You are on page 1of 23
12 TEORIAS PSICOMETRICAS DA PERSONALIDADE Luis F Garcia INTRODUGAO Pedro é um psicdlogo de reconhecido presti- gio. Como muitas vezes antes, nesta manha, Tecebe em seu consultério uma pessoa que de- seja solucionar determinados problemas de con- duta. E, como sempre faz, um de seus primei- ros objetivos é realizar uma correta avaliaco da personalidade do cliente que tem diante de si. Chegado a este ponto, as perguntas que Pedro faz para si mesmo sao as seguintes: Que tracos devo medir? Para qué? Quais sZio os mais importantes? Que instrumentos devo utilizar? Essas sio as mesmas perguntas que os psicélo- {gos se fazem ha mais de um século. E respon- der a elas tem sido 0 objetivo das diversas teo- rias psicométricas da personalidade. Mas é provavel que outro exemplo escla- reca melhor o leitor sobre qual é a finalidade das teorias psicométricas da personalidad. Po- nha-se no lugar de um especialista em ossos. Esse especialista recebe uma pessoa que sofre de uma dor constante nas costas. Suponha que essa pessoa sabe que stias dores so provocadas pela fratura de um osso, mas nfo sabe qual. Para ajudéa, o especialista deve saber quais so os ossos das costas, quais podem provocar essas dores e como localizé-los e avaliar seu estado. Pois bem, o trabalho do psicdlogo que realiza uma avaliagéio da personalidade é muito seme- Ihante. Ele precisa saber quais so os tragos que configuram nossa personalidade, com que tipo de condutas e de problemas eles esto associa- dos e, finalmente, como medi-los de maneira, adequada. Ou seja, deve conhecer um modelo (ou varios) de personalidade que lhe diga quais tracos é necessdrio medir, quais séo suas propriedades e caracteristicas e quais so os instrumentos validos e confidveis com que con- ta para realizar uma avaliaco precisa e util da personalidade. Como foi que os psicdlogos chegaram a responder a essas perguntas? A principal fer- ramenta utilizada tem sido a andlise fatorial. A mesma que se utiliza nos modelos da estrutu- ra da inteligéncia? Exatamente. As perguntas so as mesmas nas dreas da personalidade e da inteligéncia, e, portanto, a forma de respon- der a elas também é a mesma. Vamos tomar como exemplo a ferramenta mais utilizada para avaliar a personalidade: os questiondrios. Par- timos de enunciados que descrevem uma con- duta, ou uma forma de ser especifica: “Eu gos- to de ira festas”, “Eu gosto de conversar com as pessoas”, “Sou pontual”, “Fico nervoso com facilidade”, etc. £ intuitivo pensar que as pes- soas que gostam de conversar também gostam de ira festas ou a lugares onde haja muita gen- te. Encontramos quais so as condutas que es- to relacionadas, ou seja, quais so as que se cortelacionam e, portanto, compartilham algo. Esse algo que as condutas t&m em comum é 0 que chamaremos de fatores (ou tracos). Por 220 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COIS. exemplo, a tendéncia das pessoas muito socid- veis de serem, também, alegres seria explicada pelo fator comum denominado “extroversiio.” Voltando a outras perguntas que faziamos anteriormente, as pessoas que sdo extroverti- das, também sao pontuais? Sao tranqiiilas? Al- guns leitores vao responder que sim, e outros, que nao, provavelmente dependendo de como tenham sido as pessoas que tiverem encontra- do durante suas vidas. O que precisa ficar cla- ro & que a associaciio j4 nao é tao evidente e, portanto, intuitivamente, vamos dizer que n’io ha relagio entre a conduta de conversar com freqiiéncia, por exemplo, e a de ser uma pes- soa tranqiiila, que nao seja agitada, nervosa. A andlise fatorial ird indicar-nos se realmente existe uma associacao entre ambos os tipos de conduta. Se quisermos predizer se uma pessoa gostard de conversar ou de ir a festas, devere- mos utilizar 0 mesmo conceito e o mesmo ins- trumento, mas, se quisermos indagar também se essa pessoa serd calma, vamos ter de utili- zar outro trago e, por conseguinte, uma escala diferente. ESTRUTURA DO CAPITULO Voltemos ao nosso amigo Pedro. Se exis- tisse um modelo tinico da personalidade (e ape- nas um instrumento para medir seus tragos), as perguntas que ele se fazia no seu consultério encontrariam automaticamente respostas. Ele sequer seria consciente dessas perguntas ou res- postas: simplesmente agiria. Mas a realidade diferente. Existem muitas teorias sobre como e como se configura nossa personalidade. Uma das primeiras tarefas de um profissional con- siste em escolher uma (ou varias) e descartar outras. No decorrer deste capitulo, vamos ex- por os principais modelos, aqueles que tém sus- citado mais pesquisa e aplicagdes praticas e que, por isso, tém maior suporte empiico. O primei- ro deles, ao qual vamos dedicar uma secio es- pecial, serd 0 modelo dos “Cinco Grandes”. O fato de ser o primeiro e de explicé-lo separadz mente do restante nao é um acaso: atualmente esse é o modelo predominante. Na préxima parte, vamos explicar outros modelos que tiveram e tém um papel destaca- do na pesquisa sobre a personalidade huma- na. O leitor nao deve pensar que estes perde- ram toda sua vigéncia “atropelados” pelo mo- delo dos “Cinco Grandes”, Na verdade, ainda sdo os modelos de referéncia para muitos psi- célogos do mundo todo e geram uma conside- rével quantidade de conhecimentos sobre nos- so modo de ser. Além disso ~ ¢ este ser o tema de mais uma secdo - nao se trata de modelos excludentes. A préxima secao mostrara provas das intensas relagées entre as dimensées pro- postas pelas diferentes teorias. De fato, uma parte importante da pesquisa da personalidade tem se dirigido a detectar as relacdes e diver- géncias entre elas, com 0 objetivo de saber 0 que esta sendo medido quando se utiliza um instrumento determinado e de conhecer 0 que écomum e o que é diferente em cada modelo. A parte seguinte versard sobre a capaci- dade de predicao dos tragos de personalidade, ou seja, sobre sua utilidade em contextos pra- ticos. A posigéo desta parte, logo apés a expli- cacao dos modelos, da configuracio e das re- laces, tem uma razio de ser. Sem conhecer os elementos, nao podemos saber sua utilidade. Sem conhecer quais so 0s ossos das costas e como eles estiio relacionados, nao podemos sa- ber qual é 0 que estd provocando a dor e, por- tanto, sobre qual é preciso agir para curar essa dor ou evité-la no futuro. A tiltima segao estar dedicada as linhas futuras das teorias psicomé- tricas da personalidade. Antes de explicar os diferentes modelos, € necessario fazer uma mencio especial aos instruments de medico, ou seja, as ferramen- tas que sero utilizadas pelo profissional, Aquilo que ele tocar e analisara para responder as perguntas sobre alguém. Compreendendo seu papel fundamental na andlise cientifica da per- sonalidade, por que ndo dedicar a isso uma seco, inclusive um capitulo, a parte? A res- posta é clara: todas as partes tratam dos ins- trumentos de medio. E claro que cada mo- delo tem desenvolvido suas préprias medidas baseando-se no que considera ser os tracos basicos e as propriedades fundamentais da per- sonalidade humana. Portanto, falar de um modelo concreto significa falar do instrumen- to que este produziu para medir os tracos pro- postos. Da mesma maneira, defender a valida- de de diversos tragos envolve conhecer até que ponto seu instrumento de medida é util. 0 MODELO DOS “CINCO GRANDES” O modelo dos “Cinco Grandes” é o mode- lo dominante na atualidade, O que isso quer QUADRO 12.1 Descricéo dos “Cinco Grandes" INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS 221 dizer? Que se vocé quer avaliar os tragos basi- cos da personalidade, sem outras consideracbes, deveria medir os Cinco Grandes, Em que con- siste este modelo? Por que chegou a essa posi- cao dominante? Vamos responder a essas per- guntas nesta parte. Mas, antes de tudo, vamos dizer quais so esses cinco tracos de tempera- mento t4o importantes: neuroticismo (N), ex Neuroticismo ou Instabilidade/Estabilidade Emocional (N) ‘As pessoas com escore alto em Neurotcismo fendem @ hipersensiblidade emocional etém dficuldades para volar & norma- lidade opds experigncias emocionais fortes, Geralmente sGo ansiosas, preocupadas, com mudancas frequentes de humor @ depressbes. Tendem a sofrer de transtomos psicossométicos e apresentom reacées muito intensas a todo tipo de estimulos. © sujeitoesteveltende o responder a estimulos emocionais de maneio controlado e proporcionada. Retoma rapidamente «0 seu estado normal opés uma elevacéo emocional, Normalmente & equilbrado, calmo, controlado e despreocupado. Extroverstio (E) As pessoas extrovertidas sdo sociévels, gostam de lugares com muita gente, como festas lotadas. Geralmente tém muitos amigos, com 0s quais gostam de conversar o tempo todo. Gostom de situagées excitantes e de se ar brincadeiras e mudangas, sdo despreocupadas e ofimistas. Gostam de estar sempre ativas e fazendo coisas O introvertdo tipico é socialmente reservado. Mostra-se distante, exceto com seus amigos mais dente e desconfia dos impulsos sdbitos. Ndo gosta de diversées borulhentas e desfuta de uma vida ordenada, car, Também adoram imos. Costuma ser previ- Abertura @ Experiéncia (A) cexperimentor coisas novas e viajar. ‘As pessoas com alto nivel de abertura & experiéncia definem a si mesmas como lberais, critivas @ folerants. Tendam a ter fantasias e emocées e sentimentos “néo-ortodoxos". Saem do caminho demarcado pelos outros para abrir novas rtas. Sentem paixéo pelas manifestacSes arlisticas, Néo ficam incomodadas diante de idéias e volores novos. Adoram Pel contrrio, a pessoa com baixa abertura &experiéncia é essenciclmente conservadora e com marcoda tendéncia a seguir os, caminhos a demarcodos. Geralmente, também é mais reigioso. Custa a encontrar nova alterativas para enfrentar os proble- mos e ndo gosta de idéias que possom provocar mudangas profundes, especialmente se forem radia Cordialidade (C) A pessoa amavel ‘ogradévele cordial com os demais, preocupando-se com suas necessidodes e com seu bem-estr.Tende 4 ser confiante. Percebe e interpreta adequadamente tanto os préprias emocées quanto as dos outros. £ uma pessoa com ‘empatia, copaz de se sintonizar emocionolmente com os outros. No pélo oposto, teremos uma pessoa fria e egocéntrica. Néo se preocupa com o que possa acontecer com as pessoas ao seu redor nem com o mundo em ger. Trota-se de uma pessoa sem escripulos, copaz de manipular os demois para conseguir 0 aque deseja. Se for necessario,utlizaré métodos violentos, pos 6 incapar de perceber a dor que causa. Responsabilidade (R) respoita obrigacées pessoais ou socics. ‘As pessoas com escore alto em responsobilidade so metédicos e reflexivas. Pensam bastante nas coisas antes de tomar uma deciséo e gostam de ter tudo planejado. Respeitam as normas sociis e, em gera os obrigacées contraidas. Possuem forte sentido do dever. Em geral, 40 capazes de controlar seus impulsos com sucesso. Esta dimenséo da personalidade pode ser interpretada como o pélo oposto da impulsividade. Assim, uma pessoa pouco responsvel