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TITULO

O PROCESSO EVOLUTIVO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO


FACILITADO PELA BIODANZA

Ana Marcela Nadur Figueiredo

Monografia apresentada à Escola de Biodanza Sistema Rolando


Toro RioBarra, como requisito parcial para obtenção do título de
Facilitador de Biodanza.

Orientadora: Erika Mendel Ferreira - Facilitadora Didata de Biodanza


pela International Biocentric Foundation - Reg. IBF RIOB 1201

30 de Abril de 2017

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Obra síntese apresentada à Escola de Biodanza Sistema Rolando Toro Rio-
Barra e aprovada pela seguinte comissão julgadora:

_______________________________________

Orientadora: Erika Mendel Ferreira


Facilitadora Didata de Biodanza pela International Biocentric Foudantion
Registro IBF . RIOB 1201

________________________________________

Leila Maria Augusta de Almeida

Facilitadora Didata de Biodanza pela International Biocentric Foudantion


Registro IBF RJ 0565

Visto e Permitido a impressão.

Rio de Janeiro, 14 de Abril de 2017.

_______________________________________

Eliana Almeida
Diretora Escola de Biodanza Sistema Rolando Toro Rio-Barra International
Biocentric Foudantion
Reg. RJ, nº 9717

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Agradecimentos

Agradeço a Deus, aos Anjos e Mestres espirituais que sempre me acompanham em


todos os meus processos, me protegendo, orientando, inspirando e guiando meus
passos. Incluo aqui, meu querido mestre e amigo Niuvenius Paoli, que partiu para o
mundo espiritual mas continua de lá – porque o sinto a cada momento – a me
inspirar e orientar, como um anjo que sempre foi.

Aos meus pais que sempre me apoiaram mesmo quando acharam em seu íntimo
que minhas escolhas não iam dar em nada – mas deram, graças a Deus – e
estenderam as mãos e o coração em todos os momentos em que precisei de um
colo pra chorar, de um lar pra retornar e de um amor pra me nutrir e eu poder seguir
a diante.

Aos amigos de todos os cantos e épocas que acompanharam a minha jornada de


vida, em busca do propósito da minha alma, e que com seu amor e lealdade, me
ajudaram a atravessar todos os desafios – e como houve desafios - celebrando
comigo cada vitória e trazendo para minha vida um alento transcendente.

Agradeço a mim mesma, por minha resiliência, força, coragem, determinação e por
toda a fé, bom humor e alegria de viver, que trago dentro de mim. Herdei dos
ancestrais aos quais dedico toda gratidão e amor por mais uma conquista. Eu sei
que eles estavam comigo e sempre estarão. Gratidão por cada dom cedido e
confiado a mim, os quais passo a diante com humildade e alegria.

Enfim, agradeço carinhosamente a todos os didatas e facilitadores do meu processo


tanto dos grupos regulares, quanto da escola, por doarem seu conhecimento e
experiência para nós e de modo especial à Eliana Almeida - diretora da minha
escola, e Érika Mendel – minha orientadora e amiga - por toda a compreensão,
apoio, doação, carinho, amizade e consideração com meu processo de formação,
tanto profissional quanto pessoal.

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RESUMO

O objetivo deste trabalho é reafirmar o grande benefício pessoal e a


potencialização do desenvolvimento do humano proporcionado pelo Sistema
Biodanza. Por ser este um trabalho progressivo, em nível de integração humana, é
essencial reafirmar a importância do grupo semanal como experiência de auto
transformação, pois este – ao ser frequentado regularmente - torna-se um
dispositivo fundamental, um potente catalizador do processo de conscientização e
evolução pessoal. A experiência vivencial em conjunto, mobiliza a energia
necessária para o fortalecimento da identidade do sujeito, pois é sabido que
nenhuma identidade se estabelece ou se fortalece fora das relações e toda relação,
por sua vez, tras consigo, os ecofatores necessários para a construção de uma
identidade autêntica e saudável.

Palavras-chave: Desenvolvimento humano, vivência, auto transformação,


integração humana, progressividade, identidade, relação.

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ABSTRACT

This study aims to reaffirm the great personal benefit and the potentialization of the
human development provided by the Biodanza System. Because its progressive
work, at the level of human integration, it is essential to reaffirm the importance of
the weekly group as an experience of self-transformation, since it is a fundamental
device, a powerful catalyst for the process of awareness and personal evolution. The
experiential experience within a group, mobilizes the necessary energy to strengthen
the identity of the person, since it is known that no identity is established or
strengthened outside of relationships and every relationship, with them, is the
necessary ecofactors for the construction of an authentic and healthy identity.

Keywords: Human development, experience, self-transformation, human


integration, progressiveness, identity, relationship.

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SUMARIO

Introdução ................................................................................................... 08

CAPÍTULO 1 - CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE BIODANZA

1.1. Definição de Biodanza ......................................................................... 13

1.2. Modelo teórico ..................................................................................... 15

1.3. Linhas de vivência ................................................................................ 19

1.4. Princípio Biocêntrico ............................................................................. 19

CAPÍTULO 2 – EVOLUÇÃO

2.1. Conceito ................................................................................................ 22

2.2. Evolução Biológica ................................................................................. 23

2.3. Evolução Cognitiva.................................................................................. 24

2.4. Evolução do Sistema Biodanza .............................................................. 26

CAPÍTULO 3 – BIODANZA E EVOLUÇÃO

3.1. Mecanismos de ação ............................................................................. 28

3.2. Categorias do movimento: Como funcionam na vida das pessoas


que praticam Biodanza ......................................................................................... 31

3.3. Três níveis de mudança de cada linha de vivência ............................. 34

3.3.1. Autoavaliação de níveis de mudança evolutiva segundo o Modelo


Teórico de Biodanza............................................................................................. 34

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3.4. Importância do vínculo grupal como catalisador do processo de evolução
e desenvolvimento humano no Sistema Biodanza.............................................. 37

3.4.1. Níveis de vínculo em Biodanza, segundo Rolando Toro ............ 39

CAPÍTULO 4 – O PROCESSO EVOLUTIVO FACILITADO PELA BIODANZA


NO GRUPO REGULAR.

4.1. O processo evolutivo facilitado pela Biodanza como experiência subjetiva


do facilitador e em relação à evolução do seu grupo regular.................................. 43

4.2. Depoimentos de alunos do grupo regular em relação à sua evolução


facilitada pelo processo Biodanza .......................................................................... 48

CONCLUSÃO ............................................................................................... 54

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................. 56

ANEXOS ........................................................................................................ 57

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INTRODUÇÃO

Parto da experiência de minhas próprias vivências para realizar este trabalho,


na consideração reflexiva de meu caminho evolutivo trilhado durante a formação
enquanto Facilitadora e do grupo regular que desde 2012, venho despertando e
realizando junto a meu presente desenvolvimento. Desejo expor uma descrição de
minhas observações sobre o processo evolutivo dos alunos do grupo regular que
facilito.

Em meu processo como aluna de grupo regular, me deparei com cinco


distintas facilitadoras(Maria Amélia Seixas, Eliana Almeida, Angelina Pereira,
Marlise Appy e Rosangela Vasconcelos) com as quais, em reverenciamento à suas
especiais singularidades, de qualidade humana, profissional e pessoal, puderam
colaborar genuinamente para que minha integração acontecesse progressiva e
efetivamente, dando forma consistente, contribuindo no fortalecimento de minha
identidade enquanto ser humano e facilitadora da Dança da Vida. Isto também foi
possível através da rica contribuição de todos os didatas do curso de formação e é
claro, à minha incessante busca pelo autodesenvolvimento e abertura para
aprender.

É essencial considerar as inúmeras variáveis envolvidas no processo evolutivo


humano, sendo a Biodanza uma dentre tantas possibilidades de transformação
pessoal. Porém, por ser um sistema de integração humana fundamentalmente
vivencial, funciona como um acelerador deste processo e fomenta a energia do
potencial individual, latente e em desuso. A Biodanza é considerada um fator
Biogerador potente e eficaz, dedicado à libertação pessoal e a abertura do indivíduo
em sua busca pelo auto aprimoramento e evolução constantes. Através da
pluralização da via promovida pelo Sistema Biodanza, sentimos que a vida não
cessa em nascer.

Ao longo dos anos, pude observar que na maioria das vezes, o processo de
evolução só avança quando o ser humano percebe conscientemente a estagnação
na qual se encontra. Isto pode se dar de várias maneiras durante a vida, através de
doenças, perdas e outros conflitos que nós mesmos criamos, a partir de nossas
dissociações. A Biodanza, porém, funciona como um Ecofator positivo, profilático,
que nos desperta, conscientiza e apresenta recursos para reverter padrões

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dissociativos, entrando como uma possibilidade de nos conduzir a uma ação efetiva,
de investigação das raízes, no recinto onde residem as respostas e as resoluções.
Quando isto acontece, então é dado o start no processo de crescimento pessoal. É
angustiante e amedrontador não saber o que vem pela frente, mas instintivamente o
Humano segue, pois a vida é um rio que flui e pede passagem para se manifestar
em sua plenitude.

Falar de minha própria evolução na Biodanza já seria suficiente para


comprovação da eficácia deste lindo sistema de integração humana, mas não seria
tão rico quanto compartilhar também tudo que pude observar com meus próprios
olhos; todas as ricas experiências de cura, transformação, libertação e transtases
dos alunos que passaram pelo meu grupo regular.

Até o fim deste trabalho, teremos tido a deliciosa alegria de descobrir que a
cada passo progressivo entre integração motora e afetivo-motora, bem como
exercícios de comunhão, essas pessoas - em menor ou maior grau - redescobriram
novas formas de conduzir suas vidas, ganharam novo ânimo e se depararam com
os seres incríveis e potentes que são.

Toda teoria aqui explorada, denota a importância de se saber que a Biodanza


não é um sistema baseado no empirismo cego, mas sim, fundamentado por bases
fenomenológicas heurísticas, científicas e relevantes que sustentam sua
fidedignidade enquanto sistema de integração humana. É exatamente por isso que
as transformações pessoais ocorrem em caráter de desenvolvimento ascendente,
potente e efetivo.

O equilíbrio bioenergético jamais foi coisa fácil de se conquistar, nem para


iogues, gurus, monges tampouco para químicos, físicos e biólogos. Falamos hoje
em termos de homeostase, sabendo que o equilíbrio é uma zona em constante
mudança, dinâmico, bem como como toda a vida, em movimento. Assim é na
Biodanza, em lançamento para o infinito de nós mesmos, orientando o sentido de
equilíbrio dinâmico da vida. Neste Sistema, equilibramos as emoções através da
própria experimentação que atualiza nosso potencial genético ao longo da liberação
da memória afetiva de origem em nosso corpo. Permitir trilhar os caminhos
energéticos ao longo de nossos membros e pensamentos traz à tona a

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potencialização de um sorriso, um arrepio e um prazer que redefinem o campo onde
se cultivam todas as nossas emoções.

A Biodanza é gregária. É prazeroso buscar no outro a potência de um carinho


que emana desde dentro de nós mesmos. A conexão através do instinto possui a
rapidez da troca de olhares. Palavras são perturbações no caminho entre o sorriso e
o estímulo nervoso que acalma o coração. A Biodanza é a possibilidade de
transmutação de tudo aquilo que nos prende em sementes de padrões negativos. É
a construção perene dos sonhos com os frutos de tudo que o movimento integrado
e o encontro nutritivo nos provocam: acolhimento, enraizamento e vinculação.

É questão de sustentabilidade e fundamento do Sistema Biodanza - enquanto


projeto voltado para a humanidade - o contato e o cuidado com toda a forma de
vida. Abraçar uma árvore, por exemplo, é experiência nutriz de nossa própria bio-
materialidade, e a epistemologia biocêntrica segundo Rolando Toro, atenta para o
caráter de resiliência do ser vivo - que se forma e deforma, poieticamente, em
contínua evolução e regeneração de si mesmo, refazendo-se da matéria-
sentimento, lapidada segundo as oportunidades de encontro para as quais se lança.
Somos múltiplos e unos num mesmo absoluto instante, acessível através dos
processos de entrega e formação de vínculo.

É importante dedicar atenção a esse momentum de eterno renascimento, de


elaboração evolutiva de si, através da manipulação (como o artista escultor) da
matéria-amor que nos é formadora. Somos da mesmíssima matéria dos sonhos, das
estrelas e das emoções. Há uma continuidade entre tais sistemas, que a Biodanza
pretende resgatar. Tal continuidade é muito estudada entre cientistas que sentem
que diariamente se perde um contato com a vida em função de um estruturado
projeto de modernidade fria, e sem movimento (INGOLD, 2011). O engano
moderno, definido em nossa história a partir de um cartesiano cogito (“Penso logo
existo”) caracteriza a absoluta frieza das relações e o moderno desencantamento
social do ser humano do início do séc. XXI.

Como bem alerta Rolando Toro, em seus estudos antropológicos, a figura do


ser humano moderno, “isolado, independente, ‘autônomo’”, alimenta mais a uma
traumática alegoria filosófica do que propriamente uma realidade ontológica.
Segundo estudos recentes na antropologia brasileira, há uma forte sugestão de que

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poderíamos compreender melhor a potência da experiência de vida segundo a ótica
das cosmologias ameríndias, (CASTRO, 2014), ou das contemporâneas filosofias e
epistemologias que nos asseguram diferentes topografias vivenciais (ROLNIK,
2000).

