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Dulce Mara Critelli ANALITICA DO SENTIDO Uma aproximacao e interpretag¢ado do real de orientagado fenomenoldégica editora brasiliense INTRODUGAO Nas ocasies em que estive falando a respeito da fenome- nologia, especialmente a ptiblicos formados por educadores, cientistas e assistentes sociais, profissionais das areas de sati- de, psicdlogos sociais e afins, sempre alguém solicitava uma bibliografia que configurasse sistematicamente um método fenomenolégico de pesquisa. Frustrei muita gente, pois tal metodologia nao se encontra senao dilufda nas obras dos fenomendlogos. Merleau-Ponty, Ricoeur, Heidegger, o proprio Husserl, entre outros, fazem, por assim dizer, fenomenologia. Pensam fenomenologi mente, mas nenhum deles escreve sobre como fazem isso. E preciso muita leitura das obras desses pensadores para se “pegar o jeito” do raciocinio fenomenolégico; algo parecido com aprender a andar de bicicleta. A questao maior é que a fenomenologia nao nasceu como um método, tal como as ciéncias e técnicas modernas 0 su- poem (como rigorosa prescrig&io de procedimentos e instru- mentais), mas, grosso modo: como um questionamento da dissolugao da filosofia no modo cientifico de pensar; da logi- ca inerente as ciéncias modernas; como critica 3 de conhecimento cientifico que rejeita do ambi proprio conhecimento tudo aquilo que nao pos dinado A sua estrita nogao de verdade, de sujeit ¢ de objeto cognoscfvel. Assim, a fenomenologia foi se constituindo como eri a ciéncia (mais especificamente a metafisica, considers como a postura epistemoldgica que a fundamenta) ¢. ee giientemente, também a técnica moderna. mee A critica destas quest6es nao consiste, evidentemente ape. nas em formulagées negativas, mas na formulagio de ae modos de se compreender tudo o que existe e que jé tinha sido significado pelo olhar metafisico, tal como as nogGes de ho- mem, mundo, corpo, percep¢ao, histéria... Esta discussao chega as tltimas conseqiiéncias, Parece- me, com Martin Heidegger, em sua obra fundamental Ser ¢ Tempo. Nela, através de uma desconstrugao do arcabouco do saber metafisico, conseqiientemente de sua ontologia, uma outra ontologia, que podemos chamar de fenomenol¢gica, foi se esbogando. A propria nogdo de ser (aquela da qual to- das as demais se originam e na qual se baseiam) é posta em questao, ¢ pela primeira vez desde sua postulagao inicial por Platio e Aristoteles. Desta feita, antes de detalhar um método, a fenomenolo- gia produziu uma nova ontologia. Somente nos familiari- zando e compreendendo essa ontologia, isto é, somente co- megando a entrar em contato com outros significados para homem, mundo, pensamento, ser, verdade, tempo, espaco etc., para além daqueles que nos foram legados pela nossa tradigo ocidental metafisica, é que podemos comegar a en- tender a possibilidade de um jeito fenomenoldgico de com- preender o mundo. Oleitor vai encontrar, nas paginas deste trabalho, a tenta- tiva de dar visibilidade a uma via de conhecimento funda- mentada na episteme fenomenolégica. Comego por uma apresentagio de como entendo a fenomenologia, 0 que ela $8 estar subor. 0 cognoscenie 8 ANALITICA DO SENTIDO. inaugura para o saber humano e¢ para nossa época civiliza- cional, a discussio essencial sobre a questo de ser e, final- mente, 0 que me parece ser 0 perfilamento do modo fenome- nolégico de ver, compreender e dizer, isto é, seu caminho de conhecimento. O contraponto & postura, 4 6tica, ao comportamento me- tafisico de nossa tradigio ocidental de pensar e ser seré man- tido desde 0 principio até o fim do texto, com o especifico objetivo de dar visibilidade a diferenga epistemolégica intro- duzida pela fenomenologia. Em nenhum momento tenho a pretensio (e a insensatez) de estar propondo o banimento da metafisica e das suas manifestagdes modernas, entre elas, a ciéncia e a tecnologia. Por me embasar neste estudo especialmente no pensa- mento de Martin Heidegger e de Hannah Arendt, 0 mais cor- reto seria referir-me-4 Fenomenologia Existencial ou mesmo a Filosofia da Existéncia (segundo a indicagfio da propria Arendt)e nfio usar genericamente a expresso Fenomenolo- gia, mais pertinente-ao_pensamento de Husserl. Mas a recor- réncia ao simples termo Fenomenologia é proposital, uma vez que quero chamar a atengao do leitor, 0 tempo todo, para esta determinacao mais basica desse pensamento, que é a de dirigit-se para o real identificando nele seu cardter de fend- meno € nao de objeto, como o faz 0 que aqui nomeamos por metafisica. i: Retirando