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if Sy : de - Maria do Carmo Medina Direito de Familia © ESCOLAR EDITORA Direito de Familia Maria do Carmo Medina Escolar Editora Angola — Av. da Independencia, 2 — Lobito E-mail escolarlobito@escolareditora.com / editora@escolareditora.com Internet hetp://wwwescolaceditora.com 1 sedigao, 2011 Tiragem 2000 exemplaress ISBN 978-989-669-023-6 Depésito legal n° 329955/11 Coordenagio Editorial Joao Costa Capa, Design e Paginagéo Louriofficina, Atelier de Design da Lourinha, Lda heep://wwwlouriofficina.pe Impressioe Acabamento Grafica Manuel Barbosa & Filhos Reservados todos os direitos ¢ interdita a reprodugio total ou parcial por qualquer meio sem prévia autorizagao escrita da autora, sendo ilicita ¢ posstvel de procedimento contra oinfrator. Q 35, 36) 37] 38 39) (47] [48] [49] Indice : 9 CAPITULO 8.° AFILIAGAO Importancia do direito da filiagao; sujeitos da relagao juridica de filiagao egais do estabelecimento da Filiagao a) A posse de estado de filho. . b) O periodo legal da concepgio Filiagio havendo casamento dos pais a) Filho concebido e nascido durante o casament: b) Filho nascido depois de dissolvido ou anulado o casamento. c) Filho concebido ou nascido antes do casamento d) Filho nascido do novo casamento da mie Filiagao nao havendo casamento dos pais . a) Vinculo da maternidade.... b) Vinculo da paternidade Estabelecimento da filiagao por declaragao. Declaragao do progenitor Declaragio feita por terceiros que nao o progenitor. Declaragao de afastamento da presungio da paternidade do marido da mic .. Titularidade formal da filiagao . Efcitos do estabelecimento da filiagao a) Data da produgao dos efeitos. b) Vinculo paterno-filial . c) Direito ao nome d) Direito a nacionalidade . ¢) Direito a pensao de seguranga social . caPiTULO 9° AUTORIDADE PATERNAL E SEU EXERCICIO Ambito, titularidade e duragao da autoridade paternal Conteitdo da autoridade paternal Conteiido de natureza pessoal. 1 — Poder-dever de guarda ... Aos meus alunos para quem, ao longo dos anos, fui escrevendo estas ligdes. Maria do Carmo Medina’ [50] (51) (52] {s3] (54] [55] [56] (59] (60) (61) [62] [63] [64] Direito de Familia 2 — Poder-dever de vigilincia 3 — Poder-dever de prestagio de sustento ¢ cuidados de satide « 4 — Poder-dever de educagio .. Contetido de natureza patrimonial 1 — Administragio ordinéria dos bens dos filhos. 2 — Bens excluidos da administragao dos pai 3 — Actos de administragio extraordinaria. 4— Anulacio ¢ validacio de actos praticados pelos pais Representacio legal... RelagGes paterno-filiais depois da maioridade dos filho: Exercicio da autoridade paternal......... Exercicio conjunto da autoridade paternal Exercicio tinico da autoridade paternal ... Exercicio da autoridade paternal em separad a) Regime dijuntivo .. b) Regime da guarda conjunta 6) Exercicio por terceira pessoa . Inibicao da autoridade paternal Intervengao judicial no exercicio da autoridade paternal a) Intervengao judicial no caso de coabitagao dos pais. .. b) Intervengao judicial no caso de separagaio de facto dos pais c) Intervengao judicial no caso de inibigao da autoridade paternal ou de necessidade de aplicagao de medidas de protecgao social. ......167 _ CAPITULO 10.2 OCASAMENTO Breve historia da evolugao do casamento . 169 A promessa de casamento no direito positivo ¢ no direito costumeiro 171 Natureza juridica do casamento ......scseeseceeeeeeeseeseeseesees Pressupostos de existéncia do casamento . a) Diversidade do sex0......sseeceeees b) Duas declaragdes de vontade .. 6) Intervengio do Conservador do R Validade do casamento: elementos de fundo ¢ elementos de forma... Capacidade matrimonial 1 —A idade mibil.... 2 — Impedimentos matrimoniais.......0..000:600sceseeeeecseee 65 66 67} (68) 69 70, 71 (72. (73] Indice i O consentimento, seu cardcter pessoal e atual ........0..e00eeceeee 197 caPiTULO 11.2 FORMA DO ATO DE CASAMENTO. Formalidade O proceso prelimina a) Declaragio b) Oposigéo ao casamento ¢) Despacho final... Celebragao do casamento . a) Intervencao das testemunhas. b) Linguas ¢ local de celebracao. c) Forma pibblica e solene .... d) Declaragées facultativas ‘Casamento urgente. . registo do casament icial... registo por inscricao e registo por transcrigéo capiruzo 12° NULIDADE DO CASAMENTO. Graus de invalidade Regime de nulidade ‘A — Falta de capacidade matrimonial. 1, Falta de idade nubil 2. Deméncia 5. Conjugicidio . 6. Falta ou vicio de vontade 7, Simulagio..s.ssceeeeeeeeeeeee 8. Casamento celebrado sem testemunhas Legitimidade e prazos para a propositura da acao de anulagao . A — Legitimidade 1. Acgao de anulagao por incapacidade matrimonial 2. Acgao de anulaco por falta ou vicio da vontad 221 3. Acgao de anulagio por falta de testemunhas . . 21 B — Prazos da propositura da agd0 .....0....eeeeeeeeeeeeeeeeeeee 221 12 (74) 75] (76] (83] [84] [85] [86] Direito de Familia Validagao do casamento. .. . Efeitos da anulagio do casamento — O casamento putativo. 1. Efeitos em relagio aos cOnjuges.....66....eeccceeeees 2. Efeitos em relacio aos filhos 3. Efeitos em relacao a terceiros caPiTuLo 13° EFEITOS PESSOAIS DO CASAMENTO Principios reguladores das relages conjugais .........6000.ecc0eee 229 ‘A — Igualdade de direitos e deveres. B — Plena comunhio de vida C — Decisiéo comum. Poderes ¢ deveres matrimoniais. Representagéo comum. . Direito a0 nome, emancipagio, nacionalidade Tutela dos direitos matrimoniais, capituLo 14° EFEITOS PATRIMONIAIS DO CASAMENTO Sistemas do regime econémico do casamento.....sseeesseeteveee ‘O regime econdmico do casamento no Cédigo Civil A — As convengées antenupciais ........... B — As doagées para casamento ¢ entre casados. C — Regimes de bens no Cédigo Civil . 