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Carina Berta Moljo e Maria Lucia Duriguetto (Organizadoras) Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizagdes da SociedadeCivileServicoSocial Uma andlise da realidade de Juiz de Fora Yy EDITORA UF F 25 ANOS Juiz de Fora 2012 (© Lakers UFJ, 2010, ‘cela on pate dle no poe ser epoaride por qualquer mein sem anteiagn ees da stor © ented dots lay se de autonagSa laionala 3 pom deo de ages ou eto de utr) ator), ‘ao de tis reponebiidade dele) sates) eau organist) 4 ha EDITORA UF | F 25 ANOS Durvor os Eoroaa UFJF / Presipent bo Conse Eoroa JAscrenox Sauzen Roonictns ‘Consett Eoronan. Arso Craso Caavate Rootes ‘Anoaé Moss Gato ANDad Suna MARIN Awromio Ferris Covent ata Buaaleo Av Cusauio Hmeague Nous Ras Rocio CastceaNDe Sort Mania 008 Res Soros Rarron Hexmigue Dugur or Minna Cuaves Fittio ‘Vict-Rerron Srv Boron UFJ José Luv Rezenpe Peneran Asastesr De Catpior Mors SatEAM ayer Gainico: ANeaton Manges Pit vtoMachor ANDIEAON MARQUIS PISO (Cape Anpussone Mangus Peto Reasio ne Poerucits. ANoesia Marcus Pero FICHA CATALOGRAFICA Eprion UFJE Rua Bensanin Constar, 790 Caxtno— Jur br Fora MG CaP 3601 §- 400 on/Fae (32) 5229-7545 G2) 5229-7646 scertarineditorauf.com.br distbuicaoedivora@ufffedubr -wannscditorauff.com.br Sumario PREFACIO: Politica Social ¢ Cultura Profissional: breve nota de apresentagao — Ana Elizabete Motta e Yolanda Guerra eG INTRODUCAO. Capitulo 1. Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: rey desafios da implementacao do SUAS... Gi Rodrigo de Souza Filho; Cassia Pacheco Golvea Antinareli; Carla Alves de Paula; Wesley Helker Felicio Silva Capitulo 2. Gesto do SUAS em Juiz de Fora: andlise da estrutura buvcritia Rodrigo de Souza Filho ¢ Ester de Almeida Oliveira Capitulo 3. Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relagao com as politicas sociais Cristina Simées Bezerra; Maria Laicia Duriguetto Capitulo 4. Apontamentos do associativismo municipal e sua relagao com as politicas sociais Cristina Simées Bezerra; Maria Licia Duriguetto; Maria Zilda F. Martins; Mariana de Almeida P.- Maddalena Capitulo 5. O exercicio profissional na implementagao do SUAS: projeto ético politico, cultura profissional e intervencao profissional ... Alexandra Aparecida T. Seabra Firas; Carina Berta Moljo; Claudia Ménica dos Santos APENDICE A - QUESTIONARIO APLICADO AOS REPRESENTANTES DAS ORGANIZACOES/MOVIMENTOS/INSTITUICOES APENDICE B - QUESTIONARIO: ANALISE DAS CONDIGOES SOCIAIS, POLITICAS E CULTURAIS E DA INTERVENGAO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL NA IMPLANTACAO DO SUAS EM JUIZ DE FORA. APLICADO AOS ASSISTENTES SOCIAIS ........0000 ultura Profissional: esentagao Nacional de Cooperagio Académica - de pesquisa das Universidades Federais ) e Juiz de Fora na area do Servico Social - estudos e pesquisas que privilegiam a srvico Social os processos de produgao sm destaque para as politicas sociais, as > Estado. uisadoresdo grupo depesquisa*Servigo : Puiblicas”, vinculado ao Programa de pelas Professoras Carina Berta Moljo ste processo ¢ revela a importincia do conhecimento da realidade, razao do 5 para a realidade das politicas sociais © integra tem como eixo articulador década do Séc. XXI cuja principal ; sociais, ¢ a expansio da Politica de primeiro bloco de discussées do livro \ssisténcia Social, no Sistema Unico de es da sua gestao no municipio de Juiz n se referencia na realidade juizforana, sa junto a instituig6es, organizagoes b) a relagao entre Estado e Sociedade 1agio do terceiro setor. Finaliza este ) sobre a experincia profissional de 37 tica de Assisténcia Social, abordando o 1 pritica analisada sob a perspectiva do Servico Social brasileiro. de trabalho, merecem ser ressaltadas afirma que wma pollttica social voltada 1s classes subalternas exige uma politica Prefacio econémica que privilegie as demandas pela universalizagao e aprofundamento de direitos, se se pretende que seu desenvolvimento obtenha éxito no enfrentamento das desigualdades sociais. De outra forma, a politica social enfrentard entraves estruturais vinculados a politica econémica, néo viabilizando a expansio de direitos sociais, independentemente de sua configuragéo institucional. A articulagio entre as dindmicas da economia e da politica é uma referencia obrigatéria para aqueles que adotam uma perspectiva de totalidade no exame da realidade. E neste sentido que a Politica Nacional de Assisténcia Social e 0 seu modelo gerencial e organizativo—o SUAS —embora contenham inegaveis avangos democraticos, incorporando reivindicagdes que superam © modelo meritocratico-particularista que sempre marcou esta politica no Brasil, conforme indicam os autores do ensaio, esse avango parece estar subordinado & logica da politica econdmica. Neste sentido, como demonstram os dados empiricos expostos em alguns ensaios, a expansio da politica de Assisténcia Social vem se dando através dos programas de transferéncia de rendas, tais como o BPC ¢ 0 Bolsa Familia. Seu principal componente politico-estratégico € er se transformado num insumo imprescindivel para a expansao do consumo e formagao de um mercado interno, resultando na emergéncia do que a grande imprensa vem denominando de “a nova classe média”. Nestes termos, embora os benefici ios e usuarios da Assisténcia Social possam “estar ocupando um lugar “cidadio”, nao estamos seguras de que esta situacio avance para o estabelecimento do exercicio real dos direitos sociais. Menos pela positividade ou avanco que venha a ter a politica de Assisténcia Social e mais pela sua orginica vinculacao com as necessidades da economia. E inegivel que no Brasil do Séc. XXI convivem as sequelas da ortodoxia neoliberal, 0 neodesenvolvimentismo, a financeirizagao da economia ¢ a expansio da assisténcia social. Assim, como afirmam os Autores, faz-se essencial a retomada do papel dos movimentos sociais e da participagdo das organizagées democraticas da sociedade civil na luta pela defesa da democracia ¢ da cidadania, de uma forma geral, e, especificamente, no campo da defesa de politicas sociais ptiblicas universalistas, se se pretende algum avanco democratico neste cenério. Como parte do segundo bloco de textos, mas situado no mesmo cho histérico ¢ na_ mesma direcao de apreensao da totalidade, emerge a hipétese de que, sob 0 idedrio neoliberal, 0 terceiro setor opera uma ressignificagio do conceito de sociedade civil, tanto por parte dos setores supostamente progressistas quanto pelos defensores do projeto neoliberal, ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Ana Elizabete Motta | Yolanda Guerra cumprindo fungées econémicas, politicas ¢ ideolégicas. A faticidade desta hipétese ¢ apreendida nas légi dado a questao social, em que se combinam e se complementam: a légica corporativa no sistema de representagdo de interesses e a ldégica da solidariedade e da concessio no que tange aos direitos. Como parte de um mesmo movimento, esta légica desencadeia e reforca sentimentos ¢ comportamentos de autoajuda, ajuda-mitua ou da ajuda divina voltando-se para a auto-responsabilizagao dos sujeitos. Além de outras fangées, destaca-se a de justificar e legitimar o processo de desestruturagio da Seguridade Social, desresponsabilizando o Estado e desonerando 0 capital de co- financiar as respostas as refracdes da “questio social”, escamoteando os interesses contraditérios das classes sociais no capitalismo ¢ ocultando a luta de classes. Esta discuss coloca premissas para pensar a intervencio sécio-politica ¢ profissional do Servico Social na implementagao da Politica Nacional de Assisténcia Social e do SUAS, ea sua relacdo entre os elementos da cultura profissional que tém referencia no projeto ético politico-profissional . O capitulo intitulado O exercicio profissional na implementagdo do Sistema Unico da Assisténcia Social: projeto ético politico, cultura profissional ¢ imervengio profisiional expoe dados de pesquisa realizada em Juiz de Fora, em 2009, sobre as condigées sociais, politicas ¢ culturais ¢ da intervencio profissional do Assistente Social na implantagao do SUAS naquele municipio. A andlise dos dados transita por trés vetores descritivos e analfticos: 1) a apreensdo da Politica de Assisténcia Social no campo da Seguridade Social brasileira, especialmente, no Governo Lula; 2) a inser¢io sécio-ocupacional do Servico Social no ambito da assisténcia social em Juiz de Fora, particularizada na Associaco Municipal de Apoio Comunitério — AMAC; 3) o projeto profissional hegeménico do Servi¢o Social brasileiro. Consideramos que a abordagem da cultura profissional como resultado das objetivag6es construidas pela profissao ao longo da sua trajetéria incorpora as suas diversas dimens6es — tedrico-metodolégica, ético-politica ¢ técnico- opcrativa como produto histérico das intencionalidades dos sujeitos orientados frente a realidade da cultura profissional, como resultado das causalidades postas pela profissao se expressa em objetos (de conhecimento ¢ de intervengao), objetivos profissionais, referencias tedrico-metodoldgicas, principios éticos e politicos, valores ¢ racionalidades (a lagica constitutiva destas priticas), como resultante das dimens6es objetivas e subjetivas que informam a constituicao do sujeito profissional e constitui-se em meio de socializacao das conquistas e do acervo cultural produzido pelo Servigo Social. s que sustentam o “novo” trato Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Prefacio Contudo, os profissionais nao constroem este processo de maneira EEE auconoma, posto que a profissio é socialmente determinada. Note-se que pratica do Servico Social sofre as determinagoes da divisao social e técnica do trabalho e se insere no conjunto das relagées sociais que particularizam cada sociedade. Por isso mesmo, a profissao recebe as determinidades da dinamica macroeconémica, social e cultural prevalecente na realidade mais ampla. Como exposto em um dos capitulos, esta cultura profissional, a despeito das particularidades profissionais e, mesmo em contextos por vezes adversos, vem afirmando a necessidade da efetivagio dos direitos sociais conquistados pelas classes subalternas, reafirmando a necessidade de construgdo de uma cultura politica democritica. Segundo os autores, wma cultura profissional que converge com os valores do projeto ético politico do Servigo Social, 0 que nao a exime de ser uma cultura profissional plural, como espaco de uta, de tensées. Em resumo, 0 livro SUAS, Organizagées da Sociedade Civil e Servigo Social: Uma andilise da realidade de Juiz de Fora é uma iniciativa das mais relevantes para a produgao ¢ divulgacao do conhecimento na area do Servicgo Social ¢ afins, oferecendo 4 comunidade académica e profissional um conjunto de informagies ¢ reflexdes que terao incidéncia no exercicio profissional ena construgio de uma cultura politica e profissional democratica © comprometida com as necessidades das classes subalternas no Ambito das contradigées da sociedade capitalista contemporanea. Aos autores e autoras 0 nosso reconhecimento pela originalidade € qualidade dos textos ¢ aos leitores e leitoras o desejo de uma leitura gratificante e proficua. Recife/Rio de Janeiro, agosto de 2011. Ana Elizabete Mota (Universidade Federal de Pernambuco) Yolanda Guerra (Universidade Federal do Rio de Janeiro) téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Introdugao O presente Livro apresenta os resultados da p condicées sociais, poltticas e culturais e da intervencdo profissional do Assistente Social na implantagao do Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS) em Juiz de Fora (pertodo 2005-2009), realizada pelo Grupo de Pesquisa Servigo Social, Movimentos Sociais e Politicas Pttblicas da Faculdade de Serviga Social da Universidade Federal de Juiz de