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Experimental (Artigo)
Experimental (Artigo)
Doi: https://doi.org/10.12804/revistas.urosario.edu.co/apl/a.6132
* Dirigir correspondencia a Luciana Chequer Saraiva Messa: Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil. Correio eletrônico:
lucianasmessa@gmail.com
Para citar este artigo: Messa, L. C. S., Borloti, E., & Haydu, V. B. (2020). Estudos empíricos da ironia: revisão sistemática e
implicações para uma análise funcional. Avances en Psicología Latinoamericana, 38(1), 218-236. https://doi.org/10.12804/
revistas.urosario.edu.co/apl/a.6132
Estudos empíricos da ironia: revisão sistemática e implicações para uma análise funcional
Avances en Psicología Latinoamericana / Bogotá (Colombia) / Vol. 38(1) / pp. 218-236 / 2020 / ISSNe2145-4515 219
Luciana Chequer Saraiva Messa, Elizeu Borloti, Verônica Bender Haydu
elementos para a análise funcional empírica, e não [...] a verbal behaviour under multiple controls:
apenas interpretativa, do comportamento verbal. Multiple audience, stimuli (especially non-verbal)
Entretanto, há uma carência de revisões de estu- and motivational operations from these stimuli and
dos empíricos sobre comportamentos verbais em multiple audiences with the function of letting the
outras áreas do conhecimento que não a análise do listener produce a response (in general contrary
comportamento, cujos achados possam contribuir to what was said and almost always with ridicu-
para a análise funcional da linguagem. lous appointment)1 (Messa, Borloti, & Carmelino,
Para a análise funcional do comportamento, 2014, p. 117).
tanto o verbal quanto o não verbal, Skinner (2003)
propôs um argumento fundamental: Uma análise com o foco destacado no parágrafo
anterior tem seu mérito social, dada a função do
As variáveis externas das quais o comportamen- comportamento verbal irônico estar diretamente
to é função dão margem ao que pode ser chamado relacionada à vida em sociedade. A emissão e a
de análise causal ou funcional. Tentamos prever manutenção da ironia são vantajosas não apenas
e controlar o comportamento de um organismo para o falante, mas também para o ouvinte. Isso
individual. Esta é a nossa “variável dependente” significa, por exemplo, que a ironia pode ser emitida
- o efeito para o qual procuramos a causa. Nossas em um único contexto, tendo em vista dois efeitos
“variáveis independentes” - as causas do compor- diferentes: ridicularizar e fazer rir (humor). Esses
tamento - são as condições externas das quais o aspectos dependerão de alguns fatores: (a) quem
comportamento é função. Relações entre as duas é o falante; (b) quem é (são) o(s) ouvinte(s). Uma
- as relações de “causa e efeito” no comportamento pessoa que emite ironia com o objetivo de ridicu-
- são as leis de uma ciência (p. 38). larizar alguém pode sentir o efeito humorístico da
ironia em si mesmo; então, o efeito pode ser punitivo
Portanto, a avaliação das contingências envol- para quem ouve (vítima) e de humor para quem o
vendo uma ação verbal de um indivíduo é funda- fez (falante). Essa é uma parte da complexidade
mental para que se possa fazer uma análise funcional da ironia.
dessa ação. Isso significa que características das Diferentemente da mentira, por exemplo, em
variáveis que envolvem os estímulos antecedentes que o objetivo pode ser apenas se esquivar da pu-
(ocasião em que a resposta ocorre), a resposta verbal nição, a ironia tem um rol de possibilidades, tanto
em si e suas consequências reforçadoras, mediadas de causas quanto de efeitos. No caso de a ironia
por uma audiência, devem ser a base para a análise ter função de humor, ela pode fazer com que o
funcional (i.e., empírica) no sentido do argumento ouvinte ria e amenize as contingências aversivas
skinneriano, destacado na citação apresentada no do contexto (Hübner, Miguel, & Michael, 2005).