1, Comunhio de adquiridos. 2. Comunhio geral 3. Regime de separagao de bens 4, Regime dotal Os regimes de bens no Cédigo de Familia O tegime de comunhio de adquitidos A — Natureza jurfdica da comunhao matrimonial de bens 259 B— Osbens comuns C — Os bens préprios D — Os bens em parte comuns ¢ em parte proprios 263 265 265 O tegime da separacio de bens . Os poderes de administragéo dos bens; responsabilidade do cénjuge administrador; poderes de oneragio e de disposigao de bens......... 267 {87} [8] (89) (90} [91] {92} (93) [94] *{95] {96} [97] (98] [99] [100] [101] {102] Indice 13 A —No regime de comunhio de adquiridos. lL Administragao ordindria ¢ administragao extraordinaria 2. Responsabilidade do cnjuge administrador. 3. Os poderes de disposigéo ¢ oneragao de bens. B — No regime de separagio de bens «..... Suprimento judicial do acordo e impugnacéo judicial As dividas dos cénjuges... A — As dividas comuns . B — As dividas exclusivas Responsabilidade ¢ garantia das dividas . Fim da comtinhio de bens por execugao judicial capiTuLo 15.° A DISSOLUCGAO DO CASAMENTO Extingio do vinculo...........60+ Separasao judicial de pessoas e bens Declaragio judicial de presungao de morte Evolusao histérica do conceito de divércio. O atual conceito de divércio Conceito de divércio no direito angolano . Fundamento de divércio — causa genérica Natureza juridica do direito ao divércio Modalidades de divércio — o divércio por miituo acordo. O divércio litigioso; fundamentos a titulo exemplificativo A— Adultétio.............6. B — Vida e costumes desonrosos C — Abandono completo do lar conjugal D = Ofensas graves & integridade fisica ou moral . E—A separagao de facto por trés anos. . F — Abandono do pais por parte do outro conjuge, G —Aauséncia do cOnjuge....0.0....00c eee H — Deméncia do cénjuge . .. I — Relevancia dos fundamentos Legitimidade na agao de divércio litigioso e suspensio do direito deagio.... Causas de extingao do direito ao divérci A —Instigagio [103] {104 105, 106) 107] 108. 109] 110) iL 112) 113) 114] 115, 116} Direito de Familia B—O perdio c reconciliagao.... 319 C— A caducidade do direito ao divércio .. 320 Formalismo processual do divércio litigioso 322 1. Processo especial 322 2. Cumulagao de pedidos . 3. Conciliagao dos conjuges 323 4. Conversio da acgao .... 324 5. Medidas provisérias 324 6. Efeitos e registo da senteng capiTuLo 16° EFEITOS DA DISSOLUGAO DO CASAMENTO Efeitos genéricos Efeitos da dissolugao do casamento por morte 1. Efeitos de natureza pessoal... 2. Bfeitos de natureza patrimonial .. Efeitos da dissolucao do casamento por divércio 1. Efeitos de natureza pessoal 2. Efeitos de natureza patrimonial .. Efeitos das causas especificas do divércio capiTuLo 17° AUNIAO DE FACTO Natureza do instituto Enquadramento do direito angolano; relevancia do casamenéo segundo o direito costumeiro. . Conceito de unio de facto pressupostos legais Reconhecimento por mituo acordo Reconhecimento por via judicial . .. ‘Atendimento da unio de facto que nao preencha os pressupostos caPiTULo 18° AADOGAO Evolucao do instituto da adogio . A realidade sociojuridica angolana. Conteiido legal da adogio. (117 118 119) 120) 121 122. 123. 124) 125 _ [126 (27 . [128 (129 130 131 132, 133, 134] 135. 136 137 138 139) 140 141 Indice 15 Consentimento a adogai Autorizagio da adogio internacional. Tipos legais de adogio. Efeitos legais da adogao a) Em relagéo ao adoptante. b) Em relagio a0 adoptado. ¢) Direito do adoptado a identidad d) Em relacio a familia natural . Processo de adogio... Revisio da sentenga de adogio. Revogago da sentenga de adocao Normas de conflitos capituto 19° ATUTELA Evolugio do instituto da tutela e seu contetido Atutela eo direito piblico. en Classificagao da tutela quanto a forma de escolha do tutor Tutela obrigatoria e acéo piiblica de tutela Tutcla constituida voluntariamente .... Escolha, requisitos ¢ nomeagao do tutor Natureza juridica do cargo de tutor Poderes do tutor 1, Poderes de natureza pessoal . 2, Poderes de natureza patrimonial. Ongios de acompanhamento da tutela . Remogao ¢ rentincia do tutor. Tutela vacante, administcativa e de facto. Termo da tutela CAPITULO 20." OS ALIMENTOS Conceito, fungao social e fonte da obrigacio de alimentos .......... 409 Natureza juridica dos alimentos ...... Garantia da obrigagio de alimentos : Sujeitos ativos ¢ sujeitos passivos da obrigacéo de alimentos ........ Al3 Modo, vencimento e lugar de cumprimento da obrigagio de alimentos 418 16 Direito de Famtlia [142] Medida ¢ natureza variével dos alimento: [143] Execugio da obrigagio de alimentos . [144] Extingio do direito ¢ da obrigagio de alimentos... BIBLIOGRAPFIA.........-.0csceeee eee eee reer eee e eee eee teen ret eae erga 429 CAPITULO 1.