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Maximilien de Robespierre oatangergeree | DISCURSOS E RELATORIOS _ NA CONVENCAO uer) ESTADO DO RIO DE JANEIRO : TRADUCAO | Maria Helena Franco Martins Gerd Bornheim, | ed? uery COnTRAPORTO 16 MAXIMILIEN DE ROBESPIERRE lien de Robespierre possufa um liga¢ao implicitamente amo- 1082 com 0 idioma que o formou e no qual se exprimiu Caso no estivessem referenciadas em fatos precisos da histéria da Franga, caso por um desses absurdos se tratasse da produgdo puramente ficcional de um insano, de um esquizofrénico, mes- ‘mo assim suas falas reuniriam todas as excepcionais qualidades de texto que se encontram em grandes autores. Coi nas paginas seguintes, a comprové-lo. Cronologia abreviada 1758 6 De mato Nasce em Arras, Franga, Maximilien Frangois Ma- rie Isidore de Robespierre, em uma familia da nobreza. 1781 Depois de estudar com os oratorianos no Liceu Louis-le~ Grand, torna-se advogado em sua cidade natal. & muito in- fluenciado pela leitura de Rousseau 1789 sanzino Eeleito (pelo Terceiro Estado) deputado para os Es- tados Gerais, que se reuniriam em Paris, Defende um progra- ma arrojado: sufrigio universal com eleig6es diretas, instrugio {gratuita ¢ obrigatéria, impostos progressivos. 5 pe mato O rei Luis XV1 instala os Estados Gerais em Ver- salhes, dando posse a 300 deputados da nobreza, 300 do clero & 600 do Terceiro Estado. 17 DE JUNHO Considerando que representayam 98% da po- pulagao, 0s deputados do Terceiro Estado declaram-se consti- tuidos em Assembléia Nacional. 20 DE juNHo O rei manda fechar 0 saldo de reunides. Os deputados transferem-se para a sala do Jeu de Paume (local de recreio dos cortesios) e fazem o juramento de “nunca se sepa- rarem ¢ reunizem-se onde quer que as circunstincias 0 exigis- em”, até que fosse votada uma Constituicao. Ms MAXIMILIEN DE ROBESPIERRE 9 De JULHO A revelia da vontade do rei, os representantes do Terceiro Estado declaram instaurada uma Assembléia Nacional Constituinte. Luis XVI trama um golpe contra os deputados rebelados, Paris acompanha tensa os acontecimentos, cercada por 20 mil soldados. 14 Dx jULHo Os parisienses tomam de assalto a fortaleza da Bastilha, que servia de prisio e depésito de armas, ¢ improvi- sam uma guarda nacional e uma nova administragio para a ci- dade. E 0 inicio da Revolugao. Os camponeses também come- ‘gam a se sublevar, atacando castelos e queimando os registros dos tributes feudais, 4 DE AGosTo A Assembléia aprova o fim dos privilégios feu dais e dos dizimos, decretando a igualdade perante os impostos 26 DE AGosTo A Assembléia aprova a Declaracio dos Direi- tos do Homem e do Cidadio, que, entre outras coisas, proc! ma o dircito de resistir & opressio. Luis XVI recusa-se a sancio- nar as principais decisdes da Assembleia, Aguarda a chegada de tropas mercendtias alemas ¢ suigas para pér fim ao estado de rebelido. PRIMEIROS DIAS DE OUTUBRO Nova sublevacdo em Paris. Um numeroso grupo de populares, mulheres a frente, parte para Versalhes, trazendo de ld o rei ¢ a rainha, que sio manti- dos como reféns no palacio das Tulherias. A Assembléia Cons- tituinte passa a governar efetivamente o pais. Multiplicam-se sociedades de debates politicos. Entre elas, destaca-se a Socie~ dade dos Amigos da Constituigio, que se reunia no refeitério do convento dos Jacobinos. Surge dai o nome pelo qual seriam conhecidos os integrantes da ala radical da Revolucao, lidera- dos por Robespierre. 1790 15 DE 14NEIRO Inicia-se um ano de intensa atividade legisla- tiva. A Assembléia Constituinte divide 0 pais em 83 novos de- (05 NA CONVENCAO wv SCURSOS E RELATO partamentos, cam superficies aproximadamente iguais, de mo- do a ctiar uma nova organizacdo estatal, sepultar os costumes feudais, assegurar a unidade nacional e estabelecer a uniformi- dade administrativa. 