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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

Comissão de Ética

MANIFESTAÇÃO DA COMISSÃO DE ÉTICA DO


TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO Nº 18/2022

Assunto: atuação de servidor como engenheiro


autônomo ou assistente técnico, em parceria
com escritório de advocacia, em contenciosos
administrativos ou processos judiciais
decorrentes de demandas de tribunais de
contas estaduais ou municipais.

Trata-se de consulta enviada em 5/8/2022, via Sistema Ética (Manifestação 351994),


com o seguinte questionamento:
“Considerando a manifestação CET 15/2022, publicada no BTCU 124/2022, solicito
manifestação da CET quanto à seguinte consulta: servidor do TCU pode atuar como engenheiro
autônomo ou como engenheiro assistente técnico (art. 465 do CPC), em parceria com escritórios
de advocacia, em contenciosos administrativos decorrentes da atuação de tribunais de Contas
Estaduais ou Municipais ou em processos judiciais referentes a demandas desses Tribunais dos
entes subnacionais, desde que a demanda não inclua recurso público federal, não esteja
relacionada com a União (tampouco com o TCU) e não prejudique, comprometa ou impeça a
realização das tarefas atinentes ao cargo público? Existe alguma orientação adicional para que o
servidor, ao atuar como engenheiro autônomo ou como engenheiro assistente técnico nesse
contexto, deva observar para não ofender o Código de Conduta Ética do TCU?”
EXAME
O servidor do Tribunal indaga se é possível atuar como engenheiro autônomo ou
assistente técnico em processos administrativos ou judiciais que tratem de demanda decorrente de
ação de tribunais de contas dos estados ou municípios que não inclua recurso público federal, não
esteja relacionada com a União nem com o TCU e não prejudique, comprometa ou impeça a
realização das tarefas atinentes ao cargo público.
A prova pericial é tratada nos artigos 464 a 480 do novo Código de Processo Civil
(CPC). Em suma, há duas figuras que atuam nesse procedimento: o perito judicial e o assistente
técnico.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) firmou entendimento no sentido de que servidor
público não pode atuar como perito judicial nomeado pelo juiz da causa. Eis a ementa do julgado:
“CONSULTA. SERVIDORA PÚBLICA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. ANALISTA
JUDICIÁRIO. PERITA CONTÁBIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
PERNAMBUCO. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. CONSULTA
RESPONDIDA.
I - Trata-se de Consulta submetida a este Conselho para análise sobre a possibilidade de
acumulação dos cargos de analista judiciário com o de perito contábil, de nomeação judicial.
II - O artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal determina que é vedada a acumulação
remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observadas
as seguintes hipóteses: a) a de dois cargos de professor b) a de um cargo de professor com outro
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técnico ou científico c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com


profissões regulamentadas.
III - A restrição constitucional também se estende à possibilidade de acumular empregos e
funções e abrange autarquias, fundações, empresas públicas, sociedades de economia mista,
suas subsidiárias, e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo poder público, nos
termos do inciso XVII do mesmo artigo 37.
IV - São dois os requisitos que autorizam a acumulação remunerada de cargos públicos, quais
sejam: hipóteses taxativamente previstas na Constituição e Compatibilidade de Horários.
V - A acumulação almejada não está prevista no normativo que disciplina a matéria, sendo
impossível o exercício concomitante dos cargos pretendidos pela Consulente. Dessa forma,
mesmo que a servidora trabalhe apenas 06 horas por dia com disponibilidade para outras
atividades, há vedação normativa expressa.
VI - Consulta respondida pela incompatibilidade na acumulação dos cargos de Analista
Judiciário e Perita Contábil, nomeada judicialmente, em processos que tramitam no âmbito dos
Juízos Estadual e/ou Federal.
(CNJ - Consulta - 0002581-95.2012.2.00.0000 - Rel. JOSÉ LUCIO MUNHOZ - 150ª Sessão
Ordinária - julgado em 04/07/2012).”
Contudo, ao analisar normativo mais recente, pode-se inferir que o CNJ admite o
exercício do encargo de perito por servidor público, exceto se detentor de cargo no âmbito do Poder
Judiciário. Este somente poderá realizar a perícia na hipótese de o pagamento dos honorários for de
responsabilidade de beneficiário de gratuidade da justiça e também custeado com recursos alocados
no orçamento do ente púbico (artigos 1º, § 2º, e 14 da Resolução-CNJ 233/2016 1 c/c o art. 95, § 3º,
inciso I, do CPC).
Já em relação ao assistente técnico, o artigo 465 do atual CPC estipula o seguinte:
“Art. 465. O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo
para a entrega do laudo.
§ 1º Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de
nomeação do perito:
I - arguir o impedimento ou a suspeição do perito, se for o caso;
II - indicar assistente técnico;
III - apresentar quesitos.” (destaques acrescidos)
O assistente técnico é o profissional usualmente contratado pela parte para acompanhar
os trabalhos da perícia judicial. Assim, trata-se de pessoa de confiança da parte que não está sujeita
a impedimento ou suspeição, como prevê o artigo 466, § 1º, do CPC.
No âmbito desta Corte de Contas, a Resolução-TCU 106/1998 prevê o não atendimento
de solicitações ou requerimentos que visem à liberação de servidor para, em razão do exercício do
cargo, prestar depoimento destinado a auxiliar a instrução de inquérito policial, atuar como perito
judicial, realizar perícia contábil ou outras atividades de natureza assemelhada, salvo nos
casos determinados em lei específica ou previstos em acordos ou instrumentos congêneres (artigo
4º).

