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Organizacgao YOLANDA GUERRA ALZIRA MARIA BAPTISTA LEWGOY CARINA BERTA MOLJO iy leyau Telit JOSE FERNANDO SIQUEIRA DA SILVA | ya NRO | E SEUS FUNDAMENTOS: ONT Ga AO a copyright 2018, Editora Papel Soci “Todos os direitos reservados e protegidos pela Lein 9.610, de 19/02/1998, Nenhuma parte desse livro poderi ser reproduzidh ov transmitida por quaisquer meios: eletronicos, mecinicos, fotogriticos, gravagio ou quaisquer outros sem prévia nutorizagio por escrito da editora, ‘Muito cuidado ¢ atengio foram dedicados & edigio deste livro, no entanto a metodologia utlizada, citagies ¢ referéncias bibliogrificas dos textos sio de inteira responsabilidade dos autores, Titulo Servigo social e seus fundamentos: conhecimento e critica Editor Consello Editorial de Servigo Social: Edson de Carvalho Edvania Angela de Souza Lourengo Jussara Maria Mendes Coontenador Editorial Maurilio Matos Antonio Deusivam de Oliveira Rosane Martins Yolanda Guerra Diagramagio ¢ Projeto Grifico Kelli Costa Preparagio e reviso de texto Lyvia Félix Copa Gustavo Vilas Boas A grafia deste livro segue 0 Novo Acordo Ortogeifico da Lingua Portuguesa Esta obra teve o apoio da CAPES ¢ do cNPg Dados Internacionais de Catalogacio na Publicagio (CIP) “Andceia de Almeida CRB-8/7889 Servigo sociale seus fundamentos: conhecimento e critica / organizado por Yolanda Guetsa...lt ll. Campinas: Papel Social, 2018. 224 p. Inclui Bibliogeafia ISBN 978.-85-65540-51-3 1. Servigo social 2, Servigo social como profissio 1. Guerra, Yolanda Indice para catilogo sistemitico: 1. Servigo social 18-2055 DD 361.3 By EDITORA PAPEL SOCIAL 2 www.editorapapelsocial.com.br 1 2NTTESISTNY — editorial.editorapapelsocial@gmail.com NL Rua Antonio Bertoni Garcia, 634 - Jd. Von Zuben CEP: 3044-650- Campinas - SP|1 1-9 8300 9086 | 19-3276-9859 Digitalizado com CamScanner Ariivo 3 As Abordavens Marxistas no Listudo dos F'undamentos no Servico Social Ivete Simio Introdugio A extraordinaria Histiria do marsismo, obta organizada por Bric Hobsbawm, proporcionou a compreensio de diversas interptetagdes do x no século xx, evidenciando que histéria do marxismo foi, na verdade, a histéria dos marxismos, as formas como se desenvolveu € se modificou A luz das transformagées histéricas, das novas descolertas, das modificagdes ocortidas no quadro intelectual ¢ dos problemas teéricos priticos que a realidade foi suscitando em seu permanente devit, Também para Michel Livy (1997, p. 21), “siio os marxismos do século xx~ partindo de Marx, mas indo bem mais além — que nos ajudaram a compreender o imperialismo € ulo, as revolugdes sociais nos legado de M 0 fascismo, o estalinismo e a sociedade do espet paises periféricos ¢ as novas formas de capitalismo”. Digitalizado com CamScanner A despeito da diversdade de autores inéapretespresentes esse campy, 6 inegivel que a teoria social na letra de Marx é a que nos oferece, no conjure? © dasua obra, “um método para, a0 mesmo tempo, interpretar € mudat 0 mundy> (Hobsbawm, 1983, p. 12) ¢ produzit conhecimentos explictamente voliados , transformagio da realidad social, Os desdobramentos observados em grande. expressdes clissicas como Lénin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci e Luks, atestam a vitailade dos principios do materialismo histérico, nto como um corp loutrinétio acabado, mas que “evolui, se enriquece € se modifica na tentaiy, incessante de compreender adequadamente os novos problemas colocados pe ‘rico-social” (Coutinho, 1983, sp). Novas leituras ¢ interpretagie, adensaram ¢ seguem adensando a historia do marxismo, como a Escola de Frankfurt; o pensamento anglo-saxio de Eduard P, Thompson, Raymond Wiliams € Bric J. Hobsbawm; o debate francés com Henry Lefebvre, Lucien Goldman, ¢ Jean-Paul Sartre; as contribuigdes de Frangois Chesnais, Ernest Mandel, Istvin Mészéros, David Harvey e Evgeni Pachukanis;as reflexes na América Latina com José Marti, José Carlos Maridtegui, Hector P, Agosti e Jose Aricé; a teologia da libertagio com Enrique Dussel, Gustavo Gutierréz ¢ Leonardo Boff; a teotia da dependéncia com André Gunder Frank, Anibal Quijano Teotonio dos Santos, Ruy Mauro Marini e outros grandes intelectuais brasileizos, a exemplo de Caic Prado Jénior, Florestan Fernandes, Octavio Tanni, Francisco de Oliveira, Carlos Nelson Coutinho e tantos outros que prosseguem lancando luzes na compreensio das implicagdes do capitalismo imperialista e de suas formas de exploracio, fomentando, teérica ¢ politicamente, a luta pela transformacio tevolucionétia da sociedade Boron, 2006). © marxismo, portant, é um processo, em permanente construgio, conservacio ¢ superagio, de formulacio de novas sinteses, a partir clas contradigdes e do movimento da préptia histdria Asabordagens do marxismo no ambito do Servigo Social sio relativamente recentes se comparadas hist6ria das ideias masxistas, Transcorridos pouco mais de 50 anos do Movimento de Reconceituago na América Latina, pode- se afirmar que o maior legado teérico da experiéncia reconceitualizadora foi a aproximagito da profissio com a perspectiva marxista e a abertura de interlocus20 com outras areas do conhecimento. Os aportes da tradigio 3) sasnita, stave de tendénctan diversas, permitiram rever as bases conceituais da profissio, seu Projeto Etico-politico e suas agdes pritico-operativas. No Brasil, os ecos da experiéncia latino-americana, cerceados pelo Estado ditatorial, nao impediram iniciativas como 0 Método BH (1972-75) ¢ inimeros trabalhos de inspirago marxista emergidos no final dos anos 1970 e infcio de 1980, que impulsionados pelas lutas sociais e pelos cursos de pés-graduacio, tragaram as premissas iniciais do processo de “intengio de ruptura”. 12 0 trabalho de Marilda Tamamoto, contudo, que demarca as bases efetivas de anilise ctitica 2 evolugio hi 86 Digitalizado com CamScanner da profissio sob inspiracio marxiana. A recorténcia 4 teotia social de Marx fdentra os anos seguintes com os avangos obtidos no pracesso de renovagio da formagio profissional, através do Curticulo de 1982, dos Cédigos de Fitica de 1986 1993, e das Diretrizes Curriculares de 1996, formando, ao lado da Lei de egulamentagio da Profissio, o Projeto Etico-politico profissional Os resultados desse proceso sio indissociéveis dos matcos geradores ¢ potencializadores que langaram luzes as primeitas incursées do Setvigo Social ao legado de Marx ¢ insuptimiveis do decurso de construgio de seus # fundamentos, cujo patamar hoje alcangado seria impensavel sem os acimulos te6rico, politico, cultural ¢ ideol6gico constitutivos da sua construgdo histérica e dis lutas travadas pela profissio em diferentes cendrios da conjuntura © brasileira. E, acima de tudo, resultado da produgio tedtica, da organizagio politica da categoria, das claboragées no campo da ética, da ampliagio da © pesquisa, especialmente através dos cursos de pés-graduagio, das reflexdes 4 sobre 0 exercicio profissional, das novas requisic&es ¢ demandas colocadas A= profissio e das respostas por ela consteuidas (aness/caDEPss, 1996). 