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psicolégica 27 osicoterapla psicanalitica naney mewilliams 2) ASENSIBILIDADE | PSICANALITICA «Sahe-se de devotos das radigbesbrtinica e francesa que brandiam uns aos outros as canetas, dizendo qualquer coisa como: "O que nds fazemos € psicandlise € 0 que sracésfazem nio 6."» Tendo aprendido muito, tanto com Winnicorteomo com Lacan, acabei por os consierar representantes dos valo- res cémicos e trigicas, respectivamente, do magico ‘quadro do pensamento psicanalitico.. Em Winnicott encontramos uma visio benévola do mundo e pert cionismo ~a erenca de que € possivel haver sate e fam lias feizs, e que a humanidade pode mudar para melhor, Em Lacan somos mais capazes de encontrar um pessi- mismo freadiano—o sentido de que hd algo de fundamen- talmente incontrolivel na existéncia humana, 0 que tor- na rmitisimo suspeitaspalaveas como “sate”. Se seria instil forgar a mistura destas perspectivas,ignorar uma ‘ou ontra parece quase fico.» Deborah Luepnivz (2002, pp. 16-17) Neste capitulo, tento extrair os pontos comuns da estonteante diversidade de abordagens que se identifica todas como psicodindmicas, Talvez nao haja uma téenica psicanalitica verdadeira © wniversal, mas ha crencas e atitudes _gerais que esto subjacentes ao esforgo de aplicar os principios psicodinamicos ‘1 compreensio e 20 crescimento de outra pessoa, Mitchell e Black (1995) descre- veram tais atitudes como incluindo o respeito pela «complexidade da mente, a importincia dos processos mentais inconscientes ¢ 0 valor de um exame sus- tentado da experiencia subjectiva» (p. 206). Benjamim (2002) resume-as como 4 preocupagao com a «verdade, liberdade ¢ compaixio pela nossa vulnera- bilidade comum». Lothane (2002) observou recentemente que o docnte em Patconrnan Pstcanattica Psicanilise «demanda © objectivo socritico de uma vida examinada, tanto aprendendo a conkiecer-se[..] como. crescer como uth agente moral qu vive la responsavelmente e no impulsivamente» (p. 577). Num artigo sobre os valores psicanaliticos, Meissner (1983) salientou a compreensio deo a autenticidade, 0 dar valor a0s préprios valores ¢ a procura da verdade, _ Buckley (2001) remonta a mundividéncia psicanalitica& antiga Gréca,espe- cificamente a0 modelo sfiloséfica» plarénico ca mente (por comparagio com ‘outros modelos da antiguidade, o hométicorpoético eo hipacritico/medico) Messer ¢ Winokur (1984), apropriando-se da linguagem da critica literdt'a rorularam de trigia a orientagio psicanalitica, opondo-n visio comportamen, tal que deserevem como cémica (num espitito semelhante a0 da ja citada Luepnitz, embora ela estivesse a apontar diferensas de énfase no seio da psica. nlise). “Tragico» denota um sentido de se ter de adaptar a realidades ineren, temente imperfeitas e dolorosas; a palavra «e6mico» capta uma visio mais Pragmética de resolugdo de problemas de que € possivel realizar mudangas que déem lugar a um final feliz. Schneider (1998) inclu a tradigao psicanal tica na sensibilidade «romantica» (afectiva, incuitva, hoistica) do pensamento ‘cidental,em oposigdo a0 vis hipotético-dedutivo-indutivo da maior parted Psicologia americana c da logica positivsta em geral. Ha pouco tempo, quando, eu ensinava em Istambul, soube que a lingua turca tem duas palavras diferen. tes que significam cigncia: bel que se refere no «método cientifico idealizado pela psicologia académica do Ocidente e, elim, que diz eespeito a procura de §uma compreensdo por meios mais observacionais,instrospectivos e aesociativos (Yavuz Erten, comunicagio pessoal, 15 de Maio de 2003), Considera-ee que saber psicanalitco se encontra no dominio do elinn Diferentes autores de indole psicanalticaidentificaram-se com a fenomeno- logia,o existencalismo, oestruturalismo, o pés-modernismo, 0 constrativisme, © cepticismo, o budismo, o cristianismo, o judafsmo e outras tradigoes flosé ficas, heemenéuticase espiviuais.Etipico dos pensadores de pendor psicanal ticolocalizaros seus habitos de pensamento no seio de uma tradisio Hlosdfica © orem em causa a ideia de que a terapia pode ser conseguida a partir de meros resultados «objectivos» dos paradigias da investigacZo convencional, ou possa constituir um compéndio de «téenieas», isolado dos valores suposicbese con. textos culturaishistricos orientadores (ver Messer e Woolfolk, 1998; Stenger 1991), Parte do que eu resumo agui também caracteriza as orientagoes que desenvolveram até constuurer um paradigma psicanaitico (on para corrigic aspectos dele), incluindo, entre outzos a terapia da Gestalt, as terapias centradas no cliente e, de modo geral, a tadigio humanista-experiencial, 2 andlise transaccional, as abordagens existencias,o psicodrama es terapias pla arte No que se segue, ¢ com bastante arhitrariedade, os elementos daquilo que WW. H. Auden chamou (num poema que chora a morte de