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A Essencia Do Evangelho de Paul - Marcos Granconato
A Essencia Do Evangelho de Paul - Marcos Granconato
EVANGELHO
DE PAULO
Marcos Granconato
PREFÁCIO
ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
AUTORIA, DATA E DESTINATÁRIOS
A epístola aos Gálatas foi escrita pelo apóstolo Paulo. Ainda que
um pequeno grupo de críticos tenha levantado objeções contra a
origem paulina, as evidências internas apontam claramente para
Paulo como o autor dessa carta (Cf. 1.1). Na verdade, o calor e a
autoridade com que a epístola trata do problema dos falsos mestres,
considerando-os uma terrível ameaça contra o evangelho e contra a
própria igreja, são características próprias de um missionário e líder
zeloso, que se vê no dever de cuidar daqueles que são fruto de seu
trabalho, o que reforça o argumento em prol de Paulo. Frise-se
ainda que uma porção proporcionalmente grande da carta é
autobiográfica (1.13 – 2. 13), o que logicamente esvazia de
propósito a autoria de outra pessoa qualquer.
Paulo escreveu aos Gálatas no ano 48 d.C., um pouco antes do
Concílio de Jerusalém, ocorrido no mesmo ano (At 15). A falta de
menção das decisões do concílio, decisões essas que seriam tão
úteis aos propósitos da epístola, é prova cabal em favor da data
mencionada, ainda que haja quem situe a composição em 57 ou 58
d.C, entendendo que em 2.1-10, Paulo faz alusão às conclusões
conciliares de Atos 15.[1]
A data mais antiga, se aceita, coloca a composição da carta, num
período após o fim da primeira viagem missionária de Paulo (At 13-
14), depois dele e Barnabé terem visitado pela segunda vez o sul da
Galácia (At 14.21-23).[2] O local em que Paulo escreveu é difícil,
senão impossível, de precisar.
Quanto aos destinatários, muita tinta tem sido gasta na defesa de
duas opiniões distintas. A primeira entende que Paulo escreveu aos
gálatas étnicos que viviam no norte da província. Porém, parece
certo que o apóstolo jamais visitou essa região. A segundo opinião,
aparentemente melhor fundamentada, entende que os destinatários
eram pessoas de várias raças que ocupavam a região sul da
Galácia, visitada por Paulo em sua primeira viagem missionária (At
13-14).[3]
Paulo, portanto, teria escrito sua carta aos crentes de Antioquia
da Pisídia (próxima à fronteira da Galácia), Listra, Icônio e Derbe. As
igrejas dessas cidades, conforme veremos, estavam sofrendo
influência de mestres judaizantes (6.12-13) que, para obterem
sucesso em seus objetivos, tentavam desacreditar o Apóstolo Paulo
(4.17). Conforme se depreende da epístola, os galateus se tornaram
vulneráveis a esses ataques (3.1), revelando forte atração por um
sistema religioso cuja essência não ultrapassava o dever de
cumprimento de meras exigências externas (4.10-11; 5.2).
OCASIÃO E PROPÓSITO
Capítulo 1
A UNIDADE APOSTÓLICA
GÁLATAS 2.1-10
A SIMULAÇÃO DE PEDRO
GÁLATAS 2.11-21
O FIM DA ESCRAVIDÃO
GÁLATAS 4.1-7
GÁLATAS 5.1-6
O convite para crer em Cristo é uma vocação para ser livre não
só do mundo, do pecado e da perdição, mas também do fardo que a
Lei Mosaica impõe aos que tentam viver sob suas determinações
(5.1). Essa é a lição que Paulo repisa em toda a Carta aos Gálatas.
Contudo, certamente em virtude das acusações que lhe estavam
sendo dirigidas de pregar uma mensagem que induzia os crentes ao
desregramento, o Apóstolo vê nesta altura, a necessidade de
apresentar um contrapeso. Assim, passa a ensinar que a liberdade
a que o crente foi chamado não implica uma vida em que são dadas
asas às inclinações naturais (1Pe 2.16). Antes, essa liberdade deve
conduzir a uma forma nova de escravidão: a escravidão do amor.
Paulo ensina, então, que em vez de usar a liberdade cristã para
servir suas próprias paixões, o crente deve usá-la para servir
amorosamente aos seus irmãos (13. Vd. tb. 1Co 8.9,13).
