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TCC - Violência Policial
TCC - Violência Policial
ÂNIMA EDUCAÇÃO
LUANA KOTRYK
VIOLÊNCIA POLICIAL:
Curitiba
2022
LUANA KOTRYK
VIOLÊNCIA POLICIAL:
Curitiba
2022
LUANA KOTRYK
VIOLÊNCIA POLICIAL:
__________________________________________
__________________________________________
À minha família, por todo o apoio e por me incentivarem nos momentos difíceis. Às
minhas irmãs, Keila e Leticia, por serem exemplos de mulheres fortes e profissionais
determinadas. Aos meus pais, Eduardo e Lindamir, por nunca terem medido esforços
para me proporcionar um ensino de qualidade, por manterem meus pés no chão, e
por me aguentarem, quando eu mesma não conseguia, sem vocês eu não chegaria
até aqui. A vocês o meu amor incondicional.
Aos meus amigos, que sempre estivem ao meu lado, com quem pude conversar e
compartilhar ideias sobre esse trabalho, e que demonstraram apoio em todos os
momentos delicados da minha vida. Em especial, ao Gabriel, pela cumplicidade e por
me ajudar a terminar o curso. Ao Mario, por sempre demonstrar sua admiração. E a
Amanda (in memoriam), que sempre esteve comigo em pensamento.
Aos meus professores, por todos os ensinamentos ao longo desses cinco anos de
faculdade. Em especial ao meu orientador, professor Alexandre, pelos conselhos, pela
ajuda e pela paciência, a você toda a minha admiração.
A todos aqueles que contribuíram, de alguma forma, para a realização desse trabalho.
RESUMO
O presente trabalho monográfico tem como objetivo fazer uma análise acerca da
violência policial em nosso país. Estudando desde os princípios mais básicos de
nosso ordenamento jurídico até os dados disponibilizados pelas Secretarias de
Segurança Pública dos respectivos Estados, para tentar compreender o porquê de
sermos um dos países que apresentam uma das maiores taxas de letalidade policial.
É necessário fazer a distinção de até onde a nossa polícia age em legítima defesa –
pois de fato, vivemos em um país onde a criminalidade é sobressalente – e em qual
momento ela se torna abuso de poder pelas autoridades responsáveis. Assim como,
entender como esses casos são tratados pelas instituições internas e pelo estado,
com o propósito de tentar frear o crescimento alarmante da violência estatal.
ABSTRACT
This monographic work aims to carry out an analysys of police violence in our country.
Studying from the most basic principles of our legal system to the data available by the
Public Secretariat of the respective states, trying to understand why we are one of the
countries among those with the highest police fatality rates. It is necessary to
distinguish when police act in self-defense –in fact, we live in a country where
criminality is spare – and when at point does it become power abuse by the
responsible authorities. As well as understanding how these cases are handled by
internal institutions and the State, iming to tryto stop the alarming growth of state
violence.
LISTA DE TABELAS
Tabela 6 – Relação de civis mortos e civis feridos pela polícia civil e militar nos três
primeiros semestres de 2021......................................................................................44
1. INTRODUÇÃO..............................................................................................10
3. LEGITIMIDADE E EXCESSO........................................................................25
5. CONCLUSÃO..............................................................................................63
6. REFERÊNCIAS...........................................................................................65
10
1 – INTRODUÇÃO
2
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33ª ed. São Paulo. Atlas, 2017.
12
I- Polícia federal;
3
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
4
TÁCITO, 1975, apud MEIRELLES, 2002, p. 128
13
6Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes,
XVIII, 1990, Havana/Cuba. Declaração de Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de
Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei. Disponível em:
http://www.defensoria.ms.gov.br/images/nudedh/sistemas_onu/33_-
_principios_basicos_sobre_o_uso_da_for%C3%A7a_e_arma_fogo_pelos_funcion%C3%A1rios
__respons%C3%A1veis_pela_eplica%C3%A7%C3%A3o_da_lei__1990.pdf. Acesso em: 15 de
novembro de 2021.
15
[...]
7
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:
Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.
16
6. Força letal: é o mais extremo uso da força pela polícia e só deve ser
usado em último caso, quando todos os outros recursos já tiverem
sidos experimentados. Nesse caso o suspeito ameaça a vida de
terceiros. (SENASP, 2006).