inspiragao e orientagao do pensamento desses dois mencionados filésofos, vou empreendendo minhas pré- prias reflexdes e propostas. O texto que segue, inclusive, foi re- sultado de uma disciplina que ministrei no curso de Pés-Gra- duagio em Filosofia na PUC-SP, no segundo semestre de 1993. Seria eu, desta feita, leviana e irresponsavel se atribuisse a Heidegger e a Arendt a autoria do que exponho aqui, deste recorte de suas obras e do caminho metodoldgico que esboco e sugiro. Mas seria desonesto nao atribuir a eles a autoria de todo esse repert6rio que fundamentou e nutriu tudo o que tra- to aqui. Por esta razéio, ndo vou nomear 0 caminho de conhegj. mento que delineio com a expressao Daseinsanalyse, retiran.. do-a de Heidegger; nem mesmo vou ousar definir este estudg como a tinica articulagéo metodolégica possivel desde a feno. menologia. Chamo ao que aqui esbogo de Analitica do Sen. tido. Estas ressalvas permitem que os desacertos encontrado nesta proposta sejam atribuidos a mim, exclusivamente. 10 Uma discussio a respeito do método de conhecimento r produz, inevitavelmente, a discussio de duas quest6es filos ficas primeiras e origindrias: 0 ser e a verdade. A interrogagao basica desta discussao € o interesse em se saber e delimitar, entre outros, o melhor caminho, o Angulo mais adequado, a forma mais plausivel de se captar e expressar, verdadeiramen- te, 0 que sao e como sao as coisas. Tratar, portanto, da questéo de um método fenomenolégi- co de conhecimento é, necessariamente, reestabelecer tal dis- cussao. Porém, desde uma maneira especffica, a saber, deba- tendo-se diretamente com (ou contra) 0 modo tradicional do pensamento do Ocidente (que Heidegger identifica como metafisica e cujas manifestagdes modernas mais imediata- mente reconhecfveis sao a ciéncia e a tecnologia) a respeito de como se interpretam 0 ser das coisas, sua verdade e, tam- bém, os modos escolhidos para perscrutar, delimitar ¢ ex- pressar esse ser e essa verdade. A abordagem desta problematica pela fenomenologia su- gere a colocagdio em cena, de forma ineludivel, de um ponto de tensdo para o discurso tradicional metafisico relative , conhecimento: 0 problema da perspectiva. Ponto de tera” porque a questao da perspectiva no conhecimento ino necessariamente, 0 cardter de provisoriedade, mutabilidade g relatividade da verdade, ¢ 0 eixo do pensamento metafisieo pressup6e que a verdade seja una, estével e absoluta, beni como a via de acesso a ela. Compreendo que, ao discutir 0 ponto de vista da metaft. sica sobre © ser e a verdade, a fenomenologia nao visa, de modo algum, recair no mesmo circulo vicioso em que a dis- cussdo epistemolégica empreendida pela nossa civilizacio permanece enredada, 0 da crenga e da busca de uma tinica via de acesso ao ser dos entes e a sua verdade. Nao me parece haver a intencao, simpl6ria que seria, de se substituir 0 ponto de vista metaffsico por um outro, uma verdade tinica por outra. A critica envereda por sendas diversas, compreenden- do esta determinagdo da perspectiva metafisica como um li- mite e ndo como uma inverdade. Nao se trata, portanto, de provar 0 quao errada ¢ a pers- pectiva da metafisica, mas 0 quao tnica e absoluta ela nao €. Trata-se de uma ruptura da reificagao da metafisica, de uma superagiio do equivoco sobre a soberania de sua perspectiva. A fenomenologia fala do limite de uma perspectiva epis- témica sem fazer sua equivaléncia 4 nogao tradicional de erro, nem formular uma condenagao. A interpretagao feno- menoldgica nao expressa senao 0 que, sob seu ponto de vista, nao é mais que o 6bvio, no caso: wm ponto de vista é apenas um ponto de vista; uma perspectiva € apenas uma perspecti- va entre outras. E é como uma perspectiva relativa e provis6- ria que a fenomenologia mesma se auto-compreende. No entanto, 0 que pode parecer Sbvio para o pensar feno- menolégico certamente nao 0 € para a concepgao geral, so- bretudo se rememorarmos a problemitica histéria da estrutu- rago e desenvolvimento do pensamento ocidental. Parece que, ao longo e depois de dois mil e quatrocentos anos em que a questio do conhecimento se instaurou para nossa civi- ANALITICA DO SENTIDO lizagio, permanecemos ainda na discussao a respeito dos critérios pelos quais uma perspectiva pode ser considerada verdadeira. Mantemo-nos, assim, na incessante retomada do original embate entre a verdade e a opiniao, mais peculiar- mente expresso desde a modernidade, por exemplo, pela dis- ting’io entre saber cientifico e senso comum. Em todo caso, depois de Platao ter institufdo 0 conceito (uno, eterno, incorruptivel) como o lugar de manifestagao da verdade de tudo o que é; depois de Aristételes ter estabeleci- do que ao intelecto pertence esta fungdo de conhecimento; e depois de Descartes ter modulado este intelecto como Cogito (cujo tnico procedimento aceitavel é 0 do célculo e do con- trole légico-cientifico da realidade engessada na forma de objeto empirico), parece-me que 0 Ocidente moderno aceitou esta via como a tinica perspectiva adequada, vidvel e valida para a aproximagao entre homem e mundo, para seu saber a respeito de tudo com que se depara, inclusive ele mesmo. Nao consigo distinguir, ao longo do pensamento metafisi- co e seus resultantes, nada que ndo denote sendo a aceitagao tacita e axiomatica de que a verdade é una e imutdvel, além da prévia compreensao de que s6 ha, de fato, uma perspectiva reconhecida e confidvel para a compreensao da verdade do real, Esta unicidade da verdade e a absolutidade da perspecti- va sao, como jd dissemos, segundo a compreensao fenomeno- l6gica, vistas como equivocas. A fenomenologia poe em questao exatamente esta espécie de crenga metafisica na unicidade da verdade e na busca de ‘uma perceptiva de conhecimento que seja absoluta. Em con- seqiiéncia, pde em questao a redefinigao do que é, efetiva- mente, uma perspectiva epistémica, de que se trata, 0 que a compée. O pressuposto de que parte a fenomenologia, nesta discussao, € 0 de que a perspectiva do conhecer e a verdade* que este alcanga nao podem, senao, ser relativas. O reconhecimento da relatividade da perspectiva é, si- multanea e necessariamente, 0 reconhecimento da relativida- de da verdade. DULCE MARA CRITELLL aa ; A dificuldade da episteme metaffsica em aceitar a relati- vidade da perspectiva e da verdade, levando-a a nega-la esté ja na origem mesma de seu nascimento: a perplexidade diante da aparigéo, da mutabilidade ¢ da degeneragio dos entes sensiveis (Platao); ¢ a inseguranga emergente diante da descoberta dos sofistas de que, sendo 0 ser dos entes inefj. vel, as coisas sfio 0 que se “bem” diz. que elas so (oratéria) A negagao da relatividade da perspectiva e da verdade é aquilo mesmo que a constitui, a episteme metafisica. Do ponto de vista fenomenol6gico, a relatividade da per- ceptiva do saber e da verdade do ser abre-se como ponto in- “seguro, mas préprio do existir (ser). Contrariamente, a tenta- tiva empreendida para a superacio desta inseguranga é 0 que instaura 0 modo do pensar (metaffsico) ocidental. Descartes requisita claramente a procura de um ponto de seguranga para 0 pensar: um ponto fora do mundo, como 0 de Arquimedes, para, desde a exterioridade e a distancia, po- der olhar o mundo, a existéncia e o que deles faz parte. Um ponto fora do mundo que “ex-tranhe” 0 homem de suas situagdes de vivéncia, de suas sensagGes e sentimentos, um ponto que possa retirar 0 homem das condig6es mais basicas de sua humanidade. E é af, num suposto ponto em que 0 homem se alocaria fora de si mesmo, que Descartes instala 0 Cogito — um poder humano, embora sem humanidade, equi- voco quanto a sua soberania e sua independéncia em relagao as condigdes ontolégicas plenas do homem. A seguranga buscada ao longo da histéria da episteme 0- cidental baseou-se na diivida de si mesmo que o homem esta- beleceu, langando para fora de si mesmo (de sua ontologia, ou das condigoes nas quais a vida lhe é dada) a possibilidade de qualquer dominio da realidade. Inclusive de suas idéias. Somente a precisdo metodoldgica do conceito (que pela cti- tica heideggeriana podemos ver sob 0 termo representacao) garante ao conhecimento humano sua imutabilidade, unici- dade e absolutidade. Assim, para o pensar metaffsico, toda possibilidade de 4 ANALITICA DO SENTIDO. um conhecimento valido e fidedigno é garantida pela cons- trugiio de conceitos logicamente parametrados e de uma pri- vaciio da intimidade entre os homens e seu mundo, isto €, entre os homens e a experiéncia que tém de seu mundo. Ora, um tal conhecimento é taéo-somente a articulagao de uma al- ternativa de aproximagio do real, ainda que devidamente planejada e estruturada. Mas nem por isso seria a Gnica afian- cdvel. A inseguranga ou a fluidez do aparecer dos entes e das possibilidades de apreender e expressar seu ser nao sao, por si s6s, indicativas da falsidade de uma perspectiva, nem da irrealidade de um ente qualquer. Também nao indicam, como queriam os sofistas, a inefabilidade do ser dos entes. A fenomenologia nao compreende essa inseguranga ou essa fluidez do aparecer dos entes e de sua interpretagéo como