É preciso, portanto, compreender que a pureza e o amor são as
cercas da liberdade do crente. É somente dentro desses limites que
a liberdade se mantém saudável e verdadeira, sendo certo que ao
ultrapassar tais fronteiras, ela se desfigura, transformando-se em
escravidão ao pecado (Jo 8.34; 2Pe.2.17-19).
A ênfase sobre o amor aos irmãos é notável no parágrafo em
análise. Paulo deixa transparecer com isso o fato de que os crentes
da Galácia não tinham apenas problemas doutrinários. Eles também
tinham sérios problemas de relacionamento, havendo terríveis
atritos entre os crentes. Fica evidente no texto que na Galácia as
igrejas acolhiam falsos mestres e feriam verdadeiros irmãos! Por
isso, Paulo, além de mostrar que a liberdade que Cristo dá deve
conduzir ao amor que se dispõe ao serviço dos santos, também
mostra que o dever de amar consta da própria Lei como uma ordem
que resume todos os demais mandamentos (14).[69] É óbvio que a
menção da Lei aqui não é despropositada. Paulo está escrevendo a
pessoas que diziam ter os preceitos mosaicos em alta conta. Na
verdade, é como se dissesse: “Vocês realmente querem cumprir a
Lei? Muito bem. Então amem-se uns outros, pois toda a Lei se
resume nesse mandamento e, curiosamente, ele não tem recebido a
atenção devida por parte de vocês que se apresentam como
zelosos cumpridores das determinações de Moisés!”
No v. 15 percebe-se o grau de atrito que havia entre os crentes
galateus. Ao usar os verbos “morder” (dákno) e “devorar”
(katesthío), o Apóstolo sugere a figura de animais selvagens
brigando ferozmente entre si, cada qual tentando brutalmente
estraçalhar e destruir o outro, em meio à completa balbúrdia, gritos
e confusão. É claro que a figura sugerida por Paulo tem um toque
de exagero com o intuito de dar maior impacto à admoestação. No
entanto, considerando a lista das “obras da carne” constante de
5.19-21, bem como a exortação de 5.26, parece certo que nas
igrejas da Galácia existiam chocantes problemas de inimizade.
A partir disso tudo, é fácil concluir que o ministério dos mestres
legalistas, com sua ênfase sobre uma religião mecânica e
cerimonialista, conduzia os homens ao apego a meras formalidades
exteriores. Assim, os crentes não davam atenção às virtudes
espirituais e jamais as cultivavam. O resultado era a divisão e a
discórdia, pois os vícios da alma de uma pessoa fatalmente são
sentidos por aqueles que estão ao seu redor. Esse fato pode ser
verificado em qualquer grupo social. Aliás, é curioso perceber na
atualidade, que, tal como na Galácia, igrejas apegadas a um sem
número de regras são verdadeiros palcos de intrigas, provocações e
calúnias. A religiosidade puramente externa consome totalmente o
tempo e a atenção, não deixando espaço para o cuidado da
espiritualidade interna. Ora, quando se descuida do coração, ele
passa a produzir espinhos que cedo ferem os que se aproximam.
Paulo alerta que esse estado de coisas, com as brigas que gera,
fatalmente conduz à destruição de todos, ou seja, a feridas
incuráveis em indivíduos a ao fim da igreja como um núcleo cristão
de comunhão e testemunho (Jo 13.35).
APÊNDICE
O CURSO POSTERIOR DO LEGALISMO
JUDAICO-CRISTÃO
SOBRE O AUTOR
Marcos Granconato é pastor titular da Igreja Batista Redenção em
São Paulo. Formou-se em Teologia no Seminário Bíblico Palavra da
Vida. É graduado em Direito pela Universidade São Francisco de
Bragança Paulista e mestre em Teologia Histórica pelo Centro
Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper.
[1] Os que situam a produção da carta em 48 d.C. vêem 2.1-10 como uma
passagem que se refere à visita de Paulo a Jerusalém mencionada em Atos
11.27-30, e não ao Concílio de Jerusalém que, segundo essa corrente, estava
ainda prestes a acontecer quando a epístola foi escrita.
[2] Na epístola aos Gálatas, Paulo faz alusão ao seu trabalho naquelas
regiões em 4.13-14.
[3] Os destinatários, segundo parece, conheciam Barnabé, o companheiro de
Paulo em sua primeira viagem missionária (Cf. 2.1,9,13). Como já dito, essa
viagem abrangeu a região sul da Galácia.