De uma forma geral, parte da filosofia contemporânea converge para um


projeto de reelaboração da condicionalidade humana, após uma necessitada
ressignificação que desloca o Homem Moderno do centro das preocupações de
análise. Compreendendo a nós mesmos como inseridos no mundo e ativamente
participantes da construção dos caminhos de desenvolvimento e de construção de
vidas, faz-se urgente buscar por sistemas epistêmicos dedicados à compreensão
dos encontros e da vinculação através da ancoragem das emoções, que são tão
profundas quanto comuns, no entendimento de sua imanência. A proposta
biocêntrica é a de instigar que as pessoas sejam livres para construir seu destino
sobre bases afetivas e construtivas que priorizem, preservem e gerem vida para si e
para todos.

É uma relação de “duplo-vínculo” (BATESON, 1972) onde ambas as partes


vinculantes se desmaterializam, se ressignificam e buscam novos estímulos, e
propulsões. Dançar é tratar ecologicamente a vida ao seu redor - um respeito
consigo mesmo e com seu entorno. Que não esteja mais divididos entre um ‘dentro’
ou um ‘fora’, mas estejamos eternamente abertos a um entorno - contato fronteiriço
e imediatamente outro, sem o qual nada somos. A simbiogênese é evidente, na
mesma medida em que são evidentes as contra-partes de um encontro, de um
vínculo.

Parto do pressuposto que a Biodanza oferece ferramentas técnicas e teóricas


específicas e o objetivo desse estudo é contribuir para a superação dos modernos
paradigmas, da ontologia e da epistemologia do velho mundo, derivada de antigas
estruturações e paradoxos que solidificam o espírito humano impedindo-o da livre
emergência, do devir que permite identidades e sujeitos mais humanos, justamente
por mais animais (DELEUZE, 2000 , WOLFF, 2000).

Consideramos, assim, estarmos no caminho de tomada de postura íntima e


ética, por tecer um profundo vínculo junto das emoções e pela ancoragem de um

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estado plural de conexão que todavia transcende à capacidade científica de
compreensão.

Abordarei, através dos capítulos que se seguem, minhas próprias pesquisas, a


partir das quais realizo um trabalho, sobretudo de observação como facilitadora de
Biodanza.

Dedico a explorar o conteúdo teórico através dos conceitos fundamentais do


Sistema Biodanza como Definição, Linhas de vivência, Modelo Teórico e o Princípio
Biocêntrico; o conceito de Evolução e seus níveis cognitivo e biológico, e a ligação
entre Biodanza e Evolução como justificativa da relevância deste sistema para a
evolução daqueles que o praticam. Por último, os níveis de mudanças e as
categorias de movimento, roteiro de entrevistas e depoimentos dos alunos em
relação ao seu autodesenvolvimento, bem como uma percepção pessoal como
facilitadora, em relação à evolução do grupo em termos de vínculo e unidade e
minha própria evolução dentro do processo.

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CAPÍTULO 1
CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE BIODANZA

Neste capítulo, serão abordados alguns dos pontos essenciais deste Sistema,
para trazer a compreensão de que a Biodanza foi desenvolvida com base teórica de
riqueza inestimável e com o cuidado que se tem ao se propor qualquer processo
sério de desenvolvimento humano. Apresentarei a definição clássica da Biodanza e
seus componentes, apresentarei o Modelo teórico do Sistema Biodanza e seus
componentes, apresentarei a linhas de vivências, ou potencias humanos
trabalhados no sistema, e por fim apresentarei o conceito do Princípio Biocêntrico,
o novo paradigma no qual é baseado todo o trabalho vivencial da Biodanza.

1.1. Definição de Biodanza

A BIODANZA é, antes de mais nada, um conceito aberto (cf. ECO, 1990). Quer
dizer, um conceito essencialmente vivo, mutante, que se descobre na medida em
que é experienciado. Segundo seu criador,

“é um sistema de integração humana, renovação orgânica,


reeducação afetiva e reaprendizado das funções originárias da vida.
Sua metodologia consiste em induzir vivências integradoras por
meio da música, do canto, do movimento e de situações de encontro
em grupo” (TORO, 1991, p. 2)

A Biodanza, inicialmente intitulada como Psico-Dança, é uma das infinitas


chaves de conexão com a totalidade unívoca do planeta. Onde há vida, há
movimento, onde há movimento, há Biodanza. A Biodanza é realizada mediante a
sincronização da música e corpo, numa sintonização que traz a reestruturação da
multiplicidade de corpos, materiais e imateriais, que conformam nossa totalidade.

Alguns pontos são importantes no entendimento da perspectiva epistêmica


sugerida pelo Sistema Biodanza. Cada item desta definição contém um sentido
profundo e inspirador. A seguir, um detalhamento para melhor compreensão de sua
potencialidade sistêmica e seu alcance científico.

- INTEGRAÇÃO HUMANA: Em Biodanza o processo de integração atua


mediante estímulo de funções primordiais de conexão com a vida, que permite a
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cada indivíduo integrar-se a si mesmo, enquanto espécie e enquanto totalidade. A
integração se dá em nível íntimo-ambiental, no sentido em que há uma verdadeira
mudança de perspectiva na qual o indivíduo sai do paradigma individual-
egocentrada e entra numa sinérgica-ambiental, no qual todo processo de
aprendizagem passa a se constituir de um processo em abertura, e não de
fechamento em relação ao mundo enquanto exterioridade.

RENOVAÇÃO ORGÂNICA: Princípio de autopoiese, de autorregulação e


autoconstrução contínua. É a possibilidade de ação sobre a autorregulação
orgânica, induzida principalmente mediante estados especiais de transe, de
ressurgência do campo inconsciente, que ativam vias e processos basais
(elementares, evolutivamente desenvolvidos), que regulam os processos de
homeostase (regulação bioquímica do corpo). Ocorre ao nível da renovação celular
e regulação global das funções biológicas, diminuindo fatores de desorganização e
estresse em nível celular e intracelular.

REAPRENDIZAGEM DAS FUNÇÕES ORIGINÁRIAS DA VIDA: Significa


aprender a viver a partir dos instintos. O instinto é uma conduta inata, hereditária,
um impulso vital que não requer aprendizado e se manifesta mediante estímulos
específicos, tendo como objetivo conservar a vida e permitir sua evolução.
Respeitando os instintos, respeitamos as vias primárias de comunicação da vida.
Estes são uma porção do comportamento que não devemos negligenciar, pois
denunciam os estados emocionais mais primitivos, expressados através de
pequenos estímulos no corpo que, quando observados e trabalhados com vistas ao
desbloqueio, são capazes de gerar a energia vital que nos move, comove e
impulsiona.

VIVÊNCIAS INTEGRADORAS: São experiências vividas com grande


intensidade, num lapso de tempo – aqui e agora - com qualidade ontológica (se
projetando sobre toda a existência) e são integradoras, por possuírem um efeito
harmonizador em si mesmas. A vivência é a via de acesso à célula; é na vivência
que se valida o processo de transformação pessoal, que autores na sociologia já
chamam de poiese social - quando o processo de individuação passa por uma
reconstrução, isto é, ressignifica a condição humana dentro de uma condição de

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organismo, animal, por não temer mais seus instintos, senão que justamente, se
orienta por eles.

Há uma nova definição elaborada por Rolando Toro, de teor Biofisiológico:

“Biodanza é um sistema de aceleração de processos integrativos à


nível celular, metabólico, neuroendócrino, imunológico e existencial,
mediante a ambiente enriquecido com músicas específicas,
movimentos integradores e carícias que deflagram vivências.”
(TORO, 2009)

A Biodanza, portanto, opera sobre um caráter biocêntrico (vida no centro) e


holístico, onde o ambiente possui caráter epistemológico central para compreensão
de um sentido fenomênico totalizador: através dos encontros e da formação de
vínculo, que toda a vida converge, num instante de manifestação em direção ao
futuro. Nunca ao passado, como fazem correntes psicanalíticas anteriores. A
Biodanza é um salto seguro, em direção a um futuro imediatamente possível,
orientado por um corpo sensível, apto à observação da ambiência que o
contextualiza. A Biodanza proporciona essa aptidão que desperta o corpo para a
tomada de ação.

1.2. Origens da Biodanza e o Modelo teórico

A Biodanza é um sistema de desenvolvimento humano e foi criada por Rolando


Toro a partir de suas reflexões, em um movimento profundo a favor da vida. Este
importante legado foi criado e desenvolvido por ele ao longo de muitos anos de
estudos e experimentações, contando com a contribuição de inúmeros
colaboradores. Rolando Toro Arañeda, nasceu em 1924, em Concepción no Chile,
em uma família humilde de educadores, perdeu o pai muito cedo e teve em sua mãe
um exemplo de determinação, altivez e humildade. Foi professor, psicólogo,
antropólogo, poeta e pintor, dentre outras muitas qualidades.

Suas revolucionarias concepções sobre educação centrada em novas formas


de aprendizagem vivencial a partir da afetividade, da criatividade e do prazer de
viver, levou-o a proferir inúmeras palestras, onde foi então convidado para criar um
Laboratório de Psicologia na Escola de Educação da Universidade de Concepción.
Em 1965 tornou-se membro docente do Centro de Estudos de Antropologia Médica
da Escola de Medicina da Universidade do Chile, dirigindo seminários de

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Antropologia Médica, Filosofia e Psicologia. Este centro tinha por objetivo humanizar
a medicina.

As experiências com músicas e danças em hospitais psiquiátricos, objetivavam


a experimentação de diversas técnicas de desenvolvimento humano para esta
"humanização”. Essas técnicas envolviam psicoterapias de grupo, arte-terapia,
psicodrama, etc. Nessas experimentações Rolando Toro observou que os
pacientes, alteravam a expressão de suas emoções. Essas observações o levaram
à conclusão de que, se a música é capaz de promover este estado, então ela
exerce influência no psiquismo e, portanto, ela seria capaz de promover bons
resultados.

Foi assim, então, que Rolando Toro pôde estruturar seu trabalho, de modo a
relacionar música, movimento e situações de encontro e de continente afetivo
formando uma unicidade. Rolando, então, criou algumas danças e exercícios a
partir de gestos naturais do ser humano, com finalidades precisas, a fim de
estimular os potenciais de vitalidade, prazer, criatividade, afetividade,
transcendência. Tanto no Chile como em Buenos Aires, para onde se mudou aos 47
anos, o trabalho de Rolando Toro esteve voltado para as artes: pintura, poesia,
fotografia, dança e teatro.

Sua crença na possibilidade de um paraíso compartilhado o levou a buscar a


fonte do "amor original", do amor ao próximo, com a essencial compreensão de um
amor que inclui a dimensão corporal ativa. Buscou, portanto, desenvolver suas
ideias sobre a "possibilidade do contato puro com a realidade viva, por meio do
movimento, do gesto e da expressão dos sentimentos", utilizando a música,
enquanto linguagem universal, a dança - integrando corpo, alma e a expressão do
ser, plena de sentido, de felicidade, ternura e força. Como diz o próprio Rolando: "a
Biodanza é um modo de convivência com a beleza... em que o encontro é
essencial".

Ele sempre foi um estudioso do desenvolvimento humano e de sua expressão,


característica que manteve por toda a sua vida. Buscou sempre vivenciar
profundamente o trabalho científico, acadêmico, artístico, bem como as experiências
transcendentais e essenciais para a formação de todo o seu pensamento. A
pesquisa científica sobre respostas orgânicas demonstrou que determinados

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exercícios promoviam uma ação reguladora no sistema nervoso. Observou-se,
também, que outros exercícios "estimulavam emoções específicas que produziam
efeitos altamente significativos sobre a percepção de si mesmo e do próprio estilo
de comunicação afetiva com as outras pessoas". Com o desenvolvimento de seus
estudos Rolando Toro se deu conta de que sua estrutura poderia encontrar seus
fundamentos nas ciências que tratam a vida.

Em 1976, a Biodanza chegou ao Brasil - em Brasília, Belo Horizonte e São


Paulo. Nessa época, Rolando Toro incorporou ao modelo teórico, linhas de vivência,
e apresentou os primeiros conceitos de teoria da vivência e protovivências.

Atentamos que o Sistema Biodanza é um modelo científico e vivo que está em


permanente evolução e serve de instrumento de investigação e manipulação de um
determinado conjunto de fenômenos observados, através do qual é possível
descobrir íntimas relações de coerência. O modelo teórico desenvolvido por R. Toro
possui íntima correlação com demais linhas de reflexão sobre a fenomenologia da
experiência da vida (BATESON, 1972 ; INGOLD, 2011 ; GUATTARI, 1993).

O modelo teórico de Biodanza foi inspirado em experiências clínicas com


pacientes psiquiátricos, quando em 1965, Rolando Toro, realizou as primeiras
investigações com música e dança em um hospital psiquiátrico de Santiago do
Chile. A abordagem consistia em incluir a atividade corporal e estimular emoções
através da dança e do encontro humano. No primeiro momento, com intuito de
induzir harmonia e tranquilidade nestes pacientes, propôs danças harmoniosas e
lentas, com os olhos fechados, o que os levava com facilidade a estados
regressivos. Contudo, as alucinações e delírios se acentuavam, levando à hipótese
de que havia uma forte mobilização dos conteúdos inconscientes durante essas
vivências, o que desestabilizava os pacientes.