sendo uma falha do mostrar-se dos entes, nem como um defeito do pensar. Contrariamente & interpretagao metafisica, estes as- pectos do ser sao, para o olhar fenomenolégico, os modos cons- titutivos e originarios do mostrar-se dos entes e do pensar. Assim, da mesma forma como o que institui a metafisica € seu empenho em superar a fluidez do mundo e do pensar (conseqiientemente do existir) para possibilitar 0 conheci- mento, a fenomenologia s6 compreende a possibilidade, do conhecimento através da aceitagao desta mesma fluid 0 Para a metafisica, 0 conhecimento é resultado de uma Su- peracao da inseguranga do existir. Para.a fenomenologia, € exatamente a aceitagao dessa inseguranga que permite 0 co- nhecimento. Com isto podemos afirmar, grosso modo e como veremos adiante, que, enquanto a metaffsica instaura a possibilidade do conhecimento sobre a seguranga da precisdo metodolégi- ca do conceito, a fenomenologia 0 instaura sobre a_angiistia. Enquanto a metafisica reconhece a possibilidade do conheci- mento fundada na relagiio entre 0 sujeito epistémico e seu objeto, tomando-o como resultante de uma produgao humana ~ a representacdo -, a fenomenologia funda tal possibilidade na prépria ontologia humana — ela é uma das condigdes em 1s que a vida é dada ao homem. Enquanto a met; forma légica do ser, a fenomenologia fala do: daveis de se ser. Desta maneira, a relatividade nao é vista logia como um problema a ser superado, mas como uma condi¢ao que os entes tém de se manifestarem: no hotizonte do tempo e nao do intelecto, e em seu incessante movimento de mostar-se e ocultar-se. A relatividade diz respeito a provi. soriedade das condigées em que tudo o que € vem a sere per- manece sendo. Embora vendo na verdade tinica e absoluta a garantia da superagao da relatividade e da inseguranga propria do ser (existir), a postura metafisica do pensar, como se pode ver, nao realizou outra coisa sendo a demarcagdo de uma relativi- dade. O que resulta da interpretagao metafisica é 0 que € pos- sivel ver, compreender e expressar apenas desde o ponto de vista em que ela esta alocada. No entanto, a questo do ser e da verdade, que aqui di- mensionamos como uma questao epistemoldgica, Heidegger a explicita como uma questéo mais fundante, como uma questao efetivamente existencial. Nao é somente um modo de pensar com que a metafisica instrui o homem ocidental, mas um modo de ser no mundo; um modo de habitar 0 mun- do, de instalar-se nele, de conduzir sua vida e a dos outros homens com quem convive de forma préxima ou distante. Através de Heidegger, 0 questionamento da metafisica como uma rediscussao sobre a questéo do ser e da verdade sai do espago estrito da critica epistemoldgica e se expande para uma critica civilizacional. Através de uma critica do pensamento, aquilo que pela fenomenologia (existencial) se pe em questao é o préprio modo de ser do homem ocidental, sua problematicidade e a busca de resolugdes para essa ques- tao de ser, de existir, que jamais cessaré de ser litigiosa para o homem enquanto ele viver.! Seaiiola Maines ty deliver coniateiebelte a 1 Veja-se, sobre a questo, Heidegger ([1966] 1972) e ({1957a] 1960). afisica fala de $ Modos infin. Pela fenomeng. 16 ANALITICA DO SENTIDO A fenomenologia, pois, nao trata da questio cognitiva seniio sob o prisma existencial. Ou melhor, subordina a pos- sibilidade do conhecimento as possibilidades existenciais; 0 pensar se belece sobre o ser, evidenciando-o. Assim, a tarefa de se pensar a possibilidade de uma meto- dologia fenomenoldégica de conhecimento é, em tltima ins- tancia, uma reflexio sobre 0 modo humano de ser-no-mun- do, inclusive tal como desdobrado na tradigao da civilizagio ocidental. Mais do que ponderar a respeito de instrumentais, o deli- neamento de uma metodologia de investigagao e andlise fun- dada na fenomenologia devera cuidar do talhamento de um olhar. Ao mesmo tempo que intenta mold4-lo, deverd ir des- pindo-o de um habito desde ha muito invi: Angiistia e Pensamento Céu e terra pertencem-se mutuamente, e todos os elemen- tos da natureza, 4 medida que aparecem revelados e abriga- dos nessacpertenga, também dela compartilham. No caso do homem, esse modo de pertenga em que se cria uma inexord- vel integracdo é impossivel; a vida humana esté em perpétuo deslocamento. Viver como homens é jamais alcangar qual- ‘quer fixidez. Do ponto de vista ontolégico, ou seja, das condigdes em que a vida é dada ao homem, isso quer dizer que habitamos. um mundo que nos é indspito. O mundo nao consegue nos abrigar e acolher da mesma