línguas de sinais. Os sinais são formados a partir da combinação do
movimento das mãos com um determinado formato em um determinado lugar, podendo este
lugar ser uma parte do corpo ou um espaço em frente ao corpo. Estas articulações das mãos,
que podem ser comparadas aos fonemas e às vezes aos morfemas, são chamadas de
parâmetros.
Meu E-mail:

Jaqson.santos@ufsb.edu.br
NÚMEROS
1- Números Representativos de Código

2- Números para se Referir a Quantidade

3- Números Ordinais
SUMÁRIO

Apresentação ...................................................................................... 07
Unidade 1: História, cultura e identidade ......................................... 09
Artigo: 1 Considerações sobre a relação dos surdos com a linguagem:
dos primórdios à contemporaneidade............................................. 10
1.1 Considerações iniciais .............................................................. 11
1.2 Primeiras abordagens: da teologia à ciência ......................... 12
1.3 Consensos teóricos e achados científicos ................................ 16
1.4 Perspectivas atuais: culturas e identidades surdas .................. 18
1.5 Considerações finais ............................................................... 22
1.6 Referências ............................................................................. 23
Unidade 2: Educação de Surdos...................................................... 26
2.1 A legislação ......................................................................... 26
2.2 Escola especial e escola inclusiva: há diferenças? ................... 28
2.3 O surdo na sala de aula ........................................................ 29
2.4 Finalizando a conversa ............................................................ 33
2.5 Referências ............................................................................. 33
Unidade 3: Estudos Linguísticos .......................................................... 35
3.1 Língua e linguagem .............................................................. 36
3.2 O alfabeto manual ............................................................... 38
3.3 Iconicidade ou arbitrariedade? ............................................. 39
3.4 Empréstimos Linguísticos ........................................................ 40
3.5 Variação linguística .................................................................. 41
3.6 Parâmetros fonológicos ........................................................... 42
3.7 O espaço de sinalização ....................................................... 46
3.8 Como os surdos adquirem a Libras? ........................................ 47
3.9 Referências ............................................................................. 48
Unidade 4: Prática Linguística ......................................................... 49
4.1 Apresentação: sinal pessoal e nome ....................................... 50
4.2 Cumprimentos ..................................................................... 51
4.3 Pronomes pessoais ................................................................. 52
4.4 Pronomes interrogativos .......................................................... 53
4.5 Expressões não-manuais ............................................................. 54
4.6 Tipos de frases ..................................................................... 56
4.7 Sistemas numéricos .................................................................... 62
SUMÁRIO

4.8 Marcação temporal ................................................................ 64


4.9 Verbos e adjetivos ................................................................. 70
4.10 Classificados ........................................................................... 75
4.11 Ordem básica da frase ......................................................... 77
4.12 Para finalizar ............................................................................. 78
4.13 Referências ............................................................................. 78
Glossário ............................................................................................... 81
Resumo ............................................................................................. 83
Referências básicas, complementares e suplementares ......................... 87
Atividades de Aprendizagem - AA ...................................................... 91
Anexo 01 – Lei 10.436/02. .................................................................... 94
Anexo 02 – Decreto 5.626/05................................................................ 95
APRESENTAÇÃO

SOARES, Charley Pereira; RIBEIRO, Maria Clara Maciel de Araújo; BRITO, Rejane Cristina
de Carvalho. Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS. Caderno Didático do Curso de Letras
Português a Distância da Unimontes. Universidade Aberta do Brasil - UAB. Montes Claros:
Ed. Unimontes, 2010.

Olá, acadêmico! Este é o caderno didático da disciplina Libras.


Neste período você vai conhecer de perto a língua visual utilizada pelas
pessoas surdas do Brasil: a Língua Brasileira de Sinais, conhecida como
Libras ou como LSB. Quais são as suas expectativas para esta disciplina? Está
animado e curioso? Esperamos que sim! Você vai adentrar agora em um
mundo novo e certamente fará descobertas surpreendentes.
Você pode estar se perguntando: porque eu tenho Libras na estru-
tura curricular do meu curso? Ora, primeiramente porque, como profissio-
nal da educação, você deve conhecer a clientela que irá atender. A inclusão
educacional, acadêmico, configura-se hoje como uma realidade concreta,
não mais imaginada, já vivenciada por professores e alunos. Diante disso, o
decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005, recomenda a inserção da
disciplina Libras em todos os cursos de formação de professores.
Em segundo lugar porque aprender línguas expande a capacidade
da mente humana e nos permite experimentar o mundo, por um instante, a
partir dos olhos dos outros. Cada língua veicula a cultura e os esquemas
cognitivos de seu povo. Se existirem mil línguas no mundo, mil serão as
formas de compreender a nossa existência. E quando novas línguas se
deslindam diante de nós, deslindamo-nos também diante delas, pois
reinventamo-nos enquanto sujeitos sócio comunicacionais.
O nosso objetivo, neste caderno, não é apenas instrumentalizá-lo
para o uso e compreensão da Libras. Esse objetivo, puro e seco, poderia ser
atingido em cursos livres, estirpados do ensino superior. Para fazer sentido, o
ensino de Libras no ensino superior tem que extrapolar a abordagem instru-
mentalista, fomentando reflexões de ordem linguística, política e educacio-
nal.
Neste caderno você irá se deparar com uma abordagem moderna
sobre os surdos e a Língua Brasileira de Sinais. É possível que estranhe no
começo, mas à medida em que for se embrenhando pelo mundo da visuali-
dade, certamente irá construir novos conceitos sobre os surdos e a Libras.
Na Unidade I você irá vislumbrar a história do povo surdo ao longo
do tempo e poderá tirar suas próprias conclusões sobre os processos opressi-
vos, historicamente vivenciados pelas pessoas surdas. Verá também que
toda língua pressupõe uma cultura e que importantes processos identitários
são construídos nessa relação.

7
Caderno Didático

Na Unidade II você conhecerá as justificativas para a consolida-


ção de escolas ditas inclusivas e poderá refletir sobre as diferenças de
abordagem entre escolas especiais e escolas inclusivas. Além disso, terá
ainda a oportunidade de discutir sobre o ensino de português para surdos e
sobre o papel do intérprete educacional.
Na Unidade III você irá conhecer uma parcela dos estudos linguís-
ticos sobre a Libras. A partir deles você poderá construir uma base teórica
que dará sustentabilidade ao processo de aprendizagem da Libras. Entre
outras coisas, verá que o sinal pode ser segmentado e que existem sinais
imagéticos e não-imagéticos.
Na Unidade IV você aprenderá a sinalizar. Conhecerá as formas de
cumprimentar pessoas em Libras, de marcar o tempo verbal nas sentenças e
entenderá a importância das expressões faciais nas línguas sinalizadas. De
posse do seu DVD, poderá visualizar sinais, sentenças e diálogos em Libras.
Ao fim da disciplina esperamos que você tenha se libertado dos
mitos sociais sobre os surdos e que seja capaz de construir reflexões próprias
sobre a Libras e o povo que se utiliza dela. Não há língua sem povo e não há
povo sem cultura. Conhecer a Libras é conhecer um pouco da cultura surda
e da visão dos surdos sobre o mundo.
Bons estudos!

8
UNIDADE 1
Caro acadêmico, nesta unidade você conhecerá um pouco da
história dos falantes nativos das línguas visuais: os surdos. Verá que a surdez
tem sido compreendida de diferentes maneiras ao longo da história da
humanidade e que, atualmente, o fortalecimento político e social do povo
surdo, unido a descobertas acadêmicas sobre as línguas de sinais, têm
proporcionado aos surdos novas e promissoras formas de ser e estar no
mundo. Você já reparou que hoje em dia os surdos têm mais visibilidade do
que no passado? Costumamos ver surdos em lugares em que não víamos
antes. Hoje, eles estão ao nosso lado nas escolas e nas universidades, como
alunos e como professores; estão nas empresas públicas e privadas; estão
produzindo artes cênicas e visuais; estão projetando, enfim, para si e para os
seus comparsas, um futuro melhor.
Poderíamos dizer, então, que com o passar do tempo, os surdos
tornaram-se mais capazes? A resposta seria: sim e não. Não quando
pensamos que eles sempre o foram, uma vez que hoje se sabe que a falta de
audição, em si mesma, não prejudica o desenvolvimento das competências
e habilidades humanas. Surdos podem ser intelectualmente brilhantes e
podem desenvolver-se no mundo tais quais os ouvintes. Sim quando
pensamos que por séculos surdos foram vistos como incapacitados e que,
por esse motivo, foram mantidos exclusos dos processos sociais, recebendo
poucas oportunidades de desenvolvimento. Atualmente, contudo, após
uma série de pesquisas, pudemos finalmente entender que, nos surdos, há
uma substituição de sentidos e de línguas, não uma falta. E que em torno
dessa língua constrói-se culturas, comunidades e processos identitários
específicos. Esse entendimento tem reconstruído a imagem social do surdo
e, com isso, vemos as suas possibilidades de desenvolvimento serem
alargadas, uma vez que a sociedade, de modo geral, começa a entender
que ser surdo não é ser deficiente, mas, sim, ser diferente linguística e
culturalmente.
Para abordar essas e outras questões, acadêmico, apresentamos a
você um artigo escrito por uma das autoras deste caderno. O artigo discutirá
questões históricas, linguísticas e culturais relacionadas aos surdos, além de
apresentar a você duas distintas formas de se conceber os surdos
atualmente. Vamos à leitura? Ao concluí-la, registre no seu diário de bordo
pelo menos três descobertas que você fez sobre os surdos, ok? Boa leitura!

9
1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A RELAÇÃO DOS SURDOS COM A
LINGUAGEM: DOS PRIMÓRDIOS À CONTEMPORANEIDADE
Maria Clara Maciel de Araújo Ribeiro

Considerations on the relationship of the deaf and language: from


beginning to the present

Eu tive de passar por muita coisa para ter identidade


DICAS própria, a de ser surda, tive de lutar, combater para
chegar aqui, antes eu era mais como “cópia de
ouvinte”, muito submissa no poder dos ouvintes, estas
histórias de ouvintes que acham que ali e aquilo é
1
Disponível em: certinho para o surdo, por exemplo, é preciso falar bem
http://www.geocities.com/HotS e ler lábios para ter o mesmo “patamar” que os ouvintes
prings/7455/patricia.html. (...). Depoimento de uma surda militante1.
Acesso em: junho de 2008
Resumo: A partir dos Estudos Surdos, este artigo aborda, em
uma perspectiva linguístico-histórica, as formas de se conceber o surdo
e a sua relação com a linguagem, da Antiguidade aos tempos atuais.
Devido em grande medida a descobertas científicas sobre as línguas de
sinais, a imagem social da surdez vem sendo reconstruída. De
amaldiçoados por Deus, os surdos passaram a ser considerados
minorias linguísticas e sociais. Veremos que, atualmente, duas são as
principais formas de se abordar a surdez: a primeira, oriunda do
domínio clínico-terapêutico e, a segunda, do linguístico-antropológico.
A filiação a uma ou a outra concepção determinará se, ao falar de
surdos, estaremos tratando de sujeitos deficientes, sobre os quais
exercemos um poder administrativo e atribuímos uma visão
normalizadora, ou de um povo específico, com língua, cultura e
identidade própria.

Palavras-Chave: surdez, linguagem, língua de sinais, cultura,


identidade.

Abstract: From the Deaf Studies, this paper focuses on a


linguistic-historical perspective, ways of conceiving the deaf and its
relationship to language, from antiquity to modern times. Due largely to
scientific discoveries about sign languages, the social image of deafness
has been rebuilt. From cursed by God, the deaf have been considered
now to be social and linguistic minorities. We will see that currently
there are two main ways of approaching deafness: the first from clinical
and therapeutic area, the second from the linguistic-anthropological
area. Membership to one or another approach will determine whether,
in speaking of the deaf, we are dealing with disabled individuals, on

10
Língua Brasileira de Sinais-Libras

whom we exercise administrative powers and assign a normative vision;


or dealing with a specific people, with language, culture and identity

Keywords: deafness, language, sign language, culture, identity.

1.1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Nas últimas décadas, assistimos à reinvenção da surdez: de


sujeitos deficitários, os surdos passaram a ser considerados sujeitos
linguística e culturalmente específicos. De modo geral, um fenômeno,
de alguma forma recente, pode ser observado nas universidades
brasileiras: pesquisar fenômenos relativos à surdez já não é privilégio
das Ciências da Saúde. O interesse pelo povo surdo chegou às Ciências
Humanas, valendo-se aqui de uma riqueza transdisciplinar que
ressignifica sujeitos, contextos e processos. Ressignificados em uma
área outra do conhecimento, a preocupação com os surdos ultrapassa
agora as fronteiras da Educação stricto-sensu, primeira área das
Ciências Humanas a se preocupar com tais sujeitos, fazendo crescer a
incidência de pesquisas sobre os surdos em todas as áreas das chamadas
Humanidades, entre elas, sobretudo, as Ciências da Linguagem.
Pode-se dizer que dois eventos contribuíram para esta
conquista: o primeiro, de cunho social, sobreveio dos
questionamentos, das reivindicações e união da própria comunidade
surda que, a partir do Movimento Surdo, fez-se visível e audível. O DICAS
segundo, de cunho acadêmico-científico, iniciou-se pela constatação
científica de que as línguas de sinais são sistemas linguísticos completos
e multiarticulados, tendo sua continuidade no surgimento dos Estudos 2
Os Estudos Surdos são
2
Surdos e nas suas novas formas de se conceber o povo surdo nas compreendidos como uma
ciências humanas. área interdisciplinar de estudos
que tem como grande área os
Como resultado, vemos que o entendimento acerca da surdez Estudos Culturais. Estabelece-
vem se renovando ao logo do tempo. Surdos já não vivem mais se, de maneira ampla, como
um percurso teórico que
recatados, enclausurados em escolas especiais, longe dos olhos e da
estuda, nas comunidades de
consciência da sociedade. Hoje eles estão ao nosso lado, nas escolas e surdos, questões de ordem
nos empregos, na política e na arte e ainda vão além: produzem uma linguística, educacional,
histórica, comunicacional e
arte própria e se engajam em movimentos políticos voltados para o
política, entre outras.
reconhecimento do grupo. E a integração dos surdos nos diversos
segmentos sociais parece coincidir, justamente, com o fortalecimento
político da comunidade surda, uma vez que a coesão do grupo
promove a inclusão social. Apesar da aparente contradição (entre a
coesão e a dispersão do grupo), é possível afirmar que quanto mais
fortalecidos e unidos enquanto grupo, mais considerados e respeitados
os surdos são enquanto cidadãos.

11
Neste estudo, apresentaremos um plano panorâmico, apesar
de sucinto, sobre as formas de se conceber os surdos, sua história,
educação e relação com a linguagem, dos primórdios aos tempos
atuais. A partir daí, buscaremos entender as ressonâncias desses
desdobramentos históricos na contemporaneidade, focalizando as
diferenças de abordagem entre uma concepção clínica-terapêutica e
linguístico-antropológica de surdez.

1.2 PRIMEIRAS ABORDAGENS: DA TEOLOGIA À CIÊNCIA

Ao longo da história, a surdez tem sido vista e conceituada de


diferentes maneiras. Da Antiguidade aos tempos atuais, a concepção
de surdez vem sofrendo alterações e constantes revisões. Na
contemporaneidade, essa noção costuma ser (re)definida e
(re)interpretada a partir do campo de conhecimento em que é
abordada e da perspectiva teórica assumida, determinando escolhas,
rejeições ou reformulações.
Na Antiguidade, acreditava-se que o pensamento era
possibilitado e organizado pela fala. Filósofos da Idade Clássica, como
Aristóteles, acreditavam que, para atingir a consciência humana, os
objetos deveriam ser conhecidos a partir dos órgãos do sentido, sendo
a audição o canal mais importante para o aprendizado. Era comum,
naquela época, a crença de que o pensamento era possibilitado e
organizado pela fala, como nos indica Guarinello (2004, p. 15). A
ausência dela, em um mundo teocêntrico, caracterizava os surdos
como seres desprovidos de pensamento e, portanto, amaldiçoados por
Deus. Surdos viviam assim, trancafiados como bichos. De acordo com
Lane (1997) e Lacerda (1998), os poucos registros da Antiguidade que
abordam a surdez e que chegaram aos nossos dias fazem referência
prioritária a “curas” inexplicáveis ou milagrosas que, subitamente,
devolviam a condição de “humanidade” aos que não ouviam.
Na Idade Média os surdos ainda não possuíam direitos legais:
não podiam votar, se casar, adquirir bens ou heranças. Eram tratados
como incapacitados e considerados inaptos a receber educação. Além
disso, a Igreja Católica acreditava que eles não possuíam alma imortal,
uma vez que eram incapazes de proferir os sacramentos. Assim, eram
tomados como seres mundanos, infra-humanos, impossibilitados de
aprender e viviam exclusos de todos os processos sociais.
Se a pré-história corresponde ao período da história que
antecede a invenção da escrita, talvez o breve relato acima possa ser
caracterizado como “a pré-história da surdez”, ou seja, o período que
antecede ao reconhecimento dos surdos como seres humanos,

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Língua Brasileira de Sinais - Libras

DICAS
passíveis de ser educados. Como vimos, até a Idade Média não há
registros que abordem os surdos de maneira ampla e diversificada,
mas, sim, uma homogeneização quanto à condição de
3
subumanidade que era atribuída aos que não ouviam. Diversos eram os métodos de
ensino utilizados pelos primeiros
A possibilidade de instruir e educar pessoas surdas surgiu a professores de surdos. Tais
partir do início da Idade Moderna. Nessa época, o nascimento de métodos variavam quanto à
maior ou menor utilização de
surdos na nobreza passa a ser a força motriz dos primórdios da métodos visuais, como a
educação de surdos: contrários a preceitos médicos e religiosos das datilologia (representação
manual das letras do alfabeto) e
épocas, que diziam que surdos não tinham aptidão para linguagem,
alguns sinais da língua de sinais
alguns professores se dispuseram, mesmo assim, a educá-los, e isso nativa da região. Porém, o
pode ser considerado, na conjuntura da época (século XVI), um principal objetivo da maioria
desses professores, como Pedro
expressivo avanço. Ponce de Leon, era o
No entanto, poucos são os registros desses primórdios, pois desenvolvimento apenas da fala
(e raramente da escrita), uma
era comum, na época, manter em sigilo o modo como essa educação vez que era prevista a
era conduzida. Além disso, os professores trabalhavam isoladamente possibilidade de o surdo
adquirir direitos legais,
e não havia o hábito da troca de experiências. Lacerda (1998), citando respondendo por si próprio e
Shánces (1990), relata, por exemplo, que Heinicke, importante podendo administrar negócios e
heranças, se pudesse se
educador alemão que foi professor de surdos, costumava dizer que
comunicar pela fala e/ou pela
ninguém conhecia o seu método de educação, com exceção do seu escrita (SOUZA, 1998, p.129).
4
filho. Alegava ter passado por tantas dificuldades sozinho, que não Consta que, por volta de 1760,
um movimento de surdos contra
pretendia dividir as conquistas do seu método com ninguém. Dessa a ideologia verbal já começa a se
maneira, muito foi perdido e pouco dos primórdios da educação de delinear no Instituto Nacional
de Surdos-Mudos de Paris
surdos pôde ser reconstituído. Mas é a partir dessa época que se
(LODI, 2005, p. 413). Os
começa a admitir que os surdos podem aprender através de estudantes protestavam contra a
procedimentos pedagógicos adequados, sem que haja, para tanto, imposição das práticas
oralizadoras, que se obstinavam
interferências sobrenaturais, como a “cura” súbita da surdez. em fazê-los falar. É provável que
Muitos autores, como Shánces (1990) e Lane (1998), fixam a aglomeração de surdos nessa
escola tenha favorecido o
como marco fundador da educação de surdos o trabalho desenvolvimento e o
desenvolvido pelo monge beneditino espanhol Pedro Ponce de Leon, fortalecimento de uma língua de
3 sinais e, com isso, feito aflorar o
no século XVI . Como relata Lodi, (2005, p. 411), o trabalho desse sentimento de grupo e a
educador não apenas influenciou profundamente métodos vontade de uma maior
participação dos surdos na
posteriores, como desestabilizou os argumentos médicos e religiosos
condução de suas vidas e
da época sobre a incapacidade dos surdos para o desenvolvimento da educação.
5
linguagem e, portanto, para toda e qualquer aprendizagem. Atualmente o treino da fala é
visto com criticidade pelos
No século XVIII, escolas públicas especializadas em educar surdos – e com desaprovação
surdos começaram a ser fundadas, como, por exemplo, o Instituto pelos educadores, uma vez que
4 se constatou que: I) os surdos
Nacional de Surdos-Mudos de Paris , primeira escola pública para tem uma língua própria,
surdos na Europa, fundada pelo abade Charles Michel de L'Epée completa e rica, a Libras; II)
atividades de fala e escrita são
(SOUZA, 1998). Nesse período, sem contar ainda com o dissociáveis na educação. Mais
reconhecimento linguístico das línguas de sinais (LS), o treino da fala especificamente: o treino
daquela pode prejudicar o
era considerado como “metodologia de ponta” na educação de
5
desenvolvimento desta, no
surdos . espaço escolar.