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Consultada, em 30/9/2022, no endereço eletrônico < https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2016/07/c653aa8306310ae2c172f5ada3fe45df.pdf>
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Um dos fundamentos para essa restrição encontra-se no artigo 3º da mesma norma e


refere-se ao fato de o pronunciamento sobre a regularidade dos atos da Administração ser
competência exclusiva dos colegiados do Tribunal.
Diante desse contexto, e considerando manifestações pretéritas da Comissão de Ética, a
exemplo da indicada pelo consulente, não há evidências de conflito entre interesses públicos e
privados – na acepção dada pelo art. 10 do Código de Conduta Ética, aprovado pela Resolução-
TCU 330/20212 – na atuação de servidor do TCU como engenheiro autônomo ou assistente técnico,
contratado, em caráter particular, por parte ou escritório de advocacia, em demandas administrativa
ou judicial que advenham de processos de tribunais de contas estaduais ou municipais, conforme
questionado pelo interessado, desde que respeitadas as prescrições legais e normativas, inclusive as
éticas.
De fato, nas condições postas, se a demanda não versar sobre matéria de competência
desta Corte e o servidor não atuar no exercício do cargo, a prestação de serviços como engenheiro
autônomo ou assistente técnico não parece, em princípio, colidir com as disposições do referido
código, uma vez que a fonte de remuneração pelos serviços tem caráter privado, sem prejuízo de o
servidor ficar sujeito às demais orientações da norma.
Todavia, em vista das disposições do art. 14, inciso I, do Código de Conduta Ética 3,
cabe considerar que a atuação de servidor do TCU em demanda poderá suscitar conflito entre
interesses público e privado caso a parte envolvida no processo administrativo ou judicial em
âmbito estadual ou municipal seja jurisdicionada a este Tribunal ou venha a ser arrolada em
processo em tramitação no órgão.
Um ponto bastante sensível nessa questão é o de que o TCU tem jurisdição sobre
estados e municípios quando executam recursos da União, os quais igualmente estão sujeitos à
fiscalização dos correspondentes tribunais de contas. Além disso, é comum que empresas que
prestam serviço a esses entes da federação também possam ter relação com a execução de despesas
cobertas por recursos federais.
Portanto, a atuação de servidor do TCU em processos que envolvam tribunais de contas
estaduais e municipais deve ser objeto de grande precaução para evitar situações de conflito, a teor
do que dispõe o artigo 13, inciso IV, alínea “b”, do Código de Conduta Ética:
“Art. 13. Configura conflito de interesses no exercício de cargo ou função no âmbito do TCU:

