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4) AESTORIA || DOSEVERNO Compight Antonio ta Cosa Cima ‘Narellan Meneces Revie: Marie L. Faveet ‘Vidor R. Shahars Indice Proficio— Silvie 7. M. Lane Prélogo «| LLisro T SEVERINO Capituto 1. ‘Onde se ouve a personagem do poema tentando, dizer quemé re Capituio 2, No. qual se observa a mesma personayem nto iais tentando dizer quem & mas atuando para encontrar vida e, nesta empreitada, chegando a se ‘dentificar como moribundo ..+.2.ye2ee0e+s Capituto 3, Que discute, no final, a possibilidade de ter a mesma persenagem encontrade condigies para se ientificar como ser humano, por causa de um frupo que festojaum naseimento .....+ uitorabresiienses 2. 1 gee im, 160 123 sin pau - 9 fone B11) 2011802 tle 1 S371 DBLM 8 Livro HI SEVERINA aphinio 1. [No qual inicia seu relato autobiogritico uma per- sonagem real (chamada aqui Severina, apesar do seu nome verdadeiro ser outro), nascida numa palhoga no serlio baianovonde viveu até os 11 anos, quaindo se mudou para a antiga rua dos Os- 808, 6m SaWAdOE eevee sens ie Capitudo 2. ‘Que relata o inicio da peregrinagao de Severina, ineluindo o vO0 no gavito-de-prata, e que tam bbém conta como ela, sendo jogada de um lado para o outro, vai se ransformando ma vingadora ue busea poder 2.1... Capitulo 3. ‘Onde continua o relato da peregrinacao de Severi- na, que tenta fugir de Exu, e nessa tentativa en contra um noivo eom quem se easa i Capétuto Em que ¢ interrompida a narrativa da peregrina- ‘io de Severina para uma reflexio, depois do que ‘oltamos & historia na época do seu noivado .... Capitulo 5. Da loucnra (1 parte) Capteuto 6 Daloucora (2 parte) a a Capitulo 7 ‘Que conta como Severina tenta suir do zero: um. ‘outro onto. a Capitulo 8. On se¥é um moleaue podendo ser moloquse por isso deixando de ser moleave 86 Capituto 9. Em que inesperadamente surge uma manicure na, vida de Soverina - 98 Gapituto 10, Em que Severina encontra uma desconhecida atta vésde quem conhece uma organizagao budisia .. 97 Capttulo 1. ‘Que conta conio Severina Be a organizacdo bu inte prova para desis ale pena ngressar na mesina ies ~~ 103 Copteuto 12. ‘Que discute « possibilidade de ter Severina encon- trado condighes para se identificar como ser hu ‘mano, por causa de um grupo onde € Hata, de- pois de tersido Komi-ed vssevsss+s +e ~ 108: Capitulo 13, ‘Onde Severina fornece evidencias que ela nio é mais ela, mas outra pessoa que Gelamesma .... 113 Capleuto 14. Em que a histéria nfo termina e poderia ser um capitulo chamado "A Morte e a Vida de Seve tina” 1 8 Lino II 1DENTIDADE Introduce Onde o autor se drige pessoalmente ao leitor para Jemibsar algo dito na “Prelicia” e para pedir des- ealpas pelo que sever Capituto 1 (Que fala de identidade coma trago estiticn do sor, fap mesmo tempo que prope « forma Persona: gem como expressio empirica da ideatidade .-.. Capitulo 2. Que mosira a forma Personagem socessivamente como tés objets diferentes, econtinua a falar s0- bre identidade, agora como algo contraditorio: igual diferente; essénciae aparéncia, Capito 3, (ue continua a falar de iene, agora come mmetamorfose Capiuto 4. (Que abre um longo paréntesis para esclarecer a+ ‘Bums questoes que sio apresentadas.. Capituto Que, para encaminhar a discussdo da nto meta smotios, fala de personagens, autores. atores. Capitulo 6. ‘Onde se afirma que a aparéncia de nlo transfor- muagao resulta do trabalho da re-posicio 125 * ML + 7 ASTOR Do SEVERINO E &HISFORADASEYERINA Caplinto 7, No qual se ufirma que cada um érepresentante de si mesmo, o que traz eonseqdéncias pars o re: presentado « cs 169 Caputo 8. ‘Que mostra 6 triplice sentido da atividade repre- sentar sees 174 Capito 9, (Que arescnta xclreimentos para preven gumas armadilas eevias MEB Capito 10. Onis consderada a categoria Conscinai (in vertida somo inconsciente) . 189 Capieuto 1 ‘Onde a identidade aparece como eenerelo ¢ came possibilidade ....-.-, = 197 Capitulo 12 Que pBe como questio a idensidade humana .... 202 Capinuto 13, [No qual se buscum elementos no desenvolvimento do individuo para entender interesse da razdo 211 Capitulo 14. No qual so buscam elementos no desenvolvimento ) Traum tipo decrise que dava em mim, de acesso ce tucura,qualguer cts no Ba Severina-de-hoje falando da Severina-de-on- ‘tom; a primeira & quem dé esta explicagto (acesso de toucura); a segunda & quem tinha visses que eram ver dadeiras. De que explicacies esta dispunha? A mej fora morta de feitipo; agora, ela 6 quem cortia perigo: Achays que ia morrer,€ légieo: tudo pra mim era cok sa feita, era macumba, ora feitigo, que at pessoas iam pra mim. (O suporte social que garantia ser verdadeira a ex- plicagio ela o encontra na lembranga das afirmagdes feitas pelos vizinhos em sua terra natal, quando a mae morreu; agora, era reafirmado pelas meninas da per sto: ‘As meninas achavar que eu tinha eneosto, que eu t= the as coisas, que eu linha isso, que eu tinha agullo outro (uma delas) me levou la no centro esprit.) Cade ver mais diriam que era eacosto que eu te nha (.) que et tinha que deseavolver (.) quo eu ti ‘nha um danado de urn Eu, que eu tina um no sei ‘quem era outro I.) Se & verdade que feitigas sto reais, fica explicada € aceitivel a dificuldade que Severina esta tendo de coneretizar seu projeto de vinganga: as outras pessoas E que impedem-na, graces a essa coisa poderosa que é ofeitico. Parece bastante razofvel admitirmos que, frente 8 dificuldade objetiva de conseguir o poder de que no- ccessita para realizar seu projeto de vinganca, em vez de abandoné-lo — o que implicaria profunda transfor- ‘acto da identidade que construira — prefere aban- donara realidade. “Mas, a realidade muitas vezes & mals surpreen- dente do gue imaginamos ‘mes marge ecole coma? No cent cap fh Gomes ire depos» gente comexou mages PP cinco anor de aamioro © mined ord tudo em se rn Stina Se io pret aoa na eallade ue me, ou carn, ghee det ana ta verde thse (pram lee