13
L'Epée reconheceu que os surdos possuíam uma forma de
comunicação eficaz e que a linguagem utilizada por eles poderia ser
útil no processo de instrução. No entanto, consoante às ideias
linguísticas e filosóficas de sua época, o abade acreditava que seria
preciso, primeiramente, organizar e dotar de lógica a língua dos
surdos de Paris, imputando-lhe regras claras e elementos faltantes,
com base na gramática da língua francesa, considerada como o
centro organizador.
Dessa forma, ele criou os “sinais metódicos”, como ficou
conhecido o (des)arranjo de L'Epée na língua dos surdos parisienses.
Grosso modo, o abade submeteu àquela língua de sinais (LS) a
gramática da língua francesa, considerada completa e melhor,
criando sinais “faltantes” (como conectivos e flexões) e inventando
elementos morfêmicos capazes de, a partir da segmentação de
determinados sinais, originar outros. O fim último seria o de conferir
aos surdos a capacidade de compreender o mundo a partir dessa
linguagem artificial, que deveria ser compreendida e traduzida em
escrita. L'Epée criou tantos sinais, no afã de dotá-los de semelhanças
com as palavras francesas, “que sua linguagem algumas vezes era tão
desfigurada que se tornava incompreensível” (BEBIAN, 1984, citado
DICAS por SOUZA, 1998, p.150).
Assim, tal método conseguiu apenas tornar os surdos bons
decodificadores, pois consistia, sobretudo, no exercício de ditar
perguntas e respostas a partir dos “sinais metódicos”, cabendo aos
7
De acordo com Souza (1998,
p. 88), esse congresso foi surdos decodificá-los em forma de registro escrito, o que não garantia
organizado, patrocinado e
conduzido principalmente por a compreensão do que estava sendo decodificado, tampouco
renomados e ardorosos possibilitava a criação individual de novas sentenças, fossem elas em
defensores do “oralismo” 6
sinais ou em linguagem escrita .
(princípio que busca
desenvolver a fala dos surdos). Com a ampliação da educação de surdos e com o passar do
Eles haviam se empenhado, já tempo, divergências teórico-metodológicas quanto aos métodos
antes do congresso, em fazer
utilizados pelos professores acabaram culminando no I Congresso
prevalecer o método oral puro
no ensino de surdos e Mundial de Professores de Surdos, congregando profissionais de
contavam, para tanto, com o 7
diferentes países em Milão, em 1880 . Ressaltamos aqui, a
prestígio político e econômico
de cientistas que apregoavam o importância histórica do congresso de Milão, como ficou registrado
controle e até a proibição da esse evento na história, para a constituição identitária dos surdos.
LS na educação de surdos. Por Ainda hoje, mais de um século depois, os desdobramentos desse
fim, decidiu-se, em uma
assembleia geral realizada no congresso são discutidos pelas comunidades surdas do mundo
congresso (da qual os surdos inteiro, pois ele pode ser caracterizado como um acontecimento que
foram proibidos de participar), fez retroceder – e estagnar – em muito, as conquistas dessa
pela adoção universal do
população.
método oral puro, que
consistia em treinar a fala e a De maneira sucinta, podemos dizer que tal retrocesso pode
audição, proibindo, para tanto, ser caracterizado pela conclusão a que chegaram os congressistas
o uso das línguas de sinais.

14
Língua Brasileira de Sinais - Libras

naquela ocasião: ficou decidido que, dali em diante, os surdos


deveriam ser ensinados através da língua oral, de terapias que
estimulassem o desenvolvimento da fala. A LS, vista naquela época
ainda como uma linguagem artificial e desprovida de gramática, foi
considerada como um possível empecilho ao desenvolvimento do
surdo, sendo, portanto, proibida a sua utilização nos espaços escolares.
Assim, Lodi (2005, p. 416) nos informa que, durante quase um século
(de 1880, data do congresso de Milão, a 1959, ano em que foi
publicado o primeiro estudo científico sobre as línguas de sinais), o
discurso dominante sobre a surdez centrou-se na tentativa de eliminar
as diferenças, de abafar e inferiorizar a surdez, de proibir a LS e de
buscar meios para o desenvolvimento da linguagem oral nos surdos, a
partir de técnicas mecânicas e descontextualizadas de treino
articulatório.
DICAS
Esse quadro, contudo, já vinha dando sinais de fraqueza, tanto
frente à resistência surda, que não aceitou a “mordaça” passivamente ,
8

quanto em relação aos baixos resultados obtidos pelos professores que,


9 8
inclusive, começaram a fazer uso de outros métodos de comunicação . Apesar de terem sofrido até
mesmo agressão física em
Foi quando, em 1957, o linguista Willian Stokoe da Gallaudet College,
nome do “perigo” que,
em Washington, lançou a hipótese de que a língua utilizada pelos supostamente, a LS
surdos poderia ser uma língua genuína, natural, constituindo-se, representava (há relatos de
surdos frequentando escolas
portanto, como um instrumento linguístico propriamente dito (LODI,
com as mãos amarradas), a LS
2004, p. 282). não pôde ser contida,
Assim, ao descrever a Língua de Sinais Americana (American continuando a se desenvolver,
ainda que na clandestinidade,
Sign Language - ASL), o grupo de linguistas liderado por Stokoe chegou à
como a língua dos surdos.
conclusão de que o sistema de comunicação utilizado pelos surdos
9
americanos era realmente “um sistema linguístico natural e articulado” O principal deles foi a
Comunicação Total, forma pela
(QUADROS & KARNOPP, 2004). Foi a partir desses estudos que a LS
qual ficou conhecida a
passou a ser vista como “uma estrutura multiarticulada e multinivelada, estratégia de comunicação com
com base nos mesmos princípios gerais de organização que podem ser os surdos, que acabou se
desdobrando em filosofia
encontrados em qualquer língua” (BEHARES, 1993, citado em LODI, educacional, a partir da mescla
2005). A partir de então, a relação dos surdos com a linguagem começa de distintos sistemas
a deixar de ser vista, definitivamente, como deficitária. semióticos, como desenhos,
palavras, mímicas, sinais da LS,
Pode-se dizer que, a partir da década de 1980, a língua de etc. O objetivo, nesse caso,
sinais passou finalmente a ser reconhecida, pelo menos pelos seria o de fazer com que a
comunicação se estabelecesse
pesquisadores da área, como a língua materna e natural da população
de maneira eficiente, sendo o
surda, reservando-se à língua oral majoritária no país, um estatuto de código de veiculação um
segunda língua. problema secundário.
Foi a partir dessa primeira conquista que outras puderam ser
firmadas. Quando se compreendeu, de maneira definitiva, que os
surdos não apresentavam desvantagem linguística em relação aos

15
ouvintes, um novo olhar e um novo discurso sobre a surdez
começaram, enfim, a ser constituídos, fazendo com que o espaço de
atuação surda fosse ampliado socialmente.
Com base no que foi exposto, pode-se concluir que a história
dos surdos, sobretudo de sua educação, é marcada pelo etnocentrismo
10
e pela colonização dos surdos pelos ouvintes, com o devido apoio da
tradição oralista, como afirma Skliar (1999), inspirado em Bhabha
(2000). Isso encobriu, por muito tempo, aspectos linguísticos (e
DICAS
culturais) próprios à surdez, por serem considerados “desvios”.
Encobriu, sobretudo, a possibilidade de desenvolvimento do povo
surdo, que tinha o seu espaço de atuação determinado e limitado pelo
10
Leitores iniciantes na área da
olhar restritivo que a eles era imputado.
surdez costumam receber com
alguma estranheza o
1.3 CONSENSOS TEÓRICOS E ACHADOS CIENTÍFICOS
argumento da colonização dos
surdos. Nesse laço teórico
busca-se enfatizar que os Na contemporaneidade, entre muitas divergências teóricas,
surdos foram subjugados e
dominados pelos ouvintes, que alguns consensos puderam ser firmados. O mais importante deles
se consideravam (ou determina que, no ser surdo, inexiste qualquer tipo de deficiência
consideram) o “padrão cognitiva ou linguística. Segundo Rocha et al. (2007), a literatura tem
superior de humanidade” a ser
seguido. mostrado, até o momento, que os circuitos neurais para as línguas de
11
Tradução das autoras citadas. sinais funcionam de maneira semelhante ao processamento cerebral
das línguas orais: o processamento das línguas sinalizadas também,
ocorre do lado esquerdo do cérebro. Lacerda (1998), citando Bellugi
(1980), relata que pesquisas realizadas com surdos afásicos, no The Salk
Institute for Biological Studies, na Califórnia, demonstram que, se por
um lado, todo sinal (elemento lexical das LS) é um gesto, nem todo
gesto é um sinal, uma vez que lesões no lado esquerdo do cérebro
levam a diferentes graus de comprometimento sintático da LS, embora
não se observe prejuízo em outros tipos de gestos, como os gestos não-
linguísticos.
Nessa mesma esteira, determina-se ainda que a modalidade
de língua “oral-auditiva” (línguas faladas) não é o modelo maior e
supremo a partir do qual se pode articular um sistema de comunicação
linguística. As pesquisas sobre as línguas de modalidade visual-espacial
(línguas de sinais) têm demonstrado isso. Quadros & Karnopp (2003, p.
29) lembram que o gerativista Noam Chomsky (1995, p. 434), por
exemplo, reconhece as pesquisas sobre as línguas de sinais quando
afirma que:

...o termo 'articulatório' é tão restrito que sugere que a


faculdade da linguagem apresenta uma modalidade
específica, com uma relação especial aos órgãos
vocais. Os trabalhos nos últimos anos em línguas de

16
Língua Brasileira de Sinais - Libras

sinais evidenciam que essa concepção é muito


restritiva11.

É preciso que se esclareça, no entanto, que um possível atraso


na aquisição e desenvolvimento da linguagem pode ocorrer devido,
exclusivamente, a questões contextuais, não neurofisiológicas.
Referimo-nos a casos extremos, ainda recorrentes, em cidades
pequenas e zonas rurais, em que a criança surda não é previamente
exposta a um input linguístico apropriado (seja através da língua de
sinais, seja através da língua oral, por meio de terapias
fonoaudiológicas), não se encontrando, portanto, imersa em um
ambiente social propício à aquisição da linguagem. Com a criança
alheia à sinalidade e sem meios para atingir a língua dos pais, a força da
natureza propicia, muitas vezes, a convenção de “sinais caseiros”, de
caráter provisório, criados e veiculados no âmbito familiar. Em casos
como esses, a aquisição de um sistema linguístico formal costuma
ocorrer no início da fase escolar, quando a criança começa a ter contato
com outras crianças surdas ou com o profissional fonoaudiólogo da
escola.
O que existe, então, de fato, é uma real diferença (no sistema
linguístico de comunicação, na aquisição da linguagem e nos modos de
socialização) que acaba sendo (ou não) interpretada como deficiência.
Mas podemos pensar que a linguagem é, ao mesmo tempo, algo tão
comum e tão complexo, que não conseguimos nos livrar dos ditames
culturais e contextuais para pensar em uma língua de existência quase
concreta, que se articula no espaço e se movimenta diante dos nossos
olhos. Vale a pena, para esta reflexão, evocar o chamado pai da
linguística moderna, que, citando Whitney, diz:
DICAS
É por acaso e por simples razões de comodidade que
nos servimos do aparelho vocal como instrumento da
língua; os homens poderiam também ter escolhido os
gestos e empregar imagens visuais em lugar de
12
imagens acústicas (SAUSSURE, 1995, p. 17). O termo ser surdo tem sido
utilizado por autores surdos,
como Perlin (2003), como uma
Isso nos leva a pensar que os caminhos da evolução poderiam categoria que visa a substituir a
ter nos levado a outros meios de comunicação que não gasta “surdez”, que estaria em
uma esfera clínica, já
necessariamente a oral. Podemos pensar, por exemplo, nos primórdios estereotipada.
da comunicação humana, quando os desenhos e os gestos fizeram
parte da história da evolução dos sistemas de comunicação.
Não sendo mais a surdez vista como deficiência (ainda que se
12
conserve essa ideia em alguns setores), o ser surdo passa a se alicerçar
na diferença; diferença sobretudo linguística, mas calcada em questões
culturais, identitárias e políticas.

17
1.4 PERSPECTIVAS ATUAIS: CULTURAS E IDENTIDADES SURDAS

Atualmente, muitos são os autores, como Gesueli (2006),


Moura (2000), Sá (2002), Pinto (2001), Skliar (1998, 1999) e Perlin
(1998, 2003) que apresentam a surdez (muitas vezes, agora, com /s/
maiúsculo) como lugar de cultura e identidade específicas. A
concepção sócio antropológica da surdez na pós-modernidade define
os surdos como pertencentes a uma comunidade linguística
minoritária – ainda discriminada – que utiliza e compartilha uma
língua visual e apresenta modos de socialização próprios, assim como
costumes e hábitos específicos porque fundados na/pela surdez.
Segundo esses autores, a experiência de vida estritamente visual, não-
auditiva, funda uma forma outra de perceber a vida.
Isso pode ser expresso em esquemas perceptivos e
interpretativos diversos “segundo os quais um grupo produz o
discurso de sua relação com o mundo” (PONCHES, 1996 citado por
DICAS SANTANA & BERGAMO, 2006), relação essa que é perpassada pela
escolha de vida entre os seus iguais, pelo uso da língua visual e até
mesmo por hábitos linguísticos que se posicionam na fronteira entre a
13
13
língua e a cultura .
Sobre as relações entre língua
e cultura, na língua brasileira Mas a noção de cultura surda não é unanimemente aceita.
de sinais, ver RUDNER, A. A Skliar (1998) e Sá (2002) relatam o incômodo e a incompreensão de
relação entre polidez e cultura
alguns diante dessa noção. Segundo os autores, aqueles que
surda na língua brasileira de
sinais (em desenvolvimento). apresentam argumentos contrários a essa noção costumam se basear,
Doutorado em Letras. principalmente, em uma concepção de cultura universal – noção
Universidade Federal do Rio de
definitivamente negada pelos Estudos Culturais, principal
Janeiro, 2010.
embasamento teórico daqueles que tomam os surdos como um grupo
culturalmente específico.
Autores como Santana & Bergamo (2005), por exemplo,
buscam fragilizar o conceito de cultura surda, apresentando
questionamentos que se voltam para a discussão acerca da real
soberania da língua nas relações culturais (apenas a língua definiria a
cultura?) ou para a cisão social entre surdos e não-surdos que costuma
ser subentendida pelo conceito (existiria assim, uma cultura ouvinte e
outra surda, dividindo a civilização entre surdos e não-surdos?).
Alegam ainda, que tal conceito intenciona reordenar relações de
poder, proporcionando poder social – para os surdos – e poder
acadêmico – para os pesquisadores.
Para Sá (2002) e Skliar (1998), o que importa nessa querela
não é apenas compreender as manifestações culturais específicas do
povo surdo, face à cultura hegemônica, mas compreender também

18
Língua Brasileira de Sinais - Libras

que a representação dessa cultura no imaginário social a toma como


uma cultura patológica, como uma subcultura, uma vez que a
resistência e a diferença não costumam ser interpretadas
positivamente.
Pensando no extremo oposto, Chiella (2007) reflete sobre
casos em que o tema da cultura acaba se tornando aliado na busca pela
“verdade surda”. A autora demonstra preocupação diante o fato de a
língua de sinais e a cultura surda estarem sendo banalizadas,
desgastadas ou reduzidas uma à outra, na tentativa, por parte de
alguns, de definir a “essência surda”. Atualmente, tem-se falado mais
em “marcas surdas”, como o faz a própria Chiella, no intuito de
demonstrar marcas culturais que são constituídas nos espaços de vida
surda.
O tema da cultura, nos Estudos Surdos, quase sempre aparece
vinculado à problemática das identidades. O termo “identidades
surdas” tem ganhado terreno sobretudo no espaço de interseção com a
lingua(gem), lugar onde ela se constrói por excelência. Para Perlin
(1998, p. 52), “a identidade é algo em questão, em construção, uma
construção móvel que pode frequentemente ser transformada ou estar
em movimento, e que empurra o sujeito em diferentes posições”. De
maneira bastante simplificada e bem genérica, poder-se-ia dizer que
“identidade surda” diz respeito principalmente ao processo de
reconhecimento e de identificação do surdo com os seus iguais; ao uso
da língua de sinais e, para alguns, ao direito de querer ser surdo. Pode
ser percebida, ainda, em algumas de suas facetas, através de práticas
sociais específicas, como a resistência frente à presença hegemônica
ouvinte ou o percurso de lutas do Movimento Surdo. Nas palavras da
pesquisadora surda Gladis Perlin:

Se nos consideramos surdos, não significa que temos


uma paranoia. Significa que estamos sendo o outro
com nossa alteridade. Somos o surdo, o povo
unânime reunido na auto presença da língua de
sinais, da linguagem que evoca uma diferença de
outros povos, da cultura visual, do jeito de ser. Somos
alteridades provadas pela experiência, alteridades
outras. Somos surdos! (PERLIN, 2003b, p.92).

Perlin (1999, p. 51), inaugurando as pesquisas sobre


“identidades surdas” no Brasil, ressalta que, em diversos momentos,
precisou contestar teorias sobre os surdos, cunhadas por sujeitos
ouvintes, pelo simples fato de ela focalizar o seu universo (surdo) a
partir de uma ótica interna. Para apresentar a concepção de sujeito
surdo que alicerça suas pesquisas, diz ter sido necessário, inicialmente,

19
lutar para se desprender das crenças que lhe ensinaram a assumir a
respeito do ser surdo, particularmente as crenças propagadas pelo
campo da medicina e da audiologia que, de maneira geral, tendem a
ver a surdez como uma anomalia. A visão “normalizadora” sobre os
surdos, segundo ela, não pode jamais fomentar discussões acerca da
problemática da diferença, do sujeito e do poder. Aliás, revelam, sim, o
“poder administrativo” do ouvinte sobre o surdo.
Segundo Skliar (1999), a forma mais presente desse poder se
dá através do ouvintismo como ideologia dominante. O ouvintismo é
um reflexo das representações estereotipadas dos ouvintes sobre os
surdos e a surdez. Pode ser visto como um dispositivo de controle
disciplinar da sociedade, como “um conjunto de representações dos
ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-se
como se fosse ouvinte.” (SKLIAR, 1998, p. 15). As representações dos
ouvintes sobre a surdez, de forma geral, refletem um posicionamento
histórico que a enquadra no campo da doença. No caso dos surdos
ouvintizados, estes passam a aceitar a estereotipia forjada para eles no
senso comum. Essa ótica pode tornar-se, assim, avassaladora e
destituidora de identidades.
Para Perlin (1999), o ouvintismo deriva de uma proximidade
particular que se dá entre surdos e ouvintes, na qual o ouvinte está
sempre em uma situação de superioridade. A ideologia ouvintista é tão
forte, segundo ela, que muitas vezes não permite ao surdo desenvolver
uma identidade própria ou, no mínimo, uma consciência oposicional.
É como se o surdo estivesse condenado a se considerar eternamente
uma cópia imperfeita dos seres que ouvem.
Skliar (1999) chama a atenção para o fato de que o ouvintismo
– ou o oralismo, sua forma institucionalizada – não deve ser
compreendido somente como um conjunto de ideias e práticas
simplesmente destinadas a fazer com que os surdos falem e sejam
como os ouvintes. Os pressupostos que fundamentam e originam essas
ideias precisam ser compreendidos como a base epistemológica que
autoriza tais práticas. Para o autor, tais pressupostos podem ser: a)
linguístico-filosóficos, quando tomam o oral como abstração e a
gestualidade como concretude e obscuridade de pensamento; b)
religiosos, quando se prioriza a confissão através da palavra vocalizada;
c) pseudocientíficos, quando se afirma que a audição é imprescindível
para o desenvolvimento humano; d) políticos, demonstrados pela
tentativa de controlar, ter sob domínio as minorias linguísticas ou
sociais.
Voltando aos estudos sobre as identidades surdas, Perlin
(1999) identifica, entre múltiplas categorias possíveis, cinco diferentes

20
Língua Brasileira de Sinais - Libras

facetas de identidades que podem ser facilmente observadas nos DICAS


sujeitos surdos. Em termos discursivos, poder-se-ia dizer que a
construção das identidades surdas irá depender da relação que esses
14
sujeitos mantêm com o discurso de fundamentação ouvintista , por 14
Categoria proposta pela
um lado, e com o discurso de fundamentação surda, por outro. autora em sua dissertação de
mestrado. Trata-se de
Na surdez, tais identidades parecem constituir-se nos formações discursivas que
espaços fronteiriços entre as culturas, as línguas e as comunidades polemizam entre si no espaço
discursivo da surdez. A
surdas e ouvintes, podendo, segundo Perlin (1999), ser classificadas
primeira formação discursiva
como: 1) identidade surda em si: aquela que se sobressai pela pode ser considerada como
militância e consciência de definir-se politicamente diferente. É originária do domínio clínico.
Nela, apresentam-se
facilmente verificada em surdos filhos de pais surdos; 2) identidade
conjecturas e propostas
surda híbrida: costuma ser atribuída a surdos que nasceram ouvintes baseadas em posturas e
e que, com o tempo, tornaram-se surdos. Apesar de a autora referir- terapias capazes de fazer com
15 que o surdo “supere”, contorne
se apenas a casos que, como o dela , foram em direção à formulação
a surdez, como forma de
de uma identidade surda, é preciso ressaltar que o oposto também alavancar o seu
pode ocorrer, ou seja, existem aqueles que se voltam para a desenvolvimento linguístico e
construção de identidades refletidas nos ouvintes; 3) identidade social. Assume-se, assim, um
discurso que pode ser
surda de transição: manifesta-se em surdos que viveram sob o considerado de fundamentação
domínio da cultura ouvinte, em geral, os surdos oralizados, mas que ouvintista. A segunda formação
discursiva que, por sua vez,
posteriormente foram inseridos na comunidade surda, passando pelo
pode ser considerada como
processo de “desouvintização” da representação da identidade; 4) oriunda do domínio linguístico-
identidade surda incompleta: verificada em indivíduos que vivem sob antropológico, postula que os
surdos podem viver e se
a dominação latente da ideologia ouvintista, negando as
desenvolver na/pela surdez,
possibilidades de identidades surdas e considerando os ouvintes sem combatê-la. Tal FD se
como o padrão a ser seguido; 5) identidade surda flutuante: ancora em princípios
linguísticos, culturais e
apresenta-se onde os surdos vivem e se expressam a partir da
identitários que especificam os
hegemonia ouvinte (de forma consciente ou não), não povos surdos, ostentando um
demonstrando, no entanto, satisfação ou integração a nenhum dos discurso que pode ser
16 considerado de fundamentação
seguimentos, nem o surdo, nem o ouvinte .
surda.
Como podemos perceber, um “novo” discurso sobre a
15
surdez começa a ser produzido pela academia e pelos próprios A autora tornou-se surda aos
treze anos.
sujeitos. Apesar de ainda corrente e bem aceita em alguns
seguimentos socias, a concepção de surdez que deriva da abordagem 16
Pontuamos que as tipologias
clínico-terapêutica tem perdido espaço, uma vez que a abordagem de identidades acima,
apresentadas por Perlin (1998),
linguístico-antropológica tem mostrado melhores resultados
costumam ser problematizadas.
socioeducacionais, psicognitivos e afetivos aos seus adeptos. O Vale ressaltar que identidades
quadro abaixo sintetiza como as diferentes abordagens tratam os são complexas, heterogêneas e
estão em constante
principais temas envolvidos:
movimento, como nos revela
Neves (2006).