Freud) «todo wm cline dle opiniZo> foram organizados por mim nos seguintes temas: curiosidade ¢ A Sunsnaninane Pacanatinicn 5S reyeréneia, complexidade, idlentificagio © empatia, subjectividade ¢ sintonia com oafecto, vinculagio e f6, Estes aspectos sobrepdem-se em certa medida e, por consequiéncia, sao dificeis de isolars embora seja impossivel descrever uma Gestalt decompondo-a nas suas componentes, eu abordo cada uma delas de forma breve. Curiosidade e reveréncia ‘Na sua mais profunda esséncia, os praticantes da psicanlise tomam a sério 1 provas de que as fontes da maior parte dos nossos comportamentos, senti- Inentos pensamentos so nao conscientes. Dado o que aprendemos nestes litimos anos sobre o e&rebro, esta convicgzo ¢ cada vex mais partilhada pelos cientistas da eognigao os psicélogos clinicos nao psicanalistas, ¢ sugere a possibilidade de uma eventual integracio das abordagens. Porém, para os de orientagio psicanalitica, nfo se trata apenas de estes fendmenos serem ndo conscientes mas de haver uma organizagio dinimica na forma como regista- ios inconscientemente a experiéncia, uma organizagio que inspira os analis- tas a falar como se houvesse algo chamado «o» inconsciente, tanto generica- mente como em cada um de nés, Entende-se que, em todas as pessoas, a organizagio intrapsiquica € 0 resultado de interacgdes que se vao dando entre a crianga em crescimento e as pessoas significativas do seu mundo. As caracte- icascessas figuras eo relacionamento com elas, tal como sio experienciadas pela erianga, acabam por ser internalizados em formas estaveis. Para todos os que praticaram terapia analitica durante muito tempo, tor- nase fascinante ver como as «escolhas» que as pessoas fazem nio sito nada acidentais. Racionalizamos o que fazemos mas, tal como o sujeito hipnotizado inventa uma explicagio para ter realizado inconscientemente uma sugestao 6s-hipnética, raro ou nunca conhecemos todos os determinantes do nosso comportamento. Talvez 0 mais impressionante disto seja a érea da «escolha» cde um parceiro romantico (Mitchell, 2002; Person, 1991}, Apaixonar-se é uma das poucas experiéncias vulgares que torna 2 maioria das pessoas consciente de como tém uma extraordinaria falta de controlo nas situagdes poderosa- mente emocionais em que dao por si. Os filhos de pais afectivamente intensos procuram muitas vezes a intensidadc. /\s filhas de pais alcoslicos lamontam « sua atraccdo por homens com dependéncia alcodlica; filhos de mies deprimi- das podem ser atraidos por mulheres infortunadas como borboletas pela cha- ma, E, jd agora, os sidicos tém um radar para os masochistas e os peddfilos conhecem o olhar da crianca que sugere a confusio ou a vulnerabilidade & ‘manipulago que tornam mais provavel que elas tolerem o molestamento. AAs pessoas tém muitas vezes a consciéncia de terem um «tipo» de objecto de amor, cuja atraccio parece irresistivel, embora poucas vezes saibam a 56 Pacoreeama Psteanantricn Fazio de esse ser 6 seu tipo de pessoa, Estamos sempre a funcionar em muitos niveis diferentes para além dos verbais ¢ racionais, a mandar uns aos outros sinais elaborados com as expresses faciais, 0 tom de voz, a inclinagio da cabega, a tensio do corpo, talvez até com os adores das feromonas. Ao rever 6s teabalhos empiricos sobre a sexualidade, Money (1986) documento «mapas do amor» individuais que séo extraordinariamente idiossincraticos, F certo ue a proximidade e a oportunidade afectam as conexdes que estabelecemos, ‘mas, quando escutam as historias dos clientes e testemutham os seus proble. mas, 0s clinicos ficam muitas vezes chocadissimos pelo ponto 2 que os guides sio inconscientemente determinados, repetitivos ¢ persistentes. Um homem. ue tratei, ¢ costumava entrar todas as manhas na cozinha, para encontrar a mae alcodlica com o olhar perdido no vazio, um cigatro numa mio e uma chavena de café na outra, apaixonou-se «inexplicavelmente» por uma mulher o pai, apesar los seus diligentes esforgos conscientes de o fazer desaparecer, Aqueles de n6s que trabalham com os sonhos, na linha de Freud e outros, ficam sempre reverentes perante tanta informagio condensada nalgumas ima. ‘gens ou numa linha de historia. Quer se analisem quer nao os sonhos na psico- terapia, € dificil ndo se dar valor 4 convicedo de Freud de que o seu esforco ara dar sentido cientifico ao acto de sonhar era 0 seu maior feito. Ha uma condensagio to extraordindria nos simbolos do sonho que nao se pode con- ceber que o cérebro tenha, conscientemente, esse geau de poder. Na elabora- $80 de Grotstci (2000), 0s sonhios demonstram a actividade de diversas «pre~ ‘Sengas» cooperantes na mente: «0 sonhador que sonha 0 sonho», «0 sonhador ue compreende o sonho», os actores ea «Presenga de Fundo» —todas interco- ‘municando ¢ simbolizando a experigncia numa narrativa que ira «organizar Uunificar a informagio