parágrafo anterior. Emitir ironia e reagir a ela com essa vantagem ou
Em defesa desse argumento, o presente artigo com outras, está diretamente relacionado a dois
de revisão sistemática da literatura foca na análise aspectos que Skinner (2003) apontou com relação
empírica do comportamento verbal irônico feita ao comportamento operante em geral: frequência
em estudos empíricos em outras áreas do conhe-
cimento que não a análise do comportamento, de 1
[...] um comportamento verbal sob múltiplos controles:
modo a identificar funções da ironia nos dados audiência múltipla, estímulos (especialmente não verbais)
desses estudos. A análise aqui proposta foi feita e operações motivacionais advindas desses estímulos e
audiência múltipla, com a função de deixar o ouvinte pro-
considerando a ironia, de acordo com os princípios duzir uma resposta (em geral contrária ao que foi dito e
da análise do comportamento, como sendo quase sempre com função de ridicularização).
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Estudos empíricos da ironia: revisão sistemática e implicações para uma análise funcional
e probabilidade da emissão de acordo com a taxa partes do episódio (falante e ouvinte) ao controle
de reforço. aversivo, em geral, do comportamento do ouvinte.
Com relação ao ouvinte, tem-se a mesma ex- O conceito de ironia foi estudado a fundo por
plicação: um ouvinte reage positivamente ou ne- Paiva (1961), definindo-a como aquilo que é o
gativamente a uma ironia, respectivamente, como contrário do que se diz, e ampliando o conceito em
estímulo apetitivo ou aversivo. Como estímulo cinco subtipos de ironias, a partir dessa definição
apetitivo tem-se o humorismo em geral. Como es- básica. Os cinco subtipos são: ironia pura, satíri-
tímulo aversivo pode-se citar o seguinte exemplo: ca, disfemística, restritiva e contornante. A ironia
se um trabalhador costuma ouvir ironias sarcásticas pura ocorre quando a função verbal é produzir
(as com função de crítica e deboche) de um mesmo como efeito apenas a compreensão do contrário
colega de trabalho com relação às suas competências do que se diz. A satírica é quando se produz como
profissionais, existe grande probabilidade de o com- consequência a ridicularização pelo cômico. A dis-
portamento dele diante desse colega de trabalho se femística é a ironia com a função de ridicularizar
manter por reforço negativo (fuga-esquiva). Além pelo menosprezo. Na restritiva, a função é a de
disso, existe também uma grande probabilidade ridicularizar pela restrição e na contornante, pela
de que a ironia do colega, emitida com intenção de indiferença. As funções que os diferentes subtipos
criticar e debochar, elicie sentimentos negativos de ironia têm sobre o comportamento do ouvinte
nesse trabalhador, que tenderá a se afastar ou a suscita a importância de análises dos efeitos das
minimizar a aversão do colega irônico. Do ponto consequências, de tal forma a justificar a análise
de vista prático, em geral, quando não é possível funcional da ironia pela ótica da análise do com-
o afastamento da estimulação aversiva, reações portamento. Assim, o objetivo deste artigo foi, a
negativas são minimizadas com piadas (Hübner et partir de uma revisão sistemática da literatura, ma-
al., 2005). Assim, a relevância social do presente pear as variáveis (ou indicadores de variáveis) que
estudo se soma à científica, ao propor condições estão sendo estudadas pelas pesquisas empíricas
para melhorar o diálogo dos analistas do compor- sobre ironia em outras áreas e indicar elementos
tamento com outras áreas do conhecimento. essenciais para a análise funcional da ironia.