21
Temas
terapêutica antropológica
Deficiência: tratamento Minoria linguística:
Surdez identitária e cultural
e reabilitação
Fator acessório, Constitui o sujeito e é a sua
metodológico 1ª língua
Modelo terapêutico
Educação Especial
(especial)
Língua
Oral e escrita Escrita (L2)
portuguesa
Cultura e
Silenciamento
Identidade na surdez
Diminuem os efeitos
Silenciamento
terapia da surdez

DICAS
de “mudos” , só restava aceitar.
17

17
sido deslocados do campo clínico para o campo linguístico e cultural,
Cabe ressaltar que surdos não
são mudos. Primeiramente, tanto no universo acadêmico, quanto nas práticas sociais. Na
porque os surdos falam, não a
língua oral-auditiva, mas a sua, à surdez cresceu horizontalmente (quantitativamente), fazendo
visual-espacial. Segundo,
porque não existe na surdez aumentar a incidência de pesquisas em diversas áreas, como a
qualquer característica educação, a linguística, a psicologia e a sociologia, demonstrando,
fisiológica que impeça a nesses espaços, crescimentos agora verticalizados (qualitativos).
expressão oral.

para as cadeiras das universidades. Esse deslocamento parece


acontecer em rede, ocasionando rupturas e realocações outras,

dos surdos consigo mesmos.


Todo esse cenário possibilita aos sujeitos uma tomada de

que favorece a construção de uma nova imagem de si e do micro e

22
Língua Brasileira de Sinais - Libras

inferiores, desvantajosos ou menos capazes que os ouvintes. Não são


– e já não se consideram – “anormais” ou “deficientes”. E preocupam-
se com as relações de poder estabelecidas socialmente entre o seu
grupo e o grupo dos não-surdos.
As questões aqui apresentadas são apenas introdutórias aos
Estudos Surdos e tiveram o intuito de redimir mitos e preconceitos
sobre a surdez. Os estudos sobre questões surdas, assim como a
vivência e a militância surda, alcançam espaços teóricos e sociais
jamais imaginados há algumas décadas. E, desta história, ainda
assistiremos a inúmeros capítulos, pois “é sempre na manutenção da
censura que a escuta se exerce”, já dizia Foucault (2006, p. 13).

REFERÊNCIAS

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Educação e sociedade, Campinas, SP,v.27, n. 94, p. 277-292, 2006.

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Letras). Universidade Federal do Paraná, 2004.

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diferentes abordagens na educação de surdos. Cadernos CEDES,
v.19, n.46. Campinas: UNICAMP, 1998.

LANE, H. A Máscara da Benevolência. Lisboa: Instituto Piaget, 1998.

LODI A.C.B. Plurilinguismo e surdez: uma leitura bakhtiniana da


educação de surdos. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n 3, p.
409-424, 2005.

. Uma leitura enunciativa da Língua Brasileira de Sinais: o


gênero contos de fadas. DELTA. Documentação de Estudos em
Linguística Teórica e Aplicada, São Paulo, v. 20, n. 2, p. 281-310,
2004.

MOURA, M. C. O surdo: caminhos para uma nova identidade. Rio de


Janeiro: Revinter Editora, 2000.

PERLIN, Gladis Terezinha Tascheto. Identidades Surdas. In: SKLIAR,


C. (org.) A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre:
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PERLIN, Gladis Terezinha Tascheto. O ser e o estar sendo surdo:


alteridade, diferença e identidade. 155 f. (Tese - Doutorado em
Educação). Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre, 2003.

23
PARA REFLETIR
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becher. Língua de
sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: ArtMed, 2004.
Durante um período da história
REZENDE, Franklin Ferreira Junior; PINTO, Patrícia Luiza Ferreira. Os
dos surdos as línguas de sinais
foram proibidas por médicos e
surdos nos rastros de sua intelectualidade específica. In: QUADROS,
por educadores de surdos. R. M; PERLIN, G. T. T. (org.). Estudos Surdos II. Petrópolis: Arara
Quais eram os argumentos A z u l , 2 0 0 7 . D i s p o n í v e l e m : w w w. e d i t o r a - a r a r a -
apresentados pelos azul.com.br/estudos2.pdf. Acesso em: jun. 2008.
profissionais da época para tal
proibição? Será que hoje tais ROCHA, Fábio. Theodo et al. Libras: um estudo encefalográfico de
profissionais ainda pensam sua func ionali da de cerebral. D isponível e m:
assim? O que você acha? www.enscer.com.br/pesquisas/artigos/libras/libras.html. Acesso em:
12 dez. 2007.

SÁNCHEZ, C. M. La educación de los sordos en un modele


bilingue: Mérida, Ickonia, 1990.
DICAS
SAUSSURE, F. de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix,
1995.

Você sabia que a Universidade SÁ, N. R. L. Cultura, poder e educação de surdos. Manaus: Ed.
Federal de Santa Catarina Universidade Federal do Amazonas, 2002.
oferece cursos de graduação
em Letras-Libras (licenciatura e SANTANA, A. P; BERGAMO, A. Cultura e identidade surdas:
bacharelado) na modalidade a encruzilhada de lutas sociais e teóricas. Educação & Sociedade,
distância em mais de 15 polos Campinas, SP, v. 26, n. 91, p. 565-582, 2005.
em todo o Brasil? Para
conhecer o curso acesse o site
http://www.libras.ufsc.br/. SKLIAR, Carlos. Um olhar sobre o nosso olhar acerca da surdez e das
diferenças. In: . A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto
Alegre: Mediação, 1998.

SOUZA. R. M. de. Que palavra que te falta? Linguística, educação e


surdez: considerações epistemológicas a partir da surdez. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.

STOKOE, William. Clarence. Sign Language Structure. (Revised Ed.


Printed in 1978), Silver Spring, MD: Linstok, 1960.

STROBEL, Karin Lilian. Surdos: vestígios culturais não registrados na


história. 2009. 176 f. (Tese - doutorado em Educação). Faculdade de
Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina,
2007.

24
Língua Brasileira de Sinais - Libras

Quanta novidade, não é mesmo? Então agora reflita: antes da


PARA REFLETIR
leitura do artigo, você sabia que línguas poderiam ser produzidas e recebidas
tanto pelas mãos e pela visão quanto pela fala e pelos ouvidos? Por que os
surdos se consideram historicamente dominados pelos ouvintes? O que Alguns pesquisadores surdos se
você acha dessa visão moderna sobre os surdos? Em que medida a visão consideram colonizados pelos
ouvintes. Para você, de onde
cultural e identitária sobre os surdos e a surdez pode alterar a nossa prática surge este sentimento? Você
pedagógica na sala de aula? Discuta essas e outras questões com os seus concorda com esta visão?
colegas.

O artigo apresentado nesta unidade, assim como outras partes do


seu caderno didático, trarão conceitos próprios da área dos estudos da
linguagem que, possivelmente, ainda não são conhecidos por você. Nas
últimas páginas do seu caderno você encontrará um glossário que poderá
auxiliá-lo na compreensão desses conceitos. Recorra a ele sempre que julgar
necessário. E quando ele não for suficiente para redimir suas dúvidas, faça
uma pesquisa online sobre o termo consultado. Se, junto ao termo, você
escrever a palavra surdos ou libras, provavelmente a sua pesquisa será
otimizada.

REFERÊNCIAS

RIBEIRO, M. C. M. A. Considerações sobre a relação dos surdos com a


linguagem: dos primórdios à contemporaneidade. Revista Unimontes
Científica (no prelo), 2011.

25
UNIDADE 2
Rejane Cristina de Carvalho Brito

Nesta unidade, estudaremos sobre a legislação que rege a inclusão


educacional, a diferença entre escola especial e escola inclusiva, sobre o
intérprete educacional e, ainda, sobre o ensino de línguas para surdos. Você
já leu sobre a inclusão de alunos surdos no ensino regular? Qual é a sua
opinião a esse respeito? Em sua vida de acadêmico, você já esteve em uma
sala de aula inclusiva? Caso tenha participado ou estado em uma escola
inclusiva, partilhe sua experiência e impressões com seus colegas. Isso
poderá ilustrar a conversa que teremos a partir de agora. Começaremos pela
legislação que contempla a educação inclusiva e alguns documentos
nacionais e internacionais.

2.1 A LEGISLAÇÃO

A Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações


Unidas – Unesco encontrou em uma pesquisa sobre a educação em todo o
mundo as justificativas necessárias para a busca por uma inclusão
educacional competente em todos os países membros (o que inclui o Brasil).
Segundo o texto da Unesco (2001), três problemas foram considerados os
mais graves e, portanto, demandavam ações urgentes:

Ÿ as oportunidades educacionais eram limitadas, com um


grande número de pessoas tendo acesso restrito à educação;
Ÿ a concepção de educação básica se restringia à
capacidade de ler, escrever e lidar com números, em vez de
uma visão mais ampla de uma base para uma vida de
aprendizado e cidadania;
Ÿ alguns grupos marginalizados – portadores de
deficiências, membros de minorias étnicas e linguísticas,
meninas e mulheres, etc. – corriam o risco de serem
excluídos como um todo (UNESCO, 2001, p. 17).

Tais problemas geraram uma reflexão e a tentativa de unir esforços


para a inclusão educacional. Os países membros assumiram um
compromisso de manter um esforço mundial para que o direito à educação
fosse garantido a todos sem restrições por sexo, cor, credo, deficiência, nível
social, etc. Surgiu assim, a Declaração Mundial de Educação para Todos
(Declaração de Jomtien) na Conferência Mundial para todos em Jomtien, na
Tailândia, em 1990.
A Educação Inclusiva passou a ser ampliada em documentos oficiais
em todos os países e justificada por três fatores conforme o esquema a seguir.

26
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Justificativas

Econômica: Uma
Educacional: Social: Mudança de
Desenvolvimento de atitude favorecendo o escola que eduque a
metodologias que surgimento de uma todos tem custo menor
trabalhem as diferenças sociedade mais justa e que um complexo
individuais e sem preconceitos. sistema que
beneficiem a todos. privilegie as diferenças.

Figura 1: Justificativa
Fonte: Arquivo dos autores

Somando as justificativas com o interesse em promover uma


sociedade igualitária, o Brasil tem se movimentado em termos políticos e
educacionais para que a educação inclusiva aconteça em todo o país.
Definimos como Educação Inclusiva “a prática da inclusão de todos –
independentemente de seu talento, deficiência, origem socioeconômica ou
origem cultural – em escolas e salas de aula provedoras, onde todas as
necessidades dos alunos são satisfeitas” (KARAGIANNIS; STAINBACK e
STAINBACK, 1999, P. 21). Porém, Mantoan (2003) nos lembra que a escola
se democratizou, abriu-se a novas experiências com o acontecimento da
inclusão, mas não basta colocar alunos em uma sala de aula para garantir que
a inclusão educacional aconteça. A autora aponta que precisamos cuidar da
formação dos docentes e das estruturas físicas e profissionais que formam o
conjunto escola.
As políticas públicas que fomentam a Educação Inclusiva em parte
contemplam a educação de surdos, mas é preciso que, além do
conhecimento e cumprimento dessas leis, os docentes estejam mais atentos
ao seu trabalho neste contexto da inclusão. Para esclarecer quais são as
políticas públicas que cuidam da educação de surdos, citaremos algumas
que são consideradas avanços em toda a academia.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, Lei nº 9.394, de
20 de dezembro de 1996, em seu Capítulo V – Da Educação Especial –, art.
59, § III, estabelece para a educação de alunos com necessidades especiais a
garantia de “professores com especialização adequada em nível médio ou
superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino
regular capacitados para a integração desses educandos nas classes
comuns”. Assim, as universidades devem se comprometer com uma
estrutura curricular em seus cursos de licenciatura que contribua para uma
formação real dos acadêmicos quanto à demanda da inclusão educacional.
Em relação à inclusão da educação de surdos nas leis e decretos
educacionais, podemos citar a o Decreto 5.626, de 22 de dezembro de
2005 que regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe
sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19

27
Caderno Didático

de dezembro de 2000. A partir deste decreto os cursos de Licenciatura,


fonoaudiologia e cursos de nível médio que cuidem da preparação de
ATIVIDADES professores para atuação nos vários níveis da educação terão dez anos para
incluir a disciplina Libras como obrigatória em seus currículos regulares. A
Libras também poderá ser incluída como disciplina optativa nos demais
Converse com seus colegas
sobre as justificativas para que cursos de educação superior ou profissionalizante. Além da disciplina Libras,
a Educação Inclusiva aconteça. a criação do curso superior Letras/Libras é prevista a partir do mesmo
Você concorda com as decreto.
justificativas (educacional,
social e econômica)? Justifique Ainda no Decreto 5.626, a Libras fica reconhecida como primeira
sua resposta. língua da comunidade surda e a língua portuguesa como segunda língua. O
sistema de ensino deve garantir o acesso bilíngue ao conhecimento a todos
os alunos surdos. Para tanto, o decreto considera o Intérprete de Língua de
Sinais (Libras – Português) como um direito do surdo e discorre sobre como
DICAS
deve acontecer a formação desse profissional.
Há várias leis e decretos sobre a educação inclusiva e que
contemplam a educação de alunos surdos. Siga a dica e pesquise mais
Siga o link para uma pesquisa
documentos sobre o assunto! Aproveite para dividir suas descobertas com
em mais documentos!
http://www.sj.cefetsc.edu.br/~ seus colegas e seu professor!
nepes/midiateca_legislacao.htm

2.2 ESCOLA ESPECIAL E ESCOLA INCLUSIVA: HÁ DIFERENÇAS?

O que você sabe sobre escola especial e escola inclusiva? Os dois


termos definem a mesma escola? Na verdade, esses termos definem escolas
diferentes. Vejamos primeiramente o que é uma escola especial

Figura 2: Escola Especial


Fonte: http://sandra-educacaoinclusiva.blogspot.com/2008
_10_01_archive.html. acesso em julho 2010

Há algum tempo atrás, as pessoas com necessidades especiais eram


separadas das ditas normais e tinham como destino a escola especial.
Entende-se por escola especial aquela que adota um modelo médico-
pedagógico ao invés do modelo educacional (VIZIM, 2003). O modelo se

28
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

apoia na concepção de uma necessidade de cuidados médicos que


acompanha a história da educação. Baseia-se em um ideal médico-
terapêutico visando à reabilitação das funções “prejudicadas” pela
deficiência. Apesar desse modelo ainda ser visto e praticado em várias
instituições brasileiras, hoje a escola especial é considerada um modelo
antigo de educação e que contribui para a manutenção de mitos sobre a
pessoa deficiente nos dias atuais.
A escola inclusiva questiona o modelo
médico-pedagógico e privilegia o modelo
educacional. Segundo a teoria, a inclusão
escolar deve ser “a inserção escolar de forma
radical, completa e sistemática. Todos os alunos,
sem exceção, devem frequentar as salas de aula
do ensino regular” (MANTOAN, 2003, p. 24).
Segundo o autor, a perspectiva inclusiva PARA REFLETIR
Figura 3: Educação inclusiva
abandona a divisão “ensino especial e ensino
Fonte: http://www.planetaedu regular” na intenção de atender às diferenças
cacao.com.br/portal/artigo.asp
?artigo=1136. acesso em julho
sem discriminação. Porém, a inclusão ainda está
A Escola Especial permanece
2010 a caminho daquilo que pretende ser em sua embutida na Educação
completude. Alguns passos importantes já foram Inclusiva que temos hoje? Se

sim, quando isso aconteçe?


dados, mas ainda é necessário mover a universidade em um esforço efetivo e
Você imagina um motivo?
conjunto (universidade, comunidade, políticas públicas, etc.) para que
outros passos mais largos e mais firmes aconteçam.
Qual é o papel da universidade na Educação Inclusiva? O que você
pensa sobre escola especial e escola inclusiva? Converse com seus colegas e
professores sobre o assunto!
Agora, falaremos com o foco voltado para o aluno surdo. Vamos
abordar a sala de aula no contexto da inclusão de alunos surdos, sobre o
ensino de português como segunda língua e falaremos mais uma vez sobre o
intérprete educacional.

2.3 O SURDO NA SALA DE AULA

Por que pensar em organizar e planejar uma sala de aula para


acolher alunos surdos? Você encontra um motivo para isso? A presença de
um intérprete educacional não é o suficiente para a inclusão do aluno?
Muitas perguntas podem surgir no momento em que se pensa na
organização espacial, metodológica e curricular para a sala de aula com
alunos surdos. Assim, teremos aqui alguns pontos para conversarmos a
respeito dessa sala de aula.

29
Caderno Didático

2.3.1 A organização espacial

Figura 3: Organização espacial


Fonte: http://www.peabirus.com.br/redes/form/post?topico_id=
7858 . acesso em julho 2010

Iniciando pela organização espacial, as Secretarias de Educação de


vários estados como Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo recomendam
que cada sala de aula inclusiva tenha no máximo 25 alunos. No caso da
inclusão dos alunos surdos temos mais algumas formas de planejar
espacialmente a sala de aula para benefício de alunos surdos e ouvintes.
Vejamos algumas formas de organização espacial:
Ÿ Disposição de alunos em círculo: os alunos surdos precisam ver
para interagir, por isso é interessante dispor os alunos de forma que todos
vejam a todos;
Ÿ Organização da estrutura física e material: salas de aula bem
iluminadas, material que privilegie o visual e o escrito sem reduzir, facilitar
ou prejudicar o conteúdo a ser ensinado;
DICAS Ÿ O intérprete educacional deve estar em lugar bem iluminado e
em frente ao(s) aluno(s) surdo(s), mas não deverá atrapalhar a visão do
professor, do quadro da sala de aula e nem dos outros alunos;

Acesse o site a seguir para mais Ÿ Os alunos surdos, de preferência, devem estar próximos para
informações: oferecer apoio um ao outro.
http://portal.mec.gov.br/seesp/a
Apesar de parecer algo simples, essas dicas nem sempre são
rquivos/pdf/aee_da.pdf
seguidas nas escolas e, por isso, os alunos surdos ficam prejudicados. Pensar
a organização espacial e estrutural da sala de aula e da escola já é uma forma
de fazer funcionar a metodologia e o planejamento curricular em benefício
de todos!

2.3.2 O intérprete educacional

Como foi dito anteriormente, a profissão do intérprete educacional


foi estabelecida pelo Decreto 5.626 de 22 de dezembro de 2005. A função
do intérprete na questão da surdez, historicamente, começou com trabalhos

30
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

voluntários e em uma tentativa de evitar o isolamento dos surdos na


sociedade (BRITO, 2010). A presença do intérprete em sala de aula
possibilita o acesso do aluno surdo ao que se passa oralmente durante a aula.
O intérprete deve ser fluente em Libras e na língua portuguesa podendo,
também, ser fluente em outras línguas como inglês e espanhol e/ou fluente
na língua de sinais de outro país. Dessa forma, o intérprete estará apto a
participar de conferências nacionais e internacionais dando suporte ao
público surdo participante dos mesmos (MEC/SEESP, 2004).
Vale lembrar que o intérprete não é o professor do aluno surdo e
nem deve substituir esse profissional em sala. Para a tradução da aula deve-
se respeitar a função do professor, manter a ética em relação ao conteúdo a
ser traduzido e não reduzir, acrescentar ou desviar as informações passadas
em aula. DICAS
Você, acadêmico, está aprendendo Libras para ter a opção de
interagir com o seu aluno surdo durante as aulas. Você não passará o
conteúdo em Libras (essa é a função do intérprete), mas poderá direcionar- Para saber mais sobre o
se diretamente ao seu aluno em momentos oportunos. Assim a relação intérprete educacional leia o
professor-aluno se estreita e todos ganham no processo de ensino- guia “O tradutor e intérprete
de língua brasileira de sinais e
aprendizagem.
língua portuguesa” disponível
em
http://portal.mec.gov.br/seesp/a
2.3.3 Aula de línguas
rquivos/pdf/tradutorlibras.pdf

Neste item, tocaremos no assunto aula de línguas para alunos


surdos. Lembramos que a Libras é a língua natural dos surdos e que a língua
portuguesa é a segunda língua. Por ser uma segunda língua e de modalidade
diferente da Libras, aprender português não é algo fácil que pode acontecer
sem esforço por parte do surdo, mas demanda tempo e disposição. Outro
ponto importante, a Libras não é o instrumento que possibilita a
aprendizagem da língua portuguesa, ela é a língua da comunidade surda e
essa é a razão para seu uso na educação de surdos (QUADROS, 2003).
Vejamos um pouco sobre o ensino de português.