[4] As duas cartas de Paulo aos tessalonicenses foram escritas por volta do
ano 50 AD, ou seja, bem pouco tempo depois que ele escreveu aos crentes
da Galácia (48 AD).
[5] 2Coríntios 11.14 e Gálatas 1.8 geralmente são textos usados contra o
mormonismo cujos adeptos afirmam que sua religião foi revelada a Joseph
Smith por um anjo chamado Moroni. Essas aplicações são cabíveis, ainda
que dificilmente Smith tenha realmente tido contato com algum espírito. Pelas
informações que temos acerca de sua vida e caráter, com certeza o próprio
Smith inventou aquela história e a levou adiante a fim de atingir propósitos
egoístas e escusos.
[6] Nos dias modernos alguns exemplos de falsos evangelhos são: a Teologia
da Prosperidade cuja salvação proposta consiste apenas no livramento de
doenças e de problemas financeiros; o Catolicismo Romano que ensina a
salvação pelas obras; e o Adventismo que, exatamente como os falsos
mestres da Galácia, crê que o homem é salvo pela prática da Lei (Gl 2.16;
4.10-11). Todos os mestres desses movimentos devem ser considerados
malditos pelos crentes genuínos.
[7] No Catolicismo Romano encontramos a mais rica fonte de invenções
humanas associadas ao termo “cristianismo”. Doutrinas como a da imaculada
conceição de Maria, da transubstanciação, da intercessão dos santos, da
infalibilidade papal, da adoração da virgem, da canonização de pessoas
mortas, entre inúmeras outras não têm nenhum amparo na Sagrada Escritura,
sendo antes mitos inventados por mentes corrompidas. Coisas do gênero
devem ser rejeitadas com todo o vigor pelos cristãos genuínos.
[8] Somente a partir da destruição de Jerusalém pelo General Tito, em 70DC,
o cristianismo passou a revelar sua autonomia como modelo religioso
independente.
[9] Essa imagem passada pelos mestres judaizantes era flagrantemente falsa,
cf. 6.12-13.
[10] Essas tradições eram comentários e aplicações da Lei de Moisés à vida
diária que, a partir do Exílio Babilônico (605 aC – 535 aC) eram transmitidos
oralmente pelos judeus às gerações que se sucediam. Jesus censurou
severamente a prática de colocá-las acima da Palavra de Deus (Mt 15.1-6).
[11] A expressão “em mim” transmite a idéia de que a revelação foi dada a
Paulo de modo pessoal e íntimo. Calvino sugere que a tradução “a mim” é
possível (CALVINO, João. Gálatas. São Paulo: Parácletos, 1998. p. 42).
[12] Deve ser admitido, porém, que a incumbência de pregar lhe fora dada já
no caminho de Damasco (At 26.15-18).
[13] Tiago, o meio irmão do Senhor, não era um dos Doze. Aparentemente
ele é incluído aqui entre os apóstolos em virtude de sua posição de
preeminência na igreja de Jerusalém (At 12.17; 15.13ss; 21.17-18; Gl 2.9,12),
bem como por sua relação singular de parentesco com o próprio Senhor, além
do fato de ter visto Cristo ressurreto (1Co 15.7). Ademais, é possível entender
o termo “apóstolo” num sentido não técnico quando aplicado a Tiago, ou seja,
apenas como um “mensageiro de Cristo” (Esse uso é aplicado a Barnabé em
At 14.14). Sabe-se que para ser apóstolo no sentido que Paulo aplicava o
termo a si próprio era preciso não só ver Cristo ressurreto (1Co 9.1-2), mas
também receber diretamente dele a função de mensageiro (Mt 28.16-20; Lc
6.13; Gl 1.1), as revelações dos mistérios divinos a serem anunciados (2Co
12.7; Gl 1.11-12; Ef 3.2-6) e o poder de realizar milagres (2Co 12.12).
[14] A fome mencionada em Atos aconteceu, provavelmente, entre 46 e 48
d.C., mas não abrangeu o Império inteiro, sendo a Judéia o seu cenário.
Contudo, aqueles dias foram marcados por fomes freqüentes que
sobrevieram a diferentes regiões de todo o Império.
[15] Isso era especialmente importante porque, como se sabe, os falsos
mestres da Galácia estavam dizendo que o ensino de Paulo era contrário à
doutrina dos apóstolos de Jerusalém.