tem pouca capacidade de controlar seus impulss, é ireflexiva e incapaz de ser organizado. Em geral, néo 222 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COIS. troverstio (E), abertura A experiéncia (A), cor- dialidade (C) e responsabilidade (R). E como se caracterizam as pessoas segundo esses cinco tragos? O Quadro 12.1 descreve brevemente como so as pessoas com escores altos e baixos em cada um dos “Cinco Grandes”. E preciso levar em conta que as descri- Ges do Quadro 12.1 esto baseadas em ape- nas um traco; contudo, segundo o modelo dos Cinco Grandes, é preciso conhecer como é uma pessoa nos cinco tracos para obter um perfil suficiente e adequado da sua personalidade. Duas pessoas extrovertidas podem comportar- se de forma muito diferente dependendo de que, por exemplo, sejam altas ou baixas em responsabilidade. As duas adorariam ir a uma festa cheia de gente, mas, ¢ se essa festa acon- tece na noite anterior a uma prova ou a uma importante entrevista de trabalho? E mais pro- vavel que a pessoa responsdvel “controle” seu impulso e fique em casa descansando. Para pre- dizer a conduta com o maximo de garantias possiveis, devemos contemplar os cinco tracos. De uma perspectiva histérica, os primei- ros autores que formulam um modelo de ci co fatores claramente reconhecivel no atual s40 Tupes e Cristal (1961). Contudo, mesmo com notaveis excegdes (Norman, 1963), esse mo- delo foi relegado durante as décadas de 1960 ¢ 1970, ficando & margem da disputa entre as, teorias de Eysenck e Cattell pela supremacia da estrutura da personalidade. Somente no fi- nal dos anos de 1970 e, principalmente, na dé- cada de 1980, os Cinco Grandes passaram a ter um papel relevante nos debates sobre qual era o modelo que refletia as dimensées basicas da personalidade. No final da década de 1970, aanilise dos dados procedentes do Estudo Lon- gitudinal de Baltimore gerou um modelo inicial de trés fatores (neuroticismo, extroverséo ¢ abertura a experiéncia; Costa e McCrae, 1976), e, posteriormente, acrescentaram-se os fatores de cordialidade e responsabilidade. O NEO-PI foi o primeiro instrumento publicado por es- ses autores e ja inclufa as seis facetas de neuro- ticismo, extroverséo e abertura 4 experiéncia (NEO; ver Costa e McCrae, 1985 e McCrae e Costa, 1990, para uma explicagao das facetas), enquanto que apenas se tinha uma medida geral dos tracos cordialidade e responsabilida- de. As seis facetas desses tragos (ver Costa, McCrae e Dyi, 1991; Costa e McCrae, 1992b para uma explicagéio das facetas) foram incor- poradas na versao revisada: NEO-PI-R. Durante a primeira metade da década de 1990, o modelo dos Cinco Grandes foi impon- do-se progressivamente. Diversos artigos pu- blicados na revista Personality and Individual Differences, a0 longo de 1992, mostraram 0 debate que se dava em torno do tema. Nesses artigos, tanto Costa e McCrae (1992a) quanto Eysenck (1992a) expunham seus critérios para considerar um trago como dimensao bésica da personalidade humana e, portanto, defendiam seus proprios modelos. Por outro lado, nao foi apenas o trabalho de Costa ¢ McCrae que con- tribuiu para o fortalecimento do modelo dos Cinco Grandes: as contribuigdes de Lewis R. Goldberg (1990) e Oliver B John (1990) sobre a hipotese léxica também foram determinantes. Como quer que tenha sido, o fato € que atual- mente ha um considerdvel consenso em consi- derar 0 modelo dos Cinco Grandes como o mais apropriado para descrever a estrutura da per- sonalidade, sobretudo da personalidade adul- ta, do ponto de vista psicométrico (Matthews e Deary, 1998; Brody e Ehrlichman, 1998). © modelo dos Cinco Grandes parte do mesmo pressuposto que sustenta a abordagem léxica: “Todos os aspectos da personalidade humana que tém algum interesse, utilidade ou importancia esto registrados na linguagem natural” (Cattell, 1943). Os trabalhos de Allport (Allport e Odbert, 1936) iniciaram o desenvol- vimento dessa perspectiva com o objetivo de encontrar a estrutura mais parcimoniosa pos- sivel da personalidade a partir do material que proporcionam os termos utilizados na lingua- gem para descrever caracteristicas pessoais ou linguagem cumpriria o duplo objetivo de pro- porcionar um modelo da personalidade que fos- se exaustivo (abrangeria todas as dimenstes) itil (identificaria as dimensdes com validade pratica). Contudo, essa abordagem tem dois in- convenientes: é meramente descritiva e existem dimensdes da personalida- de que nao sao adequadamente re- presentadas na linguagem. Devido a sua origem, baseada na aborda- gem léxica, este tem sido qualificado como um modelo meramente descritivo, como uma taxo- nomia da personalidade humana. Apesar dis- so, nos tiltimos anos, tem atraido um conside- ravel corpo de pesquisadores que estudam as bases bioldgicas e cognitivas dos tragos de per- sonalidade. Também adquiriram relevancia suas hipéteses sobre as relagées entre tracos quantitativos e transtornos psicopatoldgicos e sobre sta validade preditiva em qualquer con- texto pratico (clinico, educacional, organiza- cional, etc.). Atualmente, o modelo dos Cinco Grandes pode ser considerado como uma teo- ria explicativa e preditiva da personalidade hu- mana e de suas relagdes com a conduta. Esse modelo apresenta diversas versdes, dependendo dos autores. Por exemplo, Goldberg: denomina intelecto o fator de abertura & expe- riéncia (Goldberg, 1990), enquanto Caprara, Barbaranelli, Borgogni e Perugini, (1993) fa- lam em afabilidade ou forca de vontade refe- tindo-se aos fatores de cordialidade e respon- sabilidade, respectivamente. Essas denomina- es diferentes também implicam alguns ma- tizes nas propriedades do traco. Mas a versio dos Cinco Grandes que desfruta de maior pree- minéncia é a proposta pelos dois autores nor- te-americanos que mais vém caracterizando- se por desenvolver e defender este modelo: Paul T. Costa e Robert R. McCrae, Em 1992, eles publicaram a versdo inglesa do instrumento mais utilizado em todo o mundo para avaliar ‘0s Cinco Grandes: 0 NEO-PI-R. O modelo que INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS. 223 vamos explicar nesta parte é 0 que tem servi- do de base para desenvolvé-lo. Tragos de temperamento e facetas: 0 NEO-PI-R Como jé comentamos, 0 modelo dos Cin- co Grandes postula cinco dimensées como tra- cos de temperamento da personalidade huma- na, Essas seriam as dimensées basicas, que descrevem as diferencas entre as pessoas e nos permitem explicar a conduta. Por sua vez, cada um dos cinco tragos divide-se em 6 facetas. E é desse modo que se organiza 0 NEO-PI-R (Cos- ta e McCrae, 1992b; ver Quadro 12.2). As facetas séio consideradas como tracos de temperamento? Nao constituem dimensdes basicas da personalidade humana? As facetas fazem parte da nossa estrutura da personal dade. Contudo, as dimensées fundamentais sao 98 cinco tragos principais e, por isso, eles sao denominados temperamentais: possuem uma clara base biolégica e so mais centrais para a explicacdo do nosso comportamento. Em con- traposico, a importancia das facetas é menor € elas nao sao consideradas elementos essen- ciais da nossa personalidade. Cada faceta representa um fator primé- rio do trago em questiio. Todas as facetas de cada trago esto relacionadas entre si. Assim, 0 modelo postula que existe uma tendéncia a que todas as pessoas altas em extroversdo se- Jam acolhedoras, gostem do contato com pes- soas, sejam assertivas, ativas, procurem sensa- 6es e sejam alegres. O mesmo raciocinio pode ser feito para os outros quatro tracos. Essa hi- potese pode ser comprovada empiricamente: se analisarmos conjuntamente as 30 facetas do QUADRO 12.2 Facetas do NEO-PI-R incluidas em cada traco Neuroticismo (N}) Extroverséo (E) Abertura (A) Cordialidade (C) Rosponsabilidade (R} 114 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. NEO-PLR, provavelmente encontraremos que cada faceta se agrupa em seu fator correspon- dente, descrevendo cinco fatores claramente identificdveis com as cinco dimensdes de tem- peramento da personalidade. Diversos estudos tém sido desenvolvidos para essa finalidade. A Tabela 12.1 mostra os resultados da andlise fatorial realizada sobre trés amostras indepen- dentes: a mostra normativa americana (Cos- ta e McCrae, 1992b; n=1.000), a amostra normativa espanhola (Costa e McCrae, 1999; n=2.000) e uma amostra independente de uni- itérios espanhsis (n=948 cada faceta se relaciona principalmente com seu proprio fator, Contudo, certos valores es- tranhos nao se ajustam ao esperado. Algumas facetas relacionam-se também com um trago de temperamento diferente. Trata-se de ano- malias ou tém algum sentido tedrico? Deve- mos rechacar a hipétese proposta baseados nesse padro estranho de resultados? Antes de sermos taxativos, podemos comprovar algumas dessas facetas e o fator em que parecem “des- viar-se”: agresso-hostilidade, em cordialida- de; impulsividade, em responsabilidade; sen- timentos e altruismo, em extroversio. Se ler- mos novamente os perfis desses trés tracos, essas altas correlagées fazem sentido? E razoa- ‘vel esperar que uma pessoa alta em agressio- hostilidade seja baixa em cordialidade? TABELA 12.1 Andlise fatorial do NEO-PI-R em trés amostras independentes (0s pesos inferiores a 0,30 foram omitidos) Amostra normativa Amostra normative Amostra universitérios ‘americana espanhola espanhois INS gee Ares Ce RAN a SEMA SCo OREN eben AO NI: Ansadode 02 082 0837 N2: Agresidode 0,636 0484 0,604 0.460 0,708 0437 Hostidode 3: Depressso 0.803 0796 ogi Né: Consrongimento 0,736 0761 0.589 NS: Impulsvdode 0491 0.45 -0317| 0521 0370 -og77| 0458, 0362 -0.434 'N6: Vulnerobilidede 0,697 0,384) 0,710 0,447 | 0,801 El: Aeolimento 0664 0375 0637 020 0756 £2: Gregarismo 0,661 0,621 0,730 £5: Asertvidode 9am 04a 0327 ogts|-o4e9 0398 = -aus.——|-o.gse 0.258 © -0.531 EA: Avidode 0543 ons 045 0595-0392 ES Buse de sensacSes 0578-088 0547 0,429 0300 0353 E Emogdes postivas ors om -0,319 0,695 A: Fontesia ee) 0590 osm 336, 22: Esti 0731 0.74 0724 23: Senimentos 0366 0,412 0.507 0.598 0,501 0466 0473 1M: Asbes 0563 0513 0.499 15: dios 0783 0692 0789 1M: Voces 0489 0599 oie Cl: Confango 0352 0554 0.542 09380448 C2: Retidao 0,680 0,672 0,656 C3: Altruismo 0,522 0,551 0,416 0,585 0,474 0,492 C4: Complascéncio: 0,767 0,703 0,748 C5: Modésta 0.59% 0,664 0,420 C6: Sensibilidade 0617 0,569 0,441 RI: Competéncia 0,407 0,648 |-0,360 0,704 }-0,387 0,676 R2: Ordem 0,701 0,755 0,612 R3: Cumprimento do dever 0,680 0,317 0,714 0,694 A: Esforco por realizacées 0,742 0311 0,738 0.778 RS: Autodisciplina 0,333 0,746 |-0,317 0,751 0,827 Rb: Deliboracéo 0573 0,465 0,382. 