Deduz-se que foi a partir desse momento que o estado passou a ver os
cidadãos como um mero instrumento para um determinado fim, onde direitos
individuais eram ignorados, a violência era normalizada e a tortura era um meio
legal para se chegar aonde queria. O medo e a violência foram
institucionalizados, milhares foram torturados e centenas foram mortos.
8
VIOLÊNCIA. In: DICIO, Dicionário Online de Português. Disponível em:
https://www.dicio.com.br/violencia/. Acesso em: 01/10/2022.
9
Ibidem.
18
“Homem de preto,
É invadir favela
10
SOARES, Luiz Eduardo; PIMENTEL, Rodrigo; BATISTA, André. Elite da Tropa – Rio de Janeiro: Objetiva,
2006.
19
11
BRASIL. Decreto-Lei 3.689, de 03 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm
12
O Art. 23 do Código Penal versa sobre a exclusão de ilicitude: “Não há crime quando o agente pratica
o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal
ou no exercício regular de direito.”
20
Em 2020 o Brasil atingiu uma marca nunca antes vista no país, mas que
já vem de uma série de aumentos significativos desde 2013, quando o Fórum
Brasileiro de Segurança Pública passou a monitorar essas ocorrências. O
número de mortes decorrentes de intervenção policial chegou em 6.416, tendo
uma média de 17,6 vítimas fatais por dia, apresentando um crescimento de 190%
desde o primeiro ano de análise.
contudo, desde que o índice passou a ser monitorado, essa foi a primeira vez
que pudemos ver uma redução na taxa de letalidade policial, já que os dados
apontam uma queda de 267 mortes em relação a 2020, auge de ocorrências de
MDIP13.
7.000
6.351 6.413
6.175 6.145
6.000
5.179
5.000
4.220
4.000
3.330
3.146
3.000
2.212
2.000
1.000
0
2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021
Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; PC-MG; Fórum
Brasileiro de Segurança Pública.
13
Mortes Decorrentes de Intervenção Policial
14
In: FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança pública: 2022.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em:
01/10/2022.
22
Brasil 2,9
AP 17,1
SE 9,0
GO 8,0
RJ 7,8
BA 6,7
PA 6,2
RN 4,3
PR 3,6
MT 2,9
TO 2,6
AM 2,3
AL 1,9
MS 1,5
RR 1,4
RS 1,4
CE 1,3
PB 1,3
SP 1,2
AC 1,2
MA 1,2
PE 1,1
PI 1,0
ES 1,0
SC 1,0
RO 0,6
MG 0,5
DF 0,3
0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0 14,0 16,0 18,0
Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; PC-MG; Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
mortas a cada 100 mil habitantes. Essa foi a maior taxa já registrada pelos
marcadores, apontando a polícia do Amapá como a mais violenta do país.
Outro dado regional fornecido pelo FBSP que também chama a atenção,
é que além de alguns estados possuírem uma maior concentração de
mortalidade, essa estatística também reflete nas cidades. Das 6.416 mortes,
5.608 foram possíveis identificar de qual município vieram as ocorrências,
chegando à conclusão de que em 50 municípios – entre os 5.570 existentes no
Brasil – concentram-se 55% das mortes decorrentes de intervenção policial,
15
A Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 635 foi ajuizada pelo Partido
Socialista Brasileiro (PSB) com a pretensão de que fossem reconhecidas e sanadas graves lesões a
preceitos fundamentais constitucionais, decorrentes da política de segurança pública do Estado do Rio
de Janeiro marcada pela "excessiva e crescente letalidade da atuação policial". O pedido foi deferido e
os ministros vetaram operações policiais no Estado enquanto durar a pandemia, com a ressalva em
casos excepcionais e previamente comunicados pelas forças de segurança do Estado ao MP/RJ.
25
É importante frisar que o presente estudo não tem como objetivo alegar
que toda a ação policial que teve como resultado uma morte é ilegal, mas sim
que não seria coerente afirmar também que, diante dos números estrondosos,
todas elas são legítimas, sem que haja uma devida investigação dos fatos.
Mostra-se assim, extremamente importante o monitoramento desses
indicadores.