[16] Tito foi, posteriormente, delegado de Paulo com a missão de administrar
a crise em Corinto (2Co 2.12-13; 7.5-7). Ele também coordenou as igrejas de
Creta (Tt 1.5).
[17] Como se sabe, os judaizantes entendiam que a circuncisão era
fundamental para que o homem fosse justificado. Veja 5.2-4, 6; 6.12-13, 15.
[18] A atividade e ensino dos judaizantes de Jerusalém num tempo posterior
mas muito próximo da composição da Epístola aos Gálatas podem ser vistos
em Atos 15.1-2,5.
[19] A figura implícita aqui sugere a apresentação do evangelho por meio de
algum recurso visual como uma pintura em um quadro (CALVINO, João.
Gálatas. São Paulo: Paracletos, 1998. p. 82) ou um cartaz de notícias
colocado num lugar público, o que era comum na antiguidade (GUTHRIE,
Donald. Gálatas: introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova e Mundo
Cristão, 1984. p. 114). Paulo não havia usado esses recursos, mas suas
palavras tinham fluído de tal forma que era como se tivessem desenhado na
consciência dos galateus os pontos centrais da mensagem cristã. É de
pregadores assim que a igreja moderna precisa.
[20] Para o ensino acerca da autoridade da Sagrada Escritura, veja-se Jo
10.35; 17.17; 1Co 2.13; 2Tm 3.16-17; 2Pe 1.20-21.
[21] Tiago 2.20-24 usa o mesmo exemplo de Abraão para ensinar que a
justificação é pelas obras. Contudo, Tiago pensa na justificação como
comprovação visível da fé. Daí a importância que confere às obras. Paulo, por
sua vez, usa o termo no sentido de “livramento de culpa”, o qual decorre da fé
somente.
[22] Note-se que ao tempo de Abraão a Lei sequer havia sido dada (Rm 4.9-
10; Gl 3.17).
[23] Um dos problemas com esse método de interpretação é que ele não se
harmoniza com o modo como os profetas do VT entenderam as promessas de
bênção e maldição feitas a Israel. Mesmo uma leitura superficial de seus
escritos revelará que os profetas entendiam literalmente tais promessas (2Rs
18.10-12; Is 24.5-6; Jr 11.6-8; 32.24; Lm 2.17; Dn 9.11-13; Zc 1.6, etc.).
Obviamente, se foi assim que os homens movidos por Deus interpretaram as
palavras da Escritura, é também assim que devemos entendê-las.
[24] O v. 13, conforme se verá, também contribui para a formulação do
conceito de maldição que Paulo tem em mente. Daquele versículo se
depreende que ser maldito é também ser merecedor da pena de morte.
[25] A prática prevista em Deuteronômio envolvia a morte do transgressor e a
posterior colocação do seu corpo num madeiro. Era permitido que o cadáver
ficasse pendurado até o fim do dia como um sinal de que ali estava alguém
que havia morrido sob a maldição de Deus, por transgredir a Lei (Dt 21.22-
23).
[26] A habitação do Espírito no crente é uma bênção singular porque lhe
confere segurança de um dia ser plenamente resgatado (Ef 1.13-14), prova e
testifica que ele pertence a Deus (Rm 8.9, 15-16), capacita-o a viver em
santidade (Rm 8.13-14) e enche sua vida de satisfação (Jo 7.38-39).
[27] A palavra usada por Paulo pode significar “testamento”, isto é, a
declaração de última vontade. Também tem o sentido de contrato ou aliança.
No versículo em análise trata-se de uma declaração da vontade feita por Deus
na qual somente ele se obrigou, sem nada impor ao homem.
[28] Deve-se lembrar que, à luz do v.17, a Lei só veio 430 anos depois de
estabelecida a aliança com Abraão.
[29] Em Mateus 22.31-32, 41-45 vê-se que nosso Senhor também dava
especial atenção a aspectos gramaticais do texto bíblico.
[30] A consciência de pecado existe mesmo naqueles que jamais
conheceram a Lei de Moisés (Rm 2.14-15). Porém, ela é muito limitada. Por
exemplo: não se sabe através da mera “lei interior” que a cobiça é pecado
(Rm 7.7).
[31] O ensino de que a Lei Mosaica foi dada com o propósito de refrear as
transgressões parece encontrar obstáculos no que Paulo ensina em Romanos
7.7-14. Ali aprendemos que a Lei, apesar de santa, justa e boa, estimula o
pecado na humanidade carnal. É verdade que, idealmente, o mandamento
seria dado para produzir vida (Rm 7.10). Seu objetivo real e prático, contudo,
foi outro, a saber: dar maior força ao pecado (Rm 7.12-13; 1Co 15.56).