5 Desde a implementagio das Diretrizes Curriculares, diversas . iniciativas, levadas a efeito pela aBEPss, por instituigdes de ensino, docentese © pesquisadores, tm buscado acompanhar construir um diagnéstico sobre os avancos € dificuldades encontrados nos meios académicos, especialmente na assungio dos eixos estruturantes dos micleos de fandamentacio da formagio profissional.' Os miltiplos desenhos curticulares e projetos pedagégicos, a expansio dos cursos na rede privada e dos cursos sequenciais na modalidade 4 distdncia séo alguns dos dbices que ainda se apresentam para analisar com maior detalhamento as tendéncias marxistas utilizadas como fundamentos no processo formativo. Se ainda no dispomos de um mapeamento das diversas experiéncias que vém sendo desenvolvidas nos cursos de Setvico Social existentes no pais que permita uma avaliagio mais ampla, temos hoje um significativo quadro de informagdes disponibilizadas on-line, nos sites das instituigbes de ensino e da propria ABEPSS, que possibilita tracar, ainda que em linhas gerais, as principais tendéncias do marxismo presentes nos cursos de gtaduacio, de pés-graduacio e na producio tedrica da categoria, Esbogar um quadro dos avangos e actimulos, reconstruir analiticamente [3 esse movimento, é, como observa Netto (2016, p. 61), um imperative para “aprofundar o conhecimento do passado [..] ¢ de tecuperé-lo nos seus Momentos mais proximos ¢ mesmo contemporineos”. Tal reconstrugio diz Tespeito niio somente & recuperagio historiogrifica da profissaio, mas 1 CL Retina 8 com a pbliagi dps ead pel sb mbt aos sbre “0 csi ‘nbalho poiional punt afemegio dar Dietaes Ciuc Jo Projet eo Pllc” (204) «ox welatos dos Gre dont no td oor 87 Digitalizado com CamScanner 88 visa & reprodugio ideal (f/driea) do processo histSrico efetivo da profissio ~ a sta funcionalidadle social na sua emergéncia e no sey, desenvolvimento, a sua incorporagio de ideias e préticas surgidag 4 com as ciéncias soci ¢ humanas, outros espagos, a sua rel as tendéncias ¢ as colisdes proprias do seu movimento, envolyer dlo seu piiblico-alvo dos seus objetos de intervensio, as formas «la sua reprodugio, as suns bases tanto sociais quanto ideopoliticas ss delas, a sua ins ¢ tedtico-metodoldgicas e as alterag divisio social € técnica do trabalho, a extragio dos seus sujeitos € seus percursos posteriores, a construgio da sua autoimagem ¢ as modalidades pelas quais buscou € encontrou a sua legitimagio social. (Netto, 2016, p. 58-59) A necessidade de uma “histéria nova” pata a “teconstructo analitcg que o movimento real do Servigo Social requer hoje” (Netto, 2016, p, 69 coloca-se como um desafio na sistematizagio e visibilidade dos aciimulog tedtico-académico, politico ptofissional ¢ de seus desdobramentos contemporineos, especialmente nas trés ultimas décadas. A presenga « as formas de incorporaio da teoria social de Marx e das tendéncias dels derivadas como Fundamentos do Servigo Social brasileiro esto intimamente vinculadasa essa trajet6ria, apresentando-se, ainda, como um empreendimento desafiador e um processo em permanente construgio. Processo histérico — Marx e marxismos entre as décadas de 1970 e 1980 Quando tratamos da aproximacio do Servigo Social a vertente marxista, é necessfrio considerar as contribuigdes de diversos profissionais que assumiram seu compromisso com o processo renovador em diferentes momentos e conjunturas histéricas. Nesse sentido, “as ideias no vieram sozinhas” e expressam o “produto da atividade dos sujeitos que a construiram coletivamente, em condigdes sociais dadas” (lamamoto, 1998, p. 204). Seus pottadores as exprimem por meio de supottes materiais diversos, como livros, periédicos cientificos, matérias em jornais, revistas, folhetos, etc (Tarcus, 2018). Compreender, assim, a presenga e a assungio da tradi¢io marxista no Servico Social brasileiro implica, igualmente, localizar, além do proceso hist6rico, os agentes profissionais, as condigées objetivas © Digitalizado com CamScanner subjtivas mobilizadoras cle suas escolhas © agdes, seus vinculos tedricos ¢ pritico-politicos. a renovagio dos fundamentos do Servigo Social esta imbricada, portanto, & dinimica mesma da realidade brasileira, estimulando — { egmentos do espago académico e profissional a buscar novos referenciais para iuninar a peitia ea formagio profssionais, A insergio do pensamento marxista no Servigo Social brasileiro pode cer sintetizada em dois grandes momentos: o primeito esta situado entre 0 fim dos anos 1970 até o final dos 1980. © segundo momento situa-se do final dos anos 1980 aos dias atuais (Netto, 2009). O ponto de partida dessa trajetoria &, certamente, 0 Movimento de Reconceituagio desencadeado na América Latina entre 1965-1975, matco de rompimento com as premissas do tradicionalismo profissional norte-americano ¢ de afitmagio de novas bases teéricas, éticas ¢ politicas pata a profissio. Em tempos ditatoriais, a experiéncia reconceitualizadora e sua tendéncia de inspiragiio marxista nio encontrou possibilidades de florescer em solo brasileiro. Sob a autocracia burguesa, 0 Setvigo Social modernizou e renovou seu aparato técnico cientifico, sem, contudo, romper com as premissas do pensamento conservador, especialmente vinculadas 4 matriz positivista. Ainda assim, em plena ditadura militar, 0 protagonismo do grupo mineiro da Escola de Servigo Social da Universidade Catélica de Minas Gerais, entre 1972- 1975, inaugura uma forte critica ao tradicionalismo profissional, mediante a construgio de um projeto ancorado nos pressupostos marxistas, voltado 4 formacio académica ¢ aos quadros profissionais. A proposta denominada “Método de Belo Horizonte” ou “Método de sx”, mesmo que por meio de um “marxismo sem Marx”, dematca, tedrica, ideolégica e politicamente, a aproximacio do Servico Social brasileiro as ideias marxistas. Na esteira do Movimento de Reconceituacao, Vicente de Paula Faleiros 6 certamente, um dos intelectuais a ser referenciado. Em seu livro Trabajo social, ideahgia y método, publicado na Argentina em 1972 € no Brasil em 1981, com o titulo Metedologia e ideologia do trabalho social, tematiza a questio da ideologia, do Servigo Social e da pratica profissional no contexto da sociedade capitalista, com referéncias a Marx, Engels, Mao Tsé Tung, Althusser, Gramsci ¢ Poulantzas. A |3 recorréncia a Gramsci perpassa outras produgées relevantes do Servi¢o Social nesse petiodo, mediante o trabalho de Safira Bezerra Ammann, Ideologia do desenvolvimento de comunidade no Brasil (1980), com inequivocas contribuicées ao Secvigo Social nas trilhas do marxismo, pot meio de conceitos como ideologia, intelectual orginico, intelectual tradicional, classes subalternas, nacional-popular € suas mediagdes na anilise do desenvolvimento de comunidade e da atuagio dos ptofissionais a partir de uma perspectiva histético-critica. 89 Digitalizado com CamScanner 90 Entre 6 final dos anos 1970 ¢ ao longo da década seguinte, 6 pen, framsciano, que i akarn ample insergio nor debates académig can, passa, progressivamente, a ganhar um novo eStAttO Nas teflexdes tog tien? Social, abrindo possibilidades de renovagao ¢ revisio de seus referencigig te “Vig © de suas ages interventivas, Adensa os debates na apreensiin dag ay da politica, da cultura ¢ da ideologia, por meio de categorias com Be sociedade civil, sociedade politica, hegemonia, intelectuais, flosofia qq 2 classes subalternas, revolugio passiva, entre outras. 