apresentada aos sentidos» (p. 24). Nio é dificil a um obseevador atento ver a prova dos processos inconscien- ¥es noutras pessoass mas é mais dificil compreender a realidad de que somos A Sunsananann Patcanatinca 57 Ihabitadose influenciacos por forgas que esto ora do nosso acesso ou controlo. Nara os muitos de nds que praticam a psicanslise, fo; um acidente da nossa vida intima ou terapia pessoal que cristalizou um crescente sentido de reverén- ‘is que transformou a nossa apreciagio da motivacio inconsciente, de dedu- io intelectual em convicgdo visceral. Muitos terapeutas recordam (com memé- ‘as fotogesficas como aquelas com que as pessoas conseguem recordar onde esiavam quando souberam de um avido a chocar com o World Trade Center) ‘momento em que um puro sentimento de espanto varreu os protestos da sua vaidacle, Para mim, foi quando percebi que uma figura pablica com quem vstava estranhamente hipnotizada, tinha o mesmo diminutivo que meu pai. Vara tuma colega minha, foi quando sonhow com um «Thomas Malthus» na altura da terapia em que estava a fazer o luto do facto de, na sua familia, unor fazer parte de uma «economia de escassez». Fla nao tinha 0 conheci- mento consciente de que Malthus era um economista que realgara a natureza limitada dos recursos, e ficou de boca aberta pelo facto de ter registado algue res, inconscientemente, esa informagio. Para outro amigo, foi quando deseo- briu que a sua depressio tinha comecado a 30 anos exactos do dia da morte do pai, uma data que nao sabia que conhecia.. A curiosidade sobre a forma como os pensamentos, sentimentos, imagens & anseios inconscientes de qualquer individuo funcionam juntos & 0 motor do compromisso do terapeuta ¢ 0 baluarte da coragem do doente para se auto- ‘examinar e auto-revelar cada vez. mais. A suposigio de que, na nossa qualidade de terapentas, nao sabemos o que iremos aprender sobre um doente, é, simul- taneamente, realista e curativa. A analogia que se ouve muito para o papel do analista (um papel que afirma autoridade relativamente ao processo mas incer- teza quanto ao conteticlo) €a do batedor ou guia. Quando crazamos uma selva dlesconhecida, precisamos de estar com alguém que saiba atravessar aquele terreno sem correr perigo nem andar em circulos. Mas o guia nao sabe onde & que as duas partes sairio desse lugar selvagem: apenas possui os meios para tornar a viagem segura. Embora haja resmas de literatura sobre a dinémica que costuma acompanhar os varios sintomas, ou tipos de personalidade, um clinico psicodinamico sério escuta cada doente com uma abertura que permite a desconfirmacio dessas construgées. que Freud chamou «atengao unifor- memente flutuante>, © que Bion e, mais tarde, Ogden, chamou «réverion, ‘que Casement chama «unfocused listening», € talvez o sine qua non da atitu- de analitica: a receptividade a tudo o que se apresenta e a curiosidade sobre as, intimeras coisas que isso podera representar. Cea essa depute aes coat, ito, Esta intrinsecamente conectado como reino sobrenatural, 0 lugar do es coma humildade, o reconhecimento de que os seres humanos slo, na observa~ iio de Mark Twain, «a cagadela de mosca do universo», que cada um de nés € impelido por incontaveis forgas externas & nossa consciéncia e controlo. 58 Pacoreran Pacawattrica A reveréneia implica a disposigdo para nos semtirmos muito pequenos na pre senga do grandioso e incognoscivel. Esta receptiva e aberta 4 comogio. Di testemunho, Nao podia ser mais diferente da tendéncia mental instrumental e utilitéria do solucionador de problemas técnicos, ou do optimismo pragmé- tico e aberto aos desafios do homem que acredita estar na posse total da sua vida. Nao é anticientifica, mas define a actividade cientifica de forma muito mais alargada do que o positivismo légico, que subdivide os problemas com= plexos noutros pequenos ¢ simples de forma a que seja facil operacionalizar os conceitos ¢ controlar as varidveis, A reveréncia permite que a nossa experién- ‘nos surpreenda; convida cada cliente a fazer uma nova marca na alma e na psique do terapeuta. Complexidade Os pensadores analiticos consideram inevitével o conflito inteapsiquico ou a multiplicidade de atitudes. A maioria de ns pode encontrar em si desejos de ser, a0 mesmo tempo, novo ¢ velho, masculino e feminino, em controlo e sob 08 cuidados de alguém, e assim por diante. As nossas adaptacdes aos limites realistas sio ieredutivelmente ambivalentes. O animal humano era considerado por Freud como insaciavel, sempre anelante, nunca completamente satisfeito ~ em parte porque € frequente os seres humanos quererem coisas mutuamente exclusivas ao mesmo tempo. Os analistas pos-freudianos que consideram os individuos menos influenciados pelas pulsdes e mais motivados pela necessi- dade de relacdo, falam ainda do paradoxo, ambiguidade, dialéctica, miltiplos estados do self e da natureza