[32] Outros textos em que Paulo mostra apreço pela Lei são Romanos 3.31;
7.7,12,14; 8.4; 1Tm 1.8.
[33] A frase “a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado” significa que o
Velho Testamento declarou a transgressão de todos (Rm 3.9-19),
demonstrando que a Lei que foi dada a Moisés era incapaz de justificar e
conceder vida.
[34] O tutor, na lei romana, figurava como responsável pela criança até os 14
anos. O curador respondia pelo jovem até que completasse 25. Há ainda
quem entenda que o tutor cuidava da pessoa, enquanto o curador
administrava seus bens.
[35] A maioridade, na lei romana, era atingida aos 25 anos de idade. Não
estava, portanto, ao arbítrio do pai o tempo de sua duração. Assim, é possível
que Paulo tivesse em mente aqui um outro sistema jurídico desconhecido de
nós, mas familiar aos seus leitores originais. É também possível (e mais
provável) que o apóstolo queria apenas realçar o papel do pai como aquele
que está no controle da situação. Esse entendimento se harmoniza melhor
com as intenções do autor bíblico ao usar a presente ilustração.
[36] A ausência de artigo antes da palavra “lei” no v. 5, sugere que Paulo não
tinha em mente aqui somente e Lei Mosaica, mas qualquer conjunto de
normas imposto ao homem.
[37] Todos esses milênios compõem o período chamado de “tempos da
ignorância” (At 17.30).
[38] Earle E. Cairns, em O cristianismo através dos séculos (São Paulo: Vida
Nova, 1984. p. 29-36) afirma que a “plenitude dos tempos” em Gálatas 4.4 diz
respeito à preparação do cenário mundial de tal forma que contribuísse para
que a mensagem de Cristo tivesse o maior impacto possível. De acordo com
esse entendimento, Deus, ao longo dos séculos, foi preparando o ambiente
político, intelectual e religioso para que o advento do Messias ocorresse num
contexto que favorecesse a sua divulgação. O tempo em que tudo estava
pronto seria entendido como a “plenitude dos tempos”. No entanto, apesar de
não haver dúvidas de que Deus usou o ambiente instalado no século I para
favorecer a expansão da fé, é muito difícil que isso se relacione com o sentido
da expressão “plenitude dos tempos” pretendido por Paulo em Gálatas 4.4. O
entendimento mais natural e simples, à luz inclusive do v. 2, é que a
expressão diz respeito apenas ao tempo em que soberanamente Deus julgou
necessário livrar o homem do jugo da lei, determinando que o período de
“tutela” não devia mais se prolongar.
[39] Hipóstase, em grego, significa, essência ou natureza substancial. Na
discussão cristológica, contudo, esse termo é usado predominantemente com
o sentido de “pessoa”. Para conhecer melhor os contornos dessa matéria é
fundamental que sejam estudados os quatro concílios ecumênicos da igreja
antiga e, especialmente, a Definição de Calcedônia. Uma leitura
esclarecedora é OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. São Paulo: Vida,
2001.
[40] Aba é o termo aramaico para Pai.
[41] Outras verdades sobre a habitação do Espírito Santo são as seguintes:
ela é dada aos que crêem (Jo 7.38-39; Gl 3.2); todos os crentes desfrutam
dela (1Co 12.13); ela se constitui numa das bases para a pureza sexual do
cristão (1Co 6.18-19); e ela é a garantia de que somos “propriedade” de Deus
(Ef 1.13-14).
[42] Em 1Tessalonicenses 4.5 Paulo ensina que quem não conhece a Deus
também é escravo de desejos lascivos.
[43] Na Igreja Antiga era pacífico o entendimento de que foram os demônios
que, em tempos remotos, haviam se manifestado aos homens apresentando-
se como deuses e dando origem às múltiplas formas de adoração pagã.
[44] O proto-gnosticismo, filosofia pagã que ameaçou o cristianismo
nascente, acolhia com prontidão diversos preceitos judaicos (Cl 2.8, 16).
Portanto, o retorno à Lei também poderia ser facilmente interpretado como a
adoção de sistemas filosóficos pagãos.