1. a partir da reeg, Pt desses referenciais que o Servigo Social se intertoga sobre questées Felativas instincias estrutural ¢ superestrutural, com problematizagdes nao stbidaat respito da esfera condmica mas também pote, ideolégicae cual ye? 2008), Ademais, a inteslocugio do Servico Social com 0 arcabougg , ‘nos anos 1980, especialmente por meio dos conceitos de Estado e socieg” civil e de superagio da perspectva estruturaista de Althusser, permit reper # compreensio meranente instrumental do Estado dos vincuos enter, social, questo social e profissio (amamoto; Carvalho, 1982). Um dos marcos referencias propulsores de insergio do pensamen, de Gramsci no Servigo Social brasileiro foi o grupo formado pelo pro dle mestrado da Pontificia Universidade Catolica do Rio de Jancito (ne 1)? sob a orientagio de Miriam Limoeiro Cardoso, em trabalhos marca, no desenvolvimento te6rico do Servigo Social no cixo da tradigio marian destacando-se 0 protagonismo nos embates travados com a verens fenomenolégica ¢ a contribuicio decisiva na ampliacao das elaboragies ds Profissio ¢ de suas bases teéricas no espectro do marxismo. O pensameno gramsciano apresentou-se como umaalternativa tanto aperspectivacconomicity presente na literatura marxista dos anos 1970, quanto & fenomenologia, qe buscava reatualizar as bases do conservadorismo na teorientagio teérica e Pritica do Servigo Social. No delineamento de novas propostas alinhadas 20 cixo da tradigio marxista, 0 aporte tedtico do comunista italiano contribuiu sobremancira para operar mudancas significativas tanto no referencial teéricn metodolégico quanto nas mediagdes com o fazer pritico-operativo © 0 compromisso com os interesses das classes subalternas. A “a maioridade intelectual” do Sexvigo Social na aproximagio 20 pensamento de Marx, contudo, ocorte, conforme analisa Netto (1991, p.275).00 inicio dos anos 1980, com 0 trabalho Legitimidadee erie do Servigo Social, de Maida 2-4 nese period a gu expeiécia com pesendoresdesenvolvida por pofasionis vines Feder do Maran, na comunidade do Bogut, etendendose posteormente x uoe ovine! 3, Destacam-se nesse pertodo os tnbilhos de Josefa Batista Lopes (1979), asia de Guadalupe Siva (1982) Row (1982), Maria Helena de Almeida Lima (1982) ¢ Alba Pinho de Carvalho (1983). May Digitalizado com CamScanner Iamamoto, apresentado como dissertagio de mestrado, e, posteriormente, a obra Relagées socais ¢ Servigo Social no Brasil, detivada da pesquisa realizada com Raul de Carvalho, demarcando uma perspectiva analitica até entio inédita no debate intelectual da profissio. 14 por meio da concepgio tedtico-metodoldgica marxiana que a instituigfio Servigo Social é pensada na totalidade da ordem bburguesa estas expresses na particulatidade brasileira, O trabalho de lamamoto ¢ Carvalho inaugura nas discussdes do Servigo Social a apreensio de categorias fundantes da obra de Marx sob o prisma da histoticidade e da totalidade da vida social: produgio ¢ reprodugio das telagées sociais, metcadoria, fetichismo, capital e trabalho, classes sociais, trazidas de modo a pensat a profisstio em seu significado s6cio-histérico, sua insersio na sociedad de classes e na divisio social e técnica do trabalho, B uma reflexio que funda no Setvigo Social brasileiro “yma abordagem histérico-sistemitica sobre a produgio e reprodugio das relagdes sociais com base em um tratamento da teotia marxiana” (Iamamoto, 2007, p. 252). Obras centrais como O capital, o inédito Capitulo vie os Grundrise, até entio ausentes nos debates do Setvico Social, passam a compor a literatura profissional, possibilitando analisar e compreender o caritter contraditério do exercicio profissional “indissociével das relagdes ¢ interesses de classes ¢ de suas relagdes com o Estado que fundam a sociedade brasileira” (lamamoto, 2007, p. 253). A pesquisa hist6rica desenvolvida por Iamamoto e Carvalho abriu caminhos inéditos no estudo do marxismo, nas investigacdes sobre a categoria trabalho, na atividade profissional enquanto trabalho, nas polémicas em torno do processo de trabalho do assistente social, mantendo-se como bibliografia obrigatotia no campo dos fundamentos do Servigo Social. O recurso a Marx em suas fontes originais e as mediagdes buscadas na obra marxiana conferiram nova qualidade e direcionamento aos fundamentos tedrico-metodolégicos do Servico Social nos anos 1980, marco decisivo € forjador do reconhecimento da profissio nos citculos e debates académicos. A apropriagio do pattiménio de Marx e da tradigio marxista acumulados nesse petiodo materializaram-se na revisio custicular de 1982 ¢ no Cédigo de Etica de 1986. No Curriculo de 1982, a preocupagio com a capacitagio tedrico- metodologica permitiu avangar no estudo do marxismo ¢ na sua apreensio | 5 como fundamento para a uma formagio profissional de base critica, de recusa a0 conservadotismo e vinculada aos interesses da classe trabalhadora, A avaliagio daquele curriculo ¢ as ptincipais tendéncias ¢ polémicas na compreensio da disciplina Metodologia do Setvigo Social foram objeto da pesquisa realizada pela Pontificia Universidade Catdlica de Sio Paulo (puc-sr) em conjunto com a aBuss, entre 1987-1988. Os resultados, consubstanciados nos Cadernas ‘Aves, n. 3, petmitiram um impostante salto qualitative no aprofundamento das perspectivas derivadas do aporte marxista, A visio tripartite — positivismo, f 3 pros absues ow soruonarpun sop on Digitalizado com CamScanner 4 fenomenologia ¢ marxismo —, bem como os esleinbe ¢ sineretismos day decorzentes,provocaram umamploe proficuo debateintelectual nacomprea. dias matrizes do conhecimento, na concepgio de teoria ¢ de metodologis inerentes e, especificamente, na unidade entre hist6ria, teotia ¢ métogy preside a formulagio marxiana, Sob fingulos diversos, as reflexdes que pany 8 referida pesquisa! adensaram 0 debate sobre a teoria social de Mary desdobramentos, a questio do método, de teotia ¢ pritica, de produgio ye conhecimento, ampliando ¢ qualificando os fundamentos do Servigo Soci, 4 diregio social a set perseguids. Gradativamente, as compreensses maryiang € manxista ganham novos adensamentos, potencializados através da produca, teérica, da pesquisa, da organizagio da categoria, de seu posicionamens, Politico e da nova diregio social assumidos para a formacio profissional,¢ amadurecimento intelectual provocado nesse processo contribuiu, decisivamente Para compreender de modo exitico as interpretagdes do marxismo vulgy € superar as leituras reducionistas, mecanicistas ¢ ideologizadas que sind, permeavam o debate e as orientacdes profissionais. A assungiio da teoria social de Marx e da tradigio marxista no processo de formagio do Servigo Social é resultante, portanto, de um conjunto de determinantes histéricos, politicos, cultutais, ideolégicos e sociais gerados no préptio movimento da sociedade brasileira e da prdpria profisio, como também das demandas € exigéncias a ela colocadas nas diferentes conjunturas. Conforme apontam os estudos de Quiroga (1991), mesmo considerando as incompreensdes da obra de Marx e de seus intérpretes, com 4 implantagao do curriculo de 1982 esse pensamento se difundiu e panhou legitimidade no processo de maturacio intelectual de seus profissionais, na aptoprtiacio tedrica e metodolégica de elementos analiticos, buscados nas fontes originais, na interlocucio € no didlogo com pesquisadores de outras areas profissionais, na ampliacio da producio, contribuindo decisivamente na “travessia para a conquista” da “maioridade intelectual” do Servico Social € de sua “cidadania académica” (lamamoto, 1998, p. 234). Einconteste queaprodugio tedrica do Servigo Social entre os anos 1980 € 1990, conforme indicamos, centrou-se na ampliagéo e no aprofundamento dos fundamentos tedrico-metodolégicos vinculados a vertente marxista. A compreensio do significado social da profissio, “enquanto especializacio do trabalho coletivo, inserido na divisio social e técnica do trabalho”, evidencia “o carater de historicidade da profissio”, situada no “quadro das que ram, Seus 4, Destacam-se 03 artigos de Nobuco Kameyama, Vicente de Paula Faleros, José Paulo Netto, Marina