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Fontes e Repertórios Míticos do Carneiro: Antiguidade Clássica (Grécia e Roma)

por Julia Schmidt

Hesíodo (Grécia, século VIII AEC)


Teogonia
“À filha de Eetes, rei descendente de Zeus,
por vontade dos deuses que vivem sempre, o filho de Éson
levou-a de junto de Eetes, depois de superadas amargas provas,
que, em grande número, lhe impusera um rei grande e orgulhoso,
o insolente Pélias, arrogante e violento.
Terminou-as e voltou a Iolco, depois de grandes fadigas,
Levando na sua nau veloz a jovem de olhos vivos,
ele, o filho de Éson, e fez dela sua feliz esposa.
E ela, possuída por Jasão, pastor de povos,
gerou um filho, Medeio, que foi criado, nas montanhas, por Quíron,
o filho de Fílira. Cumpria-se assim o plano do grande Zeus.”
(Teogonia, 992 – 1002. Tradução de Ana Elias Pinheiro)

Píndaro (Grécia, século VI AEC)


Ode IV
"Aos heróis que navegaram com Jasão, armado de lança, falou assim: "Escutai-me
filhos de homens temerários e dos deuses; digo-vos que nesta terra batida pelo mar a
filha de Épafo há-de plantar a raiz das cidades, cuidado dos homens, sobre o templo de
Zeus, Àmon. (10-17)
(Odes. Tradução de António de Castro Careio)

Eurípides (Salamina, Grécia, século V AEC)


Medeia
Ama: Quem me dera que a nau de Argos, quando seguia para a terra da Cólquida, nunca
tivesse batido as asas, através das negras Simplégades, e que nas floresta do Pélion não
houvesse tombado o pinheiro abatido, nem ele tivesse dados os remos aos braços dos
homens valentes, que buscaram o velo de ouro para Pélias. Assim não teria Medeia, a
minha senhora, navegado para as fortalezas da terra de Iolcos, ferida no seu peito pelo
amor de Jasão. Nem, depois de convencer as filhas de Pélias a matar o pai, habitaria esta
terra de Corinto com o marido e os filhos, alegrando com a sua fuga os cidadãos a cujo
país chegara, em tudo concorde com Jasão. Porque é essa certamente a maior segurança,
que a mulher não discorde do marido. (01-16)
(Medeia. Tradução Maria Helena da Rocha Pereira)

Fui eu quem te salvou, como sabem dos helenos quantos embarcaram na mesma nau de
Argos, quando te mandaram pôr o jugo aos touros ignispirantes e semear o campo
mortífero. E o dragão, que, envolvendo o velo de ouro, enrolado em espiral, o
guardava insone, matei-o, levando à tua frente a luz da salvação. (475-482)
(Medeia. Tradução Maria Helena da Rocha Pereira)

Apolônio de Rodes (Alexandria, século III AEC)


Argonáutica

Começo por ti, Febo, para lembrar as glórias


dos mortais há muito nascidos que, pela foz do Ponto
e atravessando as Rochas Ciâneas, por ordem do rei Pélias,
conduziram até ao velo de ouro a nau Argo de belos bancos.
Eis a profecia que Pélias ouviu: no futuro esperá-lo-ia
um destino odioso, pois publicamente se submeteria à
influência de um homem que veria chegar com uma só sandália.
Não muito tempo depois, de acordo com o teu oráculo,
Jasão, atravessando a pé a corrente do Anauro engrossada
pela borrasca, salvou da lama uma sandália, ficando a outra
para trás, presa ali mesmo nas profundezas da foz do rio.
Chegou sem delongas junto de Pélias, ao festim
celebrado em honra do pai Posídon e dos outros
deuses; só Hera pelasga eles não veneravam1.
Logo que viu Jasão, pôs-se a conjeturar e desafiou-o
com uma navegação plena de aflições, para lhe gorar
o regresso, fosse no mar fosse entre homens de outras terras.
(Argonáutica, Livro I, versos 01- 17. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)
“Zeus soberano, qual é a ideia de Pélias? Para onde mandou
ele este grupo de homens, ao expulsá-los da terra aqueia?
Quando Eetes se recusar a entregar de bom grado o velo,
são bem capazes de lhe devastar a casa pelo deletério fogo.
Da viagem não podem fugir e a tarefa é bem difícil de realizar.”
Assim falavam, aqui e ali, na cidade. As mulheres
erguiam, fervorosas, as mãos aos céus, pedindo aos imortais
que concedessem aos heróis o regresso que regozija o coração;
e lamentavam-se entre si derramando lágrimas:
“Desditosa Alcímede, também para ti chegou o infortúnio,
embora algum tempo mais tarde, pois não terminaste a vida
em glória.
Quão grande é a infelicidade de Jasão! Teria sido melhor
para ele que outrora o tivessem envolvido numa mortalha
e jazesse debaixo da terra, ínscio das funestas provas.
Pudesse também a vaga negra ter engolido Frixo,
juntamente com o carneiro, quando morreu a donzela Hele.
Em vez disso, o funesto prodígio de ouro emitiu uma voz humana
para, mais tarde, causar a Alcímede tristezas e miríades de dores.”
(Argonáutica, Livro I, versos 242- 259. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