° INTRODUGAO U1] Oconceito genérico de familia, as relagdes juridicas familiares ¢ asua autonomia No ambito do nosso estudo teremos que nos debrugar sobre o ramo de dircito que regula ¢ disciplina as relagdes juridicas familiares. Estas relagées juridicas tm como alicerce um fenémeno social que ¢ constituido pela familia, A familia é em si um fenémeno natural inerente & sociedade humana. A socializagao da pessoa humana inicia-se na familia. O conceito de familia nao é, de qualquer forma, um conceito estitico ¢ imutdvel. Muito pelo contrario: como os demais fenémenos humanos e sociais, esté sujeito a um processo de evolugao ¢ transformagao. Nao se pode entender a familia como um instituto uniforme, sendo que dentro do mesmo Estado pode haver mais de um tipo de grupo familiar. Dentro do Direito de Familia esto englobados diversos sub-ramos de direito: © direito mattimonial, que regula as relagdes juridicas. a pessoal € pattimonial que se estabelecem entre os cOnjuges: 0 direito da filiagao ou direito _ pat al, que estabelece os direitos e deveres entre pais ¢ filhos; 0 direito de_ ~ parentesco, que determina os efeitos juridicos existentes entre pessoas ligadas por _ lagos de sangue provenientes duma ascendéncia comum; o direito da afinidade, _ que regula as normas vinculativas da alianga que se estabelece entre o cénjuge ¢ 0s parentes do outro cénjuge, ou, se quisermos entender num sentido mais lato, as normas que regulam a alianga entre duas familias; o direito da tutela, que visa regular as formas de substicuigio da autoridade paternal; o direito que regula as ¢lagbes juridicas que provém da adogio, a qual, como veremos, estabelece um vinculo juridico idéntico ao da fliagio entre pessoas nao ligadas entre si por lagos de filiagao biolégica, etc.. Dentro do Direito de Familia iremos ainda estudar determinadas situagées de facto que, pela sua importincia, o legislador nao pode ignorar, tais como a 7 18 Direito de Familia unio livre entre um homem ¢ uma mulher margem do casamento, denominada uniao de facto. E também a separagio de facto entre cdnjuges que, embora unidos legalmente por lacos do matriménio, cessam, 4 margem do divércio, a convivencia comum, Outra situagao de facto de grande relevancia no Direito de Familia éachamada posse de estado das relagdes juridicas familiares, a que o legislador reconhece efeitos legais, tais como a posse de estado de casado ou a posse de estado de filho, gue atribui ao filho uma real vivéncia como tal. Delas se faz derivar importantes consequéncias de direito e ha quem chame a este fendmeno a juridicizacao das relagoes de facto. Dentro da familia vigoram institutos de natureza patrimonial, como os regimes matrimoniais de bens entre os cénjuges, onde est4 prevista a regulacio de questées como a aquisigao ¢ a gestéo patrimonial dos bens do casal, a sua alienagdo, € ainda a administracgao do patriménio dos filhos menores atribuida aos progenitores, etc.. A propria estrutura e funcionamento do direito sucessério estio intrinsecamente ligados 4s normas do Direito de Familia. O Direito de Familia ou, se quisermos dizer, «os direitos de familia» sio em geral os direitos que tutclanyos interesses das pessoas que fazem parte da comunidade familiar. A familia pode assim ser definida como um grupo social relacionado entre si por obrigag6es ¢ direitos reciprocos. Ovestado familiar €a situagdo subjetiva da pessoa dentro da familia, como titular duma pluralidade de direitos, poderes e deveres especificos. a) Codificacao do Direito de Familia Os sistemas de direito socialista rejeitavam a divisio bipartida do direito em direito publico ¢ direito privado, adotando uma concepao unitiria do direito, dimanado de uma fonte tinica do poder do Estado. ‘Oque éimportante realcar éque, nesses sistemas,o Direito de Familiaconstituia um ramo auténomo do direito, destacado do direito civil. Autonomizava-se 0 diteito de familia em razao do tipo especifico das,instituigées juridicas que ele regula, pelo que, nesses paises, as leis de familia eram leis destacadas dos cédigos civis. A nivel do continente africano também se nota a tendéncia de autonomizar 0 diréito de familia com a publicagio dos respetivos cédigos. As Leis de Familia, Divércio ¢ Filiagao (1976) ¢ o Cédigo de Familia da Republica de Cabo Verde, Ver 0 Cédigo de Familia da Repiblica Democritica Aiema (1966), 0 Cédigo de Familia da Repiblica Popular da Bulgiria (1968), as Leis de Familia e Casamento da URSS (1968) ¢ 0 Cédigo de Familia de Cuba (1975). Introdugao 19 em parte revogado em 1997 as Leis de Familia de S. Tomé e Principe (1977), os Cédigos de Familia da Costa do Marfim da Argélia, Nos sistemas de dircito romano-germanico, que englobam a Alemanha e paises da Europa Ocidental, as normas de direito de familia estdo integradas nos respetivos cédigos civis. Verificamos que num sistema juridico que nos € préximo, o dircito brasileiro, foi aprovado pela Lei n° 10 406 de 10 de janeiro de 2002, 0 novo Codigo Civil que consagra 0 seu Livro IV ao Direito de Familia, seguindo assim o sistema romano-germinico. No entanto na Catalunha, Espanha, existe 0 Cédigo de Familia que foi autonomizado do Cédigo Civil espanhol, 0 Cédigo de Familia aprovado pela » Leine 9/1998 de 15 de julho com alteragées das Leis n.° 3/2005 ¢ n° 10/2008. Porque se vive em todo o mundo, numa época de profundas alteragbes 20 dircito de familia, tem sido frequentemente usado o método de publicacao de ._ leis avulsas que atualizam pontualmente importantes matérias de direito de familia. No Chile foi publicada a Lei n° 19 947, de 17 de maio de 2004, a Lei do Casamento Civil. Na Republica Popular da China vigora a Lei do Casamento de 1980 que sofreu profunda revisio em 2001. Na Suécia foi aprovada a Lei dos. . Conviventes, de 2003. Em Franca foi aprovada a Lei do Divércio de 26 de maio: © le 2004, que entrou em vigor em I de janeiro 2005. Em Mogambique foi publicada a Lei n.