Fora (FSS/UFJF)'. A Constituigao de 1988 apresentou grandes avangos em relacao aos direitos sociais. Particularmente em relagao & assisténcia social, pela primeira vez, ela € concebida como politica ptiblica, dever do Estado e direito de cidadania, compondo o campo da seguridade social. Esta concepcao da politica apontava para a construgio de um Estado de Bem-Estar social pautado na concepgao de seguridade social e cidadania universal. Os movimentos sociais organizados, que participaram ativamente do processo constituinte, continuaram, apés a aprovagio da Constituigéo de 1988, a atuar politicamente em questées especificas, visando a interferir na claboragao das Icis complementares que viessem a consolidar, institucionalmente, os avangos conquistados em suas dreas. Essa aco ocorreu de forma emblemética nas 4reas da satide (elaboragio aprovacio da Lei Organica da Satide — LOS), assisténcia social (elaboragdo e¢ aprovacao da Lei Organica da Assisténcia Social — LOAS) ¢ infancia e adolescéncia (elaboracao e aprovagéo do Estatuto da Crianga e do Adolescente — ECA), e tinha por finalidade consolidar os dispositivos constitucionais referentes as respectivas dreas de atuacao. Apesar de todas as dificuldades, a Lei Organica da Satide, o Estatuto da Crianga e do Adolescente e a Lei Orginica da Assisténcia Social foram aprovados pelo Congresso e sancionados pelo presidente da Reptiblica até 1993. A pesquisa foi financiada pela FAPEMIG, PROPESQ (com bolsas de Iniciagio Cicntifica c Bolsa Apoio 20 Recém-Doutor ~ 2010 - ¢ Enxoval — Bolsa de apoio a consolidacao de grupos de pesquisa 2009/2010) e pelo Programa de Cooperacao Académica — PROCAD, que envolve a Faculdade de Servigo Social da UEJF (Coordenado pela Profa. Maria Liicia Duriguetto; a Escola de Servigo Social da UERJ (Coordenado pela Profa. Yolanda Guerra); 0 Depto. de Servigo Social da UFAL (Coordenado pela Profa. Cristina Paniago) e da UFPE ( Coordenado pela Profa. Ana Elizabete Mota ~ Coordenadora geral do PROCAD) Introdugso O teflexo desse processo na assisténcia social & inequivoco. A Lei WM orginica da Assisténcia Social apresenta a assisténcia social como politica publica, direito de cidadania e dever do Estado numa perspectiva de universalizagao dos direitos sociais. Além dessa concepeio, a legislacio propée a descentralizac4o ¢ a participacao como elementos democratizadores para a implementagao dos servigos sociais, projetando uma organicidade da politica através da articulagio Estado-sociedade civil, Unido-estado-municipio entre os diferentes setores que compéem a politica. A partir da década de 1990, o Brasil adota as politicas de ajustes neoliberais. Tendo em vista a relagdo entre a politica econdmica e a politica social, ¢ considerando a orientac¢ao neoliberal de ambas, podemos afirmar que o cenério global no campo das politicas sociais no Brasil, apesar da co- existéncia de diferentes padrées e referéncias para a estruturagio das politicas sociais, é constituido, indubitavelmente, pelo padrao neoliberal. Do ponto de vista da politica social, 0 padrio neoliberal tem como caracteristicas a subordinagao do social a uma politica econémica monetarista e ortodoxa, pautada pela estabilizacéo monetiria, pela abertura comercial ¢ pela privatizacao. No campo préprio da politica social, esse padrao se expressa por meio de uma politica de desresponsabilizagio do Estado no trato das s focalizadas, fragmentadas expressées da “questio social” através de acé privatizadas, depositando a maior parte da responsabilidade no sucesso das agées na propria sociedade, apelando, assim, para solidariedade social - no que a midia colabora fazendo um apelo a sociedade civil para o desenvolvimento de medidas de cardter assistencialista, voluntério ¢ filantrépico. Corroborando com esse processo, os programas de renda minima tém sido implementados sob uma nitida concepeio liberal de focalizacio ¢ pobreza absoluta, 0 que contribui para a redugao de gastos socia Independentemente dos constrangimentos que a ordem econdmica do is. tiltimo decénio tem imposto ao desenvolvimento da politica de assisténcia social numa perspectiva de universalizagio de direitos € a priorizagéo quase que absoluta em programas de transferéncia de renda, hoje, do ponto de vista da engenharia institucional e da concepgio expressa na Politica Nacional de Assisténcia Social (2004), conseguimos vislumbrar avancos importantes nesta drea. Os aspectos mais importantes que ocorreram na drea da assisténcia foram o fim da Comunidade Solidéria, uma estrutura paralela, criada no Governo FHC (Fernando Henrique Cardoso), que fragilizava substantivamente a organiza¢io da politica assisténcia nos moldes proposto pela LOAS; a unificacao das agées da politica no atual Ministério de ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Introdugso Desenvolvimento Social e Combate & Fome e, como conclusao do processo, a aprovagao da Politica Nacional de Assisténcia Social que se estrutura na perspectiva de construgio do Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS). No entanto, a andlise realizada compreende que o Governo Lula (2002 -2010), ao manter a politica econémica neoliberal ¢ estruturar uma politica de assisténcia social fundada em programas focalizados de transferéncia de renda, inviabiliza a democratizagao da assisténcia social prevista no SUAS. Na trajetdria da constituicio e do desenvolvimento da politica de assisténcia social no Brasil, os assistentes sociais foram protagonistas centrais desse proceso, muitas vezes, inclusive, confundindo a profissio com a propria politica e incorporando dela seus tracos conservadores. Porém, no processo de mobilizagao dos anos 80, na dinamica de renovacao da profissio, os profissionais do Servico Social reorientaram sua intervengio numa perspectiva afinada com os movimentos democraticos na defesa da ampliacao de direitos sociais, no carater publico estatal das politicas sociais, na democratizagao dos espagos ptiblicos, na constituigao de uma cultura democratica e de participacio e controle social. Nesse sentido, os assistentes sociais, desde a luta pela incorporagao da as | como politica de seguridade social, yém se destacando, individual ¢ coletivamente, como liderancas dos processos de formulacio, implementagao e avaliacao da politica em sua proposigao publica e estatal € como direito de cidadania. Assim, a estrutura¢ao dessa politica vem contando intensivamente com a participagao desses profissionais tanto no nivel federal quanto estadual ¢ municipal. Atualmente, a categoria dos assistentes sociais tem assumido func6es de formulacdo, execugao e controle da implantac4o do Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS). Nesse quadro, apresenta-se como necessdrio analisar as condigées econdmicas, sdcio-politicas ¢ culturais para a implementacao do SUAS ¢ verificar que caracteristicas vem assumindo a intervengio profissional dos Assistentes Sociais no proceso de efetivacao da politica. Analisar estes elementos no municipio de Juiz de Fora, bem como identificar as bases do associativismo ¢ dos processos de participacao existentes, verificando suas potencialidades e limites para a implementagio do SUAS, constituem os objetivos dos contetidos dos capitulos que compéem o presente livro. A pesquisa de campo que substantivou as andlises aqui desenvolvidas foi realizada por meio da técnica de entrevista com responsiveis pela formulagio e execucdo da politica de assisténcia social no municipios pela téncia soci Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Introdugso aplicagao de questiondrio aos representantes das organizagées/movimentos/ instituigées existentes nas Regides Administrativas do municfpio e aos profissionais de Servigo Social dos CRAS e rede conveniada*. Também, junto a0 profissionais, foram realizados laboratérios, grupo focal e um Simpésio. Agradecemos a todos que contribufram para a realizacao ¢ conclusao desta pesquisa: assistentes sociais, representantes das instituig6es/movimentos/ organizagées, gestores, discentes da graduacao e da pés-graduacao, agéncias de fomento (FAPEMIG, Capes/PROCAD) e UFJF/PROPESQ. Os questionérios estio em Anexo, ma Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Capitulo 1 Politicadeassisténciasocialno contextoneoliberal:desafios da implementacao do SUAS Rodrigo de Souza Filho! Cassia Pacheco Gouvea Antinareli” Carla Alves de Paula? Wesley Helker Felicio Silva* 1 Introdugao No marco do capitalismo monopolista, as politicas sociais, a partir de seu objetivo imediato de garantir a reproducao da forca de trabalho, atuam 1 Professor Adjunto da Faculdade de Servigo Social/UEJR, Doutor em Servigo Social/ UFR) 2 Assistente Social da Prefeitura Municipal de Cataguases/MG. é Assistente Social da prefeitura de Teixciras/MG e Especialista em Gest3o da Politica de Assisténcia Social ¢ SUAS/Pitagoras. ‘ Assistente Social, Mestre em Servigo Social/UFJF e Doutorando em Servigo Social/UFR] Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS em determinadas expressoes da “questa social”’ como forma de construir uma base ampla de legitimidade consenso social, através do atendimento concreto de demandas e necessidades da classe trabalhadora. No entanto, elas ionadas as politi estratégia de intervengio do Estado, visando a realizagio da logica monopélica de maximizagao dos lucros pelo controle dos mercados. A forma e 0 contetido das politicas econdmicas e sociais, por conseguinte, dependerio das lutas sociais concretas - dos processos de organizacao e de luta dos trabalhadores - que produzirio a morfologia do Estado interventor e de sua politica social, num determinado contexto histérico (NETTO, 1992). Nesse sentido, entendemos a politica social como estratégia permanente e continua da intervengio do estado na rea social (NETTO, 1992). Assim, se por um lado o Estado interventor e a politica social apresentam-se como funcionais ao capital, por outro eles também atendem a interesses da classe trabalhadora. Esse movimento contraditério processa o limite ¢ a possibilidade da acao politica junto ao Estado, no aspecto geral, € 4 politica social, especificamente, numa perspectiva de reformas no campo estatal. Outro aspecto que expressa o limite ¢ a possibilidade da intervengao junto a politica social diz respeito A sua relagio com a politica econdmica. Nesse sentido, para um enfrentamento das express6es da “questo social” que venha a atender de forma mais ampla os interesses da classe trabalhadora, exige-se uma politica econémica também com este objetivo. Portanto, uma politica econémica que reforga as desigualdades sociais determina as (im) possibilidades de construgao de uma politica social voltada para os interesses das classes subalternas. Nesses termos, as politicas sociais ptiblicas, por mais encontram-se intrinsecamente rele econédmicas como Entendemos “questéo social”, conforme destaca Iamamoto, como 0 “conjunto das expressées das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura, impensdveis sem a intermediacio do Fstado. Tem sua génese no cardter coletivo da produgio, contraposto 3 apropriagio privada da propria atividade humana - 0 trabalho -, das condigies necessirias & sua realizagao, assim como de scus frutos [...] A questéo social expressa, portanto, disparidades econimicas, politicas e culturais das classes sociais, mediarizadas por relacoes de género, caracteristicas é:nico-raciais ¢ formacbes regionais, colocando em causa as relag6es entre amplos segmentos da sociedade civil ¢ o poder estatal” (IAMAMOTO, 2001, p. 16-17). Para um mapeamento das determinagées tebricas e histéricas da categoria “questo social” no marco da tradicao marxista, ver, também, Netto (2001). ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinareli | Caria Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva que scjam orientadas para a efetivagao de objetivos democraticos’ ¢ de um processo de reformas no Ambito estaral, nao viabilizarao um enfrentamento mais amplo das expresses da “questao social”. Assim posta, uma politica social voltada para 0 atendimento das necessidades das classes subalternas exige uma politica econdmica que privilegie as demandas pela universalizacéo e aprofundamento de direitos, se se pretende que seu desenvolvimento obtenha éxitos no enfrentamento das desigualdades sociais. De outra forma, a politica social enfrentaré entraves estruturais vinculados & politica econémica, no viabilizando a expansio de direitos sociais, independentemente de sua configuragao institucional. Essas caracteristicas mostram as articulacdes necessdrias que devem existir entre a politica social ¢ a politica econémica, no marco do capitalismo, para produzir ampliagio de direitos Dessa forma, para analisarmos estruturalmente a tendéncia da implementagao do Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS)’ do Governo Lula, mostra-se essencial identificarmos que tipo de vinculagao a politica social de assisténcia, de uma forma geral, estabelece com a politica econdmica implementada, para avaliarmos sua potencialidade enquanto politica social orientada para a expansio de direitos. Nossosestudos indicam que a estrutura geral da politica de assisténcia social do governo Lula apresenta-se como a contna-firce social da politica econdmica neoliberal. Esse entendimento sera tratado na primeira parte do artigo. Apés desvelar a relacao existente entre a politica econémica e a politica de assisténcia social, apresenta-se como necessério explicitar a dinamica da propria politica de assisténcia para verificar sua orientagao geral e avaliar aspectos que possam fortalecer uma perspectiva democritica. Dessa forma, identificamos aspectos - do ponto de vista geral da politica de assisténcia social € na particularidade do SUAS - que podem ser reconhecidos como Para efeito desse trabalho estaremos qualificando como democratica a politica social de “padrao institucional, redistributivista”. E 0 padrao que se orienta pelo universalismo de direitos, a ampliagio e a garantia, por parte do Estado, da protecao da promogio social, através da organicidade das politicas sociais de carter piiblico. Conjunto de servigos, programas, projetos e beneficios no ambito da assisténcia social prestados diretamente — ou por meio de convénios com organizacées sem fins lucratives -, por érgios ¢ instituigdes ptiblicas federais, estaduais ¢ municipais da administragio direta e indircta ¢ das fundagées mantidas pelo poder piblico. modo de gestio compartilhada que divide responsabilidades para instalar, regular, manter e expanditr as ages da assisténcia social (SPOSATI, 2006, p. 130). Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS avangos para a efetivacao de uma politica de assisténcia social de corte democratico. Na segunda parte do artigo desenvolvemos esta andlise. Para concluit, explicitaremos a situagao estrutural do SUAS na sua potencialidade, contradigéo e adversidade e os rebatimentos destas configuraces para a implementagio do sistema c suas possiveis consequéncias para a politica de assisténcia social brasileira. 2 A Politica de Assisténcia Social do Governo Lula 2.1 Antecedentes A década de 1990 apresentou uma conjuntura desfavordvel para a implementacao do projeto democritico de politica social previsto na Constituicao Federal de 1988 ¢ em suas leis organicas (Lei Organica da Satide, Lei Orginica da Assisténcia Social e Estatuto da Crianga e do Adolescente). A partir dos anos de 1990 ¢, de forma mais consistent, de 1994, © governo brasileiro (governos Collor de Mello e FHC, respectivamente) assume como orientagéo para as politicas econémicas ¢ sociais os ditames neoliberais fundados na légica proposta pelo Consenso de Washington (estabilizacao monetéria, abertura comercial e privatizacao) ¢ nos preceitos de um “social-liberalismo” que nao se distingue concretamente das experiéncias neoliberais de redugao do Estado na rea social. Em termos gerais, a Politica Social desencadeada pelo governo FHC seguiu os passos neoliberais de reestruturacées social-democratas, num pais que nao constituiu um padrao de intervengao do Estado na drea social do porte de tais experiéncias. Portanto, diminuiu o que ndo existia e redefiniu © que néo foi construfdo. Sendo assim, assistencializagao, mercantilizacao, re-filantropizacao e focalizagao das polfticas sociais formaram a tendéncia de tal proposicao (MOTA, 1995; YASBECK, 1995; SOARES, 2000). A conjuntura hegemédnica do governo FHC apresentou, portanto, um modelo econdmico ¢ social (ajuste neoliberal que aposta. numa politica econédmica ortodoxo-monetarista, supervalorizando a estabilizagao € 0 controle inflaciondrio ¢ a redugio do papel do Estado na Area social) incompativel com a universalizagio e aprofundamento de direitos sociais (FIORI, 1995; SOARES, 2001). téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva No ambito da assisténcia social, 0 governo FHC pautava-se em duas frentes: o apelo a solidariedade e os programas de transferéncia de renda. Pelo lado da “solidariedade”, 0 exemplo emblematico dessa politica neoliberal de isténcia social foi o Programa Comunidade Soliddria (PCS), que desconheceu a LOAS ¢ a legitimidade do Conselho Nacional de Assisténcia Social e desenvolveu uma politica de desresponsabilizacio do Estado no trato das express6es da “questio social”, através de agdes focalizadas, fragmentadas ¢ privatizadas. Outro aspecto a destacar, ainda nesse campo, refere-se a “descentralizagao destrutiva” (SOARES, 2000) operada pelo desmonte de instituigées nacionais (Legido Brasileira de Assisténcia/LBA e Fundacao Centro Brasileiro para Infancia ¢ Adolescéncia/FCBIA), sem planejamento prévio, combinada com a transferéncia das ages para os municipios, sem o devido apoio técnico e financeiro para que os mesmos fossem capazes de assumir as aces. A outra matriz da “era” Fernando Henrique Cardoso acerca da Politica de Assisténcia Social, diz respeito 2 implantagao de programas de transferéncias de renda com condicionalidades (como Bolsa-Escola, Bolsa- Alimentagao, Vale-Gds, Programa de Erradicagdo do Trabalho Infantil etc.), através de critérios restritos de clegibilidade ¢ de distribuicao de beneficios infimos. A partir desta estratégia, foi estruturada a Rede de Protecao Social, com prevaléncia para os programas de transferéncia de renda, que foram criados huma conjuntura sécio-econdmica marcada pelo crescimento acentuado do desemprego, acompanhado do acréscimo de formas de ocupagées precarias e instaveis, sem a protecao social garantida pela previdéncia social; rebaixamento do rendimento da renda proveniente do trabalho; crescimento da violéncia; ampliacéo dos indices de pobreza e da desigualdade social. Enfim, os programas de renda minima foram implementados sob uma nitida concepsio liberal de focalizacéo e pobreza absoluta, o que contribuiu para a reducao de gastos sociais (SILVA, YASBECK e GIOVANNI, 2004). Nesse quadro, as estratégias de focalizagio - via programas de combate & pobreza - ¢ descentralizagao/apelo a solidariedade voluntaria contribuem, como sinalizam Laurell (1995) e Soares (2000), para a manutengio de mecanismos clientelistas na area social. Esse aspecto parece bem razoavel em se tratando de um governo fundado num pacto conservador, que precisa articular politicamente apoio para a direcdo estratégica maior: a transnacionalizacao radical da economia (FIORI, 2001). Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS 2.2 Aconjuntura dos governos Lula Devido ao quadro politico instaurado, a sociedade brasileira elege Lula para a Presidéncia da Repiblica em 2002, ¢ 0 reelege em 2006. A cleigao de Lula significava, para todos aqueles que votaram nele, uma possibilidade de ruptura com 0 neoliberalismo ¢ uma esperanga de expansio dos direitos sociais. Porém, o que se verificou foi a manutencio, no geral, da politica econémica ¢ social do governo Cardoso (FILGUEIRAS; GONGALVES, 2007; DRUCK; FILGUEIRAS, 2007). Assim, através das metas de inflacio, do ajuste fiscal permanente ¢ do cambio flutuante, o Brasil passou durante o governo Lula, devido a0 contexto internacional favorével, por mudancas no desempenho da economia com melhora da situacao das contas externas. O crescimento dos superdvits na balanga comercial, mesmo com o mercado interno mediocre, possibilitou ao governo Lula a manutengao do modelo econémico do governo FHC, conservando suas caracterfsticas fundamentais (FILGUEIRAS; GONCALVES, 2007). A partir da dominagio da légica financeira, a insercao internacional do Brasil, conduzida de forma passiva, tornou sua politica macrocconémica mais dependente dos ciclos do comércio internacional e dos movimentos de curto prazo do capital financeiro. Desse modo, apoiada, sobretudo, em commodities e produtos industriais com baixo e médio-baixo contetido tecnolégico, a gestao do governo Lula promoveu um aumento das exportacées concorrendo para um importante saldo comercial externo (FILGUEIRAS; GONGALVES, 2007). Mas, vale lembrar que tal sucesso apresenta algumas particularidades: primero, como indicado, encontrou campo fértil no cenario internacional com o crescimento da economia global e do comércio internacional, concomitante a elevacio dos pregos internacionais ¢ da demanda das commodities; em segundo, a relevante contribuigao de uma taxa de cambio favordvel aos exportadores brasileiros; além, claro, da implementagio de politicas governamentais especificas, como crédito ¢ incentivos fiscais. Neste cendrio, a insergio internacional, iniciada pelos governos de FHC, apoia-se na exportagao de produtos primatios, responsaveis por promover uma melhora conjuntural no balango de pagamentos do pais e nos indicadores de vulnerabilidade financeira externa. Todavia, do ponto de vista estructural, essa politica econdmica distancia o pals dos paises desenvolvidos téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva na producao ¢ exportagao de produtos de alta tecnologia, significando um aumento da vulnerabilidade externa do ponto de vista estructural. Como destacou Filgueiras e Gongalves (2007), com a consolidagao do neoliberalismo no Brasil a estrutura industrial sofreu um retrocesso impulsionado pela abertura comercial, pelas privatizagées ¢ pelo processo de desnacionalizagio da economia. Nesse sentido, devido & presenc dominante de produtos intensivos em recursos naturais ¢ pelo baixo contetido tecnoldgico dos produtos industrializados, as exportagées do pais passaram por um processo de reprimarizagio que diminuiu o dinamismo industrial do Brasil. No que tange ao plano interno, verifica-se a perda tendencial do poder aquisitivo dos salarios com redugao da participagao destes na renda nacional, com intuito de canalizar para os donos do capital uma parcela desta renda maior do que a parte atribuida aos rendimentos ao trabalho. A reconcentracao da renda nacional tem nas elevadas taxas de desemprego sua principal razao: os rendimentos do capital tém sido favorecidos por um sistema tributério regressive que reduz os impostos sobre a produgao e sobre aplicagées financeiras, e até desonera integralmente os setores mais lucrativos voltados para a exportagio ¢ para os segmentos de tecnologia avangada ¢ dinamica. O enfrentamento dos compromissos da divida externa, bem como a garantia de acesso das empresas aos bens ¢ servigos importados necessitios 4 continuidade das atividades, marcam 0 ajuste externo a que o Brasil vem se submetendo, visando 4 recomposicao da relacio entre divida externa exportac6es. Neste campo, 0 governo foi bem sucedido: reduziu a divida externa e obteve excelente saldo na conta de comércio de mercadorias. Contudo, embora