You are on page 1of 106

lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Aula dia 03 de março de 2020

Bibliografia:

— A ação executiva à luz do Código de Processo Civil de 2013, Lebre de Freitas, 7.ª ed., 2017,
Gestlegal

— Curso de Processo Executivo à face do Código Revisto, Remédio Marques, Coimbra, Almedina, 2000

I. PARTE GERAL

1. Delimitação do conceito de ação executiva (artigo 10.º/4 CPC)

No esquema do direito processual civil, há duas espécies de ações (artigo 10.º/1 do


CPC):

1. AÇÃO DECLARATIVA: Pode ser (artigo 10.º/2 do CPC):

- De simples apreciação (artigo 10.º/3/a) do CPC): É pedido ao tribunal que declare a


existência ou inexistência de um direito ou dum facto jurídico.

- De condenação (artigo 10.º/3/b) do CPC): Sem prejuízo de o tribunal dever ainda


emitir aquele juízo declarativo, dele se pretende também (e fundamentalmente) que, em sua
consequência, condene o réu numa prestação duma coisa ou de um facto.

- Constitutiva (artigo 10.º/3/c) do CPC): O juiz, perante o exercício judicial dum direito
dum direito potestativo, cria novas situações jurídicas entre as partes, constituindo,
impedindo, modificando ou extinguindo direitos e deveres que, embora fundados em
situações jurídicas anteriores, só nascem com a própria sentença.

2. AÇÃO EXECUTIVA (artigo 10.º/4 do CPC): Com base num critério funcional ou

teleológico, são as ações em que o credor requer as providências adequadas(*) à


realização coativa de uma obrigação que lhe é devida por um devedor. Se é uma
realização coativa, significa que não se busca uma sentença condenatória, procura-se
antes realizar (tornar efetiva(o)) na prática uma pretensão material ou o bem jurídico que
ainda não foi alcançado pelo credor — realizar coativamente uma obrigação/um dever
de prestar que ainda não foi cumprido/satisfeito voluntariamente —, ainda que para isso
se tenha de recorrer à força pública (à violência legítima do Estado).

(*) O que são providências adequadas?


Na execução para pagamento de quantia certa, a penhora e posterior venda dos bens
do devedor e a entrega do dinheiro (produto da venda) ao credor. Na execução para
entrega de coisa certa, a localização e identificação da coisa, sua apreensão e
investidura na posse do credor da coisa. Na execução para prestação de facto, a

Filipa R. G. 1

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


fixação de uma sanção pecuniária compulsória. Há mais providências adequadas, mas,
tal como o sistema de ação executiva está organizado em Portugal, essas outras não
são praticáveis, por força da ação executiva ser desjudicializada (ponto 4.). Fala-se de
providências adequadas que passam por medidas que tentem coagir/constranger o
devedor a cumprir voluntariamente, p. ex., inibição da utilização da carta de condução,
inibição de utilização o passaporte, inibição de utilização de cartões de crédito, etc. Em
Portugal, isto não pode acontecer, porque quem pratica atos executivos não são os
juizes, são os agentes de execução e essas medidas só poderiam ser praticadas pelos
juizes (princípio da reserva de juiz).

Podem ser objeto de ação executiva:

- Obrigações pecuniária: Obrigações de pagamento de quantia certa em moeda


com curso legal.

Nos termos do artigo 817.º do CC, não sendo a obrigação voluntariamente


cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de
executar o património do devedor, nos termos declarados neste código e nas leis de
processo — o cumprimento coercitivo das obrigações não é feito através do corpo
do devedor, a execução coativa das obrigações faz-se antes através do património
dos devedores e, às vezes, de terceiros (não devedores), à luz do artigo 818.º do
CC. P. ex., celebração com um banco de um contrato de mútuo, com a garantia de uma
hipoteca constituída sobre bens dos pais do mutuário (terceiros não devedores). Se o
mutuário não pagar ao banco, o banco tem um documento que faz presumir a existência da
obrigação de pagar o capital e o juros e que não houve pagamento voluntário e o banco
ajuíza uma ação executiva e faz apreender o bem dado em garantia. O Estado apreende
os bens do património do devedor ou de terceiro, faz-os vender e com produto da
venda dos bens paga aos credores.

- Obrigações de entrega de coisas certas, sejam coisas corpóreas (móveis ou


imóveis), seja coisas incorpóreas, com lastro corpóreo de bens (p. ex.,
estabelecimento comercial ou industrial).

O Estado apreende as coisas e entrega-as ao credor delas - instituí na posse o


credor delas.

O credor não é necessariamente o proprietário, pode ser credor de entrega da


coisa a título de propriedade, a título de um direito real de gozo (usufrutuário,
superficiário, uso e habitação, habitação periódica, titular de servidão predial) e a título de
um direito pessoal de gozo (locatário - arrendamento de coisas imóveis ou aluguer de
coisas móveis -, depositário, comodatário, parceiro pensador - contrato de parceria
pecuária).

Filipa R. G. 2

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


- Obrigações de facto positivas (fazer) e negativas (não fazer, p. ex., obrigação de
não concorrência): Só aquelas obrigações (em regra, apenas de conteúdo patrimonial) de
fazer ou de não fazer que o direito protege e que permitem a sua realização coativa.

2. Tipos de ação executiva

Resulta do artigo 10.º/6 do CPC a existência de 3 tipos de ação executiva: para pagamento
de quantia certa, para entrega de coisa certa e para prestação de facto.

2.1 Execução para pagamento de quantia certa

O credor/exequente pretende obter o cumprimento duma quantia pecuniária através da


execução do património do devedor/executado (artigo 817.º do CC). Para tanto, apreendidos
pelo tribunal os bens deste que forem considerados suficientes para cobrir a importância da
dívida e das custas, tem lugar, normalmente, a venda desses bens a fim de, com o preço obtido,
se proceder ao pagamento.

2.2. Execução para entrega de coisa certa (artigo 859.º e ss. do CPC)

O exequente, titular do direito à prestação duma coisa determinada, pretende que o tribunal
apreenda essa coisa ao devedor/executado e seguidamente lha entregue (artigo 827.º do
CC), após o que o órgão de execução irá tentar identificar e localizar a coisa.

— Identificando e localizando a coisa, o órgão de execução apreende a coisa/bem e


entrega-o ao exequente - investe o exequente na posse desse bem (artigo 861.º do CPC):

• Tratando-se de coisa móvel, agente de execução manda fazer, na sua presença,


as operações indispensáveis - podendo ter o auxílio dos órgãos de polícia
criminal (GNR e PSP) - e entrega ao exequente a quantidade devida (n.º 2).

• Tratando-se de coisa imóvel, o agente de execução investe o exequente na


posse, entregando-lhe os documentos e as chaves, se os houver, e notifica o
executado, os arrendatários e quaisquer detentores para que respeitem e
reconheçam o direito do exequente (n.º 3).

— Se a coisa não for identificada e localizada, porque se perdeu, foi destruída ou foi
expropriada por utilidade pública (artigo 823.º do CC e 867.º do CPC):

• No caso de expropriação: O credor dá lugar a indemnização a pagar por


terceiro. A ação executiva era para apreender a coisa, mas como não se pode
apreender a coisa, porque o direito de propriedade sobre ela se extinguiu e
surgiu um novo direito a favor de quem a expropriação foi feita, o exequente não

Filipa R. G. 3

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


vai ter direito à coisa, mas vai ter direito ao dinheiro — a execução converte-se
numa execução para pagamento de quantia certa.

• No caso de destruição:

- Tem de ver se há algum seguro (p. ex., no caso de destruição por incêndio,
tem de se ver se há algum seguro que cubra o risco de incêndio). Se houver
seguro, o direito à coisa é sub-rogado pelo direito à quantia pecuniária a
pagar pela companhia de seguros. Se a seguradora não pagar
voluntariamente, a execução, que se iniciou como entrega de coisa certa,
tem que se converter em execução para pagamento de quantia certa.

- Quando a coisa foi destruída por ato voluntário do executado, pode-se


quantificar os danos, tendo o exequente direito uma indemnização, que
abarca os danos emergentes e lucros cessantes decorrentes dessa
destruição. Assim, a execução, que começou como entrega de coisa
certa, transforma-se em execução para pagamento quantia certa, após
fixada, com contraditório, a quantia pelo juiz. Se o executado não pagar
essa quantia, penhora-se o património desse executado, e ao fazê-lo faz-
se vender esse património e com o produto da venda faz-se pagar a
indemnização quantificada pelo juiz.

2.3. Execução para prestação de facto (positivo ou negativo) (artigo 868.º e ss. do CPC)

Em caso de execução para prestação de facto positivo e sendo a prestação fungível (p.
ex., o devedor obrigou-se por contrato ou está condenado numa sentença que o condenou ao facto
positivo de fazer uma obra corpórea), o exequente tem duas alternativas:

1. Nos termos do artigo 871.º/1 do CPC, mesmo antes de terminada a avaliação ou a


execução regulada no artigo anterior, pode o exequente fazer, ou mandar fazer sob a
sua orientação e vigilância, as obras e trabalhos necessários para a prestação do
facto, com a obrigação de prestar contas - do que gastou - ao juiz do processo, tendo
essas contas de ser objeto de contraditório. A seguir ao contraditório, o juiz manda
fazer prova, pois ele tem de formar uma convicção sobre o que era razoável ter sido
gasto, para aprovar parcial ou totalmente as contas apresentadas pelo exequente. Uma
vez aprovadas as contas, se o executado não pagar ao exequente, a ação executiva
tem de se converter em execução para pagamento de quantia certa: o órgão executivo
vai localizar, identificar e penhorar bens do património do executado, para esses bens
penhorados serem vendidos e com o produto da venda pagar ao exequente.

2. Nos termos do artigo 870.º/1 do CPC e do artigo 828.º do CC, o exequente pode
optar pela prestação do facto por outrem, requerendo a nomeação de perito que
avalie o custo da prestação. Concluída a avaliação, que é objeto de contraditório, o juiz

Filipa R. G. 4

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


terá de fixar o custo. Fixado o custo, se o executado não paga o montante, esta
execução converte-se em execução para pagamento de quantia certa, penhorando-se
bens no património do executado, para os vender e com o produto da venda dos bens
obtém-se dinheiro para pagar a prestação do outrem que vai efetuar essa prestação de
facto fungível (n.º 2).

Em caso de execução para prestação de facto positivo e sendo a prestação infungível (o


dever de prestar o facto é incindivelmente ligado à pessoa do devedor), não sendo possível
obrigar o devedor à execução da prestação de facto positivo infungível, o exequente terá de
intentar uma ação executiva e, no requerimento executivo, narra os factos subjacentes aos danos
(danos emergentes e lucros cessantes) que sofre com a não prestação e formula o pedido
indemnizatório, havendo lugar a contraditório. Além da indemnização a que o exequente tenha
direito e da indemnização pela mora, pode requerer o pagamento da quantia devida a título de
sanção pecuniária compulsória (artigo 868.º/parte final do CPC). Se o juiz entender que há
motivo para indemnizar, ele fixa o montante da indemnização (com contraditório), concordando
total ou parcialmente com os valores apresentados pelo exequente no requerimento executivo.
Assim, a execução para prestação de facto positivo infungível converte-se numa execução para
pagamento de quantia certa, para penhorar do património do devedor bens suficientes para os
fazer vender para com o seu produto pagar o montante indemnizatório fixado pelo juiz.

Em caso de execução para prestação de facto negativo, por violação de um dever de


omissão, o exequente, consoante os casos, pedirá a demolição da obra que porventura tenha
sido efetuada pelo devedor, à custa deste, assim como a indemnização do prejuízo sofrido
ou uma indemnização compensatória (artigos 929.º do CC e 876.º do CPC).

As prestação de facto negativo são, por natureza, infungíveis, mas a obrigação de demolir é
uma obrigação de prestação de facto fungível.

3. Função da ação executiva

I. A ação executiva pressupõe sempre o dever de realização duma prestação;

II. Através da ação executiva, o exequente visa reparar um direito violado;

III. Através da ação executiva, o exequente pode obter resultado idêntico ao da


realização da própria prestação que lhe é devida (execução específica), quer por meio direto
(apreensão e entrega da coisa ou quantia devida), quer por meio indireto (apreensão e venda dos
bens do devedor e subsequente pagamento), ou, em sua substituição, um valor equivalente do
património do devedor (execução por equivalente);

VI. O tipo de ação executiva é sempre determinado em face do título executivo,


consoante deste conste uma obrigação pecuniária, uma obrigação de prestação de coisa ou uma
obrigação de prestação de facto;

Filipa R. G. 5

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


V. A satisfação do credor na ação executiva é conseguida mediante a substituição do
tribunal ao devedor. Porque este não efetuou voluntariamente a prestação devida, ou não
procedeu à demolição da obra que não podia ter feito, o tribunal procede à apreensão dos bens
para, em substituição do devedor, pagar ao credor, ou para conseguir meios que permitam
custear a prestação, por terceiros em vez do devedor, do facto por este devido.

4. A relevância dos princípios processuais na ação executiva propriamente dita

A ação executiva pressupõe a prévia solução da dúvida sobre a existência e a configuração do


direito exequendo. A declaração ou acertamento (dum direito ou de outra situação jurídica; dum facto),
que é o ponto de chegada da ação declarativa, constitui, na ação executiva, o ponto de partida.
Esta constatação leva a concluir que o processo executivo, ainda que estruturalmente autónomo,
se coordena com o processo declarativo no ponto de vista funcional, sempre que por ele é
precedido; nem sempre, porém, tal precedência se verifica e, quando o título executivo não é
uma sentença, cessa esta coordenação funcional dos dois tipos de processo.

Mas, em qualquer caso, no processo executivo, enquanto tal, que visa a satisfação do direito
de umas das partes contra a outra, os princípios da igualdade de armas (artigo 4.º do CPC) e
do contraditório (artigo 3.º/3 e 4) não têm o mesmo alcance que no processo declarativo:

➡ O princípio da igualdade de armas:

- Exige o equilíbrio entre as partes na apresentação das respetivas teses, na


perspetiva dos meios processuais de que para o efeito dispõem;

- Implica a identidade dos direitos processuais das partes e a sua sujeição a ónus e
cominações idênticos, sempre que a sua posição no processo é equiparável e um
jogo de compensações, gerador do equilíbrio global do processo, quando a
desigualdade objetiva intrínseca de certas posições processuais, não permitindo a
identidade formal absoluta dos meios processuais, leve a atribuir a uma parte
meios processuais particulares não atribuíveis à outra.

➡ O princípio do contraditório, que não se confunde com o direito de defesa (artigo 3.º/1
do CPC), implica que:

- O jogo de ataque e resposta em que consistem a ação e a defesa deve ser


observado ao longo de todo o processo, de tal modo que qualquer posição tomada
por uma parte deve ser comunicada à contraparte para que esta possa responder;

- Às partes deve ser fornecida, ao longo do processo, a possibilidade de influírem em


todos os elementos que se encontrem em efetiva ligação com o objeto da causa e
em qualquer fase do processo se pressinta serem potencialmente relevantes para a
decisão.

Filipa R. G. 6

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Ambos estes princípios, manifestação do princípio mais geral da igualdade das partes,
que implica a paridade simétrica das suas posições em face do tribunal, são hoje tidos como
fundamentos, diretamente decorrentes do direito constitucional de acesso à justiça e como tal de
absoluta observância no processo civil de tipo contencioso. Mas a circunstância de no processo
executivo estar apenas em causa a atuação da garantia de um direito subjetivo pré-definido
leva a que:

1. O executado não goze de paridade de posição com o exequente;

2. A participação do executado no processo se circunscreva no âmbito da substituição


dos bens penhoráveis ou duma eventual indicação de bens a penhorar, de audição
sobre a modalidade da venda e o valor-base dos bens a vender e do controlo da
regularidade ou legalidade dos atos do processo;

3. O direito do executado à contradição seja fundamentalmente assegurado ex post,


através:

• Da possibilidade de oposição aos atos executivos já praticados; ou

• Da oposição à execução, que constitui uma ação declarativa estruturalmente


autónoma relativamente ao processo executivo.

Sem que os princípios da igualdade de armas e do contraditório deixem de ser observados


no processo executivo, o primeiro circunscreve a sua atuação ao uso dos meios técnicos gerais
do processo civil e o segundo só ocasionalmente apresentará a estrutura dialética que tem no
processo declarativo, podendo dizer-se que a igualdade das partes é, no processo executivo,
meramente formal.

5. Os diferentes modelos de desjudicialização

Existem diferentes modelos de ação executiva:

• Modelo totalmente judicializado, em que os atos materialmente administrativos são


ordenados e mandados praticar pelo juiz - era caso português, até setembro de 2003.

• Modelo desjudicializado:

- A prática de atos executivos é exercida por órgãos de polícia criminal - é o caso dos
E.U.A.;

- A prática de atos executivos é exercida por funcionários públicos, não do Ministério


da Justiça, mas do Ministério da Economia - típico dos países do norte da Europa;

- A prática de atos executivos é exercida por agentes de execução, que são


funcionários de nomeação oficial - típico de outros países da Europa, como França,
Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Grécia, Hungria e Polónia;

- A prática de atos executivos é exercida por agentes de execução, que exercem


simultaneamente funções como funcionários públicos e como profissionais liberais,

Filipa R. G. 7

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


em atenção à natureza dos atos executivos e das espécies de execução - Alemanha
e Áustria.

- A prática de atos executivos é exercida pelo Serviço Público de Cobrança Forçada,


que é um organismo administrativo - Suécia.

A ação executiva propriamente dita é uma sequência de atos e operações, sobretudo jurídicas
e materiais (citações, notificações, identificação e localização de bens suscetíveis de apreensão,
publicações, administração de bens penhorados, vendas, pagamentos, registos de penhora, cancelamento
de registos de penhora, passagens de títulos de transmissão de bens penhorados), que não carecem de
promoção do juiz, uma vez que são atos materialmente administrativos. Estes atos são
praticados, no caso português, pelo agente de execução.

Portugal adotou o modelo francês do policie de justice: quem pratica os atos executivos não é
o juiz (só em casos excecionais, previstos na lei), é o agente de execução — profissional liberal
(não é funcionário público), com licenciatura em Direito, que, após concurso público nacional e
aprovação em exame, frequenta um estágio para agente de execução e, depois de aprovado
nesse estágio, é investido nestas funções pelo Ministro da Justiça.

6. A repartição funcional de atos entre o agente de execução e o juiz

Nos termos do artigo 719.º/1 do CPC, cabe ao agente de execução efetuar todas as
diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da
competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de
bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos — ou seja, se nenhuma
norma disser expressamente que um determinado ato é da competência do juiz ou da secretaria,
quem o pratica é o agente de execução (em nome do tribunal), sem prejuízo da possibilidade de
reclamação para o juiz dos atos ou omissões por ele praticadas (artigo 723.º/1/c) do CPC).

Nos termos do artigo 723.º/1 do CP, é da competência do juiz:

a) Proferir despacho liminar, quando deva ter lugar - controlo prévio aos atos executivos
(artigo 726.º do CPC);

b) Julgar a oposição à execução e à penhora, bem como verificar e graduar os créditos,


no prazo máximo de três meses contados da oposição ou reclamação;

c) Julgar, sem possibilidade de recurso, as reclamações de atos e impugnações de


decisões do agente de execução, no prazo de 10 dias;

d) Decidir outras questões suscitadas pelo agente de execução, pelas partes ou por
terceiros intervenientes, no prazo de cinco dias.

É ainda da sua competência:

• Garantir a promoção de direitos fundamentais ou matéria sigilosa (artigos 738.º/6,

Filipa R. G. 8

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


749.º/7, 757.º, 764.º/4 e 767.º/1 do CPC);

• Assegurar a realização dos fins da execução (artigos 759.º, 773.º/6, 782.º/2, 3 e 4,


814.º/1, 820.º/2, 829.º/1 e 2 e 833.º/2 do CPC).

Desta enumeração resulta que a competência do juiz para a prática de atos executivos é
residual, não se atribuindo a ele competência direta de para praticar tais atos.

De acordo com o princípio da separação de poderes, à função jurisdicional (aos juízes)


cabe apreciar e julgar conflitos de interesses. O que significa ouvir as narrações sobre factos
em relação às quais as partes têm posições diferentes e julgar provados ou não provados os
factos controvertidos, formando uma convicção subjetiva à luz de meios de prova. Depois de
formar esta convicção, fazem as qualificações jurídicas pertinentes e posteriormente decidem
(condenando ou absolvendo ou modificando, constituindo ou extinguindo situações jurídicas).

Atos executivos como citações, notificações, identificação de bens penhoráveis nas bases de
dados, penhora dos bens, registo de penhora, publicitação no site dos bens penhorados a
vender, a venda dos bens, o recebimento do preço, a passagem do título que comprova que o
comprador é o dono desse bem, etc., não envolvem a apreciação de factos controvertidos, nem
posições factuais diferentes, nem qualificações jurídicas, nem condenações, nem decisões que
modificam, extinguem ou fazem nascer relações jurídicas. Então, nenhum destes atos integra o
núcleo da função jurisdicional. Portanto, os Parlamentos (a função legislativa) têm
discricionaridade legislativa para instituirem um sistema de ação executiva deste tipo, sem violar
o princípio da separação de poderes ou o princípio da reserva de juiz.

7. A ação executiva propriamente dita e as ações declarativas que correm por apenso e
os incidentes declarativos que dela são dependentes - as normas substantivas e as normas
processuais relevantes

Numa ação executiva, o juiz é o personagem que aprecia as questões que só juízes podem
apreciar, que são questões típicas da função jurisdicional na ação executiva. P. ex., o executado
pode alegar uma exceção peremptória (pagamento de terceiro que libera o devedor); será perante o juiz
que cabe suscitar esta questão e que cabe o contraditório e será ele a decidir se uma execução está bem
feita. Aqui já há narrativas diferentes e quem tem de apurar qual a verdadeira, do ponto de vista da verdade
processual, é o juiz.

Assim, é ao juiz que cabe todo um conjunto de ações declarativas (que correm por apenso)
e incidentes de natureza declarativa (enxertados na tramitação do processo executivo), que
são instrumentais à ação executiva (são estruturalmente autónomos, embora funcionalmente
subordinados ao processo executivo) e que normalmente ocorrem na pendência dessa ação.
Ações e incidentes esses onde o executado ou terceiros defendem bens ou direitos subjetivos
que estão a ser indevidamente atingidos.

Filipa R. G. 9

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Exemplos de ações declarativas que correm por apenso: embargos de executado, embargos de
terceiro, oposição, verificação e graduação de créditos.

Exemplos de incidentes declarativos que são dependentes da ação executiva: oposição à penhora,
liquidação não dependente de simples cálculo aritmético, comunicabilidade da dívida conjugal constante
de título extrajudicial à pessoa do outro cônjuge.

O processo executivo visa um resultado de direito substantivo: a satisfação do direito do


exequente. Neste sentido, cabe ao direito substantivo:

• Determinar os efeitos de natureza real dos atos executivos e a sua articulação com
eventuais direitos de terceiros sobre os bens apreendidos (cf. as disposições dos artigos
819.º a 826.º do CC);

• A prévia definição dos regimes de responsabilidade patrimonial e de sujeição


(sujeitabilidade) à execução dos bens objeto de garantia real e de obrigação de prestação
de coisa certa, bem como da exequibilidade intrínseca da pretensão (cf. as normas gerais
dos artigos 817.º, 818.º, 827.º a 829.º, 400.º/2, 548.º e 777.º/2 e 3 do CC);

• A criação de medidas que visam a coação indireta do devedor ao cumprimento de


obrigações impostas, mas insuscetíveis de execução específica (artigo 829.º-A do CC).

Para além destes grupos de normas, há um conjunto de normas que respeitam aos
pressupostos processuais da ação executiva e à sua tramitação, as quais constam da lei de
processo.

Aula dia 17 de março de 2020

8. Pressupostos processuais da ação executiva: pressupostos gerais e pressupostos


específicos

No domínio de uma ação declarativa, o conceito de pressuposto processual traduz-se em


todas aquelas condições formais, de natureza processual, de cuja verificação depende o
conhecimento do mérito da causa.

8.1. Pressupostos gerais

Na ação executiva, há pressupostos gerais que não têm qualquer especialidade em relação
à ação declarativa: é o caso da capacidade judiciária, da personalidade judiciária, da
representação em juízo e da sujeição à jurisdição portuguesa. Por essa razão, não são objeto de
estudo nesta disciplina, até porque já foram lecionados em DPCI.

Em todo o caso, há pressupostos gerais que não gozam de um regime jurídico idêntico ao
regime previsto para as ações declarativas, ou seja, têm um regime diferente: é o caso da

Filipa R. G. 10

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


competência internacional e interna, da legitimidade processual, do patrocínio judiciário e o do
interesse processual. Por essa razão, são objeto de estudo nesta disciplina.

Na ação executiva propriamente dita, os pressupostos processuais gerais traduzem-se


naquelas condições de natureza formal para que, uma vez verificadas e só quando estiverem
verificadas, os atos executivos possam prosseguir.

8.1.1. Competência do tribunal

8.1.1.1. Competência internacional

Segundo o artigo 59.º do CPC, na ação declarativa, os tribunais portugueses são


internacionalmente competentes, sem prejuízo do que se encontre estabelecido em
regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais (tratados e convenções
internacionais), quando:

1. Se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º;

2. As partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94.º — haja uma
estipulação contratual que prive um tribunal e atribua a competência a outro tribunal, ou
seja, sem prejuízo de poder haver pactos de competência, pactos atributivos ou pactos
privativos de competência.

A grande dúvida que divide a doutrina é saber se os critérios gerais de atribuição de


competência internacional previstos no artigo 62.º do CPC se aplicam às ações executivas
e se existe algum regulamento da União Europeia que possa afastar, no âmbito da ação
executiva, os artigos 62.º e 63.º do CPC, que são as normas relativamente à atribuição de
competência internacional.

No Regulamento UE 1215/2012 (relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à


execução de decisões em matéria civil e comercial), sobretudo nos artigos 39.º e ss., não se
encontra nenhum critério atributivo de competência internacional, no quadro das ações
executivas. Ainda o artigo 24.º/5 deste regulamento, sobre a competência internacional direta e
exclusiva dos tribunais Estados-Membros, traduz a ideia segundo a qual, em matéria de
execução de decisões, têm competência exclusiva os tribunais do Estado-Membro do lugar de
execução.

Na Convenção de Lugano (relativa à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução


de decisões em matéria civil e comercia), onde todos os Estados-Membros da UE são Estados
contratantes, bem como Estados não membros, como é o caso da Noruega, Islândia,
Lichtenstein e Suíça, também não escrutinamos qualquer norma atributiva de competência
internacional direta para as ações executivas, apenas se refere que uma ação executiva deve
tramitar no lugar da execução.

Filipa R. G. 11

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Pode-se concluir que o legislador da UE não quis definir um critério claro para o lugar da
execução. O DOUTOR REMÉDIO MARQUES julga que tal foi propositado, visto que tal já decorria no
quadro da Convenção de Bruxelas de 1968. O legislador da UE nunca quis definir, com normas
vinculativas para todos os Estado-Membros, o lugar da execução, deixando isso para o critério
de cada Estado-Membro. Portanto, a competência internacional é, assim, reenviada para o
disposto nos Códigos de Processo Civil dos Estados-Membros.

No caso do CPC português, vamos encontrar este reenvio intencional no artigo 63.º/d) que
traduz o afloramento de uma regra geral commumente aceita pela maioria da doutrina e
propositadamente desejada pelos então legisladores da Convenção de Bruxelas de 1968.

O artigo 63.º respeita à competência exclusiva dos tribunais portugueses para os litígios aí
mencionados e para os quais nenhum outro tribunal poderá ter competência. O que significa que,
se algum outro tribunal se arrogar da competência para apreciar essas matérias, qualquer
decisão proferida por esse outro tribunal não será reconhecida em Portugal e não será
executável. O mesmo acontecerá, visto que esta norma é bilaterizável, quando algum tribunal
português se arrogar da competência para apreciar uma matéria à qual o CPC de outro Estado-
membro atribua competência exclusiva aos tribunais desse mesmo Estado-membro.

A alínea d) do artigo 63.º diz o seguinte que os tribunais portugueses são exclusivamente
competentes em matéria de execuções sobre imóveis situados em território português. A regra
geral que daqui aflora é a de que: se e quando bens ou direitos penhoráveis ou a apreender
estejam localizados num determinado território soberano estadual, serão os tribunais desse
Estado os exclusivamente competentes para neles tramitarem as respetivas ações executivas
(sejam ações executivas para pagamento de quantia certa, sejam ações executivas para entrega de coisa
certa, sejam ações executivas para prestação de facto convertidas em ações executivas para pagamento
de quantia certa em que haja necessidade de se efetuarem penhoras).

Posto isto, para esta doutrina maioritária, os tribunais portugueses só são internacio-
nalmente competentes para nele tramitarem ações executivas quando os bens ou direitos a
atingir (penhora ou apreensão) se localizem em território português.

Contudo, há uma outra posição doutrinária, com menor expressão e cuja praticabilidade é
de difícil realização, que é aquela de harmonia com a qual o artigo 62.º do CPC, que trata em
geral dos critérios de competência internacional direta dos tribunais portugueses, se aplica tanto
às ações declarativas como às ações executivas. Sendo assim, para esta outra posição, aplicar-
se-ia o:

• Artigo 62.º/a) do CPC (ao abrigo do princípio da coincidência), segundo o qual os


tribunais portugueses são competentes quando a ação possa ser proposta em tribunal
português segundo as regras de competência territoriais estabelecidas na lei portuguesa
(artigos 70.º e ss. do CPC), não obstante não existirem bens ou direitos penhoráveis ou
apreendíveis em Portugal;

Filipa R. G. 12

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


• Artigo 62.º/b) do CPC (ao abrigo do princípio da causalidade), segundo o qual os
tribunais portugueses são competentes quando tiver sido praticado em território
português o facto que serve de causa de pedir na ação ou algum dos factos que a
integram, não obstante não existirem bens ou direitos penhoráveis em Portugal.

• Artigo 62.º/c) do CPC (ao abrigo do princípio da necessidade), segundo o qual os


tribunais portugueses são competentes quando o direito invocado não possa tornar-se
efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o
autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o
objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão,
pessoal ou real.

Embora possamos mobilizar o artigo 62.º do CPC, ele é praticamente inexercitável:

1. Se assim fosse, se não existissem bens ou direitos penhoráveis em Portugal, todos os


atos executivos propriamente ditos, bem como as ações declarativas e incidentes de
natureza declarativa, decorreriam no estrangeiro.

Teoricamente, o juiz português teria que, mediante sucessivas cartas rogatórias, pedir
aos juizes estrangeiros dos tribunais dos locais onde existissem bens penhoráveis a
prática de todos os atos executivos (não apenas a identificação e localização, mas também a
efetiva penhora, o depósito dos bens penhorados, a prática de atos específicos de
administração de bens penhoráveis, a publicitação da venda dos bens penhorados, a venda dos
bens penhorados, o recebimento dos pagamentos e a transferência dos valores para Portugal).
Só dizer isto leva-nos a concluir que tal não é praticável, porque o mecanismo das
cartas rogatórias apenas traduz um pedido de um juiz de um Estado para que outro juiz
de outro Estado pratique atos processuais nesse mesmo Estado, não é uma ordem.
Uma vez que não é uma ordem, o juiz do Estado em cujo território se pede a prática de
atos processuais não é obrigado a cumprir, ele tem discricionariedade judicial para, à
luz das regras processuais pré-existentes nesse outro Estado, não cumprir.

2. Sendo penhorado um bem no estrangeiro, ao abrigo de uma ação executiva a decorrer


em Portugal, se sobre esse bem existir um direito incompatível de um terceiro, poderá
haver embargos de terceiro, ou seja, uma ação declarativa para defender o seu direito
subjetivo que entende incompatível com o ato de apreensão. O problema é o se saber
onde é que essa ação declarativa de embargos de terceiro tramitaria.

À luz do Regulamento 1215/2012, as ações declarativas e os incidentes de natureza


declarativa teriam que tramitar por apenso nos autos da ação executiva, que são autos
separados, mas fisicamente juntos.

Assim, se um juiz estrangeiro, confrontado com embargos de terceiro de uma penhora


que fez a pedido de um juiz português, pudesse admitir a tramitação nesse país de

Filipa R. G. 13

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


embargos de terceiros, à luz das regras processuais desse mesmo país, não tramitados
por apenso à ação executiva onde a penhora tinha sido ordenada, tal originaria uma
grande confusão, para além de que se ficava dependente das regras processuais
estrangeiras em vigor nos países em que existissem bens ou direitos penhoráveis.

Daí a orientação segundo a qual os tribunais portugueses apenas serão competentes para
neles tramitarem ações executivas se e quando os bens a penhorar estiverem localizados em
Portugal - artigo 63º/d) do CPC e do artigo 24º/5 do Regulamento 1215/2012.

Portanto, em regra, o artigo 62.º do CPC deverá ser usado para determinar a competência
dos tribunais portugueses apenas para as ações declarativas.

Quando o juiz português se declara internacionalmente incompetente para uma ação


executiva que no seu juízo foi proposta, a consequência da falta deste pressuposto
processual, gera a incompetência absoluta - artigo 96.º/a)/parte final do CPC.