Analistas do comportamento não têm utilizado
achados de outras áreas para o estudo da ironia; nem
mesmo têm estudado o tema ironia especificamente Método
e internamente à análise do comportamento (uma
exceção é o artigo de Messa et al., 2014). O con- A seleção das fontes de dados para a revisão
trário ocorre na Linguística, área na qual o estudo partiu da definição de estudo empírico de Demo
da ironia é comum, devido às suas variadas faces (2000), em que o estudo selecionado deveria
(diferentes formas e funções da ironia), sendo elas o ser o que mostra a “face empírica e fatual da
principal interesse de investigação nessa área (e.g., realidade; produz e analisa dados, procedendo
Brait, 1996; Machado, 1995; Nishiwaki, 2015). A sempre pela via do controle empírico e fatual”
partir de variados contextos de aprendizagem, ge- (p. 21). Nessa definição de empírico, delimita-
rando efeitos diversos, tanto de compreensão quanto ram-se quais aspectos dos estudos de outras áreas
de manipulação do episódio verbal, os linguistas, poderiam interessar em uma análise funcional,
mesmo não usando termos analítico-comporta- no sentido skinneriano. Esses aspectos são os
mentais, têm apontado o “poder” que a ironia pode mesmos pontos centrais da análise funcional da
gerar pelos efeitos que produz, que podem variar pesquisa comportamental tradicional: previsão
do reforço positivo (e.g., “ganhos”) para ambas as de resposta a partir da ocorrência de variáveis
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específicas e confirmação dessa ocorrência nos dade de estudos sobre o tema nas áreas específicas
dados, o repertório do participante. (Linguística, Psicologia e Neurociência) indexados
Assim, na busca dos elementos úteis à análise nas mesmas. A localização dos artigos foi realizada
funcional na bibliografia de outras áreas que não de maneira livre, ou seja, o trabalho foi localizado
a análise do comportamento foram estabelecidas e separado de acordo com os descritores indicados,
como categorias de análise: (a) conceito de ironia; independentemente da localização deles no texto
(b) características dos participantes; (c) objetivo (se no resumo, no título ou no corpo do texto).
da análise da ironia (produção, compreensão ou Os critérios de inclusão dos artigos foram:
ambas); (d) tipo de estímulos discriminativos para (a) palavra ironia estar em qualquer lugar no texto,
a produção e/ou compreensão da ironia (e.g., (b) serem estudos de natureza empírica, e (c) os
sentenças, situações, histórias); e (e) resultados, estudos serem das áreas de Psicologia, Linguística
efeitos ou consequências obtidos (as). Essas cate- e Neurociência. Os critérios de exclusão foram:
gorias foram tidas como úteis por poderem indicar (a) artigos abordarem a ironia como previsão situa-
itens da tríplice contingência, contribuindo para uma cional (a famosa “ironia do destino”); (b) artigos
análise funcional do comportamento verbal irônico. serem da Medicina (que, em geral, objetivaram
mapear o funcionamento cerebral enquanto pessoas
ouvem ironias); e (c) artigos conterem explicações
Fontes de Dados e Procedimento psicanalíticas, filosóficas ou literárias da ironia.
A análise dos resultados foi realizada a partir da
Os descritores selecionados para a busca de leitura inicial do resumo do artigo para confirma-
artigos foram: ironia, ironia verbal, sarcasmo, ção da seleção dentro dos critérios anteriormente
controle múltiplo, irônico e comportamento verbal descritos. Em seguida foi feita a leitura do artigo
(irony, verbal irony, sarcasm, multiple control, na íntegra e registradas as seguintes informações:
ironic, verbal behavior). Inicialmente eles foram autores, ano de publicação, características dos par-
combinados um a um ou uns aos outros por inter- ticipantes. Dado o contexto de análise da ironia em
seção pelo operador booleano and. Cada descritor cada artigo, foram registrados: os objetivos dos
foi localizado individualmente até se esgotar a ne- estudos, os tipos de antecedentes utilizados pelos
cessidade de localização daquele termo; só então autores (estímulo discriminativo), o tipo de efei-
foi utilizado um novo descritor para a busca de to (consequência) e o foco da análise, isto é, se a
novos artigos. Em seguida, realizou-se uma busca compreensão (com especificação das características
com os operadores booleanos de combinação de do ouvinte) ou a produção da ironia (com especi-
termos por união (or) e, depois, por exclusão (not). ficação das características do falante). Depois de
Tanto na bibliografia da análise do comporta- registradas, essas informações (dados) foram or-
mento quanto na das outras áreas, a localização ganizadas em uma planilha em ordem alfabética,
dos artigos ocorreu por meio das bases de busca e a partir dos nomes dos autores.
