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oo Dados internacionais de Catalogagao na Publicaglo (CIP) {(Cimara Brasileira do Livro, SP, Brasil) itberio | “Momentos mutativos em psicandlise Gilberto Salta, — Sto Paulo : Casa do Psicdlogo, 1995, Bibliogeatia ISBN 85-85141-57:3, I. Psicandlise 2, Psicoterapia 1. Titulo Indices para catalogo sistematico: I Psicandlise:Psicotrapia 150.198 2. Psicotrapa psiandliica 130.195 alitor: Anna Elisa de Vllemor Amatal Gntest (Capat Cristina Sion [Revisio: Joi Vaz Composisio Grafica: Arte Graphic - (011) 578-0668 psicandllise ‘aegi iiida po Lali Yih Gilberto Safra MOMENTOS MUTATIVOS EM PSICANALISE UMA VISAO WINNICOTTIANA, Casa do Psicdlogo® {© 1095 Casa do PsioGlogo Livaia e Faitora Lida Reservads todos 0s direitos de publicago em lingua portuguesa & ‘Casa do Psicdlogo Livrara e Edtora Alves Guimaies, 436 ~ CEP 0410-000 ~ Sto Paulo ~ SP Fone (011) 852-4633 Fax (11) 645392 proida repodugio total a parcial desta publiago para qual- ‘quer finalidade, sem auorizapio por escrito dos editors. Impresso no Brasil / Printed in Breil Sumario PREFACIO, INTRODUCAO, Setting ¢ Momentos Mutativos 1. RELAGAOANALITICA E POSSIBILIDADE DE EMERGENCIA DOS MOMENTOS MUTATIVOS .. Marcio: O Congetamento do Sel 2. REGRESSAO E APARECIMENTO Dos MOMENTOS MUTATIVOS, Jaime A Falsa Bistncia Sandi A Busea da Feminildade 3, BUSCA DO OBJETO E MOMENTO MUTATIVO : Agumas Necesidades Psiguicas Biscas A Busca eu Ligio de Objet0 Paul A Necessidade de Ser Visto 21 35 AL 58 9 89 100 ur oo 6 132 137 <2 yagsup pani cua 2 Momentos Mutatvos em Psicandlise ‘Um Caso Relatado por Hanna Segal 4, RESISTENCIA, ACTING OUT EMOMENTOS ‘MUTATIVOS| 7 Jane: A Capacidade de Amar Ameagada Claudio: © Ato Libertador 5, AINTERPRETAGAO E SUA RELAGAO COM (O§ MOMENTOS MUTATIVOS ‘Uma Sessio de Winnicott Um Caso Relatado por Racker Carmem: © Odio Sem Vox CONCLUSAO BIBLIOGRAFIA M47 133 lel 166 17s 178 187 191 197 205 Prefacio ‘Momentos mutativos em psiednalse, de Gitberto Satta, & ‘um teabaho fluo, harmBnico © coerente Fluide porque brota da experineiaclnia picanaitica com natualidade, através de idéias que se derramam numa exposigo de espontineas seqiéncas conceituas que progeessivamente Yio ‘complementanda e clateandoo tema arnnico uma vez que seu objetivo de transmitiea expe riéncia psicanalitica, ao se apoiar no tripé do alihament das idgias, no material clinico © nas. ctagSes bbliogrieas,o faz de tal modo a escolhereada um em conformidade a ser exclarecidoe ccomplementado pelo outro. Em tabalhos psicanaliicas elinicos comum, com carta feqUéncia, encontrar-se um grau maior ou menor de dissociagio entre o material clinico e © nivel de ccnceituagdo. Mas no trabalho de Gilberto isso mio ocorre. O material einicoe a citagdo bibliogrifica cuidadosamente esco- Iida so entrtecidos de tal modo com sua mancia de pensar que 0 texto € progressivamente elucdativo e direcionado & meta propos CCoerente pois, aa exposigo do tema, ao abordar sucess vas etapas do processo com questées priticas etedricas que se imbricam com aquelas, 0 faz de modo I6gico num conjunto de telages consstentes. (0 ponte central do trabalho so 08 momentos mutativos. sts slo examinades com constineia nos cinco capitulos do Ii : Momenios Muttivos em Picanlise ‘yr, analisando em todos eles as associagSes dos momentos ‘uativos coma relagoanalftica, a regressio, a busca do objeto, fa resisténcia ea interpretaga. 'Na vera, os cinco ponts abordados so aspect, ma pit Em relagio auséncia de consciénca do significado das emogées, as pessoas situam:se nos mas diversos panos interme= didrios de dois extremos: num extemo, as pessoas que erotizam sas relagbes para nd terem contato consigo mesmas ¢ fazem tuagSes com qualquer pessoa ¢ em qualquer ecasio; noutro ex ty Momentos Mutativosem Psicandise trem, as pessoas que mesmo em ocasides propicias¢ adequadas| tm tanto medo de suas emoges que esistem a qualquer tipo de cexperinia ‘As ocasies em que natural ainformalidade, como numa ‘elagio familia, a regrageral da transferEncia, quando