Nas sessões seguintes, propôs danças euforizantes, a partir de ritmos alegres,


que estimulavam a motricidade. O resultado foi um aumento notável do juízo de
realidade e o desaparecimento dos delírios e alucinações. Isto mostrou que ambos
os conjuntos de exercícios apresentavam respostas neurovegetativas específicas:

• Exercícios euforizantes estimulavam o sistema nervoso autônomo simpático,


gerando respostas simpático-adrenérgicas (liberação de adrenalina);

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• Exercícios de regressão, de desaceleração e interiorização, estimulavam o
sistema autônomo parassimpático, gerando respostas parassimpático-colinérgicas
(liberação de acetilcolina).

Estas experiências e observações iniciais constituíram a base para a


construção de um modelo teórico operativo, em que foram localizados, em um polo,
os exercícios de regressão e, em outro, os exercícios euforizantes que conduzem à
consciência de si e o fortalecimento da identidade.

O Modelo teórico de Biodanza é pulsante e cresce ao redor das linhas de


vivencias que se entrelaçam, em forma espiral ascendente. No eixo horizontal,
transversal às vivências, oscilam os potenciais genéticos, entre os dois polos numa
pulsação contínua, centrípeto-centrífugo, conforme observamos na tabela abaixo:

IDENTIDADE REGRESSÃO

TRANSE

Categorias Categorias

do Polo Identidade do Polo Regressão

Ampliação da consciência Dissolução na totalidade

Percepção de si como centro Regressão a estados


do Universo primordiais

Incorporação aferente de Abandono e fusão com o


estímulos todo

Percepção realista

O modelo teórico detalhado será exposto mais adiante neste trabalho para
demonstrar a evolução que ocorre dentro do processo de Biodanza, em uma pessoa
que tenha frequência no grupo regular semanal.

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1.3. Linhas de vivência

Quando assimilamos que somos seres sagrados e em sintonia plena com tudo
ao nosso redor, passamos a reverenciar a vida e adotamos uma postura que nos
conduz à sua preservação sob qualquer circunstância. Esta conscientização é
possível através de uma conexão profunda com nossa identidade essencial, onde
reside todo o potencial genético latente, aguardando para se manifestar. O rico
ambiente proporcionado pela Biodanza, formado por um grupo afetivo que dá
passagem e confiança, chance de entrega e portanto, vínculo, se apresenta como
um ecofator (estímulo) positivo, que favorece a expressão da identidade verdadeira
do sujeito, sua autenticidade e serve de gatilho para a manifestação dos potenciais
genéticos, classificados por R. Toro em cinco linhas de vivência, que são:

VITALIDADE – Alegria de viver, ímpeto vital, acesso à energia matriz


disponível para a disposição da ação, integração motora e equilíbrio
neurovegetativo;

SEXUALIDADE – Despertar da fonte de desejo de motivação vital, conexão


com a identidade sexual e diminuição da repressão da energia criadora.
Estabelecimento da conexão com o prazer de viver;

CRIATIVIDADE – Capacidade de expressar-se criativamente, de inovar, ousar,


improvisar, construir, criar e recriar a própria vida;

AFETIVIDADE – Capacidade de estabelecer e manter vínculos através do


amor, da amizade, do altruísmo e da empatia;

TRANSCENDÊNCIA – Estabelecer uma conexão com a totalidade, um


sentimento de pertencer a uma rede vital que nos atravessa e nos interliga a um
todo, maior e significante.

1.4. Princípio Biocêntrico

A compreensão do Princípio Biocêntrico é fundamental para a verdadeira


imersão na experiência proporcionada por essa terapia fundamentada pela dança e

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pelo movimento. Este princípio, há séculos desenvolvido no campo da Filosofia e da
Antropologia, diz respeito a uma renovada superação das rígidas estruturações
modernas, de construções ontológicas derivadas a partir de uma axiomática
condição epistêmica centrada na culturalidade humana, em oposição a sua
natureza, e que forma a visão contemporânea de um mundo no qual mente e corpo
andam desconectados, bem como o indivíduo de seu meio, o espírito da matéria, a
Natureza da Cultura, a Animalidade da Humanidade e tantas outras dicotomias que,
em matéria de Antropologia, estruturam o espírito humano. No Sistema Biodanza,
através do princípio Biocêntrico, o ser humano é convidado a reintegrar-se, pois que
o Biocentrismo propõe geração de vida, e não há vida integral, dissociada da
totalidade.

A proposta de revolução paradigmática proposta por Rolando Toro é


reconhecidamente uma inversão importante, uma vez que ressalta a afetividade e a
linguagem do corpo como momentos de atenção para a dedicação à Biodanza.

As características inéditas percebidas por Rolando Toro o levam ao tratamento


unívoco da ontologia do ser, atravessado infinitamente por linhas de ação,
indissociáveis, por assim dizer, do contínuo florescimento que faz reunir sobre a
superfície do corpo, os múltiplos agenciamentos (afetos) atuantes diretos da
estruturação física de nosso corpo (mediadas através da alimentação, do
envolvimento com certas atividades, da sintonização com distintos padrões
emocionais). A semântica da Biodanza é estruturada segundo um nobre princípio
totalizador - e revolucionário - que transcende a simples convergência
interdisciplinar. É do alcance da Biodanza

“modificar o organismo e a existência humana em diferentes níveis:


desde a homeostase orgânica, a estrutura postural, o estilo de vida,
até os processos socioculturais”. (TORO, 1991, tomo I, p.4)

Para a composição desse cenário no qual o sentir possui preponderância


sobre o pensar, tratamos, em Biodanza, de tomar como referência existencial, a
vivência e a compreensão dos sistemas vivos. Dizemos que “a vida vem antes” da
separação racionalista que destitui o movimento de tudo que se move no universo,
elementos, astros, plantas, animais - são todos componentes de um sistema vivo
maior, e que justifica a homologia universal segundo a qual o Universo só existe
porque existe a vida, e não o contrário.

20
O Princípio Biocêntrico – como um paradigma do Sistema Biodanza - propõe
uma aproximação ontológica do ser humano junto da natureza; num movimento de
reconhecimento profundo, de aceitação e compreensão de nossa interioridade
através da experimentação de nossos potenciais genéticos. Tal religamento da
matéria humana com sua natureza, aponta a imediata denúncia da episteme
moderna, há muito desligada de suas fontes de inspiração, de potência e vitalidade.
A ciência cartesiana, racionalista enrijeceu a subjetividade, a qualidade, a
sensibilidade, a sensação, a impressão, o desejo, o afeto, culminando na
construção de um forte individualismo entre as pessoas, e o desrespeito às demais
formas de expressão de vida. A prevalência do antropocentrismo é ponto chave
para a compreensão da proposta biocêntrica, baseada nos encontros e na
complexidade de uma nova visão de mundo que descortina a realidade como
inacabada, incerta, instável e incompleta, sendo compreendida como um tecido
urdido pelo emaranhado de interconexões que se estabelecem entre tudo que
existe, formando uma complexa “teia da vida”, da qual o ser humano se constitui de
um simples fio.

A vivência é o ponto de partida autorregulador. Significa o momentum de


ressignificação de nossa própria matéria, através da intensa percepção de si no
mundo e da entrega ao momento de estar vivo aqui e agora, quando a intuição é
desperta e capta o instante de vida capaz de reverberar harmonicamente por todo o
sistema vivo humano. A vivência, e não exclusivamente a consciência, é
deflagradora dos processos de transmutação dos padrões comportamentais que
nos causam estagnação através da fixação de nossa identidade. A verdadeira
construção de si é trazida através dos exercícios destinados à sedimentação
identitária que acontece a posteriori, quer dizer, quando permitida a libertação da
roupagem comportamental que se investe sobre nós reificadamente,
desmaterializada pela sutileza da experienciação destituída de projetos de
construção identitário, e que lançam possibilidades de territorialização ao alcance
das impressões sentidas à flor da pele, guiadas pelas consignas técnica e
intuitivamente elaboradas pelo facilitador.

21
CAPÍTULO 2
EVOLUÇÃO

Por ser o tema deste trabalho, “O processo evolutivo facilitado pela Biodanza”,
é de grande relevância que se compreenda a EVOLUÇÃO em suas várias nuances,
até que cheguemos ao desenvolvimento humano como ápice desta trajetória de
aperfeiçoamento. Apresentarei nesse capitulo o conceito de Evolução, abordarei um
pouco mais a fundo a Evolução Biológica e Cognitiva e por fim narrarei sobre a
Evolução do sistema Biodanza, pois trata-se de um sistema vivo em permanente
desde a sua criação.

2.1. Conceito

O que é Evolução?

Evolução é o substantivo feminino que indica a ação ou efeito de evoluir.


Uma evolução remete para o aperfeiçoamento, crescimento ou desenvolvimento de
uma ideia, sistema, costume ou indivíduo.

Etimologicamente, este termo tem origem no latim evolutio, que significa o


desdobramento de alguma coisa.

O sentido de evolução como processo biológico de transformação só surgiu


no século XIX. Neste caso, a evolução consiste em um conjunto de modificações
lentas em direção a um determinado sentido, que remete para um desenvolvimento
gradual e progressivo.

No contexto filosófico, a evolução representa uma alteração progressiva de


um ser ou de um sistema em direção a um estado final. A hipótese teleológica indica
que a evolução pressupõe um estado inicial e final, onde existe a noção de
superação.

Na política, a evolução remete para um melhoramento gradual de parâmetros


sociais, econômicos e políticos de uma população. É diferente da revolução, porque
as mudanças são alcançadas sem violência, através de reformas.

22
2.2. Evolução Biológica

De forma mais atual possível, definiríamos que o termo evolução diz respeito,
simplesmente, à ação do tempo sobre a origem e transformação das formas
orgânicas. É possível dizer que o Princípio Biocêntrico atualiza positivamente os
sentidos de evolução no campo de discussão das ciências. São ações ou
agenciamentos, endógenos ou exógenos ao corpo, que modulam a matéria (forma e
essência) esteja ela associada a organismos ou coisas. Vale lembrar, a vida é
anterior à razão ontológica a qual modernamente estamos acostumados. Assim, é
possível conceituar a evolução como um processo universal, contínuo e
heterogêneo: existe, sempre, uma infinidade de caminhos evolutivos sobre os quais
se lançam os movimentos de vida.

Mesmo recorrendo às noções de ambiente, gene, nicho ou habitat, criadas


segundo o próprio teorizador da dinâmica evolutiva - Charles Darwin (1809 - 1882),
todavia não fica claro de que maneira o ambiente (uma vez separado da matéria
humana segundo o pensamento ocidental), envolve diferentes agentes orgânicos
inseridos num mesmo sistema de interação. (cf. INGOLD, 2011)

Carecemos, portanto, de aliar as diferentes linhas de compreensão da


Ecologia para então nos remetermos mais diretamente à perspectiva evolucionária,
enquanto matriz universal que informa origem e mecanismos de uma Natureza
maiúscula, e ambivalente, já que opera tanto sobre a natureza ‘interna’ quanto
‘externa’ dos organismos, por vias heterogêneas reunidas através dos afetos e das
intensidades singulares emergentes das operações de vínculo.

As teorias darwinistas e neodarwinistas desenvolvem-se a partir das teorias do


biólogo inglês que desenvolveu uma teoria de seleção e passagem de informação a
partir da unidade genética (unidade material do processo evolutivo) e da seleção
natural. Organismos mais bem adaptados possuiriam maior número de
modificações a determinado ambiente, e portanto teriam maiores chances de
sobrevivência em relação aos menos adaptados, passando adiante as modificações
aleatórias que lhes conferiram sucesso adaptativo para um determinado ambiente.

Na "luta" pela vida, organismos com variações favoráveis às condições do


ambiente têm maiores chances de sobreviver (maior fitness), produzindo

23
descendentes, geneticamente adaptados ao ambiente (apresentam as variações
vantajosas de seus pais). Assim, ao longo das gerações, a atuação da seleção
natural sobre os indivíduos mantém ou melhora o grau de adaptação destes ao
meio.

A Teoria sintética da evolução (Neodarwinismo) basicamente incorpora noções


modernas sobre a genética. A mais importante contribuição individual da Genética,
provém dos trabalhos de Gregor Mendel, que conceitua a própria molécula gênica.
Neodarwinistas tendem a trabalhar com variáveis sobre a genética de populações, e
compreendem o processo como formas de mutações adquiridas ao acaso, por
influência do ambiente (que atua como força externa ao organismo).

O Princípio Biocêntrico proposto por R. Toro aponta para uma síntese entre
potencial genético e ecofatores. Teóricos como John Lovelock (Teoria Gaia) e Lynn
Margulis (Simbiogênese) crescentemente ganham força com suas teorias que muito
veem ao encontro deste princípio teorizado por Toro: a tomada de consciência de
habitarmos um ‘planeta vivo’, no qual a vida é caráter de unidade, e não de
distinção, entre os muitos seres vivos inseridos no mesmo sistema ecológico,
reescreve o mito de criação de toda a humanidade, esquecendo um pouco sua
especificidade ligada ao paraíso e comungando de uma existência compartilhada
acompanhada até os tempos do dilúvio da criação.

2.3. Evolução Cognitiva

A linguagem simbólica representa um grande diferencial para as possibilidades


de interação do ser humano em seu ambiente, além de proporcionar estudos
comparativos às demais espécies (cf. Tomasello & Call, 1997). Estudos sobre
linguagem simbólica se voltam para processos de aquisição e desenvolvimento de
competências comunicacionais, o que reforça a distinção entre espécies mais ou
menos competentes, gerando conclusões precipitadas sobre a inteligência entre
animais humanos e não-humanos.