2.3.3.1 Português como segunda língua

A língua portuguesa, por ser a língua nacional, é demandada como


a segunda língua do surdo brasileiro, podendo ser ainda considerada como
uma língua estrangeira para este aluno. A educação bilíngue prevê o ensino
da língua portuguesa (alfabetização e letramento) para dar ao surdo a
oportunidade de acesso a várias vias do conhecimento. Porém, muitas
vezes, o fato de o português ser uma língua estranha para o surdo, fica
esquecido e o aluno pode ficar prejudicado em seu percurso educacional.
Para relembrar, a Libras é uma língua de modalidade visual-espacial e sua
estrutura não se subordina à língua portuguesa, que é uma língua de

31
Caderno Didático

modalidade oral-auditiva. Uma das dificuldades encontradas pelos surdos


na escola está na aprendizagem da modalidade escrita do português. A
escola inclusiva ensina português como língua materna e esta abordagem
não é adequada aos alunos surdos, que deveriam apreendê-la a partir de
metodologias de ensino de língua estrangeira. Não há um correspondente a
esse processo na língua de sinais e, muitas vezes, as variações que ocorrem
na escrita do surdo não recebem crédito por parte dos professores por não
corresponderem à norma culta do português (QUADROS, 2003). Outra
dificuldade está em alguns professores não reconhecerem a língua de sinais
como forma legítima de comunicação dos surdos e reduzirem as ideias e
pensamentos expressos por esses alunos a comentários sem valor. Os surdos
ficam então, presos ao ato de escrever por não verem o expressar em sua
língua natural legitimado em boa parte do meio educacional.
Tendo em vista as dificuldades apontadas, o professor de língua
portuguesa e demais professores, que usam a modalidade escrita em sua
disciplina como forma de avaliação, devem estar preparados para a
compreensão da variação que ocorre na escrita do português pelo aluno
surdo. Além disso, o professor deve aceitar como legítima a forma de
expressão em Libras.

2.3.3.2 Línguas estrangeiras (inglês e espanhol) para surdos

Figura 4: globo terrestre


Fonte: http://simplehomeschool.net/giving-our-children-the-world-education-through-
geography/ acesso em julho 2010

Na escola inclusiva, o ensino de línguas estrangeiras (inglês e


espanhol) para surdos encontra um obstáculo a mais: a falta de intérpretes
educacionais que sejam fluentes nessas línguas (BRITO, 2010). O intérprete,
teoricamente, precisaria ser fluente no par linguístico língua estrangeira -

32
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Libras, porém as leis que regem a função deste profissional em nosso país,
apenas preveem a tradução português-libras e vice-versa. O professor de ATIVIDADES
língua estrangeira deve entender a dificuldade de tradução na sua aula e
tentar elaborar recursos de acordo com o contexto que lhe é apresentado. Veja o vídeo Imagine no
Além disso, é preciso lembrar que a modalidade escrita da língua estrangeira youtube
também passará por variações na escrita do surdo e que a avaliação de seu http://www.youtube.com/watc
h?v=JNl91QXws7o&feature=r
processo escrito, assim como ocorre no ensino de português, deve privilegiar elated. Diante do que foi
as ideais e o expressar-se com coerência no texto. estudado, qual é a sua opinião
sobre o ensino de línguas
estrangeiras para alunos
2.4 FINALIZANDO A CONVERSA surdos?

Tendo visto sobre a legislação, a diferença entre escola inclusiva e


escola especial, sobre a sala de aula para surdos, o intérprete e a
aprendizagem de línguas, agora você tem temas suficientes para dialogar
com seus colegas e trocar ideias sobre a opinião de cada um a respeito do
que foi estudado. Aproveite para partilhar as pesquisas que você fez no
tempo em que se dedicou a estudar este capítulo!

REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto-lei n. 5.626 de 22 de dezembro de 2005. Diário Oficial
[da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez. 2005. Seção 1, p. 30.

BRASIL. Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua


Brasileira de Sinais (LIBRAS) e dá outras providências. Disponível em:
www.mec.gov.br/seesp/legislacao.shtm Acesso em: 10 ago. 2010

BRITO, R. C. C. Representações do professor de língua inglesa no ensino


inclusivo dos alunos surdos. 167f. (Mestrado em Linguística
Aplicada)–Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo
Horizonte, 2010.

KARAGIANNIS, A., STAINBACK, S.; STAINBACK, W. Inclusão: um guia para


educadores. Porto Alegre: Artmed, 1999.

MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer? São


Paulo: Moderna, 2003.

QUADROS, R. M. Situando as diferenças implicadas na educação de


surdos: inclusão/exclusão. Ponto de Vista, Florianópolis, n. 5, p. 81-112,
2003.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. O tradutor e intérprete de língua


brasileira de sinais e língua portuguesa. Programa Nacional de Apoio à
Educação de Surdos - Brasília : MEC ; SEESP, 2004. 94 p.

33
Caderno Didático

TRASK, R. L. Dicionário de linguagem e linguística. São Paulo: Contexto,


2004.

UNESCO. Arquivo Aberto sobre a Educação Inclusiva. Paris, 2001.


Disponível em: <www.inclusion.uwe.ac.uk>. Acesso em: 15 jan. 2009.

VIZIM, M. Educação Inclusiva: o avesso e o direito de uma mesma


realidade. In: SILVA, S.; VIZIM, M. (Org.). Políticas Públicas: educação
tecnologias e pessoas com deficiências. Campinas: Mercado de Letras; ALB,
2003. p. 49-72.

34
UNIDADE 3
ESTUDOS LINGUÍSTICOS

Maria Clara Maciel de Araújo Ribeiro

Nas unidades anteriores você aprendeu que: I) a história dos surdos


é uma história de dominação; II)
estudos linguísticos sobre a Língua
de Sinais Americana (ASL – A
m eric an Sign Lan gu age)
comprovaram que as línguas de
sinais são línguas genuínas e
naturais, que possuem estrutura
gramatical própria; III) atualmente os
surdos têm sido compreendidos
como uma minoria linguística e
cultur a l , nã o como pes s oa s
deficientes; IV) a educação que se
almeja hoje para os surdos é uma educação bilíngue, que parta de uma
pedagogia surda; V) o intérprete não é o professor particular do surdo, mas
aquele que torna possível a comunicação e interação no ambiente escolar;
VI) a libras é a primeira língua do surdo e o português é a segunda, podendo
ser considerado como uma língua estrangeira para a população surda
brasileira; VII) a escola inclusiva representa um ganho social, apesar de
ainda estar em processo de construção.
Nesta unidade e na próxima você vai finalmente conhecer mais de
perto a língua utilizada pelas pessoas surdas no Brasil: a Língua Brasileira de
Sinais, conhecida como Libras ou como LSB. Nestas unidades abordaremos
noções tanto teóricas quanto práticas da Libras. No campo teórico, você
descobrirá as diferenças entre língua e linguagem e verá que o sinal pode ser
segmentado em unidades menores, assim como as palavras da língua
portuguesa também o podem. Irá descobrir também qual é a função do
alfabeto manual na Libras, e que esta língua, a exemplo das línguas orais,
também apresenta variações linguísticas, ou seja, a Libras sinalizada em
Minas Gerais pode apresentar características distintas da Libras carioca, por
exemplo. Esta unidade irá prepará-lo, futuro professor, para o estudo prático
da Libras, que será iniciado em profundidade na próxima unidade, mas que
já estará esboçado aqui.
Vamos começar?
Para darmos início aos estudos linguísticos da Libras, precisamos,
primeiramente, desfazer alguns mitos correntes sobre a Língua de Sinais. Ao
estudar a Libras você precisa ter ciência de que ela:

35
Caderno Didático

1. Não é mímica;
PARA REFLETIR 2. Não é uma linguagem e, sim, uma língua.
3. Não é uma língua universal;
4. Não é uma língua artificial, mas natural;
Para você, dos mitos acima,
qual é o mais prejudicial aos 5. Não é uma língua ágrafa;
surdos? Que ressonâncias 6. Não é uma língua limitada, incompleta ou simplória: expressa
sociais este mito pode
conceitos abstratos, ciência, filosofia, poesia, política, enfim, tudo o que
produzir?
requer a atividade mental humana;
7. Não é a versão sinalizada do português, mas uma língua
distinta, uma vez que apresenta características e relações gramaticais
próprias;
8. É considerada a língua materna dos surdos;
9. Requer um sistema elaborado de expressões faciais, que faz
parte da sua estrutura gramatical;
10. Não é o alfabeto manual – ele é utilizado de forma limitada e
esporádica.

No ambiente virtual, junto ao seu professor e tutor, você terá a


oportunidade de aprofundar em cada uma dessas questões, descobrindo
por que muitas delas podem ser consideradas mitos. Aliás, você já refletiu
sobre as origens dos mitos? De onde eles surgem, afinal de contas? Isso você
também poderá discutir com o seu professor e tutor no ambiente virtual.

3.1 LÍNGUA E LINGUAGEM

Para refletir sobre alguns dos mitos acima, inicialmente, pensemos:


o que é língua e o que é linguagem?
Linguagem, em sentido amplo, pode ser entendida como toda e
qualquer forma de comunicação, podendo ser: 1) verbal ou não-verbal 2)
humana ou animal 3) natural ou artificial.
As formas verbais de comunicação se restringem aos sistemas
linguísticos de modalidade oral-auditiva (a língua portuguesa, inglesa,
espanhola, russa, etc.) ou visuo-espacial (a língua brasileira de sinais, a
língua americana de sinais, a língua grega de sinais, etc.).
Formas não-verbais podem referir-se a uma infinidade de
outros meios de comunicação, tais como: I) o imagético – placas de
trânsito; II) o artístico – pintura, música e dança; III) o formal – matemática e
computação; IV) o dos animais – das abelhas e dos chipanzés, por exemplo.
Formas naturais ou artificiais referem-se à dicotomia
acontecimento e espontaneidade versus planejamento e elaboração. No
primeiro caso temos as diversas línguas (orais ou visuais) humanas: línguas
são naturais porque surgem da necessidade de comunicação e interação

36
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

entre os seres humanos, isto é, elas não são frutos de elaboração ou


regulação consciente de seus usuários. No segundo caso temos, além das
línguas planejadas, como o esperanto, a linguagem computacional, entre
outras.
É interessante como a comunicação pode ser estabelecida de
diferentes meios, não é mesmo? Parece que agora você está começando a
construir um conceito de língua e de não-língua. Então, como podemos
definir uma língua? Em que medida uma língua se diferencia de outros
sistemas de linguagem?
Língua pode ser definida, de maneira técnica, como um sistema de
signos linguísticos submetidos a um conjunto de regras gramaticais. Línguas
(orais ou visuais) são estruturadas a partir dos níveis: fonético, morfológico,
sintático e semântico-pragmático. De maneira mais abrangente, língua pode
ser definida como um fenômeno eminentemente social. É a instituição pela
qual os humanos se comunicam e interagem uns com os outros por meio de
signos linguísticos. Língua é um fenômeno inerente aos seres humanos, pois
temos um dispositivo mental, uma faculdade específica – a faculdade da
linguagem – que nos possibilita a aquisição e o exercício de línguas. Dentre
todas as possíveis formas de linguagem, língua é o mais complexo e
sofisticado sistema de todos eles.
Você notou que acabamos de apresentar uma outra definição para
o termo linguagem? Em uma abordagem específica, linguagem pode ser
compreendida também como a faculdade mental que nos possibilita
adquirir línguas.
O quadro a seguir sintetiza tais informações: DICAS

Quadro 2: Linguagem

Linguagem Língua Fique atento: o correto é dizer


Abrangente: música, matemática, Estrito: comunicação LÍNGUA Brasileira de Sinais e

não LINGUAGEM Brasileira de


abelhas ou chipanzés, corpo… verbal/visual humana
sinais. Do mesmo modo, o que
Natural ou artificial Natural chamamos de palavra no
português, chamamos de
Animal ou humano Humano SINAL na Libras. Portanto,
prefira: “como faço o sinal de
Objeto de inúmeros profissionais Objeto de linguistas e casa?” ao invés de “como faço
(biólogos, músicos, físicos), além de semioticistas o gesto ou o símbolo de casa”.
linguistas e semioticistas. Prefira: “a língua dos surdos” a

Todo – continente Parte – contida “linguagem dos surdos”.


A sua materialização e
Faculdade abstrata
possibilidade de exercício

Diante do exposto, pense rápido: para você, a Libras é uma língua


ou uma linguagem? Claro: é uma LÍNGUA. Discuta essa questão com o seu
professor.

37
Caderno Didático

3.2 ALFABETO MANUAL

Agora você começa a entender por que a Libras é uma língua. Mas
será que esta língua é composta principalmente pelo alfabeto manual?
Absolutamente, não! Nas palavras de Quadros e Karnopp (2004, p. 88), a
soletração manual é apenas a representação manual direta das letras do
alfabeto português. Ele não é a essência da Libras; é apenas um recurso que
permite aos seus usuários representar visualmente o português. Por esse
prisma, o alfabeto digital é o “português nas mãos”, digamos assim, não a
Libras em si.
Além disso, ele é utilizado em poucos e específicos momentos: para
expressar nomes próprios ou para veicular significados cujo sinal não existe
ou não se saiba em Libras – como é o caso, por exemplo, de termos técnicos
de áreas específicas. Soletra-se palavras isoladas, nunca frases completas.
Digitamos o nosso nome, ao conhecer alguém. Digitamos palavras cujo sinal
desconhecemos. Mas é preciso tomar cuidado: digitação em demasia
descaracteriza a língua de sinais e torna o enunciado pouco claro. A seguir o
alfabeto manual da Libras:

Figura 6: Alfabeto manual das Libras


Fonte: Felipe; Monteiro (2007, p. 29)

38
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Para tornar-se hábil no uso do alfabeto, propomos a você a seguinte


DICAS
atividade: soletre o seu nome e o nome dos seus familiares. Depois, soletre o
nome de três amigos e do seu país, estado, cidade e bairro. Por fim, pegue
um livro e o abra em uma página qualquer. Digite a primeira e a última
palavra da página. Repita esta operação três vezes... e pronto! Certamente
agora você já está começando a se familiarizar com o alfabeto digital da O Núcleo de Sociedade
Inclusiva (NUSI) da
Libras, não é? Então leia o recadinho que deixamos aqui para você:
Universidade Estadual de
Montes Claros disponibiliza o
download da fonte do alfabeto

Bo n s e s t ud o s digital da Libras. Acesse o site


http://unimontes.br/pagina.php
?param=nusi, realize o
download e divirta-se!
3.3 ICONICIDADE OU ARBITRARIEDADE?

Você deve estar se perguntando: se a Libras não é principalmente o


alfabeto manual, então ela é basicamente mímica? Não, não mesmo. Libras
não é mímica. Se assim o fosse, como diríamos, por exemplo, em Libras: “o
crescimento econômico do país está intimamente relacionado aos gastos
com educação. Na medida em que esse cresce, aquele o acompanha”. Seria
impossível, não é mesmo? É por ser composta por signos linguísticos
convencionados e por estes signos estabelecerem entre si relações
gramaticais estabelecidas no espaço que a Libras pode ser considerada uma ATIVIDADES
língua. E, por ser uma língua, ela é capaz de veicular com precisão o
enunciado acima. Pesquise no dicionário digital
Como se vê, na Libras não nos utilizamos de gestos, mas de signos de Libras
(www.acessobrasil.org.br) cinco
linguísticos – chamados de palavra nas línguas orais e de sinal nas línguas
sinais arbitrários e cinco sinais
visuais. icônicos. Para saber se o sinal é
Atrelada à crença da mímica está uma outra: pensa-se que os sinais arbitrário ou icônico é só
refletir sobre o grau de
da Libras são todos representativos. Ora, os sinais da Libras não mantêm representatividade do sinal. Se
obrigatoriamente uma relação com a sua representação imagética. É o grau for elevado,
verdade que muitos sinais trazem essa relação de pertinência com a provavelmente trata-se de um
sinal icônico. Se não houver
realidade imagética, como é o caso de CASA, BEBER, AVIÃO, TELEFONE,
relação imagética com a
mas é também verdade que muitos não têm absolutamente nenhuma realidade, é provável que o
relação, como é o caso de CONHECER, CONSEGUIR, FAZER, MATERIAL, sinal seja arbitrário. Registre no
seu diário de bordo as suas
ANO, entre outros. descobertas!
No primeiro caso, quando o sinal lembra o referente, dizemos que
os sinais são icônicos, pois a forma indica o conteúdo. No segundo caso,
quando o sinal não dá pistas do conteúdo, dizemos que ele é arbitrário, pois
não há relação de pertinência entre forma e conteúdo, como nos informa
Gesser (2009). No link www.acessobrasil.org .br/libras você encontrará o
dicionário digital de Libras produzido pelo Instituto Nacional de Educação
de Surdos (INES). Acesse o dicionário digital do INES para conferir os sinais
citados.

39
Caderno Didático

3.4 EMPRÉSTIMOS LINGUÍSTICOS

De modo geral, todas as línguas (orais ou visuais) incorporam


palavras de outras línguas e as adequam ao seu próprio sistema fonológico. É
o caso das palavras ballet, abajur, réveillon e lingerie, do francês, e das
palavras show, jeans, futebol e estresse, do inglês – empréstimos linguísticos
do inglês e do francês ao português. A pronúncia, e até mesmo a grafia de
algumas dessas palavras, foram adequadas à nossa língua portuguesa, não é
mesmo? O mesmo acontece na Libras.
Segundo Quadros e Karnopp (2003, p. 88), “palavras do português
podem ser emprestadas à Libras via soletração manual”. A história da Libras
registra que algumas palavras do português, tradicionalmente soletradas na
Libras pela inexistência de um sinal, acabaram por incorporar-se ao léxico da
língua brasileira de sinais, sofrendo adequações ao sistema da língua e
tornando-se um sinal. Chamamos este processo de soletração de
soletração rítmica e dizemos que o sinal provém de um empréstimo
linguístico do português à Libras. Os sinais AL e NUN, por exemplo, são
derivados da soletração manual A-Z-U-L e N-U-N-C-A, respectivamente.
Com o passar do tempo, a soletração dessas palavras ganhou um ritmo
próprio e algumas letras desapareceram. A soletração, portanto, tornou-se
um sinal, conforme
ilustração a seguir:

Figura 8: Soletração
PARA REFLETIR Fonte: Arquivo das autores

N-U-N (NUNCA)
Será então que toda palavra
que soletramos na Libras torna-
se um empréstimo linguístico?
O que você acha? Quando um
sinal soletrado se torna um
empréstimo linguístico? Vamos
discutir no fórum?

Figura 9: Soletração
Fonte: Arquivo dos autores
A-L (AZUL)

Nos sinais acima, o movimento derivado da soletração ganha um


ritmo específico, uma vez que a soletração torna-se um sinal. Em AZUL, por
exemplo, a letra L, realizada logo após a letra A, parece “pular” da mão do
sinalizador.

40
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

3.5 VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

Línguas são vivas e estão em constante movimento. Para se ter uma


ideia desse fenômeno podemos pensar, por exemplo, que o português
falado no Brasil se difere do português falado em Portugal. Apesar de tratar-
se da mesma língua, a variedade falada no Brasil apesenta características
distintas da variedade falada em Portugal (e vice-versa). Chamamos este
fenômeno de variação linguística. Ele também ocorre no interior de um
país ou até mesmo de uma comunidade específica. Pense, por exemplo, no
português falado no Rio de Janeiro e no português falado na Bahia. Há
características distintas entre o falar desses dois estados? E em relação ao
português falado ou escrito pela elite e o português falado ou escrito pelas
classes populares? E o português dos jovens e dos velhos? Ele é exatamente o
mesmo? Certamente, não.
Pense agora no português falado no Brasil no período da
colonização portuguesa, ainda nos idos do século XVI. Ainda falamos e
escrevemos este português? Claro que não! O país e seu povo cresceu, se
modificou e evoluiu e, claro, a língua portuguesa acompanhou todo esse
movimento. A esse fenômeno chamamos mudança linguística. Ele vem
acontecendo ao longo do tempo de maneira contínua, lenta e gradual sem
nos darmos conta desse processo.
O mesmo pode ser verificado na Libras: ela também varia
geograficamente e socialmente, por exemplo. Além disso, ela também sofre
mudanças decorrentes de uma série de fatores, entre eles, o histórico.
A seguir você verá exemplos de variação regional na Libras, isto é,
verá diferenças encontradas na realização do sinal PAI e MÃE, nos estados de
Minas Gerais e de Santa Catarina:

M-Ã-E (Santa Catarina) P-A-I (Santa Catarina)

Figura 10: Soletração


Fonte: Arquivo dos autores

41
Caderno Didático

M-Ã-E (Minas Gerais)


Figura 11: Soletração
Fonte: Arquivo dos autores

Acesse o dicionário digital do


INES
www.acessobrasil.or.br/libras.
Pesquise nele o sinal PAI. Que
sinal apareceu? O que é mais
utilizado em Minas? Os que é
mais utilizado em Santa
Catarina? Outro sinal? Discuta
essa questão com o seu tutor.
Sempre que quiser ver a
realização de dado sinal, P-A-I (Minas Gerais)
recorra a este dicionário. Mas Figura 12: Soletração
não se esqueça de verificar, no Fonte: Arquivo dos autores
seu CD, se o sinal disponível
no dicionário coincide com o
sinal utilizado na sua região, Apesar das variações, acadêmico, a Libras constitui, sim, uma
ok?
unidade linguística. Não pense que os falantes da Libras de diferentes locais
não conseguem se entender! Resguardadas as devidas proporções, as
variações na Libras são semelhantes às variações do português pelo Brasil
afora. Quando estamos no nordeste e ouvimos a palavra “macaxeira”
DICAS
sabemos (ou passamos a saber) que se trata da nossa tradicional “mandioca”,
não é mesmo?
São cinco os parâmetros
fonológicos da Libras:
configuração de mão, locação, 3.6 PARÂMETROS FONOLÓGICOS
movimento, expressão facial e
direção da palma da mão.
Quadros e Karnopp (2003, p.51) nos informam que a Libras é
Neste caderno, trabalharemos
apenas com os três primeiros. basicamente produzida pelas mãos, embora movimentos do corpo e da face
Para aprender mais sobre a também desempenhem importantes funções. Ela é composta por sinais (que
gramática da Libras, leia o livro
não são gestos, nem mímica) convencionados pelos usuários. Você já
das Profas. Ronice M. Quadros
e Lodenir B. Karnopp: Língua reparou que a realização do sinal na Libras envolve a junção de alguns
Brasileira de Sinais, estudos elementos? Ora, o sinal não é um símbolo uno, mas um signo linguístico
linguísticos.
(arbitrário ou icônico) que pode ser segmentado em unidades menores.
Chamamos estas unidades de parâmetros fonológicos. Eles são cinco, mas

42
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

no seu caderno didático trabalharemos com apenas os três principais, que


são configuração de mãos, locação e movimento, assim esclarecidos:
Ÿ Configuração de mãos (CM): diferente(s) forma(s) que a(s)
maõ (s) adota(m) durante a realização de um sinal. A Língua Brasileira de
Sinais, segundo Felipe e Monteiro (2007, p 28), apresenta 64 configurações
de mãos, incluindo as 26 letras do alfabeto. Observe:

Figura 13: Configuração de mão de libras.