0,632 Se a correlacio entre as facetas fosse 1, nao seria necessdrio medi-las. Ou seja, se uma pessoa obtivesse 0 mesmo escore em extrover- so que em cada uma das 6 facetas, para que deveriamos aplicar mais itens? Se as facetas foram inclufdas no modelo é porque proporcio- nam informacao detalhada que nao esta refle- tida no traco temperamental. Flas nos permi- tem matizd-lo. Por exemplo, se observamos duas pessoas altas em extroversdo, podemos encontrar que enquanto uma delas é muito assertiva, a outra nfo é, ou que a segunda é muito alegre enquanto a primeira é menos ri- sonha. Essa informacao seria perdida se me- dissemos somente seu nivel de extroversao e pode ser extremamente titil em nosso trabalho Por que o predominio? A replicabilidade do modelo dos “Cinco Grandes” A tazo principal da atual predominan- cia do modelo é sua replicabilidade. Foram ob- tidas solug6es de cinco fatores independente- mente do pafs (McCrae e Costa, 1997), dos ins- trumentos de medicio utilizados (Cattell, e Cattell, 1995) e da pessoa que é avaliada (Goldberg, 1992). Os trés tipos de evidéncia representam um critério de validacio nao sé do modelo dos Cinco Grandes, mas também, dos tragos de personalidade em geral, pois: ee De qualquer populacdo/cultura/ pais/linguagem a que se aplique 0 mesmo instrumento serio extraidos os mesmos tracos de personalidade (McCrae e Costa, 1997). Isso nao quer dizer que os fatores encontra- dos siio exatamente iguais, ou que no existem mudancas nos niveis médios, mas indica que, indepen- dentemente das caracteristicas so- cioculturais, so extraidos cinco tra- INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIIDUAIS. 225 os de personalidade que guardam razoavel pensar que, se aplicarmos um instrumento que nio foi gerado a partir do modelo dos Cinco Gran- des, ndo poderemos extrair os ditos fatores. Portanto, é necessdrio ana- lisar fatorialmente questiondrios ela- borados a partir de modelos diferen- tes para comprovar se é possivel obter os cinco grandes. Quando se realizaram essas andlises sobre um grande mimero de questiondrios de personalidade (por exemplo, 16PF, MMPI, MPQ, Myers-Briggs Type Inventory, ete.), a estrutura mais re- produzida tem sido a dos Cinco Grandes (Matthews e Deary 1 jutra possivel critica aos modelos da personalidade é que refletem so- mente dimensées psicolégicas que esto na mente das pessoas que res- pondem. Se fosse assim, quando analisadas fatorialmente as heteroa- valiagées (questiondrios formulados em terceira pessoa para responder segundo nossa percepcao do com- portamento de alguém), nao encon- trariamos os mesmos fatores. Em es- séncia, o que se afirma é que as di- mens6es extraidas seriam totalmen- te diferentes, pois dependeriam da pessoa em particular que respondes- se ao questiondrio, Contudo, os re- sultados empiricos indicam que as estruturas fatoriais so as mesmas, independentemente da pessoa que preenche o questionario (por exem- plo, Goldberg, 1992). Além disso, as correlagées entre as escalas obtidas por meio de questiondrios auto-apli- cados e heteroavaliagdes so sem- pre altas e significativas (por exem- plo, Costa e McCrae, 1988). 126 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. OUTRAS TEORIAS PSICOMETRICAS DA PERSONALIDADE Modelo de Cattell Raymond B. Cattell foi um dos psicdlo- gos que mais esforcos dedicou A andllise cienti- fica da personalidade humana. A pesquisa rea- lizada por ele, ou seu modelo tedrico, abrange todas as reas fundamentais de estudo e todos 05 contextos profissionais em que se desenvol- ve 0 psicdlogo. De fato, um dos questiondrios mais uti inica e selecao de pessoal tem sido li oe, Eber e Tatsuoka, 1970) e suas posteriores versées. Como chegou Cattell a seus 16 fatores pri- mérios? Cattell parte da abordagem léxica do trabalho empirico inicial desenvolvido por Allport e Odbert (1936). Seu objetivo sio os fatores comuns que existem nas expressées Nos termos lingiiisticos que utilizamos ao refe- rir-nos a nés mesmos e aos demais. Para isso, baseia-se nao s6 em questionérios auto-aplica- dos, mas tambéin em heteroavaliagées. Cattell depurou uma base de dados inicial que co1 tinha milhares de termos da linguagem, até car com um ntimero determinado de fatores. Contudo, a teoria de Cattell possui duas carac- teristicas que ajudam sua configuracdo como um corpo tedtico sélido, em vez de como uma mera taxonomia baseada na linguagem: 1. A utilizagiio cruzada de trés tipos de dados na avatiagaéo da personalida- de: dados L (de vida [Life], dados Q (questiondrios [Questionnaires}) ¢ dados T (provas objetivas [Test]). A informagio conjunta, procedente dos trés tipos de dados, é que deve ser utilizada, Também defende o trata- mento matematico dos dados obti- dos através de técnicas quantitativas rigorosas, contrapondo-se a uma ana- QUADRO 12.3 Relacdes dos fatores primédrios com os fatores de segunda ordem do modelo de Cattell Fatores primérios Fatores de segunda ordem Ansiedade | Exio/invia Independencia | Cortetia (Dureza) | Autocontrole A |Afobilidade) x WX B (Raciociio) Sexto fotor (inteligéncia) C (Estabilidade) Ox E (Dominéncia) F (Entusiasmo) x WX G (Atencio &s normas) H (Atrevimento) x | ensibilidade) bx L [Desconfianga} x M [Abstracéo) x N (Privacidade) © (Apreensdo) x Ql (Receptividade a mudancas) 2 (Néo-adesdo o grupo) Q3 (Perfeccionisme) Q4 (Tenséo} x (2 (ates), 03 (isin) « 04 (ent). {Na Besos moms os tes que crt oa mana do 16 Fda Eto Caso: (apnsdos, Bien C(etbidod ema, abereg), Flpeoapors), 6 (cocci), H (deen, | (baru, (aan), Magia), (eqs), 0 apenin, obo nes agi, lise qualitativa da personalidade ba- seada em julgamentos subjetivos. 2. A teoria da personalidade de Cattell inclui elementos diferentes dos tragos de temperamento. Assim, Cattell co- loca especial énfase nos estados de Animo e nos tracos de motivacio ou impulsos. Também inclui as capaci- dades cognitivas (isto é, a inteligén- cia) como elemento da sua teoria sobre a personalidade. Todos esses elementos sao considerados em sua teoria da aprendizagem estruturada (Cattell, 1987), segundo a qual o rendimento de uma pessoa iem uma determinada situagao j seria expli- cado nao sé por seus tracos de tem- peramento, mas também por seu es- tado no momento da execugio, por sua motivagio e, evidentemente, por suas capacidades cognitivas. A con- tribuicdo de cada elemento pode ser quantificada por meio de coeficien- tes numéricos. Cattell propde 16 fatores primarios bési- cos, dos quais sao extraidos 6 fatores de se- gunda ordem. Os X do Quadro 12.3 orientam sobre as relagées entre os fatores primérios e 08 tragos de personalidade extraidos a partir deles, Um sinal negativo entre parénteses in- dica que a relago é negativa. Nao sfio mostra- dos valores numéricos uma vez que os X foram marcados considerando varios estudos (Cattell e Brennan, 1994; Conn e Rieke, 1994; Aluja e Blanch; 2003). Observe que o fator primério B (aciocinio) nao se relaciona com nenhum fa- tor de personalidade e identifica, por si mes- mo, 0 sexto fator. Mesmo que a énfase esteja nos fatores de segunda ordem, Cattell defende 0 uso dos fatores primérios na prética didria, visto que proporcionam informagao valiosa so- bre a personalidade do individuo. Modelo dos trés “superfatores” de Eysenck Hans Jurgen Eysenck é, provavelmente, © psicdlogo cientifico mais importante da his- t6ria ndo s6 por suas contribuicées no terreno INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENGAS INDIIDUAIS. 227 da personalidade, mas também por suas con- tribuigdes em todos os campos da psicologia cientifica, especialmente naquelas dreas rela- cionadas ao estudo das diferengas individuais. Diferente dos dois modelos apresentados anteriormente, a teoria proposta por Eysenck (como também os modelos que apresentare- mos a seguir), nao tem a linguagem como pon- to de partida. © modelo de Eysenck caracteri- como um trago de temperamento basico se nao dispde de uma base biolégica contrastada por meio de estudos correlacionais e experimen- tais. Essa énfase na validaciio experimental das proptiedades dos tracos temperamentais fazdo modelo de Eysenck uma verdadeira teoria da personalidade. Eysenck iniciou suas pesquisas analisan- do fatorialmente dados provenientes da histé- ria clinica de pacientes internados em hospi- tais psiquidtricos britanicos. Extraiu dois fato- res: extroversdo e neuroticismo (ver Eysenck e Eysenck, 1985). Esses resultados marcariam as duas dimensdes da personalidade as quais Eysenck dedicaria grande parte de seu traba- lho cientifico. A terceira dimensio, o psicoti- cismo, foi incorporada ao modelo apés varios anos, com o objetivo de explicar as psicoses (¢ seus diversos graus) sobre a hipétese de uma dimens4o continua normal contraposta a uma explicacao baseada em um sistema de catego- rias psicopatolégicas (ver Eysenck, 1992b). As descrigdes dos perfis altos e baixos em extroversio e neuroticismo sao as mesmas que aparecem no Quadro 12.1. De fato, se mode- los postetiores, como o dos Cinco Grandes, in- corporam ambas as dimensdes, isso deve-se, em grande medida, & solidez empitica dos tra- balhos de Eysenck. No que diz respeito ao Psi- coticismo, uma pessoa que obtém um escore alto neste traco caracteriza-se por ser fria, cruel e insensivel com as demais. Também por ter maior probabilidade de responder de maneira agressiva e hostil, com certo desprezo pelo pe- rigo e pelas conseqiiéncias de seus atos. Tam- bém se caracteriza por ser impulsiva, é alguém a quem custa refrear seus apetites e desejos. Contrapostos a esse tipo de pessoas, aquelas TAB CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. com escore baixo neste trago sentem (¢ se im- portam com) as emocées prdprias e alheias. Mostram-se carinhosas e amdveis com os de- mais. Também controlam melhor seus proprios impulsos. Poder-se-ia dizer que é a dimensdo mais caracteristica do modelo de Eysenck, se bem que também é a que tem recebido maio- res criticas, tanto pela menor confiabilidade das suas medidas psicométricas quanto pelas limi tagdes da teoria bioldgica que sustenta esse trago. utilidade na pratica clinica e em contextos @s- Pecificos como 'o penitenciario,, Em resumo, Eysenck postula a existéncia de trés tracos basic temperamento, que formam seu modelo [BEN (psicoticismo, extro- verso e neuroticismo). Apesar de também ter desenvolvido um conjunto de fatores primarios (facetas) para cada trago, Eysenck nao pres- tou a eles muita atencdo, por dois motivos: 1. considerava que as facetas nao acres- centavam suficiente poder preditivo a0 escore do traco geral; 2. seu objetivo era desenvolver um pa- radigma cientifico do estudo da per- sonalidade. Essa tarefa somente poderia ser realiza- da trabalhando com dimensées com sentido psicol6gico, relevantes para explicar a condu- ta humana, que tivessem medidas confidveis sobre cujas propriedades fosse possivel elabo- rar teorias contrastaveis. As facetas nao cum- priam esses requisitos, como acontecia com os trés superfatores, ‘Uma das caracteristicas fundamentais do modelo PEN é a independéncia (ortogonalida- de) dos trés superfatores: O que isso quer di- zer? Que se o escore de uma pessoa em neuro- ticismo é conhecido, isso nao diz nada sobre seu grau de extroversio ou sobre seu nivel de psicoticismo. Uma pessoa alta em neuroticismo podera ser alta/média/baixa em extroversio e psicoticismo. Essa propriedade é fundamental, visto