Mesmo as diversas escolas cognitivas, como a estruturalista e a funcionalista,


consideram as competências linguísticas em diferentes níveis de referência sobre a
matéria biológica. Tomasello (1997) sugere um mecanismo evolutivo que teria

24
operado mais rapidamente, e em um tempo cronologicamente mais curto do que a
seleção natural. Não sendo esse o problema do Sistema Biodanza, por acreditar na
potência, como mecanismo de evolução e transcendência, e não da seleção natural,
como modelo de desenvolvimento e passagem de informação entre os organismos.

Conceber a proposição biocêntrica, de construção de um complexo sistema


diretamente ligado às raízes do sistema límbico, é tarefa a ser realizada. A
perspectiva de compreender a aprendizagem como um processo, como um
deuteroaprendizado - aprender-a-aprender - (BATESON, 1972) promove a dinâmica
necessária para que não se trate somente de substituir padrões parentais
(cognitivos, culturais) introjetados na infância. Na Biodanza compreende-se bem o
princípio de que “conhecimento” não é algo-forma que carregamos, e passamos
adiante, senão que uma chave com a qual abrimos portas de acesso à diferentes
experimentações de um ambiente: isso nos exige a contínua calibração de nosso
corpo, a cada passo, a cada momento musical, menos como uma coreografia e
mais como uma conexão com o momento. Consiste em mudar os valores
produtores de patologia, transmitidos através da história, através da autoridade
política (reificados através de sistemas religiosos, educacionais e médicos
modernos), que engessa maus costumes e preconceitos socialmente evidentes.
Para cortar o fio patológico da história, é necessário pluralizar os pontos de vista
sobre a humanidade, abrir o corpo humano, permitir sua plasticidade segundo os
momentos de encontro, diluindo a síndrome patológica de diferentes civilizações.

A Biodanza tem o compromisso de oferecer marco referencial consistente e


módulos de informação objetiva de caráter holístico: antropológico, poético,
científico e artístico. Isto permitirá ao aluno ampliar seu horizonte e liberar-se de
seus preconceitos. A Biodanza é, portanto, informativa, mas não interpretativa nem
analítica. Não são requeridas interpretações sobre as vivências, senão que a auto
percepção das sensações experimentadas, que poderão ser expressadas
voluntariamente – no ato da intimidade verbal do grupo - antes do início de novas
vivências, em uma aula. A mobilização de instrumentos cognitivos da interpretação,
contribuiria fortemente para o bloqueio da produção e da percepção experiencial. A
função cognitiva cortical inibe - como é sabido - a função vivencial límbico-
hipotalâmica. Informação e reculturação são indispensáveis, porém a interpretação
pode dificultar o processo de mudança.

25
2.4. Evolução do sistema Biodanza

Apresento o que representa a evolução do Sistema Biodanza, cuja história de


seu criador se faz mister. A vida de Rolando é repleta de um conteúdo de profunda
motivação à educação da alma humana, de inspiração em matéria de movimento,
de vôo e de dança, assim reunidas por um incansável zen, que é Toro. Sua
dedicação à estética faz dele uma referência que transcende a temporalidade do
papel, da escrita e da investigação mediada pelo pensamento. A Biodanza, hoje, se
oferece como uma ferramenta muito próxima da fenomenologia, enquanto
ferramenta heurística de superação da cientificidade moderna, que todavia se
baseia no paradigma newtoniano-cartesiano.

O Sistema Biodanza, como abordagem de facilitação do desenvolvimento


humano, foi criada por Rolando Toro a partir de um movimento profundo em favor
da vida. Seu modelo teórico e metodológico tem marco inicial em 1965, início de sua
sistematização.

Toro busca desenvolver suas teorias sobre a possibilidade de contato mais


“puro” com a realidade viva, por meio do movimento, do gesto e da expressão
corpórea dos sentimentos (cf. TORO, 1991). Utiliza a música, enquanto linguagem
universal e a dança integrando todas as esferas do corpo, da alma e a expressão do
ser, plena de sentido, de felicidade, de pertencimento, prazer e força.

Autodidata estudioso do desenvolvimento humano, desfrutou de plena saúde e


expressão física até pouco mais de 80 anos. Como ele mesmo diz: "a Biodanza é
um modo de convivência com a beleza, onde o contato é essencial".

Suas experiências com músicas e danças em hospitais psiquiátricos, em


meados da década de 60, contribuíram para a criação de diversas técnicas em favor
da "humanização da medicina". Através dessas experiências, Toro observou que o
transe assim induzido, trazia à tona modelos padronizados e específicos de
expressão relacionados à determinadas emoções. Observando que a música é
capaz de promover tal estado, dedica-se à investigação desse momentum na
individuação do sujeito humano.

Assim, portanto, estrutura seu trabalho de relacionar música, movimento e


situações de contato e de continente afetivo na formação unívoca na constituição do

26
ser. Criou algumas danças e exercícios também a partir de gestos naturais do ser
humano, com finalidades precisas, a fim de estimular a vitalidade, a criatividade, o
erotismo, a comunicação afetiva entre as pessoas e o sentimento de pertença ao
universo, à totalidade.

Mais tarde, incorpora as Linhas de Vivência ao Modelo Teórico, e apresenta os


primeiros conceitos de teoria da vivência e protovivências. Isto se dá pela
concepção extraordinária da Biodanza sobre a sociedade e a ecologia humana, e
parte do entendimento de que a vida é o princípio de tudo que existe. A questão
paradigmática rompe com a visão antropocêntrica e dissociada do mundo, em favor
de uma compreensão Biocêntrica: a vida não existe em função do ser humano, mas,
o ser humano existe porque nele também habita a vida.

A Biodanza, segundo Rolando Toro é uma conjunção de arte, ciência e amor,


conforme expressou em 1979:

"A base conceitual da Biodanza provém de uma meditação sobre a


vida, ou talvez do desespero, do desejo de renascer de nossos
gestos despedaçados, de nossa vazia e estéril estrutura de
repressão. Poderíamos dizer com certeza: da nostalgia do amor.
Mais que uma ciência é uma poética do encontro humano, uma nova
sensibilidade frente à existência." (TORO, 1979, p. 1)

A Biodanza no Brasil foi perseguida durante a segunda metade da década de


70 e início dos anos 80, bem como a seu criador, Rolando Toro. Os Conselhos de
Psicologia (principalmente da Regional Nordeste) perseguiram os praticantes e
pesquisadores em Biodanza. O Conselho Federal de Psicologia denuncia Rolando
Toro com base no Estatuto do Estrangeiro, criado pela ditadura, com a finalidade de
expulsar os padres estrangeiros ligados à Teologia da Libertação. Rolando é detido
em 1982, por quatro horas, sendo solto por encontrar-se com o passaporte validado.
O cenário de ditadura militar quase extingue a emergência da Biodanza no Brasil.
Ainda assim, três encontros nacionais realizados e sessões de Biodanza facilitadas
por Toro para alunos em São Paulo, Belo Horizonte e em Brasília, aconteceram.

Desde então, muito esforço continua a ser realizado no fortalecimento e


difusão da Biodanza no Brasil.

27
CAPÍTULO 3
BIODANZA E EVOLUÇÃO

Neste capítulo poderemos observar que caminhos os alunos de um grupo


regular de Biodanza percorrem - em termos de movimento, envolvimento e contato
– para atingirem, progressivamente, níveis cada vez maiores e melhores de
evolução pessoal. Para tal, apresentarei os Mecanismos de Ação da Biodanza,
apresentarei como as Categorias do movimento funcionam na vida das pessoas que
praticam a Biodanza, apresentarei três níveis de mudança de cada uma das linhas
de vivência, critérios para uma autoavaliação de níveis de mudança evolutiva
segundo o Modelo Teórico de Biodanza. Por fim, abordarei a importância do vínculo
grupal como catalisador do processo de evolução e desenvolvimento humano
finalizando com os níveis de vínculo em Biodanza, segundo Rolando Toro.

3.1. Mecanismos de ação:

Os mecanismos de ação do Sistema Biodanza estão profundamente


interconectados (a distinção das variáveis possui apenas um valor didático-teórico).
O Sistema Biodanza abarca a totalidade da vida humana, quer dizer, sua
integralidade e possui um Modelo Teórico de grande coerência, através do qual,
fatores externos (ecofatores) e fatores internos (potenciais genéticos) se encontram
numa expressão única, projetada em direção à superação, a libertação e a
conquista de novos territórios existenciais.

O mecanismo fundamental deste Sistema é o estímulo mediante a música, a


dança e a diversidade dos encontros em grupo. A vivência tem prioridade sobre o
pensamento conceitual ou qualquer programação de conduta (essência da proposta
pós-paradigmática da Biodanza). O pensamento lógico racional não é um
instrumento potente o bastante para o florescimento da mudança existencial e para
a indução de mudanças realmente profundas, das atitudes e tendências
comportamentais naturalizadas.

As vivências sim, têm efeito profundo sobre a Identidade da pessoa, sobre os


seus processos de integração afetiva, sua realização existencial e estados de

28
consciência alcançado. As vivências tem um poder de integração em si mesmas e
não necessitam de elaboração consciente, pois são um modo de cognição puro,
quer dizer, atuam diretamente em nível inconsciente.

A música permeia a identidade do indivíduo, pois mobiliza-o por inteiro, na


deflagração de movimentos integradores oriundos do cerne do campo emocional
humano (não comandados pelo córtex cerebral – sede da razão. Diferentemente, no
entanto, no Sistema Biodanza as músicas são rigorosamente selecionadas - a fim
de cumprir seu papel enquanto ecofator. Os alunos são convidados a sentir a união
de um só movimento entre dança e música. As músicas devem ser orgânicas, isto é,
buscar atingir maior grau de ressonância com o organismo e são selecionadas por
seu valor funcional integrador.

A semântica musical possui características físico-químicas como fluidez,


harmonia, ritmo, tônus, unidade de sentido e é totalmente sinestésica, sendo assim
um forte veículo de integração das vivências. Podem deflagrar vivências intensas,
por isso obedecem a critérios semânticos (significação temática, emocional e
vivencial) rigorosos: por vezes despertam padrões de sentimentos que trazem à
tona acúmulos e tensões emocionais que fazem parte da historicidade de cada
indivíduo, trazidas à elaboração na medida em que o movimento da dança as
permite mobilização.

A dança deve possuir o caráter de integração: a emoção é a porta para o


movimento, não um movimento qualquer, mas um movimento pleno de sentido (não
dissociado) e que atinge a totalidade dos sistemas do organismo. A dança
compreende uma coordenação rítmica ideo-afetivo-motora, funcionando como um
suporte com o qual atua uma coleção de ecofatores com grande poder de
deflagração de vivência e que se potencializam reciprocamente. Seu efeito na
homeostase das funções orgânicas, na regulação do sistema integrador-adaptativo-
limbico-hipotalamico, na elevação da qualidade de vida no sentido da plenitude e o
prazer de viver, são consequências diretas da arte de se movimentar plenamente.

Metodologia vivencial: O sistema Biodanza propõe a deflagração de vivências


integradoras, únicas, capazes de reparar as dissociações produzidas pelo indivíduo,
e inconscientemente reificadas no cotidiano.

29
A carícia é uma ferramenta de conexão imprescindível para que haja
comunicação afetiva entre as pessoas. O Vínculo tem o poder de cura, logrado
através do carinho paulatinamente constituído dentre os membros do grupo. Ele
permeia a identidade numa via de mão dupla, como podemos acompanhar nos
exercícios de “Eutonia”, “caricias sensíveis de cabelos em pares”, etc.

O Transe e demais Estados Alterados de Consciência implicam na diminuição


do Ego por período de tempo determinado. Constitui-se de um momento especial,
de abertura de nossa identidade às possibilidades de vínculo nutridas localmente,
que dão segurança e liberdade à expressão íntima, e reprimida quando em estado
de consciência cotidiana – momento perene no qual muitos hábitos se sedimentam,
e sedentarizam nosso potencial transmutador, vinculador e afetivo. A
experimentação de estágios de Expansão de Consciência, de estados de
consciência alterada, se caracteriza, no indivíduo por restabelecer a consciência de
vínculo primordial. Temos como efeito mais importante a intensa percepção da
unidade Ontocosmológica. O indivíduo se ressitua perante o mundo, fortalecido pelo
grupo que lhe permite, e nada mais, aceitando sua condição de transmutador de
sua própria realidade.

A Regressão diz respeito à condução a estados iniciais de existência,


memórias inconscientes, de nascimento e princípio da infância, o que permite a
renovação orgânica e a reparentalização sob novas e salutares condições de
existência. A Regressão existe para que haja Renascimento enquanto autopoiética,
isto é, emergência enquanto expressão máxima de uma interioridade potencializada
pelo momento (aqui-e-agora) em que se vive.

O grupo é a matriz de renascimento que se integra em nível afetivo e constitui


um campo de interações de alta intensidade. As dinâmicas vivenciadas dentro do
grupo ganham a característica de “Emergência”, em sistemas ecológicos, no qual
nossa identidade se expressa sempre dentro de um campo relacional, isto é, em
alteridade, frente a um outro, junto ao qual se alcançam os estágios de estabilização
emocional. O grupo é a base sobre a qual emergem as identidades desejadas,
numa interessante e complexa dinâmica onde “não há vencedores” (BATESON,
1972), isto é, tudo que existe são os lançamentos das possibilidades, dos devires

30
existenciais, em busca da harmonização dos estados de inquietude, de baixa
afetividade e estagnação energética.