° 10/2004 de 25 de agosto que: aprovou a Lei da Familia e que veio revogar o respetivo Titulo do Cédigo Civil. ‘Na Africa do Sul foi aprovada a Lei da Unio Civil que entrou em vigor em novembro de 2006 e que foi a primeira lei no continente africano a reconhecer efeitos & uniao entre pessoas do mesmo sexo. A Lei 54/2006 da Itdlia, veio alterar © Cédigo Civil na matéria relativa ao exercicio da autoridade paternal por pais separados, estabelecendo e regulando o exercicio da autoridade paternal de forma conjunta. Na Suiga foi aprovada a Lei do Partenariado Registado, que passou a vigorar a partir de 1 de janeiro de 2007, aplicével a unides entre pessoas do mesmo sexo. A Noruega aprovou a Lei do Casamento em junho de 2008 que entrou em vigor em janeiro de 2009 e que permite casamento formal entre pessoas de sexo diferente ou do mesmo sexo. Em Portugal foi publicada a Lei n.°61/2008 de 31 de outubro que veio alterar o regime juridico do divércio, fazendo-o por via da alteracao das disposigbes do Cédigo Civil e completando-as com altcragies a0 Cadigo de Processo Civil e do Registo Civil. No ano de 2009 foram alteradas disposicbes relativas ao estabelecimento da filiagao, Lei n.° 14/2009 e relativas a0 casamento Lein.® 29/2009, de 29 de junho, que passou a permitir 0 casamento entre pessoas do mesmo sexo. Mais recentemente, a Lei n® 7/2011 de 15 de marco, veio 20 Direito de Familia estabelecer 0 procedimento a seguir no registo civil para se alterar a mudanga de sexo ¢ de nome préprio. Ji sistema de direito anglo-saxénico o direito de familia ¢ integrado em leis especificas sobre os seus institutos fundamentais, como o casamento, divércio, filiagao ¢ direitos da crianga.® Mesmo em paises que procederam a reformas legislativas importantes apés as mudangas no mundo socialista manteve-se 0 direito de familia em diplomas separados.) Ha que apontar que a Repitblica Checa apesar de muita controvérsia, optou por introduzir a partir de 1998, as reformas do direito de familia no Cédigo Civil. b) Fungéo promotora do Direito de Familia Por fim, devemos apontar a fungao promotora do dircito de familia no Ambito do comportamento dos membros da familia ¢ na defesa dos legitimos interesses dos seus membros tal como so tutelados por lei. Importa reconhecer que o direito de familia est4 profundamente imbricado com questées que se prendem com a sociologia ¢ a antropologia ¢ que estudam as bases do comportamento humano no meio social e em que se estrutura o direito costumeiro. E-certo que questées de natureza eminentemente politica se vao repercutir no direito de familia, como sejam a defesa dos direitos fundamentais da pessoa humana’ liberdade ¢ 4 igualdade, a posi¢ao da mulher na sociedade, a politica de cada pais em relagio ao aumento ou a diminuicéo da populacio. Acontece com frequéncia haver um desajuste entre 0 conteido da norma juridicaea prética social, porque muitas vezes 0 peso das tradigoes leva exploragéo € 2 opressio dentro da familia ¢ ao destespeito dos principios defendidos por lei € a0 uso abusivo de direitos. Mas também ¢ certo que 0 conhecimento, por cada pessoa, dos seus proprios direitos permite que mais facilmente se reivindique 0 seu exercicio e a sua aplicacio subjetiva. Por isso as reformas no campo do direito de familia tem um indiscutivel impacto no meio social ¢ atuam como agente promotor do progresso da propria sociedade. O direito de familia confere um verdadeiro poder de intervengio pela via legal, alterando comportamentos anteriores que deixaram de set protegidos por lei. © A «Family Law Act» de Inglaterra (1996),a «Family Law Act» da Australia (1996), alterada pela Lei da Reforma do Dircito de Familia de 2006 ¢ © Cédigo do Direito Matrimonial da Suécia (1987). ©) © Cédigo de Familia Russo de 1996. O Cédigo de Familia da Repiiblica do Azerbaijio de 2000. O Cédigo de Familia da Albania de 2003. A Lei de Familia da Sérvia de Julho de 2005. A Lei de Familia da Crodcia de 2007 Introdugao 21 Muitas vezes as normas do direito de familia sao, na sua esséncia, normas de contetido ético-juridico que definem o tipo ideal das relagoes familiares. Este ramo do direito néo pode, por conseguinte, ser encarado de forma passiva como a reprodugio, a nivel juridico, de uma realidade social. Ele deve antes traduzir- -s¢ num meio de atuagao nas estruturas sociais, visando em concreto um novo comportamento ¢ um novo relacionamento entre os membros da familia. [2] Breve nogio histérica da familia e dos sistemas familiares Oeestudo do direio de familia exige que tenhamos, antes de mais, uma nogio do que é a familia. E um conceito que nao pode ser entendido de forma dogmatica, Porque cle esta em correlacéo com a prépria realidade econémica, cultural ¢ social das diferentes sociedades humanas._ A familia tem, a sua-osigem no fenémeno natural da procriag - Propagacao da espécie humana. Mas é sobretudo um fenémeno social, pois através dos tempos se tem verificado que nela nao intervém tao somente fatores biolégicos. Nela intervém outros fatores de ordem social e econémica.Como tal, o conceito varia de acordo com a estrutura social e politica em que se insere e ‘.interessa recordar os diversos conceitos de familia que acompanharam a evoluggo histérica das sociedades humanas. Nao existe um conceito tinico de familia, mas on diverses conceitos. * Temos a familia extensa ou a grande familia estabelecida com base no parentesco. E