uo, era ca aera meri, Sra muons sew cera 8 Gia Co) at dese enc a le ot Beane com. ie ‘ton mento, por ly sabe ges et 8S “han oa fmt mk ha ava com de preci a ere mes, anit ‘itl cals arate ue ieee nr Ce} Tu aieitann mle pament le ie eo ta fol nea pesos sue ex ace qe com, av ‘Shes er atvna de tnd, ea pom ae eh ae ‘fidget eee fra era pera: naa ex ‘ata ments ie pain De repente, a realidade que se mostrave to host ‘Severin — a ponto de ela comecar inconscientemente ‘use evadir da mesma — muda surpreendentemente: ‘encontra wm fapaz com quem durante cinco anos tem ‘um namoro e wim noivado perfeitos. Nao falta o final feliz: easam-se, de papel passado © na igreja, com as ‘bengios dos pais do marido. Ele é instruido (pra mim ele eva destor: tinh ginasial completo) e esti empre- fgtdo (era soldado, com fungio de datilografo © taqui- ‘rafo, num tribunal militar). ‘Uma altermativa de mudanga de identidade dese- jada por muitas moras — até mesmo de classe média ‘com farnilia — set eepos direitinho! Curiosamente, no se pereebe neninuma evidéneia ide que Severina desejasse isso antes. Apenas tinha ido ‘a0 centro ospiriia por causa dos Teitigos, dos oncostos (un danado de wm Ex), buscar ajuda desenvolver).. i" Tada 0 que declarara até entéo fora trabalhac, ficar rica, adquirir poder, voltar para sua terra e vin- arse: a vingadoral Eis que temos Severina casada, dona. ‘em um ano, mae de um menino. Tronias do destino... ou de Deus... ou do diabo. dona-de-easa, mae, tudo Capitulo 4 EM QUE BINTERROMPIDA A. NARRATIVADA PEREGRINACAO DE SEVERINA. PARA UMA REFLEXAO, DEPOIS ‘DO QUE VOLTAMOS A HISTORIA NA EPOCA DO SEU ‘NOIVADO [Atk os vinte © poucos anos, a histbria de Sev rina, sob a aparéncia de uma grande diversidade © iedade de situacdes © episédios, é relativamente ho- fmogenea ¢ repeiitiva; & possivel perceber com. certo frau de nitider o desenvolvimento de sua identicade, ‘Que € mantida por uma contradieio até ento nao su perada. Na inflineia-que-nio-teve configura-se a escrava~ revoltada, que constitui o que chamou de seu aticerce, fieviodo de vida-que-nfo-fol-vivida. Assinala 0 comego Ge sna vide — sua pereprinagdo — gnando entra na ‘ndolescencia como bicho-do-mato, que logo se most ‘icho-humane quando comega a entender e dar signi- fioado a sua exstncia. Isto ok i ca. Into a tern a seidentfca, en- 'f0, como vingadora-briguenta, eo mesmo tempo que se descobre fiha-de-ringuém, Propese treba: thar muito para conseguie poder © conctetizar wou pro eto de vngungs, meso sentndo-sejogada de rn a do par oui, evendoimpedidas outs alteroaras cident dace ou eserara que Ihe tmpoemy, ou ving dora. (gue desea vr a Ser). Ambas se optein ¢ gam. a Nao conseaue superar e night OPER NUDE exe conrad, nem ei Pode-se entender que aos vnte © idade comega a esmorecer, As ah oo paar ae come camatete, Av alcinast aca A histria se complica sun ientdade porde si ‘Deum lado,» vingadora pen : manece apenas como ‘some, No conerta seu prjeto per fain de mdigoes objelivas; € um projeto alimentado apenas Pele Seu desea ¢ sabres Comyreatdadepuramcmie subjetiva, um imagin4rio individual a _bletva, um inabadr nddl, qe no compar: De owtro lade, a esr 8 excrava sempre se concretizando ¢ se-reprodusinds em eadn montento ds sua Pete hacia despelto de seu esforgo ede sua vontade eth fugit dessa condigto, Objetivamente, esta € 2 Teal dade que se materialize nes suas relgbes sciae ~# [Come eierava que é, sent so revolted por nto onseguis transformase! em vingadora: impotente Sin ple gto tod 7 “Ao mesmo tempo, esses dais eomponentes con- leaditorios de sua identidads se desemvolvem. ‘Avvingadora como que se recolhe cada vez mais para um ‘undo imagindrio, onde ela continua bet AESTORIA BOSEVERINOEA RIsTOWA DA.SEVERINA {gando e Jutando — j& nko mais com as pessons. ae fom ela interagem — mas com seus fantasies inle- ores. As alucinagdes sto percebidas como sintoinas Da encosto; seu mando imagindrio adquire stats 3 Mealidade aobrenatural, realidade que ¢ legitimada < Confirmada pelos membros do centro espirita, que asam a exploré-la (segundo sua visio retrospective), ‘Reduzitia novamente A con digho de eserava explo ada, pensa ter encontrado uma saida, uma alters Pier ne noivade. Cria tuma realidade inter-subjetiva- mente compartiihada apenas com o noivo, um smundo {Guase celestial. Prepara-se para ser esposa/dont-de- Cusa/ mle. Objetiva esta nova identidade com o cus rento: esta nova realidade j& n8o € apenas inter-sub- fis, sua concretizacio se dA pela insergao dessas ie Theses no nmundo objetivo da Sociedade de classes em sque vive, cade ocupa — assim como seu marido — ita poxigso praticamente marginal. A totalidacle so- ‘cial se impee decisivamente. ‘0 casamento se revela uma nova forma de escra: oe a marido encerna a violdacia © a exploracdi elagdes a que esta submnetidn e que caracter Fr eaviedade, Ooivade foi Apenas usta pausa, ane fobriu com o véu da flusio uma realidnde que resstrae lis forte ap6s ocasamento. ‘Para perccbermos melhor esta evoluglo, aqui an Jecipada, voltemos i narrative que Severina faz de sua vida. “aig do que jé foi dito dobre os cineo anos que “girou o rolvado, que mais podemes saber? esses cinco anos continue com v contro esiritae as Skis ruins ape aeomtecendo: os pestelas,semere eo saa AT ain |A1S¥OKINDOSEVERINOE ANISIORIADASEVERINA 2 Aina ox pesados.) cada vee mat ddam que e sso ac dna ls fata) tad Sera ‘14a, Ge ram, eu tins em mim, cies alte Se ‘eu acreditava, acreditaval ee Sarat do centro, alimentos, sr por les tratada € ad Relrospectvamente, a Seveina-de-hole dit que fru bobs mas cries ro na Spon sce 9 relato que Severna far dese perlodo de sua fot ore bobe Era, donor luce. ia comparativamonte potas da nforeneoe nee ta sondgtedelatida mascara sa condlgto de thins Ba impracto dense sear fue como aus cocapmua a vingadors-brguani. da vingadora-briguenta, que acaba " [ludida ndos8 pelos caras do centro — nem prin- mas de eseravidio. Imente — mas basicamente iludida com um novo © santieade ue fs (do cenro esprit) ava is vidas que er aor espota‘dona-decaen? 