que, para descrever a personalidade de alguém, precisamos de seus escores nos trés tragos. Naturalmente, cada traco esta associ do de modo diferente aos fendmenos psicolé- gicos que visa a explicar. Se que se pretende 6 expor a probabilidade de que alguém sofra uma depressio, é fundamental conhecer seu escore em neuroticismo; se o que se quer é ptognosticar a “vitalidade” de alguém, o que se deve medir é o traco de extroversao. Mas, se a decisio é explorar a conduta violenta, de desprezo pelos demais, sem diivida o psicoticis- mo vai permitir uma aproximagao cientifica a tais fendmenos. Os outros dois fatores podem proporcionar informacio ttil para a compreen- so desses fenémenos? A resposta é afirmati- va, mas néo com tanto poder explicativo como tem o traco principal. Relacionado com a ortogonalidade dos fatores, o modelo de temperamento de Eysenck estabelece quatro subtipos de personalidade (melancélico, colérico, fleumdtico e sangui- neo), inspirados na teoria hipocratica-galénica nos estudos de Wundt. A Figura 12.1 mostra em que quadrante est situado cada um dos subtipos em func&o das combinagdes dos tra- G0s extroversao e neuroticismo. Também mos- tra uma série de adjetivos que podem descre- ver cada subtipo. Essa classificagéo permite uma rpida descri¢o da pessoa, mas sempre é necessario considerar 0 nivel individual em cada trago: nfio é a mesma coisa falar de uma pessoa “sangiiinea” com um percentil 75 em extroversao que de outra com um percentil 99. Neste tiltimo caso, estado muito mais marca- das as caracteristicas préprias do subtipo “san- giiineo”. Da mesma maneira, também é neces- sario considerar o escore em psicoticismo. Por exemplo, as probabilidades de que uma pes- soa se comporte de forma violenta so eleva- das se pertence ao subtipo “‘colérico” e seria ainda mais provavel que viesse a desenvolver uma conduta violenta se apresenta um alto nivel de psicoticismo. Pelo contrério, uma pes- soa “colérica” com um escore baixo em “psico- ticismo” demorar4 muito mais para agredir os outros e causar-lhes dor: para elas, os objetos inanimados serio um alvo mais condizente com sua personalidade. Eysenck e seus colaboradores, entre os quais estava sua mulher, Sybil, desenvolveram toda uma série de escalas para avaliar os trés superfatores. Partindo das medidas construidas no Hospital Maudsley, durante a década de 1950 (MMQ e MPI), desenvolveu-se o Eysenck Asso Preocupado Triste Sério Pensativo MELANCOLICO Suscetvel INTROVERTIDO Razodvel Controlado Responsivel ‘ Tenaz FLEUMATICO Peer Sereno Personality Inventory (EPI; Eysenck e Eysenck, 1964) para avaliar extroversdo e neuroticismo. Com 0 objetivo de melhorar as escalas origi- nais e de incluir uma medida de psicoticismo, Eysenck elaborou, posteriormente, o Eysenck Personality Questionnaire (EPQ; Eysenck e Eysenck, 1975). A versio revisada desse ques- tiondrio (EPQ-R) também inclui uma medida de desejabilidade social (escala L (Lie]). Es- cores altos nesta tiltima escala questionariam avveracidade dos escores obtidos, especialmen- te se o individuo obtivesse algum escore no ‘Além dos instrumentos de avaliagio dos trés superfatores, Eysenck e seus colaborado- res desenvolveram diversas medidas de perso- nalidade. Destaca-se o IVE (Eysenck e Eysenck, 1991), que avalia impulsividade, temeridade (venturesomeness, em inglés) e empatia. Par- tindo dessas escalas, derivaram-se outras me- didas, como a “escala de adigao” ou a “escala de criminalidade”, construfdas a partir dos itens que discriminavam melhor os viciados dos nio- viciados e os que tinham sido condenados dos que no, respectivamente. INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUALS ny INSTAVEL tivo COLERICO Impaciente Histtiénico Egocéndtrico Excel EXTROVERTIDO Jogador Tolerate Socidel Despreocupado Esperangaso Negre SANGUINEO ESTAVEL FIGURA 12.1 Subtigos do modo d tamporamento de sack adoptdo de Eysencke Eysenck, 1985) Modelo de Gray Jeffrey Gray trabalha no Hospital Maudsley, de Londres, onde Eysenck desenvolveu a maior parte das suas pesquisas. Nio é de se estra- har, portanto, que o modelo de Gray se confi- gure como uma proposta alternativa ao mode- lo de Eysenck (Gray, 1981). Seguindo a mesma tradigio psicobio- logica e empirica, Gray desenvolveu principal- mente duas linhas de pesquisa: com ratos e com neurofarmacos (Gray, 1987). Os resulta- dos de ambas as linhas levaram-no a questio- nar o modelo de Eysenck, fundamentalmente em dois aspectos: ‘L. Gray sugere que os mecanismos bio- ldgicos da extroverstio e do neuroti- cismo t8m elementos comuns. ‘A manifestacdo dos tragos depende grandemente da natureza do esti- mulo: apetitivo ou aversivo. » Ambos os principios servem como base para a formulagao da sua teoria da persona- lidade. 130 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. Quando encontrou evidéncias de relacées em nivel biol6gico entre os tracos extroversio ¢ neuroticismo, Gray afirmou que nao podiam ser independentes, em nivel psicoméirico, e propés duas dimensdes (ansiedade e impulsi- vidade), resultado de rotar as originais de Eysenck em 45° (ver Figura 12.2). dimen- so'de ansiedade seria caracterizada por alta introversao + alto neuroticismo, enquanto a imn- pulsividade viria caracterizada por alta extro- «verso + alto neuroticismoy Observe que, em ambos os casos, valores altos nas duas dimen- sdes correspondem a valores altos na dimen- so neuroticismo. Nos tiltimos anos, Gray, colaboradores modificaram os valores ae wes, defendendo relagdes de 30° (Pickering, Corr e Gray, 1999). Assim, a Ansiedade estaria situada mais proxima do neuroticismo do que da introversdo, enquanto a impulsividade es- taria mais orientada para a dimensao de extroversao. No entanto, ainda se discute qual é 0 modelo mais apropriado, e a maior parte das pesquisas e aplicacdes dessa teoria parte de relagées angulares de 45°, como as mostra- das na Figura 12.2. Por essas razées, optamos por apresentar o modelo original. Gray propoe trés sistemas para explicar a conduta humana: BAS, BIS e o Sistema de Ata- que-Fugay-Vamos concentrar-nos nos dois pri- meiros, os sistemas BAS (da expresso inglesa Behavioral Activation System, ou sistema de Neurotcsmo Ansiedade Impulsividade Estabilidade emocional FIGURA 12.2 Rolagéo ongular dos dmensées proposas por Gray € 0s tragos de extroversao e neuroticismo de Eysenck. ativagio comportamental) e BIS (da expres- so inglesa Behavioral Inhibition System, ou sis- tema de inibicdo comportamental) e dizer que se relacionam com as dimensdes de impulsi- vidade e ansiedade, respectivamente. © primei- fo seria ativado por sinais de recompensa ou de auséncia de castigo, proporcionando 0 “im- pulso” para que tentemos atingir nosso objet vo. O segundo seria ativado diante de sinais de castigo ou de auséncia de recompensa (tam- bém perante estimulos novos, que produziriam uma resposta nao-condicionada de medg). A6 contrario do BAS, o BIS seria ativado para nos impedir de fazer alguma coisa, para que a evi- ‘temos. Ambos os sistemas funcionam conjun- tamente, e a predominancia de um sobre 0 outro, ou seja, 0 fato de que nos aproximemos (BAS predominante) ou que nos afastemos (BIS predominante) vai depender do nosso nivel nas dimensbes de impulsividade e ansiedade. Um exemplo pode ser esclarecedor para entender como funcionam ambos os sistemas. Vamos supor que vocé gosta de sorvete de cho- colate, Em uma tarde quente de verao, vocé est sozinho(a) em casa e resolve ir até a gela- deira com o razodvel objetivo de tomar um ma- ravilhoso sorvete de chocolate. O BAS esta ati- vado, e vocé vai aproximando-se, sem remé- dio, de seu guloso objetivo. De repente, vocé Jembra que sua mée/pai/companheiro/a/filhos pediu encarecidamente para nao tocar no sor- vete de chocolate, argumentando alguma ra- 740 que vocé nao lembra direito. Mas o que lembra é que, se avangar no sorvete, no mini- mo o céu abrir sobre a sa cabeca e um raio vingador vai cair sobre vocé (ou, pelo menos, vocé levard uma bronca que deseja evitar a todo custo). Diante desse castigo potencial, o BIS é ativado e vocé desiste de seu passeio até a ge- ladeira. E nesse momento que acontece a “luta” entre ambos os sistemas. Se vocé for uma pes- soa com um BAS hiperativo (ou seja, muito impulsivo) e, além disso, seu nivel de ansieda- de for médio ou baixo, o mais provavel é que o sorvete acabe no seu estémago. Para vocé, é mais importante conseguir o prémio do que evitar 0 castigo. Vocé é mais suscetivel & re- compensa. Se, pelo contrario, vocé tem um escore elevado em ansiedade e sua impulsi- vidade nao é alta, provavelmente vai desistir, ‘© 0 sotvete ficard intacto dentro da geladeira. ‘Nesse caso, para vocé, é mais importante evi- ‘tar a bronca do que tomar o sorvete. Vocé é ‘mais suscetivel ao castigo. Evidentemente, esse um exemplo em que ambos os sistemas en- tram em conflito. Mas vamos imaginar que no existe castigo, que temos via livre para tomar ‘0 sorvete trangiiilamente. Nesse caso, as dife- rencas irao aparecer em outras varidveis, como ‘© tempo que demoramos para decidir tomar 0 sorvete ou a velocidade com que o fazemos. A distincao entre “orientacao ou susceti- bilidade a recompensa” (BAS predominante) er“orientagao ou suscetibilidade ao castigo” (IS predominante) é uma caracteristica cen- tral da proposta de Gray? Nesse caso, a teoria de Eysenck sobre diferengas em condiciona- bilidade e personalidade serve como base para 1s estudos de Gray. A partir das bases biolégi- cas da extroversio e do neuroticismo, Eysenck sugere que nem todas as pessoas se condicio- nam do mesmo modo. Concretamente, diante do mesmo mimero de ensaios, as pessoas me- ancdlicas (introvertidas-neuréticas) terao maior probabilidade de aprender a resposta condicio- nada do que o resto dos subtipos de personali- dade. A contribuigao de Gray consiste em ma- tizar esses resultados em fungio do valor do estimulo nao-condicionado (apetitiva ou aver- siva). Se estivermos diante de um estimulo aversivo, Gray concordaria com Eysenck: os melancélicos (ou ansiosos, segundo a dimen- sdo de Gray) ficariam condicionados antes, com mais forca. Mas, se o estimulo ndo-condi- cionado é de natureza apetitiva, entdo seriam, as pessoas altas em impulsividade (extroverti- das-neuréticas) que se condicionariam antes. Levando em conta a relevancia do condiciona- mento no processo de socializacao (e, em ge- ral, para conseguir que alguém se comporte de uma determinada maneira), estabelecer esse matiz é fundamental na pratica profissional. E neste ponto que convém falar das me- didas psicométricas da teoria de Gray. Enquan- to 0 resto dos autores se langou a construcao de sucessivas escalas para avaliar seus cons- tructos teéricos, nao hd muitas tentativas de desenvolver medidas para os sistemas propos- tos por Gray, e as que foram desenvolvidas nao tiveram muita aceitacaio. Contudo, nos tiltimos INTRODUGAG A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS 237 anos, tém aparecido diversas escalas que pre- tendem medir as