a familia parental formada por um largo conjunto de pessoas, unidas por uma ascendéncia comum, ligadas por fortes lacos de solidariedade ¢ com uma comunidade de interesses econémicos. A familia monogdmica ¢ estraturada no casamento tnico ¢ exclusivo dos cnjuges. A familia poligamica, ou melhor dizendo, poliginica é aquela em que © marido se apresenta ligado por lacos de casamentos vilidos com mais de uma mulher simultaneamente. No século XIX invocava-se 0 conceito de livre arbitrio e do predominio da tazao para a explicacio dos fenémenos sociais. Desde cedoa humanidade comegou aimpor restrigdes as relagdes de procriagéo entre parentes consanguineos (pais ¢ filhos, itmos ¢ irmas), proibindo o incesto € mais adiante empreendendo ainda a exogamia, ou seja, 0 casamento fora do grupo familiar. Podemos também assinalar a impostincia das sociedades de economia doméstica, em que as mulheres representam grande parte da forga de trabalho, produzindo os alimentos necessérios 4 manutengio da familia com acentuada importancia social. 22 Direito de Familia O cli ou grupo ¢ consticuide por grupos de descendentes provenientes de um ascendente comum e, como vimos, pode ser estatuido por via materna, quando hd a referencia a uma ascendente feminina comum, ou ser estabelecido pela via paterna, quando a referéncia é feita a um ascendente masculino comum. Numa fase posterior, a familia é caracterizada pela poligamia praticada pelo homem, tendo como contrapartida a exigéncia de uma rigorosa fidelidade por parte da mulher. No entanto, a poligamia ¢ em regra praticada pelos elementos masculinos que detém o poder: «A poligamia é um privilégio dos ricos ¢ dos poderosos... a massa do povo é mondgama». Neste tipo de sociedade a mulher esté subordinada ao marido ¢ nos meios rurais a familia constitui uma tnidade de produgio em que cabe 4s mulheres executar.os trabalhos agricolas ¢ os setvigos domésticos de manutengio do agregado familiar, como o transporte de lenha e 4gua, a preparacao dos alimentos, 0s cuidados com os filhos, etc.. Nela os lagos matrimoniais nao sao indissohiveis. Diferente ¢ a sociedade familiar do tipo patriarcal que se baseia no poder exclusive do homem, o patriarca, ¢ se caracteriza pela organizacio de um grupo de pessoas, livres ¢ nao livres, submetidas ao poder paterno de um chefe. Este tipo de familia aparece-nos.retratado nos tempos biblicos do Antigo ‘Testamento, na Roma antiga, na China dos mandarins e no mundo mugulmano em geral: Nelacoexistiam 0s esctavos¢ os membros.da familia, como filhos, netos, respetivas mulheres ¢ outros parentes, subordinados ao dominio paterno. Aparece depois a familia monogimica ainda assente no predominio do homem. Ela tem por fim a procriagao da prole, salvaguardando a paternidade indiscutivel dos filhos por parte do marido ¢ rendo em vista a transmissio da proptiedade e da posse dos bens dentro da familia. A familia monogamica caracteriza-se pela maior solidez dos lagos familiares, passando a vigorar o princfpio da indissolubilidade do matriménio, salvo em casos excecionais, em que se possibilita o repidio da mulher pelo marido. A monogamia néo impede que o homem pratique o heterismo, ou seja, as relagdes sexuais fora do casamento, prética que ¢ muitas vezes aprovada pelo costume € pela lei. Apesar disso, a mulher atingiu no casamento monogimico uma posigio mais elevada. O casamento petmitiu, assim, a transmissio da propriedade privada dentro da familia, consolidando o poder da burguesia. © Friedrich Engels. 4 origem da Familia, da Propriedade e do Estado, Edigio Presenga, 3 edicao, p. 81. Introdugéo 23 [3] A familia na sociedade tradicional africana Interessa apontar alguns dos caracteres predominantes nos diversos tipos de organismos familiares que se encontram no nosso continente, com especial relevo para a sua zona austral. Os primitivos habicantes desta parte sul de Africa, 0s povos San, indevidamente designados como bosquimanos, caracterizam-se por uma organizagio coletiva do poder e pelas relagées conjugais baseadas na monogamia.”) Nos pavos Bantos predomina a vida sedentéria apoiada na atividade agricola ena criagao de gado. Nestes povos negro-africanos a ideia de familia é entendida relagdes que ligam nos seus fundamentos ¢ estruturas, tendo em conta as prép “© @ homem a terra. Esta ¢ explorada coletivamente pela familia. As relacdes de produgao estado intimamente relacionadas com as relagdes “familiares e estas determinam 0 direito dos individuos sobre o solo e os seus produtos ¢ os seus direitos ¢ obrigagdes de receber, dar ¢ cooperar, como membros integrados no grupo familiar. As relagdes de parentesco funcionam como relagoes de produgio. £ nesta linha de pensamento que se enquadra o casamento, que se traduz Suma alianga de grupo a grupo ¢ nao de individuo a individuo. E uma alianga le grupos domésticos e no entre grupos de filiacéo. A autoridade paternal nao « 2forcosamente exercida pelo progenitor mas pelo chefe da familia. ®° Noodireito tradicional africano ha regras proprias relativas ao parentesco, 2 filiagéo, ao preco da noiva como integrante do casamento¢ ao regime matrimonial de bens. A tesponsabilidade pelo cumprimento das obrigagées ¢ pelos demais negécios juridicos vai recair sobre o grupo familiar € nao ’sobre o individuo unicamente a titulo pessoal. A mulher nao é, em regra, reconhecida capacidade juridica para ser processada e responsabilizada sem a assisténcia do representante legal. O levirato ¢ 0 sororato sao largamente assinalados, confirmando a diregio principal de que o casamento se estabelece por acordo entre familias. A fase preliminar do casamento é constituida pela entrega de prestacdes da familia do noivoa familia da noiva, o que representa uma compensagio econémica pelasaida de um membro da familia (a mulher passa aestar subordinada ao poder do marido), Em contrapartida,os valores recebidos pelos familiares da mulher podem ser aplicados no pagamento de uma prestagio para a celebra¢ao do casamento de um membro masculino da familia ¢ garante-se assim uma compensagio da saida de um membro feminino da familia pela entrada de outra mulher. 