4 sc somportamentotorniva rab vere ean F Uinprjels ©, ne aie ness como a Besadelog/ 6 no ala male rete Tas es Mineadors, sm projeto que, parce alo junto encosto. E uma realidade socialimente compartihase noire e junto com ele. esper Que dava sentido a0 que aconteci 1 asi Isso inclusive determina um novo arranjo no set ree: ‘Que eu tinha que ir, que tinha que iteaioniar: todo sébado, toda sexte: todo vanatn Tiudida por atguém que também estava dudido, & Sa ears sone oe eans cee eee Franca Se | eee eee is Somer tnt ot ts es ra dat oe ic: era agueta coisa maravidhora que tinha entre ditara mesmo.) agents comprava ae falsas elvis . Emora real a maravilhosa rlagie no noivado, Broncars do cer; meu soo er presidente doco fou desenvolvimento desvela sua base tus6ria. (bert dip eaves eh aque nto confi con uatmtiade fi embacada: oa oa ae jue nie confiava em ninguém, nem a ninguém obe- ‘mento cra uma coisi simples! E, outra coisa (...) eu deca, véae dade pelo nao, om chen eae ee ee Dinmont: ela que queria gather Gait eee Peartees wat ais egie wat ob cam, lca seu peje de vngance ¢inaisa erate Fe et dormir.) nite, quand ol ol smn sinha so run miaba casa, fot dal pasch gue de snes © casamento:aier dizer que leva com ce pebloe thas dentro de asa, que la gintara cle aeic ee Cantar une ss to gure — et ata made qu alr opal dentg de eae no dave dinheira,auer dizer ef pl es me east ‘at, udiavam del, julavam moda de de: cparea ‘in ee: ent.) ele dit ain: etna hora ces Tye a dl) se tuo a ele ave quera tr iterate, ev nde pou ot tender owe fo) © ‘sentido do noivado, supostamente © mesmo ara ambos, ma verdad ea dierent pars cada ban Ett, nto hava urs projeto comin: Bal seu carktet is6rio, dai « frustragio. a ‘Ai mudou tudo, porque 0 que 26s den Yivernos dentro de ‘ingo anes... depais dois anos fol de afer, Se, de slgama forma, pode ser um pouco surpre- endente que tum noivado cefetil evolu para um sazamento infernal, 9 que nfo € nem um povco sur preendonie € que, tendo deteriorade, leuk dorado apenas dols anes. Na verdade, duro mute. Severina jt advertirao nino: Eu conte! pra ele minha hist 7 i histbria, a minha vida, Sie tassel com meu pai e com eninha mae'e et Semore dae p(s vd me cme 39 0 aplentar mem vin forgo gus mina ads nuene {ou home nova fazer comigns ve meu pat com minha mie. > said ‘Bra a yingadora-briguenta, encapsulada dentro Jesorava/noiva-submissa-e-hidida, que avisava, Foi vo. 0 que eu aranhel desse earn nao fol botinho no! Eu fantel nia! Ele batia tink eabera no chio, como Stbate um ceco, tune, tuic, func, tunel Tae voltara, {ne voltava (-0 ma catumiava (.-) Qual o motivo? A. falta das coisas donero de casa, eu mo pedis abrir 8 ‘boca, Eu pesia « dentro:de easa o que € que entrava? Era o meu dinheiro, poraue o-dinhelro que ele hays, te ele genhava aiguma coisa, entRo cle acom- Danhava‘os outros, gastave tudo () Farrista(...) na Gera pings: acho que era o toxico, poraue els tntar Comigo (.) ele era alto, ce era forte (..) ele era da Guvataria (das poiciasespeciats, ele era forte, era lade, era enorme, daquclas patruthas (..) ¢ ee tue fina cotaigo! Nawueia Spocn quanto que eu pesura? 45 {dito ele hitava comigo como se lutasse com am ho- tom ele me massacrava (...)eu enfrentava esaia toda Guebrada (..) com s eabega deste tamanho, boea do {nmantio de im bonde, «ou enfrentaval -Severina resume aqui dois anos de easamento. No nade daha mudado: eserava, explorada ¢ vio- jowada Hiteralmente de um lado para 0 outro, | briguenta, insubmissa. Sus reacko, nova- Ne, €de bieho acuado, de animal que se sente pre~ ‘iutna armadilha, ameagado de morter. Contudo, ela nfo acusa © marido de tla engi ; mentinde e oeultanda, come um carrasco dis- Jo. Nao, este & 0 cariter da ilusto reciproca com Ne pode caracterizar a fase do noivado. AKTOMODACOsTA CAMP ‘Como que pode uma pessoa. um ser humanoter duas, Dorae eu digo, ele foi das peronagens, dots sercs fm um Ser $6, numa pessoa (..) ¢ a transtormacto ele.) talve ele easou comigo e no ors iv ste ste aerin ent era um modo dle Hira th, Capitulo 5 DALOUCURA (SPARTE) Severina conta que seu marido foi duas perso- nagens, dois seres em um s6 ser, que sofreu ums gra~ {le eransformacdo, © noivo divino metamorfoseia-se ‘em marido diabSlieo, Concomitantemente, as relagbes atre ambos se transformam. Concomitantemente, a Ydentidade de Severina sofre madangas, mudangas. ‘nesperadas para ela ise casamento xa meu ideal, inka vidas al en ima~ ignava ter win mazigo, ui iri (..) porave est cer- {ou uke tinha preparo, mes eu Densava que ne me ‘Sanmonto ora o fis do mew sofeimento; mas dal é (que comegou men sofrimente: dobrou(.. Severina recorda af o projeto que acalentou nos Jinco anos de noivado celestial, Nessa época sua escra- Sido se fornara mais suave. At mesmo no trabalho tnelhorava. Ainda noiva, arranja empregoem um hos: Pita; jd no & mais casa por casa. A eseravidao da do- ‘méstica suaviza-see 6escamoteada por um trabalho 45- Salariado com registro em eartetra, previdneia sovial, tee, Tanto que puders montar o quartinko com tude 0 ue precisava, tanto que puders comprar 4s coises roscaras do centro. A medida que sua situaco evondimica methora pode ser mais roubada, mais explorada. No Tundo, festa €a dinica explicagto que encoatra para o ncivo fer casaddo com ela, em especial para a antecipagao de seu casamento. Mas isto & a Severinaedechoje falando. A Sevetina-de-ontem casa-se achando que era o fim do ‘meu sufrimento, ‘Quando ex estava com 3.08 4 meses de gravider, quase Deraio (fhe), do chute cue ele (marie) me dee ele ‘me Jogou na parede. Ev ful pro hospitel (em auc et ava emprepada) trabsihar tnds arrebentace de pam ada que eu tints levado porque (ele achava que) 0 Fiho néo era dele (..) Foi dal pra cd que as cous depois comeearam a acantecor comige, es negteio dedesequilforio © fato casual de ester empregada num