multifacetada da vida ¢ dos seus desafios (por exemplo, Eigen, 2001; Grorstein, 2000; I. Hoffman, 1998). Eles consideram suspeito quase todo o tipo de reducionismo. Um comentario do género: «Ela 86 esta a fazer isso para chamar a atengao nao seria uma observacao do report6rio de um psicanalista (pelo menos com 0 «s6»). Em 1937, o psicanalista/fisico Robert Waelder trabalhou dois termos que Freud mencionara, mais ou menos de passagem, os conceitos de «sobredeterm nagdo» e «funcio miltipla». Reconhecida, a comunidade analitica adoptou- 0s como forma de descrever algo que os clinicos observavam ha muito «Sobredeterminagéo» refere-se a observagao de que problemas ou tendéncias psicol6gicas significativas tém mais de uma causa; na verdade, a maioria tom ‘uma etiologia complexa. E caracteristico que um sintoma suficientemente impor- tante para desencadeara ida a um terapeuta tenha resultado de muitas influén- cias diferentes e interactivas, incluindo factores como a constituigdo, organi- zagi0 emocional, histéria do desenvolvimento, contexto social ilentificacdes, contingéncias de reforgo, valores pessoais e actuais stresses de cada um, «Fungo miltiplay refere-se ao facto de qualquer tendéncia psicolégica significativa ASensimuinane Pacanarica $9 io inconsciente, por exemplo, reduzir a ansiedade, Festanrar a auto-estima, exprimir uma atitude que é mal vista na familia, evi- {ur tentagio ou comunicar alguma coisa aos outros. Assim, uma muther que se corna anoréetica pode ter desenvolvido esse pro~ Hnlema por causa da interacezo das seguintes contribuigdes: 1) antecedentes de sobreinvestimento parental na sua alimentagio; 2) histéria de abuso sexual; 1) una recente perda ou desapontamentos 4} um desafio de desenvolvimento ‘eccie; 5) uma associagao inconsciente do aumento de peso com a graviders 6) historia de ter sido humilhada por causa da sua fome ou necessidade de ro emocional; 7) sentimento de ter sido negligenciada pela familia; 8) expe- in de ser alvo de admiragao por ter perdido pesos ¢ 9) exposigao repetida jens muito valorizadas mas irrealistas de corpos femininos. A anorexia pode realizar-lhe, inconscientemente, os seguintes objectivos: 1) conseguir con- irolo sobre si e 0s outros, a despeito dos esforgos dos outros para a controla- tem; 2} reduzir o seu poder de atraceio para possiveis molestadores; 3) expri- mir dor; 4} manter uma sensagdo de ser pré aululta; 5) ter a certeza de que nao esté gravida; 6) evitar criticas & sua auto- ‘complacéncia; 7) obter a atengao da familia; 8) colher elogios ¢ 9) submeter-se 2s expectativas culturais de beleza. A maioria dos analistas diria que € uma lista curta para algo tio complexo como a anorexia, que pode reflectir muitas ‘outras influéncias e desempenhar igualmente muitas outras fungdes. Por exem- plo, parece haver agora subculturas (moda, danga}, em que o comportamento anoréctico é normativo e continuamente reforcado. Quando eu era pré-graduada, um dos meus professores era um erudito cicatista social hiingaro chamado George Lanyi. Sabia-se entre os alunos, que, para ter boa nota com o Professor Lanyi, era imprudente sugerir explicagoes unifactoriais para acontecimentos politicos internacionais. Tinha que se estudar atentamente 0s paises em causa e mencionar coisas como as respectivas situa- bes econémicas, as crengas religiosas dos seus cidadios, as suas aliangas e tivalidades historicas, a personalidade dos seus lideres, as agendas domésticas das suas diferentes facgdes internas, as suas teorias sobre as maiores amea- as sua estabilidade, a suas herancas ideolégicas, os seus niveis de desenvol- vimento, o seu sentido de missio nacional, os seus componentes étnicos, os caprichos do seu clima, etc. Nos pontos escritos de politica internacional, era sempre bom introduzie uma linha no sentido de que nenhum factor singular podia explicar algo importante na politica mundial. Um amigo meu referia-se crenga orientadora sobre a complexidade das coisas como a «bola de Lanyi» Ele estava a opé-la 4 navalha de Occam, o esforgo de dara todos os fendmenos a explicagao mais simples possivel. a (Os psicdlogos ¢ os investigadores médicos realizam investigagdes empiricas 60 Pacornana Putcanattien rea verdade (ef, Wilson, 1995), Tanto a navalha dle Oceam como © bola de Lanyi» sio fiegdes, formas de afirmar a preferéncia por eeorias simplificadas ou elaboradas da causagio. Na tendéncia dos terapeutas psica- naliticos para preferir explicagdes complexas ¢ intrincadas as simples, vemos expressa a sua experiéneia clinica mas, também, um temperamento que 0s fez tendler para um tipo de trabalho profundo e emocionalmente complicado. E.certo ‘que podemos vir a perceber que alguns fendmenos psicoldgicos tém causas singulares mas, enquanto isso nao acontece, o preconceito psicanalitico assume a complexidade. Identificagdo e empatia Faz parte