Tal vai ter consequências na tramitação da ação executiva de pagamento de quantia


certa:

➡FORMA DE PROCESSO SUMÁRIO (artigo 855.º do CPC) - É a tramitação da maioria das


ações de pagamento para quantia certa. Não há lugar, em regra, a despacho liminar do
juiz (não há esse momento inicial em que o juiz controla os pressupostos processuais gerais e
específicos a partir do requerimento executivo) e o requerimento executivo é enviado ao
agente de execução (n.º 1) que:

- (Em regra) Inicia as diligências destinadas a identificar e a localizar bens


penhoráveis; ou

- Se desconfiar da não verificação de algum dos pressupostos processuais, abster-


se-á de iniciar as diligências executivas propriamente ditas, devendo suscitar a
intervenção o juiz (artigo 723.º/1/d) do CPC), para este analisar a falta da
verificação dos pressupostos processuais, sejam eles específicos ou gerais (n.º 2/
b).

Se o juiz concluir pela verificação da incompetência internacional, dá-se a


absolvição do executado da instância e a ação executiva terminará logo no
início.

O juiz não pode remeter o processo para o tribunal estrangeiro que ele entenda
competente, até porque poderia acontecer que esse tribunal estrangeiro não
aceitasse essa competência e aí teríamos uma negação bilateral de competência.

No domínio das ações declarativas, a incompetência internacional dos tribunais


portugueses determina a absolvição do réu da instância, a não ser que houvesse uma

Filipa R. G. 14

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


convenção ou um tratado internacional em que um dos países aderentes fosse o Estado em
relação ao qual o juiz português dissesse que era competente e esse juiz tivesse que
apreciar a sua própria competência internacional. Não havendo nenhuma convenção
internacional ou tratado entre Portugal e outro Estado que permita esta cooperação
judiciária internacional, o juiz português não deve e nem pode enviar o processo para o
tribunal que entenda competente.

➡FORMA DE PROCESSO ORDINÁRIO (artigo 726.º do CPC): O requerimento executivo

(que é enviado para o juiz automaticamente pela secretaria) é previamente analisado


pelo juiz da execução, que verificará a ocorrência de exceções dilatórias (supríveis ou
não supríveis), ao abrigo do artigo 726.º/2, 3 e 4 do CPP.

Se o juiz concluir pela verificação da incompetência internacional (exceção dilatória


insuprível), o juiz indefere liminarmente o requerimento executivo.

No caso de os tribunais portugueses serem internacionalmente incompetentes, mas


nem o juiz (no processo ordinário), nem o agente de execução (processo sumário) se
aperceberam deste vício, caberá ao executado defender-se, deduzindo oposição a esta
execução com fundamento na incompetência internacional dos tribunais portugueses. Então, ele
terá de instaurar uma ação declarativa que se chama oposição à execução por meio de
embargos de executado.

O artigo 729.º do CPC enumera os fundamentos taxativos de oposição à execução


mediante embargos de executado:

a) Inexistência ou inexequibilidade do título;

b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da
execução;

c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância


executiva, sem prejuízo do seu suprimento; — É esta a alínea que permite deduzir
embargos de executado com fundamento na falta de qualquer pressuposto processual,
seja um pressuposto processual geral seja um pressuposto processual específico.

O executado será autor e irá elaborar, através do seu advogado, uma petição inicial de
embargos de executado que dará origem a esta ação declarativa autónoma, mas
dependente da ação executiva, onde ele alega, entre outros fundamentos que possam
ser suscitados, a incompetência absoluta dos tribunal onde a ação foi instaurada por
violação das regras de competência internacional.
d) Falta de intervenção do réu no processo de declaração, verificando-se alguma das situações previstas na
alínea e) do artigo 696.º;

Filipa R. G. 15

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da
execução;

f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;

g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da
discussão no processo de declaração e se prove por documento; a prescrição do direito ou da obrigação
pode ser provada por qualquer meio;

h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;

i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de nulidade ou


anulabilidade desses atos.

Quando, no caso de haver uma imperícia profissional do advogado do executado ou no caso


de o executado não precisar de constituir advogado e não constituir, o executado não deduzir
embargos de executado ou deixar correr o prazo, como não é justo que a ação executiva corra
num tribunal português sendo este internacionalmente incompetente, o artigo 734.º do CPC
atribui ao juiz (onde esteja a tramitar a ação executiva) o poder-dever de conhecer oficiosamente
das questões que poderiam ter determinado o indeferimento liminar, nos termos do artigo
726.º do CPC — como é o caso da incompetência internacional (artigo 726.º/2/b) do CPC) —,
podendo vir a rejeitar/extinguir a ação executiva — com base na falta de de pressupostos
processuais insanáveis como é este da incompetência internacional dos tribunal portugueses nas
ações executivas — até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados — portanto, os
bens já estão penhorados, já estão a ser feitas diligências destinadas à venda, mas ainda não foi
feita a venda de quaisquer desses bens; é assim porque o legislador não quis que direitos de
terceiros que adquiram bens penhorados e a confiança que terceiros investiram nessa aquisição
fosse defraudada, quando inclusivamente esse terceiro já podia ter alienado, doado, etc. o bem
penhorado.

8.1.1.2. Competência interna

Tendo a obrigação exequenda elementos de conexão com ordens jurídicas estrangeiras e


tendo o juiz português se declarado internacionalmente competente, ele tem que ver se o seu
tribunal é também internamente competente, através dos critérios determinativos da
competência interna dos tribunais portugueses (que valem tanto nas ações declarativas como
nas ações executivas): a competência em razão da matéria, a competência em razão da
território, a competência em razão do hierarquia e a competência em razão do valor.

Deve-se ter em conta, nesta matéria, os artigo 85.º e ss. do CPC e os artigos 117.º e 129.º
da LOSJ (Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).

Filipa R. G. 16

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


8.1.1.2.1. Competência em razão da matéria

Relativamente à competência em razão da matéria, há tribunais que têm competência para


apreciar e julgar certos litígios, com exclusão de quaisquer outros:

➡ Os juízos, com a sua competência determinada nos artigos 122.º a 129.º da LOSJ,
cabe apreciar e julgar os litígios determinados nos respetivos artigos, independente do
valor.

P. ex., juízos de família e menores (artigos 122.º a 125.º), juízos de trabalho (artigos 126.º e 127.º),
juízos de comércio (artigo 128.º) , juízos de execução (artigo 129.º) e tribunais de competência
territorial alargada (artigo 83.º e artigos 111.º e ss.) - tribunal de propriedade intelectual, tribunal da
concorrência, regulação e supervisão e tribunal marítimo (são sobretudo estes que nos
interessam).

➡ Aos juízos centrais cíveis, com a sua competência determinada no artigo 117.º da
LOSJ, cabe apreciar e julgar litígios de natureza cível não atribuídos a outros juízos cujo
valor seja superior a 50.000 euros. A sua competência é simultaneamente atribuída em
razão da matéria e do valor, mas não deixam de ser órgãos jurisdicionais de competência
especializada.

➡ Aos juízos locais cíveis, com a sua competência determinada no artigo 130.º da LOSJ,
cabe apreciar e julgar litígios de natureza cível não atribuídos a outros juízes cujo valor
seja inferior a 50.000 euros. Também não deixam de ser órgãos jurisdicionais de
competência especializada, cuja competência também é determinada em razão do valor,
mas não só.

➡ Aos juízos locais de competência genérica, com a sua competência determinada no


artigo 130.º da LOSJ, nas localidades com menor densidade populacional, com menor
nível de litigiosidade. Estes juízos apreciam e julgam questões cíveis e questões criminais
até 50.000 euros.

Poderíamos pensar que, uma vez que existem juízos de execução (artigo 129.º/1 da LOSJ)
instalados em todas as comarcas e a funcionar, todas as ações executivas respeitantes a
obrigações exequendas de direito privado seriam tramitáveis no juízo de execução. Poderia ter
sido esta a orientação. Todavia, no n.º 2 vemos que muitas ações executivas não tramitam nos
juízos de execução:

1. Sentenças condenatórias proferidas por tribunais de competência territorial alargada;

2. Sentenças condenatórias proferidas por juízos de comércio, juízos de trabalho e juízos


família e menores.

Estas ações tramitam, conforme o artigo 85.º/1 do CPC que remete para a LOSJ,
precisamente (apesar de não expressamente) para o artigo 129.º/1 e 2, de forma autónoma,

Filipa R. G. 17

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


nos próprios autos em que a sentença condenatória foi proferida.

Exemplo 1. Uma sentença condenatória proferida pelo 1.º juízo de trabalho da comarca de Coimbra que
tenha condenado a entidade patronal a pagar salários em atraso, proporcionar o subsídio de férias e o
subsídio de Natal e uma indemnização ao trabalhador em caso de despedimento ilícito, tendo o
trabalhador optado pela não reintegração. Esta sentença condenatória é executada, não no 1.º juízo de
execução da comarca de Coimbra, mas é executado no próprio juízo de trabalho.

Assim, o requerimento executivo é apresentado nesse processo, no processo que tramitou no juízo de
trabalho de Coimbra, correndo a execução de forma autónoma nos próprios autos - os próprios autos da
ação declarativa agora terminaram e começam a decorrer uns novos autos na ação executiva.

Exemplo 2. Uma sentença condenatória proferida pelo 1.º juízo de família e menores da comarca de
Coimbra regulou as responsabilidades parentais relativamente a um menor com progenitores que se
separaram de facto ou cujo divórcio foi decretado. Ao regular estas responsabilidades parentais, não
adotou o modelo comum que é a divisão de responsabilidades parentais com guarda física conjunta e
alternada, determinou antes que as responsabilidades parentais cabem aos dois, embora a guarda física
caiba só a um dos progenitores, ficando o outro com uma obrigação de alimentos ao menor, porque não
está fisicamente com ele, a não ser quando o visita, de férias, etc.

No caso, p. ex., de atrasos nos pagamentos desta prestação de alimentos, a ação é executada no juízo
de família e menores. O requerimento executivo é apresentado nesses autos de regulação de
responsabilidades parentais, tramitando autonomamente nesse mesmo juízo de família e menores.

Em razão da matéria, tramitam nos juízos de execução as:

1. Sentenças condenatórias não cumpridas proferidos por juízos cíveis centrais;

2. Sentenças condenatórias proferidas por juízos cíveis locais;

3. Sentença condenatórias proferidas juízos locais de competência genérica;

A secretaria destes juízos cíveis centrais, juízos locais d juízos locais de competência de
competência genérica envia ao juízo de execução competente (quem tem competência
naquele local) todo este processo (o requerimento executivo, a sentença condenatória e
os documentos que acompanham os documentos executivos).

4. Sentenças condenatórias proferidas por um tribunal arbitral — A lei de arbitragem


portuguesa não atribui competência aos tribunais arbitrais para executar as suas
próprias decisões, embora as suas decisões tenham o mesmo valor que as decisões
proferidas pelos tribunais do Estado. À luz do artigo 85º/3 do CPC e do 129º/1 da LOSJ,
elas tramitam no juízo de execução que tenha jurisdição no local onde o tribunal arbitral
foi instalado e apreciou e julgou a ação.

Exemplo: Se o tribunal arbitral funcionou na Associação Comercial de Coimbra e aí foi proferida


uma sentença arbitral, a ré, condenada a pagar a quantia pecuniária de uma transação
comercial, vai ser executada no juízo de execução da comarca de Coimbra.

Filipa R. G. 18

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


5. Sentenças condenatórias proferidas em Julgados de Paz — O regime dos Julgados de
Paz (Lei n.º 78/2001) não permite que estes tribunais estaduais tenham competência
para executar as suas próprias decisões;

6. Todas as obrigações exequendas fundadas em títulos executivos extra-judiciais — O


credor que seja credor com base num documento a que a lei atribui força executiva,
não tem de ajuizar uma ação declarativa prévia, pode instaurar imediatamente uma
ação executiva - são os casos em que a obrigação exequenda consta de um título
extra-judicial.

Exemplo 1. O requerimento de injunção do qual tenha sido aposta a forma executória, que é um
pedido que o credor formula no Balcão Nacional de Injunções. Esse Balcão é um serviço, é uma
secretaria judicial, no qual trabalham funcionários públicos. Estes, ao receberem esse formulário
onde o credor alega a natureza da dívida, onde indica o devedor e o montante da dívida,
notificam o alegado devedor para este se opor em 15 dias. Se não se opuser, aquele
requerimento de injunção é transformado automaticamente em título executivo (extra judicial).

Exemplo 2. As letras, as livranças e os cheques.

A consequência da falta de competência em razão da matéria do tribunal para a ação


executiva é a incompetência absoluta (artigo 96.º/a) do CPC).

O momento em que esta incompetência absoluta pode ser conhecida ou suscitada varia
consoante o processo executivo tramite sob forma sumária ou sob a ordinária:

• Se for processo ordinário: Num processo executivo para pagamento de quantia certa, o
juiz analisa o requerimento executivo e, se entender pela incompetência material,
indefere-o liminarmente (artigo 726.º/2/b) do CPC).

• Se for processo sumário: Num processo executivo para pagamento de quantia certa, o
agente de execução tem acesso imediato ao requerimento executivo e só se suspeitar da
falta de verificação de algum destes pressupostos processuais, como é o da
incompetência em razão da matéria, é que deve remeter o requerimento executivo para o
juiz do tribunal onde a ação for instaurada (artigo 855.º/2/b) do CPC).

No caso de o agente de execução remeter o requerimento executivo para o juiz e este


entender que há incompetência material, então estamos perante exceção dilatória, de
conhecimento oficioso, que não implica necessariamente a absolvição do réu
(executado) da instância e a extinção da execução, precisamente se for advogada a
aplicação do artigo 99.º/2 do CPC à ação executiva. Deste artigo resulta que se a
incompetência for decretada depois de findos os articulados, podem estes aproveitar-se
desde que o autor requeira, no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da

Filipa R. G. 19

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


decisão, a remessa do processo ao tribunal em que a ação deveria ter sido proposta, não
oferecendo o réu oposição justificada.
Podemos pensar em adaptar esta norma à ação executiva, porque a falta de
pressupostos processuais deve, se possível, ser suprida, porque o fundo prevalece sob a
forma, a não ser que o pressuposto processual seja totalmente insuprível. Poderíamos,
assim, aproveitar esta norma e admitir a remessa do requerimento executivo para o
tribunal materialmente competente, mas teria de se ouvir o executado para saber
se este oferecerá ou não uma oposição justificada à remessa.

Mesmo que o juiz não se aperceba da incompetência material ou que o agente de


execução não suscita (no processo executivo sumário) a intervenção do juiz havendo
incompetência material e a ação executiva para pagamento de quantia certa tramita, são
identificados os bens penhorados e estes são penhorados, não deduzindo ou não
deduzindo o executado embargos de executado com fundamento em incompetência em
razão da matéria, é possível, ao abrigo do artigo 734.º do CPC, o juiz conhecer
oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão de bens penhorados, desta
questão da incompetência material do tribunal para a ação executiva, desde que
haja requerimento ao juiz.

8.1.1.2.2. Competência em razão do território

— Competência territorial quando o título executivo é judicial (sentença condenatória)


(artigo 85.º do CPC):

• Quando o título executivo é uma sentença condenatória, em regra, está já definida a


competência territorial para a ação executiva: a sentença condenatória será executada
no tribunal que a proferiu.

• A única especificidade é as sentenças condenatórias proferidas pelos juízos cíveis


locais, pelos juízos cíveis centrais, pelos tribunais arbitrais e pelos julgados de paz,
porque, nestes casos, o critério territorial relevante é o juízo de execução competente
territorialmente que tenha jurisdição no local onde está instalado o tribunal que
proferiu a sentença condenatória.

— Competência territorial quando o título executivo é extrajudicial (artigo 89.º do CPC):

• De acordo com o artigo 89.º/1/1.ª parte do CPC, a regra geral da competência em


matéria de execuções é da competência do tribunal do domicílio do executado.
Todavia, o artigo 89/1/2ª parte do CPC permite uma alternativa: pode o exequente
optar por executar no tribunal do lugar onde a obrigação deveria ser cumprida, e que
não foi (entende-se por lugar da prestação o indicado nos artigos 772.º e ss. do CC),
quando o executado seja uma pessoa coletiva ou quando situando-se o domicílio do

Filipa R. G. 20

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


exequente na área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o executado tenha domicílio
na mesma área metropolitana - em 2001, para descongestionar os tribunais da grande
Lisboa e do grande Porto, adotou-se esta alternativa segundo a qual exequente ou o autor
(ação declarativa) podia, independentemente do domicílio dele e do executado ser na mesma
área metropolitana, intentar as ações declarativas e ações executivas no lugar do cumprimento
da obrigação (lugar da prestação), se for um lugar diferente.

Exemplo: Uma obrigação de entrega de uma coisa móvel certa que à data do incumprimento
da coisa estava num armazém na Guarda e o exequente e o executado são sociedades com
domicílio no grande Porto e na grande Lisboa. À luz das regras do CC, o lugar da prestação,
no caso de entrega de coisas móveis (artigo 773.º do CC), é o lugar onde a coisa se
encontrava à data do incumprimento - armazém na Guarda. Assim, apesar de o executado
(devedor) e exequente (credor) terem sede na grande Lisboa ou no grande Porto, o credor
pode intentar a ação executiva tanto na comarca do Porto (no juízo de execução do Porto),
como na comarca de Lisboa (no juízo de execução de Lisboa), como na comarca de Guarda.

Nota: O artigo 71.º/1 do CPC é uma norma correspondente para às ações declarativas de
competência territorial.

• De acordo com o artigo 89.º/2 do CPC, no caso de dívida provida com garantia real
é competente o tribunal do lugar da situação dos bens onerados.
Exemplo: Dívida garantida por uma hipoteca que incide sob um apartamento localizado em
Coimbra. Logo, será competente o tribunal da comarca de Coimbra, independentemente do
local do incumprimento.

• De acordo com o artigo 89.º/3 do CPC, quando a execução haja de ser instaurada
no tribunal do domicílio do executado (regra do n.º 1) e este não tenha domicílio
em Portugal, mas aqui tenha bens, é competente para a execução o tribunal da
situação desses bens — isto confirma a ideia de que para as ações executivas os tribunais
portugueses só são competentes quando os bens a penhorar se localizem em Portugal.

• De acordo com o artigo 89.º/4 do CPC, quando a execução haja sido instaurada em
tribunal português, por via do artigo 63.º/b) do CPC, e não ocorra nenhuma das
situações previstas nos artigos anteriores e nos números anteriores deste artigo, é
competente o tribunal da situação dos bens a executar.

• Quando o executado com residência no estrangeiro tiver bens situados em várias


comarcas em Portugal, podemos usar, por analogia, a norma do artigo 78.º/1/a) do
CPC, a propósito da competência territorial em matéria de arresto e o arrolamento.
Assim, será de entender que a ação executiva pode ser proposta em nos juízos de
execução de qualquer uma dessas comarcas.

Filipa R. G. 21

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


A consequência da falta de competência em razão do território do tribunal para a ação
executiva é a incompetência relativa (artigo 102.º do CPC).

O momento em que esta incompetência relativa pode ser conhecida ou suscitada varia
consoante o processo executivo tramite sob forma sumária ou sob a ordinária, para pagamento
de quantia certa: se a forma de processo for ordinário, o requerimento executivo é imediatamente
apresentado ao juiz para apreciação liminar; se a forma de processo for sumário, o agente de
execução submete-o ao juiz se suspeitar desta exceção dilatória. Se o não fizer, o executado tem
sempre a possibilidade de a alegar em em sede de oposição à execução por meio de
embargos de executado. O fundamento dos embargos de executados, estando em causa a
incompetência em razão do território, é também o artigo 729.º/c) do CPC (uma qualquer falta de
pressuposto processual).

A incompetência em razão do território não é, em regra, de conhecimento oficioso; mas em


algumas hipótese, é-o.

Com o novo CPC, o legislador foi-se aproximando da doutrina do PROF. ANSELMO DE CASTRO,
segundo a qual a violação das regras da incompetência em razão do território se aproximam do
regime das regras da violação das regras da competência material, em razão da hierarquia e da
competência internacional. E, nesta medida, são imperativas e em muitos casos não permitem
que as partes as afastem mediante pactos de competência (artigo 95.º/1 do CPC).

Assim, a infração das regras da competência em razão do território  é  de conhecimento


oficioso nos casos previstos nos artigos 102.º a 104.º do CPC, já que, no novo CPC, as
disposições reguladoras da competência do tribunal continuam a estar previstas na parte geral
deste CPC e, por conseguinte, são diretamente aplicáveis à ação executiva.

Exemplo 1. A execução para entrega de coisa certa deve ser ajuizada no tribunal (maxime, no juízo de
execução) da situação dos bens: o artigo 89.º/2, é uma das normas para que remete o artigo 104.º/1/a) do
atual CPC.

Exemplo 2. A instauração da execução fora em desrespeito da regra do ajuizamento desta no tribunal


do domicílio do executado (se o título executivo for extrajudicial) é de conhecimento oficioso (artigo 89.º/
1/1.ª parte, ex vi do artigo 104.º/1/a) do CPC).

8.1.1.2.3. Competência em razão da hierarquia

A regra, nas ações declarativas é do princípio da plenitude de jurisdição, segundo o qual


só os tribunais de 1.ª instância têm competência para neles serem ajuizadas ações. Com duas
exceções, em que as ações declarativas são propostas na Relação ou no Supremo:

1. Os processos especiais de revisão e confirmação de sentenças estrangeiras;

2. As ações de indemnizações contra magistrados por danos causados no exercício das


suas funções.

Filipa R. G. 22

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Nas as ações executivas, de acordo com o artigo 85 e 86.º do CPC, mesmo que a ação tiver
sido proposta na Relação ou no Supremo, é competente para a execução o tribunal (de 1.ª
instância) do domicílio do executado (a não sei nos casos do artigo 84.º do CP). Aqui não há
nenhuma exceção, ou seja, nunca um tribunal superior é competente para nele ser ajuizada uma
ação executiva, ainda quando a ação declarativa - o acordão condenatório - provenha de uma
petição inicial que deu aí entrada (na Relação ou no Supremo).

A consequência da falta de competência em razão do hierarquia do tribunal para a ação


executiva é a incompetência absoluta (artigo 96.º/a) do CPC).

A incompetência em razão da hierarquia é de conhecimento oficioso. Como é que o juiz


conhece oficiosamente desta exceção?

1. Se o agente de execução (nas execuções para pagamento de quantia certa que


seguem a forma de processo sumário) suscitar esta questão ao juiz;

2. Se o próprio juiz (nas execuções para pagamento de quantia certa que tramitam sob a
forma de processo ordinário) se aperceber da questão.

Em último caso, é sempre possível ao juiz, até ao primeiro ato de transmissão dos bens
penhorados, conhecer desta questão, ao abrigo do artigo 734.º/1 do CPC.

Aula dia 24 de março de 2020

8.1.1.2.4. Competência em razão do valor

A competência em razão do valor é um critério que está completamente absorvido pelo


critério da competência material.

Na ação declarativa, a competência em razão do valor respeita às ações de valor superior ou


inferior a 50.000 euros atribuíveis aos juízos centrais cíveis ou aos juízos locais cíveis ou de
competência genérica, se não forem atribuídos a outros juízos de competência especializada.

Na ação executiva, os juízos centrais cíveis e os juízos locais cíveis não têm
competências executivas, a não ser que na comarca não esteja instalado e a funcionar um juízo
de execução.

Exemplo 1. Uma ação instaurada no juízo de trabalho de Coimbra por um trabalhador no sentido de de
impugnar despedimento. O trabalhador ganha e a entidade patronal é condenada a pagar-lhe as
retribuições em atraso e o subsídio de férias no montante vários milhares de euros e o trabalhador opta
pela reintegração. Se a entidade patronal não cumprir voluntariamente, à luz dos critérios de competência
matéria, o trabalhador executa a ação condenatória no mesmo juízo (artigo 85.º do CPC e 129.º/2 da
LOSJ), tramita nos próprios autos de ainda que forma autónoma; à luz da competência territorial, a
comarca de Coimbra é a comarca competente; à luz da competência em razão de hierarquia é o juízo

Filipa R. G. 23

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


enquanto tribunal judicial de 1ª instância. A competência em razão do valor é o juízo de trabalho de
Coimbra, porque é independente do valor da execução.

Exemplo 2. Uma decisão condenatória proferida por juízo cível local ou um juízo local de competência
genérica em Bragança. Portanto, uma ação declarativa condenatória de valor inferior a de 50.000 euros,
que o réu não cumpriu. Como na comarca de Bragança o juízo de execução ainda não estava a funcionar,
não se executava? Se estivesse a funcionar o juízo de execução, seria aí, no juízo da execução da comarca
de Bragança, que iria ser executada, à luz do artigo 129.º/1 e 2 da LOSJ. Não estando a funcionar, a
sentença condenatória proferida pelo juízo cível local de Bragança seria executada no próprio juízo cível.
Só nesta hipótese é que os juízos locais e os juízos centrais teriam competência executiva, ou seja, se na
comarca onde estão instalados não estiver a funcionar um juízo de execução.

A consequência da falta de competência em razão do valor do tribunal para a ação


executiva é a incompetência relativa (artigo 102.º do CPC).

8.1.2. Patrocínio Judiciário

Tanto na ação declarativa (no caso de ação declarativa ou incidente declarativo que tramite por
apenso à ação executiva), como na ação executiva (no caso de execução de um título extra-judicial ou
de uma sentença condenatória), o patrocínio judiciário, que é a representação por advogado

(auxílio técnico-jurídico de um advogado com inscrição definitiva na Ordem dos Advogados), só


é pressuposto processual se for obrigatório.

O patrocínio judiciário é obrigatório nos casos enunciados no artigo 58.º do CPC:

1. Ações de execuções de valor superior à alçada da Relação (n.º 1, 1.ª parte): São
execuções de valor igual ou superior a 30.000 euros e 1 cêntimo.

2. Ações de execuções de valor entre 5.000 euros e 1 cêntimo (superior à alçada do


tribunal de 1ª instância) e 30.000 euros, quando tenha lugar (a instauração e a
tramitação de) algum procedimento que siga os termos do processo declarativo (n.º
1, 2.ª parte): São execuções, executadas por terceiro ou pelo próprio executado, que
implicam algum incidente de natureza declarativa (p. ex., incidente de oposição à penhora)
ou nela são enxertadas alguma ação declarativa (p. ex., embargos de terceiros, embargos
de executado, concurso de credores).

3. No apenso de verificação de créditos, quando for reclamado algum crédito de


valor superior à alçada do tribunal de 1ª instância e apenas para apreciação dele
(n.º 2): Pode acontecer que uma ação declarativa tenha se iniciado entre um
enxequente e um executado e que este executado seja devedor de outros credores.
Alguns destes credores que tenham um direito real de garantia sobre os bens já
penhorados e disponham o título executivo contra o mesmo executado, podem

Filipa R. G. 24

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


reclamar créditos. Ao reclamarem créditos, o primeiro deles a reclamar créditos vai
instaurar uma outra ação declarativa com processo especial que corre por apenso: o
apenso de verificação de créditos, designado na gíria forense por concurso de credores.

O objetivo desta ação declarativa com processo especial é admitir ou recusar os


créditos reclamados sobre o mesmo devedor, por parte de credores que tenham direitos
reais de garantia sobre os bens já penhorados e que tenham um título executivo sobre o
mesmo devedor, e graduar esses créditos, para que, quando os bens penhorados forem
vendidos, o produto da venda seja distribuído pelos credores que tenham sido
graduados.

Esta ação declarativa apenas implica a obrigatoriedade de patrocínio judiciário quando


for reclamado algum crédito de valor superior à alçada do tribunal de 1ª instância, ou
seja, quando for reclamado algum crédito de valor superior a 5.000 euros e 1 cêntimo.

4. Demais execuções de valor superior à alçada do tribunal de 1ª instância (n.º 3): Nas
demais execuções de valor superior a 5.000 euros não abrangidas pelos números
anteriores. Neste caso, as partes têm que se fazer representar por advogado com
inscrição definitiva, mas também se podem fazer representar por advogado estagiário
ou solicitador. Contudo, esta é uma hipótese residual.

Podemos concluir que nas execuções de valor inferior a 5.000 euros, inclusive, o
patrocínio judiciário não é pressuposto processual, ele não é obrigatório. O exequente
só constituirá advogado com inscrição definitiva se quiser; por norma fá-lo, mas não é
obrigado.

8.1.3. Legitimidade Processual

Na ação declarativa, o autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar e o
réu é parte legítima quanto tem interesse direto em contradizer (artigo 30.º do CPC). O interesse
direto em demandar ou o interesse direto em contradizer apura-se pela vantagem ou
desvantagem que um e outro, do ponto de vista económico, possam vir a ter no final da ação
declarativa. Na falta de outro critério, subsidiariamente, têm interesse direto em demandar e
interesse direto em contradizer, os sujeitos na ação material controvertida.

Na ação declarativa é relativamente fácil saber quando é que o autor ou o réu são partes
legítimas. A legitimidade processual numa ação declarativa exprime a posição da parte perante o
objeto do litígio perante o pedido e a causa de pedir, em termos de se poder dizer que o autor e o
réu têm, perante o pedido e a causa de pedir, uma relação jurídica muito próxima.

Na ação executiva, a regra geral é a do artigo 53.º/1 do CPC, segundo o qual a legitimidade
processual exprime uma posição puramente formal, no sentido que só é parte legítima ativa -
como exequente - a pessoa cujo nome figura no título executivo na qualidade de credor e só

Filipa R. G. 25

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


é parte legítima passiva - como executado - a pessoa cujo nome esteja mencionado no título
executivo na qualidade de devedor.

Tal significa que mesmo que outras pessoas sejam titulares da ação material controvertida da
qual resulta a obrigação exequenda, se o nome delas não estiver mencionado no título executivo,
na qualidade de devedores ou credores, elas não são partes legítimas.

É preciso fazer uma interpretação gramatical/literal do título executivo para discernir quem
cujo nome está mencionado nesse documento (sentença condenatória, título extra-judicial,
documento particular assinado pelo devedor, letra, livrança, etc.) na qualidade de devedor ou credor.

Exemplo: Numa sentença condenatória aparece o nome de vários sujeitos, aparece o nome de quem
participou nas negociações que levaram à obrigação cuja condenação é pedida, o nome das testemunhas,
o nome dos peritos, o nome do cônjuge. O que interessa depois saber é quem é que o juiz condenou, se o
título executivo for uma sentença condenatória.

Ainda que outras pessoas tenham sido mencionadas no título executivo, só as pessoas a título
de devedoras e a título de credoras da obrigação exequível é que são partes legitimas e terão
legitimidade processual.

Contudo, há desvios à regra geral da legitimidade processual nas ações executivas:

1. Títulos ao portador (artigo 53.º/2 do CPC)


Os títulos de crédito ao portador não mencionam a pessoa do credor. Quem tem
legitimidade processual para ser exequente é quem tenha a posse legítima desse título
de crédito - o portador. Ter a posse legítima significa que se é possuidor na sequência
de endossos em que há tradição, mas note-se que pode nem chegar a haver endosso.

No caso em que o portador não seja o portador legítimo, tal pode-se discutir nos
embargos de executado, à luz das regras dos negócios jurídicos cambiários.

P. ex., cheques ao portador. O cheque é uma ordem de pagamento feita por uma pessoa (que
tem uma conta aberta com saldo) a um banco, pela qual a pessoa ordena ao banco que pague a
outra pessoa e coloca o nome do beneficiário da ordem no documento (cheque à ordem) - aqui
não há desvio. Todavia, a lei uniforme sobre cheques permite que os cheques sejam ao portador.
O cheque ao portador é quando a ordem de pagamento dada ao banco para pagar a outra
pessoa não contém o nome do beneficiário da ordem. O funcionário do banco, quando alguém
se apresenta e deposita o cheque na sua conta, apenas pede a identificação dessa pessoa. Essa
pessoa será o portador legítimo se for credor dessa quantia. No caso de o cheque não ter
provisão, há incumprimento no quadro da relação cambiária e o banco informará o portador que
o dador da ordem não tem saldo disponível.

2. Sucessão/cessão no débito e/ou no crédito (artigo 54.º/1 do CPC)

O nome das pessoas que atuam na qualidade de exequente e/ou que atuam na
qualidade de executados não surge no documento que titula a direito de crédito ou que

Filipa R. G. 26

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


titula a dívida, porque houve cessão.

Exemplo 1. O devedor morre e antes de morrer tinha sido condenado em sentença a pagar uma
quantia pecuniária. Nestes casos, apesar do nome que consta do título executivo como devedor
ser o do falecido, são os herdeiros do falecido que vão ser executados.

Exemplo 2. Uma instituição financeira cedeu o crédito a outra instituição financeira. Não sendo
pagas as prestações vencidas do capital ou dos juros, o novo credor, que não consta no título
como credor, têm legitimidade ativa para ser exequente tendo apenas que justificar os factos
construtivos da aquisição de créditos.

O único requisito formal que tem que ser cumprido pelo exequente (credor) é o dever
de justificar e alegar os factos constitutivos da sucessão, no caso concreto, da
sucessão na dívida - é um dever declarativo específico enquanto alegação factual
específica no requerimento executivo.

Cont. exemplo 1. O credor tem que dizer que o devedor, cujo nome consta do título, faleceu e
juntar a certidão de óbito e identificar os herdeiros, juntando, se necessário, a declaração de
habilitação de herdeiros. Desta maneira o exequente justifica na petição executiva quem são os
sucessores na dívida.