ecorre, & ser de eariter repetitive, Raramente alguém que viva a transfe- réncia consegue ganhar condigées interas pata conseientizéla, simboliz-lae elabori-la. Isso, em geral,é devido a paradus do ‘desenvolvimento emocional. $6 no processo analfico € possivel smobili2éla Portanto,atansferGneia€ universal e pode ocoreerem qual «quer lugar e com qualquer pessoa. Mas, éna experiencia emocio ral da relagio analista-analisando que é possfvel vivé-la com o objetivo de conscienti2él, simbolizs-ls ¢ elaboré-la. A exper {cia emocional est intimamente associada as ideniicagées| projtivas¢intojetivas ‘A realidade psiquica do paciente, que € mével,esté cont ruamente, em nivel verbal e pré-verbal, investindo-se de sensorialidade projetando-se no analista que a acolhe ese de a peneirar por ela, capta seu significado e a devolve com um povico menos de necessidade de alivio-motor ou gratificago sen- sorial, para que o pacienteintojteo projetado de moda a cons- ‘tuir ou reorgar sua capacidade de simbolizar e de pensar. A ex- perigncia emocional fh elas idetificagées de intimidade para itimidade em ambasdiregbes, riando um espago inerativo em ‘que ambos compartitham da experiencia comum. Esse espago comparithado por ambos tom com base 08 igniticados emocionais da linguagem usada na experiéacia ana- Iitica nicialmenie, 0 espago analtico construido e comparilhae do pela dupa tem, pelo menos para opaciente, uma exturailus6- ta ou de transformagées em alucinose. Gragas is transformagées do analistapotencialmente geradoras de conheciment, 0 paci- tente paulatinamente vai evoluinda de uma vivéncia ikusria pare ‘outta que pode conscientizat a tansferéncia e evolir para ma real com o analista, ganhando capacidade de simbolizar claborat ‘Uma entrega © uma confianga gradualmente se estabele- ‘2m no analisando com ampliagao da conscinca de suas neces- sidades reais, podendo viraviver com analista uma experiéncia ecisivae vital relacionada as suas necessidades jamais anerior- ‘mente reconhecidas eatendidas. Chegamos, ento, ao ponto em que Gilberto chama a aten- ‘fo para as dus faces da transferéncia: “O pacente transfer seus ‘objelos internos ao analista ¢ transfee paralelamente fungées, que nio puderam ser atendidas no longo de seu percurso de evo- Igo psfquica” (camino est preparado para as tes fases seguintes do peril de desenvolvimento do process: '3) Um perfodo de regressio e dependéncia na relagio Uuansferencal. O paciente busca no analista as fangGes de que necessita, Se o ferapeuta compreende a situago temas um m0= 4) Ha imernalizagio da experiencia vivida, © a sua simbolizagio e concatenagio com a histria de vida do pacient, A regressio ésuperada, 5) Segue-se um perfodo em que ha um predominio dot batho interpretativo segundo os molds clssicos” ‘Como exposto até aqui, alcangamos altima questio que sgostatia de propor neste preticio, Por que os momentos mutaivoscolacas como ponto cen- sal no trabalho de Gillerto so uma questio bisica no desenvol- vimento humano e decisva no processo analitico? Penso, em primeiro lugar, porque Gilberto desloca a én se médica de cura pata o desenvolvimento mental, ea énfase do inconsciente para a realidade psiquica, Em segundo luga, porque © processo educative © socilizante wiliza apenas uma pate da realidade psiquica «ser- vigo da sobrevivéneia, da produtividade, da represso e dos valo- a Momentos Mutativos em Puicanise tes cultrai, 0 restante da ealidade psiquica que nio tee possi- bilidade de se desenvolver € teprimido, Este varia de individuo pata individ e pode ser considerdvel, o que acareta empobre Eimento do ex, desgaste imenso para manter a ropressio Aistorsdes de carter pelos mecanismos de defesa, 0 processoanalitico que tem os recursos para transpor as boareiras das distorgies e dos mecanismos de defesa para se apro imar da ago do paciente, fcilitando que este ampliesuacons- ‘eigncia de si, sua capacidade de simbolizare de pensar aexperi- {cia de vide, permitndo entrar em contato com suas necessida- ‘des reprimidas eatend-Ias