Sem demora nem rodeios, explicou o pensamento do filho de


Leto: “O destino e a incumbência que os deuses vos dão
é voltar aqui com o velo, mas entretanto imensas
hão de ser as provas, tanto na ida como no regresso.
O odioso destino que, segundo a divindade, me cabe, é
morrer bem longe daqui, algures na terra da Ásia.
Outrora as funestas aves instruíram-me da minha fortuna
e ainda assim deixei a pátria para embarcar e para preservar
a glória da minha casa com este embarque.”
Assim falou. Os jovens ouviram, satisfeitos, os vaticínios
sobre o regresso, mas angustiaram-se com o destino de Ídmon.
(Argonáutica, Livro I, versos 439- 449. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

Aí estava também o Mínias Frixo, como se deveras


escutasse o carneiro, que lhe parecia falar. Ao vê-los
ficarias em silêncio e iludir-se-ia o espírito,
esperando ouvir deles uma notícia densa de sentido,
e, nesta expectativa, ficarias muito tempo a contemplá-los.
Tal era o presente da divina Itónia Atena.
(Argonáutica, Livro I, versos 763- 768. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

“Homens surpreendentes, afasta-nos da pátria o assassínio


de um parente? Ou viemos de lá para aqui necessitados
de casamento por desdenharmos das nossas cidadãs? Agrada-vos
habitar aqui para desflorar as fecundas terras aráveis de Lemnos?
Ora mulheres forasteiras não nos farão granjear glória,
há tanto tempo aqui isolados; nem o velo virá por sua própria
iniciativa, como dádiva de algum deus que o vá arrebatar
pelas nossas preces. Vamos, cada um para a sua casa; e, a ele,
deixai-o passar o dia inteiro no leito de Hipsípile, até que povoe
Lemnos com meninos e a grande notícia chegue a todo o lado.”
(Argonáutica, Livro I, versos 865- 874. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

Hipsípile fazia a mesma prece, tomando as mãos


do Esónida; escorriam-lhe lágrimas, porque ia ficar sem ele:
“Vai e que os deuses permitam que voltes são e salvo
com os teus companheiros, levando ao rei o velo de ouro,
conforme tu queres e te apraz . Esta ilha e o cetro
de meu pai estarão disponíveis, se, no futuro,
um dia, quando regressares, aqui quiseres voltar.
Reunirás facilmente sob o teu poder imensos povos
de outras cidades. Mas tu não hás de ter este desígnio;
eu mesma não prevejo que isto se leve assim a cabo.
Ao menos lembra-te de Hipsípile na partida e também no
regresso.
(Argonáutica, Livro I, versos 886- 897. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)
Ouvi-me, vós que excedeis todos os Helenos,
se deveras sois os que, sob a ordem fria de um rei,
Jasão conduz na nau Argo em busca do velo – sim, em rigor
sois vós, pois a minha mente conhece cada pormenor,
graças à ciência profética; agradeço-te, a ti soberano,
filho de Leto, mesmo nas minhas árduas tribulações –
por Zeus Protetor dos Suplicantes, que é para infratores
o mais arrepiante dos deuses, por Febo e pela própria Hera,
que é entre os deuses a que mais cuida de vós, viajantes,
suplico-vos: auxiliai-me, salvai um infeliz do ultraje;
não partais deixando-me para trás com indiferença.
(Argonáutica, Livro II, versos209-219. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

Mais adiante, depois desta ilha e da terra em frente,


vivem os fílires; e acima dos fílires estão os mácrones,
depois as extraordinárias tribos dos bequires.
A seguir a estes, nas imediações, habitam os sapires,
depois destes, nas terras vizinhas, os bizeres; depois destes,
estão já os próprios colcos, homens de Ares. Prossegui
a travessia na nau até chegardes a um mar recôndito.
Ali, atravessando a terra dos citas, vindo dos longínquos
Montes Amarantos e da planície de Circe, o Fásis,
redemoinhando, lança no mar a sua vasta corrente.
Ao conduzirdes a nau para as águas deste rio,
vereis as muralhas de Eetes Citeu e o bosque
sombrio de Ares; ali, no cimo de um carvalho, o velo
é vigiado por um dragão, ser prodigioso, terrível de se ver,
que espreita de todos os lados. E o doce sono nem de dia
nem pelo crepúsculo vence o seu olhar impudente.”
(Argonáutica, Livro II, versos392- 407. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

“Um Eólida de nome Frixo foi da Hélade para Ea;


falo com rigor e vós próprios tê-lo-eis ouvido algures.
Este Frixo chegou à cidade de Eetes montado num carneiro
que Hermes tornou de ouro – ainda agora podeis ver
o velo estendido nos luxuriantes ramos de um carvalho.
Depois sacrificou o animal, segundo os conselhos recebidos
a Zeus Crónida, entre os deuses o Protetor dos Fugitivos.
Eetes recebeu-o no palácio e entregou-lhe a filha Calcíope
em casamento, sem dote, tamanho era o contentamento
do coração dele. É de ambos que somos filhos. Entretanto
o venerável Frixo já morreu na morada de Eetes,
e nós, dando imediata atenção às ordens de nosso pai,
íamos a Orcómeno, por causa dos pertences de Átamas.
Se também desejas saber o nosso nome, este aqui
tem o nome de Citissoro, aquele ali de Frôntis
e aquele outro de Melas; quanto a mim, chamai-me Argo
(Argonáutica, Livro II, versos 1141- 1157. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)