da tendéncia mental da psicanélise encarar uma perturbagio no funcionamento de um individuo como expressando uma versio extrema ou actualmente desadaptada de uma tendéncia humana universal. A convicyao de Harry Stack Sullivan de que «somos todos mais humanos do que outra coisa» (1947, p. 16) impregna o pensamento psicanalitico. Com esta hipotese, os analistas partilham um viés com os terapeutas humanistas, experien centrados no cliente. Nao que aqueles de entre nés que exercem a psicodinémica no sejam individuos bem capazes de sentir uma superioridade defensiva em relagio a outros, que podemos objectificar com os nossos diagnésticos e impli- citamente desvalorizar no nosso zelo de nos distanciarmos das suas dindmicas problematicass a minha questio é que as teorias analiticas salientam sempre ‘em nés as vias de desenvolvimento, as vulnerabilidades e as lutas comuns a todos os humanos. A exigéncia dos institutos analiticos de que os candidatos se submetam, cles préprios, & psicandlise (assunto de que falarei mais no pré- ‘ximo capitulo) tinha, entre outros objectivos, a intengo de aumentar as capa- idades do terapeuta para se identificar com os esforgos dos doentes, a0 encon- trar problemas compariveis dentro de si. Ha, nos analistas, um viés contra a categorizagio dos «problemas de vida» dos humanos (Szasz, 1961] como «perturbagdes> categoriais independentes da compreensio das fungdes que desempenham num individuo psicolo- ‘gicamente complexo, Tal como ja desenvolvi noutra oportunidade (McWilliams, 1998), o psicodiagndstico agora praticado pelos terapeutas psicodinAmicas & holistico, contextual e dimensional. F raro que problemas aparentemente dis- ceretos possam ser bem compreendidos isolados da pessoa em quem exis (Na minha experiéncia, doentes com uma perturbagao do Eixo I «no co-més bida» tém de ser de outro planeta.) Aparece uma expressio articulada desta atitude analitica bisica no artigo de Roughton (2001) sobre a evolugio, durante quatro décadas, do seu entendimento da orientagio sexual enquanto ‘uma dimensio de funcionamento humano independente da satide ou doenga A Sunstmuinane Psicanatenica 6 nental, Ao diseutir actividades sexuais especificas, observa que «Como em da a avaliagio psicanalitica, é a estructura psiquica subjacente ¢ a motivagio (0 significado ~ nao a superficial semelhanga de comportamento ~ que con- Lume (p. 1206). Kmbora as terapias analiticas tomem em conta, a partic de Freud, as pre- Llisposigies genéticas, quimicas e neurolégicas para psicopatologias graves, clas também procuram os stresses (os da histéria ¢ 03 actuais) que podem fazer ‘com que essas tendéncias surjam com violéncia, como problemas. Ha um con- ‘oso implicito na comunidade analitica de que, nas mesmas circunstancias onstitucionais ¢ situacionais que afectam o doente, o ferapeuta ter-se-ia tornado iystalmente sintomético. Por temperamento e formago, 0s clinicos psicodinami- ‘cos que tentam compreender 0 esquizofrénico com alucinagées, o auromutilador loterminado, a anoréetica que morre de fome até o psicopata sidico ~ pres- tam atengio as partes psicdticas, borderline, obcecadas pelo corpo e sadicas cles préprios. Também esperam que, quando trabalham com alguém que lida com um aspecto dificil da personalidade, haja uma activacio dos seus pré- pros problemas semelhantes. Esta tendéncia para se identificar com os clien- tes e procurar nessa identificagio sentimentos cada vez mais profundos de ‘mpatia contrasta com a responsabilidade sentida pelos psiquiatras e os psicé- logos académicos com uma orientagao mais biolégica em assumir uma posi- ‘io mais distanciada em relacao s pessoas ¢ aos problemas, No entanto, cla é Compativel com uma atitude de acolhimento que tende a caracterizar as pro- fissGes de trabalho social clinico e de aconselhamento pastoral. Freud dew 0 mote. Embora seja certo que desdenhava quem nao se interes- sava por conhecer-se melhor (incluindo os americanos, enquanto colectivo, que ele considerava ingénuos, emocionalmente superticiais ~sabe-se que cle se referia aos EUA como «Dollarland>|, ele alargava a sua empatia a alguns gru- pos que constituiam objectos de identificagao altamente improvaveis para as pessoas do seu tempo, classe ¢ profissio. Quando muitos outros médicos ape- lidavam de ficeis simuladoras as mulheres com perturbacdes de conversio ¢ somatizagio, Freud tomouras a sério ¢ tentou compreendé-las. A sua famosa carta de 1935 & mae de um homossexual (citada em F. Jones, 1957, p. 195), em que insistia que a homossexualidade «no é nenhuma vergonha, nem vicio, nem degradagio, ela nfo pode ser classificada como docnca», foi certamente impressionante na sua recusa a consignar os homossexuais a uma categoria ‘menor da humanidade (ainda que também, e infelizmente para a posteridade, cle considerasse a homossexualidade como uma «paragem no desenvolvimento sexual»). E, embora os ouvidos contemporaneos considerem perturbadora- mente racistas as referéncias de Freud aos «selvagens», a sua principal mensa- gem foi a de que as pessoas das sociedades civilizadas tém mais em comum com aquelas que tipicamente rejeitam como «primitivas» do que alguém jamais imaginou. 