hospital ‘acaba sendo um fato extremamente relevante para o desenvolvimento de sua histéeia, com pelo menos ums implicagio altamente significative para sua identi. dade: os sintomas que antes eram interpretados como encosto vie sos vistos medicamente, Estive para perder o (litho) estaya ruin, rim, maim os codgos ave ea’am da hemorragia cram ouor, mes (..) chamaram ele (tnaride) porgue queriam fa ‘apr curetagem; ai ele disse que poderia aver (41) eu edia parao (médieo), pedia que eu queria mew fhe, secu nfo queria perder mes fhe (.) fiz uma 60- SASS omen fe nscense(-) fo al prnch que eu inute “porque ea levante da can, piel 0 p60 ‘Shosecsent a mesma cosa que cu chesar aqui na Serta, par agua aa woe paola ave ave ape pemorvena ent chnarem ce (arise) Inti is dns que squo ule que tina me jen satete pra baboon casa, porto tina ado da ‘nj, queen ra loves eto ftp dane de cam agai de le dss Gur eww loca 25 fu que ou comose aso watarento 0th jiatem ave wabalher a ica ‘Ao mesmo tempo que recebe assistincia mé par evita oaborto Viguel meses de epouso), comes Rreceber tratamento psiguiétrice. Informa que algum tempo depois uc com os nero tudo, desmolengsdos f sual Benen cadets ders, ae volta, ine vO Era, porque we puns pe su ato agente, ‘Stuur ou demuteta ou na cadelr de rodas. Doi me- Meet gual nteoada, Ar minha carts pula... Rec purlia que co tba bia; eu flava C.) ef $08 Rishees tao mlahoes, tenho bicho, tenho bie Shy mhas cares puma tino, do, toa she Col sabe la quando a ente math el We el ite plano.) agen (3 meso epee de Meek fisnegucbuchando, eno, peu corpo inte, Wd pcour cbslude pura.) te negoto Ge ino isos es sie, also Room pra. ‘O bicho-acuadocsté feride quase mortalmental Eseebucha, a5 cames pulam, a forea dos mem- ‘bros desaparece. uma reagdo praticamente animal de sobreviver epreservaraeris. Sobrevivel A erla também! obicho-humano? Antes, de solicit, tinha aquetes problemas (..) dee pists, que tina encoste que tomo conta de mim C.jmem pensavaem loucuta(..) ol deol isso, ue cle (marido falou que eu ert iouca, tlou pros ted. {608 que eu era loca (.) 08 méicnssereditaram () eenacraditel (Jv ¢ que, & duro, ogo, ne, como ‘ate pode, o que que éa menie da gente.) ele inven tou, pra encobrir a surra(..) dal ev fiqde loves, E fiquel!(.) Quem ofhava pra mim pargela gue eu uma tei, llé mesmo; eu andava coma uma tonta, ‘uma bra, e como que as pessoas consequent, ne! Ele fez minhasfiehas, ee.) felon pra tode mundo que few era doida, que eu estava fovea (..) Por pouco que eu nfo estava em Franco da Rocha; eu mio estou s 20 Agradeco a iso e tenho muita graidan a0 (amédic, ‘dono do hospital em que trabathava)(.-) aavelas pes Soas me ajudaram multe, ajudaram muito. O (Gono ‘do hospital) depois que ficou sahende do ticu probie ‘ma comecou a aludar a mim, pela menos nestas p= ies. Ent, quando ee (marido) chegou lé com ar has prontas pra me internat — nose com ele con- Seat — s0estaa faltando a porua(.-)entéo.o{ dons Ado hospital disso que nto; que eu ni sala dal nao, ‘estivesse com problemas (1) eu ia set cu ‘dada 1, iam me encaminhar pro INDS (.) mas pe ‘ante ele (marido) eu era uma Touch © et acreditaya, comoeu acreditaral Uma nova identidade: louca, dosnte mental. Se ‘Bo a morte bioldgiea, entdo a morte simbslical ASTORIA Do SEVERNNO 4 HISTORIA DASEVERNA 71 A Severina de-boje monhece que fa salva pelo patito, o melico dono do howptal sade tabalbara. Bias, Severin ce-ontem etediaea que ea doeale menial, Com Gniase tlrmat.e dal eu fiquel lowes. E Frew Tdomtitiaae como loves lvcal “Tudo far seni. Osigficadosocalmente com partlhado define, expia, eglina srealldade ea ova aenidade mundo Scvering estavasondo tratads no centro esis o nove confirma o enon, Agora tage Som spa, mada confirma a Govaga scala. cla sempre aceditando, E agindo como tll A reall dade sinilca vendo produsidn tcialmente. Como Sfrmaraloveurn num centr espiata? Como afimar Sencosto mum hospi? Toucuray desrwigto simbilca, Transformacto digo Capitulo 6 DALOUCURA (Q2 PARTE) © tratamento médico salva Severine da morte q biolnea © da morte sinbole,Sobram sede q Com 0 parto hem siccide the & outorgada ientidace dorado: aposar dos pesares 6 era spose: Endo, sinha também que sr dona-de-casa, para com: figurar inleraimente © padedo do identtiade fem nina: espost/dona-decata/inie. Além disso, mam tinhs 0 empreg no hospital; era ume trabathadara também, A eseraidao tomara formas tio raradas € sutis que petmanecia velada. A vngadora continua encapsulada, comprimida. Advertira 0 noive antes do casamento que sito ggucntai nem tre ae minha re aged, omoa mie sofreu muito, provavelmente est ainda nao se completara, " uo! Insist em fer um lar. Ete, el, fo recém-nas- ABSTONDA BO SEVEKINO HA ISTORIA>DASEVERDA 73 “Umm quotidiano que reproduz a violéncia, « ex: Senlouguecimento, Com aguetes problemas dentro de casa, dole nto pa tars dividas, nto pagar nada, 0 dinhetro que entrava {Er sb.0 meu ¢ era muio pouee: eno ele queria que “susalse por divine forea do hospital...) descobei que fstava havendo elacionamento (sexnal) entre ele ela (inoga que Severina empregara para enidar do filha “enguautoteabsthava), a ot onde comecou as encren- {is (1) digo: nfo di mais (..) arramel uma sonora fe idade pra ficarla(..) af que virou bagunga mesmo {n,)e ele at enerencando comiga, judiands do mim (2) batendo em mim, me caluniando, me toeaiando na porte do hospital, dizende que ew tinha amantes, us.eu tisha isso, queen tinha agile outro (..) Aza trinava tango quo As tenes oa achava que tinha ame tel.) ‘Ainda tem crises intermitentes; as vezes vai tra sno hospital, as vezes fica intemada. De qual f forma, esti mais fortalecida. Afinal, 0 bicho- ferido quase mortalmente sobrovivera: 6 pre euidar do filhote B-surrada, mas enfrenta omarido. (.)ontaoa revolt continuous 8 nao tina dois pra Imatar; ev daha res meu marido:j£tinba mais um hlista nee. A revolta da escrava desperta a vingadora-bri- ita, Mas, como