3. LEGITIMIDADE E EXCESSO
Um dos conceitos mais utilizados até hoje sobre o tema, tanto na ciência
política quanto no direito, vem de anos atrás, com Max Weber, que classifica o
Estado como um agrupamento humano que “reivindica de forma bem-sucedida
16
BUENO, Samira; MARQUES, David; PACHECO, Dennis. Anuário Brasileiro de Segurança Pública: As
mortes decorrentes de intervenção policial no Brasil em 2020. Disponível em:
https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em: 25/11/2021.
26
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
Excesso punível
17
WEBER, Max. Ciência e Política, duas vocações – São paulo: Cultrix, 1997, p. 56.
18
BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de
Janeiro, 31 dez.
27
19
BRUNO, Anibal. Direito Penal – Parte geral. Imprenta: Rio de Janeiro, 2005, p. 365.
20
GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e
constitucionais – Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 122.
28
Pode ser entendida como a defesa exercida em seu próprio favor diante
da ocorrência de uma injusta agressão que esteja efetivamente ocorrendo no
mundo concreto. É necessário que a reação seja na mesma proporção da ação,
atendendo aos limites legais, para que não haja excesso de poder.
21
NUCCI, Guilherme de Souza. Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
29
22
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual do Direito Penal Brasileiro: parte
geral. – São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 639.
30
23
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado – São Paulo: Forense, 2014, p. 268
24
BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. São Paulo: Saraiva, 2006.
31
25
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 18ª ed., Rio de Janeiro: Impetus, 2016.
26
MEZGER, Edmundo. Tratado de Derecho Penal, Madri: Revista de Derecho Privada, 1995, p.454.
32
A agressão injusta pode ser entendida como uma lesão, física ou moral,
a um bem juridicamente protegido, causada por uma ação humana, ou seja, não
é possível caracterizá-la por um ataque de animal.
27
GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e
constitucionais – Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 129.
33
28
GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e
constitucionais – Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 132.
34
Art. 23 [...]
Excesso punível
Para Greco (2012. p. 140), se mesmo depois de ter feito cessar uma
agressão que estava sendo praticada contra sua pessoa, o agente não
interrompe seus atos e continua com a repulsa, a partir desse momento já estará
incorrendo em excesso.29 Ou seja, o ato é lícito até o exato momento em que o
29
GRECO, Rogério. Atividade policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e
constitucionais – Rio de Janeiro: Impetus, 2012, p. 140.
35
agente consegue fazer cessar a agressão, após isso, torna-se excesso, incidindo
em abuso de poder.
30
GLOSSÁRIO. Conselho Nacional do Ministério Público, 2021. Disponível em:
https://www.cnmp.mp.br/portal/institucional/476-glossario/8237-abuso-de-poder-1. Acesso em: 23 de
novembro de 2021.
31
Consideram-se Execuções sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais todo e qualquer homicídio praticado
por forças de segurança do Estado (policiais, militares, agentes penitenciários, guardas municipais) ou
similares (grupos de extermínio, justiceiros), sem que a vítima tenha a oportunidade de exercer o direito
de defesa num processo legal regular, ou, embora respondendo a um processo legal, a vítima seja
executada antes de seu julgamento ou com algum vício processual; ou ainda, embora respondendo a
processo legal, a vítima seja executada sem que lhe tenha sido atribuída uma pena capital legal.
PIOVESAN, Flávia et al. Execuções Sumárias, Arbitrárias ou Extrajudiciais: Uma Aproximação da
Realidade Brasileira. Recife: 2001.
36
Tanto aqui como na maioria dos países existem dois motivos básicos
para justificar, interna corporis, a violência policial. O primeiro é que
muitas vezes a lei é dúbia, deixa margem para interpretação. Em casos
assim, os policiais agem de acordo com regras próprias, por vezes
infringindo o espírito das leis. O segundo é que alguns policiais
extrapolam a lei, atuando de forma ilegal, espancando, torturando ou
mesmo executando criminosos ou supostos criminosos.
Frequentemente com o apoio de algum segmento social.32
32
MINGARDI, Guaracy. Apresentação. In: KUCINSKI, Bernardo, et al. Bala perdida: a violência policial no
Brasil e os desafios para a sua superação – São Paulo: Boitempo, 2015, p. 14.