3.2. Categorias do movimento: Como funcionam na vida das pessoas que


praticam a Biodanza:

Os estudos sobre movimento tem como foco o papel do espaço – conceitual e


experiencial – e sua interiorização na formação de uma totalidade individual (cf.
INGOLD, 2011). Os conceitos de espaço e espacialidade são pressupostos
incorporados através do movimento, que dão fundamentação teórica ao Movimento
enquanto pós-paradigmático, pois ressignificam a materialidade humana baseada
na distinção dentro-fora, indivíduo-social, eu-tu e assume mais contundentemente o
caráter de amálgama existencial, quer dizer, da trans-pessoalidade na interpretação
psicanalítica. Desses pressupostos consiste o entendimento da condição espacial a
partir do corpo em movimento; o espaço sendo conceituado e avaliado a partir da
deriva dos corpos, dos encontros imersos no (meio) ambiente, da qualidade dos
passeios, do modo como se estabelecem as relações entre corpo em movimento e
os limites, obstáculos, nas diferentes escalas existenciais (pessoal, relacional,
global).

“A árvore é um objeto? [...] Onde termina a árvore e começa o resto


do mundo? [...] se decidimos que os insetos que vivem na casca
pertencem à árvore tanto quanto a própria casca, então não há
razão para excluirmos seus outros moradores, inclusive o pássaro
que lá constrói seu ninho ou o esquilo para o qual ela oferece um
labirinto de escadas e trampolins. Se consideramos que o caráter
dessa árvore também está em suas reações às correntes de vento
no modo como seus galhos balançam e suas folhas farfalham, então
poderíamos nos perguntar se a árvore não seria senão uma árvore-
no-ar.” (INGOLD, 2011, p. 142)

O movimento é inerente, ele faz parta da própria conceituação da Pessoa. Isso


nada mais quer dizer que há certa primazia pelo contexto dos encontros, como
‘seres humanos no ar’, enquanto matriz existencial assumida pela Biodanza, onde o
grupo frequentemente assume tal condição matricial: é o jogo de construção das
identidades entre ecofatores e a deflagração de nosso potencial genético. O
conceito de movimento se refere, portanto, ao grau de encadeamento entre dois
elementos analíticos: o espaço e o corpo, sendo melhor caracterizada enquanto

31
uma textura do mundo na fenomenologia do deslocamento dos corpos (INGOLD,
2011).

Assim é que, através da Biodanza, as análises devem sempre focalizar o


contexto, as relações, o grupo, ao invés do indivíduo encerrado sobre si mesmo. O
indivíduo é livre para renascer, e preza-se pela libertação do mesmo de forma a
lograr, simultaneamente, uma descrição geométrica (das potências imanentes do
indivíduo) e uma descrição topológica (dos alcances potenciais do grupo).

Em termos de espacialidade, a dinâmica é única: a forma do espaço e o


deslocamento do corpo interagem e se modificam mutuamente. A espacialidade,
portanto, não é neutra (como visto acima, o grupo é a própria matriz de
renascimento, condição de poiese do indivíduo), e pode colaborar ou emperrar o
desempenho do corpo. Cabe ao facilitador conduzir, através do movimento, a fluidez
das energias, das texturas – os encontros e a experienciação coletiva – de um
mundo em contínua criação.

O estudo, assim, da inter-contextualidade, é essencial no âmbito da


terapêutica ao propiciar uma avaliação da performance dos grupos a partir das
demandas expressas diretamente através do próprio corpo, e do reconhecimento da
afinidade que se traduz, no grupo, enquanto uma unidade corporeificada. O
reconhecimento da terapêutica a partir do movimento, ao se posicionar na mão
contrária da tendência dominante que foca no indivíduo e em seus traumas,
ressignifica valores essenciais para uma terapia como arte social.

O dualismo cartesiano que dicotomiza o corpo e a mente (com uma ligeira


primazia do segundo sobre o primeiro) resulta, hoje, no advento do “Homem-
máquina” e no “corpo instrumento”, no qual o corpo teria como função executar as
determinações da mente, tornando o homem alheio, estranho à sua própria
corporealidade.

A existência corporal com totalidade e unidade (fundamento da Biodanza),


considera o organismo como uma estrutura completa cujas reações são
essencialmente co-ordenadas, abandonando a ideia de que o corpo teria uma
suposta funcionalidade linear orientada por um conjunto de órgãos fisiologicamente
agrupados. A Biodanza entende o movimento humano como expressão corporal

32
espontânea, traduzindo as sensações e emoções experimentadas pela pessoa. A
dança é o próprio movimento, expressão máxima do conjunto de reações
emocionais em contato com o meio, em contínua interação existencial, para além de
uma coreografada raciocinada:

“Antes de ser uma forma de arte, a dança foi uma expressão


espontânea da vida coletiva a qual dava uma vigorosa e expressiva
acentuação. O homem dançou de fato antes de ter falado. Em todos
os hemisférios o homem manifestou-se, expressou-se com seu
corpo desde as suas origens” (cf. Le Bouch, 1987, pp. 76-77).

Nos povos primitivos, a dança sempre foi um meio essencial de participar das
manifestações sociais e rituais da tribo, onde a expressão do corpo é um perfeito
veículo de manifestação dos afetos vividos em comum. Foi um instrumento utilitário
da sociedade para celebrações, para pedir a chuva, a cura das doenças, agradecer
pela fecundidade da terra, a proteção contra os ataques, a vitória nos combates
entre tribos e outros. As danças possuem sempre o caráter de mimese, isto é, de
imitação da vida cotidiana, simbolizando e codificando a vida através do movimento
no qual os dançarinos simulavam as situações que desejavam materializar ou
comunicar. O papel assumido pelo dançarino através da dança é tomado por um
poder emocional enorme. Em Biodanza, ao dançarmos, revivemos nosso espírito
ancestral, dançamos como dançávamos há milênios, na imitação das figuras
animais (bio-mimese), despertando nossa própria animalidade. Na dança nos
convertemos em animais (felinos, répteis ou anfíbios): sentimos sua força,
determinação, agilidade e sinergismo. Vivemos nosso animal interior e tomamos
consciência dele, reconhecendo-o como sacralidade poderosa, vigilante, atenta e
dona de si mesma.

R. Toro faz uma reunião de toda a libertação do corpo proporcionado pela


dança moderna, dedicada a fazer renascer a espontaneidade e a paixão na dança,
permitindo a “dança autêntica” impossível de ser imitada. Tal linha de trabalho
propõe um modelo que agrupa distintos aspectos do movimento corporal em relação
a uma visão holística do homem, propondo uma dança evocada, emocionada, com
“movimentos plenos de sentido”, sem modelos e estereotipias.

Deve-se sempre estimular a autenticidade do movimento no grupo, frisando


que a dança é expressão da identidade, única e inimitável. Por este motivo

33
podemos dançar infinitas vezes uma prática qualquer em Biodanza jamais uma
vivência será igual à outra.

3.3. Três níveis de mudança de cada linha de vivência

O Sistema Biodanza promove processos evolutivos em três níveis de


mudança:

Numa Primeira Ordem, os participantes podem observar benefícios no que


diz respeito à sua íntima sobrevivência, com o aumento da qualidade de vida, a
ampliação da capacidade de comunicação, a entrega para os rituais de vínculo, e a
progressiva eliminação das relações tóxicas.

Em nível de Segunda Ordem, a Biodanza promove o desenvolvimento da


autorregulação, da extensão existencial em solidariedade e aumento da capacidade
de dar e receber, de realizar trocas com maior resiliência, capacidade de se
entregar e de oferecer acolhimento.

Referente à Terceira Ordem de mudanças, atribui-se à capacidade de


estabilização emocional em estágio de empatia, felicidade amorosa, contínua
criação, tomada de decisões coletivas e de ação social.

Em todos os níveis de mudança, o vínculo afetivo está presente em suas


variadas manifestações, funcionando sempre como um feedback para o processo
evolutivo integrativo individual. Não há segredos, ou mistérios, a prática das
vivências é sempre embasada por um conhecimento robusto, que preza pelo
aprendizado gerado durante as sessões. O caminhar evolutivo é absolutamente um
mérito conquistado a partir da permissividade de cada sujeito, em seu desejo por
agir, atuar, conviver e se inter-relacionar com mundo em que vive. De maneira
integrada e nutritiva.

3.3.1 - Autoavaliação de níveis de mudança evolutiva segundo o Modelo


Teórico de Biodanza.

MUDANÇAS
MUDANÇAS MUDANÇAS
3° ORDEM
1° ORDEM 2° ORDEM
LINHAS DE
VIVÊNCIA Felicidade amorosa e
Sobrevivência Liberação
criativa

34
1 - Aumento da 1 - Forte motivação 1 - Renovação
VITALIDADE energia vital para a vida biológica
2 - Integração motora 2 - Autorregulação (rejuvenescimento,
3 - Integração ao sistêmica (eliminação diminuição das
corpo (superação da de sintomas enfermidades)
fronteira corpo-alma) psicossomáticos) 2 - Atitude mais
4 -Transformação das 3 - Aumento da entusiástica
defesas musculares autoestima e da auto 3 - Orientação
5 - Autorregulação e confiança. existencial afetivo-
homeostase 4 - Eliminação da cognitiva (refinamento
discriminação seletivo)
(patologia do Ego)
5 - Ímpeto vital

1 - Despertar da fonte 1 - Orgasmo 1 - Êxtase erótico


SEXUALIDADE do desejo 2 - Consciência da (sentimento de
2 - Diminuição das identidade sexual plenitude)
defesas e da auto 3 – Eros 2 - Integrar prazer e
repressão sexual indiferenciado amor, sentindo a
sacralidade da vida no
ato sexual
3 - Descoberta da
identidade sexual
(Eros diferenciado)

1 - Expressão das - Capacidade de - Reformulação


CRIATIVIDADE emoções inovação existencial
2 - Expressão através 2 - Integração Yin- - Criação artística
da voz / movimento Yang
3 - Renovação do
estilo de vida
(mudança da estrutura
existencial)

1 - Eliminação ou 1 - Amor 1 - Capacidade de dar


AFETIVIDADE diminuição de indiferenciado e receber continente
relações ‘tóxicas’ 2 - Não discriminação 2 - Empatia
2 - Capacidade de 3 - Capacidade de 3 - Capacidade de
vínculo qualificar amor epifânico
3 - Aumento da 4 - Percepção estética 4 – Auto doação
capacidade de do Outro
comunicação 5 - Amor comunitário

1 - Capacidade de - Diminuição do ego 1 - Expansão da


TRANSCENDÊNCIA transe e regressão - Consciência consciência
2 - Restauração dos ecológica 2 - Êxtase
vínculos com a - Integração do 3 - Intase
natureza sagrado e profano 4 - Experiência
4 - Visão integrativa paradisíaca
da Totalidade (Transe) 5 - Comportamento
ético

35
Mudanças de primeira ordem são as mudanças percebidas pelo participante
logo no início do processo terapêutico. Frequentemente associadas ao aumento da
energia vital, da integração motora, do despertar do desejo e da criação de relações
nutritivas.

As mudanças de segunda ordem ocorrem paulatinamente e estão ligadas à


reformulações no estilo de vida, de aplicação do aprendizado no cotidiano do
indivíduo (abertura para expressão dos afetos, aumento da capacidade de entrega,
relaxamento, etc.). São conquistas de segunda ordem quando o individuo passa a
refletir sobre as questões essenciais sugeridas pelo Sistema Biodanza que são:
‘Onde desejo viver?’, ‘Como quero viver?’ ‘Sou feliz em minha vida?’ ‘O que tenho
feito da minha vida?’.

Mudanças de terceira ordem, são mudanças mais profundas e normalmente


ocorrem dentro de um período maior de participação em grupo regular. Estão
associadas a uma visão mais sistêmica do mundo, diretamente voltada para
questões sociais, coletivas, quando o participante se capacita em observar para
além de si mesmo enquanto ser isolado ou em caráter de vitimização social. (são
exemplos: a tomada de ação e luta social pelos desamparados, criação de obras
artísticas, iluminação, capacidade de iluminar a vida dos outros, participação em
trabalhos voluntários, entre outras). Qualquer mudança pode ser sentida como
ameaçadora, pois desloca o status social do indivíduo, de modo a causar
insegurança psicológica e gerar sensação de medo. Por isto, a identidade de cada
um – em um grupo regular de Biodanza - é fortalecida para que as mudanças
possam ocorrer de modo contínuo e paulatino, naturalmente, sem pressões ou
sensação de obrigação por mudança. São requisitos indispensáveis ao facilitador -
para que mobilize o grupo em direção ao auto desenvolvimento - a afetividade, a
empatia, a vocação humanística, o desejo de ajudar o próximo, a humildade, a
sinceridade, a coragem e a resiliência emocional e física.

3.4. Importância do vínculo grupal como catalisador do processo de evolução


e desenvolvimento humano no Sistema Biodanza.

A metodologia da Biodanza, pautada na vivência, só é possível através da


formação de grupos, visto que a mesma preocupa-se com a vinculação do ser
humano em no mínimo três níveis: consigo mesmo, com o outro e com a totalidade.