dimensées de sensibilidade & recompensa (como indicador do BAS) e de sen- sibilidade ao castigo (como indicador do BIS), entre as quais se destaca especialmente o teste SPSRQ (acrénimo, em inglés, de: Sensitivity to Punishment and Sensitivity to Reward Ques- tionnaire), desenvolvido pelo psicdlogo Rafael ‘Tormubia e sua equipe de colaboradores (Torrubia et al., 2001), que ja foi traduzido para varios idiomas. Se o modelo de Gray foi construido a par- tir dos trabalhos de Eysenck, onde é incluido 0 psicoticismo? Agora é momento de retomar o sistema de ataque-fuga (FFS, da expressao in- glesa fight-flight system). Esse’sistema jativa- se diante de sinais de castigo, especialment quando nossa integridade fisica ou psicolégica‘ corre perigo (quando hé expectativa de fracas so, por exemplo). Nas situagbes que envolvem um desafio e nas quais se correm riscos, esse sistema é capaz de explicar nossas tendéncias de comportamento. Como bem indica a deno- minagio FES, quando enfrentamos situacdes desse género podemos mostrar dois tipos basi- cos de resposta: atacar ou fugir. Pense na des- ctig&o que faziamos das pessoas altas em psicoticismo: vocé acha que uma pessoa assim vai sentir medo nesse tipo de situaco? E se eu Ihe disser que as pessoas com esse perfil carac- terizam-se por apresentar uma baixa reacao de medo e por um déficit na aquisicao de condu- tas inibitorias, instauradas mediante castigos? que vocé acha agora? Exatamente: mesmo a identificacdo nao sendo tao forte quanto no caso do BAS/BIS e das dimensdes de extrover- so e neuroticismo, pode-se considerar que as diferencas no FFS esto relacionadas com 0 psicoticismo. Nao obstante, a austncia de uma medida confidvel do FFS impede tanto a com- /provagao direta deste pressuposto quanto a pesquisa das suas propriedades por meio de questiondtios. Modelo dos “Cinco Alternativos”, de Zuckerman A primeira impressio, ao ler 0 nome do modelo proposto por Marvin Zuckerman e co- laboradores (Zuckerman et al., 1993), é que 1231 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. se trata de uma adaptacaio do modelo dos Cin- co Grandes. Essa idéia nao € correta. O modelo de Zuckerman parte do estudo experimental biolégico da personalidade hu- mana. Tal como no caso de Eysenck, esse mo- delo nao deriva da linguagem. Zuckerman co- megou a se interessar pelas diferengas indivi- duais em personalidade como resultado de suas pesquisas sobre privagao sensorial (Andrés- Pueyo, 1997), em que observou que nem to- das as pessoas agiientavam as situagdes de baixa estimulacio da mesma maneira (por exemplo, trancadas em um quarto escuro e a prova de som). Enquanto algumas ficavam de- sesperadas rapidamente, outras se sentiam qua- se como se estivessem em casa. Para explicar essas diferengas comportamentais, Zuckermam langou mao de um traco que viria a ser funda mental na sua teoria sobre personalidade: @ ‘busca de sensagSes: Assim, as pessoas altas em busca de sensagées, por terem uma necessida- de constante de nova estimulagio, nao supor- tariam bem as situagées de privacdo, enquan- to as pessoas baixas na mesma dimensio esta- riam muito mais cémodas nessas situagGes e, inclusive, as prefeririam ativamente. ‘Quando partiu dessa dimensao, Zuckerman tinha um duplo objetivo: encontrar as bases Diolégicas do traco “busca de sensacdes” e des crever os fatores que complementassem set modelo temperamental da personalidadel Né ‘primeiro caso, suas pesquisas estao focadas/ principalmente, nas diferencas encontradas nas ‘vias de transmissio dopaminérgica. Hé estu- dos que mostram que as pessoas com uma ne- cessidade constante de novos estimulos, avalia- ‘da mediante questionarios ou correlatos de con- duta, apresentam concentragdes mais elevadas de dopamina e, principalmente, baixos niveis: de monoaminoxidase (MAO), uma enzima qué regula a concentracdo de dopamina. Zuckerman obteve solugées fatoriais de trés, cinco e sete fatores. A solugdo de trés fa- tores aproximava-se consideravelmente da pro- posta de Eysenck, visto que incluia os fatores de impulsividade, sociabilidade e emocionali- dade, claramente identificdveis com psicoti- cismo, extroversao e neuroticismo, respectiva- mente. Nao é de estranhar, portanto, que a co- laboragao cientifica entre ambos os autores tenha sido constante e muito produtiva, uma vez, que eles também trabalharam juntos no desenvolvimento e na adaptacao da escala es- pecifica de busca de sensacées (Sensation Seeking Scale [SSS], Zuckerman, Eysenck e Eysenck, 1978). Contudo, Zuckerman consi- derou que era necessaria uma descricéo mais exaustiva da personalidade, o que o levou a optar, finalmente, por um modelo de cinco fa- tores: impulsividade-busca de sensagdes a socializada (Imp-USS), neuroticismo-ansi ide (N-Anx), sociabilidade (Sy), atividade (aa) e agressio-hostilidade (Agg-Host): O primeiro traco tem dois componentes: 1. impulsividade: relacionado com a auséncia de reflexdo e inibiggo de conduta; 2. busca de sensagées: relacionado com uma necessidade constante de estimulagio, se possivel, nova. Essa. dimensfo relaciona-se com a predilecio por atividades arriscadas, viagens ¢ comidas exéticas, ingestdo de drogas, pensamentos i- berais e condutas sexuais variadas e intensas. Desde 0 desenvolvimento do SSS e suas ver- ses posteriores, a escala geral de busca de sensagées, assim como suas quatro subescalas, foram as medidas mais utilizadas para avaliar esse traco. Apesar disso, nos tiltimos anos, 0 proprio Zuckerman tem recomendado a utili- zacao da escala Imp-Uss do ZKPQ (Zuckerman- Kuhlman Personality Questionnaire [ZKPQ]), que atualmente esta em sua terceira versio (ZKPQ-II-R; Zuckerman et al., 1993). O ZKPQ-II-R também inclui quatro esca- las de personalidade adicionais, corresponden- tes aos quatro tracos restantes, assim como uma escala de desejabilidade social denominada “infreqiiéncia”. Com respeito ao modelo dos Cinco Grandes, gostarfamos de destacar a in- clusdo das dimensées de atividade, sociabili- dade e agressiio-hostilidade como tragos basi cos da personalidade humana, as quais sao con- sideradas como facetas de extroversao, no caso das duas primeiras, e de neuroticismo, no caso da tiltima, no modelo dos Cinco Grandes (ver Quadro 12.2). Contudo, a principal diferenga com respeito ao modelo de Costa e McCrae é a auséncia de um traco equivalente ao de “aber- tura & experiéncia”, Mesmo existindo parale- lismos com “busca de sensacées” — de fato, en- contram-se correlacées significativas e positi- vas entre ambas as escalas (Aluja, Garcia e Garcia, 2003) -, estes no podem ser conside- rados como fatores idénticos. Modelo de Cloninger As relagGes entre as dimensdes de perso- nalidade e suas bases biolégicas vem ocupando um lugar proeminente nos estudos cientificos da personalidade. Ja na Grécia Classica, des- tacavam-se nomes que assentaram suas teorias sobre o temperamento humano sobre bases biolégicas. Hipécrates, Galeno, Juan Huarte de San Juan, Gall, Galton e Pavlov constituem al- guns dos exemplos mais representativos. O paragrafo anterior contextualizou a ex- plicacao do modelo proposto por Robert C. Cloninger. Apesar de jé termos comentado que os fundamentos bioldgicos dos tacos tém uma importéncia fundamental para Eysenck, Gray e Zuckerman, nenhum deles coloca tanta én- fase nas relagdes entre constructos psicoldgi- cos e biolégicos quanto Cloninger. De fato, esse modelo é autodenominado como psicobioldgi- co, © que equivale a toda uma declaracdo de principios. Esse seria seu pilar fundamental. As relagées entre tracos quantitativos e trans- tornos psicopatolégicos tém sido o segundo grande tema de pesquisa e dos estudos sobre aprendizagem e fungées bdsicas, como a me- moria ou a atengio, e seus efeitos sobre a con- duta e o desenvolvimento de habitos constitu- em o terceiro grande suporte dessa teoria, es- pecialmente para as dimensées de cardter. Cloninger (Cloninger, Svrakic, Praybeck, 1993) propuseram um modelo da personali- dade composto por sete dimensdes. © miclea do modelo estaria composto por quatro tracos de temperamento: busca de novidades (NS, dap) expresso inglesa novelty seeking), evitaco de dano (HA, harm avoidance), dependéncia day recompensa (RD, reward dependence) e persis- téncia (P, persistence); NS relaciona-se com os sistemas de ativacao de conduta orientado & obtenc&o de algum estimulo prazeroso. O sis- INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS. 233 tema funcionalmente oposto, de evitacio e de inibicdo de conduta, estaria representado pela dimens&o HA, enquanto RD indicaria diferen- ¢as na manutengdo de uma conduta jé apren- dida e reforcada mediante recompensas. P é definida pelas diferengas na capacidade para manter a conduta em condigdes de frustracdo e fadiga provocada pela auséncia de recom- pensa. As diferencas nessas dimensées seriamy em grande medida, hereditarias, associadas a sistemas neurofisioldgicos independentes; ma- nifestam-se nos primeiros anos de vida e repre- sentam tendéncias de comportamento que in- fluenciarao, posteriormente, nossos processos de aprendizagem. As-trés dimensées restantes sao de cafa- ter.¢ formam, especificamente, 0 submodelo de personalidade: autodeterminagao (SD, self- directedness), cooperatividade (C, cooperati- veness) e espiritualidade (ST; self-trascendence). SD relaciona-se com a vontade e a capacidade de controlar nossa conduta para alcangar de- terminados objetivos, enquanto escores altos em C indicariam pessoas com um jeito de ser agradavel com os outros, auséncia de egois- mo, aceitacéo dos demais e capacidade para produzir empatia. Por sua vez, ST inclui as- pectos “misticos”, de profunda religiosidade e sentido de pertencer a uma entidade maior e mais global do que nés mesmos. Na formagio dessas dimensées, desempenhariam um papel mais ativo os processos, tanto conscientes quan- to inconscientes, de aprendizagem e de forma- go de habitos e também estariam relaciona- dos com os componentes de motivacdo e de forga de vontade da nossa personalidade. Sf \sterapias psicoldgicas teriam um impacto maior nessas dimensées, enquanto seu efeito sobre os tracos de temperamento seria consideravel- ‘mente mais reduzido. Cloninger e seus colaboradores desenvol- veram o TCI (Temperament and Character In- ventory), que avalia as sete dimensdes do mo- delo. Esse questiondrio também incorpora va- rias facetas para cada dimensao. O TCI repre- senta uma ampliacao do TPQ (Tri-Dimensional Personality Questionnaire; Cloninger, Svrakic e Praybeck 1991), que foi o instrumento de- senvolvido para avaliar as trés dimensées de temperamento incluidas na primeira formula- ‘234 CARMEN FLORES-MENDO7A, ROBERTO COLOM & COLS. cao desse modelo (Cloninger, 1986). Nessa pri- meira versio, o traco “persisténcia” estava in- corporado como uma faceta de “dependéncia da recompensa”, e ainda nao haviam sido in- corporadas as dimensées de caréter. As evidén- cias empiricas levaram a considerar a nature- za de P como uma dimensao de temperamen- to independente