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Livro Didático C6 - H 20
Livro Didático C6 - H 20
Habilidade 20
AUTORES:
Felipe Pereira Cunha | Gabriel Torres
IMAGENS:
© pixabay.com
© pinterest.com
© FreeImagens.com
© Autores
CAPA:
Humberto Nunes
PROJETO GRÁFICO E
DIAGRAMAÇÃO:
Vânia Möller | Cristiano Marques
DIREITOS RESERVADOS:
© Felipe Pereira
HABILIDADE 20
Reconhecer a importância do patrimônio linguístico para a preservação da
memória e da identidade nacional
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existência coletiva nos influencia em quem somos, qual nos revelamos aos outros e a nós mesmos é
como pensamos, como agimos. Esse algo que se uma herança. Partindo disso, podemos ampliar a
eterniza é a contribuição das individualidades visão de patrimônio linguístico a tudo aquilo que é
para a construção do coletivo, daquilo que é de consequência da língua: as histórias, as opiniões,
todos que me rodeiam, e justamente por isso os conselhos, os discursos, as expressões, os
me importa e me enche de orgulho. Sentir-se jargões, e tudo aquilo que é língua, que expressa,
parte de, ou ter acesso a um patrimônio é ter que funciona em um sistema estruturado e que
consciência de que meu pai, minha mãe, meus serve de patrimônio a todos que compartilham o
avós e meus bizavós tomavam chimarrão e saber mesmo sistema de comunicação verbal.
que eu estou agora tomando, como se essas
pessoas tivessem me passado o bastão da vida Levar essa visão às últimas consequências é uma
para que eu a continuasse da maneira como eles atitude diabolicamente democrática. Afinal, sem
acreditavam que era o melhor. Não precisamos dúvidas, o livro “Grande Sertão: Veredas” faz
ser reféns do passado, para não repetir os seus parte do patrimônio linguístico brasileiro, porém
erros. Porém, é imperioso reconhecer que o as história da “Turma da Mônica” também fazem.
patrimônio representa a importância do passado Assim, a gravação de um pronunciamento de um
como formador do presente. presidente eleito democraticamente que declara
Considerando essa breve explanação acerca de o fim de uma ditadura é um patrimônio linguístico
patrimônio, podemos nos dirigir especificamente (são palavras que ecoam na história), porém
ao patrimônio linguístico, que pode ser entendido, as histórias que minha vó me contava também
em um primeiro momento, como a própria são. “Iracema”, de José de Alencar, forma
língua. Isto é, a língua é o maior patrimônio que nosso patrimônio histórico (tirano, colonialista,
recebemos. O sistema linguístico (no nosso caso covarde, explorador), no entanto a tradição oral
o português) que nos foi passado e por meio do indígena também forma.
Competência 6 |3
Ministério da Cultura inicia, por meio
do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional, política de reconhecimento das diferentes
línguas e dialetos falados no Brasil através de
processos de inventários, apoio a pesquisas,
divulgação e promoção. 23/06/2014,IPEA.
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não por meio do contato direto com suas formas
de organização social, mas por meio dos textos que “O estímulo inicial para esta reflexão (sobre
a cultura indígena) foram as numerosas
lemos acerca da cultura indígena. referências a uma concepção indígena segundo
a qual o modo como os seres humanos veem os
Falar sobre a cultura indígena e sobre o modo
animais é profundamente diferente do modo
como nossa historiografia a trata é falar da como os animais vêem os humanos e se vêem
memória brasileira, daquilo que nos marca a si mesmos.
historicamente em relação às outras nações. Visto Na nossa cultura, os humanos, em condições
que o índio não foi pacificamente integrado à normais, vêem os humanos como humanos e
vida europeizada, sendo dizimado junto com sua os animais como animais. Entretanto, na cultura
indígena, os animais predadores e os espíritos
cultura, nós, os ocidentalizados, criamos textos
veem os humanos como animais de presa. O
para representá-los, para falar sobre eles, para ser humano se vê a si mesmo como tal. A lua, a
“homenagiá-los”, sem nem percebermos que serpente, o jaguar o veem, contudo, como um
tiramos a voz dos protagonistas da sua própria tapir (animal mamífero de grande porte). Em
cultura por meio do uso da nossa língua e da suma, os animais são gente, ou se vêem como
pessoas. Tal concepção está quase sempre
nossa linguagem. No momento em que não nos associada à idéia de que a forma manifesta de
dedicamos à língua indígena, não nos dedicamos cada espécie é um envoltório (uma ‘roupa’)
à memória indígena, aniquilando-a (a verdadeira a esconder uma forma interna humana,
morte é o esquecimento). Assim, formamos nossa normalmente visível apenas aos olhos da própria
espécie ou de certos seres transespecíficos, como
identidade, excluindo muitas vezes a do outro. É
os xamãs. Essa forma interna é o espírito do
imprescindível ter com que se identificar, no que animal: uma intencionalidade ou subjetividade
se ancorar. É definitivamente decisivo lançar um formalmente idêntica à consciência humana,
olhar inteligente sobre si mesmo, e partindo dis- materializável, digamos assim, em um esquema
corporal humano oculto sob a máscara animal.”
so, reconhecer-se nos outros, identificar-se, ver-se
parte, nunca todo. No entanto, essa identificação Perspectivismo Ameríndio,
com aquele que é próximo de mim nunca pode Eduardo Viveiros de Castro
legitimar a aniquilação daquele com que não me
identifico. Utilizar a língua (por meio da escrita, da
fala, da leitura e da audição) para formar e reco-
nhecer nossa identidade é lindo, profundo e hu-
mano. No entanto, isso não nos dá o direito de,
por meio de nossa língua e de nossa linguagem,
dizimar as outras culturas e as outras identidades,
como se fosse menos legítimas, menos profun-
das, menos valiosas, menos humanas.
Competência 6 |5