62. Paicorsnana Paicanantricn Num trabalho que teve muitissima influ fez 0 comes ia, Christopher Bollas (1987) io, agora famosor «para encontrar o doente, temos de © pro: ccurar dentro de nés préprios» (p. 202). A importancia fundamental da identi- ficagao ¢ da empatia vai para além de uma preferéncia conceptual e passa para ‘a questio da eficécia. O principal «instramento» de que dispomos nos nossos csforgos para compreender quem nos vem pedir ajuda é a empatia e o princi- pal «sistema de entrega» dessa empatia éa nossa pessoa. Sejam quais forem os beneficios dos aspectos mais intclectuais da nossa compreensio (as nossas teo- ria, investigagdes € relatos clinicos), a nossa capacidade le «agarrar» o doente (ou, mais precisamente, de nos aproximarmos de uma compreensio que mutt ca poder chegar & plenitude nem & precisio completa), e de lhe transmitir o nosso entendimento de forma itil, reside sobretudo nas nossas capacidades intuitivas ¢ emocionais. Uma das fontes habituais de prazer {mas também de fadiga) no trabalho psicodinémico & a necessidade de andar sempre para ts € para diante, tentando entrar na subjectividade do doente e, depois, tentando sair e reflectir sobre a experiéncia de imersio. Se sentem que os terapeutas Acertam mas ndo slo empaticos, 05 clientes engolem a pflula terapéutica com tuma dose sufocante de vergonha, um afecto que mais evoca obediéneia, estado de oposicdo ou paralisia, do que receptividade ¢ maturagdo emocional, Os clientes que sentem que os terapcutas esto enganados, mas a tentar identifi- car-se, nao ficario envergonhados ¢ continuiaro 0 seu empenhamento no pro- cesso terapéutico, & medida que tentam fazer se entender. Subjectividade e sintonia com o afecto Intimamente relacionada com a identificagao e a empatia esta a suposigio de que a subjectividade, longe de ser inimiga da verdade, pode promover uma compreensio muito mais abrangente dos fenémenos psicoldgicos do que a objectividade, 56 por si. Nao se presume que um fisico teérico entre em empatia com as particulas da matéria (embora Finstein chegasse a dizer que estava simplesmente a tentar entender o plano de Deus, e muitas pessoas invulgarmente ctiativas se identifiquem mesmo com objectos inanimados), mas o psicotera- peuta pode utilizar uma subjectividade disciplinada para fazer inferéncias verificaveis sobre a psicologia da pessoa. Na verdade, alguns antares psicana- liticos (Kohut, 1959; Stolorow e Atwood, 1992} definiram a psicanalise como a ciéncia em que o principal modo de observagio é um exame empatico sus- tentado. Os perigos da subjectividade so bem conhecidos: podemos facilmente fazer dlistoredes para servir as nossas necessidades pessoais; todos temos algumas wuficiéncias devidas aos nossos antecedentes, suposiges ou limitagoes indi viduais; ndo conseguimos construir uma cigncia cumulativa sem uma garantia A Suntanipane Patcananinicn 63 tuna validade objectivas. Mas a objectividade também esti cheia de proble- ores que lutam pela objectividade tendem a ignorar a infor- tnngto que no possa ser operacionalizada, manipulada ou estudada em ensaios Jinicos aleat6riosstenclem a fragmentar os problemas complexos e inter-relacio- tniclos para os tornar susceptiveis de exame empitico; como se sabe, eles podem lor muita precisio mecodolégica sem terem qualquer interesse substantivo. Quanto mais eonhecemos sobre a comunicagio entre o bebé e quem dele cuida, nie o primeiro ano de vida, mais descobrimos que ha muitos processos icativos pré-verbais dificeis de observar, desceever e contabilizar. Mas snnts, Os invest mos. Ho Entre bebé e progenitor hi, ness primeiro ano, uma danga de comunicagio «cvebro-direto-aeérebro-dreito que & esencial para o desenvolvimento neural ‘eal ea obtengao de uma vinculagio segura, oletincia ao afectoeregulagio do ‘feta (Goldstein e Thaw, 2003). A experiéncia emocional eserutinada de um Ulinico disiplinado pode revelar muita coisa sobre o que o cliente esté a comu- bc pea iad testo fac ingugen corporal rom de vox Kernberg iz «que 08 doentestransmitem nos «canals I, I e If»: comunicagio ndo verbal ¢ Stcarlo comacransfeencial (Hellnge, van Layne Dalewily 2001), Or terapeutas analticosassumem a sua subjectividade, com as suas reacgées sub- isctvas, € aprendem imenso sobre o que 0 clientes estio a tenta dizer Hié alguns anos atts, um homem despertou a atengio dos neurologistas po eausa de um ferimento que lesionara 0 lobo frontal de um modo tal que hiio sentia emogdes, Do ponto de vista fsioldgico, podia ser 0 protétipo do hhomem racional» tio