9) Carlos Valiente Noialles, Les Bosquimanes, Peuples Oublies de lAfrique Australe. 24 Direito de Famtlia Pelo casamento, 0 marido adquire sobre a pessoa da mulher verdadeiros direitos in rem, pois se alguém a mata, a agride, ou com ela pratica adultério, atribui-se a0 marido o direito de exigir uma indemnizagao. Mas se foro marido a maltratar a mulher ou a causar-lhe a morte, sio os parentes da mulher que tém direito a ser indemnizados. Reconhece-se que o direito costumeiro tem um elaborado sistema de normas ¢ principios que se referem as questdes do noivado, ceriménia do casamento, relacdes entre pais ¢ filhos, conflitos conjugais, direito sucessério, etc... O direito a alimentos, a adogao e as relagées de afinidade vigoram dentro da familia com regras préprias. O direito de familia é, pois, o mais desenvolvido nas comunidades africanas. [4] A familia na sociedade moderna Periodos hé em_que a familia € profundamente afetada ¢ até destruida por determinados fendmenos, como .a escravatura, os periodos de guerra ¢ -instabilidade que originam a deslocagio maciga da populacio, as migragées, etc.. Dé-se um afrouxamento om até a mprnra des relagdes:familiares. Mas, passados esses periodos de transformagao ou convulsio social, a sociedade familiar recompée-se e-reconstieui-se sob novas formas. ‘A familia na sociedade moderna corresponde a-um dado estigio social resultante do desenvolvimento técnico-cientifico industrializado: nela coexistem os cénjuges e os respetivos filhos, formando a familia nuclear ou conjugal E, pois, um conceito de familia de Ambito mais restrito, composta por um homem e uma mulher, formando uma comunidade de vida, unidos com estabilidade e a sua prole comum. Dela resultam importantes direitos ¢ deveres reciprocos de solidariedade ‘entre os seus membros, como 0 direito € o dever de ajuda miitua ¢ A assisténcia moral ¢ material, que se traduz na prestagio de alimentos, etc.. Embora no presente exista restrigao & extensao da familia ora reduzida & familia nuclear, ou pequena familia em sentido estrito, nao se lhe retira a sua grande importancia social. E- lhe atribuida atividade de grande relevo, pois é considerada 0 micleo basico do tecido da sociedade, e nela se encontram confundidos interesses de natureza pessoal e social. © Ronald Thandabantu Nhlapo, «International Protection of Human Rights and the Family — Africa variations of a Common Theme», em International Journal of Law and the Family, Abril 1998, p.9. Introdugao 25 A familia é reconhecida uma fungio de natureza estabilizadora cuja preservacao interessa 4 evolugdo da prépria sociedade. Por ‘isso ela deve ser apoiada e protegida pelo Estado. Incumbe especialmente & familia conjugal a procriagao da prole, a educagao ¢ a formacio dos filhos ¢, em suma, a satisfagio dos sentimentos afetivos de cada pessoa. Nela se efectivam de forma direta as necessidades bisicas da convivéncia humana.” Numa forma mais reduzida de unidade familiar deparamo-nos hoje, em ntimero cada vez maior, com a familia monoparental, composta t4o somente por um tinico progenitor, o pai ou a mie, e pelos respetivos filhos. Tal ocorre no caso das mées solteiras, dos pais separados, divorciados ou vitivos que vivem com os filhos. ; Embora a pequena familia moderna tenha perdido o seu valor econémico, ela nao deixa de ter grande relevancia no aspecto cultural, pois é nela que, de geragio em geragio, se vio transmitindo, de pais para filhos, os valores culturais. Pela criacio, instrugao e educacao dos novos membros da familia vio-se transmitindo © ensino da lingua, os conhecimentos adquiridos pelas geragdes mais velhas, os habitos de vivéncia, que formam a esséncia de cada povo. Postergou-se 0 conceito retrégrado de que a familia conjugal devia ser... estabelecida sob o poder autoritério do marido sobre a mulher, consubstanciado na tutela marital, que acarretava para a mulher uma verdadeira capitis diminutio. «. Também deixou de se acatar o principio segundo o qual, nas relacées paternais, devia prevalecer o poder do pai sobre os filhos, subalternizando a mie. E hoje aceite um novo conceito de familia conjugal que no necessita da preponderancia deum «chefe», antes ¢ baseada na liberdade e na individualidade dos dois cénjuges € na convivéncia solidaria dos seus membros. Substitui-se a familia estruturada na hierarquia pela familia estruturada na diarquia (de marido e mulher) ¢ baseada no consenso de ambos. Ao marido ¢ & mulher sao atribuidos direitos ¢ deveres estruturados em igualdade, a luz da verdade essencial de que a dignidade humana ¢ a mesma para o homem ¢ para a mulher. ‘Da mesma forma se altera a visio das relagées entre pais e filhos que se entende devem ser exercidas com autoridade mas sem autoritarismo. © A. Burguiére, C. Zuber, M. Segalen ¢ F. Zonabend — «E amanhi, a familia?» in Histéria da Familia — vol. LV. Edigio Terramar, 1995, p. 140: «A modetnizagao das sociedades nao foi feita contra a familia, mas sim com ela. Ora grupo de residéncia, ora rede, a familia, ¢ um ponto de apoio para o individuo que tem que se deslocar, entrar na cidade, penetrar nos novos mercados de emprego... 