recuperação disponíveis via Internet e dos descri-
tores citados anteriormente. A busca foi realizada
nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde Resultados e discussão
(bvs), da National Center for Biotechnology In-
formation (ncbi); da Science Direct, da PsycInfo A partir da busca feita nas bases de dados foram
e da EBSCO, sem restrição do período de busca. encontrados 211 artigos. Desse total, com base na
A partir de uma busca prévia, estas bases de dados leitura dos títulos dos artigos e aplicando-se os cri-
foram escolhidas em função da quantidade e quali- térios especificados no método, foram excluídos,
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inicialmente, 167. A partir da leitura dos resumos et al., 2016); e (b) a produção e compreensão de
dos artigos e com a aplicação dos critérios de in- crianças quando expressões irônicas são utilizadas
clusão, foram selecionados os 43 artigos dos quais em situações comunicativas familiares (Angeleri, &
os dados estão organizados na tabela 1. Airenti, 2014; Filik et al., 2014; Recchia et al., 2010).
Os artigos analisados são em sua maioria, da Quanto ao que concluíram, alguns estudos de-
Psicologia (33). Em seguida, são os da Neurociên- monstraram que a emissão de ironia vem acompa-
cia (6) e da Linguística (4). O foco dos estudos nhada de “pistas” verbais e não verbais emitidas
foi, em grande parte, a análise da compreensão pelo falante com a função de se fazer compreender
da ironia; alguns analisaram tanto as condições pelos ouvintes (Anolli et al., 2000; Baptista et al.,
de compreensão quanto as de produção da ironia 2015; Bruntsch, & Ruch, 2017a). Outros, que a ironia
em contextos que permitiam ao participante ver, é uma forma de comunicação prevalecente entre
ouvir ou ler situações em que tipos diferentes de adolescentes usuários de substâncias psicoativas
ironia estavam presentes em frases/sentenças e/ou com função de aproximação social e humor (Brum,
em situações do cotidiano. Esses contextos tiveram & Siniak, 2011). Alguns estudos apresentaram dados
função de estímulos antecedentes (discriminativos) que demonstram uma tendência ao uso de ironia
para emissão da compreensão ou para estimular a por pessoas que costumam utilizar o humor com
emissão de uma resposta irônica pelo participante. frequência (Calmus, & Caillies, 2014; Dews et al.,
Os estudos analisados eram bastante diversi- 1996; Jorgensen et al., 1984). Em outros, a com-
ficados em seus objetivos gerais, alguns deles se preensão do elogio irônico e seus benefícios além da
propuseram a investigar: (a) os efeitos emocionais crítica foram discutidos (Bruntsch, & Ruch, 2017b;
que a ironia gera nos ouvintes em situações distintas, Dennis et al., 2012; Bruntsch, & Ruch, 2017b). Adi-
por exemplo, em situações comunicativas comple- cionalmente, houve estudos que demonstraram que
xas, em relações familiares e não familiares, bem pessoas com determinados diagnósticos psiquiátri-
como a função social do uso da ironia (Akimoto & cos compreendem observações irônicas, enquanto
Miyazawa, 2011; Amenta et al., 2013; Campanella, as com outros tipos mais graves de diagnóstico têm
2013; Dennis et al., 2012; Filik et al., 2015; Filik dificuldades em compreender essas observações.
Tabela 1.