Exemplo 3. Transmissão singular de dívidas ou a co-assunção de dívida. No primeiro caso, o


devedor transmite, com o consentimento do credor, a dívida a outra pessoa. No segundo caso, o
devedor convence outra pessoa a ser co-devedora. Tanto o nome daquele em relação ao qual se
transmitiu a dívida, como o nome do co-devedor não constava do título inicial, mas ambos têm
legitimidade processual passiva.

3. Dívidas providas de garantia real sobre bens de terceiro (artigo 54.º/2 e 3 do CPC)

Este terceiro não é devedor, é alguém que permitiu constituir-se a favor do credor um
direito real de garantia sobre bens seus (p. ex., uma hipoteca, um penhor, uma consignação
de rendimento), cujo nome não consta do título executivo na qualidade de devedor e que,
mesmo assim, pode ser réu numa ação executiva.

Exemplo: Um terceiro aceitou constituir um hipoteca, a favor do credor (banco), sobre um bem
seu, para garantir uma obrigação (alheia) de um familiar.

Note-se que este terceiro não é o fiador! Enquanto que este terceiro não é devedor,
apenas permite que sobre um bem ou alguns bens seus se possa constituir um direito
real de garantia, o fiador é devedor, porque presta uma garantia pessoal (isto é, todo o
seu património penhorável pode ser penhorado numa execução movida pelo credor) e é
normalmente um devedor subsidiário (responde na falta ou insuficiência dos bens do
devedor principal), mas pode ser imediatamente executado, se e quando tiver
renunciado ao benefício de excussão prévia (caso em que é o devedor principal ou co-
devedor) (artigo 638.º/1 do CC).

Filipa R. G. 27

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Neste caso, o credor tem 3 alternativas:

1) O credor, cujo nome consta do título executivo, intenta a ação executiva


apenas contra o terceiro dador da garantia real

Neste caso, o bem ou direito que, em primeiro lugar, será penhorado é o dado
pelo terceiro em garantia.

Se o terceiro alienar o bem dado como garantia, quem o adquirir, adquiri-o


onerado. Portanto, se o devedor não pagar, o credor irá executar (propor a ação
executiva contra) o adquirente do bem onerado - direito de sequela.

Se o bem dado em garantia pelo terceiro não for suficiente para pagar a
obrigação exequenda, pode a execução seguir contra o devedor, ou seja, o
credor pode requerer a intervenção principal provocada do devedor, tornando-
se este executado (artigo 54.º/3 do CPC). Assim, a execução que começou
contra um enxequente (autor) e um executado (réu), vai agora continuar com o
mesmo exequente e dois réus, por intervenção de outro réu que é o devedor da
quantia exequenda (litisconsórcio voluntário sucessivo).

2) O credor intenta a ação executiva simultaneamente contra o devedor da


obrigação exequenda (cujo nome consta do título executivo) e contra o
terceiro (não devedor) dador da garantia real (artigo 54.º/2/parte final do
CPC) (hipótese que é mais vulgar e mais diligente).

Temos um litisconsórcio voluntário inicial.

3) O credor intenta a ação executiva apenas contra o devedor, e não contra o


terceiro (não devedor) sobre cujo bem ele dispõe de um direito real de garantia
(hipótese mais absurda e que envolve riscos para o credor).

Esta é uma hipótese claudicante e de risco, porque:

• O credor pode fazê-lo, mas apenas pode penhorar os bens do devedor


(artigo 54.º/2 + artigo 735.º/1 e 2 do CPC). O artigo 735.º/1 diz-nos que
estão sujeitos à execução todos os bens do devedor suscetíveis de
penhora e o n.º 2 diz-nos que podem ser, nos casos especialmente
previstos por lei, penhorados bens de terceiros não devedores, desde
que a execução tenha sido movida contra eles. Isto significa que só
podem ser penhorados bens de terceiros desde que este seja réu na
ação. Assim, se o credor apenas executar o seu devedor, e não o dador
da garantia, ele apenas pode penhorar bens e direitos no património do
seu devedor, e não o bem sobre o qual tem uma garantia real e que é de
terceiro.

Filipa R. G. 28

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


• Pode entender-se que, à luz das afirmações feitas no requerimento
executivo e do comportamento do exequente de apenas demandar o
devedor e não o terceiro dador da garantia, o credor está a renunciar ao
direito real de garantia que tem sobre o bem desse terceiro não devedor.
Se assim se entender, o exequente jamais pode executar esse bem.

4. Demandar o possuidor dos bens onerados a favor do credor e que são do devedor
(artigo 54.º/4 do CPC)

Exemplo: Uma pessoa estabeleceu um contrato de comodato de um carro com um amigo, carro
esse que foi adquirido com financiamento bancário. Não tendo restituído as prestações devidas
ao banco, o carro foi hipotecado a favor do credor (banco), mas sobre o carro, alguém que não é
o devedor (o possuidor, que é o amigo do dono do carro), exerce poderes de facto. O mesmo no

De acordo com o DOUTOR REMÉDIO MARQUES, o legislador estabeleceu solução para


agilizar, à luz dos critérios de economia processual, a execução para estes bens
onerados, de forma a tornar a execução mais rápida.

Se esta norma não existisse (como sucedeu até 1995) o bem podia ser penhorado na
mesma (porque era um bem do devedor executado, cujo nome está no título executivo na
qualidade de devedor), mas o terceiro possuidor que não era réu, tendo conhecimento da
penhora do bem, poderia tentar defender a sua posse sobre um bem alheio, através de
uma ação declarativa de embargos de terceiros, tendo de demostrar que a posse que
ele exerce sobre o bem é oponível em relação à apreensão.

Tal poderia ser grave na perspetiva dos interesses do exequente, porque ao deduzir
embargos de terceiros, em regra, a execução sobre o bem suspender-se-ia enquanto
ainda não fosse decidido, com trânsito em julgado, se a posse de terceiro poderia ser
desconsiderada ou não relativamente ao ato de apreensão judicialmente ordenada - o
que poderia durar vários anos, tendo em conta que esta ação declarativa poderia ter
vários recursos.

Para evitar estes inconvenientes/perturbações na ação executiva, o legislador lembrou-


se de tornar o possuidor (terceiro) executado, permitindo que este também seja réu,
porque, se ele for réu, deixava de ser terceiro e, ao deixar de ser terceiro, deixa de ter
legitimidade processual ativa para ser autor dessa ação declarativa de embargos de
terceiro.

Ao deixar de ser terceiro e tornando-se executado/réu, passa a ter as faculdades


jurídicas processuais de qualquer executado: passa a poder deduzir oposição à
penhora e a deduzir embargos de executado, opondo-se, neste último caso, à
execução. Contudo, enquanto terceiro não devedor, o possuidor não pode fundamentar
a oposição à execução em exceções peremptórias pessoais (porque os titulares da relação
material controvertida na obrigação exequenda são o credor e o devedor; estas exceções

Filipa R. G. 29

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


apenas o devedor pode opor ao credor), mas pode fundamentar em exceções dilatórias
(falta de pressupostos processuais gerais, porque não está mandatado pelo devedor a defender
os interesses pessoais do devedor). Isto significa que este terceiro que passa a ser
executado não pode aproveitar de todos os fundamentos de embargos de executado
previstos no artigo 729.º do CPC: não lhe aproveitam os fundamentos de embargos de
executado que respeitam a exceções peremptórias pessoais, que só o devedor pode invocar
perante o credor dele.

5. Terceiros abrangidos pelo caso julgado (artigo 55.º do CPC)

A execução pode se promovida não só contra o devedor, mas também contra as


pessoas em relação às quais a decisão condenatória tenha força de caso julgado. Fala-
se aqui dos limites subjetivos do caso julgado.

Em regra e à luz da observância do contraditório, ninguém pode ficar vinculado por


uma sentença condenatória, quer do lado ativo (crédito), quer do lado passivo (dívida),
se não tiver tido oportunidade de ter tido intervenção, de contraditar e de influenciar o
juiz nas várias decisões que ele foi tomando ao longo do processo e, sobretudo,
influenciar a decisão final. Ou seja, o caso julgado, do ponto de vista subjetivo, só pode
atingir (vincular) aquelas pessoas (partes, sobretudo partes principais - autores e réus) que
tiveram oportunidade de poder ter influenciado o julgador na ação declarativa ao longo
de todo o processo.

O artigo 55.º do CPC corresponde a um afloramento de um desvio à regra. Trata-se de


casos em que alguém, do lado passivo ou do lado ativo, fica vinculado pelo caso
julgado (favorável ou desfavorável), ainda que não tenho tido participação no processo
(declarativo) de que essa sentença é o último ato.

O legislador no artigo 55.º do CPC não diz quais são esses casos, eles decorrem de
previsões em outros códigos e em leis avulsas.

Exemplo: Numa sociedade, um sócio não satisfeito com determinada deliberação, como, p. ex.,
o aumento de capital ou mudança de sede ou a dissolução da sociedade, entende que a
deliberação está ferida de nulidade ou de anulabilidade. Este sócio intenta uma ação destinada a
invalidar deliberação da Assembleia Geral ou do Conselho de Administração, cuja ré será a
sociedade. A decisão que vier a ser proferida nessa ação declarativa e na respetiva sentença
condenatória, vincula tanto a sociedade como os demais sócios, ainda que estes possam não ter
sido partes.

Para alguns autores, como o PROFESSOR LEBRE DE FREITAS, o artigo 55.º do CPC
apenas representa um desvio à legitimidade processual passiva e não um desvio à
legitimidade processual ativa. Já o DOUTOR REMÉDIO MARQUES e o DOUTOR TEIXEIRA DE
SOUSA entendem que o artigo 55.º representa um desvio tanto à legitimidade processual
passiva, como à legitimidade processual ativa.

Filipa R. G. 30

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Exemplo 1. Uma ação que foi proposta por um dos três credores de um mesmo devedor. Este
não é um caso de litisconsórcio necessário numa ação declarativa, pois cada um dos credores
pode sozinho tentar fazer condenar o devedor através de uma decisão judicial. O credor que
propôs a ação obteve uma sentença condenatória. Os outros dois credores, que não tiveram
intervenção na ação declarativa, podem aproveitar o caso julgado, que condenou o devedor a
pagar, para executar o devedor.

Exemplo 2. Ações populares para a defesa de interesses individuais homogéneos/interesses


subjetivos/individualizados/subjetivamente radicados (class action). Um ou dois dos milhares de
lesados instaura(m) uma ação popular cível contra uma empresa que é a fonte produtora dos
danos, que é uma empresa que negoceia através de cláusulas contratuais gerais e insere
cláusulas nulas ou que é uma empresa que poluiu ou uma empresa que lançou no mercado
medicamentos que estão a fazer mal a milhares de pessoas. No início desta ação, após os
articulados, é feita a publicidade desta ação popular para que os eventuais lesados venham a
este processo declarativo declarar, se assim o pretenderem, que não querem ficar vinculados
pelo caso julgado. Quem não vier declarar nessa fase fica vinculado pelo caso julgado favorável,
ou seja, pode aproveitar, numa ação proposta contra a mesma empresa, de uma sentença
condenatória que tenha feito uma condenação genérica até a um determinado limite, ainda que
não tenham sido partes ativas na ação popular.

A ilegitimidade das partes constituiu uma exceção dilatória de conhecimento oficioso


(artigo 577.º/e) e 578.º do CPC). Consequentemente, cabe ao juiz:

➡ Se insanável e haja lugar a despacho liminar, indeferir liminarmente a petição inicial


(artigo 726.º/2/b) do CPC);

➡ Se sanável, proferir despacho de aperfeiçoamento (artigos 6.º/2 e 726.º/4 do CPC) e,


seguidamente, só se não for sanada indeferir o requerimento executivo (artigo 726.º/5).
Aplica-se igualmente o artigo 734.º.

Quando seja citado, não obstante uma ilegitimidade insanável, ainda que não manifesta, o
executado tem a possibilidade de se opor à execução por embargos (artigo 729.º/c), quanto à
execução de sentença.

Aula dia 31 de março de 2020

8.1.3.1. Pluralidade de sujeitos e pluralidade de pedidos

8.1.3.1.1. Litisconsórcio (pluralidade de partes)

Enquanto que, para a Escola de Lisboa, o litisconsórcio são aquelas situações em que há
uma pluralidade de partes e um único pedido, para a Escola de Coimbra, o litisconsórcio são

Filipa R. G. 31

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


situações em que, por força da lei, de negócio jurídico ou da própria natureza da prestação a
efetuar, há pluralidade de partes e unicidade de relações materiais controvertidas.

8.1.3.1.1.1. Litisconsórcio necessário

Para o curso, em regra, não há litisconsórcio necessário nas ações executivas (vale a
dispensa de necessidade). Relativamente às ação executiva para pagamento de quantia certa, o
que está em causa é uma responsabilidade patrimonial que está a executar uma obrigação não
cumprida voluntariamente sobre o património do devedor ou de terceiro que responda pela dívida
exequenda (no caso de haver direitos reais de garantia sobre bens de terceiro), o exequente pode
renunciar a um direito subjetivo de fazer responder (executar) o património de um devedor e
executar o património de outro(s) devedor(es) - os direitos subjetivos de conteúdo patrimonial são
renunciáveis.

Embora haja situações (marginais) em que, atendendo à natureza da obrigação exequenda


e à finalidade da ação executiva, esse litisconsórcio seja obrigatório.

Exemplo 1. Situações de bens indivisos ou de compropriedade em que várias pessoas foram


condenadas ou estiverem obrigadas contratualmente a entregar uma coisa ao credor dela, casos em que a
ação executiva tem que ser proposta contra todas as pessoas contitulares da coisa ou que se
comprometeram a entregar a coisa comum. Nas execuções para entrega de coisa certa, se as várias
pessoas se comprometeram a entregar ou foram condenadas a entregar através de sentença condenatória,
então a ação executiva tem que ser proposta contra todas elas.

Exemplo 2. Várias pessoas se obrigam a prestar um facto - fazer um recital. Como o facto é infungível e
várias pessoas estão obrigadas a prestá-lo, a ação executiva para o cumprimento coercitivo terá de ser
deduzida contra todas as pessoas obrigadas a prestá-lo. Nessas ações executivas para prestação de
facto, não é possível obrigar o facto, logo essa ação executiva converte-se, após o requerimento executivo,
após a liquidação da indemnização, numa obrigação para pagamento de quantia certa (execução para
pagamento de quantia certa). No requerimento executivo, o exequente deduz o montante indemnizatório
pelos danos causados (danos emergentes e lucros cessantes) e há lugar a contraditório e será o juiz do
processo executivo a fixar o montante indemnizatório que vai substituir a prestação de facto.

Exemplo 3. Os contraente estipularem num contrato, que depois é descumprido, que todas as ações
declarativas e execuções que forem deduzidas na sequência de um litígio entre as partes devem ser
propostas conta todos e por todos - temos aqui uma convenção contratual e um litisconsórcio necessário
convencional.

Exemplo 4. Ações que têm de ser propostas por ambos ou contra ambos os cônjuges para entrega de
coisa certa - artigo 34.º do CPC. Em regra, o artigo 34.º não é aplicável à ação executiva, só é aplicável à
ação declarativa. Contudo, podemos encontrar nesse artigo situações em que a ação executiva deve ser
proposta contra os dois. Por exemplo, numa situação em que credor requer a restituição de um bem
imóvel que é bem comum ou bem próprio de um dos cônjuges. A ação declarativa condenatória devia ter
sido proposta contra os dois cônjuges, ao abrigo do artigo 34.º/1 do CPC, e não o foi e também ninguém

Filipa R. G. 32

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


se apercebeu da ilegitimidade processual na ação declarativa. O credor ganhou a ação e um dos cônjuges
foi condenado a entregar a casa que era a casa da morada de família do devedor e do seu cônjuge.

Então, esta ação, movida apenas contra um dos cônjuges e tratando-se de um imóvel próprio ou
comum cuja perda ou oneração deveria sempre implicar a intervenção do outro (artigo 1682º-A e B do CC),
da qual resultou sentença condenatória, está votada ao insucesso. Um dos cônjuges pode embargar
terceiro dizendo que deveria ter sido parte na ação declarativa anterior e não foi, e que, por esse motivo, a
sentença condenatória não o vincula.

Teríamos um caso em que o artigo 34.º/1 do CPC (+ artigo 34.º/3/parte final) implicaria a propositada de
uma ação executiva para entrega de coisa certa contra ambos os cônjuges.

Não sendo a ação executiva proposta contra todas as pessoas que deveria há preterição de
litisconsórcio necessário, que conduz à falta de legitimidade processual, o que traduz a falta
deste pressuposto processual (artigo 577.º/e) do CPC), a qual é suprível nos casos previstos no
artigo 261.º e ss. (ex vi do art.  316.º e ss.) do CPC - o autor pode chamar a pessoa a intervir, nos
termos dos artigos 316.º e seguintes, até ao trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das
partes por não estar em juízo determinada pessoa.

8.1.3.1.1.2. Litisconsórcio voluntário

Na ação executiva, há situações de litisconsórcio voluntário:

— Inicial: A pluralidade de partes ocorre desde a nascença da ação executiva.

- É a situação do artigo 54.º/2 CPC: a ação executiva é proposta simultaneamente contra o


devedor e contra o terceiro não devedor que constituiu um direito real de garantia sobre uma
coisa sua - neste caso, ocorre litisconsórcio voluntário inicial do lado passivo.

— Sucessivo/superveniente: A pluralidade de partes ocorre após a nascença da ação


executiva. Ou seja, a execução começa com um exequente e um executado e, a dada altura,
entram, no polo ativo ou no passivo, outros sujeitos.

- É a situação do artigo 54.º/3 CPC: a ação executiva é inicialmente deduzida contra o


terceiro não devedor que aceitou constituir um direito real de garantia sobre uma coisa sua, mas
o exequente pode requerer, no mesmo processo, o prosseguimento da ação contra o devedor, no
caso de se reconhecer a insuficiência dos bens onerados com a garantia real.

- É a situação do artigo 745.º/3 do CPC (penhorabilidade subsidiária): a ação executiva é


movida apenas contra o devedor principal, mas o exequente pode requerer a intervenção do
fiador (devedor subsidiário) no processo, no caso de os bens que estão no património do
devedor principal serem insuficientes.

- É a situação do artigo 745.º/2 do CPC: a ação executiva é instaurada apenas contra o


devedor subsidiário e este invoca o benefício de excussão prévia, ou seja, invocar que, antes de
o credor executar o seu património (o património do devedor subsidiário), vai ter que executar o

Filipa R. G. 33

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


património do devedor principal, visto que o devedor subsidiário não renunciou àquele benefício.
Só na falta ou insuficiência é que se vai executar o património do devedor subsidiário. Neste
caso, o exequente requer, no próprio processo, a intervenção do devedor principal.

8.1.3.1.2. Coligação (pluralidade de partes)

Na coligação é formulada uma pluralidade de pedidos (ou de pretensões) por ou contra


uma parte plural, devendo corresponder cada pedido a um sujeito ou sujeitos diferentes, ou
seja, há uma pluralidade de partes e uma pluralidade de pedidos: pode haver coligação ativa (de
exequentes) contra um só executado ou contra vários executados litisconsortes e pode haver
coligação passiva (de executados) em ação proposta pelo mesmo exequente ou por diversos
exequentes litisconsortes.

Por força do artigo 56.º/1 do CPC, a coligação é admitida em processo executivo quando
cumulativamente se verifiquem os seguintes pressupostos:

1. Não se verifiquem as circunstâncias impeditivas do artigo 709.º/1 do CPC;

2. Se verifique algumas as alíneas do artigo 56.º/1 do CPC:

a) A vários credores coligados demandar o mesmo devedor ou vários devedores


litisconsortes;

b) A um ou vários credores litisconsortes, ou a vários credores coligados, demandar


vários devedores coligados desde que obrigados no mesmo título;

c) A um ou vários credores litisconsortes, ou a vários credores coligados, demandar


vários devedores coligados, titulares de quinhões no mesmo património autónomo
ou de direitos relativos ao mesmo bem indiviso sobre os quais se faça incidir a
penhora.

Por força do artigo 56.º/2 do CPC não obsta à cumulação a circunstância de ser ilíquida
alguma das quantias, desde que a liquidação dependa unicamente de operações aritméticas.

Por força da remissão do artigo 56.º/3 do CPC para o artigo 799.º/2 a 5, observam-se na
coligação, quanto à competência em razão do valor e do território, as regras seguintes:

• Quando todos os pedidos se fundem em títulos judiciais impróprios, a ação executiva


corre no tribunal do lugar onde haja corrido o processo de valor mais elevado;

• Quando haja pedidos fundados em título judicial impróprio e outros em título extrajudicial,
a ação executiva corre no tribunal em que haja corrido o processo em que o título se
formou;

• Quando todos os pedidos se fundem em título extrajudicial, a competência determina-se


nos termos do artigo 82.º/2 e 3 do CPC;

Filipa R. G. 34

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


• Quando os pedidos originariam, isolados, formas de processo comum distintas, segue-se
a forma de processo ordinário.

No caso de coligação ilegal:

— Por não verificação de algum dos pressupostos enunciados, o juiz, havendo lugar a
despacho liminar, profere despacho de aperfeiçoamento, convidando o exequente - ou
exequentes - a que escolha o pedido relativamente ao qual pretende que o processo prossiga, e
só no caso de ele não o fazer absolverá o executado da instância (artigo 38.º e 726.º/4 e 5 do
CPC);

— Quando, quanto a algum dos pedidos, se verificar a incompetência absoluta do tribunal


ou a inadequação da forma de processo, o princípio da economia processual impõe que se
profira um despacho de indeferimento parcial e a causa prossiga relativamente aos outros
pedidos (artigo 726.º/3). O indeferimento dever-se-á, então, respetivamente, à incompetência do
tribunal (artigo 96.º) ou à inadequação da forma processual, inaproveitável para a forma legal ou
judicialmente tida por adequada (artigo 193.º).

8.1.3.1.3. Cumulação de pedidos (pluralidade de pedidos)

Na cumulação de pedidos, o credor ou credores (litisconsortes) cumulam execuções contra


o mesmo devedor ou contra vários devedores (litisconsortes), ou seja, há várias partes e vários
pedidos.

— O artigo 709.º do CPC trata das situações de cumulação de execuções fundadas em


títulos diferentes.

As várias alíneas do seu n.º 1 contêm limites a esta cumulação de execuções fundadas em
títulos executivos diferentes: É permitido ao credor, ou a vários credores litisconsortes, cumular
execuções, ainda que fundadas em títulos diferentes, contra o mesmo devedor, ou contra vários devedores
litisconsortes, salvo quando:

a) Ocorrer incompetência absoluta do tribunal para alguma das execuções;

b) As execuções tiverem fins diferentes;

c) A alguma das execuções corresponder processo especial diferente do processo que deva ser
empregado quanto às outras, sem prejuízo do disposto nos n.os 2 e 3 do artigo 37.º;

d) A execução da decisão judicial corra nos próprios autos.

— O artigo 710.º do CPC trata das situações de cumulação de execuções fundadas em


sentença condenatória (que julga procedentes vários pedidos).

Antes do CPC de 2013, se a sentença condenatória cumulasse a condenação de dois pedidos


de pagamento de quantia certa e de entrega de coisa certa, o exequente tinha que ajuizar duas
execuções diferentes, atenta à natureza da obrigação exequenda. Ou seja, tinha que ajuizar uma

Filipa R. G. 35

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


ação executiva para pagamento de quantia certa e outra ação executiva autónoma para entrega
de coisa fundada na mesma sentença.

O artigo 710.º do CPC veio trazer a possibilidade de cumular pedidos executivos a que
respondem formas de processo diferentes na mesma execução, desde que esses pedidos
estejam alicerçados na mesma sentença condenatória. Tal é vantajoso ao nível de poupança de
honorários do agente de execução e de menor morosidade.

Exemplo: Uma ação de reivindicação julgada procedente. O autor, nessa ação declarativa de
reivindicação, formulou o pedido de entrega da coisa e pediu que, caso fosse julgado procedente o pedido
principal, um pedido indemnizatório, o réu fosse condenado a pagar vários milhares de euros por
deteriorações que a coisa sofreu enquanto esteve a ser ocupada sem título pelo réu. O tribunal, na
sentença condenatória julgou procedente os dois pedidos formulados, julgou procedente o pedido de
desocupação e julgou procedente o pedido indemnizatório.

— O artigo 711.º do CPC trata das situações de cumulação sucessiva. Do ponto de vista da
coligação em sentido objetivo, da coligação enquanto cumulação de pedidos executivos, uma
execução pendente pode implicar a execução de sucessivos títulos. A mesma execução permite
que o mesmo credor exequente cumule sucessivamente vários pedidos executivos fundados em
títulos executivos diferentes, desde que se obedeça aos requisitos do artigo 709.º/1 do CPC.

Ainda há possibilidade de, extinta a execução, ela poder renovar-se, na medida em que o título
executivo é de trato sucessivo.

Exemplo: O credor é um credor de alimentos relativamente ao ex-cônjuge e relativamente a filhos


menores ou maiores até aos 25 anos. Algumas prestações de alimentos ficaram por paga. Ele tem título
executivo que é a sentença homologatória de divórcio por mútuo consentimento. Houve algumas parcelas
que falharam e este executa através de uma execução especial por alimentos. Consegue coercivamente a
penhora e a judiação de quantias da entidade empregadora ou saldos bancários. A execução extingue-se,
porque o credor de alimentos conseguiu satisfazer aquelas obrigações de alimentos em falta. Se o
obrigado falha novamente pode-se renovar a execução juntando-se um requerimento e reabre-se o
processo executivo.

8.1.4. Interesse Processual (ou interesse em agir)

O interesse processual ou interesse em agir é um pressuposto processual não previsto


expressamente no CPC e que tem de ser, na ação declarativa, exibido pelo autor.

O interesse processual traduz-se na carência de tutela judiciária, ou seja, é preciso de


colocar a máquina do Estado a trabalhar, porque a pretensão não pode ser satisfeita de uma
forma extrajudicial.

O interesse processual é diferente de legitimidade processual, o que significa que poderá


haver situações em que alguém tem legitimidade processual, mas não tem interesse processual.
A legitimidade processual exprime a posição de um sujeito perante um conflito, no sentido de se

Filipa R. G. 36

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


dizer que esse sujeito é um dos titulares da relação material controvertida e que tem interesse
direto em demandar ou interesse direto em contradizer. Ora, o interesse processual não tem a ver
com isto. Pode-se ser um dos titulares da relação material controvertida, ou seja, pode-se ter
interesse direto em demandar, mas não ter interesse processual, porque se pode resolver o litígio
por meios extra-processuais, logo não há carência de tutela judiciária. P. ex., porque a relação
material controvertida diz respeito à moral e não ao direito.

Na ação executiva, o interesse processual tem apenas a uma adaptação: a de se aferir em


função de se ser titular de um título executivo, ou seja, de dispor no título executivo na
qualidade de credor. Assim, se se tiver um título executivo e se esse título executivo for
apresentado no requerimento executivo, ele faz presumir, embora seja uma presunção ilidível,
que a obrigação existe e que há um obrigado, que é a pessoa cujo nome consta naquele
documento com a qualidade de devedor. Saber, depois, se o título executivo é exigível, se ação
exequenda ainda existe, se a obrigação se modificou, será um assunto que poderá ser discutido
na oposição à execução, por ação declarativa de embargos de executado.

8.2. Pressupostos específicos

Os pressupostos específicos estão expressamente previstos no artigo 713.º CPC e podem


ser:
• Materiais (que dizem respeito à obrigação exequenda): Certeza, exigibilidade e liquidez
(é o corpo);

• Formal: Título executivo (é a roupa que envolve a obrigação exequenda): é o documento que
contém a obrigação exequenda.

Os pressupostos específicos, se não puderem ser sanados, acarretam o não prosseguimento


da ação executiva, ou seja, a sua extinção.

8.2.1. Certeza da obrigação exequenda

A obrigação exequenda é certa quando está qualitativamente determinada. Por outras


palavras, o que está em causa na certeza é que obrigação é que o sujeito passivo devia ter
cumprido e ainda não cumpriu.

Estamos perante situações de falta de certeza:

➡ Obrigações alternativas (artigo 543.º do CC e 714.º do CPC): Nas obrigações


alternativas, a regra geral é que a escolha pertence ao devedor da obrigação. Na falta
de escolha do devedor, pode pertencer ao credor.

Em todas estas situações, é necessário a escolha, sob pena da execução não


prosseguir:

Filipa R. G. 37

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


• Se a escolha couber ao credor (exequente), é ele que, no requerimento executivo,
tem que dizer qual das obrigações escolhe para o devedor (executado) cumprir.

• Se a escolha couber ao devedor (executado), ele tem que ser citado para, no
prazo da oposição à execução por embargos de executado, vir dizer por qual das
prestações opta. Se o devedor mesmo assim não escolher, a escolha passa a caber
ao credor exequente.

Portanto, nas obrigações alternativas é possível, enquanto obrigações incertas, torná-las


certas mediante estas operações preliminares de escolha, que têm de ocorrer no início
da ação executiva já proposta.

Exemplo: O dono do stand faz um contrato de compra e venda com o potencial comprador que
comprará um dos vários veículos automóveis, até um determinado preço, que irão chegar de
certo modelo a esse stand. O dono do stand compra os vários veículos e, depois, a escolha do
automóvel cabe ao devedor do preço (há uma cláusula de escolha). Existe um documento (título
executivo) que está assinado pelo comprador e vendedor com as assinaturas reconhecidas. O
vendedor, que é o credor do preço, tem que colocar à disposição do comprador um dos veículos
para que este escolha (sendo que o preço está dependente dessa mesma escolha) e o comprador
não vem escolher e descumpre. Nos termos do artigo 714.º do CPC, como a escolha não cabe ao
credor do preço (exequente), o devedor (executado) terá que ser citado para, no prazo da
oposição à execução, declarar por qual das prestações opta. Se não o fizer, a escolha devolve-se
ao credor exequente. Feita a escolha pelo credor, no caso de o comprador não pagar ou pagar
uma parte, a obrigação exequenda tem que prosseguir para cumprimento coercitivo do
pagamento do preço.

Caso isso não aconteça e se esteja executar uma obrigação alternativa em relação à qual
não foi feita escolha, ou seja, que é incerta, as consequências são:

• Num processo executivo para pagamento de quantia certa sumário: O agente


de execução tem que suscitar esta questão ao juiz, porque o juiz não toma contacto
com o processo no início com o requerimento executivo. O juiz depois irá proferir
um despacho liminar por forma a convidar, se a obrigação se puder tornar certa, o
exequente a torná-la certa, ou seja, a escolher.

• Num processo executivo para pagamento de quantia certa ordinário: O juiz


deve aperceber-se da incerteza da obrigação, porque o requerimento executivo é
lhe entregue pela secretaria, não vai para o agente de execução. Então, o juiz deve
fazer diligências para ela se tornar certa:

- Se a escolha pertencer ao exequente credor: notificá-lo para fazer a escolha


no requerimento executivo;

- Se a escolha pertencer ao devedor: citá-lo para fazer a escolha.

Filipa R. G. 38

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


- Se a escolha pertencer a terceiro: citá-lo para fazer a escolha e caso não o
faça este direito subjetivo de escolha devolver-se-á ao exequente.

Se nem o agente de execução se aperceber, nem se suscitar a questão ao juiz, só resta


ao executado alegar a incerteza com embargos de executado - artigo 729º/e) do
CPC, que se aplica às situações em que o título executivo é extra-judicial e o artigo
731.º do CPC manda aplicar aos títulos executivos extra-judiciais os fundamentos de
embargos de executado previstos para os títulos executivos judiciais.

➡ Obrigações genéricas de espécie indeterminada (artigo 539.º do CC): Quando


alguém se obriga a entregar uma mercadoria e não se individualiza a espécie.

Exemplo: Alguém compra x toneladas de mármore - é uma obrigação genérica porque há várias
qualidades de mármore.

Quando há falta de certeza nestas situações, resolve-se pela possibilidade de uma


obrigação genérica (quanto ao género) se poder concretizar/individualizar no próprio
requerimento executivo, se o título executivo permitir interpretar literalmente essa
individualização. Há situações em que próprio título executivo não permite fazer essa
individualização através de uma interpretação gramatical, então a execução não poderá
prosseguir, porque está a concretizar uma forma muito vaga. Aí terá que haver uma
renovação do acordo e, se o executado não concordar em fazer um novo contrato, a
base da execução é o título.

Em todo o caso, note-se que o artigo 714.º do CPC, sendo diretamente aplicável às
obrigações alternativas, pode ser usado para algumas obrigações genéricas,
sobretudo quando ocorre necessidade de, ao abrigo do 715.º/1 a 4 do CPC, efetuar a
prova complementar do título, o qual se aplica não somente aos casos expressamente
nele previstos, mas também a todos os demais em que a certeza não resulte do próprio
título, embora já ocorre-se antes da instauração da execução.

Nas ações declarativas isto não é um problema, antes pelo contrário. O artigo 553.º do CPC
diz que é possível formular pedidos alternativos, em relação a direitos que pela sua natureza e
origem sejam alternativos. Ou seja, numa ação declarativa, o efeito jurídico pretendido não tem
que ser certo.

Nas ações executivas, o efeito jurídico pretendido tem que ser certo. Se não o for, terão que
haver mecanismos no início da ação executiva para tornar certa a obrigação incerta.