15 De Maro A Assembléia autoriza a venda das propriedades nacionais em leildes piiblicos, dividindo as terras em parcelas pequenas que podiam ser arrematadas e pagas em doze anos. abole a nobreza hereditéria, com 19 DE FUNHO A Assem| seus titulos ¢ brasdes. 2 DE NovEMBRo Por decreto da Assembléia, todos os bens da Igreja, sobretudo terras, passam a pertencer a nagio. Come- ga a separacao de fungoes entre Igreja e Estado. 1791 FEVEREIRO So abolidas as corporagies e seus privilégios 21 pe sunno Divulga-se uma noticia extraordindria: Luts XVI fuugira do palicio das Tulherias para contra-atacar a Revolugao com apoio do exterior. O rei, porém, 6 reconhecido e detide em ‘Varennes, retornando a Paris sob custédia. 17 pe JULHO Grande manifestagao na capital contra o rei. Robespicrre se destaca como um dos principais chefes da nova insurrei¢ao. SeTExARO Promulga-se a nova Constituigio, que no pro- clamava a Repiiblica nem instituia o sufragio universal, dei- xando ainda algumas prerrogativas ao poder real. 1792 20 pr anRtL Compreendendo que uma intervengio estran- geira era inevitivel, a nova Assembléia Legislativa antecipa-se a ela e consegue do rei uma declaragao de guerra a Austria e Prussia, Forma-se um ministério chefiado por girondinos, agrupamento moderado cujos membros mais influentes ha- 20 MAXIMILIEN DE ROBESPIERNE viam sido eleitos pelo departamento da Gironda. Depois de sucessivas derrotas francesas, com as tropas prussianas jd em ‘Champagne, a Assembléia proclama que “a patria est em peri go”, Acelera-se 0 processo revolucionério interno, agora trans- formado em guerra civil, A agio do ex-constituinte jacobino Robespierre ganha grande destaque. E acoso Uma sublevagao popular instala na Comuna idade) de Paris a sede de um governo revolucio- a0s girondinos. Robespierre é um dos chetes des- se governo paralelo revoluciondrio. O rei é preso na torre do ‘Templo. Nas seis semanas que se seguem, as energias se con- centram na reorganizagio da defesa externa e na identificagio dos inimigos internos, O Exército prussiano chegara a Verdun, praga forte que dominava Paris, Aqueles que — real ou supos- tamente — simpatizam com a intervengao estrangeira sio per- seguidos. As prises se enchem, as execugées comegam, 20 DE seremBRO Apesar de famintas e maltrapilhas, as tro- pas revoluciondrias francesas obtém em Valmy seu primeiro @xito significativo contra os prussianos. No mesmo dia, toma posse a Conven¢éo Nacional, eleita por sufragio universal (mas por reduzido ntimero de eleitores, pois os moderados se abs- tem). A Monarquia é abolida, decreta-se o ano I da Repiiblica Aumenta a disputa entre jacobinos e girondinos. © curso da guerra comeca a mudar a favor do Exército francés, 1793, 21 DE saEIRO O “cidadao Luis Capeto” — ninguém menos que Luis XVI — ¢ executado na Place de la Concorde, em Paris, por decisio da Convenggo, tomada por pequena margem de votos. Robespierre teve papel de destaque na acusagdo. Am- plia-se a coligaco externa contra a Revolugao. Para reforcar 0 Exército, a Convengio ordenara a requisi¢ao de 300 mil ho- ‘mens jovens. Irrompe em seguida uma revolta na Vendéia e em regides vizinhas, ditigida por padres catélicos e nobres mo- DISCURSOS F RELATORIOS NA CONVENCAO a narquistas. Em Paris, os radicais, cuja base social eram os cha- mados sans-culottes, se fortalecem. 31 DE MAIO A 2 DE 1UNHO Grandes agitagées em Paris, com a prisao de 29 lideres girondinos. 24 pe juno Expurgada dos chefes girondinos, a Conven- Gio vota a Constituigio do ano |, radicalmente democratica, 10 DE OvTUBRO A Convengao concede poderes extraordin’- rios ao governo, “até a paz”. O novo Executivo, com plenos poderes, se divide em dois érgios principais: 0 Comité de Sal- vagio Publica © 0 Comité de Seguranga Geral. Na pritica, 0 primeiro deles, de doze membros — entre os quais Robes re —, assume o governo da Franga, com poderes ditator para “salvar o pais da invasdo”. Para reprimir levantes contra- revolucionarios e punir “traidores a servigo do estrangeiro”, decide-se explicitamente “colocar o