37
33
Morte de Genivaldo foi causada por asfixia mecânica e inflamação de vias aéreas. CNN Brasil,
02/09/2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/morte-de-genivaldo-foi-causada-
por-asfixia-mecanica-e-inflamacao-de-vias-aereas/. Acesso em: 02/10/2022.
38
das leis, e não ter uma visão da sociedade como um eventual inimigo, a quem
se deve reprimir.
34
MENA, Fernanda. Um modelo violento e ineficaz de polícia. In: KUCINSKI, Bernardo, et al. Bala
perdida: a violência policial no Brasil e os desafios para a sua superação – São Paulo: Boitempo, 2015,
p. 20.
39
Aferir com exatidão se a força utilizada pela polícia foi ou não apropriada
e se essa agiu com excesso e violência é dificultoso – se é que não podemos
dizer que praticamente impossível – pois varia de caso para caso e depende das
circunstâncias. No entanto, a partir do estudo de diversos pesquisadores no
intuito de buscar critérios para analisar o uso da força policial, foram criados
padrões internacionais para aferir a letalidade das polícias.
Por esses padrões, três critérios são usualmente utilizados para aferir
o uso da força letal: (1) a relação entre civis mortos e policiais mortos;
35
UOL – disponível em https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-
brasileiras-mataram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-estudo.htm - acessado em
26/11/2021.
40
(2) a razão entre civis feridos e civis mortos pela polícia; (3) a proporção
de civis mortos pelas polícias em relação ao total de homicídios
dolosos.36
36
BUENO, Samira; CERQUEIRA, Daniel; DE LIMA, Renato Sérgio. Sob fogo cruzado II: Letalidade da ação
policial. In: Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Anuário Brasileiro de Segurança Pública. 2013, p.
119.
37
CANO, Ignácio. Letalidade da ação policial no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Iser, 1997.
41
Morte Decorrente
Grupos Mortes Violentas de Intervenções Proporção de
segundo Brasil e Intencionais - MVI Policiais (MDIP) em MDIP em relação
39
qualidade Unidades da serviço e fora de às MVI
dos Federação serviço
dados 38 Número Absoluto Número Absoluto Em percentual (%)
2020 2021 2020 2021 2020 2021
38
Grupos segundo qualidade estimada dos registros estatísticos oficiais de Mortes Violentas
Intencionais. Grupo 1: maior qualidade das informações; Grupo 2: qualidade intermediária das
informações; Grupo 3: menor qualidade das informações.
39
A categoria Mortes Violentas Intencionais (MVI) corresponde à soma das vítimas de homicídio doloso,
latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais em serviço e
fora (em alguns casos, contabilizadas dentro dos homicídios dolosos). Sendo assim, a categoria MVI
representa o total de vítimas de mortes violentas com intencionalidade definida de determinado
território.
42
40
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022. Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 02/08/2022.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em:
02/10/2022.
41
8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2014. Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Disponível
em: https://forumseguranca.org.br/storage/8_anuario_2014_20150309.pdf. Acesso em: 02/10/2022.
43
1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993
406 332 321 298 296 339 362 379 359 414 453
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
459 382 357 366 369 308 297 378 341 373
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 TOTAL
367 347 386 398 378 414 397 404 410 11.090
Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; Sistema Nacional de
Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (SINESP)/ Secretaria Nacional de
Segurança Pública (Senasp) /Ministério da Justiça; FBI; Statistical Abstract of the United
States:2002, The National Data Book; Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Tabela 6 – Relação de civis mortos e civis feridos pela polícia civil e militar nos três primeiros
semestres de 2021.
44
muitos díspares é difícil crer que em todos os casos a polícia agiu visando sua
defesa.
Tendo como base o maior índice, usado pelo FBI – 12 civis para 1 policial
morto – quando nos deparamos com os dados apresentados no Brasil, é no
mínimo chocante. Em 2020, para cada policial morto, em serviço ou fora dele,
foram 33,1 pessoas mortas em intervenções policiais no Brasil, quase o triplo do
aceitável nos parâmetros do FBI. O índice varia de estado para estado, enquanto
em Rondônia, Piauí e Mato Grosso do Sul a proporção foi abaixo de 6, em Goiás
e no Paraná os números nos deixam incrédulos. Em Goiás a relação foi de 210,3
civis mortos para 1 policial morto em intervenções policiais, e no Paraná o
número chegou a 186,5, apresentando uma queda significativa comparada a
2019, quando a proporção era de 288 civis mortos para cada policial.