Fonte: Felipe; Monteiro (2007, p. 28).

Ÿ Locação (L): lugar no corpo ou em frente a ele em que o sinal é


produzido: um sinal pode ser produzido no braço, (BANHEIRO), na testa,
(APRENDER) ou no chamado espaço neutro, (TRABALHAR), entre outros
exemplos (veja esses sinais no dicionário do INES). Por espaço neutro
entende-se o espaço em frente ao corpo (tronco) do sinalizador. O sinal é
realizado no espaço, sem apoio em nenhuma parte do corpo. Quadros e
Karnopp (2003, p. 57) apresentam as seguintes locações possíveis na LSB:
cabeça (10 locações), tronco (10), mão (11) e espaço neutro.

43
Caderno Didático

Figura 14: Locações possíveis na LSB


Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 57)

Ÿ Movimento (M): forma(s) ou trajetória(s) do(s) movimento(s)


da(s) mão(s). De acordo com Quadros e Karnopp (2003, p. 54), “para que
haja movimento, é preciso haver objeto e espaço”. Nas línguas de sinais, a(s)
mão(s) do sinalizador “representam o objeto, enquanto o espaço em que o
movimento se realiza é a área em torno do corpo do enunciador”. As autoras
apresentam 04 categorias de movimento: tipo, direcionalidade, maneira e
frequência. As variações do movimento, nas línguas sinalizadas, podem ser
extremamente significativas. Nos exemplos a seguir (oriundos da Língua
Americana de Sinais) veremos que alterações no movimento produzem
alterações no significado:

Figura 15: Alterações no movimento


Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 55)

44
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Agora que você já conhece os parâmetros que compõem um sinal,


observe a especificação de cada um deles no sinal BEBER a seguir:

ATIVIDADES

Figura 16: Parâmetros que compõem um sinal Vá ao dicionário digital de


Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 51)
Libras e pesquise os seguintes
sinais: HOJE e BANHEIRO.
No sinal BEBER a mão está configurada em C (CM 51a da tabela de Agora tente descriminar: qual é
a CM de cada um
Felipe e Monteiro, 2007) e se localiza na região em frente à parte inferior do
deles?
rosto (indicada por um círculo). O movimento é curvo, contínuo e para Qual é o
dentro, em direção à boca, conforme indica a seta. Portanto, teremos: L? E
qual é o
Configuração de mão: letra C (ou 51a, conforme tabela); M? .
Locação: em frente à boca; Para precisar a configuração de
mão (CM) basta consultar a
Movimento: semicírculo para cima e para dentro, em direção à
tabela do item 3.6 e mencionar
boca. o número indicado, ok?
Ao aprender um sinal, fique atento à sua composição. Tais
parâmetros são distintivos e podem produzir pares mínimos. O que isso
significa? Significa que se alterarmos apenas um dos três parâmetros,
mantendo os outros dois intactos, podemos produzir um outro sinal, com
significado distinto. Observe:

Sinais que se opõem quanto à


configuração de mão:
PEDRA/QUEIJO.
Mesma locação e mesmo movi-

mãos.

Figura 17: Parâmetros que compõem um sinal


Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 51)

45
Caderno Didático

Sinais que se opõem quanto à

Mesma configuração de mão e


mesmo movimento. Distintas
locações.

Figura 18: Parâmetros que compõem um sinal


Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 51)

DICAS Sinais que se opõem quanto ao

Mesma configuração e mesma

Em uma conversa com surdo,


quando precisar soletrar
palavras em português por Figura 19: Parâmetros que compõem um sinal
desconhecer o sinal na Libras, Fonte: Quardros; Karnopp (2003, p. 51)
não se esqueça de perguntar o
sinal da palavra que digitou. O mesmo acontece no português: pelo ponto de vista formal, o que
Assim você aprenderá um sinal diferencia a palavra bata da palavra pata? A troca de fonemas /b/ e /p/, não é
novo. Para isso, faça o sinal de mesmo? Então fique atento, acadêmico, pois em Libras a troca gratuita de
SINAL, com expressão de
pergunta. Pesquise o verbete um dos parâmetros pode gerar uma comunicação desastrosa!
SINAL no dicionário do INES:
http://www.acessobrasil.org .br/l
ibras/. 3.7 O ESPAÇO DE SINALIZAÇÃO

Idealmente, para se expressar em Libras, você deve utilizar o


espaço à frente do seu corpo: da sua cintura até o topo da sua cabeça.
Muitos autores falam de um quadrado ou círculo virtual, da ordem de 01
metro de altura por 01 metro de largura. Isso significa que devemos sinalizar,
preferencialmente, dentro dessa área. Não é preciso sinalizar esticando
longamente os braços,
nem curvando-se demais
para baixo: a sinalização
deve estar em uma zona
de conforto visual para o
s e u i n t e r l o c u t o r. A
produção de sentenças,
em Libras, ocorre dentro
desse espaço definido. A
pausa (repouso das mãos)
indica o fim de uma
Figura 20: A pausa da mão. sentença.
Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas
/apostia_libras_basico.pdf. Acesso em 09/2010

46
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Quanto à atividade das mãos nesse espaço de sinalização: na


Libras, podemos usar uma ou duas mãos na realização de um sinal. Há sinais ATIVIDADES
feitos com apenas uma mão (CONSEGUIR, TER, SOLTEIRO) e sinais
realizados com duas mãos (BANHEIRO, NOITE, ESPERAR). Não de descri- Observe, no canal Canção
mina se um sinal é feito com a mão direita ou esquerda: isso vai depender da Nova, a atuação do intérprete
lateralidade do sinalizador. Se você é canhoto, faça, portanto, os sinais com a de Libras na TV. Será que o
espaço utilizado por ele
esquerda! coincide com o indicado aqui?
Escreva em seu diário de
bordo.
3.8 COMO OS SURDOS ADQUIREM A LIBRAS?

Normalmente, os filhos herdam a língua dos pais e aprendem com


eles (e com os demais membros da família) a balbuciar as primeiras palavras.
Ora, cerca de 97% dos surdos brasileiros são filhos de pais ouvintes. Você já
pensou como os surdos adquirem, então, a Libras?
Os pais precisam expor seus filhos surdos o mais cedo possível à
Libras. Assim, eles terão melhores chances de se desenvolver de maneira
completa e saudável desde tenra idade. Para aproximar os seus filhos da
Libras é importante que os pais também procurem aprender a língua visual e
que mantenham a criança em contato constante com outros surdos (crianças
e adultos) ou ouvintes sinalizantes.
As escolas especiais, principalmente as que apresentam
profissionais surdos em seu quadro de docentes, será de suma importância
nesse período de aquisição. Convivendo com outros surdos (adultos e
crianças) ou com ouvintes fluentes em Libras, a criança surda irá começar a
entender e a se apropriar, de maneira natural, do sistema linguístico visual.
A Associação de surdos ou uma fonoaudióloga fluente em Libras
também podem ajudar nesse processo, uma vez que quanto mais exposto à
língua, mais rapidamente o sujeito se apropriará dela.
Ressaltamos que pesquisas indicam que há uma relação direta
entre a aquisição da Libras e a aprendizagem do português. O surdo terá
mais chances de obter sucesso na aprendizagem do português se ele tiver
um nível satisfatório de conhecimento da Libras. Isso porque ocorrerá um
processo de transferência de habilidades linguísticas da Libras para o
português.

47
Caderno Didático

REFERÊNCIAS

FELIPE; MONTEIRO, T. A; MONTEIRO; M. S. Libras em contexto: curso


básico, livro do professor/instrutor. Brasília: Programa Nacional de Apoio à
Educação dos Surdos, MEC: SEESP, 2001.

GESSER, A. Libras? Que língua é essa? Crenças e preconceitos em torno da


língua de sinais e da realidade surda. São Paulo: Parábola, 2009.

QUADROS, R. M. & KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos


linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.

Site: http://h endrix.sj.cefetsc.edu.b r/~nepes /video s/apo stilas /


apostia_libras_basico.pdf. Acesso em: out. 2010.

48
UNIDADE 4 LINGUÍSTICA

Maria Clara Maciel de Araújo Ribeiro


Charley Pereira Soares

Vamos começar a movimentar nossas mãos, faces e mentes? Você já


adquiriu importantes conhecimentos linguísticos sobre a Libras e agora
daremos continuidade a este processo através do estudo prático dessa
língua.
Para obter sucesso na aprendizagem da Libras, acadêmico, fique
atento às dicas a seguir:
Ÿ Reproduza todos os sinais e expressões faciais que você vir no
seu caderno didático e no seu DVD;
Ÿ Ao sinalizar, procure não falar;
Ÿ Ensine a um amigo ou familiar os sinais que estiver aprendendo,
assim você terá com quem sinalizar;
Ÿ Para ampará-lo na prática da Libras, produzimos um DVD com
todos os sinais e diálogos que aparecem no seu caderno didático. Sempre
que vir esta imagem recorra ao seu DVD para assistir à realização dos
sinais no contexto de uso. A numeração dos vídeos no DVD coincide com a
numeração das seções desta unidade.
Nesta unidade, para registrar a Libras, usaremos três recursos: a)
fotografias dos sinais, para você visualizar, de imediato, no seu caderno
didático, os sinais abordados; b) vídeos realizados com surdos e ouvintes
fluentes em Libras, que mostrarão a você a maneira exata de realizar cada
sinal; c) “sistema de notação em palavras”, que é uma forma de se registrar os
sinais da Libras através das palavras da língua portuguesa, seguindo, para
tanto, algumas convenções. Para o uso desse sistema de transcrição,
seguiremos as convenções apresentadas por Felipe (1997), a saber:

1. Os sinais da LIBRAS, para efeito de simplificação, serão representados


por itens [...] da Língua Portuguesa (LP) em letras maiúsculas. Exemplos:
CASA, ESTUDAR, CRIANÇA, etc.;
2. Um sinal, que é traduzido por duas ou mais palavras em língua
portuguesa, será representado pelas palavras correspondentes separadas
por hífen. Exemplos: CORTAR-COM-FACA, QUERER-NÃO "não
querer", MEIO-DIA, AINDA-NÃO, etc.;
3. Um sinal composto, formado por dois ou mais sinais (...), mas com a
ideia de uma única coisa, serão separados pelo símbolo ^ . Exemplos:
CAVALO^LISTRA “zebra”;

49
Caderno Didático

4. A datilologia (alfabeto manual), que é usada para expressar nome de


pessoas, de localidades e outras palavras que não possuem um sinal,
está representada pela palavra separada, letra por letra, por hífen.
Exemplos:
J-O-Ã-O, A-N-E-S-T-E-S-I-A;
5. O sinal soletrado, ou seja, uma palavra da língua portuguesa que,
por empréstimo, passou a pertencer à LIBRAS por ser expressa pelo
alfabeto manual com uma incorporação de movimento próprio desta
língua, está sendo representado pela datilologia do sinal em itálico.
Exemplos: R-S “reais”, A-C-H-O, QUM “quem”, N-U-N-C-A, etc.;
6. Na Libras não há desinências para gêneros (masculino e feminino) e
número (plural); o sinal, representado por palavra da língua
portuguesa que possui estas marcas, está terminado com o símbolo @
para reforçar a ideia de ausência e não haver confusão. Exemplos:
AMIG@ “amiga(s) e amigo(s)” , FRI@ “fria(s) e frio(s)”, MUIT@
“muita(s) e muito(s)”, TOD@, “toda(s) e todo(s)”, EL@ “ela(s), ele(s)”,
ME@ “minha(s) e meu(s)”, etc.

Fonte: FELIPE; T. A. Introdução à Gramática da LIBRAS. In: Brasil, Secretaria de Educação


Especial. (Org.). Educação Especial - Língua Brasileira de Sinais. Volume III - Série
Atualidades Pedagógicas 4. 1ª ed. Brasília: MEC/SEESP, 1997, v. III, p. 81-123.

Você percebeu que na unidade III utilizamos algumas dessas


convenções? Viu como foi fácil compreendê-las?

4.1 APRESENTAÇÃO: SINAL PESSOAL E NOME

Você já sabe que o alfabeto manual serve para expressar nomes


próprios, endereços, termos técnicos ou palavras cujo sinal não se saiba.
Mas, e quanto aos nomes de pessoas? Temos que digitá-los sempre que
quisermos nos referir a elas? Ou será que existe uma maneira mais
representativa e pessoal de veicular nomes próprios?
Em Libras, cada pessoa recebe um sinal pessoal para representar o
seu nome. Este sinal se relaciona às características físicas ou da
personalidade da pessoa. Isso significa que não teremos sinais fixos para
cada nome, ou seja, se o seu nome é Luíza, em português, isso não significa
que em Libras o seu nome será “traduzido” para tal sinal. Se tivermos três
Luíza na sala de aula, provavelmente teremos três sinais distintos – um para
cada uma delas. Uma Luiza de cabelo cacheado pode ter o seu sinal atrelado
a essa representação, enquanto outra Luiza, risonha, pode receber um sinal
condizente com essa característica. Veja no seu DVD de apoio o sinal
de cada um dos autores do seu caderno didático. Veja também, em seguida,
dois sinais para duas hipotéticas Luíza.

50
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

A imagem a seguir traz o sinal de SINAL. Observe a expressão facial


do sinalizador. Ele está questionando a alguém sobre o seu sinal. Fique
atento às setas! Neste caderno elas indicarão o movimento do sinal.

Figura 21: Sinal de sinal


Fonte: Arquivo dos autores

Há indícios de que, na cultura surda, ao nos apresentar, indicamos


primeiramente o nosso sinal para, posteriormente, soletrar o nome. O sinal
NOME está expresso na imagem abaixo. A expressão facial do sinalizador
indica que se trata de uma frase interrogativa, conforme veremos adiante.

Figura 22: Sinal de sinal


Fonte: Arquivo dos autores

4.2 CUMPRIMENTOS

Vamos aprender a cumprimentar as pessoas em Libras? Os


cumprimentos iniciais mais utilizados são OI ou aceno de mão, conforme
imagens a seguir:

51
Caderno Didático

Figura 23: Sinal de SINAL


Fonte: Arquivo dos autores

Para ser cortês, utilize também o cumprimento referente ao turno


ATIVIDADES
do dia: bom dia, boa tarde ou boa noite, conforme as imagens a seguir:

Imagine-se diante de um surdo.


Cumprimente-o e diga o seu
nome. Como você perguntaria
a ele o nome dele? Que sinal
faria nessa situação?

Figura 24: Cumprimentos.


Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf. Acesso 08/10

4.3 PRONOMES PESSOAIS

Como o português, a Libras também apresenta um sistema


pronominal para representar as pessoas do discurso. Na Libras, tal sistema é
chamado de apontação ostensiva. Observe o porquê:
Ÿ EU: mão configurada em D (CM 12) apontando para si próprio.
Ÿ VOCÊ: mão configurada em D apontando para o interlocutor
(aquele com quem se fala).
Ÿ EL@: mão configurada em D apontando para o lado (aquele de
quem se fala). Observação: note que, no singular, todas as pessoas têm a
mesma configuração de mão. Apenas a orientação da mão é alterada.

52
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Ÿ Plural: depende da quantidade: dual, trial, quatrial ou coletivo.


Veremos distintas configurações e distintas orientações.
Acesse o seu DVD para ver estes sinais. No DVD você também
poderá ver os pronomes possessivos em Libras.

Conversando em Libras
Diálogo 1
A – OI, BO@ DIA.
B – BO@ DIA.
A – AMIG@ APRESENTAR SINAL-DEL@ NOME C-A-M-I-L-A.
B – OI TUDO BEM? M@-SINAL MEU-NOME C-H-A-R-L-E-Y. PRAZER
CONHECER.
C – TAMBÉM PRAZER CONHECER. VOCÊ SURD@?
B – SIM, SURD@. VOCÊ SURD@ OU OUVINTE?
C – SURD@ TAMBÉM.
B – VOCÊ-DOIS ESTUDAR AQUI UNIMONTES?
A – NÃO. EL@ ESTUDAR EU INTÉRPRETE.
B – BO@. IMPORTANTE SURD@ FACULDADE.
C – VOCÊ CURSO QUAL?
B – PEDAGOGIA. VOCÊ CURSO?
C – LETRAS.
B – LEGAL.
C – PRECISAR IR AULA.
B – TCHAU.

4.4 PRONOMES INTERROGATIVOS

Os pronomes interrogativos em Libras são praticamente definidos


pelas expressões faciais. Não existe pronome interrogativo sem o franzir ou o
levantar de sobrancelhas. Pronomes interrogativos podem vir no início ou no
final da frase. Em algumas ocasiões, no entanto, colocá-lo no fim da frase
pode conferir clareza ao enunciado. Veja no seu DVD os principais
pronomes interrogativos em Libras. Preste atenção às expressões faciais, ok?
As imagens a seguir ilustram os pronomes mais usuais. DICAS

Os sinais da Libras não


apresentam gênero masculino
ou feminino, portanto, quando
precisar indicar gênero, faça o
sinal HOMEM ou MULHER
após o referente. Pesquise estes
COMO? O QUE? QUEM? ONDE? sinais no dicionário do INES.
Figura 25: Pronomes interrogativos.
Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf. acesso 08/10

53
Caderno Didático

4.5 EXPRESSÕES NÃO-MANUAIS (EXPRESSÕES FACIAIS)

Expressão facial é sinônimo de vida e expressividade nas línguas de


sinais. Elas não são adornos opcionais, mas itens gramaticais obrigatórios!
Expressões faciais (ou expressões não-manuais) são movimentos específicos
produzidos pelo tronco, pela cabeça ou pelos músculos da face (região dos
olhos, da boca ou das bochechas). De acordo com Quadros e Karnopp
(2003, p. 60), expressões não-manuais se prestam a duas diferentes funções
na Libras:
a) Compõem sinais específicos (como aqueles que se relacionam a
emoções) e definem o grau de intensidade dos verbos, advérbios e adjetivos.
b) Marcam sentenças interrogativas e estabelecem concordância.
No primeiro caso, compondo sinais específicos, veremos as
expressões faciais veicularem emoção na medida em elas que fazem parte
de sinais notadamente emotivos, como é o caso das expressões que
acompanham os sinais VERGONHA, ORGULHO (dependendo do
sentido), TRISTEZA, ALEGRIA e SURPRESA, por exemplo:

VERGONHA ORGULHO TRISTEZA

ABORRECIMENTO ALEGRIA
Figura 26: Expressões faciais
Fonte: http://danidraws.com/2007/12/06/50-facial-expressions-and-how-to-draw-them

As expressões acima não são os sinais em si mesmos, mas devem


acompanhar os sinais que correspondem a cada uma dessas situações. Para
ver estes sinais e as expressões que devem conter cada um deles, acesse o
seu DVD .
As expressões podem ainda ser contextuais de modo a determinar,
assim, circunstâncias específicas. É o caso, por exemplo, da distinção entre
um choro de tristeza e de um choro de raiva. O sinal CHORAR será o
mesmo, mas a expressão facial será distinta e produzida em concomitância
com o sinal, como é o caso das expressões contextuais a seguir:

54
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

CHORAR DE TRISTEZA CHORAR DE RAIVA


Figura 27: Expressões contextuais
Fonte: Arquivo das autoras

As expressões podem ainda definir o grau de intensidade de um


adjetivo, por exemplo. Veremos que as diferenças entre os sinais
BONITINHO, BONITO e BONITÃO se relacionam principalmente à
mudança de expressão, além da amplitude do movimento do sinal,
indicado pela seta branca, observe:

ALGO OU ALGUÉM É BONITINHO


Figura 28: Grau de intensidade de um adjetivo
Fonte: Arquivo dos autores.

ALGO OU ALGUÉM É BONITO


Figura 29: Grau de intensidade de um adjetivo
Fonte: Arquivo dos autores.

55
Caderno Didático

DICAS

O Instituto Nacional de
Educação de Surdos (INES)
disponibiliza em seu site uma
biblioteca digital com vários
títulos sobre os surdos e a
Libras. Confira no site
http://www.ines.gov.br/Paginas/
biblioteca.asp.

ALGO OU ALGUÉM É MUITO BONITO OU BONITÃO


Figura 30: Grau de intensidade de um adjetivo
Fonte: Arquivo dos autores.

No segundo caso, quando as expressões cumprem funções


gramaticais, tais funções estão relacionadas ao tipo de frase que se quer
produzir, uma vez que as expressões faciais definirão se ela é afirmativa,
exclamativa ou interrogativa. Este é, justamente, o tema do próximo tópico.

4.6 TIPOS DE FRASES

De acordo com Felipe e Monteiro (1997), as línguas de sinais


utilizam as expressões faciais e corporais para estabelecer formas negativas
ou interrogativas, “por isso, para perceber se uma frase em Libras está na
forma afirmativa, exclamativa, interrogativa ou negativa, precisa-se estar
atento às expressões facial e corporal (sic) que são feitas simultaneamente a
certos sinais ou com toda a frase”.

4.6.1 Na forma afirmativa, a expressão facial é neutra ou de


consentimento, dependendo do contexto.

Figura 31: Expressão, forma afirmativa


Fonte: Arquivo dos autores.