Terror na ordem do dia”. Seguem-se prisdes em grande escala, © pais mantém cerca de um milhdo de homens mobilizados no Exército. A crise social e econémica se agrava, 16 pe ouruDRo A rainha Maria Antonieta, vitiva de Luis XVI ¢ irma do imperador da Austria, 6 executada, 1794 Mango Robespierre combate as tendéncias moderadas e par- ticipa da condenacio 4 morte de Hébert e seus seguidores. ApRIL Danton ¢ Desmoulins também sio executados. Promulga-se uma lei destinada a acelerar os julgamentos pelos tribunais revoluciondtios, suprimindo a defesa dos presos e a necessidade de audiéncias para ouvir testemunhas. Nos cin- qienta dias subseqiientes so executadas 1.376 pessoas, Na frente de combate, o Exército francés obtém vit6rias, conse- 22 MARIMILIEN DE ROBESPIERRE guindo rep wasores para além das fronteiras do pais. Mas, com o aprofundamento do Terror, a base popular dos jacobinos diminui, Robespierre, apelidado de “Incorruptivel” por seu modo de vida simples, torna-se 0 alvo principal dos descontentes. 26 be yuLH0 Depois de uma auséncia de seis semanas, Ro- bespierre comparece a Convengio para defender-se das a es de ter institufdo uma ditadura, Faz seu tiltimo discurso, consciente de que sera deposto e executado. 27 ve juto (9 TERMIDOR) Declarado “fora da lei” pela Convengio, Robespierre é preso, © movimento para liberti-lo € rapidamente sufocado, 28 DE JULHO Aos 36 anos, Robespierre é to com Saint-Just (31 anos) ¢ outros correl vengdo retoma para si os poderes. Na seqiiéncia dos eventos, 0 girondinos remanescentes retomam seus lugares. Chega 20 fim 0 Terror. E promulgada uma nova Constituigao, chama- da “do ano Ill”, que, entre outras medidas, suprime o suftégio universal. DISCURSOS E RELATORIOS NA CONVENCAO ts MAXIMILIEN DE RODESPIERRE xava de que seu confidente, Beurnonville, viera para assassini- Jo no meio de seu Exército, dizendo em seguida abertamente que respondia por ele, porque era seu amigo? © que vimos desde essa época até 0 momento em que falo? Nenhuma medida decisiva para a salvacio da patria, porque a influéncia da faccao ditigiu-as todas. Foi decretada a prisdo de alguns individuos, o selo foi aposto em seus documentos, mas 86 apés terem sido devidainente advertidos, e depois que virios deles — tais como Sillery ¢ d'Orléans — solicitaram eles mes- ‘mos essa formalidace, Bonne-Carrére, Laclos, Sauvin e outros igualmente suspeitos foram soltos logo depois da prisio. Todos 08 Bourbons foram feitos reféns; mas era preciso colocar os acusados nas mios da justiga. Transformé-los em reféns © en vié-los a0 confins da Repiblica seria diferente de subtrai-los império da lei e & autoridade revolucionsria, temida pelos conspiradores? Seria diferente reservi-los, de certo modo, co- mo objetos de troca pelos nassos comissarios detidos pela co- nivéncia de Dumouriez com os chefes da facc40, e como meios de transagio com os tiranos? Pego que os individuos da familia ¢’Orléans, cognominada Igualdade, sejam citados a comparecer diante do tribunal revo- lucionério, assim como Sillery, sua mulher, Valence e todos os homens especialmente ligados a essa casa; que este tribunal seja igualmente encarregado de instruir processo de todos 0s ou tros ciimplices de Dumouriez. Ousaria eu nomear aqui patrio- tas tais como Brissot, Vergniaud, Gensonné, Guadet? — Reno- Yo neste momento a mesma proposigio que jé manifestei com relasio a Maria Antonieta da Austria, Solicito que a Conveneao Nacional se ocupe em seguida, sem trégua, dos meios tantas ve- 2es anunciados de salvar a patria e de aliviar a miséria do povo. v Sobre a nova Declaragao dos Direitos 24 de abril de 1793 A queda da realeza impuna o elaboragito de wna nova Cons- tituigao. Esta eva a principal tarefe ta Como, pala gue fomada de enapréstimo ao vocabuldrio politico consagrad ST ealie depos da Independéncia dos Estados Unidos. Em 15 de fevereiro, 0 Marqués de Condoreet apresentou wn projeto que instourava uma espécie de “reptiblica de notéveis”. Os ja- cobinos, ou “montanheses”, defendiant outra concepgo, bem mais democratica, que deveria ser precedida de uma Declaragto dos Direitos. Discursando sobre ela, Robespierte apresentow suas idétas sobre a propriedade, a progressividade dos impostos e a Jraternidade dos povos. Cidadaos! . Pedi a palavra, na iiltima sessio, para propor alguns artigos adi importantes, que dizem respeito Declaragao dos Direitos do Homem e do Cidadao. . Vou propor-lhes de inicio alguns artigos necessarios para completar vossa teoria sobre a propriedade. Que essa palavra nao alarme ninguém: almas de lama, que nao estimais sento © ouro, niio quero tocar em vossos tesouros, por mais impia ue seja sua fonte, Deveis saber que essa lei agraria de que tan- to falastes nao passa de um fantasma criado pelos patifes para apavorar os imbecis. - Sem ditvida, nao seria preciso uma revolugao par: © universo que a extrema desproporgdo das fortunas é a fonte de muitos males e muitos crimes; mas nem por isso deixamos de estar convencidos de que a igualdade dos bens é uma qui mera. Quanto a mim, creio que ela ainda é menos necessiria & formar “7 felicidade privada do que ao bem-estar publico: trata-se muito mais de tornar a pobreza honrosa do que proscrever @ opulén- cia; a choupana de Fabricio nada tem a invejar ao palicio de Cassio. No que me diz respeito, gostaria tanto de ser um dos filhos de Aristides, criado no Pritaneu a expensas da Repti quanto 0 herdeiro presuntivo de Xerxes, nascido no lodo dos tursos para ocupar um trono decorado com o aviltamento dos povos, ¢ abrilhantado pela miséria publi Estabelecamos, pois, de boa-fé os principios do dircito de propriedade; isso ¢ tanto mais necessirio quanto nfo ha um s6 deles que os preconceitos os vicios dos homens nao tenham procurado envolver nas mais espessas nuvens, Perguntai ao mercador de carne humana o que é a proprie- dade; vai dizer-vos, mostrando aquele longo ataride que chama de navio, onde encaixotou ¢ acorrentou homens que parecem vivos: “Eis ai minhas propriedades; comprei-as a tanto por ca- beca". Interrogai o fidalgo que tem terras e vassalos, ou que pensa que 0 universo esté transtornado desde que nao mais os ossui, ¢ ele vos dard idéias mais ou menos semelhantes sobre a propriedade. Interrogai os augustos membros da dinastia dos Capetos; dir-vos-8o que a mais sagrada de todas as propriedades é sem qualquer dtivida 0 direito hereditério de que sempre gozaram de oprimir, aviltar ¢ extorquir legalmente e monarquicamente 8 25 milhdes de homens que habitavam o territorio da Franca, sob os caprichos de sua vontade abit Aos olhos de toda essa gente, a propriedade nao envolve (Exchui todas as nogdes do justo e do injusto.) Por que vossa Declaragéo dos Dircitos parece apre- sentar 0 mesmo erro? Ao definir a liberdade, 0 primeiro dos bens do homem, o mais sagrado dos direitos que ele recebe da natureza, dissestes com razio que os limites dela eram 0s di- reitos de outrems por que nao aplicastes esse prinefpio a pro- sdade, que & uma instituigdo social? Como se as da naturcza fossem menos invioliveis que as convengdes dos is eternas DISCURSOS & RELATORIOS NA CONVENCAO 89 homens. Multiplicastes os artigos para assegurar a maior liber- dade ao exercicio da propriedade, ¢ nao dissestes uma tinica palavra para determinar o caréter legitimo desse exercicios de maneira que vossa declaraclo parece feita nao para os homens, ‘mas para 0s ricos, para os monopolizadores, para os agiotas e para os tiranos. Proponho-vos que reformeis esses vicios sa~ cramentando as seguintes verdades: Art. I. A propriedade ¢ 0 direito que cada cidadao tem de usufruir e dispor da porgao de bens que lhe é garantida pela lei 11. O direito de propriedade é limitado, como todos os ou- ros, pela obrigagao de respeitar os direitos de outrem. IL, Ele nao pode prejudicar nem a seguranga, nem a liberda- de, nem a existéncia, nem a propriedade de nossos