Maciel, rand Gee Cardoso ¢ Maris Iamamoto, que, entre outros, aprofundam o debate sobre teria socal de Marx ea a tradicio mars ena compreensio do Servigo Social (Cadethos anes, 1983). wl Digitalizado com CamScanner relagdes entre as classes ¢ destas com o Estado ¢ com 0 conjunto da sociedadle” (ABESS/CHDERSS, 1996, p. 153). A conjuntura marcada pelo fim da ditadura militar, as lutas pela democratizagio da sociedade, 0 retorno das eleigdes dietas, a elaboragio ¢ a aprovacio da Carta Constitucional de 1988 reverberaram na ditecio social assumida pela profissio, em consonincia com ‘os interesses € lutas da classe trabalhadora.' Tal posicionamento, reafirmado no Codigo de Etica de 1996, evidentemente deita raizes na tradicao marxista cena busca de sua incorporagio como fundamento tedrico-metodoldgico para a formagio profissional, E nesse proceso histérico que “o Servigo Social brasileiro construiu um projeto profissional radicalmente inovador e critico, com fundamentos histéticos € tedtico-metodolégicos hauridos na tradigio marxista, apoiado em valores e principios éticos radicalmente humanistas ¢ nas particularidades da formagio histérica do pais” (amamoto, 2009, p. 4.5), Tal projeto adquire materialidade no conjunto das regulamentagées profisionais: 0 Cédigo de Btica do Assistente Social (1993), a Lei da Regulamentacao da Profissio (1993) e as Diretrizes Curriculates norteadoras da formacao académica (aBESS/CEDEPSS, 1996). O inicio da década de 1990 demarca uma nova fase para o Servico Social brasileiro, um momento de ampliagio e adensamento do espectro de suas tendéncias tedrico-metodoldgicas e ideopoliticas. A significativa producao académica fundamentada no marxismo alargou os debates em torno de temas relativos 4 questio social, a0 capitalismo monopolista, as configuragdes do Estado brasileiro, as anélises conjunturais e ao poder institucional, as politicas e aos direitos sociais, 4 democracia, 4 cidadania, aos movimentos sociais (amamoto, 1998).° O debate marxista se entiquece ese amplia com a introdugio do pensamento dos filésofos hiingaros Gyorgy Lukacs e Agnes Heller, suas problematizagies sobte 0 cotidiano, os valores ¢ a ética, as chaves analiticas da experiéncia humana ¢ da cultura desenvolvidas por E. P. Thompson, as contribuigdes de Hobsbawm na interpretagio marxista da histéria, estruturalismo genético de Lucien Goldmann, a dialética do concreto de Karel Kosik, as obras de Florestan Fernandes, Caio Prado Junior e Octavio anni no estudo da sociedade brasileta, destacando-se 0 papel deste iltimo na formagio pés-graduada junto a puc-se. Amplia-se o aprofundamento do pensamento sgramsciano especialmente a partir do ingresso de Carlos Nelson Coutinho na Escola de Servigo Social da urn), do pensamento de Lukécs ¢ de Marx com i 5 g = corto em 1979, conbcdo como “Congreso da Vind", demarcou conservadora que determinava a diego socal da profissio, dens vinculads& exquerda © 20 pensamento eco 5. Om Congresso Brasileiro de Assistentes Soca, tum momento significa no confronto com a pespecta Contbuindodedsivament, por meio a milfs politica com {6 O denco das principis produgées dese periodo esti refereniado em Iamamoto (1998, p. 201-249), 93 Digitalizado com CamScanner 8 3 & 3 inswarpung 5 94 88 publeagbes de José Paulo Netto, Matilda Lamamoro € de Ur vast ee de professores nas diversas instituigées de ensino superior com formagig 0. Servigo Social ¢ em outras dteas como Filosofia, Sociologia ¢ ( Aencia Polite través de tais sujeitos, obras de reconhecidos pensadores marxistas ing: ‘ Pitada, em Marx, Gramsci ¢ Lukiies fomentaram ¢ ampliaram Proxtugdes do Servi Social, adensando os fundamentos tedricos, éticos e politicos de vitiag pn” s Funda i erage, dle profisionais formadas nos cursos de geacuagio € de pés-praduagan i intimeros centros de formagio universitiria em todo o pais, A ampliagio do debate marxista dos anos 1990 aos 2000: 0 Servigo Social “contra a corrente” As profundas mudangas desencadendas nas trés tltimas décadas dy Século xs, sob a mundializagio do capital e da hegemonia neoliberal, nio Subverteram apenas as formas de segulagio da economia e do Estado, ma Provocaram alteragdes de grande impacto em diferentes esferas da’ vide Social. Da economia & politica, da cultura a ideologia, os novos padrdes de Sociabilidade desafiaram implacavelmente 0 conhecimento ¢ os modelos de interpretagio do mundo voltados a construir, a partic da préxis, uma nove ordem societisia. Os embates em torno da chamada “crise dos paradigmas ou das “grandes natrativas” € o proclamado fim das ideologias ¢ das utopias colocaram em xeque o projeto da modernidade ¢ os sistemas globalizantes de explicagio da vida social. A tazio dialética, até entio afirmada como um conhecimento que é também ferramenta de luta politica e social e, portant, de transformagio revolucionitia da sociedade, é desqualificada em favor das tendéncias pés-modernas e de sua contraposicio 20 marxismo, Fatos histéricos marcantes agravaram essa conjuntura, como a derrocada da experiéncia do Leste europeu e a ruina do chamado “matxismo-leninismo”, comprometendo o projeto socialista enquanto alternativa a ordem do capita, O entendimento da crise do “socialismo real” e da desintegracio da Unio Soviética como sindnimos de obsolescéncia do marxismo disseminou a ideia de exaurimento do seu pattiménio categotial “expresso nos textos dos ‘clissicos’ e na grande variedade de leituras deles decorrentes” (Coutinho, 1998, p. 23). A confrontagio a tais argumentos tequereu, nos anos 1990, esforsos tedticos e politicos na teafitmacio dos valores e principios do projeto socialista otigindtios de Marx, situados para além do bolchevismo e nio invalidados Digitalizado com CamScanner are 0 colapso do comunismo sovictico, Ademais, as marcas desse tempo pistxico, a0 favorecerem & aparente vit6ria do capitalismo, fortalecida pelo” spectro do “fir dn a ¢ das ideologias, do arrefecimento dos grandes suptos soca € das grandes narrativas,tornaram as relages mereantis © novo fas da sociabilidade humana. Ao lado do processo de anu financetizagio da economia, a ldgica destrutiva do capital, associada A ideologia neoliberal, agravaram a situagio de desigualdade, o crescimento da pobreza e a idesresponsebilizagio do Estado em face da questio social, No curso do que ja vinha ocorrendo nos paises de capitalismo — ¢ avangado, a onda neoliberal chegou ao Brasil no inicio dos anos 1990 e, sob 1 insignia da modernizagio econdmica ¢ da insercio do pais nova ordem mundial, agilizaram-se os processos de ajuste estrutural, de redefinigio dos papéis ¢ fungdes do Estado ¢ de sua submissao aos interesses dos grupos dominantes nacionais ¢ internacionais, Privatizaram-se bens ¢ servigos = piblicos, desmontaram-se as legislagdes de protecio social, precarizaram- se os contratos de trabalho, aumentando os niveis de desemprego, de exploragio ¢ de exptoptiacio das classes subalternas. E justamente nesse cendrio de dominacio do capital sob a ética neoliberal e na “contracorrente” da chamada crise do marxismo e do projeto socialista que 0 Servigo Social desencadeia, no inicio dos anos 1990, um novo processo de revisio curricular, culminado com o documento das Diretrizes Curriculares, aprovadas pela aBEPSs e pelo conjunto das unidades de ensino em 1996. Tal proposta traduz o amadurecimento intelectual da categoria, resultado da sua trajetéria de lutas, tendo como marcos referenciais 0 Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais (CBAs), realizado em 1979, as bases € os avancos obtidos com