anteriormente, a vinganca € desejo inlo se eoncretiza; permanece fantasi Prefere agir de acordo com sua identidade fer ‘nina convencional e pede « ajuda do sogro. Este in- trfere a favor da Severina, Ficou assim, do menino ir pra li (casa do sogro) até nnormalizar vida da gente (.) onto eu fale pra ele {Gao mas eu vou junto, pelo menos uns 15 dias, porgue Oprimeirfilhoe duro agente detsar, ja ponsou sepa rar? (12) Entao en aria toc om dia ia pra (eas sosro) um dia. ea yinka pra (casa dela) ..) al quand ‘hhezava na casa (6488 do sogro) estava.o maior baavé (Go) a8 maiores confustes (..) no dia seguinte (uma Vizinha)(.) fl correndo no meu servigo edise: done Severina vai It que (seu maride) est vendendo tudo 0 {que € da senhora, esté acabande do 0 que tam dex- tro da sua casa, acabando com tudo.) Novamente vai pedir socorre ao sogro, em cuja ceasa acaha encontrando 0 marido. (2 foi quando cle rato ‘certo ns certiddo, né,rasgou Deialhe? Ou ato prenhe de significado simbitico? © marido parece simietizar nesse ato aparente ‘mente toloe indeuo toda sua intencio: destruir a iden- le de Severina, Note-ve que faz iss0 em seguida a0 que uma vizinha deserevera como esta acabando com tudo (0 que é dela, « que tem dentro da casa) Té que os médicos do hospital haviam anterior mente frustrado sua tentativa de destruir Severina, tenta denove, ‘Tinha pesado o menine (filo) © tne saide (9 for am pegat ele no mercadinho com a erianes. A EsrGRJA D0 SEVERIND A HISTORIA DASEVERINA, 78 Severina sem fitho deixatia de ser mie... Falou pro meu sogro que nfo era praen entrar mals 6 (casado casa): disse que era pra eu entreyar chave; ‘ques, porgue queria achave da casa. Soverina sem casa deixa de ser dona-de-case. Dai meu sowro diz, d& Severina, dessa have. Severina sem marido jé milo € esposa... Eta no outro dia pra mim i (na casa do easal) bus aro reso da minha roupa (..) Fui, quando ebegust 1(..Jentramos no covredor (acompanbada de umes ‘Sal vzinfio ao qual pediu ajuda) ele veio pra me agar- far(._)0vzinho) se atracou com ele.) sal.) pa {rembora (.) vet a (outra Vainha) correndo: dana Severe, voi ld, vail, val correndo, weuda, ee esti tacando finga om tudo gue é da senhora a ele 2eabov mesmo (.) taco foga em todo () eu fiquel x com Elgumas Foupas que tina 94 easa do meu sogro © ‘gue eu estava yestindo no corpo, fiquel sem naa.) {odo mundo die que aqucle Alcool mao era prt tecar Togo nagullo, cle i tocar fogo em mim (..) come ele into conseguiu, ele queimo minhas colts, ai que d fou mesmo, af ave asabou com tudo mesmo...) alee ‘miu sel ese.) mae nests alfuras eu jh estou no fuse da... cols, né, porave af eu jf no trabahava ‘nas, et ahalhava uma semans, uma semana es fe ‘Cova internada; en teabalhava ura semana, wie sé mana eu Bevainternadas (1) onl eciconiara tle me espancera, na époea cu andava como um bie Fula © am casa do meu Sogro (..) af eu figuel im ano smorando na casa do mew sogrs(..) 0 (meu marido) for even, por pove, tris me dorado complet: De fato, quase a destruiu completamente. Desde ‘quando comeca sua peregrinaeao, Severina tem tra batho como missio, vendo-o como meio para poder realizar seu projeto de vinganca. Na sua histéria, des ea jnffineia-que-nao-teve, o trabalho é uma presenga cconstante. Foi af que, quando ew ao tha mais eondicao de tre bbathar —e flcando Internada,e fleando internada — {fo} quando me puseram na esinn (INPS), mie encosta ‘om ma ealva; me eneostaram a calaa ¢ ou fuel ha caita,e com que eu ia viver? Nao mais trabathadora, ela que antes dos 11 anos jf madrugava para encher de égua os barrieaes os fazendeitos, a endeia cujo trabalho era poe ae Escrava-encestada, inti, inudizada. Os médicos a salvaram de morte. Continuar cul dando dela talvea sea diffell, talvex soja wantiecond- ‘mico, Dentro da racionalidade capitalista a melhor $0- lugdo é aposcutié-la; final, trata-se apenas de uma es- cerava inutilizadal © riseo de tornar-se uma doente mental crOnica & inevitivel para uma escrava imutli- zada. Dane-sel J4 foi salva uma ver quando @ pro- blema era agudo. Sade 6 uma mereadoria muito ca +4, dispensdvel para uma escrava. "Nem mesmo eserava consegue mais set! Que resta? ‘Ser mae; sim, ainda havia filha, | ESTOMA ROSEVERINO EAHISTORIA DA SEVERNA 77 esse entremeio, cle (marido) comegou a azuerinar ‘ini sogra, pra tinkiasogra peenr a tutels do me iso, Ele queta: porgue eu no sala com © merino, @2 ‘ado podia sair com © menino: eu sala com o menino © (Gunndo evcontrava com ele, fazia au volar pra casa © Sntrepar menino outra vet, devalver o menine. NEO posia sar com o menino de especie alguma de dentro Berens (Mew sogro mais moderado (..) Mina Soera cava festigando(..) leva do lao dele, Léxico (C5 Um dia meu sogro fl eomign no Julzada (de Me- Sores) e ele (aide) fo junto (.) mak eu fol porave tics son diss names Severina porgue precttames 7e- olver ata couse direta, pravero quo a gente vai fazer ey tnas ua falow naa de tutela, que ev tinh que Sir actela'do retin pra ele (souro) (..) quando ‘hegou la abt enn tudo que podia tmaginar; ele (mn do) falou pra advosads (sie) que ou era uona ind fpeme, que cu era wina proriuta, que eu sbandonel © Fito gue ew abandonel ele, que cu abandanci a casa, {gue bu abandoel tado,« fou, e falou, € falow (~) ‘Ut obgervador externo dire que estava montado co cenirio ideal para um eompl0, Nao € bem o juign- mete que a Severina-de-hoje faz, especialmente quan- do preserva a figura dosogro. De qualquer forma, no {ouse a defesa clogtente e apaixonada que Severina fez desi poderia perder a tutela do filbo. Termina dizendo Sadvogada (sie) do Tuizado de Menores: Até 0 sitio momento que eu tver de vida, dia de (i, cu quero asmemit esta roeponsabilidade; @ meu Tito, 4 dnien coi de bom que eu tenho até hoje € fmeu'iho: eu vou dar? (.) 