0 estudo das transformacdes familiares ligadas & modernidade pde em evidéncia a diversidade de respostas da instituigao face 4s novas condig6es econdmicas ¢ sociais» 26 Direito de Familia As unides entre pessoas do mesmo sexo, expressio do homossexualisino, vao ganhando espaco na consagracio legal, sobretudo em paises com-influéncia de cultura europeia. A alteragao da concepsio sobre as relagdes familiares, leva & aceitagao de novas realidades dentro da vida familiar.” [5] Princfpios fundamentais do Direito de Familia No direito moderno podemos, em sintese, expressar os seguintes principios fundamentais comuns aos diversos sistemas juridicos atuais: a) O principio da separacao do Estado e das confissbes religiosas™ no direito de familia, de que resulta em regra, o reconhecimento tinico do casamento laie® celebrado por um érgio estatal, seja ele o conservador do registo civil, como entre nés sucede, ou o presidente da cdmara, 0 juiz, o notario. Nestes sistemas todas as questdes relativas a validade e a dissolucao do casamento ete. sio resolvidas pelos tribunais judiciais ¢ nao por tribunais eclesidsticos. Outros sistemas juridicos adotam o principio da igualdade das diversas crengas religiosas perante o Estado, ¢ permitem que as igrejas legalmente reconhecidas celebrem casamento religioso a0 qual sio atribuidos efeitos civis, desde que-estejam conformes as normas estipuladas na respetiva legislagao vigente de direito matrimonial. b) O.princfpio da liberdade de :escolha.da forma de constituir famibia € da dignidade dos seus membros, segundo o qual assiste a cada pessoa o'dircito fundamental de constituir familia, sendo livre para escolher a forma como quer criar a sua prépria familia, pelo casamento ou pela unido de facto, ou até para a no criar, nao sendo em qualquer dos casos atingido na sua dignidade™, c) O princ{pio da igualdade de direitos e deveres entre o homem ea mulhér em todos os aspectos da vida familia, principio que tem a sua fonte no proprio direito constitucional, que o assegura no seu art. 35.°, n.° 3"), Este principio é © Martine Segalen, Revolugdo Industrial do Proletdrio ao Burgués, idem, p.32: «Além disso a esperanga de vida veio alterat as relagdes entre as geragSes... a transmissio do patriménio organiza-se de forma mais flexivel a0 longo do ciclo familiar. A coabitacio juvenil, o divércio, os nascimentos fora do casamento jé no constituem um desvio, sendo antes integrados nos processos das relacoes familiares». © «A Republica de Angola é um estado laico havendo separagao entre o Estado ¢ as igrejas», Constituigao — art. 10.°, n.° 1. A Lei n.° 2/04 de 21 de Maio, ja reafirmava que: «O Estado angolano € laico com completa separagio entre o Estado e as instituigoes religiosas, que tém direito a igual traramento» — art. 3.°,n.° 3. (0) Esta Convengio estatui sobre as diversas formas de que se reveste a discriminago contra a mulher ¢ ao focalizar as relagées no seio da familia vai impondo que elas sejam combatidas ¢ ilegalizadas nos diversos sistemas juridicos ¢ para tal impée novos principios ¢ regras obrigatdrias. Fontes Fundamentais do Direito de Familia 37 A Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos, aprovada pela Orga- nizago da Unidade Africana em 1981 ¢ ratificada pela Resolucao da Assembleia do Povo n. 1/91, consagra o seu art. 18.°8 familia. «ARTIGO 182 1.A familia ¢0 elemento natural ea base da sociedade, 2. (.u) assistir d familia na sua misséo de guardié da moral e dos valores sradicionais (..) 3. (.) velar pela eliminagéo de todas as discriminagies contra a mulher e de assegurar a protecio dos direitos da crianga (...)> ‘+ Enaltece-se o valor culeural da familia sem embargo da obrigagao dos Estados porem fim a todas as formas de discriminagao contra a mulher e de protegerem “08 direitos da crianga. A Convengao Internacional sobre os Direitos da Crianga, aprovada pelas Nagées Unidas em 20 de novembro de 1989 ¢ ratificada pela Resolugio n.° 20/90 da Assembleia do Povo, reserva os seus artigos 7°, 8° ¢ 9°, a0 direito de toda a crianga a uma cidadania e as relagdes familiares, impondo o seguinte: ah «Alt. 7.2 : “1A crianga é registada imediatamente apds 0 nascimento e tem desde 0 nas- “3 3. cimento, 0 direito a um nome, o direito a uma nacionalidade e sempre que ” posstvel, o direito de conhecer os seus pais. Art. 8° 1. (...) @ direito a preservar a sua identidade incluindo a sua nacionalidade, 0 nome e relagées familiares (...) _ Art. 9° 1. (...) a garantir que a crianga nao é separada de seus pais contra vontade destes (...) sera prejuizo de deciséo judicial.» A Carta Africana dos Direitos e do Bem Estar da Crianga aprovada em 1990 ratificada por Angola em abril de 1992, determina o seguinte: «Art, 18.2 1.A familia é a base natural da sociedade (...) 2. (.1) (se) tomardo medidas apropriadas para assegurar a igualdade de direitos e responsabilidades dos cnjuges perante as criangas durante o casa- mento e durante a sua dissolugéo (...) 