8.2.2. Exigibilidade da obrigação exequenda


A obrigação exequenda é exigível quando (1) já está vencida - porque prazo de pagamento já
decorreu - ou (2) o seu vencimento depende de uma mera interpelação do credor ao
devedor, de acordo com o estipulado na lei ou em contrato - trata-se das obrigações puras.

Filipa R. G. 39

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Em regra, qualquer obrigação entre sujeito ativo e sujeito passivo é uma obrigação pura.
Obrigações puras são as obrigações cujo vencimento (cuja exigibilidade) está dependente de
simples interpelação, e não de uma condição suspensiva ou de um prazo, o que significa que o
credor pode, a todo o momento, notificar judicial ou extra-judicialmente o devedor para cumprir.

No plano do direito das obrigações (do direito substantivo) e não do direito processual, basta
que a obrigação se vença pela mera interpelação. No plano processual, o que importa é,
sobretudo, as situações que não são de obrigações puras, ou seja, que são obrigações
inexigíveis:

1. Obrigação de prazo certo e este ainda não decorreu (artigo 779.º. do CC).

2. Obrigações exequendas dependentes de condições suspensivas: Vencem-se, em


sentido lado, quando a condição se verifica. A condição, conforme o artigo 270.º, 271.º
e 272.º do CC, é fazer-se depender a obrigação (um dever de prestar) de um facto
futuro e incerto. Há obrigações que podem ficar sujeitas/dependentes, por vontade das
partes, dessas factos futuros. Ora, quando isto acontece, o credor exequente tem que
alegar e provar documentalmente, no início da ação executiva, logo no requerimento
executivo, que esse facto futuro e incerto já ocorreu, sob pena de se estar a iniciar uma
ação executiva relativamente a uma obrigação que não se sabe se o facto de que ela
está dependente já ocorreu ou não (n.º 1).

Exemplo: Senhorio e inquilino acordaram que a primeira renda só seria paga quando o inquilino,
que é professor, fosse colocado naquela localidade, não podendo o senhorio exigir o pagamento
da renda enquanto o seu inquilino não fosse colocado. Estamos perante uma obrigação de
pagamento de quantia certa dependente de um facto futuro e incerto. Aqui o exequente-senhorio
tem que provar, no requerimento executivo, que o facto futuro já ocorreu.

Todavia, por vezes, a demonstração da verificação do facto futuro e incerto não é


possível fazer documentalmente, sendo necessário prova testemunhal ou até prova
pericial. Se assim for, o credor deve, logo no requerimento executivo, oferecer as outras
provas (n.º 2).

Nesse caso em que quando a prova da verificação da situação não pode ser feita
documentalmente, terá que ser suscitada a intervenção do juiz para apreciar esses
meios de prova e convocar audiência de produção de prova (n.º 3). O juiz poderá,
nesses casos, mesmo com a prova complementar, ouvir o devedor antes de proferir a
decisão, para este oferecer contraditório, no que toca à formação da convicção do juiz
sobre a verificação da condição suspensiva ou não (n.º 3/parte final).

Se isso acontecer, se o devedor ser chamado para ser ouvido, o devedor é citado para
contestar os factos constitutivos da narração factual de que a condição já ocorreu na
perspetiva do exequente, sendo advertido de que, na falta de contestação, se considera

Filipa R. G. 40

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


verificada a condição ou efetuada ou oferecida a prestação, salvo o disposto no artigo
568.º (n.º 4) e a contestação do executado só pode ter lugar em oposição à execução
(n.º 5).

Se o juiz não se convencer que o facto futuro já ocorreu, ou seja, se a obrigação não
for exigível, ele não determina o prosseguimento da ação executiva e a instância
executiva extingue-se ou só avançam na parte que for exigível. Tal pode acontecer nas
execuções pode acontecer quer no processo ordinário para pagamento de quantia
certa, quer, nos termos do artigo 855.º/2 do CPP, nas execuções sumárias para
pagamento de quantia certa.

3. Obrigações a prazo indeterminado e a fixar pelo tribunal: A obrigação, tal como


combinada pelas partes, tem um prazo incerto, pois as partes não combinaram
qualquer prazo.

Nos termos do direito das obrigações (direito substantivo), pode acontecer que a
obrigação esteja sujeita ao regime das obrigações puras e as partes não tenham
combinado prazo. Então, nessas situações, é necessário, por causa da natureza da
prestação ou pelas circunstâncias que a determinaram, que o prazo seja fixado pelo
tribunal, nos termos do artigo 777.º/2 do CC (já o n.º 1 trata das obrigações puras).

Quando isto acontece, quando é necessário que o juiz fixe o prazo da prestação, a ação
executiva atrasa-se muito, pois, enquanto esse prazo fixado pelo juiz não decorrer, a
execução não pode prosseguir. Ou seja, iniciou-se e suspendeu-se a instância
executiva, porque era uma obrigação a prazo indeterminada, cujo prazo teve que ser
fixado por um juiz, prazo esse que, uma vez fixado, tem que decorrer e só depois de
decorrer e de a obrigação não ter sido voluntariamente cumprida é que esta execução
poderá prosseguir.

4. Obrigações exequendas dependentes de prestação (epígrafe do artigo 715.º do


CPC): Trata-se de casos de sinalagma, em que o credor-exequente não satisfez a
contraprestação. Para além das situações de mora do credor, há situações em que num
negócio as contra-prestações são de tal maneira complexas e interligadas, porque há
deveres acessórios e até deveres de conduta ligados ao contrato que cabem ao próprio
credor.

Nesse caso, enquanto o credor não presta a contra-prestação, o devedor pode recusar-
se a cumprir.

Se o credor intenta a ação executiva, porque tem título executivo, ele tem que
demonstrar que já fez essa contra-prestação, ou seja, que não está em mora. Se ele
conseguir fazer esta prova por mero documento no requerimento executivo, a ação
executiva prossegue. Caso contrário, terá que o juiz apreciar sumariamente, se não se
conseguir fazer a prova por documento, a prova produzida.

Filipa R. G. 41

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Aula dia 13 de abril de 2020

8.2.3. Liquidez da obrigação exequenda

A obrigação exequenda é líquida quando é quantitativamente determinada. Por outras


palavras, o que está em causa na liquidez é quanto é que o sujeito passivo deve.

A liquidação está prevista no artigo 716.º do CPC e pode seguir as seguintes formas:

1. Liquidação por simples cálculo aritmético (artigo 716.º/1 do CPC): Quando a


liquidação depende de simples cálculo aritmético, o exequente deve fixar o seu
quantitativo, no requerimento inicial da execução, mediante especificação e cálculo dos
respetivos valores, deduzindo um pedido líquido.

Exemplo 1. A obrigação de pagamento dum preço a determinar de acordo com a cotação (duma
moeda, ação ou mercadoria) verificada em determinado dia.

Exemplo 2. A obrigação de juros já vencidos.

2. Liquidação não dependente de simples cálculo aritmético:

➡ Título executivo extrajudicial (artigo 716.º/4/1ª. parte do CPC): O exequente, no


início da ação executiva, tem que suscitar o incidente declarativo destinado a fixar
(a quantificar) o montante da obrigação exequenda ilíquida, cuja liquidação não
depende de um mero cálculo aritmético, o que faz com que a ação executiva pare.
O executado é citado para a contestar, em oposição à execução, mediante
embargos, com a advertência de que, na falta de contestação, a obrigação se
considera fixada nos termos do requerimento executivo, salvo o disposto no artigo
568.º.

Exemplo: O dono da obra está alegadamente em dívida para com o empreiteiro de


montantes referentes à construção já feita, mas ainda não acabada.

Neste caso, o título executivo é um título extra-judicial - o contrato de empreitada, que é


um documento bastante para o empreiteiro propor uma ação executiva contra o dono da
obra por falta de pagamento do que ele já construiu. Contudo, não é possível determinar o
quanto é que isso representa, por mero cálculo aritmético. Então, tem que se,
eventualmente, proceder-se à prova pericial.

O empreiteiro, como não quer rescindir o contrato, apenas quer que ele seja cumprido, tem
de indicar o montante que, na sua perspetiva, já deveria ter recebido do dono da obra face
ao trabalho já realizado, p. ex., 100.000€.

O dono da obra é citado para contestar em oposição à execução, com a advertência de


que, na falta de contestação, a obrigação considera-se fixada nos termos do requerimento
executivo. Portanto, havendo contestação, é necessário desenvolver diligências
probatórias para se saber e convencer o juiz da execução quanto é que, no momento em
que ação executiva deu entrada em tribunal, o dono da obra poderá estar a dever, para

Filipa R. G. 42

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


essa quantia ser realizada efetivamente através de penhoras no património do dono da
obra.

Portanto, vai haver oposição e isto tudo é um incidente declarativo (por apenso à ação
executiva), vai haver produção de prova e vai haver decisão do juiz a fixar o montante.

O montante que é fixado pelo juiz da execução torna líquida a obrigação


exequenda que era ilíquida e a ação executiva não avançará para se realizar
quaisquer penhoras, enquanto não for quantificado pelo juiz, no incidente
declarativo, o montante exequendo.

➡ Título executivo judicial (uma sentença condenatória) (artigo 716.º/4/1.ª parte do


CPC a contrario sensu): Desde 2003, quando entrou em vigor este sistema
desjudicializado da ação executiva, a liquidação das sentenças condenatórias faz-
se na própria instância declarativa, a seguir ao proferimento da sentença
condenatória que condenou numa obrigação ilíquida, ou seja, em linguagem mais
leiga, reabra-se o processo declarativo e o lesado apresenta um requerimento onde
quantifica os danos que teve.

É uma situação de um pedido genérico (artigo 556º/1/b) do CPC). Conforme este


artigo, quando não é possível, no momento da sentença, numa ação declarativa
condenatória, determinar de modo definitivo as consequências de um facto ilícito,
é possível ao autor da ação formular, na petição inicial, um pedido genérico. Ora,
se o autor pode formular um pedido genérico é porque ele está à espera de uma
condenação genérica, ou seja, que o réu seja condenado num montante que só
posteriormente será quantificado.

Nota: O prazo de prescrição das ações de indemnização fundadas em


responsabilidade civil por factos ilícitos é de 3 anos, a contar do conhecimento
do facto danoso.

É para esta situação, prevista no artigo 556.º/1/b) do CPC, que remete o artigo
716.º/4/1.ª parte do CPC a contrario sensu, ou seja, quando o título executivo é
judicial não se faz a liquidação tal como está no artigo 716.º/4, faz-se a liquidação
ao abrigo do artigo 360.º/3 do CPC, que é um incidente de liquidação de uma
obrigação que consta de sentença condenatória que tenha condenado o réu em
quantias ilíquidas a quantificar em momento posterior na mesma instância
declarativa onde o réu foi condenado nessa quantia ilíquida. Reabrindo a instância
declarativa, terá que haver contraditório e a seguir ao contraditório, à contestação,
seguem-se os termos do processo comum declarativo.

Este incidente não se trata de uma ação executiva! A ação executiva ainda não foi
deduzida, nem pode! Primeiro tem que ser quantificada a quantia, através desse

Filipa R. G. 43

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


incidente de liquidação e, só depois disso, é que pode ser deduzida a ação
executiva.
Exemplo: Um acidente de trabalho em que a vítima é o trabalhador. O empregador tem que
ter um seguro obrigatório de responsabilidade civil, pelo qual transfere a responsabilidade
pela causação de danos aos trabalhadores a empresas seguradoras que assumem esse
risco. Esse trabalhador sofreu um acidente no trabalho sofrendo várias lesões e não
conseguiu chegar a um acordo com a seguradora e intentou uma ação declarativa
condenatória contra a seguradora. Contudo, o trabalhador, na petição inicial, não consegue
logo quantificar os danos atuais e os danos futuros em termos líquidos, uma vez que ainda
terá que fazer algumas cirurgias, ainda terá que ser quantificado eventualmente o grau de
desvalorização e de incapacidade para o trabalho. Por isso, no momento da ação
declarativa condenatória, ele formula um pedido genérico.

Nota 1. Não se pode confundir esta designação pedido genérico com obrigação
exequenda genérica. O pedido genérico, se for julgado procedente, dá origem a
uma sentença condenatória que condenada o réu numa quantia ilíquida que terá
que ser quantificada, após a sentença condenatória ser proferida e sob iniciativa
do autor que ganhou a ação.

Nota 2. Responsabilidade extracontratual por factos ilícitos é responsabilidade


civil objetiva. Para condenar um réu numa indemnização fundada num facto ilícito
é necessário: (1) facto, (2) dano, (3) ilicitude e (4) nexo causal. Não é necessário a
culpa, porque responde-se independentemente dela.

Cont. exemplo: O réu é a seguradora que responde independentemente de podermos


imputar-lhe uma conduta censurável ético-juridicamente. A seguradora responde e pode
ser condenada a pagar, desde o autor da ação declarativa de condenação alegue e prove o
facto, o dano, a ilicitude e o nexo causal.

Provado isto e convencido o juiz destas circunstâncias factuais, afirma a responsabilidade


civil objetiva da seguradora e condena-a:

• Nas despesas que o trabalhador já teve à data da propositura da ação declarativa e


que já podem ser contabilizadas, por exemplo, despesas não comparticipadas pelo
sistema nacional de saúde;

• Numa quantia que será quantificada em momento posterior, após o proferimento da


sentença condenatória, de acordo com o artigo 360.º/3 do CPC (incidente de
liquidação de sentenças condenatórias que tenham condenado os réus em quantias
ilíquidas): quando o incidente seja deduzido depois de proferida a sentença e o réu
contestar seguem-se os termos do processo comum declarativo.

3. Liquidação por árbitros quando o título é extrajudicial (artigo 716.º/6 do CPC):


Quando deva ter lugar, ou seja, quando as partes assim o estipularem, realiza-se, nos

Filipa R. G. 44

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


termos do artigo 361.º do CPC, antes de apresentado o requerimento executivo.

Aplica-se a Lei da Arbitragem Voluntária (Lei n.º 63/2011) para que estes 3 árbitros, que
exercem funções jurisdicionais, quantifiquem uma obrigação ilíquida.

4. Pedido de entrega de universalidade (artigo 716.º/7 do CPC): A iliquidez da


obrigação pode resultar da circunstância da obrigação exequenda ter por objeto
mediato uma universalidade e o autor não possa concretizar os elementos que
compõem essa universalidade. Nestas situações, a liquidação faz-se já dentro da ação
executiva, em momento imediatamente posterior à apreensão, precedendo a entrega ao
exequente.

• Universalidades de facto

Exemplo: uma biblioteca, um rebanho, uma manada.

O beneficiário (por testamento, contrato) da biblioteca ou do rebanho pode requerer a


apreensão, no primeiro caso, dos livros e, no segundo caso, das ovelhas para ser ver quais
desses livros ou ovelhas integram a biblioteca ou o rebanho e quais os livros ou ovelhas
que devem ser excluídos por pertencerem a outras pessoas.

• Universalidades de direito

Exemplo: o estabelecimento comercial.

Alguém tem a obrigação de entregar um estabelecimento, porque cedeu a empresa por


negócio inter vivos (trespasse) ou mortis causa (testamento) e não entregou a empresa em
sentido objetivo. Há uma obrigação de entrega que pode constar de um documento ou de
uma sentença condenatória. Havendo essa obrigação de entrega da coisa, que é o
estabelecimento composta por muitas outras coisas, apreende-se o estabelecimento com
as coisas. Contudo, algumas dessas coisas podem ser de terceiros. Portanto, apreendeu-
se a empresa em sentido objetivo, porque era a universalidade que estava em causa
enquanto obrigação exequenda, mas temos de ver que coisas compõem a empresa e
quais as coisas que não a compõem e que, por isso, são excluídos desta apreensão.

5. Obrigação em parte ilíquida e noutra parte líquida (artigo 716.º/9 do CPC): A ação
executiva pode seguir e prosseguir quanto à parte que está líquida, isto é, que está
quantitativamente determinada, e aguarda os termos da liquidação da parte ilíquida, isto
é, que ainda não está quantitativamente determinada.

Assim, irá se fazer uma execução na parte que já é líquida e, quando a parte que não é
líquida for liquidada e não houver pagamento voluntário, a execução prosseguirá na
outra parte.

Exemplo: O trabalhador que sofre um acidente de trabalho, quando propõe a ação contra a
seguradora, pode já quantificar uma parte dos danos sofridos, caso em que deve quantificar o
montante desses danos logo no requerimento executivo e os outros montantes ficaram
dependentes de liquidação.

Filipa R. G. 45

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


8.2.4. Consequências da incerteza, inexigibilidade e iliquidez

No caso de a obrigação não ser certa, exigível e líquida e de o exequente avançar com a
execução, há falta desse pressuposto processual específico.

Se o processo executivo for de pagamento de quantia certa e seguir a forma:

• Ordinária: É possível o juiz conhecer da questão da iliquidez e pode mandar corrigir


(artigo 726.º/4 do CPC), prosseguindo a ação executiva relativamente à parte líquida e
pára relativamente à ilíquida, por iniciativa do juiz.

• Sumária: Quem intervém no início e toma pela primeira vez contacto com o requerimento
executivo é o agente de execução. O agente de execução, apercebendo-se que há uma
situação de iliquidez, deve suscitar a intervenção do juiz para que este tome uma
decisão: ou indefere liminarmente (p. ex.: a execução é totalmente ilíquida) ou indefere
parcialmente (p. ex.: mandado seguir a execução na parte líquida e determina que o exequente
promova as diligências na parte não líquida).

Quando nem o agente de execução, nem o juiz se aperceberem da incerteza, inexigibilidade e


da iliquidez, o executado pode deduzir oposição à execução mediante embargos de
executado, com base na incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda não
supridas (artigo 729.º/e) do CPC). No final dos embargos de executado, que são ações
declarativas que tramitam por apenso às ações executivas, em que o executado é o autor e o
exequente é o réu, há uma sentença que julga:

- Totalmente procedente os embargos de executado: Extingue-se totalmente a execução;

- Parcialmente procedente os embargos de executado: Extingue-se parcialmente a


execução;

- Improcedente os embargos: Não se extingue a execução.

Esta sentença tem possibilidade de recurso de apelação para a Relação e pode haver até,
eventualmente, recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça. Entretanto, enquanto
não vier uma decisão com trânsito em julgado nesta ação declarativa de embargos de executado,
fica pendente a ação executiva.

Em último caso, se nem o agente de execução, nem o juiz se aperceber, nem o executado
deduzir embargos de executado, em último recurso, sendo impossível tornar a obrigação líquida,
o juiz, nos termos do artigo 734.º/1 do CPC, pode, até ao primeiro ato de transmissão dos
bens penhorados, conhecer oficiosamente da falta deste pressuposto processual, no
sentido de extinguir (total ou ou parcialmente) a ação executiva.

8.2.5. Título executivo

Filipa R. G. 46

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


8.2.5.1. Noção de título executivo

O título executivo é a base da objetiva (coisas) e subjetiva (pessoas: exequente e executado) da


execução. É da leitura do título e a sua interpretação gramatical que nos dá a resposta ao
quanto, que coisas e a quem.

No século XX, houve várias posições de alguns autores italianos: uns que afirmavam que título
era um documento que continha uma obrigação e outros que afirmavam que título não é o
documento, mas sim o ato jurídico documentado. Podemos dar alguma razão a estes últimos, no
caso das sentenças. No caso das sentenças condenatória, além da sentença ser o documento, o
título é também um ato jurídico com um comando. Numa confissão de dívida ou num documento
particular com assinatura reconhecida, existem declarações negociais ou uma única declaração
negocial e temos também título executivo que é o ato documentado.

Independentemente destas polémicas, vamos assentar que o título executivo é um


documento que plasma uma obrigação e que demonstra ou faz prova (ilidível, nos embargos
de executado) de que uma obrigação existe e que ainda existe (não tendo sido cumprida).

Coloca-se, agora, a questão de saber o que é um documento. Do artigo 362.º/2.ª parte do


CC resulta que é um documento qualquer objecto elaborado pelo homem com fim de reproduzir
ou representar uma pessoa, coisa ou facto. Exemplo: Uma fotografia, um vídeo, uma gravação. As
reproduções mecânicas, que são reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos
fonográficos e, de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de
coisa, previstas no artigo 368.º do CC, não deixam de ser documentos. Exemplo: Fotografias,
email, fax, páginas digitalizadas.

Aula dia 21 de abril de 2020

8.2.5.2. Espécies de título executivo

O artigo 703.º do CPC enumera as espécies de títulos executivos previstas na lei


portuguesa:

a) As sentenças condenatórias;

b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais


com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;

c) Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos
da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento
executivo;

d) Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.

Filipa R. G. 47

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Esta é uma lista muito generosa - na previsão de documentos que só por si permitem
intentar imediatamente uma ação executiva - e taxativa/exaustiva - o legislador enumera
exaustivamente os títulos executivos, apesar de a alínea d) esconder muitos títulos executivos
previsto em leis especiais.

Os títulos executivos distinguem-se e dividem-se entre:

➡ TÍTULOS EXECUTIVOS JUDICIAIS: De acordo com o artigo 703.º/1/a) do CPC, as


sentenças condenatórias são títulos executivos. Ora, isto é tomar a parte pelo todo,
pois a expressão sentenças condenatórias diz menos do que o que na realidade é. O
DOUTOR REMÉDIO MARQUES entende que, em vez de sentenças condenatórias, deveria
dizer-se decisões jurisdicionais condenatórias, visto que há mais atos decisórios emitidos
pelos tribunais para além das sentenças, como são os acórdãos e os despachos.

Os acórdãos são decisões jurisdicionais proferidas por orgãos colegiais em que o


tribunal é constituído por 3 ou mais juízes. Os tribunais que emitem acórdãos são
Tribunais da Relação, o Supremo Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Administrativo
e o Tribunal Central Administrativo do Norte e o Tribunal Central Administrativo do Sul.

Os despachos são decisões judiciais que não põem termo ao processo, nem decidem a
causa, decidem apenas uma questão interlocutora a meio do processo.

Exemplo 1. No âmbito do procedimento probatório de apresentação de documentos, há


entidades terceiras, que não são partes, que, por vezes, são solicitadas a juntar documentos que
são indispensáveis para a descoberta da verdade material.

No caso de uma partilha, na sequência de um divórcio ou de uma morte, o réu diz que já pagou,
mas que não tem em seu poder os documentos de pagamento. Então, o banco, que tem nos
seus registos o pagamento feito pelo réu ao autor, pode ser ordenado pelo juiz, enquanto terceiro,
a apresentar esses documentos e o banco tem que colaborar com o tribunal para a descoberta
da verdade, mesmo não sendo parte. Caso o banco não o faça, pagará uma multa por falta de
colaboração para a descoberta da verdade, multa que é infligida a um terceiro (que não é parte)
através de um despacho condenatório.

Exemplo 2. Um hospital que é réu numa ação de indemnização, na sequência de violação de


deveres de cuidado do paciente que entrou são no hospital para fazer um TAC e saiu do mesmo
infetado com um vírus. O autor da ação tem que provar o nexo causal, através dos registos
médicos do hospital, sendo o hospital réu. Se o réu não disponibiliza esses registros médicos
para se analisar a conduta negligente ou correta do hospital, o autor não consegue demonstrar o
facto constitutivo do seu direito que é a existência do nexo causal entre o facto ilícito e o dano. O
tribunal, neste caso, determina a junção do relatório médico do hospital da entrada do paciente
até à sua saída. Se o hospital não o fizer, além de se poder inverter o ónus da prova, ou seja, de
passar a ser o hospital a ter que fazer prova que atuou diligentemente e que a pessoa não
apanhou o vírus na suas instalações, o juiz vai lavrar um despacho aplicando-lhe uma multa.

Filipa R. G. 48

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Serão as sentenças proferidas em ações constitutivas títulos executivos? É o problema
das condenações implícitas. O DOUTOR REMÉDIO MARQUES diria que são título
executivos, mas haverá casos em que será adequado que o autor formule, além do
pedido que visa alterar, modificar, extinguir ou constituir um efeito jurídico, um pedido
subsidiário condenatório, caso o pedido principal venha a proceder, porque, pode ser
duvidoso que, à luz do princípio do dispositivo, uma sentença proferida numa ação
constitutiva possa, por si só, permitir a execução de uma obrigação que decorre da lei
com o proferimento da sentença.
Exemplo 1. O autor de uma ação de preferência, por mero efeito da sentença procedente,
substituiu-se na posição jurídica do adquirente, passando a ser ele o dono e, ao passar a ser o
dono, tem que ter acesso à coisa. Seria injusto que o autor que ganhou uma ação constitutiva
tivesse que internar, com base nessa sentença constitutiva, uma ação declarativa condenatória
de reivindicação. Em muitas destas sentenças proferidas em ações constitutivas, da própria
sentença decorre um efeito jurídico previsto na própria lei. O autor torna-se dono da coisa,
portanto, é natural que possa usar essa sentença para obter a entrega da coisa, no caso de ação
de execução específica ou uma ação de preferência.

Exemplo 2. Mais duvidosos serão naqueles casos em que um mútuo é declarado nulo. O
contrato de mútuo implicou que o mutuante tenha transferido dinheiro para o mutuário. Ao ser
declarado nulo cada parte tem que restituir as prestações efetuadas na sequência do
cumprimento das estipulações da partes. Com isto, podíamos pensar que essa sentença que
decretou a nulidade do contrato de mútuo por si só seria título executivo para obter a restituição
do capital (não dos juros, porque o contrato nulo não poderia gerar juros) e essa é a posição do
DOUTOR REMÉDIO MARQUES e do DOUTOR LEBRE DE FREITAS. Portanto, uma sentença constitutiva
que extingue uma situação jurídica invalidando um contrato permitirá obter coercivamente,
servindo como título executivo, a restituição, neste caso concreto, das quantias mutuadas, não se
tendo que propor uma ação declarativa condenatória.

Posto isto, o legislador não está só a pensar em sentenças condenatórias, pode também
estar a pensar em sentenças proferidas em ações constitutivas das quais resulte, como
efeito normativo decorrente da sentença, uma obrigação legal de entrega.

1. Sentenças proferidas por tribunais estrangeiros, até mesmo fora da UE, em


que os devedores têm bens penhoráveis em Portugal (artigo 706.º do CPC): As
sentenças proferidas por tribunais estrangeiros só podem servir de base à
execução depois de terem sido revistas e confirmadas pelo tribunal português
competente. Contudo, nem sempre isso acontece. O legislador diz sem prejuízo do
que se ache estabelecido em tratados, convenções, regulamentos comunitários e
leis especiais, ou seja, há regulamentos da UE e tratados e convenções

Filipa R. G. 49

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


internacionais de que Portugal é parte que dispensam este processo especial de
revisão e confirmação de sentenças estrangeiras.

Modelos de revisão e confirmação de sentenças estrangeiras

— Processo especial de revisão e confirmação de sentenças estrangeiras


(artigo 978 e ss. do CPC)
O processo especial tem que ser instaurado pela pessoa que ganhou esse
processo no estrangeiro e consoante a proveniência, por vezes, o interessado
em executar em Portugal a sentença estrangeira, porque tem bens em Portugal
penhoráveis, para intentar ação executiva, tem que obter uma decisão
(declarativa) proferida por um tribunal português (de 2.ª instância) que analise
vários requisitos que têm que estar verificados sob pena de não confirmar e
rever essa sentença estrangeira. Esses requisitos são os previstos no artigo
980.º do CPC.

Todas as sentenças condenatórias de países como Brasil, Angola, Canadá e Estados


Unidos, por não haver nenhum tratado ou convenção entre a república portuguesa e
esses países que regule especificamente o reconhecimento e a execução de decisões
proferidas destes outros Estados, tem que se seguir o regime processual civil interno
português.

Já as decisões proferidas por países da UE são reconhecidas automaticamente e são


executadas sem que seja necessário requerer declaração de executoriedade.

— Convenção de Lugano sobre competência internacional, reconheci-


mentos de sentenças estrangeiras e execução de decisões em matéria
civil e comercial

No caso de a sentença condenatória provier de um dos seus Estados


contratantes: Estados-membros da UE e Estados não membros que integram a
associação de comércio livre (Noruega, Suíça, Islândia e Dinamarca).

A sentença estrangeira proveniente de um Estado contratante tem que obter


em Portugal uma declaração de executoriedade, que se obtém através de um
pedido simples, no tribunal de 1.ª instância do lugar da execução. O lugar da
execução há-de coincidir com o lugar em Portugal onde os bens penhoráveis
estejam situados. Depois de o juiz declarar o exequátur (as causas de recusa do
exequátur estão previstas na convenção) é que o requerido vai ser informado e
poderá opor-se. Entretanto, o requerente já tem, além da sentença no
estrangeiro, a sentença do exequátur e com estes dois documentos já pode
intentar ação executiva em Portugal.

Filipa R. G. 50

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


— Regulamento da UE 1215/2012

Vincula todos os Estados-membros, à exceção da Dinamarca e seu território


ultramarino (Gronelândia).

É modelo mais ligeiro e desformalizado de execução de sentenças estrangeiras


em Portugal, não sendo sequer necessária qualquer declaração de
executoriedade - artigo 39.º e ss. do Regulamento, sobretudo o artigo 42.º, que
prevê os requisitos para que a execução num Estado-Membro de uma decisão
proferida noutro Estado-Membro: o requerente (o futuro exequente) deve
facultar às autoridades de execução competentes (autoridades portuguesas)
uma cópia da decisão que satisfaça as condições necessárias para atestar a
autenticidade da decisão e uma certidão que comprove que a decisão é
executória no país que a emitiu e incluir o estrato de decisão. A autoridade de
execução competente (autoridade do tribunal português) pode, se necessário,
exigir que o requerente apresente uma tradução do conteúdo da decisão.

2. Sentenças condenatórias proferidas por órgãos jurisdicionais de sujeitos de


direito internacional público, a que Portugal esteja vinculado.

P. ex., o Tribunal Geral da União Europeia, o Tribunal de Justiça da União Europeia,


Tribunal da EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio), Tribunal Europeu dos
Direitos do Homem.

Em todo o caso, é necessário que estejam cumpridos os requisitos de exequibilidade


da sentença, requisitos esses previstos no artigo 704.º do CPC.

A regra geral, de acordo com o n.º 1, é que a sentença só constitui título executivo
depois do trânsito em julgado (contra esta sentença já não é possível interpor recurso
ordinário ou reclamação, neste caso a sentença estabilizou/cristalizou, não pode ser
modificada). Todavia, essa regra comporta exceções, ou seja, é possível executar
provisoriamente uma sentença quando ainda está pendente um recurso ordinário que
contra ela foi proposta, de acordo com o o n.º 1/parte final, se o recurso contra ela
interposto tiver efeito meramente devolutivo, já se o recurso tiver efeito suspensivo
não é possível executá-la provisoriamente, é necessário esperar pela decisão final.

Que recursos é que são cabíveis de sentença condenatória proferidas por


tribunais judiciais em 1.ª instância?

Antes de mais, desde 2008, o sistema é monista, porque há só uma espécie de


recursos que se interpõem da 1.ª para a 2.ª instância e desta para o STJ também é só
uma espécie.

Filipa R. G. 51

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Da 1.ª instância para a Relação interpõe-se recurso de apelação, da Relação para


o STJ interpõe-se recurso de revista.

— O recurso de apelação: O efeito regra do recurso de apelação é o efeito


meramente devolutivo (artigo 647.º/1 do CPC), ou seja, o tribunal de 1.ª
instância, através da interposição do recurso, devolve a parte decidida e
impugnada para o tribunal de 2.ª instância (Relação) e aí é iniciada uma nova
instância e o comando condenatório inscrito na decisão de 1.ª instância pode ser
cumprido coercivamente na pendência do recurso, isto é, a interposição do recurso
não suspende a produção de todos os efeitos. Pode ainda produzir outros efeitos,
como o efeito executivo.

Todavia, há casos excecionais em que o recurso de apelação pode ter efeito


suspensivo, ou seja, o ajuizamento do recurso suspende o comando da sentença
objeto de recurso (artigo 647.º/2, 3 e 4 do CPC).

— O recurso de revista tem por objeto o acordão da Relação, na parte em que o


recorrente impugna aspetos decisórios desse acordão, sobretudo violação de lei
substantiva ou de lei processual, pois o STJ não conhece matéria de facto, apenas
conhece matéria de direito.

O efeito regra do recurso de revista é o efeito meramente devolutivo. Só há efeito


suspensivo para questões sobre o estado das pessoas (artigo 676.º/1 do CPC), p.
ex., ações de anulação de casamentos, ações de divórcio, ações destinadas a adotar
medidas de acompanhamento.

No caso de execução iniciada na pendência do recurso (artigo 704.º/2 do CPC), ela


vai sofrer os efeitos da decisão do tribunal de recurso:

- Se a decisão condenatória foi revogada parcialmente, porque o recurso foi


parcialmente procedente, a execução iniciada modifica-se, mantendo-se sob forma
modificada.

- Se a decisão condenatória foi revogada totalmente, porque o recurso foi


totalmente procedente, a execução iniciada extingue-se (extinção total da ação
executiva). O que acarreta, por exemplo, o levantamento das penhoras já feitas e o
cancelamento dos registos de penhora.

Atenção que o tribunal de recurso não pode colocar o recorrente numa situação pior do
que ele se encontrava, por isso não pode determinar uma obrigação maior.

Durante a pendência do recurso, nem o exequente nem os credores podem ser


pagos pelo produto da venda dos bens penhorados sem prestar caução (artigo

Filipa R. G. 52

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


704.º/3 do CPC). Isto é assim porque se o recurso for julgado procedente esta execução
era ilegal e praticamente consumaram-se efeitos irreversíveis. Assim, só se paga ao
exequente o produto da venda dos bens penhorados se o exequente, por exemplo,
constituir uma garantia bancária em que que se o recurso for julgado procedente o
banco paga o montante penhorado e devolve o montante ao executado.