66 digo: doutora, nem of bichos, nem os aimais do seus fihetes, agora eu vou dar? E quando mew Bho crescer 0 aue ele vai nchar de sim? ™ ANTOMO-DA COSTA clAMPA Nao perde 0 filho. Conserva sua identidade de mae. Alguma coisa se Salvon: por pouco, por pouco, teria me destruido completamente. ‘Quando eu cheguel em cass, minha sogra estava toda feliz, pensando que ev tinka dado, de papel passado, © menino, 4 tutela pro meu sogro... quando cheeuel fem casa € nfo tinha nada aleitado, ela fechon a cara omg (..) passou dois dias (..) meu sogro falou pet mim: Severna, voed faz ast, voc€arrumma tr Tee seer pra fear.) porque agui no val ter mete condi- ‘plese yoo! far, ajeta sua vida, deina 0 menine at ‘tea kente ama canta do menino(,.) Ail Que me dot mais revolts, deivar meu fiko, desar meu flho al, sozinbo; sil que eu tinha yontade mesmo de acabar som a vida do (mew maride), da mie dele, ie todo ‘mundo, dagquela rapa itera. Nao perde o fitho? Conserva sua Iiie? Alguma coisa se salvou? mtidade de Capitulo 7 QUE CONTA COMO SEVERINA TTENTA SAIR DO ZERO: UMOUTROOUTRO Daf quel anew...) en Baus aze0(..) Severina faz um balanco descledor de sus vids. ‘Se alguma coisa se salvou fol coisa pouea; de impor janie, sua vida e a do filho. Sempre pode recomecar. ‘A tute legal do filho esté saivamas, de fato (ain- a que nio de direto), sua guarda s seu cuidado ca- ‘até a companbis do filho Ihe & fi- jo de vez.em quando. E mie, mas imie-de-visita! © trabalho também esti perdido, Sua_doenga mental astasta do-emprego. E tabalhadora, mas tr ‘bathadora-na-caixa! Eserava invtilizada, de fato uma ex-escrava. Tam hhém éex-espona eex-doua-de-casa, Tudo lhe foi traco, Toubado, espoliado, destrwido. Como isto pade ser dito em termes positives? Em ver de afirmarmes o que nla era, ogue cracla? Doente mental, ofiialmente, com laudo médico & tudo mais. Reeebe uma pensio para se manter viva © reprodurir sua identidade de doente mental, encarna- ‘lo, coneretizagtio da destrutividade de uma sociedade esumanizadora. Seu ex-marido apenas foi mais um dos muitos instrumentos dessa destrutividade, embora tenha sido um dos principais no esso particular de Se- ‘erin, Ele proprio também sofre os efeitos dessa des- ‘rutividade. Exrnoivo perfeito, tem a mesma sina de Severina, Esté desempregado, sumido pelo mundo, ‘enlouquecendo cadaver mais: algoz e viima a um s6 tempo! Mas, Severina é quem fem a palavra Fol duro... eu vim morar.. pedir na antiga ease que ‘ev morava antes de ei casa, das portugueses (.) ‘quando chogo Uno tin agar pra mim fear; onde de oui iar? (..) nto fu falar com (outrannulher fue alugs quarts ne proximidade)(..) nfo tem agar ‘pra mim ficar(..) Onde que eu you fesr agora? (~.) ‘Aventao ela (a mesnaa mulher tinha um banbetiah Ibo set por que razip eles fecharam aquele Banhei rho, faparem tudo (..) sabe esses banheitinhos de Pensto, uma coisa muito pegueininha? Entio ela iz:olha,oinico lugar que ter é este bonhelrinko, se ocd quiser fear af, figue (..) Butta en disse: tudo bem (..) Aerumot uma cama rela.) peda um col fgrona que nba 4.) tna (us antiga ‘cnlecida) aa outra pensio...) uve me arrurou um fxbertorzinko, uma colchinia que eu forrel ¢ figuel ‘aE comer? (..) armume de comer no (hospital em ‘que trabathou) a rccber o primeiro pazamento (do |ADSTORIADOSEVERINOE ABISTORIADASEVERINS 87 1NPS)(..) depois ainda me dev nfessto nos ris, gue weShsve sae, de neti, uring sung @e em ‘Sh Golde Eas mulheres do dal posit les th ‘amr moreno Jui oue oH ‘ihn poranvam que eu ero blebo alter, un ae erga ran cou fu cal na booger de falar prt mautean cy esr com problema de urine os ihaesaaado ungoe, Hope! (.) Fol fwo magele pm min; ¢ cual mas eu sempre com a Pree ngance doue dem, com 4 taba rals etna broneay eu dha que me ina (6 Soman ano dar om eto ne i la, Mas mame? tats modo ave en poderia tenga dle Satnatando leo o centr, ou mach, 8? A vingadora-eneapsulada retoma seu lugar. B ela ‘quem vai dar forgase sentido para esso ser quase der truido completamente. Que alternative the restava, se até esorava ni era sais? A tica coisa que no Ihe tinh sido tirado era o projeto de vinganga, Se The trassem, tlvez fosse a Sl- fms eoisa a set tirada antes de perder a vidal ‘O projelo é reformulado e ampliado. Nao mais 6 fo pale a amante, nem prioriteriamente. Primeiro 0 arido, Mas como? Antes & preciso manter-se viva, sobreviver {.)tuma mother aus hie faeces me dew wma o- ‘Sahel outa mother) 860 ama cance, es cece Pe odo quebrada, mat ex wuardo ate hae 80 a, Gea pnrdsdge€ nae tare abe 2 go um sds ea, gum cis asc: comprats pO, Pie pase Aguas quondo nha call ou chou qual ‘Yaris ast 80 INPS,eUrizando com o INPS, brigando com a turma do INPS — nunca esquego um dia que (am metio)falou pra mim assim, que ia me Pr demir de una cams defor ..) © médico do INPS talvez nio entendesse, Pen- sava que estava tratando de uma doente mental, mas estava era tratando com uma vingadlora-briguenta,.. Ponsa yollar a ser escrava-itil. Mesmo que reco- ‘meee casa por casa mew quarto fea do lado — nos ia les ear tim pea i, oure ra oe, wm pra rim, cnt, Sood; ne mulers, do manha, est evans den de ‘a, urd, ela slam, fm ras la) ia ta dC, mat aad, taram ee, estagaran omy le, Ese C: mares I quanta vere «mulher dle io me den conta {evestara no feo dos maconttrs e os ldrtet ‘io inhapra onde porque otha conden, Dentro de cerios padres mais convencionais, & azodvel supor que tera difculdades em strana ema: prego, Se alguém fosse fazer uma desetigho de sua ‘dentidade na época, quem era ela? — Uma doente ‘mental, que estaya na caixa do INPS; moradora num Jocal suspeito, onde ela mesma era suspeita; 86, sem familia, nem amigos, vinda nao se sabe de onde; quase maltrepilha, faminta. Aparéncia muito poueo reeo- smendivel. Mas, talvez apenas aparéncia, AESTORIADOSEVERINOEAKISTORADASEYERINA 83 CConsegue emprogo na cas de um casal, onde ga nha tum pequeno salério, comida, ete.; continua mo- zando no foro. Como ou seme flop too mundo, ex digo: com {ode tincerdade, com toda eld — so eu tenho travado dentro demi —- come eu enconre (sect Sab maquela epoca, eu poderia ter encontrado ovens pessoa! Porque