idealizado pelos fil6sofos do lluminismo © muitos investigadores contemporineos ~ um verdadeiro Data ou Mr. Spock (da tiltima ¢-da primeira série de Star Tre, respectivamente). Todas as suas tomadas de esis eram ditadas pela raz30 ea lgica, endo por processosafecivos como simpatia, emocio e intuigio, Mas o impressionante nas decisdes deste homem é que eram muitas vezes bizarrase, outras, flagrantemente autodestrutivas. Sem ‘emocionalidade, ele parecia desprovide da capacidade de compreender todo 0 significado das suas decisées. Em vez de estar gloriosamente liberto dos contaminantes primitivos que alegadamente corrompem a capacidade de aj zat el ficara incapacitado pela auséncia das sensibilidades que possibilitam um bom seinen, se home tka so ui depos da so, efor mou-se dos tribunais porque compreendeu que, para administrar a Justca, tom ds sen enpas dwn compoecnado pls dacraos motives dos ham nos. A sua dificil situagdo faz lembrar a sabedoria de Platdo, que considerava 4 razio humana como um cocheiro que, para avancar, no precisa apenas do cavalo beanco da vontade mas também do cavalo negro da paixao (ver Damésio, ; Sacks, 1995, pp. 244-296) ‘ See tua esiees sens eee Freud percebeu que ha uma dife- renga entre os insights intelectual e emocional Isto é, podemos «conhecer> 64 Psicovnanin Parcanactien ognitivamente uma coisa € no entanto nia compreennder de todo, Para muda, precisamos dle ponderar a nossa condi¢ao de uma forma visceral, por oposigio a cerebral, Esta descoberta foi repetidamente feita pelos terapeutas psicodina- icos, existencialistas ¢ humanistas que se seguiram a Freud (ver, por exem plo, Applebaum, 2000; Hammer, 1990; Maroda, 1999), E provavel que Drew ‘Westen (comunicacéo pessoal, 10 de Maio de 2002) tenha razio, que 4 medi- da que © movimento cognitive-comportamental amadurece, podemos esperar ‘que 0s seus clinicos comecem a chamar-se qualquer coisa como «cognitivo- -afectivo-comportamentais» porque lhes ser4 impossivel ignorar esses mes- ‘mos fendmenos. Ha qualquer coisa no que classificam sob 0 rétulo «afecto» que é um pré- -requisito da compreensio significativa e da mudanga genuina. A experiéncia sugere que a maioria das pessoas nao se separa, individualiza ou chega a uma aceitacio pacifica do passado sem atravessar um periodo em que sentem raiva, € até 6dio,& pessoa, familia, comunidade ou ideologia de cuja influéncia esta a sair. Todas as sociedacles conheciclas esperam um processo de luto arites que 0 enlutado retome o funcionamento normal. Os acontecimentos avassaladores cessam de ser trauméticos, wma vez que se possa dar vor ds reacgdes emocio- nais a eles. Os estudos empiticos da emogao (por exemplo, Pennbaker, 1997) confirmam o que geragées de clinicos observaram: que o afecto desempeaha tum papel determinante no processo de crescimento e mudanga. Sem a capaci dade de ponderagao subjectiva dos mundos emocionais dos seus doentes, os terapeutas perderiam uma enorme fatia de informagao ea sua eficacia ficaria sravemente comprometida Os clinicos, ao contrétio dos que consideram as questées da satide mental, a partir de uma distincia maior, no tém outro remédio senio lidar com 0 afecto: a dor ou hostitidade ou entusiasmo do doente podem inundar o espago entre duas pessoas em formas que vao muito para além das palavras. Os afec- tos so contagiosos; cles induzem muitas reacgées emocionais complexas em nds, Durante muito tempo na tradi¢io psicanalitica, os terapeutas tentaram submeter-se ao viés cientificista do século x1x de Freud, segundo 0 qual se podia manter a cabeca fria a despeito das tempestades emocionais dos doentes, tudo o que néo seja uma atitude médica salutar €suspeito e sugestivo de extrava incias emocionais que o analista ainda no elaborou, A partir do momento «em que os terapeutas passaram a trabalhar com doentes mais «dificeis», aban- dondmos esse ideal racionalista, Claro que temos de ponderar as implicages de uma explosio do doente e de restringir a tendéncia natural para agirmos os ‘Ross0s sentimentos ao fazé-lo, Claro que nos lembramos que é a0 doente endo a0 terapenta que se solicita que dé rédea larga aos sentimentos, dentro do gabinete. Tal como varios analistas comentaram nestes iiltimos anos, tenta- ‘mos ser 0 »no380 melhor self com os doentes, nao o self total. Os psicanalis- tas raramente subscreveram a filosofia popular de «lavar toda a roupa suja». ASonsimtspane Paicanartien 65 Mos prestamos mesmo ti 1 nossas reaegdes subjectivas As emo- ies dos nossos clientes e valorizamos © que aprendemos quando o fazemos. As emogoes e as tendéncias afectivas mostram-se muito mais importantes tlo que as pulses instintivas em que Freud inseriu as suas teorias abrangentes. Muitos pensadores contemporineos da psicanélise questionam as hipéteses de \nlintos primitivos e universais, e do, antes, énfase as organizacdes afectivas, Numerosos