Um exemplo de frase afirmativa em libras

56
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

CHARLEY

PROFESSOR
Figura 32: Expressão, forma afirmativa
Fonte: Arquivo dos autores.

Tradução: Charley é professor de Libras

4.6.2 Na forma interrogativa a testa e as sobrancelhas se franzem


ou levantam e a cabeça é levemente inclinada para cima.

QUEM? O QUÊ? COMO? ONDE? QUANDO? QUAL?


Figura 33: Expressões, forma interrogativa
Fonte: Arquivo dos autores.
Um exemplo de frase interrogativa em Libras

VOCÊ APRENDER
Figura 34: Expressões, forma interrogativa
Fonte: Arquivo dos autores.

57
Caderno Didático

LIBRAS POR QuÊ?


Figura 35: Expressões, forma interrogativa
Fonte: Arquivo dos autores.

Tradução: Porque você está aprendendo Libras?

4.6.3 Na forma negativa, de acordo com Felipe (1997), é possível


verificar pelo menos três distintos processos:
a) Acrescenta-se o sinal NÃO (manual) à frase afirmativa: EU
VIAJAR BH NÃO.
a) Acrescenta-se um aceno de cabeça simultaneamente à ação que
está sendo negada: EU CONHECER-NÃO PROFESSOR
b) Utiliza-se sinais que incorporam a negação em sua estrutura: TER-
NÃO QUERER-NÃO, GOSTAR-NÃO, SABER-NÃO: EU GOSTAR-
NÃO PEIXE.

Figura 36: Frase negativa.


Fonte: Arquivo dos autores.

Exemplo de frase negativa em Libras

PROFESSOR PORTUGUÊS
Figura 37: Frase negativa.
Fonte: Arquivo dos autores.

58
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

VOCÊ CONHECE-NÃO
Figura 38: Frase negativa.
Fonte: Arquivo dos autores.

4.6.4 Na forma exclamativa as sobrancelhas devem ser levantadas


e a cabeça ligeiramente inclinada para cima ou para baixo. Pode-se verificar
também um intensificador representado pela boca notadamente aberta (ou
fechada).

Figura 39: Frase exclamativa


Fonte: Arquivo dos autores.

Exemplo de frase exclamativa na Libras

SUA CASA
Figura 40: Frase exclamativa
Fonte: Arquivo dos autores.

59
Caderno Didático

BONIT@ GRANDE
Figura 41: Frase exclamativa
Fonte: Arquivo dos autores.

Tradução: Sua casa é enorme e muito bonita.

Conversando em Libras

Diálogo 2

A – SUSTO! BOB@! EU PENSAR LADRÃO!


B – DESCULPA, VERGONHA!
A –OK.
B – VOCÊ PALESTRA AGORA?
A – HOJE NÃO-PODE. FILHO DOENTE.
B – DOENTE O QUÊ?
A – ONTEM FILHO FOI CHUVA BRINCA PULA. HOJE FEBRE TOSSE.
B – CRIANÇAS...
A – EU BRAV@ FALAR JÁ PODER-NÃO CHUVA PODER-NÃO.
B – PRECISO IR. PALESTRA COMEÇAR AGORA.
A – TCHAU.
B – TCHAU.

4.6.5 Aprenda a realizar expressões faciais

Para aprender a realizar expressões faciais você terá que,


primeiramente, deixar a vergonha de lado! Sinta os músculos da sua face e
perceba que eles podem ser flexionados. Agora vá para a frente do espelho e
tente manifestar, através da face, as seguintes emoções: alegria, raiva,
tristeza, tédio, vergonha, medo e desconfiança. Marque um encontro virtual
com um colega, via webcam, e veja se ele descobre as expressões que você
irá fazer. Deixamos, a seguir, algumas expressões faciais para você descobrir
quais são. Escreva no quadro ao lado o que elas significam ou que tipo de
frase veiculam. Aproveite e tente imitá-las na frente do espelho!

60
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Sobrancelhas levantadas e
cabeça para trás. Surpresa

Figura 42: Expressões


Fonte: Arquivo dos autores.

Sobrancelhas abaixadas e cabeça


levemente inclinada.

Figura 43: Expressões


Fonte: Arquivo dos autores.

Expressão facial neutra

Figura 44: Expressões


Fonte: Arquivo dos autores.

Sobrancelhas levantadas e
boca aberta

Figura 45: Expressões


Fonte: Arquivo dos autores.

61
Caderno Didático

Sobrancelhas franzidas e
boca torta para baixo

Figura 46: Expressões


Fonte: Arquivo dos autores.

4.7 SISTEMAS NUMÉRICOS

Na Língua Brasileira de Sinais os números podem ser sinalizados de


quatro diferentes maneiras, dependendo do contexto de uso (SILVA et al.,
2010):

4.7.1 Números Cardinais A

Representação numérica geral (com o foco em situações de


informação):

Figura 47
Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf

Usamos números cardinais para informar idade, número de


telefone, número de conta bancária, de documentos pessoais, número de
páginas, etc.

4.7.2 Números Cardinais B

São usados especificamente para quantidades:

62
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Figura 48
Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf

Exemplo: quantidade de alunos, de provas, de professores, etc.


Note que a diferença entre a representação geral de números cardinais e a
representação específica (para quantidade) está, precisamente, nos quatro
primeiros algarismos (de 1 a 4). A representação dos próximos seis
algarismos (de 5 a 9 e 0) se mantém inalterada.

4.7.3 Números Ordinais (primeiro, segundo, terceiro...)

A configuração de mão é a mesma dos números cardinais A, com


uma única diferença: acrescenta-se, a cada número, um movimento
trêmulo e breve.

Figura 49
Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf

Exemplo: segundo da fila, quarto filho, terceiro emprego, etc.

4.7.4 Valores monetários

Utiliza-se a configuração de mão dos números cardinais B (para


quantidades).
Para representar os valores de um até nove reais, usa-se o sinal do
numeral correspondente ao valor, incorporando a este o sinal VÍRGULA.
Assim, o numeral para valor monetário terá pequenos movimentos rotativos.

63
Caderno Didático

Pode ser usado também para estes valores (um a nove) o sinal do numeral
DICAS correspondente seguido dos sinais soletrados R-L “real” ou um R trêmulo
(reais).
Acima desses valores, o movimento terá a sua amplitude
Quer aprender a sinalizar aumentada, tornando-se maior e mais acentuado à medida que os valores
alimentos em Libras? Então aumentarem (dezena > centena > milhar > milhão). Verifica-se, ainda,
acesse o site
http://www.youtube.com/watch
conforme Felipe (1997), uma possível gradação na expressão facial.
?v=g0zfPc2fTDI e assista a uma
divertida aula! Bons estudos!
Assista no seu DVD

QUANTO-CUSTA
CARO
BARATO

4.8 MARCAÇÃO TEMPORAL

Você pode estar se perguntando: como faço para determinar o


tempo (passado, presente, futuro) da fala ou da ação na Libras? Na Libras o
tempo pode ser marcado pelo menos de duas diferentes maneiras: a)
realizando o sinal PASSADO, PRESENTE ou FUTURO no início da frase ou
em local adequado ao contexto – de forma a indicar que os verbos que virão
estão no tempo verbal mencionado. Nesse caso, a amplitude do movimento
do sinal indica se trata-se de um passado (ou futuro) muito ou pouco
distante; b) indicando a partir de um advérbio ou sinal específico (HOJE,
ONTEM, DEPOIS-DE-AMANHÃ, SEMANA-PASSADA, ANO-QUE-VEM
etc.) o momento da narrativa:

PASSADO
Figura 50: Movimento de narrativa
Fonte: Arquivo dos autores.

64
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

PRESENTE
Figura 51: Movimento de narrativa
Fonte: Arquivo dos autores.

FUTURO
Figura 52: Movimento de narrativa
Fonte: Arquivo dos autores.

Acesse o seu DVD e veja a realização das frases a seguir em ATIVIDADES


Libras. As traduções para o português estão ao lado.
Ÿ PASSADO EU NÃO-SABER LIBRAS (Eu não sabia libras.). De posse do vocabulário que
Ÿ EU APRENDER LIBRAS PRESENTE (Eu estou aprendendo você está adquirindo em
Libras, tente elaborar uma frase
Libras.). interrogativa no passado e
Ÿ FUTURO EU LIBRAS TRANSFORMAR (Futuramente, serei outra exclamativa no presente.
ótimo em Libras.). Atente-se para a expressão
facial, ok?
Ÿ AMANHÃ PROVA MATEMÁTICA (Amanhã tem prova de
matemática.).
Ÿ ONTEM PROVA HISTÓRIA (Ontem teve prova de história.).
Ÿ DEPOIS-AMANHÃ PROVA BIOLOGIA (Depois de amanhã terá
prova de biologia.).

65
Caderno Didático

4.8.1 Dias da semana

A figura 53 ilustra os sinais dos dias da semana em Libras. De


segunda a quinta-feira, a locação continua a mesma e a configuração de mão
vai se alterar conforme o dia da semana: segunda-feira (dois dedos), terça-
feira (três dedos) e quarta-feira (quatro dedos). Quinta-feira: não se altera a
locação, mas a configuração de mão é o número 5 (cardinal). Sexta-feira:
sinal icônico (peixe). Sábado: mesmo sinal de laranja. Domingo: CM: mão
configurada em D. L: de frente à boca. M: círculo de frente à face. Observe
as imagens ilustrativas:

PARA REFLETIR

Ao lado das imagens dos sinais


dos dias da semana (retirados
do dicionário enciclopédico
trilíngue da Libras) aparece um
tipo de símbolo ou desenho.
Você sabe do que se trata?
Reflita por um instante e
questione o seu professor sobre
essa ocorrência.

Sábado

Figura 53: Dias da semana.


Fonte: (CAPOVILLA; RAFHAEL, 2002, p. 1176).

4.8.2 Meses do ano

Sinalizar os meses do ano em Libras e fácil, acadêmico. Basta


realizar o sinal MÊS (veja no dicionário digital) mais a especificação
adequada: JANEIRO, FEVEREIRO, MARÇO, etc. A tabela a seguir ilustra
apenas os doze meses do ano, sem o sinal MÊS que deve precedê-los. Mas
não se preocupe! Acesse o seu DVD para ter uma visão completa da
sinalização.

66
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

MESES DO ANO

ATIVIDADES

Agora pense rápido em Libras:


I) que dia é hoje? II) que dia foi
ontem? III) que dia será
amanhã? IV) em que dia da
semana você costuma ir à
igreja? V) qual é o seu dia da
semana predileto? VI) em que
mês se comemora a páscoa?
VII) em que mês se comemora
o natal? VIII) qual é o mês do
seu aniversário? IX) quais são os
meses em que temos férias
escolares? E qual é o mês das
festas juninas? Se você
respondeu a todas as questões
consultando ou sem consultar
o material disponível,
parabéns! O importante é que
você movimentou a sua mente
e as suas mãos!

Figura 54: Calendário


Fonte: hendrix.sj.cefetsc.edu.br/~nepes/videos/apostilas/apostia_libras_basico.pdf.

4.8.3 Horas

Como expressamos as horas em Libras? Seguindo o modelo


imagético da sequência dos números no relógio digital: primeiro os números
referentes às horas, depois os números referentes aos minutos (sem sinalizar
os dois pontos). Fácil, não é? Acesse o seu DVD para uma melhor
visualização. A gramática da Libras apresentas algumas regrinhas
específicas para a produção de horas. Veja abaixo:

67
Caderno Didático

Quadro 3: Horas em libras

1. Expressamos as horas, de 1 a 4 como expressamos


quantidades (cardinais B). Os minutos são expressos como os
cardinais A. Ex: 03:21h.
2. Para representar a fração de meia hora (30 minutos), a
configuração de mão varia de acordo com a variedade
linguística da comunidade surda: as formas mais usuais são: um
semicírculo na face, o sinal METADE (no espaço neutro) ou 30
min.
3. Em Libras costuma -se utilizar mais o formato de 12 horas
(4: 16h) do que o de 24 horas (16:16h). Quando o
contexto for obscuro, acrescenta -se o sinal MANHÃ, TARDE,
NOITE ou MADRUGADA após o número.

E como se pergunta quantas horas são? Ou a que horas é um


compromisso? (A) Como expresso horas decorridas ou a serem decorri-
das em Libras? (B)

Figura 55: Horas em libras.


Fonte: FELIPE; MONTEIRO (2007).

B: Os sinais de UMA-HORA até QUATRO-HORAS seguem a


configuração de mão dos números cardinais B (quantidade) e são expressos
a partir de um movimento semicircular ao redor da face. A partir de 5 horas,
faz-se o sinal de HORA seguido do número que se quer expressar (HORA 5,
HORA 10, HORA 15...).
E quanto ao sinal de meia-hora ou de minutos? Ora, para o primei-
ro, basta realizar um semicírculo ao redor da face, com a mão configurada
em D. Para o segundo, basta expressar o número seguido do sinal MINUTO
(mão configurada em M com um movimento breve e curto, para cima e para
baixo). Observe as ilustrações a seguir:

68
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Figura 56: Horas


Fonte: FELIPE; MONTEIRO (2007).

Assista no seu DVD e descubra as respostas

1 – QUE-HORAS?
Ÿ AULA COMEÇAR QUE-HORA AQUI?
Ÿ VOCÊ TRABALHO COMEÇAR QUE-HORA?
Ÿ AULA TERMINAR QUE-HORA?
Ÿ VOCÊ ACORADAR QUE-HORA?
Ÿ VOCÊ DORMIR QUE-HORA?

2 – QUANTAS-HORAS?
Ÿ VIAJAR SÃO-PAULO QUANTAS-HORAS?
Ÿ TRABALHAR ESCOLA QUANTAS-HORAS?
Ÿ VOCÊ ESTUDAR LIBRAS QUANTAS-HORAS DIA?

Conversando em Libras

Diálogo 3

A – BO@ NOITE!
B – BO@ NOITE!
A – EU QUERER INSCRIÇÃO CURSO.
B – ESCOLHER JÁ?
A – JÁ, ESCOLHER CURSO LIBRAS.
B – CERTO, EU FAZER INSCRIÇÃO VOCÊ. NOME?
A – M-A-R-I-A C-L-A-R-A
B – IDADE VOCÊ?
A – IDADE? 29
B – ENDEREÇO?
A – RUA MANGUEIRA, NÚMERO 171, BAIRRO SANTA LÚCIA.

69
Caderno Didático

B – NÚMERO TELEFONE?
A – 3212-4137
B – ESCOLARIDADE?
A – 2º GRAU PRONTO.
B – CASADA OU SOLTEIRA?
A – CASADA
B – FILHO TER?
A – TER DOIS
B – IDENTIDADE?
A – MG-12.987.654
B – NOME PAI?
A – JOÃO SILVA.
DICAS B – NOME MÃE?
A – MARIA SOARES.
B – PRONTO, AGORA VOCÊ VIRAR DIREITA LÁ COMEÇAR CURSO
LIBRAS. 01 HORA CURSO.
Visite o site http://editora-arara-
azul.com.br/novoeaa/mapa-do- A – OBRIGAD@.
brasil-em-libras/. Você
B – MÊS DEPOIS VOCÊ PAGAR R$ 50,00.
encontrará um mapa do Brasil
animado, contendo o sinal de
todos os estados e capitais 4.9 VERBOS E ADJETIVOS
brasileiras. Aprenda e divirta-
se!
Na Libras os verbos são flexionados de maneira distinta do
português. Por este motivo, costuma-se pensar que, na Libras, não existe
flexão verbal. Mas ela existe sim, apesar de ser distinta do português.
Observe os verbos abaixo:

4.9.1 Verbos direcionais

1 -AJUDAR 2 - AJUDAR [me]

Figura 57: Verbo e adjetivos.


Fonte: Arquivo dos autores.

70
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

1 - ENSINAR
Figura 58: Verbo e adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

2 - ENSINAR [me]
Figura 59: Verbo e adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

1 - PERGUNTAR 2- PERGUNTAR [me]


Figura 60: Verbo e adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

1- ENVIAR (e-mail) 2- ENVIAR [me] (e-mail)


Figura 61: Verbo e adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

71
Caderno Didático

O que você observou na sequência de sinais acima? Que diferenças


existem entre as imagens 1 e as imagens 2? Se você respondeu que é a
direção do movimento, você acertou! Preste atenção à explicação: se EU
ajudo alguém, o movimento parte de EU em relação a ELE. Se ELE me ajuda,
o movimento parte DELE em relação a EU. Interessante, não é? Nem todos
os verbos têm a propriedade de serem direcionais. Existem ainda outros
tipos de flexão verbal na Libras, mas não é o nosso objetivo contemplá-las
aqui.

4.9.2 A seguir, alguns verbos de ação e processo:

TRABALHAR ESTUDAR
Figura 62: Verbos de ação e processo
Fonte: Arquivo dos autores.

DICAS
QUERER PROCURAR
Figura 63: Verbos de ação e processo
Fonte: Arquivo dos autores.
Assistia ao vídeo
disponibilizado no youtube
para aprender mais verbos:
http://www.youtube.com/watch
?v=9r4AKZvS1do&feature=rel
ated. Bons estudos!

PRECISAR
Figura 64: Verbos de ação e processo
Fonte: Arquivo dos autores.

72
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Conversando em Libras

Diálogo 4
A-PROFESSO@ DESCULPAR EU FALTAR AULA.
B-PORQUE VOCÊ FALTAR DE NOV@?
A-AGORA TRABALHO ADMITIR NOV@. SEMPRE CANSAR.
B-VOCÊ QUERER FORMAR? ESTUDAR PRECISAR.
A-VOCÊ CORRET@. VOCÊ AJUDAR (ME)? ENSINAR (ME) EU PASSAR ANO
FORMAR.
B-EU AJUDAR VOCÊ. MAS PRECISAR ESFORÇAR PRECISAR. CASA
AMANHÃ EU PROCURAR LIVRO BO@ EMPRESTAR VOCÊ ESTUDAR,
OK?
A – ÓTIM@. MUITO OBRIGAD@.

4.9.3 Sobre a intensidade dos adjetivos

Na Libras os adjetivos também podem ser flexionados. No item 4.5


você viu um exemplo de flexão: Bonitinh@, bonit@, bonit@++++. Você
se lembra qual foi o parâmetro alterado para produzir mudança de
sentido? Volte algumas páginas para descobrir. Já viu? Foi o movimento,
além da expressão facial, não é mesmo? Isso significa que à medida que
aumento ou diminuo a expressividade da minha fisionomia e a amplitude do
movimento (na maioria dos casos) flexiono em grau o adjetivo. Observe:

2. ALEGRE
Figura 65: Intensidade de adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

1. BRAVO 2. BRAVO
Figura 66: Intensidade de adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

73
Caderno Didático

1. GORDO 2. GORDO
Figura 67: Intensidade de adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

1. MAGRO 2. MAGRO
Figura 68: Intensidade de adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

1. CANSADO 2. CANSADO
Figura 69: Intensidade de adjetivos.
Fonte: Arquivo dos autores.

Viu só! A expressão facial e as modulações no movimento fazem


parte da estrutura gramatical da Libras. Não há Libras sem elas.

Veja no seu DVD


EU TRABALHO CANSAD@.
EU CANSAD@-MUITO DORMIR NADA.
EL@ ALEGRE.
EL@ ALEGRE-MUIT@ CONCURSO CONSEGUIU.

74
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

4.10 CLASSIFICADORES

As línguas visuais, como a Libras, apresentam uma propriedade


criativa muito interessante: os classificadores (CL). O que são classificadores
nas línguas visuais? São possibilidades de representar e descrever, através das
configurações de mãos, propriedades físicas (ou emotivas) de pessoas, coisas
ou objetos.
Para Felipe (1997), classificadores podem ser considerados
marcadores de concordância de gênero: PESSOA, ANIMAL, COISA. Gênero
não se refere aqui a masculino ou feminino, mas à espécie e características
do referente (que pode ser pessoa, animal ou coisa). Por exemplo: usarei
distintas configurações de mão e distintos movimentos para sinalizar que: a)
um objeto caiu da mesa b) um animal caiu da mesa c) uma pessoa caiu da
mesa. Note que a configuração de mão e o movimento utilizados
dependerão das características do referente. Veja no seu DVD as
diferenças na sinalização de:

a) Uma folha caiu da mesa / uma TV caiu da mesa;


b) Um cachorro caiu do muro/ um gato caiu do muro;
c) Uma pessoa caiu da cama/ uma criança caiu da cama.

Outro exemplo: para indicar aflição, posso colocar a mão


configurada em A sobre o meu peito, com movimentos de sobressaltos
repetidos. Para representar o pouso de uma borboleta ou de um pássaro no
meu ombro, terei de usar configurações de mãos adequadas às característi-
cas físicas desses seres. Para representar um carro batendo em um poste,
transformo a minha mão dominante no carro e o antebraço da mão passiva
no poste. Classificadores conferem coerência, mobilidade e liberdade
criativa à Libras.
Apresentaremos a seguir alguns exemplos de classificadores –
baseados em configurações de mãos (CM) específicas (ver tabela do item 3.6
unidade III) – que representam tamanho, forma e, em alguns casos, modos
de locomoção. A tabela abaixo foi adaptada de Supalla (1986):

75
Caderno Didático

Quadro 4: Classificados
Categoria CM Exemplos de CL:

Objeto fino 40 BARRA-FERRO-CONSTRUÇÃO


38 FIO-DENTAL-FINO

61 MESA-PLANA
Objeto plano TELHADO-RETO
62
PORTA-ARMÁRIO-RETA

COELHO-PULANDO, SAPO -
Animal pulando 53ª
PULANDO

Animal voando BORBOLETA -VOANDO


64
PÁSSARO-VOANDO
Veículos de duas MOTO-LOCOMOVENDO-SE
rodas em 63 BICICLETA-LOCOMOVENDO-
locomoção SE
02 (grandes)
ELEFANTE-ANDANDO
62 (médio e de
CACHORRO-ANDANDO
Animal andando pequeno porte)
GATO -ANDANDO
28 (aves em
AVES-ANDANDO
geral)

PEIXE-NADANDO
Animal nadando 63
GOLFINHO-NADANDO
HOMEM-ALTO
Seres ou coisas HOMEM-BAIXINHO
62
altas OBJETO-NO-ALTO
OBJETO-EM-BAIXO
Fonte: quadro adaptado de Supalla (1986)

Além de representar, os classificadores servem ainda para descrever


elementos subjetivos como: paladar, cheiro, sentimento, textura ou olhar.
Como você descreveria os seguintes seres/objetos a seguir? Vamos tentar
descrevê-los a partir das CMs da Libras?