semelhantes.. IV, Toda posse, todo tréfico que viole esse principio & eimor Falais também do imposto, para estabelecer o principio in- contestavel de que este s6 pode emanar da vontade do povo ou de seus representantes; mas esqueceis uma disposigio que 0 teresse da humanidade reclama; esqueceis de sacramentar a ba- se do imposto progressivo. Ora, em matéria de contri piiblicas, havera principio que com mais evidéncia tenha sido tirado da natureza das coisas e da eterna justiga do que aquele ‘que impde aos cidadiios a obrigacdo de contribuir para os gastos, publicos, progressivamente, segundo a dimensao de sua fortuna — isto é, segundo as vantagens que tiram da sociedade? Proponho-vos consigna-lo em um artigo concebido nestes termos: ‘Os cidadaos cujos proventos nao excedam aquilo que é ne- cessirio a sua subsisténcia devem ser dispensados de contribuir para os gastos piblicos; os outros devem sustenté-los progres- sivamente, segundo a dimensio de suas fortunas. © Comité ainda esqueceu inteiramente de lembrar os deve- res de fraternidade que unem todos os homens e todas as na- 62s, e seus direitos a uma miitua assistencias parece ter igno- rado as bases da eterna alianga dos povos contra 0s tiranos; oo MAXIMILIEN dir-se-ia que vossa declaragio foi feita para um rebanho de criaturas humanas encerradas num canto do globo, € nto para a imensa familia qual a natureza deu a Terra como patti- ménio e morada, Proponho-vos preencher essa grande lacuna com os artigos que se seguem: eles s6 podem granjear-vos a es- tima dos povos; é verdade que podem ter 0 inconveniente de vos indispor irremediavelmente com os reis. Confesso que esse inconveniente nao me amedronta; nao amedrontara aqueles que nao querem reconciliar-se com eles. Art. L Os homens de todos os paises so irmaos, ¢ 08 dife- rentes povos devem ajudar-se mutuamente, segundo seu po- der, assim como os cidadaos do mesmo Estado. 11. Aquele que oprime uma nagio se declara inimigo de todas. TIL. Aqueles que guerreiam contra um povo para deter 0 progresso da liberdade ¢ aniquilar os direitos do homem de- ‘vem ser perseguidos por todos, nao como inimigos ordinérios, mas como assassinos e bandidos rebeldes. IV. Os reis, os aristocratas, os tiranos, quaisquer que sejam, so escravos revoltados contra o soberano da Terra, que & © genero humano, € contra o legislador do universo, que ¢ a natureza Cidadéos, eu teria outros artigos a vos propor, se tivésseis a paciéncia de me ouvir por mais tempo, mas eles se encontram dos na série dos outros artigos, enunciados no projeto de Declaragdo dos Direitos do Homem, ¢ para que eu possa usuftuir da amplitude do meu sufrigio seria necessério que me permitisseis ler esse projeto. Pensei dever iniciar esta Declara- 0 com umn preambulo, Os Representantes do Povo Francés reunidos em Conven- ‘s40 Nacional, reconhecendo que as leis humanas que nao ema- nam das leis eternas da justiga e da razdo nao passam de aten- tados da ignorincia ou do despotismo contra a humanidade; convencidos de que o esquecimento ou 0 desprezo dos direitos naturais do homem séo as tinicas causas dos crimes e das des- DISCURSOS E RELATORIOS NA CONVENGAO, 1 venturas do mundo, resolveram pronunciar-se, a fim de que todos 0s cidadaos, podendo comparar incessantemente os atos do governo com 0 objetivo de qualquer instituigao social, nao se deixem jamais oprimir e aviltar pela tirania; a fim de que 0 povo tenha sempre diante dos olhos as bases de sua liberdade € de sua Felicidade; o magistrado, a regra de seus deveres; 0 legis- lador, o objeto de sua missao. Em conseqiiéncia, a Convencio Nacional proclama, diante do universo e sob 0s olhos do legisladar imortal, a seguinte De- claragdo dos Direitos do Homem e do Cidadao: |Art. LO objetivo de toda associagao politica ¢ a manutencao dos diteitos naturais e imprescritiveis do homem, ¢ 0 desen- volvimento de todas as suas faculdades. IL. Os principais direitos do homem sao 0 de