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Estado do Rio de Janeiro Poder Judiciário

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Fls.
Processo: 0436250-03.2016.8.19.0001
Processo Eletrônico

Classe/Assunto: Procedimento Comum - Promessa de Compra e Venda / Coisas

Autor: JULIANA FARIAS SARTO


Réu: JANETTE JOSEPHINA PARAVATTI

___________________________________________________________

Nesta data, faço os autos conclusos ao MM. Dr. Juiz


Cristina de Araujo Goes Lajchter

Em 14/09/2017

Sentença

Cuida-se de ação proposta por JULIANA FARIAS SARTO em face de JANETTE JOSEPHINA
PARAVATTI, na qual alega que em setembro de 2012 firmou contrato de instrumento particular de
sinal e princípio de pagamento com a ré, visando a aquisição do imóvel localizado na rua João
Alfredo 26, apto. 201, Freguesia, sendo acordado o preço de R$470.000,00, sendo pago à
mesma, através de cheques, os valores de R$21.800,00 e de R$28.200,00, este endossado para
a imobiliária a título de comissão de corretagem. Narra que o restante do valor seria pago por meio
de financiamento bancário, mas que, visando obter o financiamento do valor integral acordou com
a ré que alterariam o valor do imóvel no formulário a ser entregue ao Banco Bradesco para que
constasse R$540.000,00. Sustenta que, apesar da avença das partes, ao comparecerem na data
aprazada para a assinatura do instrumento particular de financiamento para aquisição do imóvel,
venda e compra e alienação fiduciária, a ré se recusou a firmá-lo, sob o argumento de que o valor
constante do financiamento seria superior àquele recebido a título de sinal, tendo deixado o local
em posse das três vias do contrato de financiamento. Aduz que, no momento da assinatura ainda
foi oportunizado à ré a alteração do valor, mas a mesma se mostrou intransigente, sendo desfeito
o negócio sem a devolução do valor adiantado pela autora. Alega que, em razão da retenção das
vias do financiamento pela ré, as parcelas do financiamento vêm sendo descontadas na folha de
pagamento da autora. Ante o alegado, postula a autora a devolução em dobro das arras, o custeio
do valor adiantado a título de ITBI e a indenização pelso danos morais sofridos. A Inicial foi
instruída com os documentos de fls. 29/221.

Proferido despacho liminar positivo às fls. 224 com designação de audiência preliminar.

A ré ofereceu contestação de fls. 230/237, acompanhada de documentos de fls. 238/291, na qual


suscita preliminar de incompetência. No mérito, alega a autora nunca a procurou para recebimento
do valor de R$21.800,00 e que deixou de assinar o contrato por ter ficado nervosa ante a
alteração do conteúdo. Postula a condenação da autora por litigância de má-fé, já que,
diversamente do afirmado, não há parecer conclusivo no CRECI. Alega que a declaração no
financiamento de valor superior ao acordado é crime e que, por conta disso, quem efetivamente
sofreu danos morais foi a ré, formulando pedido contraposto para ser indenizada por danos
morais. Requer a improcedência dos pedidos.

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Sessão de mediação às fls. 297, não sendo obtido o acordo.

Instadas a se manifestar em provas e em réplica, a parte ré postulou provas (fls. 307/308) tendo a
autora apresentado réplica às fls. 346/355.

Decisão saneadora à fl. 363, afastando a preliminar de incompetência do juízo e indeferindo a


produção de prova oral e documental.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Analisando-se os autos, denota-se que a causa já se encontra madura para o julgamento,


havendo elementos suficientes para o exercício de uma cognição exauriente, fundada num juízo
de certeza, para a prolação de sentença com resolução do mérito.

As arras ou sinal, regra geral, representa um valor pago em dinheiro ou um bem dado
antecipadamente a título de adiantamento com o objetivo de confirmar um contrato. Nesta
modalidade, que é a mais comum, este sinal é também conhecido como arras confirmatórias.

Para Sílvio Rodrigues, as arras "constituem a importância em dinheiro ou a coisa dada por um
contratante ao outro, por ocasião da conclusão do contrato, com o escopo de firmar a presunção
de acordo final e tornar obrigatório o ajuste; ou ainda, excepcionalmente, com o propósito de
assegurar, para cada um dos contratantes, o direito de arrependimento" (Direito Civil. Vol. 2, 30ª
ed, São Paulo: Saraiva. 2002, p. 279).

Nesse sentido, é sabido que, se as partes cumprirem as obrigações contratuais, as arras serão
devolvidas para a parte que as havia dado. Poderão também ser utilizadas como parte do
pagamento.

É o que diz o Código Civil, no artigo 417 in verbis: Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma
parte der à outra, a título de arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de
execução, ser restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da principal.

Emergindo a rescisão da promessa de compra e venda da inviabilidade de obtenção do


financiamento bancário que viabilizaria a quitação do saldo remanescente do preço pela
adquirente em razão de o imóvel objeto da promessa já ser gravado por ônus real, não se
cogitando de desistência imotivada quanto à consumação do negócio, a repetição do vertido pela
promissária adquirente a título de arras, porquanto despendido como início de pagamento,
incorporando-se ao preço convencionado, consubstancia imperativo legal coadunado com o
princípio que repugna o locupletamento ilícito.