“Amigos, na medida das nossas forças, podereis contar


com a nossa ajuda, por pequena que seja, quando tiver de ser.
Mas Eetes é terrivelmente dotado de deletéria crueldade;
por isso sinto um medo incomensurável pela expedição.
Ele declara ser descendente de Hélio e em seu redor
habitam os imensos povos dos colcos; na voz
medonha e na enorme força igualará por certo Ares.
Arrebatar o velo sem que Eetes se aperceba, não será
mais fácil; um dragão imortal e insone guarda-o, olhando
em redor e dando voltas, um ser que a própria Terra
gerara nas encostas do Cáucaso, sob a Rocha Trifónia,
onde dizem que Tífon, ferido pelo relâmpago de Zeus
Crónida, por ter atingido o deus com as resistentes mãos,
derramou da cabeça gotas de sangue quente. E assim
chegou às montanhas e à planície de Nisa, onde
ainda agora jaz debaixo das águas do lago Serbónide.”
(Argonáutica, Livro II, versos1200- 1215. Tradução de Ana Alexandra Alves de Sousa)
Roma

Ovídio - Metamorfoses

“A da Meónia representa Europa, ludibriada pela aparência


de um touro: dirias ser um touro real, um mar de verdade.
Ela aparece contemplar as terras que se quedaram atrás
e chamar para ali as companheiras, a ter receio de tocas
nas águas que saltitam, a tirar para trás o pé temeroso.
Teceu também Astéria, sendo à força apanhada pela águia,
e teceu Leda, reclinada para trás sob as asas de um cisne.
Adicionou ainda de que forma Júpiter, disfarçado de sátiro,
engravidou de dois gêmeos a bela filha de Necteu;
como em Anfitrião se tornou quando te possuiu, ó Tirínyia,
e feito ouro enganou Dánae, e a filha de Asopo feito chama,
feito pastor Mnemósine, a filha de Deo feito malhada cobra.
Também a ti, Neptuno, transformado em bezerro feroz, ela
te pôs sobre a filha virgem de éolo, sob a figura de Enipeu
geras os Aloídas, como carneiro ludibrias a filha de Bisaltes;”
(Metamorfoses, 103 – 118. Tradução de Paulo Farmhouse Alberto)

Heróides

Carta de Medeia a Jasão:


"Eu que, afinal, me tornei agora, a teus olhos, uma bárbara,
eu que te pareço, agora, pobre, eu que te pareço nefasta,
mergulhei no sono, com uma poção, aqueles olhos de fogo
e entreguei-te, para quem segurança o levasses, o velo.
(Heróides, 105 – 108. Tradução de Calos Ascenso André)

Carta de Leandro a Hero:


"Com ondas desmesuradas, o mar da filha de Atamante alveja
e a custo a barca se mantém em segurança no seu porto.
Este mar assim seria, julgo eu, quando, pela vez primeira,
graças à virgem náufraga, encontrou o nome que possui.
e infamente o bastante é este lugar pela morte de Hele.
para me poupar; tem um crime no nome.
Tenho inveja de Frixo, que a ovelha de ouro, com velo de lã,
levou em segurança por tristes mares"
(Heróides, 137 – 144. Tradução de Calos Ascenso André)

Carta de Hipsípile a Jasão:


[Hipsípile, de Lemnos, da raça de Baco, fala ao filho de Esão,
e nas palavras quanta parte de coração havia.]

As costas de Tessália, diz-se que, de volta com teu barco,


tu as atingiste, enriquecido com o velo do carneiro de ouro.
Congratulo-me de que chegues a salvo, tanto quanto mo consentes; disso, porém,
devia eu ficar mais sabedora, por um escrito teu.
A verdade é que, quando desejavas não passar, na volta, além do meu reino,
que te estava prometido, podes não ter tido ventos;
por contrários que fossem os ventos, uma carta, devias escrevê-la;
Hipsípile era merecedora de lhe enviares saudações.
Porquê me chegou de ti, primeiro que uma carta, a fama
de aos bois sagrados de Marte ter sido imposta a canga recurva,
de ter crescido, de sementes que lançaste à terra, uma seara de homens,
e de a morte deles não ter tido precisão do teu braço,
de a vigilância constante de um dragão ter preservado os despojos do rebanho,
de o velo de ouro, mesmo assim, ter sido roubado pela força das tuas mãos?
(Heróides, 01 – 14. Tradução de Calos Ascenso André)

Outras fontes de consulta: Eumelo, Eratóstenes, Simónides de Ceos, Higino, Sêneca,


Apolodoro.

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