Autores e ano, objetivo geral, número de participantes, características dos participantes, tipos de antecedentes (SD),
tipo de efeito (consequências) da emissão de ironia e se envolvia compreensão e/ou produção da ironia (ouvinte e/ou
falante) de acordo com as publicações revisadas
Características Tipo de Compreensão
Tipo de efeito
Autores/ano N Objetivo geral dos antecedente ou produção
participantes (SD) da ironia
Investigar que fatores
Akimoto, &
desempenham um papel nos Sentenças Risada, prazer e
Miyazawa 30 Adultos típicos Compreensão
sentimentos de um ouvinte positivas humor
(2011)
evocados pela ironia.
Decodificar componentes
emocionais em situações
Amenta, Noël,
comunicativas complexas
Verbanck, & Sentenças Convencimento
44 (efeito emocional da ironia) e Adultos típicos Compreensão
Campanella positivas e atenção
sua relação com habilidades
(2013)
empáticas em alcoolistas
crônicos.
Continuar
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Explorar a compreensão
da metáfora e ironia na
Mo, Su, Chan, esquizofrenia durante a Adultos/ Situações Convencimento
29 Compreensão
& Liu (2008) remissão e examinar o papel atípicos cotidianas e atenção
do qi à luz da Teoria da
Mente.
Analisar um grupo de
pacientes com e sem
Monetta, parkinson com relação à
Adultos Situações Convencimento
Grindrod, & 11 capacidade de interpretar Compreensão
típicos/atípicos cotidianas e atenção
Pell (2009) intenções comunicativas
subjacentes à ironia verbal e
mentiras.
Investigar se a apreciação e
o processamento da ironia
estão relacionados com
Nicholson, habilidades de acordo com
Crianças Situações Convencimento Compreensão/
Whalen, & 30 o sexo e se o processamento
típicas cotidianas e atenção produção
Pexman (2013) da criança é maior do que
o sentido da fala que pode
explicar a Teoria Molecular
ou Interativa.
Crítica,
Rapp, Langohr, Investigar a compreensão Sentenças deboche e
Adultos
Mutschler, & 47 de ironia e de provérbio em positivas e constrangimento/ Compreensão
atípicos
Wild (2014) mulheres com esquizofrenia. negativas risada, prazer e
humor
Continuar
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cínico (Blaser, 1976; Glenwright, & Pexman, 2010; do comportamento verbal irônico pelas crianças.
Kreuz, & Glucksberg, 1989). Isso evidencia que a Isso mostra que a comunidade verbal próxima da
história de reforço do ouvinte pode fazer com que criança é capaz de modelar desde cedo o comporta-
ele sinta como reforçador ou aversivo os ambientes mento de falante e de ouvinte relacionados à ironia.
com estímulos verbais irônicos, a depender se a
ironia for “positiva” ou “negativa” em relação a sua
história de reforço e às operações motivacionais Quem eram os participantes do estudo?
do momento.
Essa evidência dos efeitos “positivos” ou “ne- A tabela 1 permite verificar que 27 estudos fo-
gativos” da ironia (humor, riso, crítica, deboche, ram realizados com adultos (homens e mulheres)
constrangimento, raiva) aparece especialmente no acima de 18 anos, com desenvolvimento típico;
estudo de Recchia et al. (2010), que observaram em segundo lugar (n = 6) foram os estudos com
os comportamentos das crianças ao compreende- adultos com algum diagnóstico de transtorno men-
rem e emitirem ironia em conversas familiares. tal (esquizofrenia/demência/amnésia/Parkinson/
Os comportamentos verbais irônicos emitidos abuso de álcool); crianças com desenvolvimento
pelos pais apareceram em contextos reforçado- típico foram participantes em sete estudos; crian-
res (harmônicos) e aversivos (conflituosos). Nos ças com desenvolvimento atípico, especialmente
contextos conflituosos (e. g., quando uma criança o Transtorno do Espectro Autista (tea), em quatro
emitia comportamento emocional de teimosia), estudos; e, por fim, adolescentes foram os parti-
as mães foram mais propensas a fazerem per- cipantes de dois estudos. É importante analisar
guntas retóricas e a emitirem ironias; e os pais, quem foram os participantes das pesquisas, uma
a emitirem comportamentos irônicos mais sob a vez que suas características ajudarão a identificar
forma de hipérboles (isto é, exageravam ao co- e compreender parte das consequências da ironia
municarem uma ideia com finalidade expressiva), obtidas nos estudos. Esses tipos variados de par-
eufemismos (isto é, emitiam expressão ou locução ticipantes eram ora falantes irônicos (produção)
mais agradável em vez de palavras que poderiam ora ouvintes de ironias (compreensão).