Brasil e Unidades
2019 2020
da Federação
Brasil 36,9 33,1
Acre 23 27
Alagoas 29 43
Amapá 122 -
Amazonas 88 16,2
Bahia 96,6 103,4
Ceará 68 14,3
Distrito Federal - 11
Espírito Santo - 46
42
Ibidem, p. 119.
43
CVLI: Crimes Violentos Letais Intencionais
46
A partir da análise desses dados, seria passível dizer que, apesar dos
estados de Rio de Janeiro e São Paulo serem os que tem a maior proporção de
mortes em decorrência de intervenção policial, não são os que possuem a polícia
mais letal.
44
Mortes em confrontos com policiais no Paraná cresceram 9,74% em 2021. Ministério Público do
Paraná, 27/04/2022. Disponível em: https://mppr.mp.br/2022/04/24444,10/Mortes-em-confrontos-
com-policiais-no-Parana-cresceram-974-em-2021.html. Acesso em: 02/10/2022.
45
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022. Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 02/08/2022.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em:
02/10/2022.
47
46
Segundo estudo da ONU referente ao ano de 2012, o Brasil registrou 11,4% dos homicídios do
planeta, ainda que concentrasse apenas 2,8% da população mundial no mesmo ano.
47
8º Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2014. Fórum Brasileiro de Segurança Pública, pág. 43.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/storage/8_anuario_2014_20150309.pdf. Acesso em:
02/10/2022.
48
Tabela 9 - Policiais Civis e Militares vítimas de CVLI, em serviço e fora de serviço – Brasil
2020 2021
Policiais Militares mortos em confronto em serviço 46 34
Policiais Militares mortos em confronto ou por lesão não natural 142 124
fora de serviço
48
SILVA, Jennifer Caroline Araújo; EBERHARDT, Marcos Eduardo Faes. Letalidade da polícia militar: o
modelo de polícia ostensiva militarizada e as consequências da arbitrariedade para sociedade e para
os agentes de segurança, pag. 11, 26/11/2021. Disponível em: https://www.pucrs.br/direito/wp-
content/uploads/sites/11/2022/02/jennifer_silva.pdf. Acesso em: 03/10/2022.
49
16º Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2022. Fórum Brasileiro de Segurança Pública,
02/08/2022. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2022/06/anuario-
2022.pdf?v=5. Acesso em: 02/10/2022.
49
50
SILVEIRA, R. A. A morte do policial. In: FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário do
Fórum Brasileiro de Segurança Pública 2015. p. 24-25. Disponível em:
http://www.forumseguranca.org.br/storage/download//anuario_2015.retificado_.pdf. Acesso em:
03/10/2022.
50
51
In: FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança pública: 2022.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em:
01/10/2022.
51
“resistência” e não era instaurado o inquérito policial, visto que o agente estava
amparado por uma excludente de ilicitude. Assim explica Michael Misse (2011,
p. 28)52:
[...]
52
MISSE, M. (coord.) “Autos de resistência”: uma análise dos homicídios cometidos por policiais na
cidade do Rio de Janeiro (2001-2011). Rio de Janeiro: Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e
Violência Urbana (NECVU) / Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2011.
52
declarações que era tidas como verdade, já que duvidar da versão dada pelos
policiais é conduta atípica dentro da cultura organizacional das policias,
prevalecendo a fé pública do agente, conforme ressalta Misse (2011, p.40)
53
Ibidem.
53
54
FELDKIRCHER, G. F. Autos de resistência: o extermínio dos invisíveis. 2015. 89 f. Monografia
(Bacharelado em Direito) — Departamento de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2015. Disponível em: https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/25461/25461.PDF.
Acesso em: 04/10/2022.
54
55
CONSELHO DE DEFESA DOS DIREITOS DA PESSOA HUMANA. Resolução nº 8, de 20 de dezembro de
2012. Dispõe sobre a abolição de designações genéricas, como "autos de resistência", "resistência
seguida de morte", em registros policiais, boletins de ocorrência, inquéritos policiais e notícias de crime.
Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-
social/old/cndh/resolucoes/2012/resolucao-08-auto-de-resistencia. Acesso em: 04/10/2022.
56
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 635 – Rio
de Janeiro. Relator: Min. Edson Fachin.
55
Não é atoa que outros Estados estão seguindo a medida tomada por
São Paulo e implementando aos poucos o uso de câmeras nas fardas, já que o
Estado registrou uma queda de mais de 80% nas ocorrências de confronto da
Polícia Militar desde o início da medida.
Assim como no Paraná, onde após a divulgação dos dados sobre o alto
crescimento da letalidade policial no Estado foram divulgados pelo GAECO57, foi
elaborado e encaminhado um ofício ao governador do Estado, Carlos Massa
Ratinho Junior, com sugestões para a redução do número de mortes causadas
em intervenções policiais 58. Dentre as medidas propostas, estão a
implementação de um sistema de geolocalização e de gravação de áudio e vídeo
nas fardas e viaturas dos policiais, e também a estruturação de um curso sobre
direitos humanos, obrigatório para todos os agentes que integram o sistema de
justiça.
57
Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado
58
Instituições propõem medidas para reduzir mortes em ações policiais. Ministério Publico do Paraná,
2022. Disponível em: https://mppr.mp.br/2022/04/24446,10/Instituicoes-propoem-medidas-para-
reduzir-mortes-em-acoes-policiais.html. Acesso em: 09/10/2022.
59
Treze medidas para a redução das intervenções policiais com resultado morte no Estado da Bahia.
Defensoria Pública do Estado da Bahia. - 1ª ed. - Salvador: ESDEP, 2022. Disponível em:
https://www.defensoria.ba.def.br/wp-content/uploads/2022/03/sanitize_240322-022120.pdf. Acesso
em: 09/10/2022.
56
60
CHADE, Jamil. Órgãos da ONU cobram Brasil por 20 anos de assassinatos pela polícia. UOL, 21 de
agosto de 2022. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2022/08/21/orgaos-da-
onu-cobram-brasil-por-20-anos-de-assassinatos-pela-policia.htm. Acesso em: 08/10/2022.
57
61
MOYA, Isabela; PIRES, Marilza. O Massacre do Carandiru e suas versões. POLITIZE!, 5 de junho de
2019. Disponível em: https://www.politize.com.br/massacre-do-carandiru/. Acesso em: 08/10/2022.
59
62
Depoimento retirado do documentário “Auto de Resistência”. Direção: Natasha Neri e Lula Carvalho.
Produção: Joana Nin, Bruno Arthur de Melo, Lia Gandelman. Brasil, 2018. Amazon Prime Video.
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63
NUNES, Marcos. Após divulgação de vídeo de jovem morto por PM, comandante de batalhão é
exonerado. EXTRA, 27 de fevereiro de 2015. Disponível em: https://extra.globo.com/casos-de-
policia/apos-divulgacao-de-video-de-jovem-morto-por-pm-comandante-de-batalhao-exonerado-
15451815.html. Acesso em: 08/10/2022.
61
Apesar de sua idade, o policial autor do disparo alegou legitima defesa e o caso
foi registrado como auto de resistência.
Após anos de discussão sobre qual seria o juízo competente para julgar
a ação – judiciário militar ou tribunal do júri, na justiça comum – o caso foi
arquivado. O crime prescreveu sem que houvesse nenhuma responsabilização
pelo homicídio de Maicon. O caso ainda tramita na Comissão Interamericana de
Direitos Humanos.
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A chamada “gratificação faroeste” foi criada pelo governador Marcelo Alencar em 1995, podendo
aumentar em até 150% o salário de policiais que tivessem praticado supostos atos de bravura, quase
sempre em ações que resultavam na morte de acusados. Tal gratificação foi uma das responsáveis pelo
aumento dos homicídios classificados como “auto de resistência.
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temos opção: somos mães e o que nos mantem vivas é o amor pelos
nossos filhos que morreram e os que ficaram. Quando o esposo ou
esposa morre, torna-se viúvo ou viúva, quando não se tem pai e mãe,
são órfãos. Mas quando se perde filho, não tem nome para essa dor
que sentimos. Mas temos outros filhos e temos que nos levantar.