houve essa melhora na trajetéria da divida publica externa devido aos grandes saldos da balanga comercial, o pais implementou uma politica de troca da divida piiblica externa pela divida puiblica interna. Por conseguinte, a reducio da divida externa, por um lado, e aumento da divida interna em relacao ao PIB, por outro, concorreram para flexibilizar as restrig6es externas. Isso serviu fundamentalmente para viabilizar os objetivos centrais da politica econémica do governo Lula, visto que, buscaram reduzir gradualmente a divida publica por meio da obtengao de elevados supendvizs primarios ¢ taxas de inflacio cada ver menotes, de acordo com o regime de metas de inflaco, por meio de taxas de juros elevadas. Essas diretrizes essenciais da politica econémica do governo Lula contribuiram, entao, para Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS reduzir 0 risco-pais ¢ clevar o Brasil como uma nagao capaz de honrar suas obrigagées com o capital financeiro (FILGUEIRAS; GONCALVES, 2007). Assim sendo, esse conjunto de fatores tem sido utilizado para justificar 0 aumento do superivit primario do orgamento piiblico, paralisando recursos que poderiam ser destinados aos gastos sociais ou a investimentos em infraestrutura. Aanilise dos gastos piblicos, no periodo 2001/2005, nao deixa dtividas sobre a manutengio da ldgica neoliberal do governo Lula: a) manutencio do gasto com pessoal, educasao e previdéncia dos servidores em relagio ao PIB (2,3%; 0,2%; 2,2%, respectivamente); b) redugao das despesas correntes € investimento (em 0,4p.p e 0,3p.p); ©) crescimento dos gastos com programas sociais previdéncia (0,7p.p € 1,1p.p); d) elevacao do superivit primario em 1,05 p.p. (ALMEIDA; GIAMBIAGI; PESSOA, 2006). Além disso, os superavits obtidos no governo Lula vieram acompanhados por uma elevacao da carga tributdria que, por sua vez, vem aumentando sucessivamente desde a adogao do Plano Real e, sobretudo, apés 0 acordo com o FMI visando promover um ajuste fiscal permanente. A andlise da evolugao da carga ibutiria brasileira, conforme o Tribunal de Contas da Uniao -TCU - (2010), indica que houve no periodo de 1995 a 2007 um aumento de 20,57%, correspondendo a um salto de cerca de 29% em 1995 para cerca 35% em 2007 na composicao do PIB. Essa evolugao diminuiu apenas no ano de 2009, com uma retragao de 1,29%, devido ao contexto de crise econédmica. Todavia, o sistema tributirio brasileiro no obedece ao principio da equidade ou de capacidade contributiva compativel com a capacidade econémica dos seus cidadaos, 0 que acaba por onerar aqueles com menor nivel de renda, exigindo deles um esforco tributario maior do que dos cidadaos mais ricos. Por esse aspecto, o sistema tributério brasileiro penaliza mais os contribuintes mais pobres, constituindo uma relacao inversa entre os tributos pagos e o nivel de renda deste cidadao. Esse quadro regressivo da carga tributiria brasileira € composto_ pela incidéncia indireta dos tributos sobre © consumo, constituido em 43% da carga ibutéria, possuindo um peso maior do que os tributos diretos, incidences na renda na propriedade, que constitui um percentual de cerca de 28% (BRASIL, 2007). Por conseguinte, no Brasil, os tributos sobre 0 consumo possuem maior peso que aqueles sobre a renda. Com isso, a populagio de baixa Conforme Relatério ¢ parecer prévio sobre as contas do Governo da Repiiblica: exercicio de 2009, do Tribunal de Contas da Unio, disponivel em wwwi.tcu.gov.br ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva renda é responsével por financiar o Estado ¢ carregar, sobretudo apés acordo do “pacote fiscal” com 0 FMI, © peso do aumento da carga tributiria ao longo dos tiltimos anos, j4 que esta possui quase metade de sua composicao proveniente dos impostos incididos sobre o consumo (SALVADOR, 2010). Isso significa que hé “uma brutal transferéncia de renda do conjunto da sociedade para o capital financeiro e os rentistas” (DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 29). Em 2006, os servicos da divida consumiram 34,1% do orcamento federal, enquanto a previdéncia 26,6% e a assisténcia social, apenas, 2,7% (BEHRING, 2007). Em relacdo ao PIB, entre 2008 e 2009 a divida publica chegou a aumentar R$191,7 bilhées, marcando um crescimento em 5,62% do PIB, que saltou de 37,34% em dezembro de 2008 para 42,96% no final de 2009. A prevideéncia contou com uma variacao de 8,6% do PIB para 9,3%, entre os anos de 2008 ¢ 2009, respectivamente. Jé a politica de assisténcia social passou por uma evoluséo no orgamento da Uniio ao longo do perfodo 2005-2009, representando uma evolugao de 15,8 a 33,3 bilhdes de reais, correspondendo a uma evolucdo de 0,7% do PIB em 2005 para 1,1% em 2009 (BRASIL, 2010). A tabela abaixo vem ilustrar este contexto, mostrando a tendéncia no destino dos recursos da Seguridade Social desde 0 periodo de 2000 a 2007, para cada uma das politicas. Tabela 1 - Orgamento da Seguridade Social: distribuigao de recursos entre as politicas soc (2000-2007) R$ milhées Pees de Seu | 2000 | 2001 | 2002 | amos | anos | 2005 2006 | amar =a rns | gs ayse | aorsaaas | aa : : Brn | osaerss | uorsasas | asatsas | rsesrrse | sesso | uarzvest | 212945 | 23csrai9 wk [mana aes | aae | zane | ame [same | «orm | aman Sein 2 si 5 ass | 2 fiat | suo [say fasts fans | asas | saw | 21 wa Tol en we mies | risizo | ascre | sass | saias6 | 22s | 2009 | xs07 | scant ano | ay99 | 2001 | 2002 | amos | avo | 2008 | 2006 | omer Tec o me [oan | reese | ayes | ream | rosie | any | rom | rane | rae | rom Sn a stema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS ae Seana | aeoo | am | 2m | ams | noon | 200s | 206 | aor = geome | sree | sam | sam | som | com | oom | rom | sum ‘Faalem% | 10000% | r0000% | 10.00% | 10.00% | rca00% | 100.0% | t0000% | 10000% etter | agg | aor | ome | 2am | me | ames | ane | mr sam | sae | asm asm | zm | som | one sue faze | rom ize | rom | azo | az | ize | 1708 fosatnsa | asa foam — | oa | osm fare — | ora | ase | asm Taalem % | joo | ro4s% | rose | anes | rnseee | ri.tm% | rim | 11.91% mm ew RS] savage | igoeise | vara | rove | yaa | avo | rser | assunn ynte: STAFI/SIDOR. Elaboracao: Salvador (2010) Os dados apontados revelam que dentro do periodo abordado, a previdéncia recebeu a maior parcela de recursos em todos os anos. Entretanto, vale destacar que a maior parte dos gastos com a previdéncia social é custeada pelas receitas provenientes dos trabalhadores ¢ emptesarios. Em outro diapasio, percebe-se que ocorre uma reducdo na participagio relativa da satide no total deste quadro orcamentirio, ao passo que a politica de assisténcia social passa por uma ampliagao de gastos. Isso ocorre sobretudo a partir de 2004, devido a redugo de idade da populagio idosa (de 67 para 65 anos) para acesso a0 Beneficio de Prestagao Continuada — BPC, e ao aumento de recursos para © principal programa de transferéncia de renda do governo federal, 0 Bolsa Familia, que tinha no ano de 2005 uma despesa equivalente a 0,21% do PIB, aumentando para 0,36% em 2007 e 0,4% em 2008. Nesse sentido, Druck e Filgueiras assinalaram (2007, p.30) que os gastos sociais que tém maior capacidade de impacto no combate as desigualdades € 4 pobreza, como satide, educagao, habitagao saneamento, perdem participacio relativa no orcamento social. A satide, por exemplo, obteve certa estabilidade em proporcao ao PIB, com uma média de 2% desde 0 ano de 2005. Apenas no ano de 2009 contou com uma participacao de 2,2% do PIB, o que, em parte, pode ser atribuido a estagnagao do crescimento do PIB devido ao contexto de crise. Jé a habitacdo e o saneamento contaram com um crescimento pouco expressivo, entre os anos de 2005 e 2009, na ma Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva ordem de 0,07% para 0,08% em rclacao ao PIB na habitacao, ¢ 0,0% para 0,1 % no saneamento, Contudo, como acima demonstrado, os gastos com a assisténcia social neste periodo dobraram, tendo um crescimento consideravel em relagdo ao PIB (BRASIL, 2010). Ainda que se constate a ampliacao dos montantes de recursos para 0 Fundo Nacional de Assisténcia Social (FNAS) desde a sua criagdo em 1996, este tem tido uma participacéo timida no orcamento da seguridade social. Dessa forma, se em 1996 os recursos executados via FNAS correspondiam a apenas 25,7% do total dispendido na fungio assisténcia social, no orcamento previsto para 2010 corresponde a cerca de 62% do orgamento previsto para a mesma funca (0, de acordo com a Lei Orcamentéria Anual de 2010. Todavia, diante do orgamento previsto para a Seguridade Social, neste mesmo ano, a fungao Asistencia Social corresponde a apenas 9,1%, ja o FNAS a 5,5% diante do orcamento previsto para a Seguridade Social em 2010. Cabe lembrar que esta evolucao dos recursos destinados ao FNAS tem como responsdveis os programas de transferéncia de renda, expressados BPC e na Renda Mensal Vitalicia - RMV, executados pelos recursos aportados na Unidade Orgamentaria FNAS. Quando se procede a comparagao entre os recursos destinados aos principais programas de transferéncia de renda ¢ as demais acées sociais do MDS, verifica-se que 0 BPC consome cerca de 52% dos recursos, seguido pelo Bolsa-Familia com cerca de 35%. Estes dois programas de transferéncia de renda concentram 87% dos recursos destinados 4 populacéo. Os outros 13% dos recursos estao distribufdos entre a RMV, com 4,6%, a protegao social bésica ea protecao social especial com 2,3%, PROJOVEM com 0,9%, o PETI com, aproximadamente, 0,7%, no enfrentamento da violéncia sexual contra criangas ¢ adolescentes com 0,1% e as outras aces do MDS que somadas ficam com somente 4,4%, conforme indica a Lei Orcamentéria Anual de 2010. Como se percebe, os gastos com a politica de assisténcia social revelam a consolidagao da tendéncia dos mesmos constituir-se predominantemente nos programas de transferéncia de renda. Somados os valores destinados a esses programas, constata-se que sao responsaveis pela execugao de 91,6% do valor total de recursos orgamentados para o MDS. Desse modo, o MDS vem priorizando claramente os programas de transferéncia de renda para categorias e/ou segmentos em situacao de pobreza absoluta, o que lhes atribui © carater de programas altamente restritos ¢ focalizados. Tal fato torna-se ainda mais grave diante do reduzido investimento nos servicos, programas Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS € projetos de assisténcia social, 0 que atribui a politica de assisténcia social carter residual e de manipulagio politica, Conforme analisam Filgueiras e Golgalves (2007, p.163): Mais do que © governo Cardoso, que dew inicio a esse tipo de politica, Lula Icvou a sétio a importincia politica c social dessas despesas, compreendendo sua fungao amortecedora de tensoes no interior do projeto liberal. Este € 0 objetivo essencial de um programa que néo tem capacidade de desarmar os mecanismos estruturais de reprodugéo da pobreza. Apenas maneja a pobreza, pois mantém em permanente estado de inseguransa, indigéncia c dependéncia © seu piblico alvo, permitindo assim, a sua manipulacao politica. A politica social do governo Lula, tal como sua politica econémica, ¢ também de natureza neoliberal, coerente com o modelo econdmico vigente e serve de instrumento poderoso de manipulacao politica de uma parcela significativa da sociedade brasileira, a0 mesmo tempo em que permite um discurso “politicamente correto” (DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 32). No governo Lula foram combinadas flexibilizagao € precarizagio do trabalho e politicas focalizadas e flexiveis de combate 4 pobreza. Ambas conduzidas pela mesma légica, qual seja, do curto prazo, do imediatismo inconsequente, de intervenges pontuais ¢ precrias que, para ndo se contrapor ‘4 ordem econdmica neoliberal’ ¢ as determinagGes