soar grosseiras) ou perguntas retóricas (isto é, Em estudos como os de Stratta et al. (2007),
perguntas mais eloquentes). Os filhos também Mo et al. (2008), Amenta et al. (2013), Zalla et al.
apresentaram evidências de uma crescente capaci- (2014) e Rapp et al. (2014), em que os partici-
dade de emitir comportamentos verbais irônicos, pantes eram adultos/crianças com diagnóstico de
especialmente com topografias de hipérbole e transtorno psicológico (i.e., tea, Esquizofrenia), as
de perguntas retóricas. Finalmente, seus irmãos conclusões foram que a compreensão da ironia era
mais velhos demonstraram compreender melhor reduzida. Apesar de fazerem parte da comunidade
a ironia do que os mais novos, confirmando mais verbal do irônico ou terem intimidade com ele,
uma vez a importância da história de reforço na os portadores desses transtornos pareceram estar
relação com a comunidade verbal para que reper- psicobiologicamente limitados ou impedidos de
tórios mais refinados de compreensão da ironia compreender a ironia. Os autores não souberam
sejam adquiridos. interpretar o porquê disto, mas, talvez isso se deva
No geral, acerca da compreensão ou produção ao fato de a ironia ser um comportamento verbal
da ironia, os resultados dos estudos de revisão su- complexo que, em sua base de definição linguística
gerem que as conversas em casa entre os membros (Paiva, 1961), envolve o que não pode ser tateado
da família podem ser contextos importantes para no ambiente, como o contrário do que é verbaliza-
o desenvolvimento da produção e compreensão do (que, por sua vez, já é um estímulo arbitrário).
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falante: a função do comportamento verbal irônico A identificação desses itens nos estudos revi-
emitido. Os estudos revisados mostram que, para ser sados demonstra que eles podem ser considerados
uma audiência qualificada para um irônico, como relevantes para uma análise funcional da ironia,
afirmou Skinner (1957), o ouvinte precisa fazer uma vez que avaliam empiricamente o ambiente
parte da comunidade verbal do irônico, ou pelo de ocorrência da ironia e a função que o compor-
menos ter experimentado uma parcela de variáveis tamento irônico tem neste ambiente. Assim, os
dessa comunidade para que ele possa compreender requisitos básicos para a análise funcional (Skinner,
o significado (função) ironia emitida por ele. 1957) puderam ser vistos nos estudos revisados.