36
Assim, o grupo é o caminho, condição sine qua non para o fortalecimento da
identidade do indivíduo, através de sua integração e consequente desenvolvimento
de suas potencialidades. Não existe uma prática individualizada de Biodanza, pois
as vivências são marcadas pela presença do outro. O objetivo do grupo é funcionar
como uma matriz de renascimento, onde a vida e o cuidado recíproco são
constantemente valorizados. É um espaço puramente Biocêntrico, biogerador e de
florescimento da personalidade.

O psicólogo Carl Rogers (1902-1987), fundador da abordagem


psicoterapêutica “Centrada na Pessoa” dedicou anos de pesquisa aos fenômenos
de grupo, compreendendo que o grupo, em si, funciona também como um
organismo vivo, autorregulado, onde cada indivíduo é parte constituinte e
fundamental do todo ao mesmo tempo em que é, também, o todo em si. O indivíduo
evolui na mesma medida em que o grupo, como um todo, também o faz. Para isto, é
preciso um clima afetivo e de compreensão onde seus membros possam refletir e
se expressar livremente. Os indivíduos em um grupo alcançam graus mais amplos
de abertura segundo o clima terapêutico conquistado.

Na Biodanza, acreditamos que o grupo deva possuir um clima de segurança


emocional que encoraje a expressão - de emoções e sentimentos como respostas
a estímulos provenientes - entre os membros do próprio grupo, e abranja o
envolvimento afetivo como um todo. O grupo, que se desenvolve mediante
mecanismos próprios de autorregulação e diligência, rege o ritmo e conduz suas
próprias trocas de experiências, permitindo a emergência de um material afetivo
significativo, isto é, quando os indivíduos começam a expressar frente uns aos
outros os seus sentimentos mais imediatos.

O grupo de Biodanza oferece terreno afetivo propício para a expressão das


emoções. Cada participante é convidado a entrar em contato com suas emoções,
por meio de suas próprias forças, conduzidas por condições pessoais de valor,
moral, enfrentando também seus medos e dificuldades, proporcionando verdadeiro
crescimento individual. Trata-se, portanto, de uma condição mister, a formação de
um grupo afetivo e cuidadoso, em que as vivências são propostas de forma
progressiva, respeitando sempre os limites e possibilidades de cada um. Segundo
R. Toro, “a única relação saudável entre as pessoas é a relação afetiva, através da

37
qual os indivíduos têm a oportunidade de conhecer a si mesmos e serem si
mesmos”.

Os membros de um grupo vão se conhecendo aos poucos, de acordo com as


afinidades. A unidade de um grupo vem dele próprio, sendo que o facilitador apenas
contribui para a fluidez, a comunicação, e o diálogo entre seus membros. O
facilitador não deve jamais impor nada: ninguém é obrigado a estabelecer relações
com quem não sente afinidade ou que não desperte o desejo de vínculo, porém, o
facilitador trabalha de modo a intermediar as relações para que todos possam
transcender ao desafio de se relacionarem organicamente. Todo grupo tem implícito
um ‘contrato’, que é o vínculo afetivo que se cria nas relações, inicialmente dado
entre o indivíduo e o facilitador e que posteriormente, se dissolve entre todos.

Segundo R. Toro (1991), são funções que caracterizam um grupo de


Biodanza:

1. Permissivo: quando o grupo permite aos membros que atenuem seus


mecanismos de defesa e se apresentem como realmente são.

2. Facilitador: quando há fortalecimento do que há de salutar em cada


indivíduo, com estímulo do ímpeto vital, da alegria e da criatividade.

3. Integrador: através dos sistemas motor, afetivo-motor e ideo-motor, permite


a integração entre o sentir, pensar e agir, bem como entre os sistemas cortical e
emocional, promovendo a geração de prazer.

4. Deflagrador: quando o grupo permite a deflagração de situações ou


emoções ocultas, que promovem os processos de crescimento.

5. Criador: quando o grupo é capaz de induzir situações de promoção da


criatividade e inauguração de momentos inusitados e extraordinários.

6. Transcendente: o grupo tem como principal função ser uma matriz de


renascimento.

O facilitador, peça fundamental do Sistema Biodanza, mantém uma relação


com os participantes, de abertura e afetividade; ocupa o lugar de dirigente e
condutor do grupo, porém, não detém um lugar de ‘saber superior’: ele é também

38
um dos integrantes do grupo e busca seu próprio desenvolvimento e integração.
Participa das vivências, propicia ao grupo o clima de confiança e tece a si mesmo
em meio as demais individualidades. É de sua responsabilidade promover
segurança e conforto ao grupo para que cada indivíduo sinta o valor de si na
constituição do grupo. O facilitador deve ser um catalisador das relações
experienciadas pelos participantes, no sentido de promover o crescimento coletivo e
gerar mudanças internas em cada um deles.

3.4.1. Níveis de vínculo em Biodanza, segundo Rolando Toro.

Os processos de vinculação se objetivam através das vivências onde uma


oferta de afeto é o que possibilita novas formas de contato comunitário (eu-mundo),
fundadas no amor e na ética e, por conseguinte, na possibilidade da
reparentalização, reorganizando criativamente as formas de estabelecimento dos
vínculos afetivos, que advém de matrizes primitivas de nosso desenvolvimento
psicológico.

Para a Biodanza, a vinculação afetiva acontece em três níveis: consigo, com


o outro e com a totalidade. A capacidade de conexão, de entrega, de
interdependência, de intimidade, de relacionar-se, de fazer contato, de dialogar, de
cuidar, de dar e receber, de sentir-se presente mesmo distante, de estar disponível,
etc., se dá no individuo com ele próprio, de um indivíduo para com o outro e do
indivíduo com a totalidade da vida.

O “vínculo consigo mesmo” consiste em resgatar a unidade psicofísica do


ser. É o aprofundamento da relação de intimidade consigo próprio, valorizando os
próprios desejos e instintos, mantendo sentimentos positivos sobre si mesmo e sua
vida, valorizando-a positivamente , sacralizando-a, e colocando-a no centro do
movimento vital.

O vínculo com o outro, consiste em resgatar e restabelecer a identificação


com outro ser enquanto semelhante e, mesmo respeitando as diferenças singulares
de cada identidade, entrar na relação com empatia, feedback, reciprocidade, amor e
todos os sentimentos e ações já elencados, caracterizados pela afetividade e
vínculo.

39
O vínculo com a totalidade se dá através do restabelecimento da conexão com
a espécie humana, enquanto totalidade biológica, com a natureza, incluindo o reino
animal e vegetal e com o Universo como um todo. Neste nível, são vivenciados os
sentimentos de pertencimento, de inclusão, de epifania, de ressonância e de
unidade com o todo. “A certeza de que somos um”, segundo R. Toro. Quando é
possível sentir-se vinculado nesses três níveis, pode-se dizer que a capacidade de
vínculo é muito boa e revela a saúde afetiva do indivíduo e sua evolução como Ser.

Os componentes estruturais da afetividade se encaixam perfeitamente para o


melhor entendimento sobre a formação de vínculo. São eles: identidade, nível de
consciência, nível de comunicação, ecofatores e antecedentes biográficos. É
através do estado constitutivo da identidade do indivíduo que se dá seu processo de
vinculação saudável ou patológica. Se sua identidade está fortalecida e integrada,
ele sente-se bem consigo mesmo, tem alto nível de autoestima e permissão para
expressar-se e realizar seus potenciais. Desta forma, a capacidade de criar
vinculação saudável, é potencializada. Porém, se a identidade está comprometida
em seu núcleo e expressão - gerando sentimentos de baixa autoestima , auto
destrutividade, opressão, sentimentos de inferioridade ou superioridade, medo da
diversidade, preconceitos, autodesqualificação e desqualificação do outro, etc. -
então a capacidade de vinculação fica igualmente comprometida. Segundo R. Toro,
“uma identidade débil gera incapacidade de amar por medo da diversidade; logo os
vínculos possíveis de serem estabelecidos serão defensivos.” (id, 2011)

O Sistema Biodanza não somente promove o vínculo, mas, o tem - em


primeiro e último graus - como núcleo integrador da existência.

A construção de vínculo é algo que possui um evidente caráter histórico,


contextualizando a maneira com que os encontros são realizados na atualidade.
Formas originais de formação de vinculo caracterizam-se pela solidariedade e o
caráter orgânico das relações mediadas por necessidades materiais e por uma
relação mais direta com o meio no qual se encontravam as populações humanas.

A Biodanza busca estimular diferentes maneiras de realização do convívio, já


que necessariamente trabalha um grupo no qual se encontre o amor e o resgate da
afetividade. No encontro com o outro fundado na ternura, e portanto, no ético, cria-
se uma base vinculativa positiva para um encontro consigo mesmo concomitante ao

40
desenvolvimento dos Potenciais de Vitalidade, Sexualidade, Criatividade,
Afetividade e Transcendência de cada um.

Para que isto aconteça, o grupo deve assumir funções distintas segundo a
fase do desenvolvimento em sessão (que mobiliza forças indutoras através da
música e de uma sequência própria de movimentos. O encontro “consigo mesmo” a
todo o momento flui para o “encontro com o outro” ao mesmo tempo em que o
“encontro com o outro” revela-se um espelho, da relação “consigo mesmo”.

Nas sessões de Biodanza, o grupo sensibilizado através da música, do


movimento, e das situações de encontro, passa a formar um continente afetivo, que
recebe e integra a todos os participantes possibilitando a experienciação, segundo
R. Toro, de uma matriz de renascimentos, sempre ancorando em território amoroso,
aquilo que nos fundamenta como humanos. O grupo é biogerador, ou seja, um
centro gerador de vida. A concentração de energia convergente dentro do grupo
produz um potencial sempre maior que a soma das partes, resultando na
estabilização de um campo magnético sobre o qual se projetam as emoções,
desejos e sensações físicas de grande intensidade. Produz-se uma percepção da
‘essência’ das outras pessoas, umas vez atingido tal grau de atenção com o grupo e
com isso dá-se entrada em um novo “regime de identificação” (cf. RANCIÉRE,
2005).

A atmosfera criada por um grupo quando alcança um nível básico de


integração é de um mundo sem tantas barreiras, em que as pessoas não
representam mais um limite à expressão interior. Esta atmosfera permite que os
corpos se deixem tocar pela presença e potencial do outro e que manifestem
emoções integradoras de grande intensidade.

Para R. Toro, a afetividade está profundamente enraizada na Identidade,


sendo que as pessoas com identidade frágil têm dificuldades de expressar
sentimento de amor, temem a diversidade, a entrega e vínculo com o outro e agem
defensivamente. Uma questão importante que envolve a afetividade da pessoa, é
sua capacidade de vincular-se ao todo enquanto algo vivo, possibilitado uma
experiência de expansão da consciência. Uma precária consciência da totalidade
define pessoas que vivem girando em torno de conflitos redundantes, que obliteram

41
o fluir da vida. Nas palavras de Rolando Toro, portanto, “Vínculo é a disposição de
pura ternura e a disposição para dar e receber afeto”.

42
CAPÍTULO 4
O PROCESSO EVOLUTIVO FACILITADO PELA BIODANZA NO GRUPO
REGULAR

Neste ponto do trabalho, o foco será no caminho de evolução realizado por


mim, enquanto aluna de grupo regular e escola de formação, bem como minha
observação ao que diz respeito aos grupos que conduzi/facilitei e a evolução destes,
seguindo os padrões de ortodoxia e progressividade que o Sistema Biodanza
propõe. Também será possível acessar depoimentos de alguns alunos que se
beneficiaram deste lindo e potente trabalho.

4.1. O processo evolutivo facilitado pela Biodanza como experiência subjetiva


e em relação à evolução do meu grupo regular.

Conheci a Biodanza através de uma vivência apresentada em um Simpósio


de Psicologia na faculdade, em 2000. Eu estava em um momento existencial
bastante vulnerável, pois minha mãe havia passado por uma cirurgia neurológica
seríssima em função de um aneurisma cerebral que a levou a perder
temporariamente algumas funções orgânicas básicas. Eu tinha muito medo de
minha mãe ficar com as sequelas daquela doença e/ou não suportar e morrer. Isto
foi em Abril de 2000 e em Agosto, perdi um primo muito amado (grande amigo), de
apenas 36 anos, num acidente de automóvel. Eu estava vulnerável
emocionalmente, tendo crises de choro e terror noturno e me sentia deprimida a
maior parte do tempo.

Então, naquela semana de Simpósio, numa manhã cheguei atrasada para a


primeira palestra e era justamente da Biodanza, com um facilitador do Rio de
Janeiro chamado Paulo Sergio de Oliveira. Eu sequer havia lido a programação do
dia. Quando entrei na sala, a palestra havia acabado e o professor estava
convidando o grupo para uma roda. Foi quando olhou diretamente pra mim e
perguntou seu eu gostaria de participar da vivência. Embora não fizesse ideia do
que se tratava, eu entrei na roda e tudo aquilo mexeu muito comigo. Chorei quase
que o tempo todo, pois tudo me tocava o coração e me mobilizava interiormente. De
repente, na parte baixa da aula, entrei num estado de dor profunda e não parava de
chorar, até que o professor me abraçou e se manteve ali comigo até a música

43
acabar e eu cessar o choro. Simplesmente não vi ninguém ao meu redor, não me
importei absolutamente com nada, nem mesmo se estava me expondo. Minhas
amigas – que já sabiam tudo que eu vinha passando – se aproximaram e também
me abraçaram. Me senti muito acolhida e depois da aula o procurei para saber do
que se tratava aquele trabalho tão integrador, quando então ele me contou sobre a
Biodanza. Depois que o ouvi, simplesmente olhei pra ele e disse: “Um dia serei
professora de Biodanza.” Ele me explicou como era o processo de formação e
daquele dia em diante, eu passei a pesquisar tudo que podia, e claro, meu estado
de ânimo, depois daquela vivência, havia se transformado e eu já me sentia mais
serena e consequentemente, mais feliz. Foi depois daquela vivência, que tive
vitalidade para procurar por uma psicóloga e iniciei um processo terapêutico que me
tirou completamente daquele estado. Hoje sei que o que recebi naquela aula, foi um
bálsamo de vitalidade e afeto, que me fiz retornar à vida.