Quadro 5: Descrição de seres / objetos

Descreva a forma e o
paladar do abacaxi.

Figura 70: Abacaxi


Fonte: www.influx.com.br/imgblog
/image/ abacaxi.png. Acesso 07/2010

76
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

Descreva a forma,
o andar e a força do jacaré.
Figura 71: Jacaré
Fonte: www.cecgodoy.pro.br/banco
deimagens/d/571-3/jacare-06-md-
web.jpg Acesso 07/2010

Descreva o olhar de um
homem ciumento e bravo.

Figura 72: Rosto


Fonte: http://tracosetrocos.
files.wordpress.com/2007/
07/olhar-mau.jpg?w=468
Acesso 07/2010

4.11 ORDEM BÁSICA DA FRASE

A Libras apresenta a mesma organização sintática que o português?


Os termos da frase aparecem na mesma ordem? O que você observou até
aqui? Em português, o mais comum é a ordem: sujeito-verbo-objeto: o
menino subiu na árvore. Em Libras, segundo Felipe; Monteiro (1989),
Ferreira-Brito (1995) e Quadros; Karnopp (2003), apesar de ser possível
observar certa flexibilização da ordenação da frase, a ordem mais recorrente
é sujeito-verbo-objeto.
No entanto, em muitos e específicos momentos, é possível prever a
necessidade de inversão: em algumas ocasiões, o objeto deve anteceder o
verbo. Isso porque a Libras é uma língua visual que se organiza no
espaço, portanto, o cenário da ação, em alguns momentos, deve ser
construído previamente. É o caso, por exemplo, da frase: o menino subiu na
árvore, em Libras: MENINO ÁRVORE SUBIU. Ora, para fazer uso de um
classificador (o menino subindo na árvore) é preciso, primeiramente,
localizar o objeto no espaço e, posteriormente, a ação vinculada a ele. No
seu DVD você poderá visualizar com clareza

77
Caderno Didático

4.12 PARA FINALIZAR

O que vimos até aqui, acadêmico, foi uma pequena amostragem


do que é a Libras. Para continuar os estudos dessa língua você deve procurar
um curso na sua cidade. Em cidades do interior, os cursos de Libras
costumam ser oferecidos pela Associação de Surdos local ou por
determinadas igrejas. Procure se informar sobre isso.
Esperamos que você não deixe o tempo alterar a sua capacidade
de se comunicar em Libras ou de refletir sobre questões relacionadas à
comunidade surda. Procure conhecer surdos conterrâneos, assistir a vídeos
sinalizados na internet, e tente manter contato com surdos nos seus estágios
curriculares.
Finalizamos este caderno com as palavras da surda Emmanuelle
Laborit (1996):

Utilizo a língua dos ouvintes, minha segunda língua, para


expressar minha certeza absoluta de que a Língua de Sinais é
nossa primeira Língua, aquela que nos permite ser seres
humanos comunicadores. Para dizer, também, que nada
deve ser recusado aos Surdos, que todas as linguagens
podem ser utilizadas, a fim de se ter acesso à vida.

REFERÊNCIAS

CAPOVILLA, F. C. ; Raphael, W. D. Dicionário Enciclopédico Ilustrado


Trilíngue da Língua de Sinais Brasileira. Volumes I e II. São Paulo, SP:
Edusp, Imprensa Oficial, Feneis, 2002.

FELIPE, T. A . Introdução à Gramática da LIBRAS. In: Brasil, Secretaria de


Educação Especial. (Org.). Educação Especial - Língua Brasileira de Sinais
Volume III - Série Atualidades Pedagógicas 4. 1ª ed. Brasília: MEC/SEESP,
1997, v. III, p. 81-123. Disponível em: http://www.ines.gov.br/ines_
livros/SUMARIO.HTM. Acesso: setembro de 2010.

FERREIRA-BRITO, L. Por uma gramática da Língua de Sinais. Rio de


Janeiro: Tempo Brasileiro, 1995.

FELIPE; MONTEIRO, T.A; MONTEIRO; M. S. Libras em contexto: curso


básico, livro do professor/instrutor. Brasília: Programa Nacional de Apoio à
Educação dos Surdos, MEC: SEESP, 2007.

QUADROS, R. M. & KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos


linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.

78
Língua Brasileira de Sinais - Libras
Unimontes

SILVA, F.I. et al. Caderno Pedagógico I. Curso de Libras. Centro Federal de


Educação Tecnológica de Santa Catarina – CEFET/SC. Núcleo de Estudos e
Pesquisas em educação de surdos – NEPS. Santa Catarina, 2007. Disponível
em: http://hendrix.sj.cefetsc.edu.br/ ~nepes/videos/apostilas/apostia_
libras_basico.pdf. Acesso: outubro de 2010.

SUPULLA, P. The classifier system in ASL. In: GRAG, C, (org.). Nouns classes
and categorization. Typological studies in language. Philadelphia. John
Benjamin Publishing Co., 1986.

79
GLOSSÁRIO

Fonética-fonologia: estudo científico das características dos sons de uma


língua (parte física, articulatória e percepção dos sons) descrevendo e
classificando os mesmos.
Léxico: conjunto de palavras existentes em uma língua.
Língua materna: a primeira língua adquirida pelo sujeito. Língua
naturalmente adquirida pelo sujeito e para a qual ele tem intuições e
informações linguísticas sobre a forma e uso.
Língua natural: acepção 1: a língua que é mais naturalmente adquirida pelo
indivíduo e na qual ele se sentirá mais confortável. Acepção 2: Língua não-
artificial, não planejada.
Língua: “Sistema de signos compartilhado por uma comunidade linguística
comum. A fala ou os sinais são expressões de diferentes línguas. A língua é
um fato social, ou seja, um sistema coletivo de uma determinada
comunidade linguística” (QUADROS, 2004, p. 7).
Linguagem: acepção 1: relaciona-se à faculdade mental que nos possibilita
o exercício da língua. Acepção 2: refere-se a todo e qualquer sistema de
comunicação. A língua seria, assim, o maior e mais complexos deles.
Linguista: aquele que estuda a linguagem humana. “O linguista é (...) aquele
que quer descobrir como a linguagem 'funciona', e isto ele faz através do
estudo de línguas específicas” (CRYSTAL, 2004, p. 17).
Linguística: estudo científico das línguas.
Mão-dominante: a mão ativa, que realiza o movimento durante a
realização de um sinal.
Mão-passiva: a mão que recebe ou aguarda a outra.
Mímica: modo de expressar um pensamento por meio de gesto, expressão
fisionômica ou corporal.
Segunda língua: língua que aparece como a segunda na ordem da
aquisição, diferente da língua materna ou natural, podendo demandar
maior esforço e aplicação na aprendizagem. Pode ser entendida como
sinônimo de língua estrangeira.
Signo linguístico: objeto linguístico que contém forma e sentido. De acordo
com Saussure (2007), o signo é uma imagem psíquica que possui uma
imagem acústica (ou visual no caso das línguas de sinais) e um conceito, em
resumo, um significante e um significado, ou, de forma simplista, uma forma
e um conteúdo.

81
Caderno Didático

Sinal: item lexical (palavra) das línguas de sinais.


Variação linguística: fenômeno linguístico em que elementos de uma
língua se diferem espacial, temporal e socialmente.
Vocabulário: conjunto de palavras recortadas do léxico de uma língua.

REFERÊNCIAS
CRYSTAL, D. Que é linguística. Tradução de Eduardo Pacheco de Campos.
Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 2004.
SAUSSURE, F. de. Curso de linguística geral. São Paulo: Cultrix, 2007.
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. O tradutor e intérprete de língua
brasileira de sinais e língua portuguesa / Programa Nacional de Apoio à
Educação de Surdos - Brasília: MEC; SEESP, 2004. 94 p.

82
RESUMO

UNIDADE I

Nesta unidade vimos que:


• na antiguidade os surdos eram considerados seres amaldiçoados
pelos Deuses;
• na Idade Média eles ainda não possuíam direitos legais (não
podiam se casar ou adquirir heranças, por exemplo);
• a partir da Idade Moderna começa-se a pensar na possibilidade de
se educar pessoas surdas;
• professores de surdos se divergiam quanto ao método mais
adequado à educação de surdos: alguns utilizavam do método oral, outros
utilizavam de métodos visuais (incluindo o uso de sinais);
• em 1880, em Milão, na Itália, acontece o 1º Congresso Mundial
de Educação de Surdos. Em assembleia fechada, da qual os professores
surdos foram excluídos de participar, decidiu-se pelo predomínio do
método oral puro na educação de surdos. Dessa fora, o uso de sinais foi
banido das escolas;
• na medida em que o método oral não atingia os resultados
esperados, os professores de surdos acabavam por se utilizar de diferentes
recursos para o estabelecimento da comunicação (desenhos, sinais, fala...).
Esta abordagem ficou conhecida como Comunicação Total;
• em 1957 um grupo de linguistas da Gallaudet College realiza
estudos sobre a Língua de Sinais Americana e chega à conclusão histórica de
que essa língua é um sistema linguístico genuíno propriamente dito. A partir
daí, as teorias sobre os surdos e a surdez começam a ser revistas;
• há um consenso, atualmente, em dizer que a surdez não acarreta,
por si mesma, deficiência cognitiva ou linguística;
• linguistas como Saussure e Chomsky admitem, diretamente ou
indiretamente, que línguas podem ser estabelecidas pelo canal visuo-
espacial, não apenas oral-auditivo;
• na pós-modernidade os surdos passam a ser considerados uma
minoria linguística e cultural, não mais sujeitos patológicos ou deficitários;
• surge daí a noção cultura surda, que determina hábitos e visões de
mundo específicos aos surdos, possibilitados a partir da experiência de vida
estritamente visual.

83
Caderno Didático

• essa noção vai contra a visão normalizadora sobre os surdos e a


surdez, pois sugere que os surdos podem viver e se desenvolver na e pela
surdez, sem necessariamente combatê-la.
• atrelada à noção de cultura está a noção de identidades surdas. Os
surdos se relacionam e convivem com o seu estado visual perante o mundo
de diferentes maneiras. Perlin (1998) apresenta uma tipologia de
identidades possivelmente verificadas em surdos;
• vemos, portanto, que um “novo” discurso sobre a surdez começa
a ser produzido pela academia e pelos próprios sujeitos surdos.
• o discurso tradicional deriva de uma abordagem clínico-
terapêutica sobre os surdos e os considera sujeitos deficientes que precisam
ser normalizados a partir de acompanhamento e/ou terapias específicas.
• o discurso moderno sobre os surdos deriva de uma abordagem
linguístico-antropológica que os compreende como um povo específico
(uma minoria linguística e cultural) que protagoniza a própria vida a partir da
visualidade.
• a trajetória narrada acima possibilita aos sujeitos surdos uma
tomada de consciência política e identitária – de si, da sua língua e
comunidade – que favorece a construção de uma nova imagem de si e do
universo ao seu redor. Surdos não são – e já não se consideram – inferiores,
desvantajosos ou menos capazes que os ouvintes. Não são – e já não se
consideram – “anormais” ou “deficientes”.

UNIDADE II

Nesta unidade vimos:


• um pouco mais sobre os motivos que conduzem os esforços
mundiais para alcançar uma educação inclusiva competente. Vimos que há
uma justificativa social, uma educacional e outra econômica para que a
inclusão aconteça.
• um pouco mais sobre a legislação brasileira e sobre o importante
Decreto 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Esse decreto trouxe grande
progresso à Educação de Surdos e à valorização da Libras .
• que a educação especial é diferente da educação inclusiva. A
primeira tem uma abordagem médico-pedagógica e a segunda uma
abordagem educacional igualitária.
• que a organização espacial, estrutural e pedagógica deve ser
planejada para acolher o surdo em sala de aula.
• que o intérprete educacional não é substituto do professor e tem
sua função como tradutor do par linguístico Libras/Português.
• que o ensino de línguas para surdos deve respeitar o uso da Libras
que é a língua natural/materna do surdo e privilegiar as ideias expressas na

84
Língua Brasileira de Sinais - Libras Unimontes

forma escrita do português (segunda língua do surdo) ao invés de privilegiar a


forma. O mesmo deve acontecer com o ensino de línguas estrangeiras.

UNIDADE III
Nesta unidade vimos que:
• a Língua Brasileira de Sinais não é uma linguagem, mas um sistema
linguístico propriamente dito, assim como o português, o francês e o inglês o
são;
• de maneira ampla, entende-se linguagem como toda e qualquer
forma de comunicação, verbal ou não-verbal, humana ou animal, natural
ou artificial. Em uma concepção mais específica, pode-se ainda
compreendê-la como uma faculdade mental própria aos humanos, que
nos possibilita a aquisição e exercício da língua.
• o alfabeto manual pode ser considerado a representação direta
das letras do alfabeto. Dessa forma, apesar de fazer parte da Libras, ele não é
a Libras em si mesmo. Usamos o alfabeto manual em poucas ocasiões;
• os sinais da Libras não são exclusivamente icônicos. Muitos sinais
(talvez a maioria) são arbitrários, ou seja, não mantêm relação de
semelhança com a sua representação imagética.
• via soletração manual, a Libras recebe empréstimos linguísticos do
português. O empréstimo linguístico pode ser considerado a entrada (e
adequação) de palavras de uma língua em outra.
• um sinal pode ser segmentado em unidades menores. O sinal é
composto basicamente por três parâmetros: Configuração de Mão,
Movimento e Locação. Tais parâmetros são distintivos entre si, isto é,
alterando um deles, pode-se alterar o significado do sinal;
• o espaço de sinalização compreende um círculo virtual, à frente
do corpo do sinalizador, da ordem de um metro de diâmetro,
aproximadamente.

UNIDADE IV

Nesta unidade você aprendeu:


• que em Libras, cada pessoa recebe um sinal pessoal para
representar o seu nome. Normalmente o sinal se relaciona a alguma
característica (física ou não) da pessoa;
• que há indícios de que, na cultura surda, o usual é apresentar
primeiramente o seu sinal-de-nome e, depois, o nome soletrado;
• a realizar os sinais BOM-DIA, BOA-TARDE e BOA-NOITE;
• a sinalizar pronomes pessoais, possessivos e indefinidos, na Libras;
• que, na Libras, as expressões faciais não são adornos
opcionais, mas itens gramaticais obrigatórios;

85
Caderno Didático

• que expressões faciais compõem sinais específicos (como aqueles


que se relacionam a estados e emoções ) e definem o grau de intensidade
dos verbos, advérbios e adjetivos.
• que expressões faciais marcam sentenças afirmativas,
interrogativas, exclamativas ou negativas e estabelecem, ainda,
concordância gramatical.
• que para flexionar o adjetivo em grau é preciso alterar a expressão
facial, assim como a amplitude do movimento.
• que para a forma afirmativa, a expressão facial é neutra ou de
consentimento, dependendo do contexto;
• que na forma interrogativa a testa e as sobrancelhas se franzem
ou se levantam e a cabeça é levemente inclinada para cima.
• que na forma negativa verifica-se pelo menos três distintos
processos: a negação manual junto ao sinal, a negação da cabeça junto ao
sinal ou a incorporação da negativa ao sinal
• que na forma exclamativa as sobrancelhas devem ser levantadas
e a cabeça ligeiramente inclinada para cima.
• a realizar diferentes expressões faciais;
• a sinalizar números em diferentes contextos;
• a marcar o tempo verbal das sentenças de duas diferentes
maneiras: acrescentando o sinal PRESENTE, PASSADO OU FUTURO ou a
partir de um advérbio de tempo específico;
• a sinalizar os dias da semana, os meses e as horas;
• a flexionar alguns tipos de verbos e adjetivos em Libras;
• que classificadores são possibilidades de representar e descrever,
através das configurações de mãos, propriedades físicas (e emotivas) de
pessoas, coisas ou objetos. Classificadores conferem liberdade criativa à
Libras.

86
REFERÊNCIAS

BÁSICAS

BOTELHO, Paula. Segredos e Silêncios na Educação de Surdos. Belo


Horizonte: Autêntica, 1998.

QUADROS, Ronice Muller de. O Tradutor e Interprete de Língua


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2004.

SALES, Heloisa Maria Moreira et al. Ensino de Língua Portuguesa para


Surdos. vol. I e II. Brasília: MEC, SEESP, 2004.

COMPLEMENTARES

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[da] República Federativa do Brasil, Brasília, 23 dez. 2005. Seção 1, p. 30.

BRASIL. Lei 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua


Brasileira de Sinais (LIBRAS) e dá outras providências. Disponível em:
www.mec.gov.br/seesp/legislacao.shtm Acesso em: 10 ago. 2010

BRITO, R. C. C. Representações do professor de língua inglesa no ensino


inclusivo dos alunos surdos. 167f. (Mestrado em Linguística
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Volume III - Série Atualidades Pedagógicas 4. 1ª ed. Brasília: MEC/SEESP,
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88
Língua Brasileira de Sinais - Libras Unimontes

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89
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história. 2009. 176 f. (Tese - doutorado em Educação). Faculdade de
Educação, Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina, 2007.

90
- AA

1) O que foi o congresso de Milão e por que ele pode ser considerado um
retrocesso na educação de surdos?

2) A história dos surdos nos narra eventos opressivos contra a população


surda e deixa entrever que tais sujeitos foram considerados, durante muito
tempo, como seres incapacitados (ou pouco capacitados) tanto para o
exercício da linguagem, quanto para o exercício de práticas cidadãs como
um todo. No entanto, um evento específico (ou uma conquista específica)
contribuiu sobremaneira para que este quadro começasse a ser alterado.
Que evento foi esse e o que nos diz agora a perspectiva moderna e atual
sobre os surdos?

3) Apesar de haver divergências sobre a forma de caracterizar os surdos


(pense, por exemplo, nas diferenças entre a abordagem médica e a
abordagem antropológica), alguns consensos puderam ser firmados. Cite os
principais.

91
Caderno Didático

4) Dentre as leis brasileiras que legislam sobre a educação de surdos, o


decreto 5.626 pode ser considerado como um dos mais significativos. Do
que trata esse decreto? Que conquistas ele traz?

5) Sabe-se que a língua portuguesa é a segunda língua dos surdos. Ao passo


que bebês ouvintes, ainda em tenra idade, começam a adquirir de maneira
natural a língua que está à sua volta, os bebês surdos filhos de pais ouvintes
devem procurar meios distintos e externos para adquirir a Libras. Mais tarde,
na escola, ele necessitará de estratégias e recursos adequados à
aprendizagem do português escrito. No tocante à língua portuguesa, quais
são as dificuldades encontradas pelos surdos na sala de aula inclusiva? Qual
deve ser a postura do professor diante desse fato?

6) Qual é a diferença entre linguagem e língua? Por que a Libras pode ser
considerada uma língua?

7) Quais são os parâmetros que se unem para formar o sinal? Caracterize


cada um deles.

92
Língua Brasileira de Sinais - Libras Unimontes

8) Adjetivos e verbos podem ser flexionados na Libras? Explique como


fazemos para flexioná-los.

9) Como diferenciamos frases exclamativas, negativas, interrogativas e


afirmativas em Libras? Que expressões não-manuais caracterizam cada uma
delas?

10) Em Libras existe uma única forma de expressar números? Mudando a


situação de uso, muda-se também a sinalização? Explique cada uma das
formas de se sinalizar números em Libras.

93
ANEXO 01

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 10.436, DE 24 DE ABRIL DE 2002.


Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais -
Regulamento
Libras e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e
eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua
Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de
comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com
estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias
e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil.
Art. 2o Deve ser garantido, por parte do poder público em geral e empresas
concessionárias de serviços públicos, formas institucionalizadas de apoiar o uso e difusão
da Língua Brasileira de Sinais - Libras como meio de comunicação objetiva e de utilização
corrente das comunidades surdas do Brasil.
Art. 3o As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de
assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores
de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor.
Art. 4o O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais,
municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de
Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior,
do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros
Curriculares Nacionais - PCNs, conforme legislação vigente.
Parágrafo único. A Língua Brasileira de Sinais - Libras não poderá substituir a
modalidade escrita da língua portuguesa.
Art. 5o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 24 de abril de 2002; 181o da Independência e 114o da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Paulo Renato Souza
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 25.4.2002

94
ANEXO 02

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

DECRETO Nº 5.626, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2005.

Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002,


que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais -
Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro
de 2000.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 84, inciso IV, da
Constituição, e tendo em vista o disposto na Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, e no art. 18 da Lei no
10.098, de 19 de dezembro de 2000,

DECRETA:

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o Este Decreto regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, e o art. 18 da Lei no 10.098,
de 19 de dezembro de 2000.

Art. 2o Para os fins deste Decreto, considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva,
compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura
principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais - Libras.

Parágrafo único. Considera-se deficiência auditiva a perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um
decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz.

CAPÍTULO II

DA INCLUSÃO DA LIBRAS COMO DISCIPLINA CURRICULAR

Art. 3o A Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de
professores para o exercício do magistério, em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de
instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 1o Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes áreas do conhecimento, o curso normal de nível
médio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educação Especial são considerados
cursos de formação de professores e profissionais da educação para o exercício do magistério.

§ 2o A Libras constituir-se-á em disciplina curricular optativa nos demais cursos de educação superior
e na educação profissional, a partir de um ano da publicação deste Decreto.