o Curriculo de 1982 e o Cédigo de Etica de 1993, radicados em uma perspectiva histérico-critica e de assuncio de um projeto profissional vinculado as demandas e interesses da classe trabalhadora. As premissas te6rico-metodolégicas e ético-politicas, no eixo da tradicio marxista, enunciam-se no entendimento de que “a formagio profissional tem na questio social sua base de fundamentagio sécio- historica, o que Ihe confere um estatuto de elemento central e constitutivo da relagio entre a profisstio e a realidade social” (aBESS/CDEPSS, 1996, 154), E, para tal, reivindica um conjunto de conhecimentos transversais logica curricular, necessatios ao “trato rigoroso da questio social ¢ de suas Patticularidades na realidade social, o trabalho ¢ a ética em uma perspectiva Ontolégica”, bem como de “categorias assentadas em uma perspectiva critica © dialética”. Delineia-se o perfil profissional almejado com capacitagio teérico-metodolégica, ético-politica e técnico-operativa para a apreensio do Proceso histérico como totalidade (aBEss/CEDEPSS, 1996). Wializagio © de 95 Digitalizado com CamScanner 96, Do final dos anos 1980 € a0 longo dos anos 1990, t8é5 grande, tenuléncias marxistas podem ser identiicadas nos debates do Servigo Soci anhando densidade © desdobramentos com as requisighes postar peg. diretrizes curticulates de 1996, Nos niveis de graduagio € de pés-graduagin, g, Pensamentos de Marx, Gramsci e Lukics ocuparam centralidade nas diseyse, relativas As esferas da economia, da politica, da cultura e da deologia. Ampliarare se as reflexdes com as obras de José Paulo Netto, a saber, Ditadurae Seri Soa (1991) ¢ Cuapitalima monapalicae Srvga Social(1992), trabalhos de clara inspinaca, tna teoria social de Marx e nas categorias lukacsianas, As duas obras ancoram. em “fina sustentagio tedrico-metodologica” na abordagem da historia brasil € na dindmica da expansio monopolista mundial, na anilise da estrutura interns do Servigo Social sua interlocugio com o pensamento social da modernidade, especialmente vinculados & tradigio eritico-dilética (amamoto, 2007, p, 264, As teflexdes de Netto ¢ lamamoto constituem-se, indubitavelmente, em obras obrigatérias ¢ indispensiveis no campo dos fundamentos do Servico Social no eixo da tradigio marxista, Rigorosamente pautadas no método ctitieg. dialético © com um amplo e rico arsenal de categorias, tais obras condensam elementos imprescindiveis a compreensio das determinagdes hist6rico-sociais ¢ ideoculturais do Servigo Social, sua reorientagao tedrica e politica ancorada no patrimdnio categorial marxiano e marxista, A intensa produgio desses autores a0 longo dos anos 1990 ¢ 2000 adensa a literatura profissional no cixo da tradicio marxista, com abordagens e contribuigdes no estudo do método, do conjunto da obra de Marx e de seus grandes intérpretes veiculados no universo do Servigo Social brasileiro, de aportes & compreensio da conjuntura nacional ¢ internacional, das mudangas societirias, dos desafios & formagio ¢ & pritica profissionais, & pesquisa e a produgio de conhecimentos. © cuidadoso balango realizado por Iamamoto (2007, p. 213) sobre a produgio académica do Servico Social brasileito entre os anos 1980 e 2000 atesta a ittadiagéo da teoria social critica no campo dos fundamentos da profissio em suas “dimensdes hist6ricas, tedrico-metodologicas e éticas”, especialmente no aprofundamento de temas como capitalismo monopolista, identidade € alienagio, relagdes de forca, politicas sociais, protesao e assisténcia social, hegemonia ¢ organizagao da cultura. Na intetlocucio com o amplo arcabougo marxista, ptossegue ¢ amplia-se a recorréncia as obras de Marx, Gramsci € Lukes’ no trato do Servigo Social e das diversas expresses da “questio social” 1. Ao longo dos anos 1990 «200, rept amp peng do Serio Soci funda a dio mari, smo de extrem complexidade tmzer neste espago uma listagem completa. Na bibliografa adotada na grande mors m= Ssciptinas doy eros de Serio Sec enretntedestcamse Marl (HH, Bond at (198, ee O79. Mota (1998, Caden (198), Sion (195), Gucre(199) Bro (196), Pre 200, etn G3. Digitalizado com CamScanner No final dos anos 1990, expande-se a influéncia lukacsiana no recurso A ontologia do set social, jé presente no Cédigo de Titica de 1993, fortalecendo fo compromisso da profissio com as classes subalternas ¢ “com valotes ético- liticos emancipadores” referidos A plena conquista da liberdade (Barroco, 2001, p. 200). © novo campo de intetlocugio do Servigo Social com o pensamento Tukacsiano ganha novos adensamentos nas duas tiltimas décadas, conforme revela a detalhada pesquisa de Adtianyce de Sousa (2010). O debate aberto com as Diretrizes Curriculares, na concepgio do Servigo Social como trabalho, bem como a fundamentagio filoséfica presente no Cédigo de Stica, fomentaram novas tendéncias investigativas ¢ produgdes do Servico Social, especialmente sobre a centtalidade do trabalho, categoria fundante da sociabilidade humana. As pesquisas sobre o mundo do trabalho, a agudizagio da questio social, a movimentagio das classes sociais e de novas dindmicas de lutas, a reafitmago do método marxista e de seus fundamentos para a compreensio das contradicdes da sociedade burguesa contemporinea € os desafios postos a0 Servico Social, tém impulsionado um arco de investigacées vinculado a0 estudo e ao aprofundamento da obra do marxista htingaro. As contribuigdes lukascianas na interpretaco e na retomada da teoria social de ‘Marx como uma “ontologia do ser social”, a concepgio de praxis, a tematizacio da ideologia, do estranhamento, da vida cotidiana ¢ da seificagio das telacdes sociais, as expressdes da decadéncia ideolégica, do irracionalismo, sio temas que tém alargado as bases de teflexio tedrica e os fundamentos do Servigo Social (Lessa, 1996; Barroco, 2008; Silva, 2013; Lara, 2017). Tanto na literatura publicada quanto nos grupos de pesquisa, além dos eixos acima, identifica-se, nos anos 2000, um significative crescimento de produgdes vinculadas ao tema do trabalho, suas expresses e transformagdes no capitalismo monopolista mundializado, a nova morfologia da classe trabalhadora, como também o trabalho profissional do Servico Social no ambito das politicas ¢ programas sociais, suas formas de assalariamento e precarizagio. Intensificaram- se 0 estudos acerca de categorias centtais da critica da economia politica na compreensio da questo social e do trabalho na dinamica capitalista, como a teoria do valor trabalho, mais-valot, superpopulagio ¢ pauperismo, As relagdes a ep pops ase 8. Fem Relaio do Grupo Temitio de Pesquis: Trabalho, Questio Sociale Servigo Socal/ansrs, no peviodo 2012/2014, ‘levantamento do grupos de pesquisa e produgSes dervadhs de trabalhos a pés-graduagio (dssrtadese tees indion ‘um "aprofundamento de estudos sobre o texbalho e questo social nos mareos da tdigho maraista” Amara ff 2015, 326) Conforme analiza Soura (2010), a ampiagio do debate edo conhecimento da oben de Lakes, nas das itimas Aecadas, fro da imerlocugto gestada aos expigos académicos, nos nicleos de pesquisa, especialmente os siuados a Pontificia Universidade Catden de Sto Paulo (PCs), na Universidade Feder! de Alagoas (vat), ma Universidade Federal do Rio de Jancio (or) e, mais recentemente, na Universidade Federal de Santa Catarina (Ur), do dillog sberto com ovtrs ica académicas¢ com intlecttis, a exerplo de Carlos Nelson Coutinho Sérgio Lessa ¢ Ricardo Anrunes, bem como de pensadores vinculados a Lukies e inradwsidos no imbito dos debates do Servigo Soca, como Isevin Mésziros, Nicols