Quatro anos depois, já formada em Psicologia, participei de um congresso em


cuja programação havia uma vivência de Biodanza. Conheci Angelina Pereira.
Trocamos contatos e a partir dali, passamos a nos comunicar. Ganhei um folder que
preguei na porta do meu guarda roupa durante quatro anos, e escrevi nele uma
frase: “EU FAÇO FORMAÇÃO NA ESCOLA PAULISTA DE BIODANZA. MUITO
OBRIGADA.”

Em 2008 fui convidada por um amigo a realizar um trabalho de dois meses em


Itaipuaçu - interior do Rio de Janeiro, e acabei decidindo me mudar para lá. A
primeira coisa que fiz, foi procurar por um grupo regular de Biodanza, para
conseguir as horas de vivência, necessárias para o ingresso na escola. Ali estaria a
minha chance de realizar este sonho há muito acalentado em meu coração. Meu
processo de transformação facilitado pela Biodanza foi retomado através do grupo
regular de Maria Amélia Seixas, em Niterói. Não eram apenas as aulas que me
mobilizavam, mas todo o processo de ir às quartas-feiras para Niterói e voltar tarde
da noite para Itaipuaçu, tendo que caminhar sozinha um trajeto de quase um
quilômetro do ponto de ônibus para casa, as 23h30. Para mim, tudo era um desafio,
mas me sentia a pessoa mais feliz do mundo por estar, naquele momento,
enfrentando todos os medos para realizar o meu objetivo. Foram apenas quatro
semanas, mas eu me fortaleci a cada viagem e a cada encontro com o grupo.

44
Meu processo de formação foi facilitado em todos os níveis pela graça de Deus
que sempre me acompanha, a força de vontade e persistência que me motivam
intrinsicamente e a resiliência, que me permite vivenciar desafios e continuar
confiando num momento melhor e em minha própria força interna. Não houve um só
dia, desde que cheguei no estado do Rio de Janeiro, que não tenha recebido apoio
e carinho. Só isso já me fez ter a certeza de que estava no caminho certo, na senda
do propósito da minha alma e nada iria então me impedir. Só Deus e alguns amigos
e familiares mais íntimos sabem quantos foram os desafios enfrentados, mas que
delícia saber que tudo está bem agora.

No grupo regular em Niterói, frequentavam como alunos, Hedilane Alves


Coelho e Otton Silveira, facilitadores de Biodanza que coparticipavam do projeto da
Escola Rio-Barra, para sua primeira turma de formação que teria início em 2009. Eu
cheguei a comentar em uma roda de intimidade verbal, que tinha o objetivo de ser
facilitadora e que estava ali para obter as horas necessárias, enfim, e um dia, eles
me convidaram para uma reunião na minha futura escola para os interessados na
formação. Aceitei o convite e fui à reunião com o coração repleto de uma alegria
que não consigo expressar com palavras. Algumas semanas depois, passei por
uma entrevista com Eliana Almeida – diretora da escola – e falei sobre minha
trajetória terapêutica e de auto conhecimento, além da própria formação acadêmica
e minha paixão pela Biodanza. Ao final da entrevista, comentei que não tinha as
horas de vivência suficientes para ingressar na escola e ela me disse algo que ficou
registrado em meu coração: “A Biodanza está nas suas células. Você será admitida
nesta escola, se se comprometer a fazer parte de um grupo regular”. Me mudei para
a capital, consegui um trabalho abençoado e um lugar para morar e desde então,
minha vida nunca mais foi a mesma. A Biodanza fortaleceu a minha identidade de
um modo que nenhuma outra terapia havia feito tão rápida e efetivamente e até
hoje, o meu maior ganho, dentro deste lindo sistema, é o encontro contínuo e
crescente com minha essência profunda e com o propósito da minha alma.

Na escola e no novo grupo regular, estava indo tudo bem, meu círculo de
amizades aumentava a cada dia e eu começava a ter mais intimidade com as
pessoas, me sentindo pertencente, me tornando uma com todos. Morava em um
quarto alugado no Largo do Machado, com uma senhora que foi mãe e amiga e
pessoalmente a vida estava fluindo e me fazendo feliz.

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Já profissionalmente, o trabalho era um desafio, pois eu estava em uma função
que não tinha absolutamente nada a ver com minha formação em Psicologia, porém
como secretária daquela empresa, eu tinha contato com todos e era muito querida
por lá, criando laços também importantes para mim. Algumas pessoas que
trabalhavam comigo também foram essenciais em momentos de muito sofrimento e
angustia, que vieram no segundo semestre de 2009, quando perdi minha avó
paterna e minha tia materna em apenas dois meses, duas pessoas que eu amava
muito, das quais eu não consegui me despedir. Sem poder estar perto da família e
me sentindo muito fragilizada e vulnerável, desenvolvi um estresse agudo que me
fazia desmaiar e acordar alguma vezes no setor de “primeiros socorros” do metrô,
ou perder totalmente a noção do tempo e desligar meu computador as 15h já
entendendo que estava no meu horário de saída, ou ainda, chegar a imaginar que
estava em Poços de Caldas e não saber pra que lado ir para chegar ao trabalho
quando descia do ônibus na Avenida das Américas. Foram tempos difíceis, mas eu
venci com a ajuda da Biodanza e de meus amigos queridos, do trabalho e do grupo
regular.

Um ano depois, quando estava já em uma fase diferente, feliz, depois de pedir
demissão do trabalho maçante na empresa, começando a viver mais tranquila como
autônoma, recebendo seguro, com tempo para fazer novas conexões profissionais,
meu pai foi internado em função de um abcesso cerebral que quase o levou a óbito,
tendo passado por uma neurocirurgia delicada e alguns meses de recuperação e
reabilitação física e emocional. Voltei pra Minas para ajudar nos cuidados com ele, o
que me fez particularmente feliz, porém, sentia uma saudade imensa da minha
família psíquica, a que eu conquistei no Rio e também da minha rotina, do grupo de
Biodanza, de tudo. Foi uma grande frustração pra mim. Mesmo assim, não esmoreci
e três meses depois, quando meu pai já estava bem melhor, e eu planejava voltar
pro Rio, me mudei para São Paulo/SP, convidada para um novo trabalho como
analista de Recursos Humanos, na empresa de uma amiga de infância e diferente
do que eu imaginava, foram seis meses muito complicados e solitários. Retomei o
grupo regular imediatamente na Escola Paulista com Angelina e Marlize, e continuei
minha formação no Rio. De certa forma eu acabei – mesmo que por seis meses –
frequentado a Escola Paulista como havia decretado naquele folheto pregado no
armário por quatro anos. Aprendi muito neste grupo e com as facilitadoras, e sei

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que, apesar de toda a dificuldade que eu sabia me aguardar se eu fosse embora de
São Paulo naquele momento, o princípio Biocêntrico norteou todas as minhas
decisões de sair daquela cidade e trabalho que destoavam tão completamente da
minha essência e promoveram em mim, um quadro de Síndrome do pânico. Voltei
para a casa dos meus pais em Minas e apesar da vergonha, do medo e da culpa em
abandonar um trabalho que sustentava não apenas a mim e aos meus sonhos, mas
também minha família, eu me orgulho de ter tido a coragem de recomeçar em um
contexto muito mais orgânico pra mim. Com esta ação Biocêntrica eu estava
literalmente salvando a minha vida.

Isto aconteceu em 2011, ultimo ano da formação, e fiquei o segundo semestre


todo sem grupo regular, pois não havia nenhum por perto, e mesmo sendo um pré
requisito da escola, nossa querida Eliana compreendeu meu momento e me apoiou
em cada nova situação desafiadora que surgia, inclusive a financeira.

No ano seguinte dei início ao meu primeiro grupo regular em Poços de Caldas,
recebendo supervisão de Angelina Pereira – à distância – por um período de seis
meses. Olha mais uma vez meu vínculo com a Escola Paulista. Este grupo regular
durou aproximadamente oito meses e eu tinha oito alunas assíduas. Senti que não
estava fluindo o bastante sem frequentar aulas de um grupo regular e resolvi
encerrar em respeito a essas alunas e sua confiança em mim. Em 2013 consegui
levar para Pouso Alegre uma facilitadora de Biodanza e neste ano apenas desfrutei
como aluna, me fortaleci para em 2014, formar um grupo que já tem três anos e
cresce e se fortalece a cada semana. Este grupo é um orgulho pra mim, pois
consegui ao longo desses anos, realizar um lindo e potente trabalho e ver muitas
pessoas se integrarem e fortalecerem suas identidades, se tornarem mais afetuosas
e Biocêntricas, e o principal de tudo isto: “nós somos um”. A unidade do nosso
grupo em nível afetivo e colaborativo é incrível e percebo que isto torna todo o
processo ainda mais potente e eficaz. Estamos sempre juntos, nos reunimos para
festejar a vida e nos apoiamos mutuamente. Eu me sinto não apenas uma
facilitadora, mas uma aprendiz que floresce a cada dia através dessas lindas
pessoas que Deus me trouxe de presente. Nosso grupo recebe esporadicamente
novos alunos e as energias se reciclam, trazendo mais e mais pessoas incríveis
com suas riquezas interiores e suas contribuições maravilhosas para a vida de
todos. Me sinto a pessoa mais realizada e feliz por ser facilitadora de um sistema

47
tão integrador, fortalecedor e curativo. Me orgulho por ser Facilitadora de Biodanza
e sou grata a Deus e à vida por esta linda oportunidade. Para mim, Rolando é uma
personificação da Divindade e um canal de expressão desta energia na Terra. Deus
quis a Biodanza e presenteou Rolando através de sua genialidade e conexão.

4.2. Depoimentos de alunos do grupo regular em relação à sua evolução


facilitada pelo processo Biodanza

L. G. – Administradora de Empresa – Faz Biodanza há 1 ano e 6 meses.

“Eu conheci a Biodanza há aproximadamente um ano e meio. A princípio a


busca era somente por um método terapêutico que ajudaria nas dores físicas que
estava sentindo, porém no decorrer das aulas outras descobertas e curas foram
realizadas.

Aos poucos fui reconhecendo algumas deficiências que vivendo no


automático nunca haviam me incomodado. Junto fui descobrindo meu lado
amoroso, cúmplice, amigo e receptivo. Um brilho e amor que não lembrava mais
que tinha. É como se as aulas nos conduzissem para dentro de nós e nos
reapresentassem a quem realmente somos e havíamos esquecido. 
Cada vivencia - fala, olhar e abraço - me fortalece dentro e fora da aula a cada dia.
É simplesmente revigorante! 

A convivência mudou com minha família, meu amigos e pessoas que


trabalham comigo. Hoje sinto que estou mais atenciosa e preocupada com o outro.
Procuro sempre qualificar quem está ao meu lado. Ao mesmo tempo tenho me
olhado e respeitado mais, meus limites e desejos. Procuro estar com pessoas que
me nutrem e me fazem bem.

A Biodanza pra mim, foi um acordar para a vida e principalmente para a


alegria de viver”

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K. S. – Psicóloga – Faz Biodanza há 4 meses.

“Conheci a Biodanza durante a faculdade há mais de 20 anos. Tinha um


professor alemão que era facilitador e fazia parte do grupo semanal. Depois disto, a
não ser fazendo revisão do livro de uma amiga sobre Biodanza, nunca mais tive
contato. Retornei agora tendo a alegria de fazer parte do grupo de Ana Marcela. Há
quatro meses frequento as aulas e já sinto os benefícios: me sinto feliz interagindo
mais com a pessoas. Enquanto danço, sinto meu corpo mais flexível, me sinto mais
a vontade na dança da vida. Incrível como a Biodanza vem despertando em mim a
vontade de conhecer melhor a expressão do meu corpo e do meu ser!
Sou grata por poder participar!”

F. L. A. G. – Acadêmico (Pesquisador na área de Antropologia) – Faz Biodanza


há 1 ano e 6 meses.

“Acredito que a Biodanza encurta caminhos. Sinto que através das aulas,
permito o encontro comigo mesmo, que encontro nos pequenos instantes de
reflexão, silenciosa, entre as vivências. Durante as vivências, quando sugerido de
se entregar a um determinado movimento, sinto-me mais próximo de minhas
emoções, que afloram espontaneamente. Gosto quando consigo me emocionar,
liberando sensações de angústia, ou ‘viajando’ num pensamento que aflora, e toma
conta de uma viagem, que excita todo o corpo, e então se dissipa, pelos pés, pelas
mãos, pelo olhar, e me proporcionam o reordenamento das energias internas.

Gosto dos exercícios que exigem mais vitalidade, gasto energético. Parecem
necessários para o corpo, que geralmente se encontra cansado da corporeidade
cotidiana. Sinto que preciso de bastante dispêndio de energia Yang, para atingir
níveis mais profundos de entrega. A energia parece endurecer o corpo, enquanto
que durante uma sessão de Biodanza, descarregamos os velhos padrões, e
buscamos incorporar novas opções, de disposição de nosso pensamento, e
sentimentos, no mundo.