autores (por exemplo, Fosha, 2000; J. Greenberg, 1986; Hedges, 1965 Nathanson, 1996; Spezzano, 1993; Tomkins, 1962, 1963, 1991) fize- ‘es alargadas sobre a primazia do afecto, ¢ a investigagao sobre a ¢ quimica cerebral comega a tornar o funcionamento muito mais Compreensivel para nés, Entretanto, a imersio subjectiva (voluntria ou invo- Jintiria) dos terapeutas, tanto nas emocdes expressas como nas nao verbalizadas ‘Jos doentes, permanece uma das mais importantes fontes de informagao de «jue dispomos sobre 0 que «se passa» com alguém, a forma como ele ow ela ‘ sperieneia 6 que esta mal, o que pode ter acontecido para criar o problema e {jue processos emocionais serao necessatios para resolver a dificuldade. Eu conjecturaria ainda que parte do temperamento psicanalitico implica Juma atracgo pelos afectos intensos, ou a sua apreciagio ow incapacidade de imizar. Parece haver diferengas individuais acentuadas quanto pessoa procurar ou acother bem a experiéncia da emogao intensa ou preferie resist ‘ou reprimir as partes mais arrebatadas do self. Notei que os graduados da s que sto mais naturalmente atraidos pelas ideias psicanaliticas também s vezes imersos nas artes: poesia, misica, teatro, danga © outros (rios de poxlerosa emocionalidade. Uma das minhas alunas definiu-se como uma «clrogadieta do afecto». Também ha diferengas individuais 20 nivel lo controlo que cada um de nés julga ter nas emogoes. Alguns autores psica- ico, criativos¢ influentes, cescreveram as respectivas personalidades como csquiz6ides, uma predisposigao que inclui um sentimento de , sobre os esfor- ‘gos para descobrir «a verdades, cla forma como o erudito do Tluminismo que era Freud esperava fazer, Mas possamos ou nao encontrar a verdade sobre qual- quer assunto, podemos tentar falar com verdade sobre ele, ‘Tal como Edgar Levenson (1978, p. 16) observou, memoravelmente: «Talvez nao seja a verdade 1 que se chega mas a mancira de chegar & verdade que constitui a esséncia da terapia.» A tentativa de ser emocionalmente honesto é a fonte de tudo 0 que resulta da psicoterapia analitica, e o cultivar de um relacionamento em que € sivel uma aproximagio progressiva & honestidade emocional continna a ser a tarefa central do psicoterapeuta. Podemos falar deste processo em meté- foras psicolégicas do ego como a anélise das defesas, ou através de apelos psicologicos do self uma empatia correcta, ou em termos das ideas relacionais sobre a exploracio da subjectividade. Podemos ter como imagem de uma tera- pia bem sucedida o conceito de Freud de uma pessoa que dominou o recalea- ‘mento, ou a ideia de Jung de individuagao, ow a ideia de Bion de viver em O, ‘ou o conceito de Winnicott de verdadeiro self, ou 0 objectivo de Weiss © 10 Wconmata Patcanatencn Sampson de abandono das crengas patoldgicas, ou a idealizagio do pas-sim: hlico de Lacan. As diferentes ideologias psicanaliticas tém ideias diferentes conde localizar essa actividade clara e decisiva de reconhecimento, mas todos partilhamos 0 devotamento a procura conjunta do que parece ser verdade. E nesse esforgo que a comunidade psicanalitica investiu a sna fé. Comentarios finais Espero ter transmitido, nestes capftulos iniciais, o sentido nfo apenas da figura mas também do fundo do pensamento ¢ da praxis psicanaliticos. Tentei falar sobre valores, suposigdes, convicgdes, tendéncias temperamentais, viescs explicativos ¢ tendéncias emocionais que caracterizam a orientagao psicodina- mica da psicoterapia, Também sugeri algumas reflexdes sobre a razio de estes aspectos da tradigao serem muitas vezes pouco evidentes. Mas, principalmente, «defendi que o que distingue nas formas de trabalho psicanalitico nao & 0 conjunto de intervengdes técnicas mas o corpo de conhecimentos acurmulado pelos clini- ‘cos em artos de imersdo na escuta dos doentes, conhecimentos compreendidos de acordo com a tendéncia mental que descrevi. Nao é habitual os manuais cobrirem estes assuntos ¢, de quando em quando, a0 longo da escrita destes primeiros dois capitulos, imaginei as criticas, do interior e do exterior da tradigio psicanalitica, a dizer-me que eu fui para além dos dados ou fiz graves desvirtuagdes, ow inseri a minha propria sensibilidade numa disciplina de que tém uma visio muito diferente. $6 posso falar pelo que me parece verdade. Sempre gostei de tentar por em palavras as ideias que pessoas subscrevem mas poucas articularam, e, neste capitulo, esfor- ccei-me por 0 fazer em relagio as correntes submersas, muitas vezes silenciosas mas sempre poderosas ¢ apaixonadas, da tradicdo psicanali Estou profundamente convicta de que vale a pena encarecer as atitudes que discuti~curiosidade e reveréncia, respeito pela complexidade, tendéncia para uma identificagao empitica, valorizagto da subjectividade ¢ do afecto, encare~

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