Terran, Antonino Ineanca, par ear alguns 97 Digitalizado com CamScanner erntie trabalho e “questo sovial periniten feHtiNE WS FOAMAS Hay Quay question social se expresnn na teatiade (aniséria, pobreea, fome, dese Prey, piven co taal et.), como “testo vivklos pelt chasse abate fo processe dle acumnmulagio capitalistn’® (Lane ef, 2005, p. 87), Dambem o pensamento de Gramsel yanba densidade no dlos fundamentos do Servigo Social, dos anos 1990 aos 2000, ¢ mo aprotundamiente aly estado de stay obras, aa esteint das proticus retlegoce emengiclas na vada anterior, o maryista sano gana novos desdobramentes © se apresenta na attalidade como teterencial ineonteste nas produgdes dy Servigo Social!Amptiaramse as inveatigagdes de Corte te6rieo © empiticg, fomando © pensamento de Gramset como objeto de estudo ¢ alarganda two ake medlagdes dle sew apatato eategorial, com tenndticas vinculadas ae aliversas dlemtandas profisionalss Conforme pesquists realizadas por Negi 2016) ¢ Silva 2017)" categorias como Kstado, sociedad politica, s civil, hegemonia, classes subalternas, ideologia, ameticanismo, iedade fordismo, fevolugdo passiva, aneera de movimento, guernt de posigdes, entre outnas, sig abordadas tanto do ponto de vista tedrico, como suporte para anilis 's telativas. AOS Processes macrossociais ¢ ao cenitio conjuntural brasileiro, quanto de de mediagdes As pautas politica © interventiva da profissie. As formulagdes denotam o aprotundamento de estudos abarcando as telagdes entre economia © politica, esteutura ¢ superestrutuna, a movimentagio dis classes sociais no pital (ccondmica e polftica) e us transformagdes societitias dela decorrentes, Os temas centeais que perpassan as produgdes remet quadro da etise orginiea do ca nao desvendamento da dinamica das relag ho campo das polit nizagio dae ss entre Hstado ¢ sociedade 8 direitos sociais, na mobilizagio se trabalhadora, dos movimentos sociais ¢ das diversas la questio social na contemporaneidade, Laas eXprEssd ena or refragde \ tue dos fundamentos marxistas © da perspective a cod mi avanga sumida no Projeto s teflexdes ¢ a interlocugio com a na teorizagio das diversas expressdes s historicamente vinculados d profissiio, A anilise das politicas soviais yanhou nova densidade a partir do enfoque dialético, centrda no somente a partir de suas manifestagdes imediatas, mas “situadas como lide” (Behring, Boschetti, 2006, p. 44), levando Euico-politico Profissional, a marura economia politica possibilitar «la questio social e de tema expresso contnaditéria da te 9 puedes de Cah (1995), Stats (1S), Neu 2, Danguet (2007, wa noes de N nave do Servo Soca an fant 6 eae den «pli es Rais Kat, Sg Sa > Seda "i eS 207) pest psig tea acana ver de tun) sale scons de Grams no Poytamas des Gia peta TO 2018 paar mF 4 2010) analsn wn ped de eralse tnas do vrs sexta os| Digitalizado com CamScanner conta # naturens do capitaismo, © papel do Fstado © das classes soci. or nats pespectvas marist prxlugio fedrica esse campo tem abarcado Caos volados A ecuperagio do processo de constiigioe desenvolvimento sie pales soca 0 Brasil de maneita mais aprofundada, como também os entos determinados pela agenda neoliberal e pelas esteatégias Ff camilago capitalsta, Aprofundaram-se os estudos sobre a Seguridade ‘cal no Ambito das contrarreformas ¢ da desresponsabilizagio do Estado, os de privatizagio, dos destinos do fundo publico, da precarizagio » de direitos sociais, Sob o enfoque eritico-cialético, as politicas socisis,akém da fundamentago buseada em Marx, Gramsci e Lukées, foram fematizadas no fuleto das contribuigdes de um vasto campo de marxistas, como Mandel, Harvey, Chesnais, Mészéros, Abrahamson, Gough, Mishta, Titmuss" cave outros. A necessidacle de compreensio da formagio sécio-historica da sociedade brasileira, indicada nos nicleos de fundamentagio provocou, ainda, 0 alargamento do espectro bibliogtifico a partic de autores brasileiros do campo marsista, como Caio Prado Junior, Florestan Fernandes, Octavio Tanni, José de Souza Martins, entre outros. Nos anos 2000, o aprofandamento de estudos sobre a América Latina tem fomentado pesquisas sobre os temas da dependéncia edo subdesenvolvimento dos paises latino-americanos no contexto da politica e daeconomia mundiais. Autores como Ruy Mauto Matini, Theoténio dos Santos ¢ Vania Bambirra sio introduzidos em cursos de Setvigo Social, com destaque para a pés-graduagio, no estudo da teoria marxista da dependéncia, como um ovo marco de interpretagio dos principais elementos tedticos e analiticos i compreensio do desenvolvimento capitaista ¢ suas particulatidades no continente latino-americano (Paiva, Rocha, Carraro, 2010). ‘As diferentes perspectivas marxistas tomadas como fundamentos para o Servigo Social tém langado Iuzes a compreensio da profissio na divisio social e técnica do trabalho, aprimoron o conhecimento ea critica a0 conservadorismo, desvendando as expressdes da questio social em tempos de “capital fetiche”, destindando as engrenagens do sistema capitalista e do Estado, suas contradigées na getacio da riqueza e da pobreza, a movimentagio € a correlagio de forgas entre as classes sociais na afirmagio de diteitos € 4 de participagio politica, sem ptescindir do aptopriado instrumental técnico- operative. A visio pragmética e neutta dos instrumentos do trabalho profissional, submetida 4 andlise critico-dialética (Guerra, 1995), ampliou a compreensio da dimensio técnico-operativa ¢ de sua instrumentalidade, tendo presente que “toda técnica tem subjacente uma légica, uma explicacio tedtica €coloca uma dada teoria em movimento” (Guetta, 2016, p. 305). em moves direclonanne dos process ¢-da redg A 11, O debate anglo saxo e dinamanqués pode ser encontrado expecainente es PereirsPecin (200) 99. Digitalizado com CamScanner Oconhecimento produzidoa partirdas apreensdes marxistas ganhou, além, disso, novas dimensdes por meio dos cursos de pos-graduagio, formando umg massa critica de profissionais e pesquisadores que, através de produgdes expressas em dissertagdes de mestrado, teses de doutorado, publicagdes em livros, artigos c trabalhos em congressos cientificos, vem adensando a bibliografia profissional, fortalecendo © Servigo Social como Area de conhecimento ¢ qualificando as agdes nos diferentes espagos ocupacionais, Os cursos de pos-graduagio /ato sengy, organizados pelo crtss nas edigdes de 1999 e 2009, na modalidade & distancia, em, parceria com a UNB, contribuiram com contetidos relevantes a0 Setvigo Social no eixo da tradiciio marxista, abordando temas relativos a politica social, formacio ¢ exercicio profissional, projeto ético-politico, historia da profissio e seus desafios contemporineos. Destaca-se ainda o protagonismo das principais entidades da categoria aBEPSS, Conjunto CPESS/CRESS, ENESSO € a dire¢ao tedrico-politica impressa nos debates, na socializagio de conhecimentos, na disseminacio da Perspectiva critica em diferentes fSruns, espacos institucionais e profissionais, junto aos movimentos sociais e organizagées coletivas de participagio e controle democratico das politicas sociai A vertente marxista tem impulsionado a investigacZo de um amplo leque de tematicas direta ¢ indiretamente vinculadas a0 Servi¢o Social e estimulado a formacio de grupos de pesquisadores em diversas regides do pais, integrados por uma nova geracao de intelectuais insetidos na academia, com formacio pés-graduada, bem como mestres e doutores nao necessariamente vinculados 4 docéncia, com insergio na pritica diteta, conferindo uma nova qualidade a0 trabalho