do Banco Mundial, subordinam-se ao reino da volatilidade, sem mudar ¢ intervir sobre as causas estruturais dos problemas fundamentais da sociedade brasileira’ (DRUCK: FILGUEIRAS, 2007, p. 32). © atual governo brasileiro optou pela continuidade deste modelo econémico de estabilidade monetdria ¢ adotou uma politica de severidade fiscal que significam um verdadeiro sacrificio social, pois enquanto o gasto social de 2004, por exemplo, foi de R$68,3 bilhdes (BOSCHETTI, 2004, p. 3), 0 superdvit primério foi de R$70 bilhoes (BOSCHETTI, 2004, p. 3). Ou seja, © governo investiu menos em politicas sociais do que poupou recursos para pagamento dos juros da divida. Para gerar esta economia, 0 governo ampliou receitas por meio do aumento de impostos e das reformas tributdrias e da previdéncia, e ainda, por meio do corte de gastos, com a redugao de investimentos em politicas e programas sociais. Tal postura ratifica 0 compromisso com o ajuste fiscal ¢ a manutengao do superévit primario, posicionando-se contra o principio da universalidade, ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinareli | Caria Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva destacando a focalizagao nos grupos de menor renda como norteador das politicas sociais. As consequéncias desse quadro sao 0 baixo crescimento econémico e a continuidade da concentragio de renda e riqueza (apesar de alguma distribuiggo proporcionada principalmente pelo aumento real do salério minimo e pela influéncia dos programas sociais que proporcionaram um crescimento da renda mensal do trabalhador de 20% em cinco anos). Essa situacio impede a possibilidade de existéncia da “porta de saida” para a pobreza, visto que a politica de assisténcia social garante direitos socioassistenciais, mas ela nao é capaz de construir saidas estruturais para a condigao de pobreza. Nesse quadro, efetiva-se a tendéncia a privatizagao ¢ assistencializagao das politicas sociais, j4 esbogada por Mota (1995), no inicio da década de 1990, ¢ atualizada para a conjuntura atual (MOTA, 2008). Esse processo de assistencializagio da protecio social brasileira é entao, determinado pela tendéncia a expansao da politica de assisténcia social, se tornando a principal politica de protecao social brasileira, a0 passo de um processo de restrigao e orientagao privatizante das politicas de satide, previdéncia e educagio. Como se percebe, iniciou-se uma expansio da assisténcia social como principal politica de combate aos agravos cometido pelas medidas neoliberais adotadas no pais. Por isso, “se antes a centralidade da seguridade girava em torno da previdéncia, ela agora gira em torno da assisténcia, que assume a condicao de uma politica estruturadora ¢ nao como mediadora de acesso a outras politicas e a outros direitos, como é 0 caso do trabalho” (MOTA, 2008, p. 138). Portanto, a assisténcia como uma politica nao contributiva adquire um lugar privilegiado na protecéo social brasileira, se tornando a principal politica de protecao social do pais, denotando um movimento responsavel por criar uma nova engenharia da Seguridade Social brasileira (MOTA, 2008). Instala-se uma fase na qual a Assisténcia Social, mais do que uma politica de protecio social, se constitui num mito social. Menos pela sua capacidade de direta € imediata, (...), ¢ mais pela sua condigao de ideologia pritica politica, robustecidas no plano superestrutural pelo apagamento do lugar que a precarizagao do trabalho ¢ o aumento da superpopulagao relativa tem no processo de reprodugio social. Na impossibilidade de garantir o direito ao trabalho (postulado inexistente na sociedade regida pelo capital), seja pelas condigies que ele assume contemporancamente, seja pelo nivel de desemprego, Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS ou pelas orientacées macroeconémicas vigentes, o Estado capitalista amplia o 126 | campo de agio da Assisténcia Social ao mesmo tempo em que limita 0 acesso 4 satide ¢ A previdéncia social piiblicas (MOTA, 2008, p. 141). Dito de outro modo, h4 uma nova mancira de tratar a questao social na sociedade brasileira, focando-a enquanto objeto de programas ¢ agées socioassistenciais de combate A pobreza, como orienta os organismos financeiros internacionais. A assisténcia social se torna, entao, © principal mecanismo de enfrentamento da questio social. Devido as mudangas no mundo do trabalho, responsavel por modificar 0 padréo de acumulacao capitalista ¢ transformar em ntimeros exorbitantes a massa de trabalhadores sem emprego, esta politica é revalidada e colocada no centro da protecio social como proposta de combate as expressdes da questio social. Assim, a parcela da populacao que nao consegue atender suas necessidades por meio do mercado, torna-se puiblico-alvo da assisténcia social Portanto, nitidamente hd uma expansao de programas de transferéncia de renda no Brasil, inscrita no contexto das transformagées econémicas, politicas ¢ sociais em curso, que foram respons4veis por engendrar uma ampliacao da mercantilizagao dos servigos sociais, caracterizando numa nova forma de enfrentamento da questo social. Para Pastorini € Galizia (2006), essa expansio dos programas de transferéncia de renda, pautados na légica da focalizagao, ¢ uma das faces do proceso de “assistencializacao” da protecao social, que tem a privatizagao da previdéncia social, satide ¢ educagio como par dialético no proceso de inflexao dessa relacdo entre as pol{ticas permanentes de protegao social ¢ os programas ¢ acées assistenciaii Portanto, como se infere no padrao de protecao social que est4 constituindo-se, esses programas passaram a receber um aumento de recursos destinados a sua execugao, enquanto as politicas permanente (satidee educagao) passam por estratégias diversas de privatizagao, reducio e desresponsabilidade do Estado, resultando no seu enfraquecimento politico e social. Neste contexto, cabe, entao, destacar que o Programa Bolsa-Familia éa principal estratégia do governo Lula para combater a pobreza ea desigualdade social. Sua proposta de unificagio dos programas de transferéncia de renda, inicialmente restrita & unificagao de quatro programas fedcrais: Bolsa- Escola, Bolsa-Alimentagao, Vale-Gés Cartéo-Alimentacio, foi langada pelo Governo Federal no dia 20 de outubro de 2003. Apresentou-se como um programa inovador por se propor a proteger o grupo familiar como um todo ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva ¢ elevar o valor monetario do beneficio, além de desconsiderar a hipdtese de diminuicao da transferéncia monetéria. No entanto, é necessdrio ter em mente que junto a tal politica, precisa-se pensar em uma articulagio da transferéncia monetéria com outros programas sociais ¢ com uma politica ccondmica de geracio de emprego ¢ renda, de valorizagao da renda do trabalho e de desconcentragio da rendae da riqueza socialmente produzida, 0 que nao se fard sob a orientacao neoliberal que continua marcando o desenvolvimento da economia brasileira. Desse modo, o Bolsa Familia destina-se a familias indigentes, com renda per capita familiar de até R$70,00 e a familias consideradas pobres, com renda per capita familiar de R70,01 até R$140,00, de modo que 0 primeiro grupo familiar recebe um beneficio fixo de R$68,00, podendo receber mais R$22,00 por cada filho de até 15 anos de idade, no maximo de trés filhos, ¢ se tiver filhos adolescentes de até 17 anos, sendo no maximo dois, poderd receber mais R$66,00, podendo atingir 0 valor de R$200,00 por familia. As familias classificadas como pobres recebem uma transferéncia monetéria varidvel de até R$66,00, sendo R$22,00 por cada filho de até 15 anos de idade, podendo receber mais RS 66,00 do beneficio varidvel vinculado ao adolescente. Portanto, 0 valor total do Programa Bolsa Familia pode variar de R$ 22,00 a R$ 200,00, sendo que as familias tém toda liberdade na aplicacao do dinheiro recebido. A unidade beneficidria do Programa é © grupo familiar, preferencialmente representado pela mae. Nota-se quea fixagio dalinhade pobreza reduziu de meio salatio minimo per capita para um valor entre R$70,00 e R$140,00. Essa desvinculagto da referéncia ao salério minimo pode acarretar uma crescente desvalorizacio do valor adotado para classificagao da indigéncia e da pobreza. Sendo assim, devido & énfase dada nas relagées de mercado, o reconhecimento da pobreza passou a ser representado por uma nogao minimalista, resumindo-se apenas na averiguagio da renda familiar, objetando seu entendimento como aspecto essencialmente estrutural, complexo e multidimensional (SILVA; YAZBEK; GIOVANNI, 2004; SILVA, 2008). O corte de renda proposto, nao representa nem de longe o ntimero real de pobres que existem no pais, e promove uma eleigio dos mais pobres entre os pobres, estipulado por uma chamada linha de pobreza que compara os pobres, discriminando os que sio miseriveis e os que séo considerados pobres. Yarbek (2004) esse corte do public beneficidrio pela linha de pobreza tem conotagao discriminativa e fragmentada, levando a uma exclusao de familias e pessoas que também estio em condigées de pobreza e vulnerabilidade. ara Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS Dito de outro modo, a linha de pobreza estipulada pelo Bolsa Familia GEE representa uma maneita de reduzir o mimero real de pobres, visto que define- se como critério de acesso um corte de renda minimalista que visa atender prioritariamente Aquelas pessoas em condigées de extremas caréncias. Por isso, os critérios de clegibilidade do Programa utilizam-se dos famosos testes de meios pata classificar a populagao pobre, forgando-a a comprovar sua pobreza para ter acesso a esse tipo de assisténcia do Estado. Pereira (1998) afirma que esta estratégia é marcada por um vicio do passado na politica de assisténcia social, quando houve a incorporagio do principio de menor elegibilidade criado no século XIX pelos liberais. Para tanto, de acordo com este principio, a prestacdo de um servigo ou 0 acesso a um beneficio guia-se por uma “linha achatadissima de pobreza", primando pela focalizagao extrema ¢ reduzindo a demanda ao beneficio, impossibilitando, entéo, 0 acesso dos assalariados pobres a cle. Portanto, constata-se que 05 maiores limites quanto a esta politica de assisténcia social pautada nos programas de transferéncia de renda caracterizados acima sao: o baixo montante das transferéncias monetérias a familias vivendo em extrema pobreza; a fragmentagao de programas de iniciativa municipal, estadual e federal; a no viggncia destes programas com uma politica macroecondmica de distribuigao de riqueza socialmente produzida’ ¢ de geracio de emprego ¢ renda faz com que esses programas cumpram uma fungdo meramente compensatéria. Assim, “os programas de transferéncia de renda precisam ser, sobretudo, articulados a uma politica econémica superadora do modelo de concentragio de renda e desvinculada de um esforco de geragio de emprego ¢ renda adotada ao longo da historia brasileira” (SILVA; YAZBEK; GIOVANNI, 2004: 216). Além disso, deve-se considerar também a articulacdo dessa politica com as demais politicas sociais basicas (satide, trabalho, educagao), 0 que na maioria dos casos, nao ocorre. Para que esse quadro possa ser revertido, devem-se apresentar propostas que priorizem e democratizem os programas € servigos sociais bésicos, 0 que significa alterar 0 quadro conjuntural contemporanco, dando lugar a uma politica de crescimento econdmico, de geracio de emprego e de distribuigio de renda. Assim, no quadro de crescimento econémico, ainda reduzido, precarizagio e instabilidade do trabalho, desemprego, rebaixamento do valor ) hd de se con desigualdade na distribuiggo da renda e da riqueza socialmente produzida mais do que a incapacidade de geracao de renda (SILVA er alii, 2004: 202). jerar que