maneira como faz com os ele- mentos naturais. Mesmo o mundo artificial que criamos so- bre o mundo natural para, assim, podermos morar nele nao nos oferece garantias de fixagfo. Ser-no-mundo como ho- mens € habitar esta e nesta inospitalidade. Apesar dessa nao-pertenga ao mundo (natural ou artifi- cial), no mais das vezes, ser compreendida por nés como a experiéncia de um desabrigo e de um desamparo que se quer 7 a todo custo superar, ela é a condigao de liberdade do Propric homem. A ontolégica inospitalidade do mundo e a ontoléi, ca liberdade humana sao elementos coestruturais do existir, E proprio do humano nao poder ser totalmente engolfado, ou melhor, consumado por esse mundo em que vive, nem por coisa alguma que ele pense, sinta ou produza. As idéias mu- dam, assim como mudam as sensagGes, as emogoes, as pers- eresses, as lembrangas... Mudam os modos de pectivas, os int i relagaio que os homens mantém com as coisas, CoM 0S outros, consigo mesmos. De geragao para geracio, de época histérica para época histérica, de cultura para cultura, de uma sociedade para outra vemos as coisas, por exemplo, mudarem seu signifi- cado ¢ utilidade, mudarem seu ser. Vistas como meras Coisas, elas continuam presentes & referencidveis em sua mesmidade tangfvel, mas seu significado e 0 sentido que fazem em nossa existéncia se alteram. ~"Embora o ser de tudo 0 que existe torne-se plenamente manifesto quando expresso em algum conceito, idéia ou jui- zo, ambos nunca se fundem definitivamente. Na enunciagéo de algo, est4 sempre presente a muda compreensdo de uma espécie de vacuo perene entre um ente e 0 que se diz que ele é, As representagdes abrigam € expressam as coisas em sua manifestagdo apenas provisoriamente. Portanto, ao contrario da ilusao de uma perfeita co-pertenga, as representagdes S40 elas mesmas sempre indspitas ao ser dos entes. O ser das coisas (0 que sao, como sao) nao esté consuma- do na sua conceitlag’io, mas também nao esta incrustado nas proprias coisas, ensimesmadas. Est4 no lidar dos homens com elas e no falar, entre si, dessas coisas e dos modos de se lidar com elas. Esta entre os homens e as coisas; esté numa trama de significados que os homens vio tecendo entre S! mesmos e através da qual vio se referindo e lidando com as coisas e com tudo 0 que ha. om mens eo se dirigem direta e simplesmente As coisas ‘a presentidade, mas mediados por essa trama de 18 ANALITICA DO SENTIDO significados em que as coisas vao podendo aparecer. Quando as coisas mudam, é porque mudaram nossas idéias a seu res- peito, mudou a serventia que tinham para nds, nosso interesse por elas, nossos modos de nos referirmos a nds mesmos e uns aos outros. Quando as representagdes nao podem mais reter e expres- sar as coisas eM seu ser € as coisas Mesmas nao sao mais que meras coisas, insignificativas, 0 que se evadiu, através delas, foi o sentido que ser (existir) tinha para nos. Evadindo-se o sentido que ser faz para nés, € que.o mun- do pode se manifestar em sua inospitalidade. E a inospitali- dade do mundo revela-nos 0 préprio mundo no mais como ilusoriamente 0 pensdvamos, como um ente, como uma coisa, como um conjunto e um complexo de coisas naturais e artificiais que estao por af e onde acreditévamos estar per- feitamente integrados. Mas entendemos (embora nao tema- ticamente) 0 que nao haviamos compreendido do mundo: que ele é uma sutil e poderosa trama de significagao que nos enlaga e da consisténcia a nosso ser, nosso fazer, nosso saber. Porém, uma trama fluida, que desaparece sob nossos pés tao logo o sentido que ser faz se dilui e, entao, nos faz falta. Sumindo 0 mundo como uma trama significativa outrora e aparentemente perene e esvaindo-se 0 sentido que ser fazia para nds, sobramos nés mesmos. Soltos, sozinhos, postos diante do nada, sem podermos contar com as coisas e com as outras pessoas para nos enlagar na existéncia como antes. Esta experiéncia da inospitalidade do mundo, do nada em que se desfez ou ocultou o sentido que ser fazia para nés, e da mais plena liberdade em que somos langados independente- mente de nosso préprio arbitrio, Heidegger a nomeia angiistia. Fundado na angtistia, regido por este paradoxal modo hu- mano de se ser-no-mundo, é que se abre para 0 homem toda sua possibilidade de conhecimento. A ontolégica inospitali- dade do mundo e a ontoldgica liberdade humana sao regentes de toda forma do homem conhecer o mundo. Portanto, da questao do conhecimento e do método. 