profissional, Sao intimeras as formas de abordagem e fundamentacio no marxismo, nas investigages de corte histérico e empitico, na compreensio da particularidade brasileira, nas diferentes express6es da questio social, a exemplo das produgées sobre feminismo e movimento feminista, abarcando conceitos de género, patriarcado, relagdes sociais de sexo e divisio sexual do trabalho, conforme dados da pesquisa realizada junto aos programas de pés- graduagio em Setvigo Social por Duriguetto ¢ Alagoano (2018). Do inicio dos anos 1990 adentrando os anos 2000, ampliou-se a produgio do 3] __ Setvico Social no Ambito do marxismo, a partir de Manx e da tradigio marxista, tanto na discussio tedrica quanto nas mediagSes com o fazer profissional. Se hé avangos objetivos indiscutiveis nessa trajetéria, contudo, ainda sio apontadas iniimeras fragilidades. Os documentos produzidos pelo Grp Servico Social: Fundamentos, Formacio ¢ Trabalho Profissional, em diversos momentos de avaliacio apontam “a frigil associagio entre os fundamentos histéricos e teérico-metodolégicos do Servigo Social — apoiados na teoria social marxista—e o trabalho social cotidiano, cujas mediag6es” ainda nao tém sido “suficientemente privilegiadas pela pesquisa ¢ pela produgio tedrica da categoria profissional” (apepss, 2018). 100 Digitalizado com CamScanner B certo que a produgéo intelectual no tem, necessariamente, uma aplicagio direta ¢ imediata ais agdes profissionaie” ‘ compreensio meciinicn “du relagio entre teoria e prit da ientidade ov da complementatidade, subtraindo desta a relagio de unidade” (Mota, 2013, p. 19). Assim, o Servigo Social no se explica a partir de si proprio, ¢ certamente toda a produgio teética, mesmo nko vinculada diretamente 20 cotidiano profissional, oferece contribuigdes essenciais compreensio dos fendmenos particulates ¢ das agdes requeridas nos diversos espagos de insergio, através das mediagées necessétias para reconstruir suas particularidades (Silva, 2013), Tais mediagSes, no entanto, “necessitam ser aproptiadas ¢ elaboradas pelos agentes profissionais — seja no nivel da producto intelectual, seja no das estratégias de acéo”, e traduzir-se em “respostas teéticas € técnico-politicns is demandas emergentes naquele campo de possibilidades” (amamoto, 1998, p, 204). Isso no significa fortalecer a razao instrumental e pés-moderna vinculada ao pragmatismo € a0 utilitarismo, mas ter como horizonte que “[..] quando nos teferimos 4 pritica, nfo queremos dizer uma pritica pragmitica, bem 20 modo burgués, mas uma pritica que tenha telacio direta com a préxis sovial entendida como campo de possibilidades da transformacio social” (Lara, 2011, p. 201). E sea transformagio social nao é tarefa de uma profissio, é sempre mister retomar 08 fios que unem os projetos profissionais aos projetos societitios. A breve trajetéria aqui apresentada sobre as tendéncias marxistas presentes nos fundamentos do Servi¢o Social permite indicar alguns elementos de sintese: a) a significativa presenca do marxismo como base tedtica na literatura do Servico Social e o alargamento dos temas de interlocuco; b) a qualificagio dos estudos com maior rigor na abordagem dos pensadores classicos, destacando-se Marx, Engels, Lénin, Gramsci e Lukics, especialmente nos cursos de pés-graduacio, conforme dados da Capes constantes na Plataforma Sucupira; c) a ampliagio ea incorporacio da literarura contemporiinea vinculada 4 vertente marxista de pensadores brasileiros e estrangeiros, estabelecendo novos eixos analiticos como fundamentos para 0 Servigo Social; d) a maior presenca de textos marxistas nas disciplinas de graduagio dos cursos oferecidos em universidades pblicas © comunititias € a quase toral auséncia naqueles de modalidade sequencial a distancia; e) a ampliagio dos temas de pesquisa no eixo da tradi¢io marxista, conforme dados do Diretério de Grupos de Pesquisa do cng; f) as tendéncias marxistas identificadas na produsio do Servigo Social, cexne dos fundamentos tebtico-metodolégicos, atribuem um estatuto académico € profissional ctitico, fortalecendo o compromisso com a uta dos trabalhadozes, a defesa intransigente de valores como a liberdade, a igualdade, a justica social, a afirmagio dos direitos de cidadania e a tadicalizagao da democracia (Closs, 2015; Goin, 2016). + 0 que indicaria uma ica, sob 0 argumento 5 101 Digitalizado com CamScanner ‘A atualidade do marxismo: 0 Servigo Social posto 4 prova Um breve balanco da trajetéria de construgao das bases teéricas ¢ metodoligicas do Servigo Social inspirada na tradigio marxista permitg + asseveraro seu adensamento nas trés iltimas décadas, a despeito da conjunturg adversa de avango ¢ reatualizagio do conservadorismo € de assungig do Pensamento pos-moderno como “novo paradigma” assumido em bo, parte das Cigneias Humanas ¢ Sociais. A escalada reacionéria, entretanto, fomentada por décadas de neoliberalismo ¢ de hegemonia burguesa, very produzindo um “brutal esvaziamento da compreensio critica da sociedade” (Mota; Amaral, 2016, p. 31), das formas de ver ¢ analisar 0 mundo, que atinge © conjunto das priticas particulares das diferentes profissdes ¢ de seu modo de intervir concretamente para a transformagao social. Somam. € aqui as estratégias ¢ requisigdes do grande capital junto a0 Estado ng conducio das contrarreformas no campo das politicas sociais, na reducio de direitos e na radicalizagio das formas de exploragio. Merece destaque a contrarreforma do ensino superior e sua perspectiva mercadolégica no desmonte da universidade publica ¢ nos caminhos abertos & sua ampla privatizagio. Além disso, a fragmentacio da formacio universitiria em geral, o avango da expansio do ensino a distincia, a precarizagio dos cursos presenciais, tanto em relagio as condigées de trabalho do corpo docente quanto aos equipamentos institucionais, a flexibilizacio dos curriculos ¢ a reducio dos contetidos em nome da modernizacio capitalista reverberam, de modo contundente, na formacio profissional. Em relacéo a0 Servico Social, as condigdes se agravam mediante as substantivas alteragdes das Diretrizes Curriculares, em 2001, pelo Conselho Nacional de Educagio (ext), especialmente no que tange & diregdo tebrica e ético-politica. Agrega- se a esse espectro a reforma do Ensino Médio, a centralidade na formacio técnica em detrimento da formacio humanistica, expressa na extincio da obrigatoriedade do oferecimento de disciplinas como Sociologia ¢ Filosofia, 2 © que repercutira no perfil dos estudantes que ascendem A universidade. Em tempos de acirramento da ofensiva conservadora, a fundamentagio teOrica marxista vem sendo continua e cotidianamente confrontada. A perseguicio ideolégica € a censura a professores € nticleos de estudos ¢ pesquisa orientados pela tradicio marxista que ocorte atualmente no Brasil em varias universidades, especialmente apds os eventos de 2013, particularmente, com a escalada reacion‘ria fortalecida a partit do golpe juridico-parlamentar de 2016, exigem vigilincia constante e construgiio de estratégias de luta e de Digitalizado com CamScanner resistencia Nos planos tedrico ¢ Pritico-politico, Atento a essa conjuntura € § » compromisso da profissio com seus principios nortendores ¢ a ditegio social assumida, 0 Servigo Social vem travando sua luta na teafitmagio da perspectiva te6rico-critica vineulada a0 reconhecimento da liberdade, da Ponomia, da emancipagio plena dos individuos a0 da defes ag intransigente dos) ieeitos humanos ¢ sociais, do aprofundamento ¢ consolidagio da cidadania | ; ieee ; | da democracia, da