No artigo 704.º/4 do CPC há umas particularidades relativas à casa de habitação


efetiva do executado. Trata-se de uma odeia de tutela da casa da habitação efetiva do
executado. Ela pode ser penhorada, mas enquanto a sentença não transitar em julgado
não pode o agente de execução vender a casa de habitação e o juiz pode determinar, a
requerimento do executado, que a venda da casa de habitação efetiva aguarde a
decisão definitiva do tribunal de recurso.

3. Sentenças proferidas por Tribunais Arbitrais (mesmo os tribunais arbitrais que


funcionam no estrangeiro) (artigo 705.º do CPC)

Os tribunais arbitrais são tribunais privados que se constituem com base na


autonomia da vontade e da liberdade contratual, através de uma convenção de
arbitragem - isto na arbitragem voluntária.

Uma vez constituídos e aprovadas as regras processuais pelas partes ou


determinadas unilateralmente pelo juiz árbitro, a sentença proferida pelo tribunal
arbitral tem o mesmo valor de uma sentença proferida pelo tribunal do Estado - a
força executória é revestida de garantias de direito público.

Os requisitos para que uma sentença condenatória proferida por um tribunal


arbitral que foi constituído e julgou no estrangeiro ser título executivo em Portugal
estão previstos na Convenção de Nova Iorque de 1958 sobre reconhecimento e
execução de sentenças arbitrais, de que Portugal faz parte. O juiz do tribunal da
execução em Portugal, ainda que sob pedido do executado em embargos de
executado, pode conhecer de causas que impedem a execução, por exemplo, a
decisão arbitral que viola o caso julgado ou que viole uma norma de competência
exclusiva ou viole a ordem pública internacional do Estado português.

4. Sentenças homologatórias (de transação, de confissão do pedido e de partilha de


bens em inventários)

São sentenças, não no sentido tradicional de o juiz apreciar e julgar factos e fazer
qualificações jurídicas, mas são sentenças proferidas em ações que foram
ajuizadas por um autor contra o réu, que condenam e absolvem e que têm o
mesmo valor das sentenças condenatórias.

As sentenças homologatórias homologam o negócio jurídico processual, que pode

Filipa R. G. 53

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


ser um negócio jurídico bilateral (contrato processual - transação efetuada entre autor e
réu) ou um negócio jurídico unilateral (confissão do réu no pedido total ou parcialmente).

➡ Sentenças homologatórias de confissão de pedido ou de transação

O artigo 290.º do CPC diz-nos como se realiza a confissão do pedido ou a


transação (a desistência não nos interessa). Do n.º 2 resulta que há uma termo
tomado pela secretaria a simples pedido verbal dos interessados. As partes,
no caso de uma transação, juntam o requerimento a dizer que chegaram a
um acordo e juntam o acordo assinado por elas. O juiz, de acordo com o n.º
3, examina se pelo objeto e pela qualidade das partes, a transição ou a
confissão é válida, porque há situações de direitos indisponíveis que não
podem ser objeto de transação nem de confissão. Se entender que os
requisitos estão verificados homologa, a sentença homologatória declara a
desistência, a transação ou a confissão do pedido, condenando-se ou
absolvendo-se nos seus precisos termos (em que as partes realizaram o
negócio jurídico ou em que a parte declarou que devia).

Exemplo: O juiz homologa o acordo de transação e condena o réu a pagar. Se há


uma transação, tem que haver cedências recíprocas de autor e réu e o juiz, para
homologar a transação, também tem que ver que o autor também cedeu.
Imaginemos que o autor pediu que se condenasse em 100 euros, mas, entretanto, o
autor e o réu chegaram ao seguinte acordo: o réu pagará imediatamente 60 euros
sem juros de mora e o autor abdica dos 40 euros. Como houveram cedências
recíprocas, o juiz, neste caso concreto, deve homologar. Ao homologar está também,
esta sentença homologatória, a condenar o réu a pagar aqueles 60 euros que ele
próprio reconheceu que queria pagar e que o autor concordou e reconheceu receber.

Estas sentenças homologatórias pressupõem o exercício da auto-


determinação da vontade. A atividade jurisdicional (do juiz) é a de apenas
controlar a formação da vontade, os vícios quanto à formação da vontade e
os direitos indisponíveis que possam ser objeto destes negócios, ele não vai
apreciar e julgar os factos.

Exemplo: Controlar se a transação tem subjacente um negócio simulado, visto que a


simulação é de conhecimento oficioso e um negócio simulado não deve ser objeto de
transação e se o juiz desconfiar que se trata de um negócio simulado não homologa
a transação.

Posto isto, as sentenças homologatórias de transação e de confissão de


dívida são também títulos executivos judicias, embora a doutrina antiga (o
próprio DOUTOR REMÉDIO MARQUES e DOUTOR ANSELMO DE CASTRO) dissesse
que eram títulos judiciais impróprios, no sentido de a função jurisdicional do

Filipa R. G. 54

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


juiz é apreciar e julgar factos e fazer qualificações jurídicas, logo seriam títulos
judiciais impróprios desta tarefa que é específica dos tribunais.

A realidade é que o artigo 290.º/3 do CPC trata estas sentenças


homologatórias como quaisquer sentenças condenatórias, então o resultado
é que são títulos judiciais.

➡ Sentenças homologatórias de partilhas dos bens comuns na sequência


de morte ou divórcio

Estas sentenças também homologam a vontade dos interessados, pois a


composição dos quinhões é feita, sobretudo, através de declarações de
vontade. Os interessados, de comum acordo, podem e devem combinar
formas de compor os seus quinhões. E estas sentenças fazem terminar o
processo de partilha.

Exemplos: Vender os bens todos e dividir o preço; um deles fica com os bens da
herança e compromete-se a pagar em dinheiro os quinhões dos outros; fazer sorteios
ou licitações.

➡ TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDICIAIS (artigo 703º/1/b) e c) + 707.º do CPC):

1. Documento autênticos (artigo 707.º/b) do CPC e 369.º e ss. do CC): É um


documento exarado ou lavrado por notário, conservador de registo ou funcionário
da conservatória com poderes delegados pelo titular da conservatória de registo,
em papel timbrado do serviço, e que contém uma declaração (testamento) ou
várias declarações de vontade (contrato).

O notário, conservador ou outra entidade que pode exarar, tem que perguntar se o
outorgante ou outorgantes querem aquele resultado e explicar as suas
consequências. No fim, o documento deve ser assinado pelos outorgantes e o
notário, conservador ou funcionário.

2. Documento (particular) autenticado (artigo 707.º/b) do CPC): É um documento


particular, escrito pela(s) parte(s) nas folhas que lhe(s) aprouver (desde que não se
torne o documento elegível), que ela(s) leva(m) a alguém que tenha poderes públicos
para autenticar documentos particulares (ao notário, câmaras de comércio e
indústria, advogados ou solicitadores) para autenticar a assinatura - termo de
autenticação -, de acordo o cartão de cidadão, e depois assina(m).

Quer os documentos autênticos quer os documentos particulares autenticados


assinados pelo devedor são títulos executivos, se e quando, deles constar a
constituição (o documento constituiu a obrigação) ou o reconhecimento (se a obrigação
estiver anteriormente constituída e o documento só reconhece essa obrigação -
documentos recognitivos de obrigações constituídas antes, p. ex., testamento onde se
estabelece encargos) de qualquer obrigação. 55
Filipa R. G.

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


3. Documentos eletrónicos: Para ser um documento particular tem que ter a
assinatura lavrada do devedor e do autor desse documento. Segundo o decreto
que rege os documentos eletrónicos, estes podem ser equiparados a documentos
particulares, se quem os assinar o fizer à luz de uma assinatura digital avançada.
Quem usa assinaturas digitais avançadas são os advogados, os solicitadores,
funcionários de bancos, funcionários de seguradoras. Quem assina um
documento assim e o envia através da internet para um destinatário, as
declarações negociais que nele constam têm a mesma força que as folhas físicas
de documentos particulares. Contudo, ainda que a assinatura digital avançada
seja equiparada à assinatura física, para um documento eletrónico ser título
executivo precisa de ser reconhecida por um notário ou solicitador.

Nos documentos particulares cuja assinatura tem de ser autenticada tivemos


um problema a partir de setembro de 2013, data da entrada em vigor do novo
CPC.

O artigo 6.º/3 da Lei n.º 41/2013 (lei que aprovou o novo CPC), que contém uma
regra de sucessão de leis no tempo, é uma norma que regula o alcance da lei
antiga, perante o domínio de aplicação da lei nova, segundo a qual o novo CPC,
relativamente aos títulos executivos, só se aplica às execuções instauradas após a
sua entrada em vigor. Assim, o artigo 703.º do CPC só se aplica as ações executivas
instauradas a partir do dia 1 de setembro de 2013. Contudo, surge um problema:
Antes do dia 1 de setembro de 2013, eram títulos executivos os documentos
particulares meramente assinados sem reconhecimento pelo notário, advogado ou
solicitador, se neles constasse a constituição ou reconhecimento de uma obrigação. A
partir do dia 1 de setembro de 2013, estes documentos deixaram de ser título
executivo e não puderam ser usados nas ações executivas instauradas pelos
credores a partir dessa data.

O problema que aqui se gerou foi a alegada constitucionalidade material deste n.º
3 do artigo 6º, porque os credores que, anteriormente a 1 de setembro de 2013,
tinham em seu poder uma confissão de dívida que configurava título executivo, após
1 de setembro de 2013, essa confissão perdeu força executiva, deixando o credor de
a poder usar para instaurar imediatamente uma ação executiva contra a pessoa que
reconheceu que lhe devia. Em alguns destes casos, os executados, nas ações após 1
de setembro de 2013, com base nestes documentos cuja assinatura deles não foi
reconhecida, começaram a embargar executado, alegando que não podiam estar a
ser executados porque o título não era exequível e que a execução tinha que terminar
imediatamente.

Filipa R. G. 56

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Isto gerou a prolação de vários acórdãos da Relação de Coimbra, Lisboa e Évora
no âmbito de ações executivas pendentes após o dia 1 de setembro de 2013, onde
esta norma transitória (do n.º 3 do artigo 6.º) foi julgada inconstitucional, nesses
casos concretos.

O Tribunal Constitucional que depois reanalisou estas decisões da Relação foi


concordando e entendeu que, nos casos concretos, que esta norma era
materialmente inconstitucional por violação do princípio do Estado de direito, na
vertente da confiança dos cidadãos perante alterações legislativas que teriam
alterado o fundamento desse investimento na confiança.

O Tribunal Constitucional ao declarar, em sede de fiscalização concreta, em 3


casos concretos, a inconstitucionalidade desta norma, concordando com os
tribunais da Relação, a norma (o artigo 6.º/3) deixa de existir no ordenamento jurídico
português, com força obrigatória geral. Foi o que aconteceu através do Acordão
408/2015 do TC, o TC declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade
da norma do artigo 6.º/3.

Assim sendo, um credor que esteja munido de um documento particular assinado


pelo devedor cuja assinatura não esteja reconhecida e tenha em seu poder esse
documento antes de 1 de setembro de 2013, pode, após esta data, instaurar uma
ação executiva juntando esse documento que à luz da lei atual não é título executivo,
mas que à luz da lei antiga era título executivo.

À primeira vista, ao colocarmo-nos na posição do credor, parecia uma situação de


correção de injustiça material das relações feita pelo TC. Todavia, segundo os
princípios de sucessão de leis no tempo quanto a títulos executivos, deve-se aplicar,
para definir o que é título executivo, a lei que estiver em vigor à data em que a
ação executiva é ajuizada, pois, em rigor, a ação executiva só nasce com o
incumprimento e, no momento do incumprimento, há uma lei qualquer que diz quais
são os títulos executivos e é em função dessa lei que o credor tem que atuar. Foi este
o entendimento da comissão que aprovou este Código e que, em 2015, veio a ser
declarada inconstitucional pelo TC.

O DOUTOR REMÉDIO MARQUES critica o entendimento pela inconstitucionalidade,


porque:

1) Os credores podem sempre obter rapidamente título executivo contra o devedor


que assinou o documento, mas cuja assinatura não está reconhecida;

2) Entre o momento entre a aprovação do Código e o momento da sua discussão


passaram-se mais de 6 meses, ou seja, os credores de obrigações poderem
saber com antecedência o que se estava a preparar.

Filipa R. G. 57

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Posto isto, não se pode dizer, em rigor, que houve uma violação do investimento
da confiança que ataca os alicerces de uma situação de investimento de
confiança.

Seja como for, nas ações executivas instauradas a partir do dia 1 de setembro de
2013, os documentos particulares assinados pelo devedor cuja data seja posterior e
inclusive ao dia 1 de setembro de 2013, à luz da declaração de inconstitucionalidade,
já têm que ter a assinatura reconhecida.

Relativamente à exequibilidade destes documentos (documentos autênticos e


documentos particulares) temos o artigo 707.º do CPC.

A exequibilidade está sujeita a medidas especiais, porque a exequibilidade desses


documentos é também um conteúdo contratual algo diferente e estamos a falar de
negócios reais.

Note-se que temos negócios jurídicos quoad effectum e negócios jurídicos quoad
constitutionem, só estes últimos é que são os negócios reais:

• O negócio jurídico quoad effectum significa que os efeitos jurídicos produzem-se


por mero efeito das declarações negociais (verbais ou plasmadas em
documentos), se não estiverem sujeitas a termo ou condição.

• O negócio jurídico quoad constitutionem para ser eficaz e perfeito necessita


ainda de um ato/conduta anterior ao acordo de vontades de uma das partes. Se
essa conduta não existir o negócio não se perfeciona, ainda que possa ser
válido.

Exemplo: O contrato de depósito consiste em alguém, dono ou usufrutuário de mercadorias


ou coisas, combina com o outro que este lhe guarde e vigie os bens em troca de uma quantia
pecuniária. Este negócio jurídico só com o acordo das partes não está perfecionado, o
negócio só está completo quando o dono das mercadorias as entregar ao depositário para
este as guardar. Assim é necessário uma ato/conduta ulterior de uma das partes, o
depositante, sem o qual o contrato de depósito não se haja perfeito.

Exemplo: No contrato de mútuo não é suficiente para a perfeição e eficácia do negócio o


acordo de vontades. É necessário que a instituição bancária transfira as disponibilidades
monetárias para a conta aberta pelo mutuário. Só a partir deste ato real do mutuante é que o
negócio jurídico está perfeito. Só a partir deste ato é que o mutuante (banco) pode alegar
incumprimento ao exigir as prestações em dívida ou todas as prestações se o mutuário não
pagar as prestações todos os meses com juros.

Este artigo vem-nos dizer que nestes negócios jurídicos reais quanto à
constituição que prevêem obrigações ou prestações futuras, para serem títulos

Filipa R. G. 58

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


executivos é necessário que estes documentos autênticos ou particulares
autenticados sejam acompanhados de um outro documento particular com força
executiva própria que demonstre que alguma prestação foi realizada para a conclusão
do negócio ou que alguma obrigação foi constituída na sequência da previsão das
partes.

Exemplo: Uma pessoa faz um financiamento bancário para comprar um apartamento e o


banco aprova o financiamento de 100 mil euros. Este negócio jurídico de mútuo obedece a
forma escrita. Então, chamam o notário e redigem escritura pública do contrato de mútuo
(ainda que não seja necessário), em que o banco se compromete a emprestar a quantia de
100 mil euros, com certas condições, e o mutuário aceita. Além disso, para este contrato de
mútuo de perfecione é necessário que o banco transfira efetivamente os 100 mil euros para a
conta do mutuário. O mutuário tem que assinar outro documento particular cuja assinatura
dele será reconhecida por notário, advogado ou solicitador, além desta escritura pública de
mútuo, em que o mutuário reconheça que o dinheiro que pediu emprestado já lhe foi
depositado. Neste momento, o contrato de mútuo já foi constituído e já há prestações futuras
que são exigíveis pelo banco e todos os meses o mutuário vai ter que pagar aos banco a
quantia x por y anos. Se não pagar uma prestação, o banco pode entender que se vencem
todas, havendo a perda do benefício do prazo. O banco junta a escritura de mútuo mais o
documento particular autenticado no qual o mutuário reconhece que na sequência da
convenção do mútuo ele, mutuário, já teve em determinado dia o dinheiro na sua conta para o
usar.

Exemplo: Num contrato de abertura de crédito, uma sociedade combina com o gerente do
banco que este todos os meses deposite 100 mil euros com plafond máximo de 1 milhão ao
ano. Este contrato prevê a constituição de obrigações futuras. Através da primeira declaração
unilateral do empresário, o banco obriga-se a transferir o valor combinado e os dois
concluíram o contrato de mútuo. O empresário também terá que assinar o documento
particular em que reconhece que na sequência da constituição daquela ordem o banco lhe
transferiu 10 mil euros, cuja assinatura tem que ser reconhecida por advogado, notário ou
solicitador. Se o empresário não pagar o capital e os juros, o banco pode intentar
imediatamente uma ação executiva e usar como título executivo o contrato de abertura de
crédito e o documento particular assinado pelo devedor em que ele pedia dinheiro.

4. Título de crédito (artigo 703.º/c) do CPC): É igualmente um documento


particular.

Exemplo: letra, livrança e cheque.

Os títulos de crédito, enquanto documentos particulares, são títulos executivos


independente das assinaturas não estarem reconhecidas pelo notário, solicitador e
advogado.

Filipa R. G. 59

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


O problema surge com a expressão ainda que por meros quirógrafos. Coloca-se a
questão de saber o que é um quirógrafo de um título de crédito. O quirógrafo é
um sucedâneo de um título de crédito que já não vale como título de crédito. Esse
documento, que valia como título de crédito na relação cambiária, deixa de valer
como título de crédito, porque os requisitos formais para valer como título de
crédito não estão ou não foram cumpridos.

Exemplo: O portador do cheque à ordem deixa passar mais de 8 dias para o levantar e
apresentar a pagamento ao banco. Não pode usar este título de crédito e a relação
cambiária não é exercida. Então este documento/papel deixa de ter o valor de título de
crédito (cheque), quanto muito pode ter valor de quirógrafo de cheque, porque o cheque
está subjacente uma relação fundamental o contrato que deu origem à emissão do
cheque. A parte final desta alínea c) permite que esse papel, que já não tem valor de
cheque, possa ser título executivo enquanto mero documento particular, cuja assinatura
não está reconhecida, se e quando no requerimento executivo o exequente alegar os
factos subjacentes à existência daquele montante em dívida.

O cheque perdeu as características da abstração legal, apesar disso o beneficiário da


ordem de pagamentos que é um credor pode provar que é credor e pode alegar, no
requerimento executivo, os factos constitutivos do seu crédito (venda de mercadorias,
prestação de serviços) e que tal não foi pago. Mas note-se que exequente e executado
tem que estar nas relações imediatas, não mediatas.

8.2.5.3. Consequências da falta de apresentação de título executivo

Se der entrada no tribunal um requerimento executivo desacompanhado do título que lhe


serve de base ou acompanhado de um título que nada tem a ver com a execução instaurada:

• Quando seja manifesta a falta ou insuficiência do título, tem lugar o indeferimento do


requerimento executivo pelo juiz - despacho de indeferimento liminar (artigo 726.º/2
do CPC);

• Não o sendo, o que é a regra, pois dificilmente resulta do requerimento executivo que a
falta é manifesta, o juiz deve convidar o exequente a suprir a irregularidade,
apresentando o título em falta ou corrigindo o requerimento inicial (no prazo de 10 dias) -
despacho de aperfeiçoamento (artigo 726.º/4 e 5 do CPC).


Filipa R. G. 60

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Aula dia 28 de abril de 2020

II. PROCESSO ORDINÁRIO DE EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE


QUANTIA CERTA

1. Formas de execução comum para pagamento de quantia certa: processo ordinário


(artigo 724.º do CPC) e processo sumário (artigos 855.º e 856.º do CPC)

De acordo com o artigo 550.º/4 do CPC, o processo comum para entrega de coisa certa e
para prestação de facto segue forma única, independentemente do tipo ou valor da coisa a
entregar e independentemente do título executivo que alicerça essa entrega ou a prestação de
facto.

O que varia, no que toca ao processo comum, quando a obrigação exequenda se traduz no
pagamento de uma quantia certa. O processo executivo para pagamento de quantia certa
pode tramitar sob:

• Forma de processo especial (artigos 878.º e ss. do CPC): Não se estudam em DPCIII.

Exemplos: Execuções por alimentos; execução de alimentos devidos a menores; execuções


fiscais em que a obrigação tributária não foi voluntariamente paga.

• Forma de processo comum, que engloba (artigo 550.º/1 do CPC):

- Forma de processo ordinário;

- Forma de processo sumário (artigo 550.º/2 do CPC).

De 2003 a 2013, em que a ação executiva em Portugal era desjudicializada, estava previsto no
Código que processo executivo comum para pagamento de quantia certa tramitava sob forma
única, não havendo diferença entre processo sumário e o processo ordinário. Contudo, essa
afirmação era equivocada, porque era uma tramitação sobre forma única que, logo no início da
ação executiva, se bifurcava, ou seja, na prática havia várias tramitações. Foi esse equívoco que o
legislador no novo CPC quis desfazer, determinando que há duas formas de processo executivo
quando a obrigação exequenda é uma quantia pecuniária.

Entre a forma de processo especial e a forma de processo comum existe uma relação de
especialidade e subsidiariedade, o que significa que as formas de processo especiais
prevalecem sobre a forma de processo comum (artigo 546.º do CPC).

1.1. Diferenças entre a forma de processo ordinário e a forma de processo sumário na


fase inicial

Se for aplicado o processo executivo comum para pagamento de quantia certa na forma
sumária, o executado só sabe que está a ser executado quando os bens ou uma parte deles

Filipa R. G. 61

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


forem penhorados. Depois de penhorados, o agente de execução cita o executado para pagar ou
opor-se. Ou seja, a penhora dos bens antecede a citação do executado para pagar ou opor-se
à execução ou à penhora.

Se for aplicado o processo executivo comum para pagamento de quantia certa na forma
ordinária, se o juiz entender que não há falta de pressupostos processuais (gerais e específicos),
ordena que o executado seja citado para pagar ou opor-se à execução, ou seja, há citação
prévia. Só haverá penhora quando o executado não se opuser à execução, por embargos de
executado no prazo, ou, opondo-se à execução, esta oposição venha a ser julgada total ou
parcialmente improcedente.

1.2. Quando se aplica a tramitação sob a forma processo ordinário ou sob a forma de
processo sumário

A escolha pela forma de processo executivo sumário para pagamento quantia certa
assenta em 3 critérios:

1) Natureza/espécie de título executivo que o credor exequente dispõe:

• Artigo 550.º/2/a) e 85.º/1 do CPC: Em decisão arbitral ou judicial nos caos em que
esta não deva ser executada no próprio processo.

As decisões judiciais condenatórias e as decisões judiciais condenatórias


proferidas por tribunais arbitrais são os títulos executivos mais fortes e
poderosos, em termos de probabilidade de a obrigação exequenda ainda existir e
não ter sido voluntariamente cumprida. Eles dão mais garantia ao sistema de que
determinado indivíduo que se diz credor, em princípio, tem esse crédito a seu favor
e que um outro indivíduo, o que ele diz que é seu devedor, ainda não pagou
voluntariamente esse montante. Dada essa maior força, o legislador permite ao
credor desencadear uma ação executiva e obter a penhora de bens do seu
devedor executado, antes deste saber que está a executado - efeito surpresa.

• Artigo 550.º/2/b) do CPC: Em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta


fórmula executária.

O requerimento de injunção no qual tenha sido aposta fórmula executória é


um título executivo que não é muito forte, mas faz presumir que o devedor não se
interessa por cumprir voluntariamente.

Trata-se de um título executivo extrajudicial previsto no artigo 703.º/1/d) do CPC e


regulado por legislação avulsa (no DL n.º 269/98, de 1 de setembro).

No artigo 7.º do DL n.º 269/98 temos a noção do que é o procedimento de


injunção: considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força

Filipa R. G. 62

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


executiva a requerimento (apresentado por um alegado credor) destinado a exigir o
cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1º do diploma preambular
(…).

O legislador partiu do pressuposto de que há imensas situações em que o devedor


não vai discutir a existência da sua dívida perante um alegado credor e se não vai
discutir nem opor-se a ela, então, nada melhor do que o sistema jurídico de direito
privado estabelecer um procedimento que permita rapidamente formar título
executivo sem que se tenha de passar por uma ação declarativa condenatória
contra o devedor.

O legislador português optou, em 1998, nestas situações em que se presume com


grande probabilidade o devedor não vai contestar o débito, por não desjudicializar
este procedimento, mas por um procedimento administrativo, em que o
requerimento de injunção é dirigido a um funcionário público, a uma secretaria
judicial designado Balcão Nacional de Injunções (BNI), que é uma balcão
electrónico que fisicamente está sediado na secretaria judicial da Comarca do
Porto.

Se o requerimento for subscrito por um mandatário, solicitador ou advogado vai ter


que ser enviado eletronicamente; se for o próprio credor, pode ser em formato
papel. Sendo, em ambos os casos, um formulário. Este formulário é preenchido
e enviado para essa secretaria e, conforme o artigo 12.º do DL n.º 269/98, a
secretaria judicial, no prazo de 5 dias após receção deste requerimento,
notifica o requerido (o alegado devedor), por carta registada coma aviso de
receção, para que este em 15 dias pagar ao requerente a quantia pedida ou
deduzir oposição. Se depois de notificado o requerido (alegado devedor):

- De acordo com o artigo 14.º/1, não deduzir oposição, o secretário aporá no


requerimento de injunção a seguinte fórmula (expressão): este documento
tem força executiva e p requerimento de injunção transforma-se em título
executivo. Este é um título extrajudicial, porque a sua formação não tem
qualquer intervenção de juiz no seu processo formativo, nem se indaga o
mérito da obrigação que o requerente alega que o requerido tem para com
ele.

- De acordo com o artigo 16.º, deduzir oposição (no prazo de 15 dias) vai ter
lugar um processo declarativo de condenação, sendo o requerimento e a
oposição enviados pelo secretário do BNI, para o tribunal judicialmente
competente (em razão de matéria hierarquia e valor), iniciando-se aí processo
declarativo especial relativamente à apreciação do mérito desta obrigação -
artigo 17.º.

Filipa R. G. 63

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Normalmente este expediente administrativo para obter título executivo usa-se por parte de
empresas de telecomunicações, fornecedores de água, de luz, seguradores. Portanto, as
quantias são, normalmente, pequenas. Por esta forma as empresas conseguem obter o
título executivo e provar o incumprimento e ao provarem o incumprimento podem, em
termos de direito tributário, reaver o IVA (23%) que pagaram ao Estado quando forneceram
o serviço.

2) Existência ou não de direito reais de garantia constituídos anteriormente a favor do


exequente:

• Artigo 550.º/2/c) do CPC: Em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida,


garantida por hipoteca ou penhor.
Parece justo que nos casos em que a dívida já está vencida seja possível, no
requerimento executivo, o exequente alegar que já interpelou o devedor e mostrar
que há um direito real de garantia sobre bens do devedor ou de terceiro, que foi
constituído para o cumprimento desta obrigação.

O alegado devedor constituiu um direito real de garantia (penhor ou hipoteca) sobre


o seu património ou sobre património de terceiro, por isso ele sabe que pode ser
executado se não pagar e que há bens especificamente destinados à satisfação
dessa obrigação. Bens esses que ele voluntariamente colocou à disposição, em
termos de penhor ou de hipoteca, ao credor, que servirão para saldar direitos essa
dívida.

O DOUTOR REMÉDIO MARQUES entende que não há uma desproporção manifesta, à


luz do princípio da proporcionalidade lato sunsu, que o legislador tem que observar
sob pena de as leis do Parlamento e os decretos-lei do Governo serem
materialmente inconstitucionais.

3) Valor da execução:

• Artigo 550/2/d) do CPC: Em título extrajudicial de obrigação pecuniária vencida


cujo valor não exceda o dobro da alçada do tribunal de 1ª instância.

A obrigação pecuniária vencida significa que o requerente-exequente tem que


demonstrar que a obrigação já está vencida, que é uma obrigação pura e ainda que
a obrigação é de valor inferior a 10.000 euros.

No entendimento do DOUTOR REMÉDIO MARQUES, só neste caso é que há um


eventual excesso do legislador em colocar estas execuções na trilha da sequência
executiva sumária. Aqui o único critério que o legislador entendeu bastante para
atribuir ao credor o benefício do efeito surpresa é apenas o alegado valor diminuto
da obrigação exequenda vencida (até 10 mil euros). Na ótica do legislador este é
valor pouco considerável. Contudo, este valor para a maioria das pessoas não é um
valor baixo.

Filipa R. G. 64

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Posto isto, no artigo 550.º/2 do CPC, o legislador, do ponto de vista da sistemático, diz-nos
que aplica-se processo sumário e que aos restantes casos se aplica o processo executivo
ordinário.

Do artigo 550.º/3 do CPC resulta um conjunto de situações que têm que tramitar sob
forma processo executivo ordinário e faz sentido que assim seja, visto que, nestas situações,
avançar para penhora sem que o executado soubesse, talvez fosse excessivo. Podia até dar-se o
caso de estar a tramitar ações executivas em que haviam manifestas ilegalidades de penhoras e
ilegalidades de obrigações exequendas.

• Alínea a): Nos casos previstos nos artigos 714º e 715º.

Os casos do artigo 714.º são situações de obrigações alternativas (casos em que têm
que haver diligências preliminares, logo no início da na ação executiva, para a escolha) e
do artigo 715.º são situações de obrigações condicionais ou dependentes de
prestação.

• Alínea b): Quando a obrigação exequenda careça de ser liquidada na fase executiva e a
liquidação não dependa de simples cálculo aritmético.

Não faria assim sentido avançar com as penhoras antes de se quantificar a obrigação
ilíquida.

• Alínea c): Quando, havendo título executivo diverso de sentença apenas contra um dos
cônjuges, o exequente alegue a comunicabilidade da dívida no requerimento executivo.

Trata-se das situações em que o título é extrajudicial e o requerente alega, no título


executivo, que a dívida é comunicável (apesar de só ter título contra um dos cônjuges),
narrando factos do requerimento executivo sobre os quais o outro cônjuge também é
responsável.

Se partíssemos logo para as penhoras sem esperar pela determinação judicial do juízo
de execução se a dívida é comunicável ou incomunicável, não saberíamos que bens
penhorar em primeiro lugar. Teríamos de, em primeiro lugar, penhorar os bens próprios do
cônjuge devedor e só depois, subsidiariamente, uma parte dos bens comuns. Numa
situação em que, perante este incidente de comunicabilidade que tramita por apenso à
ação executivo, o juiz viesse a decidir que a dívida era comunicável e que o outro
cônjuge também era co-responsável, invertia-se a ordem de penhora, pois deveriam ter
sido penhorados, em primeiro lugar, os bens comuns. Teria-se verificado, assim, uma
injustiça, pois estavam penhorados bens próprios daquele cônjuge que não era o único
responsável, porque tinha sido deduzido erroneamente ou de forma desproporcionada
seguida a forma de processo sumário. Foi também por isto que o legislador relegou esta
particular situação para a tramitação sob a forma ordinária.

Filipa R. G. 65

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Nota: É claro que um exequente com um advogado mais diligente, para poder obter logo
penhoras sem que o executado saiba que contra ele está a correr uma ação executiva
(forma sumária), apresenta o requerimento executivo, apresentando o título extrajudicial
contra o cônjuge que assinou e obtém a penhora dos bens próprios deste. Depois, até
ao primeiro ato de venda vem, ao abrigo do artigo 741.º do CPC, suscitar a
comunicabilidade da dívida. Assim, a ação começou sob a forma sumária e,
posteriormente, é alterada para a forma ordinária, passando agora a responsabilizar-se
também o outro cônjuge.

• Alínea d): Nas execuções movidas apenas contra o devedor subsidiário que não haja
renunciado ao benefício da excussão prévia.

Fala-se, sobretudo, dos fiadores.

Parece estranho que um credor que tem título executivo contra o devedor principal e
contra o devedor subsidiário apenas demande o fiador, sendo que, para mais, este fiador
nem renunciou ao benefício de excussão. No entanto, assim é. O fiador vai invocar o
benefício de excussão prévia quando, mais tarde, lhe forem penhorados alguns bens.
Invocado esse benefício, não se penhoram bens do fiador enquanto não se excutirem os
bens do devedor principal.

Isto é uma estratégia, mas aparentemente não parece ser uma estratégia muito
adequada e funcional para o credor exequente mas, nestes casos, não poderia haver
efeito surpresa. Não teria lógica penhorar bens ao fiador, sem ele saber, sendo que este
nem sequer teria renunciado ao benefício da excussão prévia.

1.3. Tramitação inicial do processo executivo comum na forma sumária

Nos termos do artigo 855.º/1 do CPC, quanto à tramitação inicial, o requerimento executivo
- que tem que estar munido dos requisitos do artigo 724.º/1 do CPC - e os documentos que o
acompanham são dirigidos à secretaria do tribunal competente e esta envia-os
imediatamente por via eletrónica (se for subscrito por advogado ou solicitador, que são a
maioria das situações), sem precedência de despacho judicial, ao agente de execução
designado, com indicação do número único do processo.