prover a con- servacio de wa cxistencia ea liberdade. “TIL. Esses direitos pertencem igualmente a todos os homens, qualquer que seja a diferenca de suas forgas fisicas ¢ morais. ‘A igualdade dos direitos é estabelecida pela natureza: a so- ciedade, longe de atentar contra ela, s6 faz garanti-la contra o abuso da forca que a torna iluséria, IV. A liberdade ¢ 0 poder que o homem tem de exercer co- ‘mo quiser todas as suas faculdades. Tem como regra a justia, € como limites os direitos de outrem; tem por principio a natu- reza, ¢ por salvaguarda a lei. V. O direito de se reunir pacificamente, o direito de mani- festar suas opinides, seja através da imprensa, seja de qualquer outra maneira, sio conseqiléncias tao necessérias do principio da liberdade do homem, que a necessidade de enuncié-los su- Oe a presenca ou a lembranga recente do despotismo. VI. A propriedade é 0 direito que cada cidadiio tem de usu- fruir e de dispor da porgao de bens que Ihe é garantida pela lei. VII. O direito de propriedade é limitado, como todos os ou- tros, pela obrigacdo de respeitar os direitos de outrem. VIII. Nao pode prejudicar nem a seguranga, nem a liberdade, nem a existéncia, nem a propriedade de nossos semelhantes. 1X. Todo trafico que viole esse principio ¢ essencialmente ilicito e imoral. X. A sociedade ¢ obrigada a prover a subsisténcia de todos 65 seus membros, seja fornecendo-Ihes trabalho, seja garantin- do os meios de subsistir aqueles que estao impossibilitados de ‘rabalhar. XI. Os auxilios indispensiveis aquele que carece do necessirio constituem uma divida daquele que possui 0 supérfluo: cabe & |ei determinar a maneira pela qual essa divida deve ser quitada. XII. Os cidadaos cujos proventos nao excedem aquilo que € necessério a sua subsisténcia esto dispensados de contribuir 1 0s gastos piblicos. Os outros devem sustenté-los progres- mente, segundo a dimensao de suas fortunas. XIII. A sociedade deve favorecer com todo o seu poder os progressos da razao puiblica, ¢ colocar a instrugao ao alcance de todos os cidadaos. rano obrae sua proprie- dade, os funciondrios publicos sao seus empregados. © pove pode, quando the aprouver, mudar seu governo e destituir seus mandatérios. XV. A lei & expressao livre e solene da vontade do povo. xvi. ATeié igual para todos. oo XVIL A lei s6 pode proibir o que ¢ prejudicial & sociedade: 6 pode ordenar o que Ihe é util. XVM Toda lei que viole os di mem é essenctalmente injusta XC En ivre, a lei deve sobretudo defender a RIX Emi todo Estado iberdade publica e individual contra o abuso da autoridade daqueles que governam. Toda instituigéo que nto suponha que o povo é bom eo magistrado corruptivel é viciosa, XX. Nenhuma parcela do povo pode exercer 0 poder do po- yo todo, mas o anseio que ela exprime deve ser respeitado co- mo o anscio de uma parcela do povo que deve concorrer para formar a vontade geral. DISCURSOS E RELATO! Cada seco do soberano, reunida, deve gozar do direito de exprimir sua vontade com inteira liberdade: ¢ essencialmente independente de todas as autoridades constituidas e autonoma para regulamentar sua organizacio politica e suas deliberagoes. XXI. Todos os cidadaos so admissiveis a todas as fungoes piiblicas, sem qualquer outra distingto que nfo seja a das vir- tulo que nao seja 2 con- tudes e talentos, sem qualquer outro fianca do povo. XXIL. Todos os cidadaos tém igual di designagao dos mandatdrios do povo e a formagio da le XXII, Para que os direitos ndo sejam ilusérios e a igualdade quimérica, a sociedade deve remunerar 0s funcionétios piblicos fazer de modo que os cidadiios que vivem de seu trabalho pos- sarn assistir As assembleias piblicas para as quais a lei os chama, sem comprometer sua subsisténcia, nem a de sua farnil XXIV. Todo cidadio deve obedecer religiosamente aos ma- gistrados e aos agentes do governo, quando eles sto os érgios ou os executores da lei XXV. Mas todo ato contra a liberdade, contra a seguranga