a causa fundamental da pobreza no Brasil € a ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva da rendac do trabalho, nao enfrentamento das causas da desigualdade, frutos do ajuste econdmico preconizado pelo idedrio neoliberal, a grande questo que se coloca é: quais as potencialidades da Politica Nacional de Assisténcia Social? Quais seus principais encraves ¢ consequéncias? Sao e serem abordadas nas proximas segées. questées a 3 Contratendéncias da Politica de Assisténcia Social do Governo Lula Apesar da politica de assisténcia social do Governo Lula se estruturar como contraface da politica econémica neoliberal implementada, nao podemos perder de vista que 0 processo de assistencializacgao, no que se refere A expansio da politica de assisténcia social, permitiu que forgas democraticas interviessem nesse contexto ¢ elaborassem uma proposta que incorporava elementos democraticos previstos na Constituigao Federal de 1988 (CF-1988) ¢ na Lei Organica da Assisténcia Social (LOAS). Nesse sentido, consideramos que os aspectos mais significativos implementados pelo Governo Lula no campo da assisténcia social foram: o fim do Programa Comunidade Solidaria e a rearticulagéo do Conselho Nacional de Assisténcia Social; a unificagao dos programas de transferéncia de renda no denominado Bolsa Familia, que em maio de 2006 “estava implantado em 99,9% dos municipios brasileiros, beneficiando 11,118 milhées de familias, atingindo, portanto, quase 47 milhées de brasileiros” (MARQUES; MENDES, 2007, p. 20); a centralizagio das acées da politica de assisténcia social no Ministério de Desenvolvimento Social e Combate a Fome; e, por fim, a aprovacio da Politica Nacional de Assisténcia Social (PNAS), em setembro de 2004, consubstanciando as diretrizes da 1V Conferéncia de Assisténcia Social (PNAS), que teve como principal deliberagao a implementagao do Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS). Conforme destacam Almeida et alli (2008, p. 69): Sem diivida alguma, estes avangos foram conquistados pela luta infatigivel das organizagies democriticas da sociedade civil - que, desde a era FHC, vem ctiticando a condugao da politica de assisténcia social -, aliada as agoes de gestores [...] que se encontravam comprometidos com a implementagao da Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS LOAS e nao com o desenvolvimento de uma politica focalista, fragmentada e ea “filantropizada”, caracteristicas upicas da orientagio no perfodo 1994-2002. Desses aspectos que consideramos efetivos avancos na Area da assisténcia social, sem diivida alguma, a PNAS, na perspectiva do SUAS e, em seguida, a aprovacao de suas normas operacionais basicas (NOB-SUAS e NOB-RH), realizadas apés um amplo processo de debate, via conselhos, definindo, como destaca Sposati (2006), uma nova ordenagio da gestio da assisténcia social como politica ptiblica, configuram-se como a expresso mais avancada da politica de assisténcia social hoje em yoga. OSUAS implantaumalégica de organizacao dasagées sécioassistenciais. Seu foco de atendimento € a familia, seus membros ¢ individuos em seu territério de organizagao. Além disso, cle ¢ estruturado, de acordo com a complexidade, em servigos de protegio social bisica ou especial. Os servigos de protegao social especial tem como fungao prioritéria proteger as familias, seus membros e individuos onde seus direitos fundamentais se encontrem violados, mantendo, ou nao, os vinculos e/ou lacos de pertencimento. Jéos servicos de protecio social bésica tm como fungo prioritaria [...] promover atengio as situagées de vulnerabilidade apresentadas e prevenir situagées de potencial risco pessoal ou social, contribuindo para a inclusio social ¢ a autonomia das familias, scus membros ¢ individuos, bem como para a reducao dos indices de eventos (BRASIL, 2004, p. 12). © equipamento que organiza, coordena e executa os servicos de prote¢ao social basica da politica de assisténcia social ¢ 0 Centro de Referéncia da Assisténcia Social - CRAS. Conforme destaca Sposati (2006), 0 SUAS reforca alguns preceitos contidos na LOAS, tais como: universalizacao do sistema com fixacdo de niveis basicos; territorializagao de rede de assisténcia social, através da oferta de servicos baseada na proximidade e necessidades locais; além da descentralizag4o__politico-administrativa com comando tinico. Em suas diretrizes de implementagdo, o referido sistema padroniza os servicos (nomenclatura, contetido, padrao de funcionamento), define e reconhece a competéncia de cada ente federado (co-gestao das a¢des), integra os objetivos, agées, servigos, beneficios, programas e projetos por meio de organizagio em rede; substitui o paradigma assistencialista pelo de protegao social; ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva estabelece pisos de financiamento para protegao social basica ¢ especial; além de respeitar a transferéncia via fundos, com aplicagdo auténoma de recursos nos municipios. A PNAS aponta ainda alguns instrumentos democratizadores de gestao, como 0 cardter democratico da constituicao ¢ avaliacao do plano; o cardter democratico de constru¢a4o, aprovagao e gestao do orcamento, a publicizagio da informacao; a proporcionalidade de recursos no fundo e no érgio gestor da funcdo programdtica 8 (assisténcia social); a dispersao/concentragao dos recursos desta funcao entre os drgaos que comp6em a gestéo municipal ou estadual e 0 exercicio do comando unico por érgao gestor. A tecnologia de informagao constituida pela Rede SUAS também é um dos avancos advindos com a atual PNAS, pois nos possibilita fazer uma leitura das agées federais na area de assisténcia social, até entao inexistente, permitindo uma melhor apreensao a respeito de sua geréncia. A PNAS, ao destacar a participagao da sociedade civil tanto na execucio dos programas através das entidades beneficentes e de assisténcia social, como na participacao, formulagao e controle das agées em todos os niyeis, reforca que a perspectiva democriitica, com centralidade no papel do Fstado, deve orientar a relagio entre o poder ptiblico ¢ as organizagées da sociedade civil que atuam no campo da assisténcia, evitando a manuten¢io de uma articulacao de cunho neoliberal que promove a desresponsabilizacio do Estado na drea social. No entanto, como verificamos na segio anterior, a pedra angular da politica de assisténcia social do governo Lula é a politica de transferéncia de renda, principalmente a desenvolvida através do Programa Bolsa Familia, que apesar de ter tido o mérito de unificar e racionalizar as agées dispersas nessa drea o fez a partir de uma orientacdo tipicamente focalista, conformando um contetido classicamente neoliberal. Nesse sentido, se por um lado a PNAS/SUAS representa um avango democratico da concepgao ¢ do desenho institucional para a operacionalizacao da politica de assisténcia social brasileira, por outro lado, esse avango esta subordinado a légica neoliberal da politica econémica ¢ da estrutura efetiva da politica de assisténcia social do Governo Lula. Dessa forma, a PNAS/SUAS nao possui condigées objetivas para sua cfetivacio, podendo, inclusive, servir & proposta antagénica de politica de assisténcia social, fundada na perspectiva neoliberal. Analisar esse processo é tarefa da ultima seco do presente trabalho. Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS 4 Contradicdes e Adversidades na implementacgao do SUAS Como vimos anteriormente, os gastos com a politica de assisténcia social revelam a consolidagao da tendéncia da mesma constituir-se predominantemente nos programas de transferéncia de renda. Segundo dados apresentados por Behring (2009), entre 2006 ¢ 2008, dos recursos do MDS, aproximadamente 90% foram destinados a esses programas. Se levarmos em conta, a partir dos dados orcamentirios j4 explicitados, que o Programa Bolsa-Familia atende a 13 milhées de familias aproximadamente. Considerando que cada familia seja constituida por cerca de quatro pessoas e que este ptiblico (52 milhdes de pessoas) sera atendido nos Centros de Referéncia de Assisténcia Social - CRAS, somado ao fato de que a verba disponibilizada para a implantacio do SUAS é cerca de R$3.177.100.023", teremos um valor em torno de R$61,00 para atendimento per capta por ano. Ou seja, cerca de R$5,00 per captalmés para implementagao do SUAS. O que ratifica a informacao da entao Secretaria Nacional de Assisténcia Social!! de que a cobertura do SUAS significa, apenas, 5% da cobertura atingida pelo programa bolsa familia. Nesse sentido, a PNAS/SUAS pode reforgar a tendéncia de assistencializagdo ¢ re-filantropizacao da assisténcia social. Assim sendo, consideramos que a expressao da assistencializagao das polfticas sociais no campo assistencial realiza-se através dos Programas de Transferéncia de Renda, em especial do Programa Bolsa Familia. Ou seja, a PNAS/SUAS sofre os mesmos constrangimentos relacionados & assistencializacdo ¢ privatizacao que as demais politicas sociais sofrem, podendo, inclusive, servir a uma proposta antagénica 4 sua concep¢io. Até o presente momento, pode-se constatar que historicamente a assisténcia social foi marcada por caracteristicas como: assistencialismo, we Dado obtido a partir do cdleulo da verba total destinada ao MDS/FNAS em 2010 de acordo com a Lei Orgamentéria Anual (LOA, n° 12.214/2010) (Disponivel em: http://sww.plancjamento.gov-br/secretarias/upload/Legislacao/Leis/100126_ Jei_12214.pdf) que, somados, dao um montante de RS38.926.287.018, sendo que cerca 91,6% deste montante (R$35.749.187.195) destinam-se aos Programas de ‘Transferencia de Renda. Assim, supée-se que o restante, 8,4% dos recursos, scjam destinados a todos os programas sociais c & implementacio do SUAS. u Palestra proferida na FSS/UFJE. Sistema Unico de isténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva filantropia, descontinuidade, pulverizacao, financiamento _ineficiente, inexisténcia de critérios impessoais e racionais, com gestio e controle fragmentados etc (MESTRINER, 2001; OLIVEIRA, 2003). A partir da regulamentagao da Lei Organica de Assisténcia Social, algumas concepcées ganharam relevancia no debate acerca dessa politica, tais como: a prioridade no atendimento, universalidade, definic’o de fontes, critérios de aplicacio de recursos, descentralizag’o, controle, dentre outros. O Sistema Unico de Assisténcia Social (SUAS) é © responsavel, na atualidade, pela articulacéo em todo territério nacional das responsabilidades, vinculos e hierarquia do sistema de servicos, beneficios e ages de assisténcia social, de caréter permanente ou eventual, executados e providos por pessoas juridicas de direito pablico sob critério de universalidade e de agéo em rede hierarquizada e em articulagao com iniciativas da sociedade civil. No entanto, as condigées objetivas para a implementacao do SUAS estao postas: prioridade ao pagamento dos juros ¢ servigos da divida, com elevagao do superdvit primario; foco no controle da inflacio (conseguido através do aumento dos juros); redugao dos gastos piblicos da 4rea social; pouco investimento em infraestrutura, saneamento bésico, satide, educacéo; programas sociais altamente focalizados ¢ excludentes; altas taxas de desemprego; indices elevados de violéncias; dentre tantos outros fatores. Entao, levando-se em consideragao este conjunto de dados, quais as principais consequéncias para a implementacao da PNAS/SUAS? E qual seu significado para o desenvolvimento da politica ptiblica de assisténcia social? Em primeiro lugar, cabe destacar que sendo a preocupagao estrutural da PNAS/SUAS a sustentabilidade da familia para que ela possa “prevenir, proteger, promover € incluir seus membros”, a politica econdmica atual vai de encontro a esta formulacao, na medida em que scu foco privilegiado tem sido a manutencdo