Nas situações do processo executivo sumário, a secretaria funciona quase como que centro
de distribuição logístico e o juiz nem olha para o requerimento executivo, seguindo este
imediatamente para o agente de execução. O agente de execução:

• Artigo 855.º/2/a): Recusa o requerimento por motivos puramente formais, nos termos do
artigo 725.º do CPC.

• Artigo 855.º/3: Inicia logo as consultas e as diligências prévias à penhora (diligências


destinadas a localizar e a identificar bens penhoráveis e a própria penhora), que se

Filipa R. G. 66

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


efetiva antes da citação do executado, nos casos em que o requerimento foi recebido e o
processo houver que prosseguir porque não houve quaisquer falhas.

• Artigo 855.º/2/b): Suscita a intervenção do juiz do processo, nos termos do artigo 723.º/
1/d), remetendo-lhe o requerimento executivo e os documentos que o acompanham,
quando:

1) Se afigure provável a ocorrência de alguma das situações previstas no artigo


726.º/2 (casos de indeferimento liminar) e 4 (casos de convite ao suprimento de
irregularidades do requerimento executivo e da falta de pressupostos proce-
ssuais); ou

2) Duvide da verificação dos pressupostos de aplicação da forma sumária.

O juiz pode ter várias reações:

1) Se chegar à conclusão que está tudo bem, diz ao agente de execução para
prosseguir, ainda sem a citação do executado;

2) Se o juiz entender que está algo mal, convida o exequente a sanar o vício, se ele
for suprível.

1.4. Tramitação inicial do processo executivo comum na forma ordinária

O requerimento executivo, cumprindo as menções do artigo 724.º do CPC, dá entrada por


via eletrónica (se for subscrito por solicitador ou advogado em nome do seu constituinte/
exequente) na secretaria e a secretaria pode:

- Recusar, no prazo de 10 dias a contar da distribuição, com base nos requisitos formais
do artigo 725.º/1 do CPC e se o exequente não se conformar com a recusa pode
reclamar para o juiz - artigo 725.º/2 do CPC - e vai ter que apresentar um novo
requerimento executivo já com esses requisitos formais observados, nos termos do
artigo 725.º/3 do CPC: O exequente pode apresentar, outro requerimento executivo, bem como
o documento ou elementos em falta nos 10 dias subsequentes à recusa do recebimento ou à
notificação da decisão judicial que a confirme, considerando-se o novo requerimento apresentado
na data da primeira apresentação.

- Não recusar, ao abrigo do artigo 726.º/1 do CPC, e, nesse caso, envia o requerimento
executivo e os documentos que o acompanham ao juiz para que este proferia um
despacho liminar, para que este analise esse requerimento e sobre ele se pronuncie
(chama-se despacho liminar porque é feito/assumido/tomado/escrito antes de qualquer
penhora, diligência de identificação e localização de bens penhoráveis). Então, o
despacho liminar do juiz pode ter vários sentidos, conteúdos ou comandos, poder
ser um:

Filipa R. G. 67

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


1. Despacho liminar de indeferimento total (artigo 726.º/2 do CPC): O juiz rejeita
a totalidade do requerimento executivo;

2. Despacho liminar de indeferimento parcial (artigo 726.º/3 do CPC): O juiz


manda seguir a execução com a citação do executado numa parte e rejeita noutra
parte (dá-se uma admissão parcial e uma rejeição parcial). Do ponto de vista
subjetivo, o juiz admite parcialmente e rejeita parcialmente, nas seguintes
hipóteses:

1) Quando a ação tenha sido proposta contra mais do que um executado e o


juiz manda seguir a execução apenas contra um deles. Isto acontece porque
o juiz entende que os outros executados não têm legitimidade processual
passiva, à luz das regras de legitimidade processual. Nesta situação de
ilegitimidade plural, o juiz não rejeita toda a execução, porque tal seria
contra as regras da economia processual, ele manda seguir a execução
apenas contra um executado, porque considera que só o nome deste está
inscrito no título executivo como sendo devedor. Assim, o juiz determina que
esse executado (e não os restantes) seja citado para pagar ou opor-se à
execução por embargos de executado;

2) Quando o montante da obrigação exequenda e o valor da execução não


estão cobertos pelo título.
Exemplo: O valor da execução indicado pelo exequente é de 10.000€ e nada mais,
mas da leitura do título o juiz constata que a obrigação exequenda só pode ser de
7.000€. Então, o juiz indefere a execução na parte dos 3.000€ que estão a mais (que
não estão cobertos pelo título) e manda prosseguir a execução em 7.000€,
mandando citar o executado para pagar ou opor-se à execução.

3. Despacho liminar de aperfeiçoamento ou despacho-convite (artigo 726.º/4 e


5 do CPC): O juiz convida o exequente a suprimir/corrigir as irregularidades no
requerimento executivo e/ou para sanar a falta de pressupostos processuais
sanáveis e não sendo o vício suprido ou a falta corrigida dentro do prazo é
indeferido o requerimento executivo;

4. Despacho liminar de citação do executado para pagar ou opor-se à


execução, no prazo de 20 dias (artigo 726.º/6 do CPC): Este é o comando
normal.

O juiz pode ou deve tomar uma destas quatro atitudes, porque o requerimento executivo
não é enviado, tal como na situação anterior, ao agente de execução. O requerimento
executivo é concluso (nas palavras do legislador) ao juiz que já foi designado por
distribuição, havendo mais que um juiz nesse juízo.

Filipa R. G. 68

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Esta tramitação ordinária, que pressupõe a citação prévia (à penhora) do executado para este
ou pagar ou opor-se por embargos de executado, comporta uma exceção, na medida em
optando-se por não pagar e embargando-se de executado (deduzindo ação declarativa por
apenso à ação executiva, podendo vir a suspender-se a tramitação da ação executiva e não se
fazendo, por isso, penhoras) a ação poderia prolongar-se demasiado ao longo do tempo. Assim
sendo, há um caso de dispensa de citação prévia, que é a contemplada no artigo 727.º/1 do
CPC: O exequente pode requerer - no requerimento executivo, ao juiz - que a penhora seja
efetuada sem citação prévia do executado - e que ordene o agente de execução que procede
às diligências de penhora -, desde que:

1) Alegue factos que justifiquem o receio de perde de garantia patrimonial do seu crédito;

2) Ofereça de imediato - no requerimento executivo - os meios de prova.

Exemplo: O exequente pode juntar os anúncios de que o executado está a tentar vender bens
do seu património, através das redes sociais; que o cônjuge do exequente já andou a dizer que
eles vão viajar para outro país, onde irão iniciar uma nova vida, com testemunhas que possam
reproduzir estas afirmações do cônjuge do devedor ou do próprio.

Tem de se concluir que o património do devedor poderá achar-se em risco, seja por vendas,
hipotecas, dações em cumprimento, doações ou outros negócios simulados ou até negócios
reais que, na prática, implicam um empobrecimento do património do devedor que é a garantia
do credor.

Recebido o requerimento executivo com os factos e os meios de prova, o juiz deve


imediatamente designar uma audiência de produção de prova, não se citando o executado
para exercer o contraditório, pois tal seria o contrário do que se pretende. Esta audiência faz-se
apenas com o exequente (se quiser prestar declarações), com o mandatário do exequente e com
as testemunhas do exequente. De seguida, o juiz decide imediatamente:

• Se ficar convencido de que esses factos estão na iminência de acontecer ou já


estarem a ser consumados, dispensa a citação prévia do executado e determina que o
agente de execução inicie as diligências para identificar e localizar os bens penhoráveis,
não citando executado - artigo 727.º/2 do CPC;

• Se não ficar convencido de que os factos estão na iminência de acontecer ou já


estarem a ser consumados, não dispensa a citação prévia do executado.

2. Fase da penhora

2.1. Noção de penhora

A penhora é um ato de apreensão instrumental decisivo que visa o ato final, que consiste na
transmissão dos direitos que existem sobre uma coisa a terceiros, que irão pagar um preço que

Filipa R. G. 69

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


será entregue ao credor. Neste caso, o credor não quer a coisa, ele quer, através do património
do executado, ter direito à quantia pecuniária em dívida resultante de um ato ilícito (contratual ou
extracontratual).

Este ato de apreensão judicial, quando a finalidade da execução é o pagamento de quantia


certa, chama-se penhora, com efeitos de natureza processual e de natureza substantiva material:
perante uma situação de incumprimento, o tribunal priva o executado do pleno exercício dos
seus poderes sobre um bem que, sem deixar ainda de lhe pertencer, fica, a partir de então,
especificamente sujeito à finalidade última da satisfação do crédito do exequente, a atingir
através de disposição do direito do executado nas fases subsequentes da execução.

2.2. A penhora na ação executiva para pagamento de quantia certa sob a forma comum
sumária

Estuda-se agora a fase da penhora e não a oposição à execução, porque, em termos


estatísticos, a maioria das ações executivas para pagamento de quantia certa tramitam sob a
forma sumária, porque o título executivo é uma sentença condenatória ou um requerimento de
injunção no qual foi aposta a fórmula executória, que são os dois títulos que ocupam a larga
maioria das execuções pendentes em Portugal. Se assim é, o mais lógico será estudar a
sequência das ações executivas com processo comum na forma sumária.

Assim sendo, as diligências, na ação executiva comum sob a forma sumária, que se
seguem à aceitação por parte do agente de execução do requerimento executivo, não
havendo motivos para este submeter ao juiz para despacho liminar, são, precisamente:

• As consultas e as diligências prévias à penhora (artigo 748.º, 749.º e 855.º/3 do CPC),


feitas em determinadas bases de dados e que visam identificar e localizar bens
penhoráveis. Desde logo, o agente de execução tem um prazo de 3 meses para
identificar e localizar bens penhoráveis (artigo 855.º/4 do CPC) - prazo esse que vale
para ambas as formas processuais:

➡ No caso de o agente de execução não conseguir identificar nem localizar bem


penhorável no prazo de 3 meses, ou seja, no caso de se frustrarem as consultas
e as diligências prévias à penhora:

- Aplica-se o artigo 750.º/1 do CPC e terá o agente de execução que notificar


o exequente para que seja este a dizer que bens é que o executado tem
passíveis de penhora e o exequente deverá identificar, se souber;

- O agente de execução deve concomitantemente, no processo executivo


sumário, citar o executado para identificar e localizar bens.

Se o exequente não indicar bens penhoráveis e não for possível fazer a citação
pessoal do executado, a execução extingue-se, nos termos do artigo 750.º/2 do

Filipa R. G. 70

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


CPC (em 10 dias) (nota: na forma de processo ordinário a execução extingue-se
nos termos do artigo 750.º/1 e 2 do CPC).

Em síntese:
1. Requerimento executivo vai para o agente de execução que o aceita;

2. O agente de execução inicia as diligências prévias à penhora identificação e


localização de bens penhoráveis e tem 3 meses para o fazer;

3. Decorridos esses 3 meses e sem conseguir localizar e identificar bens penhoráveis,


notifica o exequente para que este lhe indique, no prazo de 10 dias, bens
penhoráveis e, concomitantemente, cita o executado com o mesmo fim, mediante
citação pessoal (contato pessoal direto e imediato ou carta registada);

4. Na impossibilidade de citar pessoalmente o executado e se o exequente não


conseguir indicar bens penhoráveis, a execução extingue-se.

Contudo, a execução não se extingue para sempre: se e quando forem


identificados e localizados bens penhoráveis ao executado, ainda que em momento
posterior, esta instância executiva, que estava extinta, renova-se mediante
requerimento.

A renovação da instância depende do direito substantivo, isto é, depende do prazo


de prescrição da obrigação exequenda. Enquanto a obrigação exequenda não tiver
prescrita, é sempre possível requerer a renovação de instância executiva extinta por
falta de identificação e localização de bens penhoráveis no passado.

Existem vários prazos para a prescrição de obrigações pecuniárias. O prazo geral é de


20 anos, mas há outros prazos especiais: 6 meses, 2 anos e 5 anos, consoante a
natureza da obrigação.

Assim sendo, uma ação executiva extinta por falta de bens penhoráveis
identificáveis e localizáveis pode renovar-se enquanto a prescrição não se
consumar e o prazo de prescrição tem ainda que ser articulado com o prazo de
suspensão.

➡ No caso de o agente de execução conseguir identificar e localizar bem


penhorável no prazo de 3 meses, ou seja, no caso de as consultas e as
diligências prévias à penhora serem bem sucedidas, temos que saber que
diligências são essas que o agente de execução faz. Estas diligências estão
previstas, fundamentalmente, no artigo 749.º do CPC (+ artigo 751.º/2 do CPC,
segundo o qual a penhora começa pelos bens cujo valor pecuniário seja de mais fácil
realização e se mostrem adequados ao montante do crédito exequente) que, por
remissão, se aplica ao processo sumário. Nos termos deste artigo, o agente de

Filipa R. G. 71

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


execução, procede à consulta de bases de dados onde existem informações sobre
bens registados em nome do executado, no prazo de 20 dias. Que bases de dados
são essas?

- (n.º 1) Bases de dados da Administração Tributária - o agente de execução


vai conseguir saber, principalmente, se o executado tem bens imóveis em seu
nome;

- (n.º 1) Base de dados do Instituto da Segurança Social - o agente de


execução vai conseguir saber quando é que o executado recebe por mês seja
a título de pensão seja a título de salário, podendo penhorar a diferença entre
o salário líquido e o salário mínimo nacional;

- (n.º 1) Conservatórias de registo (predial, automóvel, comercial, etc.) - o


agente de execução vai conseguir saber se o executado tem quotas ou ações
penhoráveis, se tem prédios e automóveis registados em seu nome;

- (n.º 1) Outros registos ou arquivos semelhantes às conservatórias do registo:


Autoridade de Aviação Civil Portuguesa (o agente de execução vai conseguir
saber se o executado tem aeronaves em seu nome) e o Instituto Nacional da
Propriedade Industrial (o agente de execução vai conseguir saber se o
executado tem direitos sobre marcas ou patentes);

- (n.º 6) Banco de Portugal - o agente de execução vai conseguir saber quais


as contas abertas, a prazo e à ordem, em nome do executado ou em que o
executado é co-titular, em Portugal;

- Mercado de valores mobiliários cotados em bolsa de valores - o agente de


execução vai conseguir saber se há registo de ações e de outros
instrumentos financeiros, como obrigações, detidas em nome do executado;

- Redes sociais (apesar de o artigo 749.º apresentar bases de dados oficiais,


nada impede que o agente de execução possa consultar outras bases de
dados mais oficiosas) - tratam-se de buscas informais sobre a vida que o
executado quer que seja publicitada, não estando aqui em causa a
intromissão ilícita na reserva de intimidade da vida privada.

• As diligências destinadas a penhorar bens (artigo 750.º do CPC)

Aula dia 05 de maio de 2020

2.3. Princípios gerais em matéria de penhora

Princípio da proporcionalidade da penhora (artigo 735.º/3 e 751.º do CPC)

Uma vez que a penhora é uma agressão dirigida ao património do executado, tem que
obedecer às regras que estão inscritas no artigo 18.º da CRP, na medida em que o direito à

Filipa R. G. 72

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


propriedade privada é um direito fundamental de natureza análoga ao direitos fundamentais
contemplados no catálogo subsequente ao artigo 18.º da CRP. Portanto, a agressão ao direito à
propriedade privada deve estar munido das garantias (do princípio da proporcionalidade lato
sensu):

1. Necessidade (de penhora de bens com exclusão de outros);

2. Adequação (ao montante exequendo e ao tipo de bens que primeiramente vai ser
suscetível de ataque);

3. Menor ingerência possível.

Do artigo 735.º/3 do CPC resulta que a penhora limita-se aos bens necessários ao
pagamento da dívida exequenda e das despesas previsíveis da execução (…) e do artigo
751.º/1 do CPC que, a serem penhorados bens, devem ser penhorados aqueles bens ou
direitos que permitam uma realização rápida e fácil do crédito do exequente, que, se
existirem, são os salários, as pensões e os saldos de depósitos bancários (não os bens móveis,
porque, apesar de fácil penhora, estes têm de ser pagos na totalidade - quando em lojas podem ser pagos
a prestações -, por isso não são de fácil venda).

Note-se que o agente de execução não tem que respeitar a ordem que o exequente
identifique, pois ele não é mandatário do exequente, é sim um agente particular ao serviço de
uma função pública tem que se pautar por critérios de proporcionalidade e independência. Em
todo o caso, o agente de execução deve respeitar, de acordo com o artigo 751.º/2 do CPC,
as indicações do enxequente, podendo desrespeitá-las se estas violarem o princípio da
proporcionalidade da penhora ou se violarem as regras sobre penhorabilidade.

A atuação do princípio da proporcionalidade da penhora manifesta-se nos artigos:

• 751.º/3 do CPC, que permite que sejam penhorados bens imóveis que não sejam a
habitação própria permanente do executado (prédios rústicos, terrenos para
construção, casas de férias), ou de estabelecimento comercial, desde que a penhora de
outros bens presumivel-mente não permita a satisfação integral do credor no prazo de
seis meses.

Exemplo: O agente de execução faz as seguintes contas: conseguiu identificar um saldo numa
conta bancária no valor de 300€ e conseguiu identificar que o executado recebe 800€ de salário
líquido, logo só pode penhorar 200€. Então, penhora os 200€ p/ mês + os 300€ do saldo. Ora,
200€ p/ mês x 6 meses = 1.200€; 1.200€ + 300€ do saldo = 1.500€. Assim, em 6 meses,
presumivelmente ele só conseguirá penhorar 1.500€. Se a obrigação exequenda for até 10 mil, a
penhora de imóveis pode ser feita imediatamente.

O princípio da proporcionalidade tem aqui duas concretizações:

- Uma concretização quantitativa: O agente de execução só pode penhorar os bens


durante um determinado prazo;

Filipa R. G. 73

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


- Uma concretização qualitativa: O agente de execução pode penhorar bens imóveis
e pode penhorar estabelecimentos comerciais.

• 751.º/4 do CPC, que permite que seja penhorado o imóvel que seja habitação própria
permanente do executado (se este for casado, a casa de morada de família; se for viúvo,
solteiro ou divorciado, a casa de habitação efetiva), nos casos enquadrados nas suas
alíneas.

Poderíamos erroneamente pensar que o imóvel que seja habitação permanente do


executado seria o último bem a ser penhorado. Contudo, no direito português, nas
execuções comuns, ele pode ser penhorado, se propriedade do executado. Em casos
extremos, pode ser penhorada por uma dívida (obrigação exequenda) de montante
inferior ao valor do imóvel, o que, à primeira vista, parece desproporcional, mas o agente
de execução entregará a diferença entre a o valor do imóvel e o valor da dívida ao
executado. Assim, o executado perde o imóvel, mas fica com parte do preço da sua
venda, correspondente à diferença mencionada.

Posto isto, pode ser penhorada a casa de morada efetiva do executado:

- Alínea a): Em execução de valor igual ou inferior ao dobro do valor da alçada do


tribunal de 1ª instância (10 mil euros), se a penhora de outros bens
presumivelmente não permitir a satisfação integral do credor no prazo de 30 meses
(2 anos e meio);

- Alínea b): Em execução de valor superior ao dobro da alçada do tribunal de 1ª


instância (10 mil euros), se a penhora de outros bens presumivelmente não permitir
a satisfação integral do credor no prazo de 12 meses (1 ano).

O que estas normas nos dizem é que há, na mente do legislador, uma determinada ordem
de penhorabilidade:

1. Saldos de contas bancárias, salários, pensões de aposentação

2. Bens móveis não sujeitos a registo, bens móveis sujeitos a registo;

3. Bens imóveis e estabelecimentos comerciais;

4. Casa de habitação efetiva e permanente do executado.

Todavia, à luz do artigo 751.º/3 e 4 do CPC, essa ordem de penhorabilidade pode ser
alterada perante as circunstâncias concretas do caso (atendendo ao montante da dívida e à
possibilidade de satisfazer num determinado prazo os direitos do exequente).

2.4. A apreensão da coisa na ação executiva para entrega de coisa certa

Nas execuções para entrega de coisa certa pode-se fazer a seguinte pergunta: O agente de
execução penhora a coisa cuja entrega é requerida pelo exequente? Não! O agente de

Filipa R. G. 74

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


execução apreende a coisa, mas esta apreensão não se chama penhora.

A penhora deve ser entendida nos termos indicados no ponto 2.1. (remissão p/ págs. 69 e 70) e,
ao contrário da penhora, numa execução para entrega de coisa certa, a apreensão da coisa é o
ato final, ou seja, apreende-se a coisa precisamente para entregá-la ao exequente. Neste caso, a
apreensão da coisa pelo agente de execução realiza, imediatamente, a finalidade do exequente e
o agente da execução, posteriormente, procede à entrega simbólica da coisa.

Só há penhora se a coisa não for localizada, for expropriada ou for destruída: quando a coisa é
destruída ou se perdeu, há conversão da ação executiva para entrega da coisa certa numa ação
executiva para pagamento de indemnização pela perda ou destruição dela. Se e quando a ação
mudar de finalidade é que se pode pensar em penhorar património do executado.

2.5. O objeto da penhora

De acordo com o artigo 735.º/1 do CPC, a regra geral é a de que só estão sujeitos à
penhora os bens do devedor. Todavia, há exceções:

• De acordo com o artigo 735.º/2 do CPC, nos casos previstos na lei, podem ser
penhorados bens de terceiro não devedor, desde que a execução tenha sido movida
contra ele (ou seja, desde que o terceiro seja réu, seja só ele ou seja ele e o devedor -
artigo 54.º/2 do CPC).

São os casos em que o terceiro constitui um direito real de garantia (normalmente,


hipoteca, penhor, consignação de rendimentos) sob um ou alguns dos seus bens ou direitos,
a favor do credor de outro.

• Contudo, há situações mais complexas em que bens de terceiros podem ser


penhorados, mesmo que a ação executiva não tenha sido movida inicialmente
contra ele: O agente de execução penhora bens que foram vendidos pelo executado a
um terceiro (não réu na ação executiva) e este vem deduzir embargos de terceiro,
dizendo, na petição inicial, para se levantar a penhora porque ela é ilegal, na medida em
que o bem é dele e não do executado. Neste caso, o exequente (enquanto réu nos
embargos de terceiro), na contestação dos embargos de terceiro, pode alegar e provar:

1. Os factos constitutivos da declaração de nulidade do negócio jurídico entre o


executado e o terceiro (da ação executiva), p. ex., uma simulação.

2. Os factos constitutivos da impugnação pauliana, ou seja, que o adquirente e o


executado-alienante estavam coleados e fizeram aquele negócio para prejudicar o
exequente e que o terceiro comprador estava de má fé (não podia desconhecer
que ao comprar o que comprou, estava a prejudicar e defraudar os interesses do
credor, que agora é exequente).

Filipa R. G. 75

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Se o juiz considerar, nos embargos de terceiro, que estão provados os factos
constitutivos da nulidade do negócio ou os factos constitutivos da ação pauliana,
mantém a penhora dos bens do património do terceiro, na medida em que julga
improcedente os embargos de terceiro, bens esses que, por força dessa improcedência,
se revertem para o património do executado.

Estes casos são difíceis de acontecer, porque o agente de execução é uma pessoa
imparcial e independente que, normalmente, não penhora bens registados em nome de
terceiro. Mas, se o fizer e se o terceiro embargar de terceiro, o exequente pode
demonstrar os factos constitutivos da declaração de nulidade do negócio ou os factos
constitutivos da ação pauliana e, se o conseguir, a penhora mantém-se e os bens serão
vendidos e com o produto da venda será pago o exequente.

2.6. Bens e direitos penhoráveis

‣ Bens imóveis (direito de propriedade plena);

‣ Bens móveis sujeitos a registo e não sujeitos a registo;

‣ Direitos reais menores de gozo (usufruto, direito de habitação periódica, superfície, etc.; já
não o direito de uso e habitação, porque não é transmissível);

‣ Partes sociais (quotas, ações, partes sociais em sociedades civis e em sociedade civis sob
forma comercial);

‣ Empresas em sentido objetivo (enquanto estabelecimentos, objeto de direitos e relações


jurídicas) - não engloba o artesanato e as profissões liberais, porque o aviamento da
empresa está dependente das habilidades manuais do executado, o que não se pode
penhorar, o que se pode penhorar são os bens da empresa;

‣ Direitos de crédito (saldos de contas bancárias, salários e pensões);

‣ Quinhões hereditários, numa ação movida contra um herdeiro, não contra a herança (o
agente de execução penhora o quinhão hereditário e tenta aliená-lo e quem o comprar torna-se co-
herdeiro e pode pedir partilhas, ou seja, pode requerer o inventário litigioso; se os restantes não
fizerem partilhas amigavelmente, ele pode desencadear o processo litigioso de partilhas e os bens
da herança vão ser concretizados em quinhões; o quinhão deste, que não conhece o falecido, mas
que comprou ao agente de execução o quinhão hereditário, vai ser concretizado em bens que estão
na herança, que vai deixar de ser uma herança indivisa e passa a ser uma herança dividida);

‣ Direitos de propriedade industrial (patentes e marcas) e a vertente patrimonial do direito


do autor e algumas faculdades emergentes, p. ex., de um contrato de edição;

‣ Expectativas jurídicas de aquisição de bens ou direitos;

‣ Etc.

Filipa R. G. 76

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


2.7. As impenhorabilidades: impenhorabilidade convencional, absoluta, relativa, parcial e
subsidiária

2.7.1. Impenhorabilidade convencional (matéria não lecionada em aula, mas que pode ser
perguntada em oral de melhoria)

No âmbito da disponibilidade das partes, podem estas, por negócio jurídico, estipular a
impenhorabilidade específica de determinados bens por dívidas também determinadas. Isso é permitido,
entre outros, pelos seguintes preceitos da lei civil:

• Artigo 602.º do CC, que permite que, por convenção entre o credor e devedor, se limite a
responsabilidade do devedor a alguns dos seus bens e, por maioria de razão, que determinados
bens do devedor sejam excluídos da sujeição à execução pela dívida contraída;

• Artigo 603.º do CC, que permite que, por doação ou testamento, se convencione que os bens
transmitidos não responderão pelas dívidas do beneficiário já existentes à data, salvo se a
natureza dos bens obrigar a registo e a penhora for registada antes do registo da cláusula;

• Artigo 833.º do CC. O artigo 831.º do CC prevê a cessão de bens aos credores para estes os
alienarem e, com o produto da alienação, satisfazerem os seus créditos. Os credores que não
participem na cessão podem fazer penhorar os bens cedidos, enquanto a alienação no tiver lugar.
Mas, relativamente aos credores cessionários e aos posteriores à cessão, já assim não é e os
bens cedidos não são por eles penhoráveis.

2.7.2. Impenhorabilidade absoluta

Um bem absolutamente impenhorável é aquele que jamais, em situação alguma, pode


ser penhorado e que, de acordo com o artigo 736.º do CPC, são:

1. Alínea a): As coisas ou direitos inalienáveis. Não podem, por isso, penhorar-se, entre
outros:

- A vertente não patrimonial dos direitos de autor;

- O direito a alimentos (o credor de alimentos precisa dessas quantias para viver, está em
causa o direito à vida) (artigo 2008.º/1 do CC);

- O direito de uso e habitação (que não é transmissível, uma vez que é um direito
pessoalissímo de gozo) (artigo 1488.º do CC);

- O direito à sucessão de pessoa viva (artigo 2028.º do CC);

- A propriedade de nome ou insígnia de estabelecimento separadamente deste (artigo 297.º


do CPI);

- A propriedade de recompensa industrial sem a parte do estabelecimento cujos produtos


justifiquem a concessão (artigo 279.º do CPI);

Filipa R. G. 77

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


- A posição do arrendatário do prédio, a qual, fora o caso de divórcio ou separação judicial
de pessoas e bens (artigo 1105.º do CC), só é transmissível por morte do titular e para
pessoas determinadas, quando verificados determinados requisitos (artigo 1106.º do CC).

2. Alínea b): Os bens do domínio público do Estado e das restantes pessoas coletivas
públicas (artigo 84.º da CRP)

Exemplos: linhas férreas, rios, lagos (sem serem a parte privada junto às margens) e espaço
aéreo.

As alíneas a) e b) são os casos de indisponibilidade objetiva, que são casos em que


não se admite a penhora porque o bem apreendido é objetivamente indisponível.

Nota: As indisponibilidades subjetivas não foram lecionadas em aula, mas podem ser
questionadas em oral de melhoria (ver livro págs. 239 a 246).

3. Alínea c): Os objetos cuja apreensão seja ofensiva dos bons costumes ou careça
de justificação económica, pelo seu diminuto valor venal

4. Alínea d): Os objetos especialmente destinados ao exercício de culto público

5. Alínea e): Os túmulos

Os túmulos são bens absolutamente impenhoráveis, mas o túmulo não é propriedade


privada. Não se compra a sepultura, adquire-se, sim, um direito de uso exclusivo
perpétuo sujeito a um conjunto de deveres de tratar e cuidar da sepultura, pois o dono é
a autarquia municipal - o túmulo integra o domínio privado disponível dessa pessoa
coletiva pública territorial. O que essa pessoa coletiva faz é conceder a utilização
exclusiva e perpétua, mediante pagamento, sob condições de fazer ou não fazer a um
cidadão.

4. Alínea f): Os instrumentos e os objetos indispensáveis aos deficientes e ao


tratamento de doentes

Na conceção do DOUTOR REMÉDIO MARQUES, estes instrumentos e objetos deveriam


pertencer ao grupo dos bens relativamente impenhoráveis e não aos bens absoluta ou
totalmente impenhoráveis. Na medida em que, p. ex., uma cadeira de rodas que esteja à
venda num estabelecimento em que o dono do estabelecimento está a ser executado
pode ser penhorada. Portanto, não é um bem que nunca pode se penhorado, ele pode
ser penhorado numas vezes e noutras vezes não, p. ex., não pode ser penhorada numa
ação movida contra o próprio deficiente.

5. Alínea g): Os animais de companhia

Para o DOUTOR REMÉDIO MARQUES, os animais deveriam pertencer ao grupo dos bens
relativamente impenhoráveis, pois quando o animal é um animal de companhia não

Filipa R. G. 78

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


pode ser penhorado (porque satisfaz um interesse vital para a pessoa), mas já o pode
ser se não se tratar de um animal de companhia.

2.7.3. Impenhorabilidade relativa

Um bem relativamente penhorável é aquele que pode ser penhorado nuns casos, mas já
não pode ser penhorado noutros e que, de acordo com o artigo 737.º do CPC, são:

1. N.º 1: Estão isentos de penhora, salvo tratando-se de execução para pagamento de


dívida com garantia real, os bens do Estado e das restantes pessoas coletivas
públicas, de entidades concessionárias de obras ou serviços públicos ou de
pessoas coletivas de utilidade pública, que se encontrem especialmente afetados
à realização de fins de utilidade pública.

Exemplo 1. Pode-se penhorar o veículo automóvel em que se desloca o presidente da câmara


ou a sua mesa e o computador do seu gabinete numa execução contra o município, na medida
em que se tratam de bens facilmente substituíveis por outro para desempenhar a mesma função
e são bens que não especialmente afetados a fins de utilidade pública.

Exemplo 2. Já não se pode penhorar uma instalação da câmara municipal de ajuda a pessoas
pobres, instalação essa que era uma das quais onde essa ajuda podia ser prestada, pois está a
ser utilizada no fim de utilidade pública e não se encontra um substituto equivalente.

Exemplo 3. Não pode ser penhorado um aparelho de ressonância magnética de um hospital


público gerido com parcerias público-privadas, através de contratos de concessão de gestão de
serviços públicos. Aparelho esse que era um dos itens do caderno de encargos para a
prossecução da gestão privada do hospital público e que estava especialmente afeta a uma
utilidade pública. Já poderia ser penhorada uma máquina que não constasse em nenhum dos
contratos administrativos.

2. N.º 2: Estão também isentos de penhora os instrumentos de trabalhos e os objetos


indispensáveis ao exercício da atividade ou formação profissional do executado,
salvo se:

a) O executado os indicar para penhora;

b) A execução se destinar ao pagamento do preço da sua aquisição ou do custo da


sua reparação;

c) Forem penhorados como elementos corpóreos de um estabelecimento comercial.


Exemplo: Não se pode penhorar um automóvel de um empresário em nome individual que anda
a fazer reparações em redes de telecomunicações, porque ele utiliza o automóvel nas
assistências técnicas que vai fazendo e usa esse automóvel que foi especialmente adquirido
para isso.

Filipa R. G. 79

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Outro automóvel que ele tenha em casa e que seja utilizado em passeio já pode ser penhorado.

Se ele comprar uma carrinha nova e deixar o anterior automóvel em casa, já se pode penhorar
esse automóvel, mas já não a carrinha, porque esta é utilizada como instrumento exclusivo de
trabalho. Mas se a carrinha nova foi comprada num stand e não foi paga, o stand (exequente)
pode, ainda que a carrinha seja instrumento de trabalho, pedir ao agente de execução que a
penhore, porque esta execução é por falta de pagamento deste instrumento de trabalho.

3. N.º 3: Estão ainda isentos de penhora os bens imprescindíveis a qualquer economia


doméstica que se encontrem na casa de habitação efetiva do executado, salvo
quando se trate de execução destinada ao pagamento do preço da respetiva aquisição
ou do custo da sua reparação.