3. Nenhuma crianga pode ser privada de meios para a sua manutengéo em razdo do estatuto matrimonial dos seus pais. 38 Direito de Familia Art. 19.2 1. Qualquer crianga tem direito 4 protectao e aos cuidados de seus pais ¢ se ‘possivel residir com eles (...) salvo se autoridade judicidvia decidir (...) que essa separagéo é no préprio interesse da crianga. 2. Qualquer crianga separada de um dos pais ou dos dois, tem direito a manter regularmente relagbes pessoais e contactos diretos com ambos os pais.> A nivel da organizagio regional Comunidade para o Desenvolviniento dos Paises da Africa Austral (SADC) de que Angola é membro, foi adotado em 17 de agosto de 2008 0 Protocolo sobre 0 Género ¢ Desenvolvimento que contem normas sobre Casamento ¢ Direitos da Familia (art. 8.°) Direitos de Viuvez das Mulheres ¢ dos Homens (art. 10.°) e Criancas do Sexo Feminino e Masculino (art. 11.°).() w ARTIGO 8° CASAMENTO E DIREITOS DA FAMILIA 1. Os Estados Partes deverao decretar e adotar medidas legislativas, administrativas ¢ ‘outras apropriadas para garantir que as mulheres ¢ os homens gozem de direitos iguais no casamento ¢ sejam considerados parceiros iguais no casamento, 2. Allegislagao sobre 0 casamento deverd garantir que: a) nenhuma pessoa com idade inferior a.18 anos contraia casamento; salvo disposigao em contrério expressa na lei, atendendo sempre ao melhor interesse e bem-estar da crianga. : b). todos os casamentos sejam:celebrados com o livre e:pleno consentimento de ambas as partes. ) todos os casamentos, incluindo os civis, religiosos ¢ tradicionais tenham um assento lavrado em conformidade com as leis nacionais. d) enquanto durar 0 seu casamento, as partes tenham direitos e deveres reciprocos pata com os seus filhos, sempre no supremo interesse destes. 3. Os Estados Partes deverao decretar ¢ adorar medidas legislativas ¢ de outra indole apropriadas para garantir que os cOnjuges, em caso de separacio, divércio ou anulagio do seu casamento : a) tenham direitos e deveres reciprocos para com os seus filhos, sempre no superior interesse destes; b) sujeitos a escolha de qualquer regime ou contrato matrimonial, renham uma porcdo equitativa de qualquer propriedade adquirida durante a sua telagio. 4. Os Estados Partes deverao decretar medidas legislativas ¢ outras, tendentes a assegurar que as macs ¢os pais honrem o seu dever de cuidar dos filhos e sejam aplicadas decisoes em matéria de obrigacio alimentar. 5. Os Estados Partes deverio estabelecer disposigées legais para assegurar que as mulheres ehomens casados tenham 0 direito de optar pela manutencao da sua nacionalidade ou pela aquisigéo da nacionalidade do seu cOnjuge. Fontes Fundamentais do Direito de Familia 39 Este Protocolo foi ratificado pela Resolugao n.° 30/10 de 6 de setembro da Assembleia Nacional e faz parte do nosso direito interno. Trata-se de matéria de conteiido muito atualizado que é dirigido especificamente contra situagées sociais que a nivel das relagdes familiares destes paises da Africa Austral se mantém ¢ que sao francamente atentérias dos prine{pios estruturantes dos direitos humanos. ARTIGO 10° DIREITOS DE VIUVEZ DAS MULHERES E HOMENS 1. Os Estados Partes deverao promulgar legislacio ¢ fazé-la cumprir, de modo a garantir que: : a) as vias nao sejam sujeitas a tratamento desumano, humilhante ou degradante; b) salvo determinagao em contrario por um tribunal competente, a vitiva se torne automaticamente encarregada de educagao dos seus filhos ¢ tenha a custddia dos mesmos em caso de morte do esposo; ¢)_avitva tenha direito a viver na casa matrimonial apés a morte do esposo d) a viva tenha acesso a emprego e a outras oportunidades para que possa prestar um contributo significativo a sociedade; e) avitiva tenha direito a uma porgao equitativa na heranga do seu esposo; ££) avitiva tena direito de voltar a casar-se com qualquer outra pessoa de sua escolha; ¢ * fe" S° ) a vitiva esteja protegida contra todas as formas de violéncia e discriminacao em razio da sua condicio. 2. Os Estados Parces deverao adotar medidas legislativas para assegurar que os vitvos "2° gozem dos mesmos direitos que as vitivas nos termos do n.° | do presente artigo. ARTIGO 11° CRIANGAS DO SEXO FEMININO E MASCULINO 1. Os Estados Partes deverao adotar leis, politicas ¢ programas para garantir o desenvolvimento ¢ protegio de meninas: : a) eliminando todas as formas de discriminacio contra as meninas a nivel da familia, da comunidade, de instituigées do Estado; b) assegurando que as meninas tenham igual acesso a educagéo ¢ a cuidados de saiide e nao sejam submetidas a tratamento algum que Ihes faca desenvolver uma imagem auto-imagem negativa; ¢)_assegurando que as meninas gozem dos mesmos direitos que os meninos e sejam protegidas de atitudes ¢ priticas culturais danosas, em conformidade com a Convengao das Nagées Unidas sobre os Direitos da Crianga e a Carta Africana sobre os Direitos ¢ 0 Bem-Estar da Crianga; d) protegendo as meninas da exploragio econémica, do trafico de seres humanos ¢ de todas as formas de violéncia, incluido abuso sexual ¢) assegurando que as meninas tenham acesso a informagao, a educagio, a servigos ¢ a facilidades na area da saiide e dos direitos sexuais e reprodutivos. 2. Os Estados Partes deverio adotar medidas legislativas e outras para assegurar que os meninos gozem dos mesmos direitos que as meninas nos termos do n.* I do presente artigo. 40 Direito de Familia Alias por forca do preceito consagrado no art. 26, n° 2, da Constituigao os «

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