"(...) 'Tratando-se de contrato que não prevê direito de arrependimento, as arras são
confirmatórias.' (REsp 1056704 / MA. Relator(a): Ministro Massami Uyeda (1129). Órgão Julgador:
T3 - Terceira Turma). 4.1. Em se tratando de arras confirmatórias, não é de se admitir a retenção
total do sinal dado ao promitente-vendedor, em ordem ao princípio consubstanciado na vedação
do enriquecimento ilícito, descrito no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor e em
consonância com o artigo 418 do Código Civil. 4.2. Ainda que a culpa pela rescisão contratual seja
do autor, há de se proceder a devolução do sinal, sob pena de caracterizar enriquecimento sem
causa".
...) Não tendo sido convencionado o direito de arrependimento a qualquer das partes, tem-se que
os valores (...), repassados pelos embargantes a título de sinal e início de pagamento (...),
caracterizam-se como arras meramente confirmatórias, eis que se destinaram, apenas, a ratificar
as compras ajustadas.

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Ocorre que, consoante pacífico entendimento jurisprudencial, o arrependimento do promitente


comprador só importa em perda do sinal se as arras forem penitenciais, ou seja, quando tiverem a
finalidade de cláusula penal decorrente do exercício do direito de arrependimento previsto no
contrato.(20130110349513APC, data de julgamento 04/02/2015, órgão julgador 5ª Turma Cível,
Relator: João Egmont, Publicado no DJE19/02/2015)

Por conseguinte, não é possível reconhecer o direito da ré de retenção dos valores recebidos a
título de sinal pelo imóvel negociado, uma vez que, em que pese nas relações contratuais regidas
pelo Código Civil, em sua maioria, vigore a autonomia da vontade, tendo a ré possibilidade de
rechaçar os termos do contrato de alienação fiduciária, a retenção indevida de tal contrato,
configura ato ilícito, gerando prejuízos à autora (fl. 28 e 360/361).

Outrossim, o item IV do contrato de sinal (fl. 42), estabelece que o valor de R$ 28.200,00 (vinte e
oito mil e duzentos reais) a ser pago a título de remuneração pelos serviços prestados na
intermediação de venda do imóvel, deve ser pago pela outorgante, ora ré, bem como, no item VIII,
do mesmo contrato, há previsão acerca de hipótese do arrependimento das partes:

"Para o caso de eventual arrependimento de qualquer das partes contratantes antes da


celebração do Instrumento Particular com Pacto de Alienação Fiduciária ora contratado, se por
culpa da Outorgada esta perderá o sinal ora pago, a título de multa compensatória. Assim,
declaram as partes que o presente instrumento obedece à disposição do artigo 420, bem como ao
artigo 725, ambos do Código Civil Brasileiro - Lei 10.406 de 10/01/2002. Sendo obrigatório aos
contratantes, seus herdeiros e sucessores".

No caso em análise, observa-se que a autora depreendeu esforços a fim de dar cumprimento ao
negócio jurídico firmado entre as partes, enquanto a ré, após o pagamento do arras, dificultou o
cumprimento deste, considerando-se assim, a desídia da mesma em tentar qualquer solução para
ambas as partes.

Com relação ao dano moral, é evidente que os incisos V e X do artigo 5º da Constituição da


República asseguraram a indenização por dano moral como forma de compensar a agressão à
dignidade humana, entendendo-se esta como dor, vexame, sofrimento ou humilhação, angústias e
aflições sofridas por um indivíduo, fora dos parâmetros da normalidade e do equilíbrio.

Entretanto, ainda que defeituosa a relação jurídica travada entre as partes, sendo, inclusive,
capaz de ocasionar danos materiais e aborrecimentos, não se pode banalizar a previsão
constitucional da indenização por danos morais, pretendendo condenar qualquer ato que cause o
mínimo de aborrecimento, formando-se uma verdadeira indústria do dano moral.

O princípio da dignidade da pessoa humana, evidentemente aplicável ao caso, não pode ser
ilimitadamente posto em cena, para justificar toda e qualquer situação que não atinja os traços
previamente designados pelas partes. Em razão disso, há entendimento consolidado no sentido
de que não ocasionam dano extrapatrimonial aquelas situações que, não obstante desagradáveis,
fazem parte do cotidiano da sociedade contemporânea e constituem tão-somente mero
aborrecimento.

Há, inclusive, verbete sumular nº 75 do TJRJ nessa linha. Veja-se: O simples descumprimento de
dever legal ou contratual, por caracterizar mero aborrecimento, em princípio, não configura dano
moral, salvo se da infração advém circunstância que atenta contra a dignidade da parte.

Ante o exposto, nos termos do art. 487 I do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE, EM
PARTE, o pedido para: a) declarar rescindido o contrato entabulado entre as partes (fls. 41/43),
determinando que elas retornem ao seu estado jurídico anterior. b) condenar a ré a restituir, em

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dobro, à autora, a quantia paga a título de cumprimento da avença objeto do feito, corrigida
monetariamente a contar do desembolso e com juros de mora de 1% ao mês, a partir da citação.

Diante da sucumbência mínima, condeno a ré ao pagamento dos ônus sucumbenciais, fixados os


honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação.

Certificado o trânsito em julgado e a inexistência de custas pendentes, dê-se baixa e arquive-se

Rio de Janeiro, 25/09/2017.

Cristina de Araujo Goes Lajchter - Juiz em Exercício

___________________________________________________________

Autos recebidos do MM. Dr. Juiz

Cristina de Araujo Goes Lajchter

Em ____/____/_____

Código de Autenticação: 4DAL.QHEE.LSFZ.1ULR


Este código pode ser verificado em: www.tjrj.jus.br – Serviços – Validação de documentos
Øþ

110 CRISTINAGOES

CRISTINA DE ARAUJO GOES LAJCHTER:29779 Assinado em 25/09/2017 15:31:08


Local: TJ-RJ

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