[45] É possível traduzir a palavra próteron (“a primeira vez”) como
“anteriormente”. Se aceitarmos essa tradução, pode-se entender que Paulo
está falando aqui do fim da primeira viagem missionária, quando voltou para
Listra, Icônio e Antioquia fortalecendo as igrejas (At 14.21). Se for este o caso,
talvez Paulo tenha empreendido o retorno de sua Primeira Viagem movido
pelas imposições de uma doença da qual se tem muito pouca informação.
[46] Alguns entendem, à luz de 4.15, que se tratava de uma doença nos
olhos. Esse entendimento também tenta explicar as “grandes letras” a que
Paulo alude em 6.11. Segundo esse ponto de vista, o suposto problema de
visão do apóstolo teve início em sua experiência de conversão, quando seus
olhos foram cobertos por algo semelhante a escamas (At 9.18). Essa opinião,
porém, não é conclusiva. Calvino, por exemplo, entende que a palavra
“enfermidade” significa aqui simplesmente “vilipêndio”, ou seja, ausência de
pompa ou grandeza. Essa interpretação, por sua vez, mui dificilmente se
ajusta com a restante da passagem que indica claramente que Paulo está a
falar de uma debilidade em sua saúde.
[47] Nesse ponto Paulo usa verbos enfáticos para descrever a atitude dos
seus destinatários. Literalmente, ele diz que os galateus não o trataram com
desdém, nem o “cuspiram fora”. Essa linguagem denota nojo, o que pode
sugerir que a doença de Paulo provocava certa repugnância.
[48] Veja o contraste entre esse zelo interesseiro e o zelo do Apóstolo
mencionado em 2Coríntios 11.2.
[49] Essa expressão tão comum nos escritos do carinhoso Apóstolo João
(1Jo 2.1, 12, 14, 18, 28, etc.) é usada somente aqui por Paulo.
[50] Para um maior aprofundamento nesse tema, veja-se LOPES, Augustus
Nicodemus. A Bíblia e seus intérpretes: uma breve história da interpretação.
São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
[51] Esse é o argumento de Calvino constante de seu comentário a Gálatas
4.22.
[52] Essa alternativa encontra-se em KAISER Jr., Walter C. e SILVA, Moisés.
Introdução à hermenêutica bíblica: Como ouvir a Palavra de Deus apesar dos
ruídos de nossa época. São Paulo: Cultura Cristã, 2002.
[53] Veja esse argumento em LOPES. Op. Cit., p.120-121.
[54] Ao longo da história tem sido comum os teólogos apresentarem a Lei de
Moisés sob duas grandes divisões: a lei cerimonial (relativa especialmente
aos serviços no templo) e a lei moral (apresentada especialmente nos Dez
Mandamentos). Ainda que seja útil para fins didáticos, essa divisão às vezes
conduz a conclusões erradas como, por exemplo, a doutrina adventista de
que fomos libertos apenas da lei cerimonial, estando ainda sujeitos aos Dez
Mandamentos. Deve, porém, ficar claro que, para Paulo, a distinção entre lei
cerimonial e moral inexiste. O próprio texto em questão mostra que, em seu
conceito de Lei, o Apóstolo inclui até mesmo o livro de Gênesis e não apenas
disposições cerimoniais constantes do Pentateuco. Ademais, em outras
ocasiões, ao argumentar contra o legalismo, Paulo não cita leis cerimoniais,
mas alude às chamadas normas morais (Rm 7.6-7; Gl 3.10; Ef 2.15) e chega
até a ensinar com notável clareza que o crente está livre do “ministério
gravado com letras em pedras”, ou seja, o Decálogo, dizendo que a glória
desse ministério se desvaneceu (2Co 3.7-11. Veja tb. Cl 2.14). Daqui se
conclui que os cristãos só devem obedecer aos Dez Mandamentos na medida
em que eles são “reaproveitados” no ensino do Novo Testamento, o que não
acontece, por exemplo, com a norma referente à guarda do sábado ou de um
outro dia qualquer. Ademais, mesmo aquela obediência deve ser resultado de
uma vida sob o controle do Espírito e não do apego carnal a regras (Rm 8.3-
4).
[55] Veja-se o legalismo de Jerusalém em face do ministério de Jesus em
Mateus 23.1-4; Marcos 7.1-8; João 5.18; 9.16, etc. Para a presença do
legalismo na igreja nascente daquela cidade, veja-se Atos 11.1-3; 15.4-5.