19 Sobre a base da inospitalidade do mundo e l6gica liberdade, podemos nos distanciar do qu sa possibilidade de tomar disténcia do mundo e do que que seja revela que nao pertencemos efetivamente ag mien ou as coisas. Os preconceitos, por exemplo, quando os tem €é como se fizessem parte de nés mesmos e/ou daquilo ae se referem. No entanto, podemos a qualquer momento, ue por obra de nada, reconhecé-los como meros pontos de en que podem ser mudados, anulados, portanto, como idéias pro- visdrias e relativas a respeito das coisas. Assim, eles perdem sua face de verdade absoluta e a forga de dominio que exer. ciam sobre nés. Passam a ser percebidos como conceitos, co- mo juizos que revestem as coisas mesmas, como pré-concei- tos. E, muito embora tivessem nos constituido por um largo perfodo de nossas vidas, nao pertencemos a eles, e eles nao pertencem a nés. Assim, portanto, nao pertecemos a nenhuma ideologia ea coisa alguma de forma fixa. Nao pertencemos ao amado, ao amante, ao pai, 4 mae, sequer a0 nosso proprio corpo. Apesar de, em nosso cotidiano, empenharmo-nos em formar estrutu- fas a que possamos pertencer, criando redes de relag6es que funcionam como redes de aprisionamentos, é este aprisiona- mento que, em sua absolutidade, é ilusdrio. A plena determinagao € algo que nao faz sentido para 0 modo de ser humano. Nem mesmo ha um modo determinfs- tico de se ser homens a que pertengamos, a diferenga das abelhas, por exemplo, que parecem pertencer a um insuperd- vel e imperceptivel instinto de ser abelhas. A vida humana nao tem, em relac&o a coisa alguma, @ possibilidade de uma pertenga confiada. E um viver sem pel- feita entrega ou confianga, por obra de uma condigao na qual ser foi dado ao homem, e nao por qualquer dtivida casual ou metodoldgica. Nao podemos confiar em sossegado abando- no, porque de tudo irrompe a falha, a falta, a quebra de sen- tido e de significages. de Nossa onto, e vivemos, By. Aexperiéncia humana da vida é, originariamente, a expe- 20 ANALITICA DO SENTIDO riéncia da fluidez constante, da mutabilidade, da inospitali- dade do mundo, da liberdade; a seguranga nao esta em parte alguma. E isto nado é uma deficiéncia do existir como ho- mens, mas sua condig&o, quase como sua natureza. Na base da estrutura de nossa episteme ocidental, a apreen- ‘io desta fluidez propria do ser, do exisitir, parece suscitar uma intranquilidade ao mesmo tempo que um desafio: bloquear essa fluidez, susté-la, interrompé-la a fim de se conquistar uma esta- bilidade, de se sobrepor a inseguranga uma posicdo de dominio, a garantia de um asseguramento. Na Idade Moderna, Descartes, por exemplo, reconhece esta inseguranga de um saber e de se ser no mundo, tal como a torna explicita nas Meditagdes. Todavia, esta inseguranga ele nao a reconhece como ontolégica, como modo de se ser homens, mas, de forma dispar, como fruto das informagées enganosas advindas dos seus prdprios sentimentos e sensa- gGes e dos saberes organizados, disponibilizados e validados pela Igreja. Essas insegurangas, decorrentes de enganos gerados por certas formas de conhecimento, Descartes as quer eliminar, reconstituindo os passos e os modos do conhecimento: asse- gurando uma metodologia adequada a regulaco do pensa- mento e, portanto, 4 superacgao de suas idéias imprecisas e obscuras. Aestratégia por ele formulada consistiu em encontrar um ponto de apoio Iégico para o pensamento, a partir do qual fosse possivel a produgao de “idéias claras e distintas” sobre o mundo. Idéias em que o mundo e os saberes sobre ele con- quistassem precisao, estabilidade e, por conseqiiéncia, pu- dessem ser controlados. Um lugar onde o mundo e as idéias do mundo ficassem sob 0 dominio do homem e nao ao con- trario. A inseguranga do ser poderia ser transposta pela segu- ranga do saber. As deturpagées decorrentes dos sentimentos e das sensagdes poderiam ser sobrepujadas pelos procedi- mentos depuradores do Cogito. Por obra do Cogito o mundo pode vir a ser representado. 