da hegemonia do capital financeiro expressa através da politica macrocconémica de clevagao de juros, cambio flutuante ¢ controle inflaciondrio ortodoxo, nao priorizando a geracao estructural de emprego € renda, numa perspectiva de distribuicao de riqueza. Conforme destacam Almeida, Giambiagi e Pessoa (2008, p. 73) Garantira sustentabilidade da familia é 0 grande desafio para a implantagao ¢ consolidacéo do SUAS. No entanto, esta garantia nao depende da politica de assisténcia, mas, sim, das condigdes econdmicas que possam vir a possibilicar Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS ou nao a sustentabilidade dessas familias. Uma politica econémica que no privilegia essa sustentabilidade para que a familia renha condigdes de lade da Politica de desempenhar suas funges, impéc limites para a efet Assisténcia Social. Este é 0 quadro atual. Nesse quadro, onde nao se efetiva a sustentabilidade da familia para viabilizar a protegio de seus entes € os recutsos para os servicos socioassistenciais s40 extremamente restritos, a tendéncia é de se desenvolver no pais, a partir da estruturagdo dos Centros de Referéncia de Assisténci Social, uma dinamica de politica social que a literatura tem descrito como “pluralismo de bem-estar”. Segundo Abrahamson (2004, p. 111), pluralismo de bem-estar ou economia mista de bem-estar consiste em um novo consenso em torno da politica social alcangado na maioria da Europa ¢ na sociedade moderna. Pereira (2004, p. 136-137) sintetiza com propriedade a configuragio desse sistema: “em vez da prevaléncia de relagdes hicrdrquicas, em que 0 Estado assumia o protagonismo, seriam institufdas relacdes horizontais em que esse Estado passaria a fazer parte de um esquema plural ou misto na condicio de co-responsavel ou parceiro”. © pluralismo de bem-estar expressa, na verdade, 0 processo de desresponsabilizagao do Estado que tem ocorrido na area social. Conforme desenvolvem diferentes analistas, o pluralismo “é tratado como modo especifico de implementacao da privatizagao de medidas de bem-estar ptiblico, antes estabelecidas, com efeitos negativos em termos de redistribuigao € qualidade” (ABRAHAMSON, 2004, p. 112). Ou seja, no pluralismo de bem-estar, o Estado tem um menor dominio da politica social, reduzindo seu papel ¢ incentivando outros setores para 0 provimento da politica. Com isso, a responsabilidade pelo bem-estar é dividida em quatro setores-chave: o informal, que é entendido pelos pluralistas como o setor que prové “assisténcia por parte dos grupos primérios de pertenga dos individuos, como a familia, os amigos proximos € os vizinhos”); 0 voluntitio, que se distingue do informal pelo fato de “apresentar maior organizacio ¢ formalidade, embora nio seja homogénco”; © comercial ou mercantil, que “é 0 tinico lécus onde todos podem livremente expressar suas preferéncias na condigao de consumidores”; € 0 oficial, que € “identificado com o Estado, ou mais especificamente com os governos (PEREIRA, 2004, p. 139-140). téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva No quadro de restrigoes de recursos para a implementagao/expansao dos servigos previstos na PNAS, porém, com a press4o para os municipios constituirem os Centros de Referéncia de Assisténcia Social, visando estruturar a “porta de entrada” do sistema e mapear os diferentes tipos de servigos existentes na tertitorialidade de sua abrangéncia, podemos vislumbrar que 0s profissionais localizados no CRAS terio conhecimento da gama de aces “informais” e “voluntarias” que, na auséncia de servicos “oficiais”, servirao para atender as demandas que chegarao ao sistema de assisténcia social. Dessa forma, a auséncia de retaguarda institucional de servigos de assisténcia social possibilita a estruturagao do “pluralismo de bem-estar”, na medida em que seréo incorporadas a rede informal ¢ a rede voluntéria como provedores de servigos.. Essa situagio ratificard a precariedade da infraestrutura dos servicos de assisténcia social e mantera a precariedade das condigées de trabalho dos profissionais da area. Assim, a politica de assisténcia social segue cada vez mais para o caminho do pluralismo de bem-estar. O Estado faz parcerias com outros setores para atender as necessidades dos seus usudrios, na medida em que ocorre uma prioridade de investimento nas politicas de transferéncia de renda ¢, por conseguinte, um insignificante financiamento no restante da politica de assisténcia. A focalizagdo & outro fator preocupante da politica de assisténcia social na atualidade, uma vez que o ptiblico alvo do atendimento deve estar dentro dos critérios de vulnerabilidade apresentados na NOB/SUAS. Esses critérios podem levar a politica de assisténcia social a ser minimalista, onde so atendidos apenas os que se encontram em situagio de extrema pobreza, © que seria um retrocesso da assisténcia e nado um avango (FILGUEIRAS; GONGALVES, 2007). Ademais, 0 piiblico alvo prioritario de atendimento sao aquelas familias que pertencem ao Programa Bolsa Familia e/ou ao BPC. E, como se viu, estes programas apresentam critérios de clegibilidade restritos ¢ focalizados. Isso faz com que se elejam os mais pobres dos pobres para serem atendidos, colocando aqueles “quase-pobres”, ou pouco pobres, fora da protegao social, 0 que pode acabar fazendo com que mais adiante esse grupo venha a trocar de papéis com os que foram atendidos, tornando a politica social cada vez mais perversa (THEODORO; DELGADO apud DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 33). Outra questao que merece destaque diz respeito ao foco do atendimento na familia, pois as politicas sociais sempre foram desenvolvidas de forma Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS setorizada: crianga, adolescente, adulto, idoso etc. Embora esse foco possa ser considerado um avango, na perspectiva da nao fragmentagio da politica, temos que atentar para a seguinte questa [...] se essa centralidade da familia vem ao encontro da perspectiva neoliberal de clegé-a para que essa possa assumir 0 papel de provedora do bem-cstar de seus membros, como fonte privada de protecio social, 20 mesmo tempo em que se constitui como instrumento de controle social, ou se vem dentro da perspectiva de estruturagio das ages a partir da ética da articulagéo tegragio das politicas piblicas (CAVALCANTI, 2007, p. 66). Deve-se alertar também para o modo como a familia est sendo focada nesses programas, se estéo considerando as particularidades de cada grupo familiar, viabilizando igualdade de acesso aos beneficios das politicas ptiblicas 0 ofertas de a todos os cidadaos. Ja que o que se tem visto nos programas pacote de servicos ¢ beneficios pré-estabelecidos que sao implantados por todo pais sem levar em consideragio “as diferengas regionais, locais ¢ as reais necessidades dos diferentes grupos familiares ¢ que dependem ainda da capacidade instalada em cada localidade para garantir de fato a oferta dos servicos e beneficios previamente propostos’ (CAVALCANTI, 2007, p. 67) Alguns organismos internacionais, como ressalta Mioto (2004, p. 44), destacam a necessidade da importincia da familia como um lugar onde o individuo busca condig6es materiais de vida, de pertencimento na sociedade, de construgio de identidade etc. Diante de tal perspectiva, percebe-se que foi instaurada uma cultura “assistencialista no Ambito das politicas e dos servicos destinados a dar sustentabilidade & familia como unidade”, em que tais politicas se fundam na premissa da existéncia de dois canais para satisfagao das necessidades dos cidad4os: 0 mercado (via trabalho) e a famflia. Somente quando esses canais falham é que o Estado intervém. Na medida em que for reforcada a concepgao de que a familia deve assumir provimento de bem-estar em detrimento de uma estrutura publica-estatal, estar sendo fortalecido o setor “informal” do “pluralismo de bem-estar”. A diretriz que utiliza a PNAS/2004 com centralidade na familia para concepgio e implementagio de projetos, servigos e beneficios, visando através da assisténcia social garantir a convivéncia familiar e comunitaria, pode, portanto, convergir com a desresponsabilizacéo do Estado conforme a estratégia do pluralismo de bem-estar. Embora, como acima apontado, possa ser considerado um avango a perspectiva matricial da familia presente na politica de assisténcia social, ¢ ma Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva importante destacar que sua incorporagao nao esta alhcia a projetos distintos de protec’o social, e mesmo societdrio. Por isso, a NOB/SUAS, diante das condigées objetivas postas pela dindmica socioeconémica brasileira, ao incorporar a familia como primazia das agdes da assisténcia social parte de uma concepcao “familista” cocrente com 0 modelo neoliberal (CAMPOS; MIOTO, 2003). Portanto, cria-se uma expectativa da capacidade protetora da familia com carter substitutivo e decisivo para acesso aos direitos sociais em lugar da obrigacéo do Estado. Diante do ocultamento dos determinantes sécio- de classe, e das expressdes da histéricos, das determinagées da contradi¢: desigualdade na demanda da assisténcia social, a aten« forma, passa a ser entendida como uma via de superagao das expressdes da questo social, podendo despolitizar © debate sobre as categorias centrais do capitalismo (TEIXEIRA, 2009). Portanto, como demonstrado neste trabalho, infere-se que 0 pouco investimento nos servigos deixa o atendimento social as familias dependente do trabalho voluntirio e do setor informal do pluralismo de bem-estar, como destacado. Tal fato ratifica o carter privatista, coerente com a estratégia da rencializagao, da protegio social brasile Por este prisma, como concluiu Paiva et al. (2009), essa matricialidade sociofamiliar, formulada de maneira quase mégica na politica de assisténcia social brasileira busca reconhecer © grupo familiar como referéncia afetiva e moral. No entanto, extrai as relagdes sociais do contexto histérico, 10 4 familia, de certa as! contraditério € dialético no qual se inserem os sujeitos, ¢ resulta num comportamento conservador da politica social, que deve servir para trabalhar a conduta das familias. Assim sendo, para que se constitua uma politica social que fortalega a familia, é necessdrio que se oferega servicos sociais universais, em quantidade e qualidade, sistematicos e continuados, que garantam direitos. Isso requer uma requalificagio dos recursos dirigidos & oferta dos servigos propostos pela politica de assisténcia social. Portanto, a familia deve ser focada no sentido do potencial que ela apresenta na “construgao de um sistema de protegao social propriamente dito e para que a assisténcia, em particular, possa assumir efetivamente seu carter transversal esua fungio agregadora as demais politicas sociais” (CAVALCANTI, 2007, p. 69) € nao como forma de desresponsabilizar 0 Estado, tornando a protecio social privada e/ou de responsabilidade exclusiva da familia. Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS Outro desafio na implementacao do SUAS esta calcado na cultura EES potirica do pais forcemente centralizadora, confirmada pela NOB/2005. Em outros termos, uma festrigio para a implementagao efetiva do SUAS esta na inyasio da autonomia dos entes federados representados pelos estados ¢ municipios, devido ao caréter centralizador na proposta do SUAS ao recomendar uma padronizagao e regulacao dos servigos socioassistenciais em todo o territério nacional sem favorecer o pacto federativo na diregao de uma gestdo pautada na autonomia partilhada entre as esferas do governo. Portanto, as aces propostas pelo SUAS constituem relacdes hierarquizadas, cuja finalizagao da politica fica restrita ao Ambito municipal. Isso impede a real descentralizagao e municipalizacao da politica de assisténcia social, conduzindo os municfpios a, na pratica, néo conseguir converter os programas e recursos federais em politicas municipais de acordo com as prioridades e demandas locais. Portanto, o SUAS com sua normatizagao atual nao oferece condigées para inovagio na cultura politica centralizadora do pais com vistas ao protagonismo dos entes federado: Por isso, o papel dos estados acaba sendo esvaziado na sua responsabilidade social, se tornando segundo plano no SUAS. Conforme Carvalho (2006), sem uma explicitagéo do papel do estado na condugio da politica de assisténcia social nao ha descentralizagao, nem fortalecimento do pacto federativo. Por isso, ao estado é delegado funcées secundérias que ora assume o papel de operar servigos de alta complexidade, ora atua apenas como capacitador de recursos humanos. Outra dimens4o a ser destacada em relacao 4 efetivagao da PNAS/ SUAS numa perspectiva democratica, refere-se, conforme Sposati (2006, p. 115) sublinha, & exiggéncia de requisitos que 0 ingresso da assisténcia social na condi¢do de politica ptiblica demanda: + ser planejada — 0 que exige 0 conhecimento prévio da realidade através da fun¢gao de vigilancia social, conhecendo demandas ¢ necessidades, construindo metas; * ser orcamentada — 0 que supée o desenvolvimento da tecnologia de orgamentagao na assisténcia social 0 que é muito mais do que definir percentuais de gastos anuais; * — dispor de um quadro de trabalhadores permanentes ¢ capacitados para o exercicio de suas fungéess + desenvolver tecnologia de gestiio democratica e participativa; téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Cassia Pacheco Golvea Antinarelt | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felicio Silva * ser avaliada — 0 que indica a necessidade da discussao dos resultados ede seus indicadores, 0 que é muito mais do que constatar o ntimero de atendimentos dia, més ou ano sem avaliagao do contetido desses atendimentos e da qualidade de respostas que contém. No entanto, cabe ressaltar que para a implementac3o da politica de assisténcia social publica ¢ democratica, o principal empecilho a ser enfrentado é a politica econémica desfavoravel ao financiamento das politicas sociais, na medida em que prioriza 0 pagamento de juros da divida visando o atendimento das necessidades do capital financeiro. Podemos concluir que a busca pela efetivacdo € a reafirmacio da assisténcia social como politica publica de responsabilidade estatal e direito de cidadania é um dos desafios a ser enfrentado para o processo de democratizagio. Neste aspecto, faz--se essencial a retomada do papel dos movimentos sociais ¢ da participagéo das organizagées democriticas da sociedade civil na luta pela defesa da democracia ¢ da cidadania, de uma forma geral, ¢, especificamente, no campo da defesa de politicas sociais ptiblicas universalistas, se se pretende algum avango democratico neste cenario. 5 Conclusdo Conforme vimos, se por um lado a PNAS/SUAS representa um avango democritico da concepgio ¢ do desenho institucional para a operacionalizagao da politica de assisténcia social brasileira, por outro lado, esse avanco esta subordinado a légica neoliberal da politica econémica ¢ da estrutura efetiva da politica de assisténcia social do Governo Lula, baseada nos programas de transferéncia de renda. Dessa forma, a PNAS/SUAS nao possui condig6es objetivas para sua efetivacao. Assim sendo, consideramos que a expressdo da assistencializagao das politicas sociais realiza-se através do Programa Bolsa Familia. Nesse quadro, a implementagio do SUAS nos estados/municipios pode, de forma geral, caminhar em, pelo menos, dois sentidos, opostos entre si: reforgo da dimensao democratica prevista na PNAS/SUAS ou, entao, seguir como estratégia de controle ¢ fiscalizagao dos critérios de elegibilidade e das condicionalidades previstas no PBF e consolidar o “pluralismo de bem- estar” na rea, reiterando a assistencializacao da assisténcia social. Tanto uma possibilidade quanto a outra sofrerao com a auséncia de recursos, ratificando a precarizagao da politica de assisténcia social Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social Politica de Assisténcia Social no contexto neoliberal: desafios da implementacao do SUAS Podemos, entao, afirmar sintetizamente, que os desafios para a GOB efetivacéo do SUAS se apresentam em trés principais dimens6es: a) combinar a luta imediata de implementagao do SUAS (consolidagao do desenho ¢ expansio dos servicos) com a luta por uma politica econémica voltada para © desenvolvimento econdmico com distribuigso de renda e riqueza (luta a ser desencadeada na sociedade civil e nos espacos ptiblicos; conferéncias, conselhos...); b) qualificar, do ponto de vista técnico ¢ politico os atores para enfrentar 0 desafio da luta pela implementacio SUAS, através do reforco de seus aspectos democriticos; ¢, por fim, mas nao menos importante, c) criar metodologias de trabalho socioassistencial, conforme destaca Paiva (2006), que promovam a efetiva participagao da populacao no campo da assisténcia, especificamente, mas que propicie o engajamento da populacao na luta politica mais ampla. $6 assim poderemos contribuir para que a implementagao da PNAS/SUAS caminhe na perspectiva de seu desenho democratico e numa efetiva politica redistributiva. Nesse quadro, o processo social, politico ¢ cultural de implementagao do SUAS nos municipios, a gestéo publica efetivada e a intervengio do assistente social nesse contexto, passam a ter um grande significado na medida em que, dependendo das condigées existentes e da orientacao desenvolvida na intervencio social, pode-se tensionar a implementagio da politica de assisténcia social no sentido de contribuir com a luta pela ampliagao das condigées para que ela se efetive no sentido democratico preconizado pelos pardmetros presentes na PNAS/2004. Assim, a questo que se coloca é: quais as potencialidades da implementagio do SUAS nos municipios em termos de sua gestao, da mobilizacio das organizacGes da sociedade civil e da intervencao profissional do assistente social? Sao estas questes que serao abordadas nas préximas segées. Referéncias ABRAHAMSON, P. Neoliberalismo, pluralismo de bem-estar € configuracao das politicas sociais. In: BOSCHETTI, I. et ali. 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Assim, a administracdo publica, para implementar politicas publicas, no geral, e politicas sociais, especificamente, orientadas para a finalidade de ampliacao de direitos, necessita estar estruturada de forma adequada para atingir 0 fim proposto. ! Professor Adjunto da Faculdade de Servigo Social/UFJR, Doutor em Servigo Social/UFRJ 2 Graduanda em Servigo Social/UFJE, Bolsista de Iniciagao Cientifica. Gestao do SUAS em Juiz d a: andlise da estrutura burocratica Portanto, considerando essa perspectiva, cabe indicar que a GB possibilidade de pensarmos a ampliagio de direitos sociais, via politi sociais, inserida no proceso de actimulo de forgas para construgao de uma sociedade emancipada, implica, também, a possibilidade de concebermos a questo da administracio de tais politicas no campo do fortalecimento do processo de democratizagao. Dessa forma, partimos da concepgao que para desenvolver uma “gestao publica” voltada para efetivar a expansao de direitos sociais, apesar de nao ser suficiente, nao podemos prescindir de um Estado forte na 4rea social ¢ burocracia estruturada, principalmente na dimensao de sua racionalidade (SOUZA FILHO, 2011). No entanto, a estruturagéo de um Estado com fim voltado para a universalizagao de direitos e, em consequéncia, uma ordem administrativa burocratica que efetive essa finalidade, depende da existéncia, na sociedade, de uma hegemonia nessa direcdo. Sendo assim, em ultima instancia, as determinag6es para uma efetiva reforma democritica da administracio estio localizadas no tipo de formagio social do capitalismo brasileiro e em nossa estrutura de dominagao, portanto, nao seréo medidas técnicas que irdo transformar a ordem administrativa brasileira. E, na medida em que no foi gestada uma saida democritica para accrise dos anos 1980, a reforma administrativa sofre os constrangimentos da opcio neoliberal da politica econédmica e social adotada a partir da década de 1990. Assim, a possibilidade de atuacdo, visando mudangas administrativas numa perspectiva democratica, restringe-se. Antes de concluirmos a perspectiva de anilise proposta, convém explicitarmos, brevemente, como interpretamos a dinamica de desenvolvimento da administracao ptiblica brasileira. 1.2 Géneseedesenvolvimento da administragao publica brasileira © patrimonialismo, a partir da origem ibérica ¢ centralizadora (FAORO, 2004), combina-se com a estrutura “patriarcal” colonial (PRADO JUNIOR, 1981), fortalecendo essa Iégica de dominacao tanto a partir da superestrutura estatal, quanto da organizagio do poder local. A nedfita burocracia brasileira sera desenvolvidaa partir da necessidade de especializacio e racionalidade instrumental capitalista, porém, evitando a impessoalidade ma Unico de téncia Social, Organizacdes da Sociedade Civil e Servico Social Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira como critério para a composicao de scus quadros, reforcando, dessa feita, a logica patrimonialista de recrutamento baseada na lealdade pesso Esse amdlgama ¢ consolidado na Republica Velha, através da organizacio politica descentralizada e da auséncia de participagio das classes subalternas na estrutura de poder, para viabilizar 0 projeto nacional da economia agroexportadora capitalista, conduzido pelas oligarquias agrérias, sob hegemonia da oligarquia cafeeira paulista. Esse & 0 cendrio que se inicia na Independencia, consolida-se com a Proclamagao da Repiblica ¢ encontra seu esgotamento no final da Reptiblica Velha, quando entra em crise a economia exportadora capitalista e a hegemonia da oligarquia cafeeira, 0 que projeta um novo objetivo politico: a industrializagao ¢ urbanizagao do pais. Assim sendo, no contexto do projeto desenvolvimentista de expansio capitalista, Fiori (1995, p. 27) apresenta uma sintese consistente sobre o ordenamento estatal ¢ sua ordem administrativa: O Estado, mormente o scu setor produtivo ¢ financeiro, estabelece 0 corporativa com o empresariado nacional, protegendo seu lucro relativo, aumentando o potencial de acumulagao e absorvendo o custo desta io. A administracdo piiblica, através de suas agéncias previdencidrias € miiltiplas instancias administrativas, dispensa servicos sociais ¢ cria vinculos empregaticios absorvendo, na dinamica estatal, parcelas cada vez maiores da populacao economicamente ativa. Com a negociacio salarial dos pélos mais dinamicos da indtistria, processava-se, de forma individualizada em acordos de empresas, 0s conflitos salariais ¢ redistributivos, que perdiam seu potencial politico; ou melhor: tinham limitado 0 potencial de difusio, o que, por sua vez, permitia que as atividades de bem-estar do Estado se processassem clientelisticamente, embora sem o vigor das negociagées corporativas. Para completar esse quadro, lembremos que 0 projeto de expansio capitalista, de sua fase restringida até a consolidagao monopélica, orientou-se sob o signo da “dupla articulagio” (FERNANDES, 1981) e da incorporacio seletiva ¢ parcial das camadas populares. Portanto, a relagio arcaico-moderno aparece também na configuracio do Estado brasileiro ¢ da sua diregao politica, assim como na estruturagao de sua maquina estatal. Sendo assim, a configuracio do Estado ¢ de sua maquina publica vo expressar essa hegemonia. Do ponto de vista do Estado, as classes dominantes (agrario © industrial) garantirio a reprodugio da ordem, incorporando Sistema Unico de Assisténcia Social, Organizacées da Sociedade Civil e Servico Social

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