socializagio da participagio politica, dos bens culturais € | da riqueza produzida, do posicionamento em favor da igualdade e da justiga, da universalidade no acesso a bens e servicos, do empenho na eliminacio de todas as formas de preconceito, da garantia ao pluralismo 20 compromisso cress, 1993). Se_na tradi¢io marxista sio encontrados elementos superados ¢/ : ow insuficientes para esclarecer os problemas com que seguimos nos deparando no século x1, a heranga tedrica de Marx e seu método de pesquisa permanecem como instrumentos essenciais “para a apreensio da ordem social contemporinea”, 0 que nfo exclui “a retificagio do que se tornou anacrénico, nem a interlocucio com outras correntes de pensamento” (Netto, 1991, p. 18). O aprofundamento do processo de exploracio capitalista e do acirramento da ofensiva burguesa em suas expressdes no presente século exigem, contudo, além dos textos marxianos, o permanente didlogo com as contribuigdes da tradigio marxista, através do arco de intelectuais preocupados em aprofundar a critica a0 atual ptojeto de sociedade, os mecanismos contemporineos de exploracio da forca de trabalho e os efeitos desse proceso sobre as novas formas de gestio e de reprodugio e suas consequéncias para a classe trabalhadora (na satide do trabalhador, nas relacdes de género, etc.), bem como as estratégias organizativas de luta e de resisténcia (Mota; Amaral; Peruzzo, 2010). A continuidade da interlocugao com as perspectivas tedricas e analiticas dos marxistas contemporineos tem possibilitado captar as novas expressdes dos fendmenos sociais nao presentes 4 época de Marx, Engels, Lénin, Gramsci ¢ Lukics, 0 que exige, certamente, reconhecer ¢ capitalizar 0 patriménio te6rico acumulado e renova-lo frente As novas questdes postas pelo processo civilizatorio. Na licida andlise de Hobsbawm (1989, p. 63-64), 3 com a qualidade dos setvigos enquanto o capitalismo sequer critica, © marxismo pode ser transformado, mas é improvavel que desaparesa (.);é extremamente improvivel que 0 posto obtido por Marx no universo intelectual de nosso século, 0 estimulo encontrado por muitos intelectuais no marxismo € 25 discussdes desenvolvidas em torno dele niko prossigam no futuro, a menos que sejam destruidos todos os livros uw a civlizagio humana aniquilada em sua forma atual. 103 Digitalizado com CamScanner 5 104 No que concerne ao Setvigo Social, através do marxismo aprimoramog nossa capacidade analitica para entender as estruturas basicas do capitalism, analisat ¢ explicar as bases sociais que sustentam a profissio na divisto social € técnica do trabalho, como especializagao do trabalho coletivo, enfrentar ¢ contrapor-se ao conservadorismo (Netto, 1989; lamamoto, 2007) que perfil 8 embates profissionais desde o Movimento de Reconceituagao. B justamente 0 confronto ao pensamento conservador que 0 Servigo Social construiy a “proposta de formagio constante nas diretrizes curriculares, fundada nq teoria critica marxiana ¢ em suas categorias centrais: totalidade, historicidade, contradigio, mediagio ¢ multideterminagio dos fendmenos”, assumindo “ética ¢ politicamente 0 compromisso profissional com a classe trabalhadora © com movimentos e lutas sociais, na perspectiva da emancipagio humana”, tecusando “todas as formas de conservadorismo, de exploragao, opressio ¢ disctiminagio” (Boschetti, 2015, p. 641-642). A continuidade na formacio de uma massa critica, todavia, ¢ indispensvel 4 qualificagio dos quadros profissionais. Seguindo as pistas de Netto (2009), 0 profissional, mesmo nao sendo um pesquisador, precisa ter uma visio global da dindmica social, do conhecimento do modo de produgio capitalista, de sua particularizagio na formaco social brasileira, da natureza de classe do Estado e da nossa estrutura social, [-] 0 profissional precisa encontrar as ptincipais mediagdes que vinculam 0 problema especifico com que se ocupa com as expresses _gerais assumidas pela “questo social” no Brasil contemporineo e com as varias politicas socinis (puiblicas e privadas) que se propdem a enfrenti-ls.[..] éindispensivel para o profissional contextualizar 4 sua intervengio; ¢ a determinacio daquelas mediagées possibilita apteender o alcance e os limites da sua préptia atividade profissional [-.] necessirias & compreensio e encaminhamento de estratégias em seus diferentes espacos de atvagio seja no planejamento, na gestio € nna execugio, (Netto, 2009, p. 265) A ideia de que ha uma vanguarda desconexa dos profissionais requet “destruir o preconceito [..] de que a filosofia é algo muito dificil pelo fato de ser a atividade intelectual propria de uma determinada categoria de cientistas especializados ou de fildsofos profissionais e sisteméticos” (Gramsci, 1999, p- 93). A organicidade de um pensamento ¢ a solidez cultural ocorrem, contudo, se houver “a mesma unidade que deve existir entre teotia e pritica”, isto & se 0s intelectuais se mantiverem organicamente vinculados as massas, part claborar ¢ tornar coerente os problemas que as estas colocam a partir de sua atividade pratica, formando, assim, “um bloco cultural e social” (Gramsci, 1999, p. 100), Trata-se, pois, na esteisa de Gramsci (1999, p. 101), de ampliar Digitalizado com CamScanner as possblidades de difustio do conhecimento elaborado, tornando-o senso comum, contribuindo permanentemente para a “superagio da maneira de precedente ¢ do pensamento conereto existente” [Jj niio se trata de ensat procuzit ex now uma ciéncia individual na vida de ‘todos’, mas de inovar € tomar ‘ceca uma atividade jf existente’, de “criar uma unidade ideoldgica nie o baixo € 0 alto, entre os ‘simples’ e os intelectuais” (Gramsci, 1999, p. 101), Esta é a tarefa da “filosofia da praxis”, ou seja, do marxismo (Gramsci, 5 1999, p- 99). nessa trilha que as vanguardas tém buscado caminhar junto os profissionais nos féruns, nos espagos de discussio © na socializagio do conhecimento. Desempenham um papel importante em eventos como CBASS, foruns regionais ¢ locais, o projeto aBerss itinerante atticulado As UFA’s,a ENESSO, os CRESS € © CFRSS, como estratégias na defesa da formacio profissional de qualidade comprometida criticamente. Sio iniciativas voltadas a impulsionar a vinculagio da massa critica As bases profissionais, reforcando a légica e os principios das ditetrizes curticulares (asePss, 2018). & Consideragdes finais acervo de conhecimentos construfdos a partir da interlocugio do Servico Social com a tradigiio marxista carece de fortalecimento ante o avango da ofensiva neoconservadora que vem se enraizando na realidade brasileira, disseminando-se na economia, na politica, na cultura e atingindo tanto as bases teéticas quanto a dimensio interventiva da profissio (Mota; Amaral, 2016). Diante de tal conjuntura adversa, ampliar, fortalecer € consolidar as bases teéticas do projeto de formagio profissional centrado nos fundamentos da tradigio marxista e assegurar as conquistas construdas ao longo das tltimas décadas colocam-nos diante de intimeros desafios exigéncias, entre eles: + Fortalecer a qualidade do ensino de graduagio presencial, 3 mediante rigorosa formacio tedrico-metodol6gica, conforme 05 ptessupostos € principios estabelecidos nas Diretrizes Cutriculates do projeto original da apnpss, aprovado pelo conjunto da categoria. + Investir e acompanhar a formacio académica ante a expansio do ensino superior privado e da graduagio @ distancia no pais, com iniciativas como a ABEPS itinerante ¢ 0 trabalho dos GTPs. 105 Digitalizado com CamScanner

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