2 DULCE MARA CRITELLI Isto é, reapresentado através de idéias c S € dis intas, Por- tanto precisas € imutaveis. Na representago do mundo, 9 mundo renasce estvel e seguro, € € assim que sua realidade € constituida e controlavel. A instabilidade do ser parece desaparecer sob a seguranca légica do Cogito. A inospitalidade propria do mundo parece ocultar-se sob a face da representagdo. Na Tepresentaciio, produto do Cogito, a vida humana esta salva da inospitalida. de do mundo e de sua prépria liberdade. A representacao € 0 substrato de uma metodologia do co- nhecimento capaz de segurar 0 mundo numa estabilidade pensdvel. Mas 0 que Descartes conquistou para o pensamen- to, a estrutura e a operacionalizagao em que 0 ajustou, apa- rentemente, e s6 aparentemente, salvam 0 homem da muta- cao incessante do ser, de seu constitutivo vir-a-ser. A civilizagiio ocidental, sobretudo modernamente, no in- tento de livrar-se da inospitalidade do mundo, voltou-se para aconstruco de uma forma especial de se saber 0 mundo e de se ser nele. Pela criagdo da representagao, habitamos 0 mun- do calculando-o e controlando-o. Controlamos 0 comporta- mento das massas, a opinao ptiblica. Nao apenas contro- lamos fenémenos da natureza, mas criamos fendmenos que nao eram possfveis sob as determinagoes e leis da natureza, como o deslocamento do homem da 6rbita da Terra. Porém, nao € porque se criaram métodos e processos que nos permitem controlar fendmenos e criar outros, que se alte- rou a condi¢ao ontolégica da inospitalidade do mundo e da li- berdade humana. Talvez por isso mesmo a ciéncia moderna se lance sobre 0 conhecimento e o controle do mundo, transfor- mando-os em coisa objetiva, e tenha se afastado, cada vez mais, de qualquer tentativa de compreensio do sentido da vida. No entanto, apesar de todos os esforgos por um conheci- mento claro, preciso, previsivel e controlével do mundo, em que o saber a respeito do mundo nao resvale para nenhum ocultamento, a pergunta sobre o sentido de ser nao abandona © homem. O controle de fendmenos da natureza (na qual se 2 ANALITICA DO SENTIDO incluem os homens) nao é suficiente para patencializar e pa- ralisar a diniimica fenoménica do sentido de ser em seu in- cessante mostrar-se e ocultar-s O c4lculo e o controle dos significados e da utilidade das coisas e da vida mesma nao servem para o desvendamento do sentido da existéncia. Essa sabedoria nao tematizada de sua prépria condigao de ser no mundo de forma indspita, o homem a tem sempre. Se a liberdade nao pertencesse ao ho- mem, como condi¢gao humana, ele nao experimentaria esta incapacidade de se incrustar no mundo e de ter no mundo um grande hospedeiro, um grande Utero a abrigd-lo de tudo, e nem haveria nenhum perguntar pelo sentido de ser. — = O homem pergunta pelo sentido de ser porque este vai embora.Independentemente de qualquer controle que se su- ponha sobre ele. O maximo controle sobre 0 comportamento das massas, sobre a opiniao ptiblica... nao é seguro. Ha, as- sim, a constituigdo de um imenso equivoco, por maiores que tenham sido 0 desejo e o esforgo de superd-los todos. Um equivoco epistémico basico, fundamental para o modo meta- fisico de pensar no Ocidente, invisivel para ele mesmo: a investida contra a inseguranga do ser esbarra na impossibili- dade de se mudar a constituig&o ontolégica dos homens. O sonho do homem moderno, a utopia de estabelecer-se como 0 centro e o senhor do universo através da representa- cao do mundo, tem se mostrado uma tarefa, impossivel. O maximo do controle sobre a natureza e sobre suas forgas € 0 descontrole maximo sobre a nossa sobrevivéncia no planeta. ~~ O resultante moderno e contemporaneo da necessidade metafisica de se superar a inseguranga do ser através do con- trole de sua representagao estd, como diz Heidegger ([1966] 1972), no modo técnico pelo qual o homem ocidental moder- no, unicamente, sabe habitar 0 mundo. O que implica uma desvalorizagao ética do homem em favor de uma atencao concentrada sobre os equipamentos e modelos de controle do mundo. Por mais que se tente arquitetar uma sociedade em que se 23 DULCE MARA CRITELLI logre 0 controle da angtistia, da inospitalidade do mundo, da fluidez e liberdade humanas, da transmutagiio ince ante ¢ : sentidos de se ser, a empreitada é, de saida, irrealizaye| a que € originario do modo de ser humano, por mais acoberta. do ¢ represado que seja, € reivindicante sempre e irrompe sutil ou violento, nos momentos e circunstincias os mais inesperados. As eriticas contempordneas, p6s-modernas, que tém por tematica 0 esgotamento de nossa época, pelo que perguntam senao pelo sentido da vida, hoje? Apesar de todos os esforgos desenvolvidos desde Plato e Aristoteles, nao se alcangou ne- nhum sucesso em impedir que 0 ser safsse de sua aparente e desejada paténcia e voltasse para seu misterioso ocultamento.2 A perda do sentido de ser. S6 a partir dai é que o pensa- mento encontra seu apelo para pensar. S6 diante de um vazio de sentido para ser, que torna insignificantes os significados tdcitos € outrora claros de todas as coisas, € que 0 pensamen- to se langa na aventura de saber, de conhecer. O pensar se langa como propriamente é, interrogante, se angustiado; ele € posto pela