Exemplo: Se houver apenas um fogão ou uma cama na casa de habitação efetiva, não pode ser
penhorado/a, mas se for houver mais do que um/a, já pode.

Caso a caso, tem de se ver se, em concreto, se trata de um bem indispensável a


qualquer económica doméstica, não só a do executado, tendo em conta o contexto
cultural em que nos inserimos.

Exemplo: O microondas não é imprescindível a qualquer economia doméstica, mas um fogão já


é.

2.7.4. Impenhorabilidade parcial

De acordo com o artigo 738.º do CPC, os bens parcialmente penhoráveis são os direitos
de crédito, que são direitos que só podem ser penhorados numa quantidade/parte, ou
determinadas quantidades/partes, com exceção de outras quantidades/partes.

De acordo com o n.º 1, são impenhoráveis 2/3 da parte líquida (o que significa que são
penhoráveis 1/3) dos:

• Vencimentos;

• Salários;

• Prestações periódicas pagas a título de aposentação;

• Prestações periódicas pagas a título de qualquer outra regalia social;

• Seguro;

• Indemnização por acidente;

• Renda vitalícia;

• Prestações de qualquer natureza que assegurem a subsistência do executado.

O n.º 3 tem dois limites de impenhorabilidade, um mínimo e um máximo:

• O limite mínimo: O executado tem sempre que ficar com um montante disponível,
equivalente ao montante líquido do salário mínimo nacional (nas empresas privadas,
600€ e, na função pública, 635€).

Filipa R. G. 80

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Exemplo: Se o executado auferir um salário líquido de 800€, 1/3 de 800€ é 266€. Se
penhorássemos 1/3 de 800€, o que o executado ficaria a receber todos os meses 534€ (inferior ao
salário mínio nacional).

Exemplo: Se o executado auferir um salário líquido de 700€, 1/3 de 700€ é 233€. Se


penhorássemos 1/3 de 700€, o que o executado ficaria a receber todos os meses 467€ (inferior ao
salário mínio nacional).

Assim sendo, mesmo que a penhora possa ser, em regra, de 1/3, às vezes tem que ser
menos. Se não fosse de outra maneira, o executado fica a receber menos que o salário
mínimo nacional.

De acordo com o artigo 738.º/5/1.ª parte do CPC, a regra de que o executado ter
sempre que ficar com o salário mínimo, não podendo o agente de execução penhorar a
sua totalidade, aplica-se seja o salário pago em dinheiro ou através de transferencia
bancária.

O artigo 739.º do CPC traduz a mesma ideia dizendo que são impenhoráveis a quantia
em dinheiro ou o depósito bancário resultantes da satisfação de crédito impenhorável,
nos mesmos termos em que o era o crédito originariamente existente.
Exemplo: O executado recebe todos os meses, por transferência bancária, alimentos do pai que
se divorciou da sua mãe. O agente de execução não pode penhorar esse saldo, porque este
representa quantias impenhoráveis.

Exceção: Não se aplica o limite mínimo de impenhorabilidade do n.º 3 no caso do artigo


738.º/4 e 5, parte final do CPC - o crédito exequente de alimentos, na medida em que
os alimentos visam salvaguardar a vida do credor.

Exemplo: Um pensionista, que aufere pensão mensal de 600€, que é devedor de alimentos a um
filho menor e que não pagou.

Segundo a regra geral, não podíamos penhorar nada a este pensionista, porque ele recebe 600€.
Contudo, como é um credor de alimentos, o exequente tem uma dívida exequenda cuja natureza
é alimentícia, o legislador permite que seja atingida uma parte desses 600€, que é a parte que
traduz a diferença entre o salário mínimo e a pensão social nos regimes não contributos, que é à
volta de 202 euros. Assim, 600 - 202 = 398€.

Um regime de segurança social não contributo é quando alguém que nunca descontou para a
segurança social, porque nunca trabalhou ou trabalhou e nunca descontou, chega a idade de
poder obter uma reforma/aposentação, aos 66 anos, e recebe por volta de 202 euros.

• O limite máximo: O montante equivalente a três salários mínimos nacionais, à data da


apreensão.

Exemplo 1. O executado ganha 9.000€ líquidos. Se aplicássemos a regra geral, ou seja, a regra de
1/3, o agente de execução podia penhorar 3.000€ e o executado ficaria com o montante
disponível de 6.000€. O que o n.º 3, no limite máximo, vem dizer é que apenas se tem de garantir

Filipa R. G. 81

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


ao exequente que fique, todos os meses, com o montante equivalente a três salários mínimos, ou
seja, a 1.800€. O que significa que se pode penhorar a diferença entre os 9.000€ e os 1.800€.
Nestas situações, penhoramos mais que 1/3, porque apenas é necessário garantir que, todos os
meses, para este executado, no máximo, o equivalente a 3 salários mínimos.

Exemplo 2. O executado ganha 3.000€ líquidos. Se aplicássemos a regra geral, ou seja, a regra de
1/3, o agente de execução podia penhorar 1.000€ e o executado ficaria com o montante
disponível de 2.000€ e 2.000€ é superior a 1.800€. Isso significa que, neste caso, o agente de
execução pode penhorar mais que 1/3. Pode penhorar a diferença entre os 2.000€ e os 1.800€,
que é de 1.200€.

Exemplo 3. O executado ganha 40.000€ de reforma. Se aplicássemos a regra geral, ou seja, a


regra de 1/3, o agente de execução podia penhorar 13.333€ e o executado ficaria com o montante
disponível de 26.667€. Isso significa que, neste caso, o agente de execução pode penhorar mais
que 1/3. Pode penhorar a diferença entre os 13.333€ e os 1.800€, que é de 15.133€.

Exemplo 4. O executado ganha 610€ líquidos (não conta o subsídio de almoço), por isso só se
pode penhorar 10€, no máximo. Nestas situações, se o executado tiver um apartamento, o agente
de execução pode penhorar o apartamento.

2.7.5. Impenhorabilidade subsidiária

Um bem ou um património parcialmente penhorável é aquele que só pode ser penhorado


depois de serem outros bens ou patrimónios. São situações de impenhorabilidade subsidiária:

• Ações movidas contra devedor subsidiário (artigo 745.º do CPC)

• Execuções por dívidas conjugais (movidas contra os dois cônjuges)


Caso em que respondem, em primeiro lugar, os bens comuns e, subsidiariamente, o
património próprio de cada um.

Se a dívida for da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges, porque há título


executivo só contra esse, ou porque incidente da incomunicabilidade foi julgado
procedente, a dívida é a da exclusiva responsabilidade desse cônjuge e ele é o único a
ser executado. Caso em que primeiro penhoram-se os bens próprios e subsidiariamente,
na falta ou insuficiência de bens próprios, os bens comuns.

• Sociedades em que a responsabilidade dos sócios por dívidas da sociedade é


ilimitada

Caso em que, por dívidas da sociedade, responde, em primeiro lugar, o património da


sociedade e, subsidiariamente, o património do sócio.

Tal não acontece nas sociedades por quotas, anónimas e em comandita por ações,
porque se tratam de sociedades de responsabilidade limitada dos sócios. Só há
subsidiariedade nas sociedades por quotas se a obrigação de entrada do sócio na

Filipa R. G. 82

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


subscrição de uma quota não tiver sido cumprida. Nesse caso, os credores podem
executar, em primeiro lugar, os bens da sociedade e, subsidiariamente, o valor da quota
que não foi realizada pelo sócio.

Há, porém, situações em que, nas sociedades por quotas, os sócios podem assumir
responsabilidade por dívidas da sociedade, até certo montante, desde que tal esteja
previsto no contrato da sociedade. Então, por dívidas da sociedade por quotas, se
constar uma cláusula deste tipo no contrato de sociedade, subsidiariamente os sócios de
responsabilidade limitada pode ver alguns dos seus bens pessoais penhorados até ao
limite a que ele se obrigou por dívidas da sociedade.

• Associações sem fins lucrativos


Caso em que, por dívidas da associação sem fins lucrativos, responde, em primeiro lugar,
o património da associação e, subsidiariamente, o património dos associados.

• Sociedades civis sem forma comercial


Caso em que, por dívidas da sociedade civil, responde, em primeiro lugar, o património
da sociedade e, subsidiariamente, na falta ou insuficiência do património da sociedade, o
património pessoal dos sócios.

2.8. Penhora em casos particulares

2.8.1. Penhora em caso de comunhão ou compropriedade (artigo 743.º do CPC)

O bem está em compropriedade e a dívida é de um dos comproprietários (que é executado).


Neste caso, pode-se penhorar a quota do sócio no bem indiviso - e não o bem em
compropriedade - e depois vende-se essa quota, tendo os outros comproprietários preferência.

2.8.2. Penhora movida contra um herdeiro (artigo 744.º do CPC)

Se o devedor é o herdeiro e não a herança:

• Se a partilha ainda estiver por fazer, o que se penhora, na execução em que esse
herdeiro é o único devedor, é o quinhão hereditário dele;

• Se a partilha já tiver sido feita, não podemos penhorar o quinhão hereditário, porque
este já foi concretizado em bens concretos que passaram a integrar o património pessoal
do herdeiro, porque já se fez a partilha. Então, neste caso penhora-se o património
pessoal do herdeiro que é devedor.

Se o devedor for o falecido (a herança) e não o herdeiro (pois, em regra, as situações


jurídicas ativas e passivas não se extinguem por morte do seu titular ativo ou passivo):

• Se a partilha já tiver sido feita, por dívidas do falecido, tem de se executar os bens dos

Filipa R. G. 83

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


herdeiros (que são réus), correndo-se o risco de se penhorarem bens que eles teriam
antes das partilhas - dá-se a transmissão inter vivos ou mortis causa da obrigação
exequenda (dívida) (artigo 54.º do CPC), sendo que é o exequente tem que justificar o
facto dessa transmissão.

Apesar de a regra ser de que, por dívidas da herança, só responde o património da


herança (artigo 744.º/1 do CPC), ou seja, não responde o património pessoal que os
herdeiros já tinham à data da abertura da sucessão, pode acontecer que, em função do
regime de aceitação da herança, o ónus da prova se inverta em desfavor dos herdeiros.

Então, se o herdeiro se opuser à penhora de um bem concreto e disser que esse bem
concreto que foi penhorado não era um bem que foi partilhado, o artigo 744.º/3 do CPC
diz-nos que se a herança foi aceita pura e simplesmente, quem tem que provar que
aquele bem concreto penhorado não é da herança (que era bem do herdeiro já ao tempo da
abertura da sucessão) é o herdeiro. O ónus da prova cabe-lhe a ele e essa prova pode
falhar, ou seja, o juiz pode não ficar convencido e por uma dívida da herança vai
responder um bem pessoal que já era do herdeiro antes da abertura da sucessão.

• Se os herdeiros suspeitarem que há dívidas da herança, eles podem aceitar a herança


a benefício de inventário - amigavelmente, em cartório, fazer a partilha ou,
litigiosamente, em inventário judicial, sendo que neste é descrita a relação dos bens, há
lugar à impugnação dos interessados (herdeiros) e depois o juiz, através de sentença
homologatória, tem que decidir quais os bens que integram a herança que vai ser
partilhada e quais não integram.

A aceitação deste forma faz com que, no domínio da ação executiva, o ónus da prova se
inverta. Assim, terá que ser o exequente a demonstrar e a convencer o juiz, na oposição
à penhora, de que o bem que foi penhorado é da herança, apesar de não estar
mencionado na sentença homologatória da partilha. Neste caso, o credor exequente vai
ter mais dificuldades, pois a forma de aceitação faz com que se cumpra a regra de que
por dívidas da herança só responde o património da herança.

Aula dia 12 de maio de 2020

2.8.3. Penhora de bens imóveis (artigo 755.º e ss. do CPC)

A penhora de bens imóveis faz-se:

1. Por comunicação eletrónica do agente de execução ao serviço de registo


competente (conservatória do registo predial competente), a qual vale como pedido de
registo, ou com a apresentação naquele serviço de declaração por ele subscrita (artigo
755.º/1 do CPC) - tem assim lugar uma transferência de posse meramente jurídica;

Filipa R. G. 84

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


2. Inscrita a penhora e observado o disposto no n.º 5, é enviado ou disponibilizado por
via eletrónica, ao agente de execução, certidão dos registos em vigor sobre os
prédios penhorados (artigo 755.º/2 do CPC);

3. O agente de execução lavra o auto de penhora e procede à afixação, na porta ou


noutro local visível do imóvel penhorado, de um edital (artigo 753.º/1 e 755.º/3 do
CPC);

4. Tradição material da coisa para o depositário (artigo 756.º do CPC).

A vende um imóvel a B, transmitindo-se, por mero efeito desse contrato, o direito de


propriedade (vigora em Portugal o sistema de título e não o sistema de modo), e B não regista. A
vende, em momento posterior, o mesmo imóvel a C e C regista. A solução, na perspetiva dos
direitos reais, é de que, embora o C tenha adquirido posteriormente a B, C levou primeiro a
registo a sua aquisição (posterior), consolidando, assim, a sua aquisição. A aquisição de C,
apesar de a non domino (era uma venda de bem alheio, pois o proprietário do imóvel já não era
A, mas sim B) é oponível a B, apesar de este ter adquirido primeiro de A. Este efeito - o efeito da
oponibilidade de situações jurídicas registadas a terceiros - é o efeito central do registo
(artigo 5.º/4 do Código de Registo Predial).

A vende um imóvel a B (transmitindo-se, por mero efeito desse contrato, o direito de


propriedade) e B não regista (o que significa que o imóvel, apesar de ser de B, ainda está
registado em nome de A).

Numa ação executiva, posterior à venda entre A e B, em que C é o exequente e A é o


executado, o agente de execução, ao identificar e localizar os bens penhoráveis a A, identificou
esse bem imóvel, que, apesar de registado em nome de A, era de B, e penhorou-o, confiando
que A era o dono. O registo da penhora deste bem foi feito na conservatória pelo agente
execução e o C beneficia desta situação de oponibilidade.

O problema põe-se quando B demonstra que tem a escritura, ainda que não tenha registado,
e é o dono. B pode opor-se à penhora por embargos de terceiro e ajuizar esta ação contra
exequente (C) e executado (A) - que passam a ser réus, na ação de embargos de terceiro -, ação
na qual, na petição inicial, vem pedir ao juiz que declare esta penhora ilegal, que seja ordenado o
levantamento da penhora e que seja ordenado o cancelamento do registo da penhora, porque o
bem é seu. O desfecho desta ação seria:

• Se a ação declarativa de embargos de terceiro for julgada procedente, A penhora terá


que ser levantada e o registo de penhora cancelado por ordem do juiz, consolidando B,
ainda que não tenha registado, o seu direito de propriedade;

Filipa R. G. 85

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


• Se aplicássemos o artigo 5.º/4 do CRP, prevaleceria a penhora, porque primeiramente
registada e ao prevalecer o registo da penhora, os embargos de terceiro iam ser julgados
improcedentes, a penhora mantinha-se e bem seria vendido pelo agente de execução.

- Todavia, a jurisprudência do STJ, num acordão de uniformização de jurisprudência


de 1999, veio dizer que o artigo 5.º/4 do CRP não se aplica a esta situação,
entendimento esse que vigora na jurisprudência até hoje.

À luz deste jurisprudência uniformizada, B e C não são terceiros para efeitos de


registo, ou seja, para efeito de oponibilidade. O efeito central do registo não funciona
nesta situação, porque, segundo o STJ, a situação de penhora não é uma situação
que envolva voluntariedade por parte de A, quem fez a penhora foi o agente de
execução, em nome dos poderes públicos que lhe foram conferidos pelo Estado.

Logo, segundo a conceção restrita de terceiros para efeitos de registo do DOUTOR


MANUEL DE ANDRADE, esta penhora e o seu registo a favor de C não é oponível à
venda, não funcionaria o efeito central do registo de que quem regista primeiro
consolida o seu direito (seja um direito real de gozo, um direito real de garantia, seja
um direito real de aquisição), pois essa regra apenas funciona nas operações
voluntárias que derivam do mesmo disponente ou do mesmo onerante (no caso, A).

Assim sendo, aplica-se a regra geral, segundo a qual os direitos reais transmitem por
mero efeito do contrato, independentemente de qualquer ato posterior (no caso, foi a
escritura pública que não foi levada a registo).

O STJ, através desse acordão de uniformização de jurisprudência, veio dizer que os


embargos de terceiro que B deduz devem ser julgados procedentes, porque, quando
a penhora foi feita, a compra e venda entre A e B já se tinha consumado, logo A já não
era o proprietário do imóvel, consubstanciando-se a penhora numa penhora de bem
alheio, não se podendo, consequentemente, aplicar-se ao caso o artigo 5.º/4 do CRP.

- A maioria da doutrina (o DOUTOR LEBRE DE FREITAS, DOUTOR REMÉDIO MARQUES,


DOUTORA MÓNICA JARDIM, DOUTOR ANTUNES VARELA, DOUTOR HENRIQUE MESQUITA) é
contra esta jurisprudência, porque o efeito central do registo é gerar uma situação
de oponibilidade. Logo, quem adquire um direito e não o regista, não o pode opor a
um terceiro que deriva do mesmo transmitente o mesmo direito. Se assim não fosse, o
instituto do registo era perfeitamente inútil, o registo seria meramente proclamatório.

Então, se o registo das situações aquisitivas (situações pelas quais se transmitem ou


adquirem direitos reais) é um registo que permite opor a terceiros essa situação, então,
se assim é (e é o que está refletido em alguns preceitos do CC), o acordão uniformizado de
jurisprudência não faz sentido nenhum, pois desvaloriza a função do registo predial.

Filipa R. G. 86

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Repara-se no artigo 603.º/1 do CC que diz que os bens deixados ou doados
(executados) com a cláusula de exclusão da responsabilidade por dívidas do
beneficiário respondem pelas obrigações posteriores à liberalidade, e também pelas
anteriores se for registada a penhora antes do registo daquela cláusula. Este artigo
trata de uma situação em que um bem é doado com cláusula de exclusão da
responsabilidade por dívidas do beneficiário, ou seja, o donatário aceita, mas não quer
ser responsabilizado por qualquer dívida inerente a esse bem. Então, se o bem for
penhorado, este artigo diz que ele ficada exonerado ou não fica exonerado, consoante
o registo desta cláusula de exoneração seja anterior ou posterior ao registo da
penhora sobre esse mesmo bem.

O direito português tem, já há muito tempo, esta ideia de oponibilidade das situações
registadas em relação a outras situações em que o mesmo titular ou disponente
dispõe de um direito ou onera um bem, de tal forma a que os dois direitos sobre o
mesmo bem são total ou parcialmente incompatíveis ou conflituantes - são terceiros
para efeitos de registo aqueles que adquirem do mesmo titular ou disponente,
direitos total ou parcialmente incompatíveis ou conflitantes sobre o mesmo objeto.

Então, B e C seriam terceiros para efeitos de registo, porque eles adquiriram


derivadamente do mesmo titular direitos total ou parcialmente incompatíveis ou
conflitantes (no caso, são parcialmente incompatíveis) sobre a mesma coisa (a casa),
independentemente da vontade de A: tanto a venda a B (caso em que haveria vontade de
A), como a penhora a favor de C (caso em que não haveria vontade de A), derivam de A
ser o proprietário inscrito, ou seja, ambos derivam da esfera jurídica de A.

Para agravar a situação da jurisprudência errónea, imaginemos a seguinte situação:


O bem é penhorado pelo agente de execução e posteriormente vendido, em venda
executiva, a Z que regista, registo este que deriva do registo da penhora. Segundo
artigo 824.º/2 do CC, os bens são transmitidos livres dos direitos de garantia que os
onerarem, bem como dos demais direitos reais que não tenham registo anterior ao de
qualquer arresto, penhora ou garantia, com excepção dos que, constituídos em data
anterior, produzam efeitos em relação a terceiros independentemente de registo. Isto
significa que o bem vendido a Z é vendido livre dos outros direitos reais que não
tenham registo anterior ao registo da penhora. Logo, como B não registou o bem, não
tem registo anterior ao registo da penhora, então, segundo o artigo 824.º/2 do CC,
quando Z adquirir, Z - se B não embargar de terceiro e, se não embargar de terceiro,
os tribunais não vão aplicar a doutrina do acordão uniformizador - seja numa ação de
reivindicação ou outra, irá ganhar e opõe o seu direito de propriedade a B.

Filipa R. G. 87

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


Temos aqui patente a contradição da jurisprudência: trata da penhora e do conflito
entre penhorante (exequente) e o que adquiriu ao executado antes da penhora e não
registou, mas quando chega a esta situação diz que essa é diferente: o Z, que deriva o
seu direito de propriedade da penhora e como a penhora tem um registo feito sempre
antes de qualquer registo de B (que não registou), é terceiro para efeito de registo, por
causa do artigo 824.º/2 do CC, logo a transmissão de A para B não lhe é oponível,
porque os direitos reais não levados a registo antes do registo da penhora (como foi o
direito real de propriedade que se transmitiu entre A e B) caducam com a venda
executiva (no caso, a Z). Assim sendo, B irá perder qualquer ação de reivindicação
que Z deduza contra ele, pois prevalecem os direitos primeiramente levados a registo.

2.8.4. Penhora de bens móveis sujeitos a registo (artigo 768.º/1 do CPC)

Nos termos do artigo 768.º/1 do CPC, à penhora de coisas móveis sujeitas a registo aplica-
se, com as devidas adaptações, o disposto no artigo 755.º, que é uma norma para a realização
da penhora de coisas imóveis.

Tal implica que o agente de execução, para fazer a penhora, efetue a comunicação eletrónica
para o instituto dos registos e do notariado, comunicação esta que vale como pedido de registo
de penhora (artigo 755.º/1 do CPC). Abrevado o registo da penhora, os efeitos da penhora
retroagem à data da comunicação eletrónica.

Agora, relativamente à apreensão, temos detalhes consoante esteja em causa um veículo


automóvel, um navio ou uma aeronave.

2.8.4.1. Penhora de veículos automóveis (artigo 768.º/2 e 3 do CPC)

O artigo 768.º/2 do CPC diz-nos que a penhora de veículo automóvel pode ser precedida
da imobilização do veículo — ou seja, antes de se fazer a penhora do veículo automóvel, antes
da tal comunicação eletrónica, pode o agente de execução imobilizar o veiculo —, através da
imposição de selos ou de imobilizadores — trata-se de um ato prévio de apreensão que não
vale como penhora, e que, por isso, não produz os efeitos da penhora, mas antecipa-a; deste ato
prévio resulta apenas a indisponibilidade fáctica do automóvel. Se assim suceder, em regra, em
24 horas, o agente de execução terá que efetuar a comunicação electrónica, que tem valor
de pedido de registo de penhora.

O artigo 768.º/3 do CPC diz-nos que após a penhora e a imobilização, deve proceder-se:

a) À apreensão do documento de identificação do veículo, se necessário por autoridade


administrativa ou policia (…);

b) À remoção do veículo — em regra, remove-se o veículo para um depósito público ou

Filipa R. G. 88

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


semi-público, que o agente de execução arrenda —, (…), salvo se o agente de execução
entender que a remoção é desnecessária para a salvaguarda do bem — note-se que
pode prejudicar a consistência física do bem — ou manifestamente onerosa em relação
ao crédito exequendo — note-se que esse valor vai sair da venda do bem penhorado.

2.8.4.2. Penhora de navios (artigo 768.º/4, 769.º e 770.º do CPC)

Nos termos do artigo 768.º/4 do CPC, a penhora do navio é comunicada não apenas à
autoridade de aviação civil portuguesa, mas também à capitania do porto para que esta
apreenda os respetivos documentos e impeça a saída.

Não é o facto de o navio estar penhorado que faz com que este esteja parado na doca. Nos
termos do artigo 769.º/1 do CPC, o depositário de navio penhorado pode fazê-lo navegar se o
executado e o exequente estiverem de acordo e preceder autorização judicial.

2.8.4.3. Penhora de aeronave (artigo 768.º/5 do CPC)

Nos termos do artigo 768.º/5 do CPC, penhora de aeronave é seguida de notificação à


autoridade de controlo de operações do local onde ela se encontra estacionada, à qual cabe
apreender os respetivos documentos.

2.8.5. Penhora de bens não sujeitos a registo (artigo 764.º do CPC)

Nos termos do artigo 764.º/1 do CPC, a apreensão de um bem móvel sujeito a registo
(computador, máquina industrial, móveis, eletrodomésticos), através da apreensão efetiva dos bens e
a imediata remoção para depósito (público ou semi-público), assumindo o agente de execução
que realizou a diligência a qualidade de fiel depositário.

Nos termos do artigo 764.º/2 do CPC, não haverá lugar à remoção quando:

1. A natureza dos bens for incompatível com o depósito;

2. A remoção implicar uma desvalorização substancial do bem ou a sua utilização;

3. O custo da remoção for superior ao valor dos bens.

Nestes casos, nos termos do n.º 2, parte final, deve proceder-se a uma descrição
pormenorizada dos bens, à obtenção de fotografia dos mesmos e, sempre que possível, à
imposição de algum sinal distintivo nos próprios bens, ficando o executado como depositário.

Nos termos do artigo artigo 764.º/3 do CPC, presume-se pertencerem ao executado os


bens encontrados em seu poder — vale aqui o artigo 1268.º/1 do CC, segundo o qual o
possuidor goza da presunção da titularidade do direito, ou seja, quem exerce poderes de facto
sobre um bem, presume-se que o titular do bem; pelo que o agente de execução deve logo
penhorar esses bens, a não ser que fique manifestamente convencido que de o bem é de terceiro

Filipa R. G. 89

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


—, mas, feita a penhora, a presunção pode ser ilidida perante o juiz, quer pelo executado ou
por alguém em seu nome, quer por terceiro, mediante prova documental inequívoca do direito
de terceiro sobre eles, sem prejuízo da faculdade de dedução de embargos de terceiro — este
incidente de natureza declarativa não é um embargo de terceiro, porque o legislador diz que o
terceiro pode fazer isto, sem prejuízo da dedução de embargos de terceiro, ação declarativa esta
que é um meio de oposição à penhora, a ser intentada num prazo de 30 dias a partir do
conhecimento deste facto.

2.8.6. Penhora de direitos (artigo 773.º e ss. do CPC)

Os direitos de crédito mais comuns que podem ser penhorados são os salários, as pensões
ou ainda qualquer quantia pecuniária que o executado tenha a receber de um terceiro.

Conforme o artigo 773.º/1 do CPC, a penhora de créditos consiste na notificação ao


devedor, feita com as formalidades da citação pessoal e sujeita ao regime desta, de que o
crédito fica à ordem do agente de execução. Note-se que o devedor a que se alude é o
devedor do devedor (que nada tem que ver com esta execução), uma vez que o crédito
pecuniário encontra-se na esfera jurídica do devedor do executado - ou seja, no caso dos
salários, é a entidade empregadora. Logo, o agente de execução notifica o devedor do
executado para este confirmar a existência do crédito e se nada disser considera-se que existe e
nos termos da indicação do crédito à penhora - artigo 773.º/4 do CPC. Posto isto, o devedor do
executado vai ser notificado para quando for pagar ao executado desconte-lhe uma determinada
quantia, para a reter e a transferir para a conta bancária indicada pelo agente de execução.

Se o devedor do executado não transferir essa quantia para o conta bancária indicada
pelo agente execução, nos termos do artigo 777.º/3 do CPC, não sendo cumprida a obrigação,
pode o exequente ou o adquirente exigir, nos próprios autos da execução, a prestação — ao
devedor do executado, que se torna executado pelo montante indicado pelo agente de execução
—, servindo de título executivo a declaração de reconhecimento do devedor, a notificação
efetuada e a falta de declaração ou o título de aquisição do crédito — trata-se de um título
executivo que se forma no próprio processo executivo, que é um título contra o devedor do
executado e que não existia no início da ação executiva; trata-se de mais um exemplo de título
executivo previsto por força de lei especial (artigo 703.º/1/d) do CPC).

Nota: Se uma pessoa ganhar o salário mínimo, o seu salário não pode ser penhorado, mas já
podem ser penhorados os subsídios (de férias e de natal) e os prémios de produtividade.

O silêncio do devedor do executado, embora permitindo a penhora, não o torna culpado em


embargos de executado, uma vez que a dívida que o executado diz que o devedor do executado
tem para com ele pode, na verdade, não existir. Assim, apesar de o devedor do executado não
ter dito nada e considerando-se, por isso, que o crédito existe, nada obsta que o devedor do

Filipa R. G. 90

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


executado, estando também ele a ser executado por não ter depositado as tais quantias, deduza
embargos de executado e ganhe, provando que se tratava de uma dívida inventada.

2.8.7. Penhora de direitos ou expectativas de aquisição (artigo 778.º do CPC)

Podem ser penhorados direitos que permitem adquirir bens ou expectativas de aquisição de
bens, na medida em que, na fase de formação do direito subjetivo, há uma situação de
pendência em que, embora não haja direito direito subjetivo, pode haver uma expectativa jurídica
que é tutelada pelo direito, expectativa essa que pode ser penhorada.

Exemplo 1. A expectativa do promitente comprador de um contrato-promessa com eficácia meramente


obrigacional dirigida à aquisição futura de um bem imóvel. Essa expectativa de aquisição pode ser
penhorada, substituindo-se o agente de execução ao promitente comprador para exigir a realização do
contrato prometido. Com a realização do contrato prometido, o imóvel entra para a esfera jurídica do
executado e a partir daí a penhora da expectativa converte-se na penhora do bem.

Exemplo 2. Contrato de leasing financeiro (ou locação financeira): O executado tem uma casa, mas é
um bem de uma instituição financeira, que o comprou por indicação do executado e que o arrendou ao
executado. No final do prazo, se o executado quiser pode exercer o direito de opção de compra e comprar
a casa. O que se pode penhorar a este executado é a expectativa de aquisição do bem, mas note-se que
isto só valerá a pena se o prazo da locação estiver quase a terminar, porque bastará pagar poucas
mensalidades para depois o agente de execução poder substituir-se ao executado e exigir da instituição
financeira a celebração do contrato de aquisição pagando o valor residual, valor que saíra dos bolsos do
exequente. Com o pagamento do valor residual à instituição financeira, será obrigada a transferir esses
bens para a esfera jurídica do executado e a penhora da expectativa converte-se na penhora do bem que
agora podem ser vendido ao preço de mercado.

2.8.8. Penhora de depósitos bancários (artigo 780.º do CPC)

Nos termos do artigo 780.º/1 do CPC, a penhora que incida sobre depósito existente em
instituição legalmente autorizada a recebê-lo é feita por comunicação eletrónica realizada pelo
agente de execução às instituições legalmente autorizadas a receber depósitos nas quais o
executado disponha de conta aberta, com expressa menção do processo, aplicando-se o
disposto nos números seguintes e no n.º 1 do artigo 417.º.

Nos termos do artigo 780.º/2 do CPC, o agente de execução comunica, por via eletrónica,
às instituições de crédito referidas no número anterior, que o saldo existente, ou a quota-
parte do executado nesse saldo (artigo 780.º/5 do CPC, segundo o qual, sendo vários os titulares do
depósito, o bloqueio incide sobre a quota-parte do executado na conta comum, presumindo-se que as
quotas são iguais) fica bloqueado desde a data do envio da comunicação, até ao limite
estabelecido no n.º 3 do artigo 735.º, salvaguardado o disposto nos n.os 4 e 5 do artigo 738.º, só
podendo as quantias bloqueadas ser movimentadas pelo agente de execução, salvo o disposto

Filipa R. G. 91

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


no n.º 10 (artigo 780.º/4 do CPC). A comunicação por parte do agente de execução às
instituição de crédito deve ainda conter os elementos mencionados no artigo 780.º/3 do CPC,
sob pena de nulidade, elementos esses que são:

a) A identificação do executado, indicando o seu nome, domicílio ou sede e, em


alternativa, o número de identificação civil ou de documento equivalente, ou o número
de identificação fiscal; e

b) O limite da penhora, expresso em euros, calculado de acordo com o artigo 735.º/3.

Nos termos do artigo 780.º/6 do CPC, quando não seja possível identificar
adequadamente a conta bancária, é bloqueada a parte do executado nos saldos de todos os
depósitos existentes na instituição ou instituições notificadas.

Nos termos do artigo 780.º/7 do CPC, são sucessivamente observados, pela instituição de
crédito e pelo agente de execução, os seguintes critérios de preferência na escolha da conta
ou contas cujos saldos são bloqueados:

a) Preferem as contas de que o executado seja único titular àquelas de que seja contitular
e, entre estas, as que têm menor número de titulares àquelas de que o executado é
primeiro titular;

b) As contas de depósito a prazo preferem às contas de depósito à ordem.

Nos termos do artigo 780.º/8 do CPC, após a comunicação referida no n.º 2, as instituições
de crédito, no prazo de dois dias úteis, comunicam, por via eletrónica, ao agente de
execução:

a) O montante bloqueado; ou

b) O montante dos saldos existentes, sempre que, pela aplicação do disposto nos n.os 4 e 5
do artigo 738.º, a instituição não possa efetuar o bloqueio a que se refere o n.º 2; ou
c) A inexistência de conta ou saldo.

Nos termos do artigo 780.º/9 do CSC, recebida a comunicação referida no número anterior,
o agente de execução, no prazo de cinco dias, respeitados os limites previstos nos n.os 4 e 5
do artigo 738.º, comunica por via eletrónica às instituições de crédito a penhora dos
montantes dos saldos existentes que se mostrem necessários para satisfação da quantia
exequenda e o desbloqueio dos montantes não penhorados, sendo a penhora efetuada
comunicada de imediato ao executado pela instituição de crédito.