A Biodanza sempre me pareceu agradabilíssima. A turma que frequento é de


gente de mais idade que eu. Acredito ser o caçula, e um dos poucos homens
(somos 2). Espero poder estar sempre em contato com essa turma, que
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ocasionalmente encontro fora dos momentos de aula. Acredito no potencial das
aulas devido aos encontros que buscamos fazer além das classes. Por vezes nos
encontramos para comermos, e conversar, ou para comemorar, celebrar:
aniversários são sempre uma boa data.

Espero um dia me aprofundar em todas as linhas de vivência. Gostaria de


que mais pessoas com minha idade tivessem a oportunidade de realizar a prática.
Me parece boa para desobstruir padrões de auto-boicote, que temos engessadas
não somente no pensamento, mas no próprio corpo.

As aulas sempre dão ar de renovação para o espírito. De alguma forma nos


nutrem verdadeiramente, acho que é a amorosidade que sustenta nosso querido
grupo. Sinto-me à vontade para dar risos e expressar a alegria que sempre se
sobressai em mim – até nos momentos de interiorização, por vezes, tenho vontade
de rir, e dessa forma descubro as cores de minha própria interioridade.

A Biodanza me dá segurança, por me permitir reconhecer quem sou, e


oferecer ferramentas verdadeiras para permitir meu lançamento rumo ao que desejo
ser. Me refiro ao que desejamos, todos os dias, a nós mesmos, enquanto devires,
seres que se completam na medida em que se encontram, se vinculam, aceitam,
recebem e retribuem. Se reconstroem, assim, em cada encontro. Cada encontro
parece abrir, de fato, uma janela no inconsciente, que nos permite arejar ‘a casa’, e
fundamentar um lar, um continente interior.”

I. V. – Bioquímica e Terapeuta holística – Faz Biodanza há 2 anos.

“Faço Biodanza com a professora Ana Marcela há dois anos. Durante as


vivências de Biodanza sinto momentos de muita descontração, relaxamento,
autoconhecimento, auto regulação e equilíbrio. Aprendo a cada dia respeitar, a ter
mais carinho com as outras pessoas, não só dentro da aula, mas também fora, no
dia a dia, me tornando mais sensível e afetiva.

Está sendo muito bom participar desse grupo de Biodanza, porque estou
conseguindo me soltar mais, apesar da minha timidez. Aprendi também a dar valor
aos amigos e querê-los sempre por perto.

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Gratidão a minha professora Ana Marcela Nadur Figueiredo que está sempre
por perto dando aquele suporte para todos os nossos sentimentos e a toda turma,
ou seja, a família da Biodanza.”

R. C. C. – Contadora – Faz Biodanza há 7 meses.

“Quando conheci a Biodanza há sete meses. estava passando por um


período difícil. Tinha acabado um relacionamento de quatro anos, onde eu havia
repetido os mesmos erros do meu casamento de vinte anos. Por medo de viver
sozinha e achando que minha felicidade estava nas mãos de um parceiro, fazia de
tudo para que o relacionamento desse certo. Aceitava o pouco de atenção que me
era dispensado e engolia coisas que me faziam mal, pois não eram coisas que eu
queria, mas o medo da solidão me fazia insistir nessa parceria que era praticamente
minha. Foram quatro anos de idas e vindas e eu sempre me sujeitando às migalhas
de amor. A partir do momento que comecei a frequentar o grupo regular de
Biodanza, me senti mais forte, foi como se a mulher que estava escondida há tanto
tempo, criasse coragem para se achar e aparecer. Comecei a ver a vida com outros
olhos e sentir que sou merecedora de um amor verdadeiro, sincero e que eu tenho
que ser feliz primeiramente comigo mesma. Passei a agradecer muito mais que
pedir e voltei a ter fé na vida. Ainda tenho muito que aprender e tenho certeza que
com a Biodanza vou conseguir trilhar um caminho mais sereno, mais feliz. Gratidão
por ter me proporcionado a oportunidade de me reencontrar.”

A. O. J. M. – Servidora Pública – Faz Biodanza há 1 ano e seis meses.

“Fazer BIODANZA foi entrar em contato comigo mesma: me perceber, me


conhecer, me respeitar, me aceitar mais do jeito que eu sou.... com minhas
qualidades e limitações como todo ser humano,  me acolhendo a cada momento da
forma como me sinto, sem representações ... e assim me tornar mais amorosa e
compreensiva comigo mesma e com os outros. Me ajudou a buscar relações mais
nutritivas, percebendo relações tóxicas e me afastando delas. Permiti que a minha
criança interior se expressasse mais naturalmente em minha vida, dançando,

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brincando, sorrindo, vivendo de forma mais autêntica, com leveza, criando meu
ritmo e passo na SAGRADA DANÇA DA VIDA. A Biodanza me ajuda muito no meu
processo de crescimento. Gratidão!

M.G. – Manicure - Faz Biodanza há 3 anos.

“Falar de Biodanza é uma satisfação!  Principalmente quando se tem uma


facilitadora dedicada e tão afetuosa quanto a nossa!  

Mas, falar sobre Biodanza é falar sobre transformação, sempre para melhor,
como ser humano, autêntico, seguro de si, mais amoroso e afetuoso e mais sincero
consigo mesmo.  É se amar e amar o próximo, tudo isso, acontecendo
suavemente e às vezes nem tão suavemente, mas transformando para o melhor!  A
Biodanza é isso e muito mais na minha vida!  Gratidão a todos que se dedicam a
esse instrumento maravilhoso! 

J. T. L. – Professor - Faz Biodanza há 3 anos.

“Faço Biodanza com Marcela há três anos, sou professor. Relato que
a Biodanza veio para ficar na minha vida comigo, pois que é uma reunião onde,
além de você poder se enxergar de uma forma mais profunda e elevada, o mais
importante é que você vê os companheiros, ali, de uma forma similar a sua. Há três
grandes perguntas na Biodanza, e ela mesma conduz às respostas, com o passar
do tempo em que você continua na Biodanza; são elas: aço o que quero? Moro
onde quero? Moro com quem quero? À medida que você vai respondendo, você
também poderá tomar melhores decisões! “

S. A. L. – Fisioterapeuta e massoterapeuta – Faz Biodanza há 1 mês.

“Tenho apenas um mês de Biodanza e as pessoas que convivem comigo já


perceberam a diferença em mim, minha voz esta mais clara, meu andar mais firme e
me sinto com mais coragem de falar aquilo que penso .
Há 12 anos conheci a Biodanza. Intuitivamente eu sentia que era tudo que eu
queria. Fiquei  guardando este desejo, mas ainda não era a minha hora; as minhas
repressões, os meu recalques, os meu medos, as minhas defesas, tudo isso me

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dificultava chegar  no objetivo. As aulas, sempre colocando a falta de dinheiro e de
tempo na frente.

Venho investindo em algumas terapias de grupo e no curso do caminho do


pathwork, aprendendo que preciso liberar o meu sistema límbico, onde em meus
pensamentos era impossível, mas com a Biodanza tem horas que julgo até ter
destravado demais, pois estou briguenta, chorona e rindo até sem motivo  (estou
tentando solucionar os excessos ). Fico feliz e muito grata pelo grupo maravilhoso
que me acolhe e especialmente pela minha professora Ana Marcela.

E. M. – Comerciante – Fez Biodanza por 2 anos.

“Fiz Biodanza por dois anos, o que me ajudou em muitas coisas. Fui muito
feliz fazendo Biodanza. Um dia voltarei e a Marcela é maravilhosa.”

C. C. – Autônoma e Mãe - Fez Biodanza por 6 meses.

“Desde adolescente eu sempre fui muito apaixonada por dança, mas nunca
imaginei conhecer algo tão maravilhoso e profundo como a Biodanza. Antes eu me
sentia irritada, estressada, confusa comigo mesma, e através da Biodanza eu
passei a trabalhar com amor e acolhimento com certas questões internas, pois ela
te permite olhar para dentro de si e de uma forma amorosa, cuidar dessas
questões. Hoje eu atribuo muitas transformações ocorridas em minha vida à
Biodanza, pois foi através da expressão corporal nas vivências que eu pude me
libertar do que estava me deixando de certo modo travada na vida, não sabendo
qual caminho seguir. Hoje eu tenho mais confiança dos meus ideais e sei que tenho
potencial sim, mas que só foram trazidos á tona através da Biodanza. A Marcela é
muito especial, é minha inspiração. Que ela siga curando muitas pessoas assim
como eu com esta ferramenta potente que é a Biodanza.

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CONCLUSÃO

Pode-se concluir com este estudo, que a Biodanza é um facilitador potente de


evolução em todos os níveis, especialmente por ser um processo progressivo e
constante. Quando as mudanças e transformações ocorrem progressivamente – o
que se dá em um tempo de maturação individual e, portanto distinto para cada aluno
- este salto evolutivo do humano, que chamamos em Biodanza de Transtase, torna-
se efetivo. Os efeitos deste progresso se refletem no fortalecimento da identidade,
tornando a pessoa mais consciente de seus potenciais latentes e portanto, mais
empoderada, autoconfiante e autentica.

Outro efeito desta evolução, se dá no encantamento pela vida, quando então


nos damos conta do quanto ela é sagrada, interessante, abundante e cheia de
possibilidades. Começamos a ver e sentir a vida não com a perspectiva limitada dos
padrões e crenças antigos, mas com os sentidos de quem experimentou vivências
profundamente integradoras e pôde, a partir deste novo sentir, ressignificar sua
história e ampliar sua consciência. A vida fica boa de ser vivida, mesmo havendo
desafios a serem enfrentados.

Estabelecer novos níveis de comunicação com o entorno, buscando vínculos


mais nutritivos, também é característico de quem evolui e isto acontece rápida e
constantemente com alunos do grupo regular de Biodanza. É incrível como os
alunos trazem para a intimidade verbal, logo que começam a perceber-se mais
integrados, o quanto se sentem insatisfeitos com determinadas relações por terem
experimentado encontros vivenciais em aula, que os conscientizaram de seu valor
pessoal e do quanto desejam continuar pela vida, a realizar encontros tão especiais
ou mais que estes. É como tomar consciência de que a vida levada até ali, não era
tão plena quanto parecia e passamos a desejar mais daquilo que antes era apenas
um sonho distante e que agora sabemos ser real e possível. A reintegração consigo
mesmo deflagra um desejo profundo de ter ao redor, pessoas que possam contribuir
para a manutenção desta evolução nos concedendo uma presença afetiva, alegre,
fortalecedora, compreensiva e interessante. E não apenas isto, mas que evolua
conosco, a partir da presença igualmente altruísta e qualificadora que nos tornamos.

Eu poderia continuar este texto e ele seria infinito, se fosse para relatar os
inúmeros benefícios da Biodanza e sua contribuição para nossa evolução, porém

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deixo que os próprios relatos do capítulo anterior deponham a favor deste método
que para mim, foi uma bênção que, desde que chegou à minha vida, tem me
sustentando e me sustentará para sempre, pois foi um presente que recebi de Deus,
uma graça, uma herança vitalícia.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BATESON, G. Steps to an ecology of mind. Chicago: University of Chicago


Press, 2000 [1972].

CASTRO, Eduardo Viveiros de. A inconstância da alma selvagem. Editora


Cosac Naify, 2014.

DELEUZE, Gilles. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Editora 34, 2000.

ECO, Umberto. Abertura, informação, comunicação. Obra aberta, São Paulo,


Perspectiva, 1990.

GUATTARI, Félix. As 3 ecologias. Ed. Campinas, 1993.

INGOLD, Tim. Being alive: Essays on movement, knowledge and description.


Taylor & Francis, 2011.

LOVELOCK, J.; BATESON, G.; MARGULIS, L.; ATLAN, H.; VARELA, F.;
MATURANA, H. et al. GAIA – inplicaciones de la nueva biologia. Barcelona, Ed.
Kairós, 1989.

MATURANA, H & VARELA, F. De máquinas e Seres Vivos: autopoiese – a


organização do vivo. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

RANCIÈRE, Jacques. A partilha do sensível. São Paulo, Ed. 34, 2005.

ROGERS, C. & Kinget, M.- Psicoterapia e Relações Humanas, Interlivros, Belo


Horizonte, 1977.

ROLNIK, Suely. Esquizoanálise e antropofagia. E. Alliez. Gilles Deleuze: Uma


vida filosófica. Editora Rio de Janeiro, vol. 34, 2000.

TOMASELLO, Michael; CALL, Josep. Primate cognition. Oxford University


Press, USA, 1997.

TORO, R. Teoria da Biodança. Coletânea de textos. Fortaleza: Associação


Latino-Americana de Biodança, 1991.

WOLFF, Francis. Nossa humanidade: De Aristóteles às neurociências. São


Paul

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ANEXOS

Início de Tudo: Primeira aula aberta em Primeiro Grupo Regular em Poços de


Poços de Calda Caldas – 2012

Aula Aberta Poços de Caldas 2015


Grupo Regular de Pouso Alegre 2015

Festividade Haloween 2015 Maratona Árvore dos Desejos - 2015

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Confraternização Reveillon 2015 Confraternização

Maratona Despertar da Deusa 2016


Maratona Despertar da Deusa 2016

Grupo de Formação da Escola de Biodanza


Confraternização – 2011

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