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1- Em que difere a postura do cientista em fase de ciência normal e de ciência

extraordinária?
Segundo Kuhn, o progresso científico é feito pela alternância entre os períodos de
ciência normal e ciência extraordinária. A ciência normal é a fase da atividade científica
que ocorre no âmbito de um certo paradigma aceite pela comunidade científica. É de
acordo com esse paradigma que é orientada a atividade da comunidade científica, o
paradigma dá resposta e prevê os problemas. Os enigmas são resolvidos tipo puzzle,
de acordo com os conceitos, valores, teorias e pressupostos do paradigma vigente.
Sem se desviarem do paradigma vigente, os cientistas fazem um estudo cada vez mais
específico e aprofundado dos fenómenos. É um período frutífero e estável. Durante
este período há evoluções da ciência e os cientistas resistem à mudança e são
conservadores. Quando ocorre uma sucessão de anomalias, enigmas persistentes,
factos para os quais o enigma não tem resposta, ocorre a crise. É quando se toma
consciência das insuficiências do paradigma vigente, e depois começa o período da
ciência extraordinária, neste período há um questionamento, por parte dos cientistas,
dos pressupostos e fundamentos do paradigma vigente. Gera-se um debate sobre a
manutenção do paradigma (velho) ou a adoção de um novo paradigma. É um período
de dúvida e insegurança. A ciência avança lentamente mas progressivamente nos
períodos de ciência normal e tem avanços consideráveis nos períodos de “ciência
extraordinária”.

2- Embora haja critérios objetivos para escolher paradigmas rivais, por que
razão a passagem de um a outro não corresponde a um processo
completamente racional e objetivo?
Uma das críticas à conceção da ciência de Kuhn, incide sobre o critério para justificar a
adoção de um novo paradigma. Critica-se o facto de a adoção a um novo paradigma
ocorrer por conversão (quase religiosa) de todos os cientistas, como se se tratasse de
uma questão de fé, ao novo paradigma. Este é um processo irracional e,
consequentemente, coloca entraves em relação ao valor da ciência. Na escolha de um
novo paradigma, ocorre um debate, uma argumentação. Seria de esperar que, como
se trata de ciência, todos os argumentos usados fossem objetivos, tal como é a ciência,
porém, nesta argumentação são usados também argumentos subjetivos, relacionados
com o contexto em que o cientista se encontra, ou seja, os seus valores, pressupostos
e crenças, tomando assim a escolha de paradigmas subjetivos. Alguns críticos acusam
Kuhn de ser relativista, já que por causa da incomensurabilidade dos paradigmas não é
possível que haja cooperação e diálogo. Concluindo, a escolha de paradigmas não é um
processo completamente racional e objetivo, como se seria de esperar já que estamos
a falar de ciência, uma vez que o processo tem componentes subjetivas e irracionais.
3- O que significa dizer que os paradigmas são incomensuráveis?
Os paradigmas são o conjunto de crenças, teorias, critérios, valores, pressupostos e
fundamentos compartilhados e aceites por uma comunidade científica. É com base nos
paradigmas que se encaram e resolvem os problemas que ocorrem no seio da
comunidade científica. Os paradigmas são incomensuráveis, isto é, são incompatíveis e
incomparáveis. Portanto, é impossível comparar objetivamente dois paradigmas, cada
paradigma tem a sua forma de resolver e encarar problemas, dois paradigmas são dois
mundos distintos em que o que é verdade num pode não o ser no outro. A verdade de
uma teoria está completamente dependente do paradigma em que se insere. A
incomensurabilidade dos paradigmas faz com que haja uma interpretação diferente do
progresso científico. Segundo Kuhn, o progresso científico é um processo que não é
cumulativo, as teorias e os paradigmas não são cumulativos. A troca de um paradigma
não significa que estamos mais perto da verdade. Se não podemos dizer que um
paradigma é melhor do que o seu antecessor, não podemos afirmar que há uma
evolução da ciência para melhor. A troca de paradigmas não é cumulativa, quando
ocorre uma troca, muda a forma de observar o mundo.

Resumos do Manual (págs 210-217)


