VAROU: MEU AMIGO MEU MESTRE
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- José Castellani -
Há 23 anos, em 1966, tiv-e (i}
privilégio de conhecer um dos ho-
mens de maior importância para
a Maçonaria Brasileira, em todos
os tempos: Theobaldo Varoli
Filho.
Conheci-o num Congresso Ma-
çônico na cidade de São Carlos
(SP), na Loja "Eterno Segredo",
onde eu apresentei um trabalho.
numa sessão por ele presidida;
foi a primeira vez que tivemos
um fraternal "arranca-rabo"
cultural, pois ele discordou de
alguns conceitos por mim emiti-
dos e isso rendeu mais de uma
hora de salutar polemização e
esclarecedor debate. A admira.'
ção mútua nasceu nesse dia: foi
"amor (maçônico) à primeira
vista" .
Logo depois, em 1967, éramos
companheiros de secretariado do
Grande Oriente de São Paulo,
quando o Grão-Mestre era o Ir.'.
José Menezes [únior: Varolí como
Grande Secretário de Inspeção de
Liturgia e Ritualística e eu como
Grande Secretário Adjunto de
Coordenação e Planejamento.
Em 1969, com a ascenção do
Ir.'. Danilo José Fernandes ao
Grão-Mestrado, continuamos co-
mo secretãrios, ió que. enquanto
ele continuava na .mesma "Pasta",
eu assumia a Grande Secretaria
de Relações de Cultura.
Mas eu já fazia as minhas
incursões na ritualística, onde
Varolí reinava, como soberano
incontestável; nas quatro circu-
lares culturais que eu emitia,
mensalmente, costumava, às ve-
zes, abordar algum assunto ritua-
lístico e ele branqueava, frater-
nalmente, mais na base da goza·
ção, dizendo que eu estava inva-
I
dindo seara alheia; e eu retrucava
que cultura englobava tudo, in-
clusive a rituaIística.
Saindo das reuniões do secre-
tariado e do Conselho Estadual.
eu o levava em casa, na Frei
Caneca, e nós ficávamos em fren-
te ao prédio onde ele residia,
dentro do carro, até duas ou três
horas da madrugada, debatendo
assuntos maçônicos, discutindo
ritualística e "quebrando o pau",
no bom sentido. Data dessa épo-
ca, a nossa luta comum pela pu-
reza ritualística, pelos rituais sem
deturpações e pela uniformiza-
ção dos trabalhos das Lojas; é
claro que eu era um mero coadju-
vante, um arbusto raquítico nu-
trindo-se da seiva extravasada do
rijo jequitibâ. Mas era um prazer
e uma honra ser .escudeiro" do
Varoli; apesar de algumas diver-
gências em torno de alguns assun-
tos, eu sempre o considerei meu
mestre e meu modelo de maçom
integral.
Depois. veio a crise de 71 e 72,
seguida pela cisão de 73 e nós
acabamos ficando em campos
opostos. Nos primeiros tempos
da questão, com a poeira ainda
no ar e os ânimos exaltados, ha-
via uma ojeriza, uma birra total
entre os seguidores do Grande
Oriente do Brasil e os dos Gran-
des Orientes Independentes (coisa
que hoje, já com a poeira assenta-
da, não mais existe). Mantive-
mos, todavia, enquanto outros
rompiam amizades antigas, em
-benefício de paixões de momento,
o mesmo relacionamento cordial,
pois uma amizade sincera não
pode sofrer percalços motivados
por fatos passageiros, por eme-
ções efêmeras prodigalizadas por
trícas políticas e interesses de
grupos; a Maçonaria verdadeira
não admite distinções entre
Irmãos; por que a admitiria entre
Amigos?
Foi nessa época que eu escrevi
o meu primeiro livrinho e que
Varoli lançou as bases do seu mo-
numental Curso da Maçonaria
Simbólica, escrevendo o primeiro
tomo, referente ao grau de Apren-
diz, e, logo em seguida, o segun-
do tomo, referente ao grau de
Companheiro. Este último foi
lançado em 1976 e o terceiro vo-
lume da série, referente ao grau
de Mestre, foi sendo protelado,
por vários motivos. Quando, em
1988, lancei o meu livro "O Rito
Escocês Antigo e Aceito: Histó-
ria, Doutrina e Prática", recebi,
do Mestre Varoli, os mais entu-
siasmados elogios, que represen-
taram, para mim, o gaíardáo
maior de minha vida maçônica;
senti-me como o filho que é
aplaudido pelo pai, ~uand;;~ dá'
os seus primeiros passos sozinho,·
quando conquista seu primeiro
diploma, quando consegue o seu
primeiro sucesso na vida profis-
sional.
Em 1988 tomamos posse juntos
na Academia Paulista Maçônica
de Letras; fizemos questão disso,
foi exigência nossa. Em abril do
corrente ano de 1989, quando,
com outros valorosos Irmãos,
fundei a Sociedade Brasileira de
Cultura Maçônica, Varoli, apesar
dos seus 78 anos de idade e dos
problemas de saude, estava pre-
sente e foi aclamado Presidente
de Honra da Sociedade, uma pálio
da, mas sincera, homenagem ao
Mestre de todos nós.
E no dia 18 de setembro Varoli
partiu, seguindo a sua querida
Eunice, que partira um pouco
antes, fazendo fraquejar o velho
[equitibá. .. A Maçonaria Brasilei-·
.ra sofreu uma perda irreparavel;
mas eu sofri dupla perda: perdí
O Amigo e perdi aquele que foi,
mais do que Irmão, o meu Pai
maçônico, que moldou a minha
cabeça, para amar, respeitar e dig-
nificar a nossa Sublime Maço-
naria.
Foi um homem digno, em todos
os sentidos e em todos os mo-
mentos de sua vida familiar, pro-
fission.tl e maçônica. Apesar
disso, foi, muitas vezes. atacado,
caluniado e achincalhado por me-
diocridades e nulidades maçôní-
cas, que, sem capacidade para
subir às alturas de seu vasto co-
nhecimento maçônico, procura-
vam denegri-I o e destrui-Ia, como
se fosse possível, a pigmeus, der-
rubar um gigante. Mas essa é a
sina dos homens de valor: eles
incomodam!
Fui seu discípulo e tenho orgu-
lho em afirmá-lo. Há alguns me-
ses, como sua benevolência de
Amigo, ele dizia, a alguns Irmãos,
que o discípulo superara o Mes-
tre. Bondosas, mas inverídicas
palavras! Ficarei satisfeito se um
dia puder igualar-me a ele. Foi
dos maiores autores maçônicos de
todos os tempos, mas geralmente
injustiçado e esquecido, ao con-
trário de alguns "maçonólogos"
de fachada, que eram e conti-
nuam sendo endeusados.
Adeus, velho Amigo! Adeus,
velho Mestre! Tu que sempre
Ioste estrela brilhante, hoje és es-
pírito de luz e continuas a ilumi-
nar-nos. E, para aqueles que não
te compreenderam, que te injus-
tiçaram e que tanto te atacaram,
traiçoeiramente, já que os medío-
cres não aceitam os que os supe-
ram, fica a máxima de autor des-
conhecido: "O que seria das
estrelas, se não fosse a noite
escura" .