anguistia de ser diante do nada, da inospitalidade do mundo, da liberdade da existéncia. Contrariamente, portanto, 4 metafisica, que busca a chance de pensar na seguranga da representagao, a fenomenologia € a postura do conhecer que medra na angtistia, na inseguranga do ser. Assim, enquanto a metafisica se articula no ambito da con- ceituacdo, a fenomenologia se articula no ambito da existéncia. Desde a anguistia o pensamento pode se empreender co- mo aquilo que mais propriamente o constitui, como reflexao. E reflexdo, segundo Heidegger ({1957a] 1960), “é a. coragem de tornar 0 axioma de nossas verdades e 0 Ambito de nossos préprios fins em coisas que, sobretudo, sao dignas de serem colocadas em questao”. A fenomenologia nao pode ser compreendida por nds ciao a aoe ea aR ee a ee 2—Um longo e consistente tratamento da temética encontramos na obr@ de Heidegger ({1961] 1971). m4 ANALITICA DO SENTIDO- como uma escola filos6fica entre outras, mas como um pen- samento provocado pelo descompasso de uma civiliza pelo seu esgotamento, pelo esvaziamento, pela nadificagao ‘do sentido em que ser nela se fazia possfvel e solicitante. Eo sentido de se ser no mundo, como homens, cuidando concre- tae expressamente de habitar 0 mundo e interagindo com os outros homens, 0 que provoca o pensar fenomenoldgico. E 0 sentido de ser o que preocupa a fenomenologia, porém, com- preendendo de antemao que todo saber a seu respeito nunca & senao relativo e provisério.3 Compreendido deste angulo, pensar fenomenologicamen- te nao € o privilégio nem o estilo de alguns filésofos, mas é um modo essencial de pensar que esté dado como condigao ontoldgica a todo homem, indistintamente. Se a fenomenolo- gia, enquanto postura epistemoldgica, € 0 pensamento atuan- do diante de um vazio de sentido civilizacional, o pensar do homem cotidiano é um pensar diante do vazio de sua propria -condigao de humanidade (pessoal e coletiva). Pensar feno- menologicamente é sempre um pensar que se abre desde um mudo saber-se estrangeiro, livre num mundo indspito, onde coisa alguma experimenta qualquer parada. Pensar é uma condigao na qual a vida foi dada ao homem, elemento de sua estrutura ontoldégica. Portanto, algo muito diferente da capacidade de se articular raciocinios légicos a respeito do que quer que seja. Esta capacidade é derivada da condic¢ao ontolégica do pensar, como uma de suas articula- 3~O desdobramento do pensar como pensamento do sentido de ser é ja um deslocamento realizado por Heidegger em relacio a Husserl. Uma das razdes pelas quais se pode qualificar de “existencial” a fenomeno- logia empreendida por ele. Arendt inclusive considera Heidegger nao mais um fenomendlogo e sim um fildsofo da existéncia, assim como Jasper. Como jé mencionamos na Introdugao, o leitor encontrard aqui, no entanto, a referéncia ao pensamento heideggeriano apenas como fenomenologia, por um interesse nosso bastante especifico, a saber: manter a atenc&o voltada para como desde Husserl e seus seguidores 0 real foi interpretado, isto é, como “fendmeno”. 25 DULLE MARA UntLELLL goes coneretas (portanto, Onticas). A metafisica interpre esta questao ao contrario, a medida que confina 0 pensar ic Ambito reduzido da representagao, como se aquele fosse me. ‘a aplicagao desta. : O pensar € um poder, um vigor, uma forga que emerge do proprio ser-no-mundo e instaura o homem na sua humanidade na sua fundamental provoca¢ao para ser. Como diz Heidegee; ({1949] 1967), “Ser € ouvir e corresponder aos apelos de ser”, Nessa trajetoria 0 homem estd em incessante embate com 0 sentido de ser.4 Promovido por esse embate diante do sentido — ‘ou de sua auséncia - € que o pensar irrompe propriamente como pensar. Por esta razdo, 0 que funda a questdo do pensamento (¢ de sua posterior formalizagio metodoldégica) é a existéncia, Este é 0 seu parametro, sua origem paradigmatica. Diante dessa circunscrigéo da fenomenologia podemos enveredar pela tentativa de configuragao de uma metodologia fenomenolégica de conhecimento, a qual chamamos, entio, de Analitica do Sentido. a 4~Ser e Existéncia aqui se confundem. Segundo Hannah Arendt (1995: P. 15), “O termo ‘Existenz’ indica, em primeiro lugar, nada mais do qv 9 er do homem, independentemente de todas as qualidades e capacide les que possam ser psicologicamente investigadas... Com a ressalva de que nao por acaso que o termo ‘Ser’ tenha sido substituido por Exis- tenz. Nesta mudanga terminolégica esta oculto um dos problemas fu damentais da filosofia moderna.

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