Buscamos Justiça para continuar em pé. Nossa luta é para que outras
mulheres, negras, faveladas não sintam a nossa dor. E a luta é grande.
Somos nós que não desistimos de investigar o que aconteceu e pedir
Justiça. Muitas vezes, a polícia não investiga. No Ministério Público, as
denúncias não são aceitas. Ou quando finalmente entramos no
Tribunal, acreditando que a Justiça vai ser feita, matam ali o nosso filho
pela segunda vez. Em vez de investigarem os culpados pela morte dos
nossos filhos, nossos filhos passam ser os condenados. Outras vezes,
enterram nossos filhos como indigentes, e temos que lutar para colocar
na certidão de óbito que ele tinha nome, mãe e pai. A injustiça e o
desrespeito se repetem por todos os lados: Quando perguntamos para
o policial: o que fizeram com o meu filho? Ele me nos olha e diz que o
filho dele está em casa. Mas teve outro policial que chorou junto... Não
desejamos nossa dor nem para a mãe de quem matou os nossos filhos.
A Justiça maior será feita. Você pode ser negro, ser favelado, mas a
gente tem que ter direito de viver dignamente no lugar onde moramos.
E nós descobrimos a nossa força nas outras mães. Viva o Movimento
Moleque, as Mães de Manguinhos, as Mães Sem Fronteira, as Mães
da Baixada, as Mães sem Fronteiras, do Chapadão! Viva cada mãe
que luta! Muitas de nós já ficamos doentes, não conseguimos voltar a
trabalhar. Perdemos o pouco que demoramos tanto em conquistar,
porque ser mulher, negra, favelada nunca é fácil. Mas aí a gente
conquista e matam nossos filhos e perdemos o chão. Nossos filhos
deixam irmãos, que hoje dizem ter medo de morrer também e nos
deixar sozinhas. Hoje, quando olhamos outros adolescentes, vemos
neles os nossos filhos. E desejamos vida, proteção, oportunidades.
Eles querem um curso, um trabalho, uma vaga de aprendiz. Queremos
dizer aos meninos que não desistam, que estamos juntos por uma vida
sem racismo, sem desigualdade. Queremos Justiça, queremos paz,
queremos vida. Parem de nos matar!
65
30 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança. Carta das mães e familiares para o Rio de
Janeiro. Rio de Janeiro, 21 de novembro de 2019. Disponível em:
63
5. CONCLUSÃO
O questionamento que nos resta é saber qual a causa, o que gera o alto
índice de violência na atividade policial, se ele vem historicamente carregado por
uma corporação que traz consigo desde a época da Ditadura Militar as táticas
de guerra e repressão; se o Estado tem sua parcela de culpa, pelo descaso, pela
falta de treinamento e assistência para com seus agentes; se é pela cultura de
extermínio, do incentivo da própria polícia para criar “cães de guerra” e da
sociedade que apoia que “bandido bom é bandido morto”.
https://www.unicef.org/brazil/sites/unicef.org.brazil/files/2019-11/carta-maes-30anos-cdc.pdf. Acesso
em: 04/10/2022.
64
66
In: FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança pública: 2022.
Disponível em: https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/. Acesso em:
01/10/2022.
65
REFERÊNCIAS
BARROS, Flavio Augusto Monteiro de. Direito penal: parte geral. São Paulo:
Saraiva, 2006.
BRUNO, Anibal. Direito Penal – Parte geral. Imprenta: Rio de Janeiro, 2005.
GARCIA, Janaina. Polícias brasileiras matam quatro vezes mais que a dos
EUA, diz estudo. UOL, 5 de novembro de 2013. Disponível em:
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/11/05/policias-
brasileiras-mataram-126-vezes-mais-que-a-do-reino-unido-em-2012-diz-
estudo.htm
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 18ª ed., Rio de Janeiro:
Impetus, 2016.
68
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 33ª ed. São Paulo. Atlas,
2017.
NUCCI, Guilherme de Souza. Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2012.
WEBER, Max. Ciência e Política, duas vocações – São paulo: Cultrix, 1997.