de RD. Por outro lado, a in- clusio dos avancos em processos de aprendi- zagem e fungdes basicas, como a meméria e seus diferentes tipos, assim como as pesquisas sobre os efeitos das drogas e de diversos tipos de terapia, levaram Cloninger a sugerir um mo- delo de personalidade formado por trés dimen- sdes de caréter que complementassem os tra- gos de temperamento. Nos tiltimos anos, temos assistido a um aumento da importancia desse modelo e, por conseguinte, da utilizagao do TCI. A razao dis- so 0 interesse pela pesquisa sobre neurotrans- missores, marcadores genéticos ¢ tracos de per- sonalidade. Por oferecer hipéteses contras- taveis sobre esses fendmenos, esse modelo tem se transformado em uma das referéncias ted- ricas. Um dos exemplos mais notaveis é a gran- de quantidade de estudos sobre as relacées entre as NS e os marcadores genéticos relacio- nados com a produgo de dopamina e, mais especificamente, com 0 DRD4 (Dopamine Re- ceptor Gene 4; por exemplo, Kluger, Siegried ¢ Ebstein, 2002). A maior parte dos estudos de associagéo feitos comparando as freqiiéncias de alelos em grupos com médias altas ¢ baixas em NS tém sido desenvolvidos utilizando os argumentos tedricos do modelo de Cloninger eaescala NS do TCI como medida psicolégica de agrupamento, Teorias psicométricas da personalidade em criangus e em adolescentes: precisamos de modelos diferentes? ‘Arresposta é NAO! No transcurso da infan- cia e da adolescéncia, encontram-se e podem ser descritos os mesmos tracos propostos para explicar a personalidade nos adultos. Essas di- mensées sio estdveis e refletem diferencas a0 longo de todo o ciclo da vida, desde o nasci- mento até a velhice e tém, nas criangas e adoles- centes, as mesmas bases bioldgicas que os tra- cos “adultos”, além de um componente de he- reditariedade inquestiondvel. Portanto, nao é necessdrio procurar por modelos diferentes so- bre a estrutura da personalidade nessas idades. Um dos poucos modelos desenvolvidos explicitamente para compreender a personali- dade infantil ¢ 0 modelo EAS, de Buss e Plomin (1984). O nome do modelo corresponde 20 acronimo, em inglés, das trés dimensdes pro- postas como tracos de temperamento em crian- as (emotionality, activity e sociability). Ambds Srrceeranetroram que essas trés dimen- ‘S0es so as tinicas que cumprem os requisitos necessdrios para ser considerada como um tra- co de temperamento: sao hereditarias, apare- cem durante o primeiro ano de vida e repre- sentam tendéncias de comportamento presen- tes durante a época adulta. Se “emociona- lidade” pode ser definida como se sentir per- turbado com facilidade e intensidade, “ativi- dade,” por diferengas na intensidade e persis- téncia da conduta, e “sociabilidade” refere-se & necessidade de estar com outras pessoas em vez de sozinho, sao evidentes as estreitas rela- Ges, quase identificagao, no caso de Ee S, com 0s tracos de neuroticismo e de extroversao, res- pectivamente. Com respeito aos modelos jé apresenta- dos, Cattell e Eysenck interessaram-se, expli- citamente, pela avaliagio da personalidade in- fantil. Seus questiondrios nao foram gerados a partir de mudancas substanciais no modelo teé- rico, apenas responderam a necessidade de medir os mesmos tragos na populacao infan- til/adolescente. Cattell construiu uma série de questiondrios para avaliar os fatores primérios, tanto em populacio infantil (ESPQ) como em adolescentes (HSPQ). De seu lado, Eysenck ela- borou uma versao “junior” do EPQ (EPQ-J) para avaliar psicoticismo, extroversao e neuro- ticismo nessas idades. Em uma pesquisa trans- cultural com esse questiondrio, a estrutura fatorial obtida em paises como Nova Zelandia, Grécia, Singapura ou Espanha foi semelhante a encontrada para criancas britanicas (Eysenck e Eysenck, 1985). Deixando de lado essas e outras pesqui- sas, a maior parte dos trabalhos e-das aplica- es derivados dos modelos apresentados até aqui tem sido realizada com adultos. Somente apés receber suporte empirico na idade adulta é que se comecaram a pesquisar suas possibili- dades em criangas ¢ adolescentes. Qual € 0 principal problema que se tem apresentado? Apesar de existirem outros inconvenientes de- rivados do desenvolvimento cognitivo e emo- cional da crianga, a compreensao da lingua- gem, especialmente em criangas pequenas, é uma barreira importante na hora de utilizar 0 instrumento de avaliagdo mais comum em per- sonalidade: os questionarios de auto-relato. Por esse motivo, ganhou maior forga nes- se campo a recomendacao de Cattell sobre 0 uso de diversos tipos de técnicas de avaliacao, como a observacao ou os registros de conduta, além da utilizacao de questiondrios construidos em terceira pessoa (heteroavaliacdes) para se- rem respondidos pelos pais, professores ou qualquer pessoa que mantenha uma relagéo estreita com a crianga. Se a avaliagio é reali- zada com esse ultimo método, é preciso utili- zar diversos avaliadores com a finalidade de obter um perfil de personalidade da crianga que seja confidvel e ajustado ao contexto obje- tivo, possivel. Os adolescentes podem responder, sem problemas, aos questiondrios-padrao construi- dos para adultos. Nesse sentido, néo haveria nenhum inconveniente especial. Contudo, é preciso destacar que, durante essas idades, =. médias em diversos tragos sao significativamen- te mais elevadas do que as obtidas com popu INTRODUGAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS. 235 Jaco adulta normal. A populacdo adolescente atinge escore mais alto em neuroticismo, extro- versio, psicoticismo, impulsividade e busca de sensagées e pontua menos em cordialidade e responsabilidade. Portanto, os problemas n&o surgem exatamente das limitagbes dos instru- mentos de medida, mas da interpretagio dos resultados: sempre é preciso lembrar que seu grupo de referéncia tem médias diferentes nes- ses fatores, mas que essas médias se modifica- rio até alcancar os valores de referéncia nor- mais quando forem adultos. Embora tenhamos dito que no hd neces- sidade de utilizar modelos diferentes para des- crever e explicar a personalidade infantil, um dos problemas que 0 psicélogo encontra cons- tantemente é que as dimensdes representadas nos questionérios infantis no se identificam diretamente com os tragos normalmente ut zados com populagio adulta. © modelo seguin- te (ver Figura 12.3) pretende ser um ponto de apoio para interpretar as dimensées da perso- nalidade infantil com base em uma teoria j4 contrastada em populac&o adulta: os “Cinco Grandes”. Nao devemos interpreté-lo como um modelo jA consolidado, e sim como um guia com suporte empirico para permitir a descri- do e a explicacao da personalidade infantil. Na Figura 12.3, aparecem cinco dimensdes da personalidade infantil e os “Cinco Grandes”. As linhas continuas representam relagdes po- sitivas, enquanto as linhas pontilhadas indicam relagGes negativas. as Emogies positivas Inibigéo Emogées negatives (oeeenes a i (rae enssmo, | | (edn tmie, | | (ra intbidat, | | moO SAS alegria) evitaséo/atracéo) moor interesse) Cordialidade Responsaildade Neuroticismo ‘Noertura i experincio FIGURA 12.3 Modelo das relacies entre a personalidade infantil e os Cinco Grandes. As linhas continuas @ os pontilhados reapresentam relacoes, posivas negtivs,respectvamente(adoplada de Casi, 1998). 136 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COILS. CONVERGENCIA DAS DIVERSAS TEORIAS PSICOMETRICAS DA PERSONALIDADE ‘Até aqui apresentamos uma série de teo- rias psicomeétricas da personalidade. Nao sao as. tinicas, mas sio as mais importantes j4 desenvol- vidas a partir do paradigma de estudo das dife- rencas individuais. Nesta parte, o que preten- demos é mostrar as estreitas relacdes entre os diversos modelos apresentados anteriormente. A Tabela 12.2 mostra as solugGes de trés e cinco fatores obtidas quando sao analisados, conjuntamente, 0 NEO-PLR, os adjetivos de Goldberg, o ZKPQ-IILR e a verso reduzida do EPQ-R (Aluja, Garcfa e Garcfa, 2002). Nas duas solugées, as escalas de neuroticismo e extrover- so alcancam pesos muito altos no fator apro- priado. Por sua vez, o psicoticismo relaciona- se negativamente com os fatores de cordiali. dade (C) e responsabilidade (R) e, na solucdo de cinco fatores, especialmente com este tlti- mo. As medidas de Abertura configuram-se com um fator proprio nessa mesma solucao, reproduzindo a estrutura de cinco fatores, mas, quando se extraem trés fatores, essas escalas alcancam pesos elevados (acima de 0,55) no fator de extroversao. Com respeito as escalas do ZKPQ, obser- va-se uma grande relagio negativa (-0,75) da escala de agressio-hostilidade com o fator de cordialidade, o que viria confirmar que 0 pélo oposto deste traco caracteriza-se por uma ten- déncia a ser hostil e a responder agressivamen- te nas interagdes com os demais. Por sua vez, a escala Imp-USS relaciona-se negativamente com 0s fatores de psicoticismo e responsabili- dade nas solugdes de trés e cinco fatores, res- pectivamente. E, como era totalmente previs{- vel, as escalas de atividade e sociabilidade pe- sam apenas no fator de extroversao. Por sua vez, a relagao da escala N-Anx com o fator de neuroticismo é de 0,91. Ou seja, pode-se con- siderar uma medida quase perfeita do fator, tal como as escalas de neuroticismo do resto dos instrumentos. Em geral, esses resultados reproduzem os obtidos por Zuckerman e cola- boradores (1993) em amostragens diferentes, TABELA 12.2 Solucées trie pentafatoriais das seguintes escolas de personalidade em populacio espanhola (Aluja, et al., 2002): EPQ-R, NEO-PI-R, Adjetives Goldberg (G] e ZKPQ-lII-R (ZKPQ). Os pesos inferiores o 0,30 foram omitidos. Trés fotores Cinco fatores Escolas E N N E A C R NEO-Extroversdo 0,88 0.84 0,30 EPQ- Extroverséo 0,85 0,82 G- Exroverséo 0,82 0,80 IKPQ-Sociabilidade 0,70 075 ‘ZKPQ-Atividade 047 0,67 ZKPQ-N-Anx 091 0.91 NEO-Neuroticismo 0,90 0,90 EPQ- Neuroticismo 0,89 0,90 G-Estabilidade Emocional -081 0,82 NEO-Cordialidade 0,58 0,89 G-Cordialidade 047 0,57 034 0,33 0,60 ‘TKPQ-Agg-Host -0,51 -0,75 G-Responsabilidade 0,79 0,86 NEO-Responsobilidade 0,75 0,87 EPQ-Pricoticismo 071 0,34 -0,63 ZKPQ-Impulsividade 0,42 0,69 0,33 0,71 G-Intelecto 0,59 0,34 0,75 0,38 NEO- Abertura a Experiéncia 0,55 0,83 tece com os modelos de Cattell e de Cloninger? Na ultima versao do 16PF (16PF-5; Cattell, Cattell e Cattell, 1993), enfatizam-se os parale- lismos entre os fatores de segunda ordem e os Cinco Grandes. Os escores obtidos nos fatores de segunda ordem sao considerados uma boa medida do nivel de uma pessoa nos Cinco Gran- des. Seguindo essa recomendaciio e os estu- dos realizados com esse objetivo, os seguintes fatores de segunda ordem do 16PF-5 e os Cin- co Grandes” poderiam ser considerados con- gruentes: ansiedade-neuroticismo, exvia/invia- extroversdo; independéncia-abertura 4 expe- riéncia/extroversao, cortetia-cordialidade (em negativo) e autocontrole-responsabilidade. Es- cores altos em cortetia definem uma pessoa fria, pouco empatica e desagradavel com os de- mais, 