2.8.9. Penhora de direito a bens indivisos e de quotas em sociedades (artigo 781.º do


CPC)

2.8.10. Penhora de estabelecimento comercial (artigo 782.º do CPC)

Filipa R. G. 92

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


2.9. O depositário dos bens penhorados:

A penhora indica, em regra, um depositário (note-se que é através dele que é exercida a
posse do tribunal, sempre que a esta haja lugar):

• Na penhora de coisas imóveis, e, por aplicação subsidiária, na penhora de coisas


móveis sujeitas a registo e na penhora de direitos (artigos 772.º e 783.º,
respetivamente), é o agente de execução ou, quando as diligência de execução são
realizadas por oficial de justiça, pessoa por este designada (artigo 756.º/1 do CPC);

• Na penhora de coisas móveis não sujeitos a registo, é o agente de execução que


efetue a diligência (artigo 764.º/1 do CPC);

• Na penhora de estabelecimento comercial, é pessoa designada pelo juiz, quando


estiver paralisada ou deva ser suspensa a atividade do estabelecimento (artigo 782.º/4
do CPC).

• No caso de penhora de direito a bem ou património indiviso, penhora de quota em


sociedade comercial ou de penhora de direito de habitação periódica, podem
implicar a constituição de depositário; assim será, pelo menos, sempre que o direito
penhorado careça de ser administrado.

São deveres do depositário (artigo 760.º/1 do CPC):


- Os deveres gerais do depositário (artigos 1187.º, 1188.º, 1191.º e 1195.º do CC);

- A administração os bens ou direitos penhorados, com a diligência de um bom pai de


família;

- A prestação contas da sua administração.

Mas há casos em que não há lugar, por desnecessária, à figura do depositário. Assim
acontece, no cade de:

• Penhora de direito de crédito. Se o devedor cumprir a obrigação, relativamente à


obrigação principal e às prestações acessórias (maxime juros) porventura devidas, ele
(devedor) fará depósito à ordem do agente de execução ou na sua falta, da secretaria, ou
entregará a coisa ao agente de execução ou à secretaria, que funcionará como
depositário, conforme os casos (artigo 777.º/1 do CPC). Se não cumprir, caberá ao
exequente (ou ao adquirente do direito pela venda) executar o crédito (artigo 777.º/3 do
CPC). Excetuam-se apenas os casos em que haja de ser apreendida uma coisa dada em
garantia, como acontece, em rega, com o penhor (artigo 773.º/7 do CPC).

• Penhora de direito ou expectativa de aquisição, quando não haja apreensão


complementar da coisa que incide;

• Penhora de (outro) direito potestativo;

Filipa R. G. 93

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques

• Penhora de automóvel não apreendido.

Quando o depositário não seja o agente de execução, o depositário pode ser removido se
não cumprir os deveres do seu cargo (artigo 761.º/1 do CPC). Sendo depositário o agente de
execução, a violação dos seus deveres constitui atuação, dolosa ou negligente, sancionada nos
termos do artigo 720.º/4 do CPC e podendo levar à sua destituição, pelo órgão com competência
disciplinar, para todos os efeitos do processo (e não apenas para os decorrentes do depósito).

2.10. O registo da penhora

A penhora de bens sujeitos a registo se efetua, em regra, com a comunicação à


conservatória competente. É o que acontece nos casos de:

• Imóveis ou direitos reais sobre imóveis (artigo 755.º/1, 781.º/5, 783.º do CPC e 2.º/1 do CRP);

• Móveis sujeitos a registo ou direitos reais sobre eles (artigo 768.º/1 e 783.º do CPC);

• Quota de contitular de direito que dê lugar a registo (artigo 781.º/1 e 783.º do CPC);

• Quota ou direito sobre quota de sociedade comercial (artigo 781.º/6 do CPC e 3.º/f) do CRC);

• Direito ao lucro e à quota de liquidação de sociedade em nome coletivo ou de parte social de sócio
comanditado de sociedade em comandita simples (artigo 781.º/6, por analogia, ou artigo 783.´e
3.º/e) do CRC);

• Direito de autor (artigo 783.º do CPC e 215.º/1/d) do CDA);

• Direito a patente, modelo, desenho ou marca (artigos 783.º do CPC e 31.º do CPI).

Mas, outras vezes, o registo da penhora constituiu um ato a esta sub-sequente, a efetuar
com base em certidão do auto que atesta a sua realização. É o que acontece nos casos de:

• Direito de crédito com garantia real sujeita a registo (hipoteca, consignação de rendimentos e
penhor de crédito garantindo por hipoteca: artigos 773.º/7 do CPC e 2.º/1/o) do CRP);

• Direito ou expectativa real de aquisição de bem sujeito a registo (artigo 778.º/1 e, por analogia,
773.º/7 do CPC);

• Bens ou direitos sujeitos a registo por integrarem estabelecimento comercial (artigo 782.º/6 do
CPC).

No segundo grupo de casos, o registo é obrigatório, constituindo ónus do exequente. Com


efeito, não só é condição da eficácia do ato da penhora perante terceiros, nos termos gerais,
como é também condição de prosseguimento do processo de execução, o qual só tem lugar
após a junção do certificado do registo da penhora e da certidão do ónus que incidam sobre os
bens por ela abrangidos.

Pode acontecer que o bem penhorado esteja inscrito em nome de terceiro. Tem, então,
aplicação o artigo 119.º do CRP, que ordena a citação do titular da inscrição registada para, no

Filipa R. G. 94

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


prazo de 10 dias, vir declarar se o bem penhorado lhe pertence, sob pena de a execução
prosseguir. Se o titular da inscrição declarar que o bem lhe pertence, o exequente, se quiser
manter a penhora, instaurará contra ele uma ação declarativa de propriedade, autónoma
relativamente à execução, que fica entretanto suspensa quanto ao bem em causa, sem prejuízo
de o exequente poder desistir da penhora ou requerer a sua conversão em penhora de direito
litigioso.

2.11. Levantamento da penhora

Efetuada a penhora, ela irá, em princípio, subsistir até à venda do bem penhorado. A penhora
pode, porém, extinguir-se por causa diferente da venda executiva (quer essa causa implique
a realização do fim da execução, quer não).

A penhora é levantada:

• Quando ocorra uma causa de extinção da execução, diferente do pagamento posterior


à venda executiva;

• Quando seja julgada(o) procedente a oposição à penhora, os embargos de terceiro e


os embargos de executado;

• Quando o exequente desista da penhora, nos casos em que lhe é permitida a


substituição por outro bem penhorado (artigo 751.º/4/a) a e) do CPC);

• No esquema dos efeitos legais do acordo do pagamento em prestações;

• Se a execução estiver parada durante 6 meses, por negligência que não seja
imputável ao executado, e este requerer o levantamento (artigo 763.º/1 do CPC): O
levantamento da penhora tem lugar - sempre a pedido do executado, dirigido ao agente
de execução - em qualquer caso em que no processo não tenha sido efetuada nenhuma
diligência para a realização do pagamento nos 6 meses anteriores ao requerimento do
executado, por ato ou omissão que não seja da sua responsabilidade (artigo 863.º/1 do
CPC).

Levantada a penhora, resta ao exequente o direito de indemnização contra o Estado,


quando a paragem do processo a ele (exequente) não se deva.

O credor, com crédito vencido e reclamado, que queira evitar o levantamento da penhora,
pode, passados 3 meses sobre o início da atuação negligente do exequente, substituir-se
a este na prática do ato que ele tenha negligenciado (artigo 763.º/4 do CPC). Não pode,
porém, substituir-se ao juiz, ao agente de execução ou ao funcionário judicial negligente.

• No caso de desaparecimento do bem penhorado: Neste caso, das duas uma:

- Ou há lugar a indemnização e a penhora transfere-se para o bem sub-rogado


(crédito ou quantia paga), nos termos do artigo 823.º do CC;

Filipa R. G. 95

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


- Ou não há lugar a indemnização e a penhora extingue-se, por falta de objeto (para o
caso análogo da hipoteca: artigo 730.º/c) do CC).

Determinado o levantamento da penhora, procede-se ao cancelamento do respetivo


registo, se a ele tiver havido lugar (artigo 101.º/2/g) do CRP).

2.12. Reações a penhoras ilegais

2.12.1. Incidente declarativo de oposição à penhora (artigo 784.º e 785.º do CPC)

2.12.1.1. Fundamentos

De acordo com o artigo 784.º/1 do CPC, sendo penhorados bens pertencentes ao executado,
pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos:

a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos (refere-se às


situações de impenhorabilidade relativa) ou da extensão com que ela foi realizada
(refere-se às situações de impenhorabilidade parcial, p. ex., penhorou-se um salário numa
quantidade superior à prevista na lei, deixando o executado com uma quantia inferior ao salário
mínimo nacional);

b) Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida


exequenda (refere-se às situações de penhorabilidade subsidiária que não foram
respeitadas, p. ex., numa ação movida contra um dos cônjuges penhorou-se um bem comum
que não poderia ser penhorado imediatamente);

c) Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito
substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência
(refere-se às situações de impenhorabilidade absoluta, p. ex., penhora de bem inalienável,
que está fora do comércio jurídico).

2.12.1.2. Legitimidade e prazo

De acordo com o artigo 785.º/1 do CPC, a oposição - que é um incidente de natureza


declarativo que tramita por apenso à ação executiva - é apresentada - pelo executado - no
prazo de 10 dias a contar da notificação do ato da penhora.

2.12.1.3. Aplicação de outras regras

De acordo com o artigo 785.º/2 do CPC, a este incidente aplicam-se as regras gerais dos
incidentes declarativos (artigos 293º a 295.º do CPC) — sendo a tramitação processual dos
incidentes declarativos uma sequência muito económica/rápida: 1) Requerimento de oposição; 2)
Contestação do exequente, onde o exequente exerce o direito ao contraditória; 3) Audiência de

Filipa R. G. 96

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


produção de prova, onde se ouvem as testemunhas e onde dificilmente haverá prova pericial; 4)
Decisão do juiz — e, com as necessárias adaptações, as regras quanto ao termo da
oposição à execução (artigo 732.º/1 e 3 do CPC).

2.12.1.4. Suspensão da execução

De acordo com o artigo 785.º/3 do CPC, a execução só é suspensa se o executado prestar


caução; a suspensão circunscreve-se aos bens a que a oposição respeita, podendo a execução
prosseguir sobre outros bens que sejam penhorados. A não ser que se trata da penhora da
habitação efetiva do executado, caso em que, independente da prestação de caução, em
princípio, se suspende a oposição (artigo 785.º/4 do CPC).

2.12.1.5. Procedência da execução

De acordo com o artigo 785.º/5 do CPC, quando a execução prossiga, nem o exequente nem
qualquer outro credor pode obter pagamento na pendência da oposição, sem prestar caução.

De acordo com o artigo 785.º/6 do CPC, a procedência da oposição à penhora determina


que o agente de execução proceda ao levantamento desta e ao cancelamento de eventuais
registos.

2.12.2. Embargos de terceiro (artigo 342.º e ss. do CPC)

De acordo com o artigo 342.º/1 do CPC, no caso de a penhora (ou outro qualquer ato
judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens) atingir direitos ou a posse de terceiro
que não devia atingir, o terceiro, que não é parte na causa, pode ser autor uma ação declarativa
autónoma, embora funcionalmente dependente da ação executiva. Note-se que, de acordo com
o artigo 342.º/2 do CPC, não é admitida a dedução de embargos de terceiro relativamente à
apreensão de bens realizada no processo de insolvência.

2.12.2.1. Legitimidade ativa e legitimidade passiva

Tem legitimidade ativa (autor) o terceiro que viu os seus direitos ou passe atingidos pela
penhora, mas note-se que é terceiro, para efeitos de legitimidade ativa nos embargos de terceiro,
quem não for parte na ação executiva, ou seja, quem não for exequente nem executado, embora
o pudesse ser (artigo 342.º/1 do CPC). P. ex., nos casos em que há um devedor, mas o exequente não
o acciona como executado, logo não é réu na ação executiva, é terceiro; se for penhorado um bem dele,
embora ele seja devedor, ele pode embargar de terceiro, porque não está a ser parte na ação executiva.

Tem legitimidade passiva (réu) o exequente e o executado (artigo 348.º/1 do CPC, quando
fala em partes primitivas, artigo este que implicitamente prevê uma situação de litisconsórcio
necessário legal passivo).

Filipa R. G. 97

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


2.12.2.2. Processamento e prazo

Nos termos do artigo 344.º/1 do CPC, os embargos são processados por apenso à causa
em que haja sido ordenado o ato ofensivo do direito do embargante.

Nos termos do artigo 344.º/2 do CPC, o embargante deduz a sua pretensão, mediante
petição, nos 30 dias subsequentes àquele em que a diligência foi efetuada ou em que o
embargante teve conhecimento da ofensa, mas nunca depois de os respetivos bens terem
sido judicialmente vendidos ou adjudicados, oferecendo logo as provas.

2.12.2.3. O pedido e a causa de pedir

O pedido (objeto de processo) numa ação de embargos de terceiro é o efeito jurídico


pretendido pelo autor (o executado) dessa ação, que é:

1) O levantamento da penhora sobre o(s) concreto(s) bem(ns);

2) Se o(s) bem(ns) for(em) sujeito(s) a registo, o cancelamento do registo da penhora,


pelo serviço de registo competente

A causa de pedir numa ação de embargos de terceiro são as ocorrências da vida real, à luz
de determinada norma, que alicerçam o efeito jurídico pretendido. No caso, à luz do artigo 342.º/
1 do CPC, são duas as causas de pedir:

1) A apreensão (no caso, a penhora) ofende a posse do terceiro autor dos embargos;

Exemplo: O promitente comprador, quando celebrou o contrato-promessa pagou a totalidade do


preço que ia pagar aquando da celebração do contrato-prometido. Sendo promitente comprador,
ele pode vender a quem quiser ficando com uma procuração do promitente vendedor para fazer
o contrato-prometido quando quiser.

Que posse é que o promitente comprador tem havendo tradição da coisa? Tem a mera detenção
(posse em nome alheio) ou a posse em nome próprio?

A posse é o exercício de poderes de facto, normalmente sobre coisas (corpóreas, ainda que o
DOUTOR REMÉDIO MARQUES defenda que também possa haver posse sobre coisas incorpóreas),
exercício esse pode ser feito em nome próprio (quando alguém exerce esses poderes como
proprietário e os demais vêm-no como tal, reunindo o animus e corpus) ou pode haver a mera
detenção (quando alguém exerce poderes de facto, mas em nome de outra pessoa, tendo o
corpus, mas não tem o animus).

O promitente comprador, em regra, é possuidor em nome alheio.

O promitente comprador, que já tinha pago o montante na celebração do contrato-promessa,


antes do contrato prometido, vê agora o imóvel a ser penhorado, porque o promitente vendedor
(que ainda tem o imóvel registado em seu nome) é o executado.

O promitente comprador vem embargar terceiro, alegando ofensa à posse. Embora a situação

Filipa R. G. 98

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


seja injusta, ele não deve ver os embargos julgados procedentes, porque ele exerce posse em
nome alheio, em nome do promitente vendedor.

O que ele podia fazer era intentar uma ação de execução específica, alegando mora e registando
a ação de execução específica antes do registo da penhora da propriedade plena, pedindo a
suspensão da execução para provar que houve mora e que o bem lhe deve ser transmitido. Se
ele ganhar a ação de execução específica, como ela está registada antes do registo da penhora,
a sua aquisição é oponível à penhora e aí os embargos de terceiro vão ser julgados procedentes.

2) A apreensão (no caso, a penhora) ofende um direito (subjetivo) incompatível (que o


terceiro tem) com a penhora (quem diz penhora diz com a diligências consequentes
que vão culminar com a alienação do direito do bem penhora).

O direito subjetivo do executado é incompatível quando não caducar com a venda do


bem penhorado. É o artigo 824.º/2 do CC que nos diz que direitos caducam e não
caducam com a venda do bem penhorado.

Se alguns destes direitos forem titulados por terceiros - direitos que este artigo diz que
não caducam - então, o terceiro pode evitar ter que se confrontar com o adquirente do
bem em ação de reivindicação e pode, através de embargos de terceiro, evitar a venda
obtendo o levantamento da penhora, dizendo que o seu direito não pode ser
desconsiderado com a penhora e com as diligências processuais subsequentes, porque
é um direito que não caduca com a venda executiva.

Exemplo 1. Penhora-se a propriedade plena de um bem que está registado em nome do


executado. Sucede, porém, que, no momento da penhora da propriedade plena e em que o seu
registo é feito, estava já registado o usufruto a favor de um terceiro desse mesmo bem.

Assim sendo, o agente de execução não pode penhorar a propriedade plena, porque se
penhorasse a propriedade plena, ele nunca a poderia vender a um outro adquirente, pois o
direito de usufruto não ia caducar com a venda executiva, porque tem registo anterior ao registo
da penhora.

Portanto, o agente de execução podia apenas penhorar a nua propriedade sobre esse bem, para
não conflituar com o usufruto registado sobre esse mesmo bem, caso em que haveria uma
compatibilidade total.

Depois quem compra-se a nua propriedade ao agente de execução teria de verificar se o


usufruto era vitalício ou se tinha prazo, pois o usufruto extingue-se, no primeiro caso, com a
morte do usufrutuário e, no segundo caso, no fim do prazo, e após a extinção a propriedade
plena é restabelecida.

Exemplo 2. O agente de execução penhora a propriedade plena, mas nesse prédio está um
inquilino com um contrato de arrendamento mais antigo do que o registo de penhora.

Nos termos do artigo 824.º/2 do CC, os direitos incompatíveis com a penhora são normalmente

Filipa R. G. 99

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


aqueles direitos que não se extinguem com a venda executiva sobre o mesmo bem. O direito do
arrendatário não é incompatível, porque se o contrato de arrendamento foi celebrado antes do
registo da penhora da propriedade plena, esse contrato de arrendamento não caduca com a
venda executiva, ele renova-se. Esta uma das situações especialmente previstas no artigo 824.º
do CC de direitos que, independentemente do registo, são oponíveis a terceiros. O direito de
arrendamento não é sujeito a registo, a não ser que o prazo inicial seja superior a 6 anos, mas é
oponível a terceiros, inclusivamente o próprio arrendatário pode opor o seu direito ao senhorio.

Assim sendo, quem comprar a propriedade plena desse prédio penhorado torna-se o novo
senhorio, mas o inquilino e as condições do contrato de arrendamento permanecem iguais.
Logo, o inquilino não tem carência de tutela processual (interesse em agir) para deduzir
embargos de terceiro, pelo que os embargos de terceiro devem ser liminarmente rejeitados.

2.12.2.4. Tramitação

Na fase introdutória dos embargos, há lugar a despacho liminar por parte do juiz, onde o juiz
vai apreciar a petição inicial para saber se os embargos foram deduzidos em tempo e se o motivo
dos embargos é procedente ou improcedente, sem ser ouvida a parte contrária.

Nos termos do artigo 345.º do CPC, sendo apresentada em tempo e não havendo outras
razões para o imediato indeferimento da petição de embargos, realizam-se as diligências
probatórias necessárias, sendo os embargos recebidos ou rejeitados conforme haja ou não
probabilidade séria da existência do direito invocado pelo embargante.

Se os embargos forem recebidos, nos termos do artigo 348.º do CPC, seguem-se os


termos do processo comum, ou seja: contestação e eventual resposta à contestação; despacho
pré-saneador (se houver irregularidades de natureza formal ou de melhor explicação dos factos);
audiência prévia (que, em regra, não é dispensada); despacho saneador; despacho a fixar os temas
da prova; audiência final de discussão; julgamento (onde se produz a maior parte dos meios de
prova); alegações finais dos advogados; sentença final dos embargos de terceiro; eventual
interposição de recurso para o tribunal da Relação.

Note-se que a única especialidade dos embargos de terceiro é a fase introdutória, porque,
a partir da fase de contestação, seguem-se os termos do processo comum.

2.12.2.5. Efeitos

— Efeitos da rejeição dos embargos (artigo 346.º do CPC)

A rejeição dos embargos, nos termos do disposto no artigo anterior, não obsta a que o
embargante proponha ação em que peça a declaração da titularidade do direito que obsta à
realização ou ao âmbito da diligência, ou reivindique a coisa apreendida.

— Efeitos do recebimento dos embargos (artigo 347.º do CPC)

Filipa R. G. 100

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


O despacho liminar que receba os embargos determina a suspensão dos termos do processo
em que se inserem, quanto aos bens a que lhe dizem respeito, bem como a restituição provisória
da posse, se o embargante a houver requerido, podendo, todavia, o juiz condicioná-la à prestação
de caução pelo requerente.

Significa que, em regra, a dedução dos embargos de executado suspende a execução em


relação aos concretos bens objeto de embargos — podendo o juiz condicionar a suspensão
da tramitação da ação executiva em relação aos bens objeto de embargo à prestação de uma
caução — e quanto aos outros bens que foram penhorados e não foram objeto de embargo
a execução continua.

2.12.2.6. Embargos de terceiro por parte dos cônjuges

Nos termos do artigo 343.º do CPC, um cônjuge pode embargar de terceiro quando o
executado é o outro cônjuge — portanto, a ação executiva foi apenas deduzida contra um dos
cônjuges, pois se fosse deduzida contra os dois, ambos eram executados e nenhum era terceiro.
— sem necessidade de autorização dele, para defender por meio de embargos os direitos
relativamente aos bens próprios e aos bens comuns que hajam sido indevidamente
atingidos pela penhora.

O cônjuge não executado pode embargar de terceiro quando:

1) O agente de execução penhorou apenas bens comuns, quando haviam bens próprios
do executado que deveriam ter sido primeiramente penhorados (forem violadas regras
de penhorabilidade subsidiária);

2) O agente de execução penhorou bens próprios do não executado.

2.13. Efeitos materiais e processuais da penhora

— Efeito processual: Apreensão do bem e a transmissão da posse para o tribunal e para


o agente de execução. O executado, quanto muito, com a penhora, se for o depositário, fica
possuidor em nome alheio - em nome do tribunal -, ele perde a posse em nome próprio. Exemplo:
Mesmo que o executado fique em poder dos bens penhorados, fique a morar na casa de morada efetiva
que é o bem penhorado, ele é o proprietário da casa (porque ela ainda não foi vendida), mas passa a ser
depositário e passa aí a ser possuidor em nome alheio.

— Efeitos materiais ou substantivos:

• Inoponibilidade situacional (artigo 819.º do CC): Sem prejuízo das regras do registo,
são inoponíveis em relação à execução — em relação ao tribunal, agente de execução e
ao exequente, bem como os eventuais credores reclamantes que tenham direitos reais
de garantia sobre os bens — os actos de disposição, oneração ou arrendamento dos

Filipa R. G. 101

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


bens penhorados — desde que esses atos tenha sido praticados após a penhora ou o
registo dela.

Até 2003, dizia-se que esta uma situação de inoponibilidade situacional era uma situação
de ineficácia (e ainda hoje se o pode dizer). Estes negócios praticados pelo executado
sobre os bens penhorados, após a penhora e o seu registo, são ineficazes em relação ao
agente de execução, ao tribunal, ao exequente e eventuais credores.

Exemplo: O executado, depois de lhe ter sido penhorado um apartamento do qual é o dono,
vendeu esse apartamento a uma sociedade imobiliária. Se a este contrato de compra e venda não
estiverem subjacentes qualquer situação de invalidade (incapacidade acidental, dolo, erro,
menoridade, situações de acompanhamento que impeçam a venda ou invalidade formal, ou seja,
o negócio ter sido feito verbalmente, se nenhuma destas circunstâncias), que à nascença matam
os negócios jurídicos, o negócio é válido só que é ineficaz, ou seja, não produz efeitos em relação
a estes interessados, sobretudo em relação ao credor exequente, apesar de o negócio existir para
toda a gente. Só no caso de a penhora ser levantada e de o seu registo cancelado é que o
contrato de compra e venda do aparamento readquire todos os seus efeitos.

• Preferência do exequente (artigo 822.º do CC): O exequente adquire pela penhora o


direito de ser pago com preferência relativamente a qualquer outro credor que não tenha
garantia real anterior; caso haja algum credor com garantia real anterior e que venha
reclamar crédito a preferência é a favor deste.

Atenção, isto não é um direito de preferência, a preferência do exequente prevista neste


artigo apenas significa isto.

Exemplo: Há 6 meses um bem foi hipotecado a favor do Santander e hoje foi registada uma
penhora a favor do exequente desse mesmo bem. Quando esse bem for vendido, o Santander, na
medida em que venha reclamar os créditos vencidos, vai ser pago em primeiro lugar, porque tem a
seu favor uma garantia real anterior ao registo da penhora. Logo, aqui o exequente não tem
preferência. Contudo, se o bem fosse penhorado e registado hoje e amanhã o executado
hipotecasse o bem a favor do Santander (que aceitou a penhora nestas condições), então pelo
preço da venda dos bens penhorados, em primeiro lugar, será pago o exequente e, só depois,
Santander.

3. Embargos de executado

Os embargos de executado, previstos nos artigos 728.º e ss. do CPC, que se trata de uma
ação declarativa tramitada por apenso à ação executiva, seja em processo ordinário para
pagamento de quantia certa, seja em processo sumário para pagamento de quantia certa,
dirigem-se a destruir a execução (e não a penhora).

Filipa R. G. 102

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


3.1. Legitimidade ativa e legitimidade passiva

A legitimidade ativa é do executado (da ação executiva, que agora é autor) e a legitimidade
passiva é do(s) exequente(s) (da ação executiva, que agora é(são) réu(s)).

3.2. Prazo

O executado pode opor-se à execução por embargos no prazo de 20 dias (artigo 728.º/1 do
CPC), a contar:

- Quando a matéria da oposição seja superveniente, a partir do dia em que ocorra o


respetivo facto ou dele tenha conhecimento o executado, (n.º 2);

- Da citação, nos restantes casos (n.º 1).

3.3. Pedido e causa de pedir

O pedido (o efeito jurídico pretendido) é que a execução seja extinta, ou seja, que termine a
execução, e a causa ou causas de pedir (que podem ser cumuladas ou não) têm a ver com:

➡ A obrigação exequenda (vícios ou exceções materiais respeitantes à obrigação exequenda -


obrigação exequenda é inexigível, é ilíquida, é incerta, houve pagamento, houve perdão,
prescreveu; ou seja, todas e quaisquer situações consubstanciadas nos factos extintos das
obrigações);

➡ O título executivo (o título é inexequível; não existe título para aquela obrigação; não existe
título que permita executar tanto).

3.4. Fundamentos

3.4.1. Fundamentos (taxativos) baseados em sentença (artigo 729.º do CPC)

Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos


seguintes:

a) Inexistência ou inexequibilidade do título;

b) Falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra


influa nos termos da execução;

c) Falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da


instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento;

d) Falta de intervenção do réu no processo de declaração, verificando-se alguma das


situações previstas na alínea e) do artigo 696.º;

Filipa R. G. 103

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


e) Incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na
fase introdutória da execução;

f) Caso julgado anterior à sentença que se executa;

g) Qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao


encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; a
prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio;

h) Contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos;

i) Tratando-se de sentença homologatória de confissão ou transação, qualquer causa de


nulidade ou anulabilidade desses atos.

3.4.2. Fundamentos baseados em decisão arbitral (artigo 730.º do CPC)

São fundamentos de oposição à execução baseada em sentença arbitral não apenas os


previstos no artigo anterior mas também aqueles em que pode basear-se a anulação judicial
da mesma decisão, sem prejuízo do disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 48.º da Lei da Arbitragem
Voluntária.

Exemplo: O tribunal arbitral não deveria ter funcionado, porque o litígio não estava coberto pela
convenção de arbitragem e o tribunal arbitral julgou-se competente, funcionou e condenou o sujeito que
agora está a ser executado. O sujeito executado pode pedir ao juiz do tribunal do Estado que impeça o
prosseguimento desta execução, porque o tribunal arbitral nem sequer tinha competência para apreciar
aquele litígio.

3.4.3. Fundamentos baseados noutro título (artigo 731.º do CPC)

Não se baseando a execução em sentença — esteja em causa um título extrajudicial — ou em


requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, além dos fundamentos
de oposição especificados no artigo 729.º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser
alegados quaisquer outros que possam ser invocados como defesa no processo de
declaração.

3.5. A tramitação dos embargos de executado

Na fase inicial dos embargos de executados o processo é especial, nos termos do artigo
732.º do CPC, pois a tramitação inicial é diferente da tramitação inicial das ações declarativas
com processo comum, porque há lugar, à luz do n.º 1, a despacho liminar. Ou seja, o juiz toma
logo contacto com a petição inicial para ver se foi deduzida dentro do prazo de 20 dias (artigo
728.º/1), a contar da citação (para o processo ordinário) ou a contar do ato de penhora (para o
processo sumário) e para analisar se o fundamento se ajusta aos fundamentos dos artigos 729.º,

Filipa R. G. 104

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


730.º e 731.º ou se o fundamento é manifestamente improcedente e nem vale a pena avançar
para a contestação. Tal acontece nos embargos de terceiro, coisa que, em regra, não acontece
numa ação declarativa de processo comum. Nesta, em regra, o juiz não olha, nesta fase, para a
petição inicial, a não ser quando o legislador o diz, o juiz só olha para a petição inicial depois da
fase dos articulados.

Posto isto, nos termos do artigo 732.º/1, os embargos, que devem ser autuados por apenso,
são liminarmente indeferidos quando:

a) Tiverem sido deduzidos fora do prazo;

b) O fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 729.º a 731.º;

c) Forem manifestamente improcedentes.

Nos termos do artigo 732.º/2, se forem recebidos os embargos — ou seja, se a petição


inicial for recebida —, o exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 20 dias,
seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo comum declarativo — o que significa
que não há réplica, coisa que pode existir nas ações declarativas com processo comum.

Se o exequente não contestar, nos termos do artigo 732.º/3 do CPC, é aplicável o


disposto no n.º 1 do artigo 567.º — efeitos da revelia — e no artigo 568.º — exceções —, não
se considerando, porém, confessados os factos que estiverem em oposição com os
expressamente alegados pelo exequente no requerimento executivo.

Sendo os embargos procedentes, extingue-se, nos termos do artigo 732.º/4 do CPC, a


execução, no todo ou em parte.

Sendo procedentes os embargos fundados no artigo 696.º/e) do CPC — ou seja, tendo


corrido o processo à revelia, por falta absoluta de intervenção do réu, se mostre que: i) Faltou a
citação ou que é nula a citação feita; ii) O réu não teve conhecimento da citação por facto que não
lhe é imputável; iii) O réu não pode apresentar a contestação por motivo de força maior — é
admitida, nos termos do artigo 732.º/5 do CPC, a renovação da instância deste processo a
requerimento do exequente, apresentado no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado
da decisão dos embargos.

3.6. Efeitos da oposição à execução

— Efeito da decisão de mérito proferida nos embargos à execução (artigo 732.º/6 do


CPC): A decisão de mérito (…) constituiu, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência,
validade e exigibilidade da obrigação exequenda.

— Efeito do recebimento dos embargos (artigo 733.º do CPC): Nos termos do n.º 1, o
recebimento dos embargos suspende o prosseguimento da execução se:

Filipa R. G. 105

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)


lOMoARcPSD|7296051

DIREITO PROCESSUAL CIVIL III

Teóricas

Prof. João Paulo Fernandes Remédio Marques


a) O embargante prestar caução — neste caso, quando seja prestada caução, aplica-se,
com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 650.º/3 e 4 do CPC - n.º 6;

b) Tratando-se de execução fundada em documento particular, o embargante tiver


impugnado a genuinidade da respetiva assinatura, apresentando documento que
constitua princípio de prova, e o juiz entender, ouvido o embargado, que se justifica a
suspensão sem prestação de caução;

c) Tiver sido impugnada, no âmbito da oposição deduzida, a exigibilidade ou a liquidação


da obrigação exequenda e o juiz considerar, ouvido o embargado, que se justifica a
suspensão sem prestação de caução;

d) A oposição tiver por fundamento qualquer das situações previstas na alínea e) do artigo
696.º.

A suspensão da execução, decretada após a citação dos credores, não abrange o apenso
de verificação e graduação dos créditos - n.º 2.

A execução suspensa prossegue se os embargos estiverem parados durante mais de 30


dias, por negligência do embargante em promover os seus termos - n.º 3.

Quando a execução embargada prossiga, nem o exequente nem qualquer outro credor pode
obter pagamento, na pendência dos embargos, sem prestar caução - n.º 4.

Se o bem penhorado for a casa de habitação efetiva do embargante, o juiz pode, a


requerimento daquele, determinar que a venda aguarde a decisão proferida em 1.ª instância sobre
os embargos, quando tal venda seja suscetível de causar prejuízo grave e dificilmente reparável -
n.º 5.

— Efeito da rejeição e aperfeiçoamento (artigo 734.º do CPC): Nos termos do n.º 1, o juiz
pode conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados, das
questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do artigo 726.º, o
indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo. E nos termos do n.º
2, rejeitada a execução ou não sendo o vício suprido ou a falta corrigida, a execução extingue-
se, no todo ou em parte.

Filipa R. G. 106

Descarregado por Gabriela Marques (gabrielamarquesduarte@gmail.com)

You might also like