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“Art. 10. Considera-se conflito de interesses a situação gerada pelo confronto entre os interesses do Tribunal de
Contas da União e os interesses privados do servidor, que possa comprometer o interesse coletivo ou influenciar, de
maneira imprópria, o desempenho da função pública ou dos resultados dela esperado.”
3
“Art. 14. Pode configurar conflito de interesses, a ser averiguado no caso concreto:
I - realização de trabalho ou prestação de serviços de consultoria, de advocacia, de assessoria, de assistência técnica, de
organização ou ministração de cursos, seminários ou palestras, de forma remunerada ou não, de natureza permanente ou
eventual, ainda que fora de seu expediente, a:
a) qualquer pessoa física ou jurídica de natureza privada que esteja sob a jurisdição do Tribunal de Contas da União ou
que com ele mantenha relação contratual, ou que atue como representante legal, em processos do TCU, de pessoas
físicas ou jurídicas; ou
b) órgãos e entidades da administração direta, autárquica e fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
dos Municípios e do Distrito Federal, especialmente os realizados no âmbito de convênios, acordos, ajustes ou
instrumentos congêneres custeados com recursos do Orçamento Geral da União.”
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(...)
IV - participar de trabalho de fiscalização, instrução processual ou qualquer outra missão ou
tarefa que lhe tenha sido confiada, nas hipóteses abaixo elencadas ou em situações análogas,
semelhantes ou correlatas a estas:
(...)
b) quando envolver processo, contrato, acordo ou instrumentos congêneres em que tenha atuado
como perito ou advogado, inclusive indiretamente, mediante escritório de advocacia com o qual
tenha vínculo profissional ou de colaboração, ou participado de atividades de auditoria interna
ou de controle interno.”
Da mesma forma, se o servidor do TCU for contratado como engenheiro autônomo ou
assistente técnico e receber retribuição pecuniária de cofre estadual ou municipal – logicamente se
isso for permitido nas leis locais – ou particular, mesmo por intermédio de escritório de advocacia,
não poderá atuar em processo de controle externo que diga respeito à parte contratante, a fim de não
prejudicar a imagem de imparcialidade no desempenho do trabalho exercido como detentor de
cargo efetivo ou função nesta Corte de Contas.
Nessas hipóteses, o servidor deverá declarar-se impedido, nos termos do artigo 12 do
Código de Conduta Ética, bem como do artigo 8º da Portaria-TCU 112/2022.
Ademais, caso o servidor do Tribunal haja instruído processo no TCU que verse sobre
matéria tratada em processo administrativo ou judicial em âmbito estadual ou municipal, haverá
conflito entre interesses públicos e privados.
Assim, não caberá sua atuação como engenheiro autônomo ou assistente técnico, no
intuito de evitar máculas em relação à imparcialidade do trabalho desempenhado e à imagem desta
Corte e possíveis questionamentos sobre uso de informação privilegiada a que teve acesso no
exercício do cargo ou função públicos (artigos 13, incisos I e III, do código4 e 5º da mencionada
portaria5).
Nesse ponto, é importante destacar que nosso código condena até mesmo o conflito
aparente, “quando, embora não haja ou não possa haver o conflito real, a situação apresentada parece gerar
conflito, de forma a lançar dúvidas sobre correção da conduta do servidor do TCU ” (art. 11, inciso III).

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“Art. 13. Configura conflito de interesses no exercício de cargo ou função no âmbito do TCU:
I - exercer atividade que seja incompatível com as atribuições do cargo ou da função pública, na forma definida em
regulamento, sendo como tal considerada, inclusive, aquela desenvolvida em áreas ou matérias afins à competência
funcional;
(...)
III - divulgar ou fazer uso de informação privilegiada, em benefício próprio, de parentes, de amigos ou de terceiros,
obtida em razão das atividades exercidas;
(...)”
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“Art. 5º Considera-se incompatível com as atribuições do cargo ou da função pública, consoante previsto no inciso I
do art. 13 do Código de Conduta Ética dos Servidores do TCU, toda atividade particular do servidor que:
I - incorra em vedação constitucional, legal ou regulamentar;
II - afete o cumprimento do horário de trabalho, das regras de teletrabalho ou das metas individuais de desempenho;
III - faça uso de informação privilegiada obtida em decorrência do exercício do cargo ou função pública;
IV - cause prejuízo relevante à imagem ou à credibilidade do TCU; e
V - gere conflito entre interesses públicos e privados, em especial promoção ou benefício pessoal a parentes, amigos ou
terceiros.”
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CONCLUSÃO
Ante o exposto, conclui-se por responder ao interessado que:
I - não consta vedação expressa no Código de Conduta Ética, aprovado pela Resolução-
TCU 330/2021, à atuação de servidor do Tribunal de Contas da União como engenheiro autônomo
ou assistente técnico em demanda judicial ou processo administrativo decorrente de ação de
tribunais de contas estaduais ou municipais que não inclua recurso público federal, não esteja
relacionada com a União ou com matéria  de competência desta Corte e não prejudique,
comprometa ou impeça a realização das tarefas atinentes ao cargo ou função públicos ocupados,
desde que respeitadas as demais prescrições legais e éticas e essa atuação ocorra em caráter
estritamente privado, sem qualquer vinculação com o TCU;
II - entretanto, nessas circunstâncias, a fim de evitar a caracterização de conflito entre
interesses públicos e privados:
a) o servidor do TCU contratado como engenheiro autônomo ou assistente técnico –
inclusive, indiretamente, por intermédio de escritório de advocacia – não poderá atuar em processo
de controle externo que envolva a parte contratante, devendo, nesse caso, declarar-se impedido
(artigos 12 e 13, inciso IV, alínea “b”, do referido Código de Conduta Ética e 8º da Portaria-TCU
112/2022);
b) da mesma forma, haverá impedimento para que o servidor do TCU atue como
engenheiro autônomo ou assistente técnico na demanda caso tenha laborado em processo de
controle externo de interesse da parte contratante (artigos 10, 11 e 13, incisos I e III, do citado
Código de Conduta Ética e 5º da Portaria-TCU 112/2022).

TCU, em 6 de outubro de 2022.

(assinado eletronicamente)
Maria Rosangela de Oliveira Andrade
Presidente da Comissão de Ética

(assinado eletronicamente)
Rodrigo de Oliveira Fernandes
Membro da Comissão de Ética

(assinado eletronicamente)
Marco Aurélio Pereira de Souza
Membro da Comissão de Ética

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