Nessa análise funcional empírica do compor-
tamento irônico, o pesquisador deve estar atento
Conclusão às características: (a) dos antecedentes que contri-
buem para a emissão de ironia (nos estudos foram
Respondendo ao seu objetivo, o presente estu- apresentados estímulos antecedentes em forma de
do demonstrou que os estudos empíricos da ironia sentenças irônicas positivas e negativas e histórias
apontam quatro elementos a serem considerados cotidianas com enredo irônico); (b) das variáveis
em pesquisas experimentais ou análises funcionais ambientais das quais o comportamento irônico é
da ironia por analistas do comportamento. Pri- função (os ambientes analisados foram tanto ex-
meiro, apontam para o indivíduo que se comporta perimentais quanto naturais, com participantes que
(o quem; o irônico ou o ouvinte dele): nos estudos se conheciam e não se conheciam, ou familiares e
analisados, esse dado refere-se aos participantes dos não familiares); (c) das consequências do compor-
estudos, ou seja, as crianças e os adultos típicos e tamento verbal irônico geradas no ouvinte e no fa-
atípicos; e ao comportamento dos ouvintes que lante do comportamento verbal irônico (produzidas
eram foco da maior parte dos estudos. Segundo, por respostas emitidas em conjunto com variáveis
apontam para o objeto-foco de análise (o quê; a ambientais que, nos estudos revisados, foram va-
ironia produzida ou a compreendida): os estudos riáveis com funções na geração de convencimento,
demonstraram uma maior tendência a analisar humor e crítica); e (d) dos integrantes do episódio
a compreensão da ironia em adultos e crianças, verbal irônico: falante, ouvinte, ouvinte qualifica-
sendo que a produção da ironia foi analisada, em do e ouvinte não qualificado (isto é, se os ouvintes
sua maior parte, nas crianças atípicas. Esse foco fazem ou não fazem parte da mesma comunidade
na compreensão verbal é relevante ao programa verbal dos falantes, respondendo adequadamente
de pesquisa lançado por Skinner, que enfatizou a ou não, ao contexto irônico).
produção verbal. Terceiro, apontam para a função Os resultados apresentados pelos estudos de-
do comportamento (o para quê: efeitos ou con- monstram que tanto adultos quanto crianças típicas
sequências da ironia) demonstrada nos estudos compreendem melhor a ironia em ambientes fami-
como convencimento e atenção, risada, prazer e liares do que os(as) atípicas; e que tanto adultos
humor e crítica, deboche e constrangimento. Esses quanto crianças atípicas apresentam dificuldades
dados foram discutidos em nível interpretativo ou até mesmo impedimentos para compreender a
por Skinner. Quarto, indicam operacionalmente o ironia, tanto na forma falada quanto na forma escri-
ambiente no qual o irônico se comporta (o onde: ta. Nos contextos em que a ironia é frequentemente
contexto): ambientes familiares e não familiares utilizada pelos adultos, as crianças apresentaram
(ambientes experimentais com pessoas conhecidas maior tendência a emitir frases irônicas.
e desconhecidas, em clínicas e grupos de reabili- Espera-se que a descrição de elementos empíri-
tação, com possibilidade de observação in loco). cos para uma análise funcional do comportamento
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verbal irônico feita no presente estudo contribua Amenta, S., Noël, X., Verbanck, P., & Campanella, S.
para o aprimoramento do conhecimento desse (2013). Decoding of emotional components in
comportamento e para a execução de pesquisas complex communicative situations (irony) and
experimentais sobre o mesmo no campo da aná- its relation to empathic abilities in male chronic
lise do comportamento. Nessa execução, a análise alcoholics: An issue for treatment. Alcohol Cli-
funcional do comportamento verbal irônico deve nic Experimental Research, 37, 339-347. https://
passar por todas as etapas de uma análise funcio- doi.org/10.1111/j.1530-0277.2012.01909.x
nal tradicional, permitindo compreender ainda Anastácio-Pessana, F. L., Almeida-Verdu, A. C. M.,
mais que a ironia é comportamento operante e a Bevilacqua, M. C., & Souza, D. G. (2015). Usan-
explicação da sua função depende de variáveis do o paradigma de equivalência para aumentar a
ambientais específicas, algumas identificadas e correspondência na fala de crianças com implan-
isoladas experimentalmente em estudos realiza- te coclear na nomeação de figuras e na leitura.
dos em outras áreas; e que comportamento verbal Psicologia: Reflexão e Crítica, 28, 365-377.
irônico é desenvolvido no repertório do indivíduo https://doi.org/10.1590/1678-7153.201528217
quando ele vivencia contingências que favorecem Angeleri, R., & Airenti, G. (2014). The development
sua aquisição e manutenção. A ironia também é of joke and irony understanding: A study with
compreendida como um comportamento verbal 3- to 6-year-old children. Canadian Journal of
adaptativo; e pode ser emitida com várias funções, Experimental Psychology, 68, 133-146. https://
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