sx ao esse eoeontrnd (exec [ap acho ave Hoje eu etara na siret, porque ma fuela poca ev estave no mor desesper (DOF fovce, pr puso.) alan (dss asl) av, como Tif di mints via, como € gue sed ele 0 formal, comcee a narmalzar nore. Comecar de novel A Severina-de-hoje valoriza muito a oportunidade que tere, mas como pensava, Senta eagia a Severina-d-ontem? {den estava tho tunstornada, to birats ada como era, né.. quase(..) Ii eu nfo 1 aprontava lh dentro (rss). O que eu fia? Faria fom colsa boa e tr ou quatro ruins... sb aproatara (co vemos problemas (.) eu chegava ti mas no es fava contenic,chegava lem verde trabalhar, quan- {as veces des chegaear em casa ¢ nfo tinh nade pronto prales eomer(...) averduraencharetda numa panela de press (..)arrumaraa case: um dis quan- Gocu queriaarrumat, quando ato queria nfo faa: bbagungava, nd; eu tnha muita. cos... sabe com {got (son) porumaestantel eu queria ver ao seh, no Siro gud (eu queria ler e se no me engano Tenho ate hoje um lio dele comigo (rises) (.) Eo fieava com uma bronca, com uma rava, quando eu ‘chegava le principalmeate se chegavi ls — prin cipalmente se chegava 6 e queria arrunst 0 quarto, fle estava dormindo! Ew nto me couforinava de che bar li Go homem estar dormindo, 0 patrao dormind. © aué ew facia? (risos) Endo chegava na tala © et ddeitava também, dormia. Quantas veres et 180 fiz ‘suo, quantas vezes eu chegava a dormir. AhI esse ‘homer dormindo al, ew nto poss impar nada — no podialimpar porque eu no queria, ne! E preciso deixar de 36 ouvir a Severina-de-hoje © restar atencio a todos seus gestes, suas expressoes Taciais © corporais; toda sua condula deve ser obser- vada quando narra esta fase. Suas palavras falam de lama Severina-de-ontem amarga, ‘com raiva, com bronea, que so apronta. Fa vingadora-briguenta ne- sando a escrava-revoltada. Bum outra da empregada oméstica, aparéncia sob’ a qual se manifesta a es- crava. Mas, a expresso (mais que as palavras) da Se verina-de-hoje revela uma tercvira personagem, um outro autre, ‘Os risos quase 0 tempo todo — uma certa ternura — ave se pereebe neste momento di uarrativa des. yelam um outro outro. E uma etianes traquinas, um ‘molegue endiabrado, turbulento ¢ travesso, que quer falar. Falar da baguinea que faz, das confusdes que arma... puerlidades, eriancices! E ama complicada dialétiea: a vingadora, que inoga a escrava, énegada pelo moleque, due é cla mes ma. Rompe com 4 mesmice; vingadora/escrava, es crava/vingadora. Ela é ela-mesma, transformande-se. Seno éuma superacao, tende para isso. Aparentemente, a0 aprontar, estava realizando 0 mito da vingadora; mas, om osséneia, concretiza-se ‘uma metamorfose, eronologicamente tardia, em que AesrORIA DO SEVERINO A ISTOAREA DA SEVERONA, 8 -s endiabrada talvez, mas ‘yem a ser erianga, uma crianga endi inidade de ser. Uma imoleque que nao teve a oporta Uma “iternativa que Ie foi negada no passado, oe infncia- (gue-no-teve, Uma trillha nfo percorrida, ui ct «que nde pode tomar. ‘Um outrs outro. Capitulo 8 ONDE SE VE UM MOLEOI PODENDO SER MOLEQUEN POR ISSO DEDKANDO DE SER MOLEOUL, © cleave ve manila ie celts. Aprende quando genal nas ohem taste opecn deers forcastigado? En violencia? An! esa velha confecion ‘pene Sorin avin tc Eve dee ja rarunJouada te um indo bara score Oa inode indo pare onvet Coss © moleve precisa ser ilerado, ae ido, tlvez ats amado. Precisn de conde objeven. ‘S6 se é alguém através das relacdes a — ‘indvdoo inlado 6 ume tonto, A ident dude se concrtia na atividade sonal: © mu, ei esi rariaan Soe kient Sd ire le identidade pe ao eae an elape or Sona 2 Be ‘ abstrata, é falsa. si siti ha ‘O moleque precisa ser moleque. ASTORIA DO SEVERINO RAISTORIA DA SEVENINA 4? ‘ura pessoa no me aturaria nfo! Outras pessoas gue covene conhesdo, ovtros patrdes, nao me ature Sam (.) Porquces Gaha tanta bronea de min... nto! ‘Nilo Gbronea de mim eu tinha bronca de todo mundo, Gavia, de todon, et nha raiva de tido! Eu nto me Conformava de cles chegarem, deitar, dormir, descan Sarve.eu ter Que traballar.. la tinha muita pacién- Ee Gomigo — tanto ela como clo! Eu no penteava Cabslo,sibe? De ver em quando ele prometia me dat tim ponte (res) Gar win pente pra’ mim... coitado! ‘Chegar na corinha, # cozinha nao era muito grande, Conta de apartament, tama mulher com um assa- fhamene ae cabelo, estas hregas é0 tamanbo de unt onde, cozinbando, que ele ia imaginar. o que ele {a char, (fos). Como que eu posso dizes? A gente ests ‘rincando assim, falando tudo assim, mas se anaisar profundanente, aquela fase pra mam nao fol brines- pda fot rineadsra, Nag foi e digo: pra eu vol tar'ao normal, pordve, quer dizer que eu estara tre Paluando, ne? Trabalhava, estiva trabalbando... ra Bathando! fezendo hora lit (.) Eles tveram rouita {olerdncia comige, porquecv aprontel multe, evapron, {elmuto, tudo ex quefia pra mim, echava que queria Dra mim (on) 9¢ fosvem outros pattdes no agents Flam (..) agdentaram tudo isto de mim, guantos enes ‘ trabalhe! 1a?) de 08 ae 71, quatro sno ‘Qmoleque pode ser molegue. B aturado, aceito, tratado com pacigncia © tole rincia -— pode até manter a aparéncia de bicho-do- mato, cabelos assanhados sem pentear — isso motivo ara brincadeira: ndo é punido e pode até panhar coi Eas que o deixem com apartneia mais civilzadat E tal~ Vez aquele mermo bichinho que em Salvador disse: era coisa mais gostosa comer pao! ry ANTON DA.Costa clANPA 14 stave mais equilbrads, quer dizer, equitbrada rane fnanclmente snare tun menos eu ji estava ganhando, eu jd tint elie emer: porque 2 comia, eu slmogava, eu torara ete de manbi; eu in trabalha som café cia tomes vo se ¥is0; eu almocava en jana mulas yee cont ge sobrava. trai pra mim ents, poraue gurode 3 isan be eu vin enor, arta utes ‘mora, eu lazgara tudo cyinha embors (6 a00f0 qe eu tive (29 casa). elo me dares (nig poi me dram)" re ee tara ce sos ee ee ow festa mec ana naa de doméstica; ‘no emprego & alimentada, to ee Tani a oee Taal ge = dicos no INPS para mar Se asennad oe cong ne are mt Sestava melhor (...) estava comm medo (..) eeu conse ‘ui... falet que cu nao estava bem (..) te anedicn) ‘Perguntava com quem eu tha ido, cont quem que cx ‘Bo tna ido fo} aqucla confusto foginha comigo, no fim oe te dezow mas un ano.) dope mat un iene » nec a Pre mae cn Ste fo woman soon Set ee tinua por um ano doente mental oficialmente, de. Sharad fl renayaga porns urns ae Se Dois varias ves, aif ola ser definitivamente apesce, Besoin ge tears ASTORIA DO SEVERINO EA HSTORIADA SEVERNA — 4) lo era mais, Volta a ser escrava-Stil eo INPS nto descabre, E preciso sempre lembrar o significado real da si- ‘wagdo para Severina, e no o aparente. Caso contra- Fio, fi iégico: Severina tinka parado de trabalhar no hospital porque se tornara uma doente mental. Logo, o desejavel seria que quisesse deixar de ser doente ‘mental para voltar 8 trabalhar. Contudo, esti icaba- Thando ¢ tem medo de ndo ser mais declarada doente ‘mental; choge até a enganar médico do INPS. Certa- mente, para Severina, deixar de ser doente mental era continuar sendo declarada doenie mental, niio voltar para 0 mundo que a enlouqvecera, e ficar naquele re- {iigio onde de ver.em quando podia frzer molecasens. ‘0 proprio fato de voltar a trabalhar dé a impres sia de algo ilégico — pelo menos do panto de vista da Ieiea vinente no mercado de trabatho. Vamos supor {gue se Lvesse recorrido a um especialista em recursos fhumanos neste episédio. Imaginemos Severina sendo submetida s-uma selegie de pessoal por um psicélogo especializado tipico. Provavelmente, nunca teria sido ‘admitida dentro dos padrées convencionais, Absurdo, ferro léenico erasso aprovéla numa selegio criteriosa, Continuemos imaginando; supondo que, por falta de critios racionais na selecdo cla tivesse sido admitida ‘qualquer especialisia em administragio de pessoal, fazendo uma avaliagao do seu desempenho, no teria & ‘menor divide em demiti-la. Nao continuaria no em ‘prego; seria ilégico,irracional para um especialista em recursos humanos que pense pela logiea da ideologia Sominante, Com cetteza, se nao fosse demitida e con tinuasse no emprego, por qualquer motivo, nio teria aumento de salérios. rr ei (onda mera) pera Jadot) obmmemencttae gate ae coe Aitewptre pracutat: Sumioa seek cnc ma. a ibe © fol at cuo iene Wudaracn a Sees ‘Pouco mais meu ordenado. i Nossoimaginéio especialista ‘ sta em adminis do pessoal estaria horrorizac ue Que de Bese estaris horreado, Que absurd! Gua ptt 1s absurdot«ausfacas de licn cruel Severna val deeano de ser mshees Podendoassuminsua condita deoaae, Mes fi contnuava com meu sg xthara aha quo dt pra ajar nc sgn) Sea ge ie ion 18 ee yates i) Poseram gusta de 18 cot Sang Seema me siucbrava a coisa no melo da semana, doanecise, ra mm rela vstar, maa sempre eet cs eet Fron venta con Apts oo abun do men sop ce ae querer ter vontade de da, mas lenio dasn mapa pra nilo brigar dentro de casa (...) Pserngnte at © que ev Na verdade, o emprego ¢ um refigio, ume ilha. Fora, continua explorada, violentada. Depeis au vim marr (20 noo ‘nde do Dane) comegas maior mal Soe sas pra mim, que cu levava mais dinboiro, porque cles (ogres) no dtvam nada, nada, nada der nace ja a cosas pra mou Bln dal Tudo er Sas AlstORIA DOSEVERINO EA WISTORIADASEVERINA. $1 faaia, B a ajuda dessecasal(patsOes), sempre me ajt- endo, que, i de mim se ude Jossem cles, ail ‘Ainda que um refisio, 0 emprego nila é uma si- tuacio itreal, fantasiosa. 6 umia realidade objetiva, Ganha dinheiro, comida, ajuda, apoio, Novas relacdes socias seestabelocem. Comeca t interagir com pessoas Com outros valores, Talves até pudéssemos dizer um. ieucio discrepante de tudo que Severina encontrara até fntlo (confirmado pela suposta observagdo que um ‘maginario especlalista om administragao de pessoal {aria do emprego de Severina), Assim como a violén- ia, a exploragho s@ coneretizou ao longo de toda sua ida, encaurnandorse, sintetizando-se na sua revolta € ha sua loveura, A tolerincia, 0 apoto, a ajuda, certa- mente, producicio outros revultados. Porém, leva ale fgum tempo, nia € feitigo, nem encosto de espirito ‘bom. E um proceste humano, social, historic. A revolts continavs dentro de mim, ania eolsa que ies soa) auctiam de mim era dinero € dinheiro Sunio nha. Eu parava dete (isitar) porque mio taka dinkeise pea der. Os hugaves que eu ia (moran) fram multe pequenos (quer dizer: nto day {Ger também oflho)(.-) Fela bpoce mais massacrante fbremim pela mine sogea (..) quando ia If, em pe igo de phoeundo tinha, nao Gina nada; (..)saia fou fio beava chorando (..) poraue ev vinka em Bora; eu nto tina condigseste levies) © nto podis ‘orm ‘Transicao difiell, 16 nao & mais tratada como es- cava, mas objetivamento ainda 6. Quer morar num ugar malor, ter seu canzo e permanecer com 0 filo & no consegue, sto sugere i tn Sabatho or que gunhe mal caer wns ia em que posse acomodar o fil po. Coen lise, Bak ra re 10 fil. Com isso, de aria de er explorada pelos soprs eva trata sr ‘Quer deizar de ser moteque Acseravaeavingidareaindascbrontem, wT" Capitulo 9 Mpnw? EM QUE INESPERADAMENTE ‘SURGE UMA MANICURE NA ‘VIDA DE SEVERINA ou jf estava bem, estaya, ostava,estaya bem melhor Teac eatava ew estavn assim, quer dizer, de rar auNE SE nha nogte dex coisas melhor, aha on: re peucamento, nous fot pelo alicerce, pelo que eu ts see eneer gue o.cacl fee pra mim, pelo que & familia [lapmm mim, aver diner. que eles me doram bastante ETC Bb ive a grande boa sorte de sair de uma BEE VGr'e ie pea outra casa boo. A (nova patroa) fol Stahe'hos, mute bom mesmo, snuto, fot ima pra ‘pita oa nite geataa els. © casal que @ empregara anteriormente muda-se param bsievodistante, Severina também vai mas, no Fando, parece querer consinuar no mesmo bairro, pré= Sima de onde mors. Nivo diz, mas é razovel supor ‘ie, mesmo confusaments, ensaia novos planos, novos prajetos.

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