Thomas S. Kuhn publicou, em 1962, uma obra essencial para a filosofia das ciências - A
Estrutura das Revoluções Científicas, que destaca o papel que a história da ciência tem
na construção da própria ciência. Para o filósofo, a evolução da ciência depende
essencialmente do trabalho dos cientistas e, portanto, o processo de produção da
ciência torna-se o ponto central da sua reflexão epistemológica. Ao contrário da
tradição positivista, Kuhn não vê o cientista como um investigador neutro, nem as
teorias como construções resultantes da análise de factos em bruto depois de
submetidos à experimentação e à matematização. Segundo Kuhn, o cientista não é um
sujeito neutro nem isolado, mas condicionado e contextualizado. A construção de
teorias científicas está sempre dependente de um conjunto de factos, de crenças e
conhecimentos, regras, técnicas e valores compartilhados e aceites pela maioria dos
cientistas, isto é, a produção científica depende de um paradigma científico. O
paradigma funciona como um modelo de referência na descoberta e resolução de
problemas, no interior da comunidade científica.
Para compreender a evolução da ciência, Kuhn estuda as etapas do seu
desenvolvimento e interroga-se sobre como ocorrem as mudanças de paradigmas. É
no interior da própria comunidade científica e analisando o modo de operar dos
cientistas que Kuhn encontra a resposta para esta questão.
É a ocorrência de anomalias que pode alterar as condições da atividade científica
provocar uma crise e uma revolução científica, situação que culmina na eleição de um
novo paradigma. Vejamos detalhadamente como isto pode acontecer. As anomalias
são problemas ou enigmas que os cientistas não conseguem resolver a partir dos
pressupostos teóricos fundamentais de um paradigma. Nos períodos normais da
atividade cientifica - designada fase de ciência normal, os enigmas resolvem-se como
puzzles. Cada peça, mais cedo ou mais tarde, encaixa no devido lugar. Acontece que,
por vezes, algumas peças parecem não encaixar. Quando isto sucede, estamos perante
uma anomalia. Nessa altura, ao contrário do que se poderia pensar, os cientistas não
abandonam o paradigma ou as teorias vigentes e tudo fazem para resolver aquela
anomalia. Por outras palavras, antes de se avançar para um novo paradigma, tenta-se
a assimilação do novo facto (problema).
Kuhn tem uma visão diferente da de Popper no que diz respeito à atitude do cientista:
perante novos factos ou problemas, o investigador não tem como preocupação
primeira tentar falsificar as suas teorias, antes procurará encontrar uma forma de
resolver os problemas que surgem, mantendo as suas teorias.
Assim, é em condições muito especiais, isto é, quando já não é possível responder às
exigências dos factos, e as anomalias se vão acumulando, que a ciência entra em
período de crise. A atividade científica vive um período instável, de escolha e debate
sobre a manutenção do paradigma vigente e sobre a eventual adoção de melhores
teorias, novos conceitos e princípios, procurando-se assim definir os alicerces de um
novo paradigma, que permita explicar aquilo que não é mais explicável à luz do
paradigma anterior - período de ciência extraordinária. Findo o debate, ou se mantém
o paradigma vigente ou se opera uma revolução científica, que impõe a mudança e a
adoção do novo paradigma.
A incomensurabilidade dos paradigmas traz consigo uma interpretação diferente
daquilo que pode ser o progresso da ciência. Em Kuhn, o progresso científico não pode
ser entendido como um processo contínuo e cumulativo de teorias ou paradigmas
cada vez melhores em direção a uma meta ou fim. Repare-se que, se não podemos
afirmar que um paradigma é melhor do que o seu antecessor, então também não
podemos afirmar que, ao ocorrer uma mudança de paradigma, haverá uma evolução
da ciência para melhor. Por outras palavras, não podemos dizer que o novo paradigma
descreve melhor a realidade do que o seu antecessor; portanto, também não podemos
dizer que a ciência progride de forma cumulativa e contínua ao substituir um pelo
outro. As mudanças de paradigmas não implicam a aproximação à verdade. O
progresso da ciência terá, então, de ser compreendido de uma forma completamente
diferente a partir da conceção de Kuhn. A ideia de que a ciência é o único meio para
alcançar a verdade definitiva sobre o mundo real é uma ideia, segundo Kuhn, errada.
Ela corresponde a um cientifismo ingénuo que supõe o progresso da ciência como uma
corrida indefinida em direção a um fim: a verdade. Kuhn não concorda com esta visão
teleológica da evolução da ciência. A verdade não é a meta para a qual se orienta a
ciência. Ela é, como vimos, relativa a cada paradigma. Só pode ser compreendida
dentro dos limites que cada paradigma impõe.
A ideia da incomensurabilidade dos paradigmas foi um dos aspetos mais criticados da
conceção kuhniana da ciência. Como vimos, o facto de os paradigmas serem
incomensuráveis implica a impossibilidade de os comparar e avaliar objetivamente.
Cada paradigma representa um modo totalmente diferente de encarar os problemas e
propor soluções. Dois paradigmas rivais são mundos diferentes em que as mesmas
coisas são entendidas de modos distintos. Não há, portanto, qualquer hipótese de
partilha, cooperação ou diálogo. À custa desta posição, alguns críticos acusam Kuhn de
ser relativista. Uma outra crítica feita a Kuhn incide sobre o critério, que alguns autores
apelidam de «irracional», utilizado para justificar a adoção de um novo paradigma.
Criticam o facto de a adesão a um novo paradigma ocorrer por conversão (quase
religiosa) de todos os cientistas - como se se tratasse de uma questão de fé - ao novo
paradigma. Ora, este processo traduz a ideia de que a atividade científica é irracional e,
consequentemente, levanta entraves à questão do valor da ciência.

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