ou contra a propriedade de um homem, exercido por quem quer que seja, mesmo em nome da lei, fora dos casos deter- minados por ela ¢ das formas que ela prescreve, € arbitrario ¢ nuulo; 0 préprio respeito a lei proibe de se submeter a esse ato, ese 0 quiserem executar pela violencia € permitido repeli-lo pela forga. XXVI. O direito de apresentar petigoes aos depositirios da autoridade piiblica pertence a todo individuo, Aqueles a quem las sao dirigidas devem estatuir sobre os pontos que con tuem sou objeto, mas jamais podem interditar, nem restringir, nem condenar o exercicio delas. XXVIL. A rei ia 8 opressdo é conseqiléncia dos outros direitos do homem ¢ do cidadao. XXVIIL Ha opressio contra 0 corpo social quando um tinico de seus membros € oprimido. Hé opressio contra cada mem- bro do corpo social quando 0 corpo so: o de concorrer & 94 MAXIMILIEN DE ROBES XXIX. Quando o governo viola os direitos do povo, a insur- reigio 6, para o povo e para cada segmento do povo, 0 mais sa~ grado dos direitos e o mais indispensavel dos deveres. XXX, Quando falta a garantia social a um cidadio, ele volta a0 direito natural de defender ele mesmo todos os seus direitos. XXXL Em um e outro caso, sujeitar a formas legais a resis- téncia & opressao é 0 extremo refinamento da tirania, XXXII. As fungdes publicas ndo podem ser consideradas como distingées nem como recompensas, mas como deveres piblicos. XXUIIL Os delitos dos mandatérios do povo devem ser seve- ra e facilmente punidos. Ninguém tem o direito de se preten- der mais inviolével do que os outros cidadaos. XXXIV. © povo tem o direito de conhecer todas as opera~ des de seus mandatirios; estes devem fazer-lhe uma fiel pres- lacdo de contas de sua gesto e submeter-se com respeito a seu julgamento. XXXV. Os homens de todos os paises so irmaos, e os dife- rentes povos devem ajudar-se mutuamente segundo seu poder, como os cidadaos de um mesmo Estado. XXXVI Aquele que oprime uma s6 nagao declara-se inimigo de todas. XXXVI Aqueles que guerreiam contra um povo para deter os progressos da liberdade ¢ aniquilar os direitos do homem. devem ser perseguidas por todos, no como inimigos ording~ rigs, mas como assassinos ¢ como bandidos rebeldes. XXXVIIL Os reis, 05 aristocratas, os tiranos, quaisquer que sejam, so escravos revoltados contra o soberano da Terra, que €o género humano, e contra o legislador do universo, que é a natureza. VE Sobre a Constituigao 10 de maio de 1793 A discussao sobre 0 projeto girondino de Constituigao pross durante todo 0 més de abril. Ao mesino tempo, ocorreram as der~ rotas do Exército na Bélgica, a traigto de Dumouries ¢ 0 levante na Vendéia, tornando ainda mais aguco 0 conflito entre girondi- nos ¢ jacobinos. Nesse contexto, Robespierre foi tribune, Como conseqiténcia de seu discurso, foi instalada uma co elaborar um texto novo. A Constituigita do ano 1, adotada em 24 de junho, depois da queda dos girondines, incorporo’ sugestaes de Robespierre, nasceu para a felicidade e para a liberdade, ¢ em toda parte € escravo ¢ infeliz. A sociedade tem por fim a con- servagio de seus direitos ¢ a perfeigdo de seu ser, @ por to- da parte a sociedade o degrada e oprime. Chegou 0 tempo de chamé-la a seus verdadeiros destinos; os progressos da razdo humana prepararam esta grande Revolugio, € a vés es mente ¢ imposto o dever de aceleré-la. Para cumprir vossa missio, ¢ necessirio fazer precisamente co contrario do que existiu antes de vés. ‘Até aqui, a arte de governar nio foi mais que a arte de des- pojar e escravizar a maioria em beneficio da minorias¢ a legis- lago, o meio de reduzir esses atentados a um sistema, Os reis os aristocratas exerceram muito bem seu oficio: cabe a vos ago- ra exercer 0 vosso, isto é, tornar os homens felizes ¢ vvés das leis, Dar ao governo a forca necessiria para que os cidadios res- peitem sempre 0s direitos dos cidadaos e agir de modo que 0

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