8 qual corresponderiam niveis baixos do trago cordialidade, enquanto o fator de inde- pendéncia nao tem equivalente exato com um dos Cinco Grandes, mas pode ser associado com um perfil de busca de aventuras, asserti- vidade e gosto por coisas novas, ou seja, que nesse fator teriam escore alto as pessoas com niveis elevados em abertura A experiéncia e extroverso. De qualquer maneira, a correspon- déncia nesses dois ultimos casos é inferior a encontrada para os tracos de neuroticismo, extroversio e responsabilidade. Quando sao analisados conjuntamente os questiondrios derivados dos modelos de Clo- ninger, Zuckerman e Eysenck (Zuckerman e Cloninger, 1996), aparecem correlacdes mui- to altas, especialmente com as escalas de Tem- peramento. Por exemplo, as escalas Imp-USS e NS correlacionam-se em 0,68, enquanto a escala de evitagao de dano (HA, harm avoidan- ce) correlaciona-se em 0,66 e 0,59 com as es- calas de neuroticismo do ZKPQ-III-R e EPQ-R, respectivamente. Correlacées similares sio encontradas para o resto das escalas do TCI, exceto “espiritualidade”. Os resultados empiri- cos também mostram uma consideravel super- posi¢ao entre o modelo de Cloninger e os Cin- co Grandes. Em um estudo realizado com pa- cientes psiquidtricos (De Fruyt, Van de Wiele, Van Heeringen, 2000), as cinco medidas glo- bais do NEO-PLR explicavam 51, 38, 23, 35, 48, 42 e 23% das escalas do TCI: HA, NS, B RD, SD, CO e ST, respectivamente. Por sua vez, quando as escalas do TCI eram tomadas como INTRODUCAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENGAS INDIVIDUAIS 237 varidveis independentes nas andlises de regres- sio, explicavam 49, 55, 34, 29 e 50% de N, A, Ce R, respectivamente. No tiltimo trabalho comentado, os coefi- cientes de correlacio sio similares, nao impor- tando se as escalas dos Cinco Grandes sao to- madas como varidvel independente ou como critério. Esse fato sugere uma discussao inte- ressante: esses resultados mostram a superiori- dade do modelo dos “Cinco Grandes” sobre qual- quer outro? E preciso levar em conta que esses sto dados baseados em correlagées, ou seja, as relagées causais ou de influéncia podem ser in- terpretadas em ambos os sentidos, na falta de outro tipo de evidéncia ou de uma teoria espe- cifica sobre os efeitos encontrados. Em qualquer caso, as idéias de que precisamos lembrar sao que as semelhancas entre os modelos sfo consi- deraveis, que as escalas geradas a partir de teo- rias e de pressupostos completamente diferen- tes podem mediir © mesmo trago, o que permite que sejam utilizadas conjuntamente (ou em 10) € que a decisao sobre qual mode- lo (e, portanto, instrumento) vamos aplicar vai depender do grau de familiaridade do profissi- onal com esse modelo e questionario e, princi- palmente, de qual ser4 o mais witil para seus objetivos. A préxima parte pretende trazer in- formagao sobre este tiltimo ponto. VALIDADE PREDITIVA DOS TRACOS DE PERSONALIDADE Os tragos de personalidade demonstraram sua eficdcia em todos os contextos de trabalho dos psicdlogos. Naturalmente, no sao as tini- cas varidveis relevantes: em muitos casos, se- quer so as mais importantes. Outras varidveis psicolégicas ou sociais, assim como as caracte- risticas situacionais, também sao fundamentais para compreender e predizer a conduta. Nesta parte, vamos comentar algumas evidéncias so- bre a validade preditiva dos tragos de perso- nalidade. Nao iremos nos concentrar em um tinico modelo de personalidade, mas nas di- menses que foram medidas em cada estudo concreto. Contudo, é importante que vocé nao se esqueca das estreitas relagdes entre tracos que foram mostradas na parte anterior. 38 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. Em uma metandlise recente, Hurtz e Donovan (2000) recolheram estudos que in- cluiam medidas desenvolvidas explicitamente a partir do modelo teérico dos Cinco Grandes. Fazendo uma anilise global, observa-se que 0 fator que mais se relaciona com 0 rendimento no trabalho é a responsabilidade (coeficiente de validade = 0,20), seguido de estabilidade emocional (0,13), cordialidade (0,11), extro- verso (0,09) e abertura a experiéncia (0,06). Como se pode ver, os coeficientes sdio peque- nos, claramente inferiores aos obtidos pelo fa- tor de inteligéncia geral (em torno de 0,50) Por sua vez, Ones, Viswesvaran e Schimide (1993) fizeram uma metanélise sobre 222 es- tudos que haviam utilizado os testes de “inte- gridade”, com amostra total de mais de 500 mil Pessoass Esses testes avaliam diretamente a responsabilidade, além de opiniées especificas sobre quest6es relacionadas com o trabalho e aética. Como medidas de produtividade no tra- balho, foram utilizadas as avaliagdes dos su- periores ¢ a execucao em tarefas relacionadas com o trabalho da pessoa. ‘Depois'de corrigt- dos determinados vieses, obteve-se uma cor+ relagao com 0 critério de 0,47: um coeficiente de validade muito elevado. Mas as andlises em contextos organiza- cionais nao tém caminhado apenas na ditecio de predizer o rendimento no trabalho: outras linhas tém sido o absentismo, os acidentes de trabalho e os problemas de satide e transtor- nos ligados a profissao. Dentro desta linha, um ‘dos problemas de satide que tem recebido mais steaczo EaindromedeBumiout Oiastrnen to mais usado para medi-la é o MBI (Maslach Burnout Inventory), que avalia trés fatores: exaustdo emocional, despersonalizagio e di- minuicéo da realizagéa, Sistematicamente, apa- recem relagbes superiores a 0,50 entre esses fatores ¢ neuroticismo, psicoticismo e extro- versio, respectivamente. Esses resultados in- dicam que os sintomas de estresse cr6nico, fal- ta'de interesse para realizar um bom trabalho e-experimentar sentimentos negativos que le- vavam. as pessoas a se sentirem emocional.e fisieamente exaustas no trabalho esto estrei- tamente vinculados.com tracos da personali- dade normal. Os transtornos psicopatolégicos tém sido uma das grandes referéncias na hora de utili- zar os tracos do temperamento como variveis independentes. Em um estudo em que era ava- liada a presenga de transtornos mentais aos 18 anos, Krueger e colaboradores (1996) mos- traram.que escores altos.em emotividade ne- gativa (definida por baixa cordialidade e, prin- cipalmente, por escore alto em neuroticismo; ver Figura 12.3) marcavam a diferenga entre as pessoas sem transtornos e as que eram diagnosticadas com problemas mentais. Na Tabela 12.3, aparecem as correlagdes (n=775 homens) entre os escores do questionario psicopatolégico desenvolvido por Cattell (CAQ) e os fatores de neuroticismo, extroversdo e psicoticismo avaliados através do EPQ. Todas as correlacdes com neuroticismo sao significa- tivas, exceto com D3, 0 que reforca a idéia de que o traco de neuroticismo estd fortemente relacionado com qualquer transtorno da per- sonalidade. Da mesma maneira, as correlacdes com extroversao e psicoticismo também sao majoritariamente significativas, mesmo no al- cangando valores to altos quanto os encon- trados para neuroticismo. Outro dado que vale a pena ressaltar € o sinal das correlagoes: ne- gativas para neuroticismo e psicoticismo, e po- sitivas para extroverstio, 0 que sugere que os dois primeiros sao fatores de risco, enquanto extroversdo representaria um fator de prote- TABELA 12.3 Correlacées entre as dimensoes clinicas avaliadas pelo CAQ e os trés tracos medidos pelo EPQ Escalas do CAQ EPQ-E EPQ-P Di (Hipocondtio) 0,46 D2 (Depresséo svicida) 024 0,47 D3 (Agitagao) 020 0,12 D4 (Depressio ansiosa) 0,27 0,32 5 (Depressto baixa energia) 029 037 Dé (Culpcbiidade-ressentimento) 0,19 025 D7 (Apatio-retirada) 0,49 0,46 Po (Poranéia) 0,20 0,37 Pp (Desvio psicopatico) 014 -0,10 Sc (Esquizofrenia) 042 As (Psicastenia) 0,12 Ps (Desajuste psicolégico) 0,37 do. Nao obstante, esses resultados podem ser produto de um viés do CAQ, que inclui diver- sos tipos de depressio, transtorno com mais probabilidades de aparecer em pessoas perten- centes ao subtipo de personalidade “melancé- lico”. Aos dois estudos comentados neste pa- ragrafo caberia criticar que eles sio baseados em relagées entre questionarios. O que acon- teceria se fossem utilizados outros instrumen- tos de avaliagao psicopatolégica, como a en- trevista? Widiger ¢\Gostai(@994jpresponderam aessa pergunta, Quando recolheram a evidén- cia gerada em muiltiplos estudos, encontraram que as correlagdes com algum traco dos Cinco Grandes eram altas (ao redor de 0,5), inde- pendentemente do questiondrio psicopatolé- gico ou da entrevista diagnéstica utilizada. No entanto, seré que somos capazes de predizer, jé na infancia, se uma pessoa tera um transtorno durante a adolescéncia ou na idade adulta? Como mostraram os resultados do es- tudo longitudinal “Dunedin” (por exemplo, Caspi, 2000), a avaliacio infantil de diferen- ¢as em temperamento tem mostrado um po- der preditivo razoavel, nao sé das diferengas de personalidade, mas de toda uma série de fenémenos, como o desenvolvimento de trans- tornos, qualidade das relagdes interpessoais ou condutas de risco. E, como ja foi comentado, na predicdo desse tipo de conduta (ingestao de drogas, freqiiéncia e variedade de praticas sexuais ou esportes de risco) desempenha um papel destacado o traco “busca de sensacdes” (Zuckerman, 1994). E jd que estamos falando da predicio du- rante a infancia, serd que a personalidade de- sempenha algum papel no rendimento acadé- mico? Recentemente, um estudo desenvolvido na Espanha (Aluja e Blanch, 2002) correla- cionou medidas de personalidade (EPQ-J) e me- didas psicopatolégicas (CDI - Questionario de Depressdo Infantil de Kovacs) com notas esco- ares em alunos de 13 anos. Q traco mais rela- “cionado com o rendimento escolar foi psicoti- cismo:-Naturalmente,.as.relagées.eram-negati- Yas, ouseja, para maior psicoticismo, notas mais baixasPor sua vez, das quatro dimensdes ava- liadas pelo CDI, 0 terceiro fator era o que apre- sentava maior impacto no rendimento. Esse fa- tor avalia conduta hostil e agressiva com os de- INTRODUGAO A PSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS 239 mais. Em um estudo que abrangia dos 4 aos 12 anos, Mervielde, Buyst e De Fruyt (1995) pedi- ram a 10 professores para avaliarem a persona- lidade de 224 dos seus alunos por meio de uma prova de adjetivos que media os Cinco Grandes. Em todas as faixas de idade, o fator de “respon- sabilidade” apresentava coeficientes (correlacao média de.0,50) consideravelmente mais altos do que os outros quatro fatores. E preciso des- tacar que, em ambos os estudos, as medidas di- retas ou indiretas da inteligéncia alcancavam correlagées to elevadas, ou mais, quanto as ob- tidas pelas medidas de psicoticismo-responsa- bilidade. Todas as evidéncias indicam que tan- toa personalidade quanto a inteligéncia desem- penham um papel relevante na predicao do ren- dimento académico CONCLUSAO Chegamos ao final do caminho? Sao sufi- cientes nossos atuais conhecimentos sobre a estrutura da personalidade? Os Cinco Grandes so 0 modelo definitive? Espero que vocé te- nha respondido