CAPÍTULO III

DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE LIBRAS E DO INSTRUTOR DE LIBRAS

Art. 4o A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries finais do ensino fundamental, no
ensino médio e na educação superior deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de
licenciatura plena em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua Portuguesa como segunda língua.

Parágrafo único. As pessoas surdas terão prioridade nos cursos de formação previstos no caput.

95
Art. 5o A formação de docentes para o ensino de Libras na educação infantil e nos anos iniciais do
ensino fundamental deve ser realizada em curso de Pedagogia ou curso normal superior, em que Libras e
Língua Portuguesa escrita tenham constituído línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngüe.

§ 1o Admite-se como formação mínima de docentes para o ensino de Libras na educação infantil e nos
anos iniciais do ensino fundamental, a formação ofertada em nível médio na modalidade normal, que
viabilizar a formação bilíngue, referida no caput.

§ 2o As pessoas surdas terão prioridade nos cursos de formação previstos no caput.

Art. 6o A formação de instrutor de Libras, em nível médio, deve ser realizada por meio de:

I - cursos de educação profissional;

II - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino superior; e

III - cursos de formação continuada promovidos por instituições credenciadas por secretarias de
educação.

§ 1o A formação do instrutor de Libras pode ser realizada também por organizações da sociedade civil
representativa da comunidade surda, desde que o certificado seja convalidado por pelo menos uma das
instituições referidas nos incisos II e III.

§ 2o As pessoas surdas terão prioridade nos cursos de formação previstos no caput.

Art. 7o Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, caso não haja docente com título
de pós-graduação ou de graduação em Libras para o ensino dessa disciplina em cursos de educação
superior, ela poderá ser ministrada por profissionais que apresentem pelo menos um dos seguintes perfis:

I - professor de Libras, usuário dessa língua com curso de pós-graduação ou com formação superior
e certificado de proficiência em Libras, obtido por meio de exame promovido pelo Ministério da Educação;

II - instrutor de Libras, usuário dessa língua com formação de nível médio e com certificado obtido por
meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da Educação;

III - professor ouvinte bilíngue: Libras - Língua Portuguesa, com pós-graduação ou formação superior
e com certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da
Educação.

§ 1o Nos casos previstos nos incisos I e II, as pessoas surdas terão prioridade para ministrar a
disciplina de Libras.

§ 2o A partir de um ano da publicação deste Decreto, os sistemas e as instituições de ensino da


educação básica e as de educação superior devem incluir o professor de Libras em seu quadro do
magistério.

Art. 8o O exame de proficiência em Libras, referido no art. 7o, deve avaliar a fluência no uso, o
conhecimento e a competência para o ensino dessa língua.

§ 1o O exame de proficiência em Libras deve ser promovido, anualmente, pelo Ministério da Educação
e instituições de educação superior por ele credenciadas para essa finalidade.

§ 2o A certificação de proficiência em Libras habilitará o instrutor ou o professor para a função docente.

§ 3o O exame de proficiência em Libras deve ser realizado por banca examinadora de amplo
conhecimento em Libras, constituída por docentes surdos e linguistas de instituições de educação superior.

Art. 9o A partir da publicação deste Decreto, as instituições de ensino médio que oferecem cursos de
formação para o magistério na modalidade normal e as instituições de educação superior que oferecem
cursos de Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras como disciplina curricular,
nos seguintes prazos e percentuais mínimos:

I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição;

II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição;

96
III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e

IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição.

Parágrafo único. O processo de inclusão da Libras como disciplina curricular deve iniciar-se nos
cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia, Pedagogia e Letras, ampliando-se progressivamente para
as demais licenciaturas.

Art. 10. As instituições de educação superior devem incluir a Libras como objeto de ensino, pesquisa
e extensão nos cursos de formação de professores para a educação básica, nos cursos de Fonoaudiologia
e nos cursos de Tradução e Interpretação de Libras - Língua Portuguesa.

Art. 11. O Ministério da Educação promoverá, a partir da publicação deste Decreto, programas
específicos para a criação de cursos de graduação:

I - para formação de professores surdos e ouvintes, para a educação infantil e anos iniciais do ensino
fundamental, que viabilize a educação bilíngue: Libras - Língua Portuguesa como segunda língua;

II - de licenciatura em Letras: Libras ou em Letras: Libras/Língua Portuguesa, como segunda língua


para surdos;

III - de formação em Tradução e Interpretação de Libras - Língua Portuguesa.

Art. 12. As instituições de educação superior, principalmente as que ofertam cursos de Educação
Especial, Pedagogia e Letras, devem viabilizar cursos de pós-graduação para a formação de professores
para o ensino de Libras e sua interpretação, a partir de um ano da publicação deste Decreto.

Art. 13. O ensino da modalidade escrita da Língua Portuguesa, como segunda língua para pessoas
surdas, deve ser incluído como disciplina curricular nos cursos de formação de professores para a educação
infantil e para os anos iniciais do ensino fundamental, de nível médio e superior, bem como nos cursos de
licenciatura em Letras com habilitação em Língua Portuguesa.

Parágrafo único. O tema sobre a modalidade escrita da língua portuguesa para surdos deve ser
incluído como conteúdo nos cursos de Fonoaudiologia.

CAPÍTULO IV

DO USO E DA DIFUSÃO DA LIBRAS E DA LÍNGUA PORTUGUESA PARA O

ACESSO DAS PESSOAS SURDAS À EDUCAÇÃO

Art. 14. As instituições federais de ensino devem garantir, obrigatoriamente, às pessoas surdas
acesso à comunicação, à informação e à educação nos processos seletivos, nas atividades e nos conteúdos
curriculares desenvolvidos em todos os níveis, etapas e modalidades de educação, desde a educação
infantil até à superior.

§ 1o Para garantir o atendimento educacional especializado e o acesso previsto no caput, as


instituições federais de ensino devem:

I - promover cursos de formação de professores para:

a) o ensino e uso da Libras;

b) a tradução e interpretação de Libras - Língua Portuguesa; e

c) o ensino da Língua Portuguesa, como segunda língua para pessoas surdas;

II - ofertar, obrigatoriamente, desde a educação infantil, o ensino da Libras e também da Língua


Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos;

III - prover as escolas com:

a) professor de Libras ou instrutor de Libras;

b) tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa;

c) professor para o ensino de Língua Portuguesa como segunda língua para pessoas surdas; e

97
d) professor regente de classe com conhecimento acerca da singularidade linguística manifestada
pelos alunos surdos;

IV - garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos, desde a


educação infantil, nas salas de aula e, também, em salas de recursos, em turno contrário ao da
escolarização;

V - apoiar, na comunidade escolar, o uso e a difusão de Libras entre professores, alunos, funcionários,
direção da escola e familiares, inclusive por meio da oferta de cursos;

VI - adotar mecanismos de avaliação coerentes com aprendizado de segunda língua, na correção das
provas escritas, valorizando o aspecto semântico e reconhecendo a singularidade linguística manifestada
no aspecto formal da Língua Portuguesa;

VII - desenvolver e adotar mecanismos alternativos para a avaliação de conhecimentos expressos em


Libras, desde que devidamente registrados em vídeo ou em outros meios eletrônicos e tecnológicos;

VIII - disponibilizar equipamentos, acesso às novas tecnologias de informação e comunicação, bem


como recursos didáticos para apoiar a educação de alunos surdos ou com deficiência auditiva.

§ 2o O professor da educação básica, bilíngue, aprovado em exame de proficiência em tradução e


interpretação de Libras - Língua Portuguesa, pode exercer a função de tradutor e intérprete de Libras -
Língua Portuguesa, cuja função é distinta da função de professor docente.

§ 3o As instituições privadas e as públicas dos sistemas de ensino federal, estadual, municipal e do


Distrito Federal buscarão implementar as medidas referidas neste artigo como meio de assegurar
atendimento educacional especializado aos alunos surdos ou com deficiência auditiva.

Art. 15. Para complementar o currículo da base nacional comum, o ensino de Libras e o ensino da
modalidade escrita da Língua Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos, devem ser ministrados
em uma perspectiva dialógica, funcional e instrumental, como:

I - atividades ou complementação curricular específica na educação infantil e anos iniciais do ensino


fundamental; e

II - áreas de conhecimento, como disciplinas curriculares, nos anos finais do ensino fundamental, no
ensino médio e na educação superior.

Art. 16. A modalidade oral da Língua Portuguesa, na educação básica, deve ser ofertada aos alunos
surdos ou com deficiência auditiva, preferencialmente em turno distinto ao da escolarização, por meio de
ações integradas entre as áreas da saúde e da educação, resguardado o direito de opção da família ou do
próprio aluno por essa modalidade.

Parágrafo único. A definição de espaço para o desenvolvimento da modalidade oral da Língua


Portuguesa e a definição dos profissionais de Fonoaudiologia para atuação com alunos da educação básica
são de competência dos órgãos que possuam estas atribuições nas unidades federadas.

CAPÍTULO V

DA FORMAÇÃO DO TRADUTOR E INTÉRPRETE DE LIBRAS - LÍNGUA PORTUGUESA

Art. 17. A formação do tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa deve efetivar-se por meio
de curso superior de Tradução e Interpretação, com habilitação em Libras - Língua Portuguesa.

Art. 18. Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, a formação de tradutor e
intérprete de Libras - Língua Portuguesa, em nível médio, deve ser realizada por meio de:

I - cursos de educação profissional;

II - cursos de extensão universitária; e

III - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino superior e instituições
credenciadas por secretarias de educação.

Parágrafo único. A formação de tradutor e intérprete de Libras pode ser realizada por organizações da
sociedade civil representativas da comunidade surda, desde que o certificado seja convalidado por uma
das instituições referidas no inciso III.

98
Art. 19. Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, caso não haja pessoas com a
titulação exigida para o exercício da tradução e interpretação de Libras - Língua Portuguesa, as instituições
federais de ensino devem incluir, em seus quadros, profissionais com o seguinte perfil:

I - profissional ouvinte, de nível superior, com competência e fluência em Libras para realizar a
interpretação das duas línguas, de maneira simultânea e consecutiva, e com aprovação em exame de
proficiência, promovido pelo Ministério da Educação, para atuação em instituições de ensino médio e de
educação superior;

II - profissional ouvinte, de nível médio, com competência e fluência em Libras para realizar a
interpretação das duas línguas, de maneira simultânea e consecutiva, e com aprovação em exame de
proficiência, promovido pelo Ministério da Educação, para atuação no ensino fundamental;

III - profissional surdo, com competência para realizar a interpretação de línguas de sinais de outros
países para a Libras, para atuação em cursos e eventos.

Parágrafo único. As instituições privadas e as públicas dos sistemas de ensino federal, estadual,
municipal e do Distrito Federal buscarão implementar as medidas referidas neste artigo como meio de
assegurar aos alunos surdos ou com deficiência auditiva o acesso à comunicação, à informação e à
educação.

Art. 20. Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, o Ministério da Educação ou
instituições de ensino superior por ele credenciadas para essa finalidade promoverão, anualmente, exame
nacional de proficiência em tradução e interpretação de Libras - Língua Portuguesa.

Parágrafo único. O exame de proficiência em tradução e interpretação de Libras - Língua Portuguesa


deve ser realizado por banca examinadora de amplo conhecimento dessa função, constituída por docentes
surdos, linguistas e tradutores e intérpretes de Libras de instituições de educação superior.

Art. 21. A partir de um ano da publicação deste Decreto, as instituições federais de ensino da
educação básica e da educação superior devem incluir, em seus quadros, em todos os níveis, etapas e
modalidades, o tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa, para viabilizar o acesso à comunicação,
à informação e à educação de alunos surdos.

§ 1o O profissional a que se refere o caput atuará:

I - nos processos seletivos para cursos na instituição de ensino;

II - nas salas de aula para viabilizar o acesso dos alunos aos conhecimentos e conteúdos curriculares,
em todas as atividades didático-pedagógicas; e

III - no apoio à acessibilidade aos serviços e às atividades-fim da instituição de ensino.

§ 2o As instituições privadas e as públicas dos sistemas de ensino federal, estadual, municipal e do


Distrito Federal buscarão implementar as medidas referidas neste artigo como meio de assegurar aos
alunos surdos ou com deficiência auditiva o acesso à comunicação, à informação e à educação.

CAPÍTULO VI

DA GARANTIA DO DIREITO À EDUCAÇÃO DAS PESSOAS SURDAS OU

COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Art. 22. As instituições federais de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a
inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de:

I - escolas e classes de educação bilíngue, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores
bilíngues, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental;

II - escolas bilíngues ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e
ouvintes, para os anos finais do ensino fundamental, ensino médio ou educação profissional, com docentes
das diferentes áreas do conhecimento, cientes da singularidade linguística dos alunos surdos, bem como
com a presença de tradutores e intérpretes de Libras - Língua Portuguesa.

§ 1o São denominadas escolas ou classes de educação bilíngue aquelas em que a Libras e a


modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo
o processo educativo.

99
§ 2o Os alunos têm o direito à escolarização em um turno diferenciado ao do atendimento educacional
especializado para o desenvolvimento de complementação curricular, com utilização de equipamentos e
tecnologias de informação.

§ 3o As mudanças decorrentes da implementação dos incisos I e II implicam a formalização, pelos pais


e pelos próprios alunos, de sua opção ou preferência pela educação sem o uso de Libras.

§ 4o O disposto no § 2o deste artigo deve ser garantido também para os alunos não usuários da Libras.

Art. 23. As instituições federais de ensino, de educação básica e superior, devem proporcionar aos
alunos surdos os serviços de tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa em sala de aula e em
outros espaços educacionais, bem como equipamentos e tecnologias que viabilizem o acesso à
comunicação, à informação e à educação.

§ 1o Deve ser proporcionado aos professores acesso à literatura e informações sobre a especificidade
linguística do aluno surdo.

§ 2o As instituições privadas e as públicas dos sistemas de ensino federal, estadual, municipal e do


Distrito Federal buscarão implementar as medidas referidas neste artigo como meio de assegurar aos
alunos surdos ou com deficiência auditiva o acesso à comunicação, à informação e à educação.

Art. 24. A programação visual dos cursos de nível médio e superior, preferencialmente os de formação
de professores, na modalidade de educação a distância, deve dispor de sistemas de acesso à informação
como janela com tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa e subtitulação por meio do sistema de
legenda oculta, de modo a reproduzir as mensagens veiculadas às pessoas surdas, conforme prevê o
Decreto no 5.296, de 2 de dezembro de 2004.

CAPÍTULO VII

DA GARANTIA DO DIREITO À SAÚDE DAS PESSOAS SURDAS OU

COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA

Art. 25. A partir de um ano da publicação deste Decreto, o Sistema Único de Saúde - SUS e as
empresas que detêm concessão ou permissão de serviços públicos de assistência à saúde, na perspectiva
da inclusão plena das pessoas surdas ou com deficiência auditiva em todas as esferas da vida social,
devem garantir, prioritariamente aos alunos matriculados nas redes de ensino da educação básica, a
atenção integral à sua saúde, nos diversos níveis de complexidade e especialidades médicas, efetivando:

I - ações de prevenção e desenvolvimento de programas de saúde auditiva;

II - tratamento clínico e atendimento especializado, respeitando as especificidades de cada caso;

III - realização de diagnóstico, atendimento precoce e do encaminhamento para a área de educação;

IV - seleção, adaptação e fornecimento de prótese auditiva ou aparelho de amplificação sonora,


quando indicado;

V - acompanhamento médico e fonoaudiológico e terapia fonoaudiológica;

VI - atendimento em reabilitação por equipe multiprofissional;

VII - atendimento fonoaudiológico às crianças, adolescentes e jovens matriculados na educação


básica, por meio de ações integradas com a área da educação, de acordo com as necessidades
terapêuticas do aluno;

VIII - orientações à família sobre as implicações da surdez e sobre a importância para a criança com
perda auditiva ter, desde seu nascimento, acesso à Libras e à Língua Portuguesa;

IX - atendimento às pessoas surdas ou com deficiência auditiva na rede de serviços do SUS e das
empresas que detêm concessão ou permissão de serviços públicos de assistência à saúde, por
profissionais capacitados para o uso de Libras ou para sua tradução e interpretação; e

X - apoio à capacitação e formação de profissionais da rede de serviços do SUS para o uso de Libras
e sua tradução e interpretação.

100
§ 1o O disposto neste artigo deve ser garantido também para os alunos surdos ou com deficiência
auditiva não usuários da Libras.

§ 2o O Poder Público, os órgãos da administração pública estadual, municipal, do Distrito Federal e as


empresas privadas que detêm autorização, concessão ou permissão de serviços públicos de assistência à
saúde buscarão implementar as medidas referidas no art. 3o da Lei no 10.436, de 2002, como meio de
assegurar, prioritariamente, aos alunos surdos ou com deficiência auditiva matriculados nas redes de
ensino da educação básica, a atenção integral à sua saúde, nos diversos níveis de complexidade e
especialidades médicas.

CAPÍTULO VIII

DO PAPEL DO PODER PÚBLICO E DAS EMPRESAS QUE DETÊM CONCESSÃO OU PERMISSÃO DE


SERVIÇOS PÚBLICOS, NO APOIO AO USO E DIFUSÃO DA LIBRAS

Art. 26. A partir de um ano da publicação deste Decreto, o Poder Público, as empresas
concessionárias de serviços públicos e os órgãos da administração pública federal, direta e indireta devem
garantir às pessoas surdas o tratamento diferenciado, por meio do uso e difusão de Libras e da tradução e
interpretação de Libras - Língua Portuguesa, realizados por servidores e empregados capacitados para
essa função, bem como o acesso às tecnologias de informação, conforme prevê o Decreto no 5.296, de
2004.

§ 1o As instituições de que trata o caput devem dispor de, pelo menos, cinco por cento de servidores,
funcionários e empregados capacitados para o uso e interpretação da Libras.

§ 2o O Poder Público, os órgãos da administração pública estadual, municipal e do Distrito Federal, e


as empresas privadas que detêm concessão ou permissão de serviços públicos buscarão implementar as
medidas referidas neste artigo como meio de assegurar às pessoas surdas ou com deficiência auditiva o
tratamento diferenciado, previsto no caput.

Art. 27. No âmbito da administração pública federal, direta e indireta, bem como das empresas que
detêm concessão e permissão de serviços públicos federais, os serviços prestados por servidores e
empregados capacitados para utilizar a Libras e realizar a tradução e interpretação de Libras - Língua
Portuguesa estão sujeitos a padrões de controle de atendimento e a avaliação da satisfação do usuário dos
serviços públicos, sob a coordenação da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, Orçamento
e Gestão, em conformidade com o Decreto no 3.507, de 13 de junho de 2000.

Parágrafo único. Caberá à administração pública no âmbito estadual, municipal e do Distrito Federal
disciplinar, em regulamento próprio, os padrões de controle do atendimento e avaliação da satisfação do
usuário dos serviços públicos, referido no caput.

CAPÍTULO IX

DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 28. Os órgãos da administração pública federal, direta e indireta, devem incluir em seus
orçamentos anuais e plurianuais dotações destinadas a viabilizar ações previstas neste Decreto,
prioritariamente as relativas à formação, capacitação e qualificação de professores, servidores e
empregados para o uso e difusão da Libras e à realização da tradução e interpretação de Libras - Língua
Portuguesa, a partir de um ano da publicação deste Decreto.

Art. 29. O Distrito Federal, os Estados e os Municípios, no âmbito de suas competências, definirão os
instrumentos para a efetiva implantação e o controle do uso e difusão de Libras e de sua tradução e
interpretação, referidos nos dispositivos deste Decreto.

Art. 30. Os órgãos da administração pública estadual, municipal e do Distrito Federal, direta e indireta,
viabilizarão as ações previstas neste Decreto com dotações específicas em seus orçamentos anuais e
plurianuais, prioritariamente as relativas à formação, capacitação e qualificação de professores, servidores
e empregados para o uso e difusão da Libras e à realização da tradução e interpretação de Libras - Língua
Portuguesa, a partir de um ano da publicação deste Decreto.

Art. 31. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 22 de dezembro de 2005; 184o da Independência e 117o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Fernando Haddad Este texto não substitui o publicado no DOU de 23.12.2005

101
ANEXO 3

Abecedário Da Xuxa
Xuxa

A de Amor
B de Baixinho
C de Coração

D de Docinho
E de Escola
F de Feijão

G de Gente
H de Humano
I de Igualdade

J Juventude
L Liberdade
M Molecagem

N Natureza
O Obrigado
P Proteção!

Q de Quero-Quero
R de Riacho
S de Saudade

T de Terra
U de Universo
V de Vitória!

X o que que é?
É Xuxa!
Z é zum zum zum zum zum

Vamos Cantar
Vamos Brincar
Alegria pra valer!
O abecedário da Xuxa
Vamos Aprender!

102
ANEXO 04

103
ANEXO 5

104
105
106
107
108
109
ANEXO 6

Encontre o nome dos 5 animais:

Gato
Urso
Pato
Foca
Sapo
Ema
Onça
Lobo
Cabra
Tigre

110
ANEXO 7

Substitua os sinais por letras e descubra o nome das pessoas

é o primeiro nome
é o segundo nome
é o terceiro nome (sem acentos)

111
ANEXO 8

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 13.055, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2014.

Institui o Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais -


LIBRAS e dispõe sobre sua comemoração.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu
sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Fica instituído o Dia Nacional da Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS a ser comemorado no
dia 24 de abril de cada ano.
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 22 de dezembro de 2014; 193o da Independência e 126o da República.


DILMA ROUSSEFF
José Henrique Paim Fernandes

Este texto não substitui o publicado no DOU de 23.12.2014

112
ANEXO 9

Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.796, DE 29 DE OUTUBRO DE 2008.

Institui o Dia Nacional dos Surdos.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a


seguinte Lei:

Art. 1o Fica instituído o dia 26 de setembro de cada ano como o Dia Nacional dos Surdos.

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 29 de outubro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Fernando Haddad
João Luiz Silva Ferreira
Dilma Rousseff
Este texto não substitui o publicado no DOU de 30.10.2008

113

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