negativamente as trés pergun- tas, E se sua resposta despertou uma razodvel curiosidade e entusiasmo para se aprofundar ainda mais nas teorias psicométricas da perso- nalidade, ento acredito que um dos objetivos deste capitulo foi cumprido. E verdade que os avancos sao grandes, mas ainda resta muito por explorar sobre os elementos que formam nossa personalidade, sobre suas propriedades e relagdes. O-modelo dos Cinco Grandes fepresenta um marco nd caminho, uma das nossas melhores obras, mas. no deve ser visto como a estrutura “verdadei- ra”, Nenhum dos modelos deve ser encarado assim, mesmo que tenham realizado contribui- Ges importantes. Muito bem, ja sabemos que néo chegamos ao final, o que nao é pouco; mas, ainda mais importante é 0 fato, de que temos, atras de nds, a bagagem legada por centenas de profissionais que construiram um sélido su- porte tedrico e empirico. Mas para onde es- tamos indo? O que devemos fazer? Uma das primeiras tarefas é continuar melhorando os modelos atuais. Sera que, real- mente, as facetas de “abertura a experiéncia”, 240 CARMEN FLORES-MENDOZA, ROBERTO COLOM & COLS. para dar apenas um exemplo, so as que Cos- tae McCrae propuseram? Foi uma decisio cor- reta incluir a faceta de impulsividade no fa- tor de neuroticismo? E possivel desenvolver facetas de “psicoticismo” que cumpram com os rigorosos critérios de Eysenck para conside- ré-las constructos cientificos que merecam nossa atencao? Essas poderiam ser algumas das perguntasa ser feitas. Também é necessdrio rea- lizar pesquisas, que relacionem os modelos en- tre si, que nos permitam conhecer qual é a pro- babilidade de que uma pessoa com um deter- minado perfil nos Cinco Grandes seja suscetivel & recompensa ou ao castigo ou que obtenha um. escore alto nas dimensGes de carater do mode- lo de Cloninger como as apresentadas na parte que trata da convergéncia das diversas teorias psicométricas de personalidade. Todos esses esforcos devem ser redobra- dos quando se trata da compreensio da perso- nalidade infantil. Ainda resta muito trabalho a ser feito nesses grupos de idade, e, neste terre- no, é fundamental construir mensuragdes con- fidveis que permitam, a baixo custo, avaliar a personalidade da erianca de acordo com nos- sos modelos tedricos. O desenvolvimento de provas objetivas da personalidade, os dados T de Cattell, deve ser uma das grandes linhas a ser desenvolvida nas préximas décadas. Mas nao devemos trabalhar apenas sobre ‘a base dos componentes jé encontrados. Ou- tras esferas psicolégicas, como a motivagio, os valores, a aprendizagem ou as funces psico- logicas bdsicas, devem ser incorporadas 4 com- preensio e A medicao da personalidade huma- na. As dimensdes de carater de Cloninger re- presentam um passo nessa direcdo. Como di- zia Cattell, no podemos compreender total- mente o comportamento de uma pessoa se no Jevamos em conta outros fatores, além dos tra- cos do temperamento da personalidade. Por- tanto, o trabalho com medidas confiaveis e validas dos elementos nao-temperamentais da personalidade e com teorias contrastaveis so- bre suas influéncias mituas deve ser outro dos objetivos que determinem a aplicagio das teo- rias psicométricas da personalidade. Também é necessdrio indagar sobre as bases cognitivas dos tragos de personalidade. Esta area nao tem sido suficientemente explo- rada, 0 que representa um vazio considerdvel. O que passa pela mente de uma pessoa no mo- mento de escolher ir a uma festa em vez de fi- car em casa? Ou quando ela se lanca para agre- dir outra? Ou quando toma a decisio de recla- mar seus direitos? Quais so os processos cognitivos que participam? Qual ¢ 0 mecanis- mo de conexAo dos tragos com as condutas? Pode-se dizer que, dos trés niveis de andlise na pesquisa sobre as diferengas individuais, traco, cognitivo e biolégico (Colom, 1998), o segun- do tem sido o grande esquecido pelos progra- mas de pesquisa sobre a personalidade huma- na, Os modelos e as evidéncias empfricas gera- dos nesse nivel (por exemplo, Mischel e Soda, 1995) devem validar ou rechacar as atuais for- mulagées sobre os tracos para, em um segundo passo, serem incorporadas As teorias psico- métricas, com seus proprios instrumentos de medigio e com suas propriedades conceituais. Mas quando falamos do futuro das teo- rias psicométricas da personalidade, novamen- te surge o nfvel bioldgico com uma importén- cia preponderante. Zuckerman (1992) fez uma descricao maravilhosa disto em sua metéfora das tartarugas. As sete tartarugas da estrutura psicobioldgica da personalidade so: genética, neurologia, bioquimica, fisiologia, condiciona- mento, conduta social e tracgs. Cada tartaru- ga descansa sobre a anterior, partindo tudo a “maior” delas, a genética, Cada nivel € inde- pendente e pode ser estudado em si mesmo, mas, se hd uma nova descoberta em uma “tarta- ruga” inferior, ela deve ser considerada pelas superiores, queiram elas ou no, O nivel de tra- co € afetado por qualquer pressuposto/testri- do/descoberta do testo das “tartarugas”. Por- tanto, devemos reproduzir o que jé sabemos em nivel psicométrico com outros tipos de evidén- cias e incorporar nossos resultados as teorias sobre os tragos. Essa tarefa nao é nova, lembre- se de como chegou Gray a seu modelo a partir das dimensdes de Eysenck. Nenhum modelo pode sustentar-se somente sobre suas medidas psicométricas: todos precisam ser validados em estudos que utilizem varidveis biolégicas. Embora, segundo a teoria, N e C sejam tracos independentes, reiteradamente é encon- trada uma relago entre ambos. Entretanto, sera que existe um mecanismo que explique essa relac&o? Se nao ha, deverfamos cogitar a existéncia de um problema com a medida ou com 0 modelo. Mas, se podemos sustentar essa relagéo sobre mecanismos biolégicos, 0 que precisamos fazer é questionar se ambos os tra- 0s (tal e como sao definidos pelo modelo dos Cinco Grandes) sao ortogonais. Jang e colabo- radores (2001) analisaram amostras de gémeos da Alemanha, do Canadé, dos Estados Unidos e do Japao para mostrar que a correlaco en- tre N e C pode ser explicada parcialmente pe- los efeitos genéticos e, mais concretamente, por um gene envolvido nas concentracées de serotonina no cérebro. Pesquisas desse tipo, no nfvel de “tartarugas inferiores”, sao as que per- mitem afiangar as teorias psicométricas, a “tar- taruga” situada no topos Finalmente, a validade preditiva represen- ta 0 outro grande desafio para as teorias psico- métricas. Se um trago nao é capaz de predizer a conduta humana, nao deve fazer parte da estrutura da personalidade. Se as hipéteses sobre a utilidade de um traco nfo se susten- tam, entio é necessério revisar a teoria inicial. REFERENCIAS Allport, G.W,, e Odbert H.S. (1936). Trait Names: A psycho-lexical study. Psychological Monographs, 47, (I, Whole No. 211). Aluja, A., e Blanch, A. (2002). The Children Depression Inventory as predictor of social and scholastic competence. European Journal of Psychological Assessment, 18, 259.274, Aluja, A., e Blanch, A. (2003). Replicabilidad de los factores de segundo orden del 16PF'5 en muestras ame- ricanas y espafiolas, Psicothema, 15, 309-314. Aluja, A., Garcia, ©., e Garcia, LE (2002). A compa- ative study of Zuckerman’s three structural models for personality through the NEO-PLR, ZKPQ -III-R, EPQ-R and Goldberg's 50-bipolar adjectives. Personality and Individual Differences, 33, 713-725. Aluja, A, Garcia, O,, e Garcia, LE (2003). Relationships among extraversion, openness to experience, and sensation seeking, Personality and Individual Difierences, 35, 671-680. Andrés Pueyo, A. (1997). Manual de Psicologia Dife- rencial. Barcelona: McGraw-Hill Brody, N., e Ehrlichman, H. (1998). Personality Psychology. The Science of individuality. New Jersey: Prentice-Hall. Buss, AH, e Plomin, R. (1984). Temperament: Early developing personality traits. Hillssdale, NJ: Erlbaum, Caprara, G.V,, Barbaranelli, C., Borgogni, L., ¢ Perugini, ‘M. (1993). The “Big Five Questionnaire”: A new ques. INTRODUGAO APSICOLOGIA DAS DIFERENCAS INDIVIDUAIS. 241 tionnaire to assess the Five Factor Model. Personality and Individual Differences, 15, 281-288, Caspi, A. (1998). Personality development across the life course. En W. Damon, e Eisenberg, N. (Eds), Handbook of Child Psychology. Volume 3: Social, Emotional, and Personality development (pp. 311-388) . New York: John Wiley & Sons, Caspi, A. (2000). The child is father of the man: Perso- nality continuities from childhood to adulthood. Journal of Personality and Social Psychology, 78, 158-172. Cattell, RB. (1943). The description of personality: Basic traits resolved into clusters. Journal of Abnormal and Social Psychology, 38, 476-506. Cattell, R.B. (1987). Intelligence: its structure, growth and actions. Amsterdan: North-Holland, Cattell, R.B., € Brennan, J. (1994). Finding personality structure when ipsative measurements are the unavoidable basis of the variables. American Journal of Psychology, 107, 261-274. Cattell, R.B., e Cattell, H.£,P (1995). Personality strue- ture and the new fifth edition of the 16PR Educational and Psychological Measurement, 55, 926-937. Cattell, R.B., Cattell, AK. e Cattell, HLE.P (1993). Sixteen Personality Factor Questionnaire. Fifth Edition. Champaing, I Institute for Personality and Ability Testing, Inc. Cattell, R.B., Eber, H.W,, e Tatsuoka, M.M. (1970) Handbook for the Sixteen Personality Factor Question. naire (16PE). Champaign, IL: IPAT. Cloninger, R.C. (1986). A unified biosocial theory of personality and its role into the development of anxiety states. Psychiatric Developments,3, 167-226. Cloninger, R.C., Syrakic, D.M., e Przybeck, TR. (1991). ‘The Tridimensional Personality Questionnaire: US normative data. Psychological Reports, 69, 1047-1057. Cloninger, R.C., Svrakic, D.M., e Przybeck, TR. (1993). Appsychobiological model of temperament and charac. ter. Archives of General Psychiatry, 50, 975-990, Colom, R. (1998). Psicologia de las Diferencias Indivi- duales: Teorfa y Préctica. Madrid: Pirémide. Conn, S.R.,e Rieke, M.L. (1994). The 16PF Fifth Edition technical manual. Champaign, Il. Institute for Persona- lity and Ability Testing, Inc. Costa, PT. Jr, e McCrae, RR. (1985). The NEO Persona- lity Inventory manual. Odessa, FL: Psychological Assess- ‘ment Resources. Costa, PT., € McCrae, RR. (1976). Age differences in personality structure: A cluster analytic approach. Jour- nal of Gerontology, 31, 564-570. Costa, PT, e McCrae, R.R. (1988). Personality in Adult- hood: A Six-Year Longitudinal Study of Self-Reports and ‘Spouse Ratings on the NEO Personality Inventory. Journal of Personality and Social Psychology, 54, 853-863, Costa, PT, e McCrae, R.R.(1992a). Four ways five factors are basic. Personality and Individual Diferences, 13, 653-665. Costa, PT., e MeCrae, RR. (1992b). NEO-PIR Professio- nal Manual. Revised NEO Personality Inventory (NEO- PLR) and NEO Five Factor Inventory (NEO-FFI). Odessa. FL.: Psychological Assessment Resources.

You might also like