com a ajuda do analist, Em terceiro lugar, porque a realizagio do ser humano no dlepende apenas de seu preparo para a sobrevivéncia eo éxito na hicrarquia social, mas depende também e, principalmente, do seu desenvolvimento pessoal, «este €fungio do desenvolvimento da realidade psiguica da harmonia consigo mesmo. Embora essa ‘ej ua questo vital no existemna cultura recursos pararesolve- la, pos estes foram secundéros ao advent da psicandlise. Gilberto assinala uma movimentagao da psicandlise de, inicialmente, uma vio médica para uma outa que expicita ne cessidades intrinszeas de crescimento. ‘Se eu pudesseassinalar numa frase a necessidade psiquica central do homem, eu diria: auto-econbecimento, inicialmente pelo outro, e, a seguit, po si mesmo, Manoel Lauviono Salgado de Castro Introdugaio “Quando lho, sou visto, logo existo, ‘Agora tenho condigées de olhar e ver: ‘Agora olho criativamente, ¢ 0 que eu apercebo eu também pereebo, Na verdade, tomo cuidado para ndo ver o que no existe para ser visto" (Winnicott, 1967), trabalho em psicanélise, segundo meu ponte de vis~ ‘a, visa ndo 86 buscar a recuperagao da verdade do sujeito, ‘mas também oferecer a ele a possibilidade de evolugao da: queles aspectos da vida psfquica que jamais puderam se ‘manifestar ou ser simbolizados, E $6 através do encontro com wm outro ser humano que haverd a possibilidade de ocorrer © contato com a pré= pria verdade e também a evolugao e simbolizagdo da vida psiquica. O vineulo com o outro é imprescindivel. © en: ‘quadire psicanaltico oferece uma oportunidade fmpar para que esse proceso ocorra, No entanto, o processo precisa 2 Momentos Mutativos em Pricandlise ser dinamizado pelas intervengGes, pelas interpretagses do psicanalista, para que 0 paciente, nesse novo vineulo, no fique aprisionado no j4 conhecido e estabelecido, na ‘compulsao a sepetigo, Evidentemente, a condugio téenica «do processo vai estar determinada pela compreenso por paste do analista, o que ocorte no vinculo entre elee seu paciente, Sabemos que ao longo da histéria da psicandlise, & medida que 0 conhiecimento dos processos psiquicos se am- pliou e que a compreensio do paciente se aprofundou, a ‘éenica de trabalho também se transformou, Inicialmente, para Freud © Breuer, a consciéneia dissociava-se devido & impossibilidade para 0 sujeito de tolerar a recordagao de um acontecimento traumstico. O pa- ciente queria esquecer as cenas que 0 adoeceram, Para re- ccuperar essas ropresentagses separadas da conseiéncia do paciente, Freud abandona o processo hipnético, emprega- do até entio em sua prtica clinica, e utiliza-se da “coer associativa”, Método deserito na apresentagdo do trabalho realizado com Elizabeth Von R. Os fatos so esquecides quando ndo se quer recordé-los, porque so lembrangas do- Torosas, desagradéveis, contrarias & ética do paciente Freud observa que, mesmo durante as sessies, 0 pa ciente evita a recordagao. Nota a presenga de uma “forca” que se opie A recordagio, a mesma que originou o esqueci- mento, Surge ai a concepeo de resisténcia. A partir de en- tio, no ha mais sentido em coagir o paciente a recordar, pois a “resistencia” sempre estaré presente, Trata-se de dei ‘aro paciente falar ivremente. A “associagio livre", como elemento fundamental da técnica, se estabelece. Com essas modificagbes na téenica e com a ajuda de sua auto-andlise, Freud ampli as suas observagaes e seu conhe= Be Invrodugao cy «iment sobre o psiquismo. Dessa forma, a questio no mais se circunscreve entre 9 recordar ¢ 0 esquscer, mas hs um enfoque ceada vez maior na dindmica intapstquica, no conflito entte a Vida instintivae a represao. A teoria da sedugio perde a impor ncia que possua iniclalmente, na sua ligagdo com o ator tra- nitico,e novos aspectos da vida psiquica passam ate relevan cia, tas como: a sexualidade infant 0 complexo de édipo e as transformagoes nas representacbes inconscientes. A tesisténciaé vista como um elemento produtive den- ‘ro daanilise, principalmente quando o paciente repete seus conflitos com © analista para ndo recordar. © fendmeno transferencial € 0 campo onde a andlise &realizada e 0 ins trumento de acesso ao inconsciente do paciente. A relagao analista-analisando ¢ vista como fator bisico de transfor- magio do psiquismo do paciente, Desses elementos decorrem as questoes téenicas re- ferentes ao enquadre, dentro do qual o analista procura nao mostrar nada de si, nem se deixar envolver com a transfe~ rncia do paviente, a fim de que arelago analista-analisan- do possa ser detalhadamente analisada, Com o passar dos anos, com a contribuigio de diver sos autores, pereebe-se que a técnica empregada pelo ana lista assim como a sua compreensio do paciente vio estar dejerminadas pela sua conttatransferéncia, Cresce a cons cigncia dos analistas sobre a necessidade de instrumentalizar 4 sua personalidade niio s6 para a realizagio de um bom trabalho do ponto de vista téenico, mas também como for made desenvolver a propria intuigio para compreender mais profundamente o psiquistmo de seu paciente. ‘Nas duas tltimas décadas, ao lado dos estudes sobre ccontratransferéncia, houve também um aprofundamento das, — a Momentos Murativos em Pricandlise cconhecimentos sobre o- desenvolvimento do ego, do self, das relagdes objetais,e do relacionamento mie-bebs ete. O processo psicanalitico passou a ser visto ndo s6 como meio de aleangar 0 insight, mas também com a preocupagdo de restauragao do self do paciente. Assim, os objetivos da ans lise mudam de enfoque: do conceito de cura passa-se ao de cevolugio da personalidade. E nessa perspectiva que o presente trabalho se colo- ca, Seu objetivo 6 enfocar 0s dinamismos existentes na re- Iago analista-paciente que parecem favorecer © apareci- ‘mento de uma condigdo que ajuda o paciente ater uma ex- perincia simbolizadora, que o levari a muday a sua pers- iva de mundo e a visio de si mesmo, Pe Desde a publicagZo das “séries complementares" por is de Psicanslise em 1916/17, estamos habituados a ver a etiologia das neuroses: como resultado da interagio de elementos complementa- res. Freud fala em ts tipos de “séries complementares” 4) Patores congénito-hereditrios interagindo com ex- Freud nas Conferéneias Introdutsr perigncias infantis, resultando uma disposiglo sexual ) A disposigdo sexual interagindo com as experién= cas atuas, ©) A fixagio, resullante das experiéneias infantis, interagindo com as frustragGes atuais, provocando regres volvimento produtivo. A presenga sign tares de “séries antagdnicas", mon (1977) fala da possibitidade de se compor tam- bém séries complementares que levam & sate € a0 desen- ativa de um fator positivo nfo exige mais que um minimo de incidéncia de uum fator complementar para assegurar erescimento nor- imal. Simon ptopde chamar esse tipo de séries complemen- Introducao % Esses conceites podem nos auxiliar no estudo do de- senvolvimento emocional do individuo e, também, no dos fe nbinenos que surgem no processo psicanalitic. (0 desenvolvimento emocional di-se dentro de um meio ambiente que facilita ou dificult a evolugio da reali ddade psiquica, Alguns autores tém estudado o desenvolvimen- toda crianga mostrando a influéneia do ambient, represents- do pelos euidados maternos, na aguisicao de fungées psiqui- ‘eas (Winnicott, 1945; Spitz, 1965; Mahler, 1975). Winnicott postula um estado primério de nao- integragio. A crianga ird necessitar de-um meio ambiente adequado, proporcionado pelos cuidados maternos (preo- ccupacdo materna priméria) para aleangar um estado de integrago, de personalizagdo (a pessoa habita 0 seu corpo, mente € corpo se integram) ¢ de adaptacio a realidade. Gradualmente, & medida que a crianga se estrutura, no- ‘vos elementos precisam ser integrados 2 sua vida psfquica, ais como as questdes referentes A diferenga sexual, 0 react ‘onamento triangular ete. Nesses momentos, as fungOes ma ‘emus patesnas se diseriminam, Podem-se observar as difi- calclades apresentadas pela crianga através das falhas no cui dado materno ou pelas falas das fungGes paternas Simon (1977), comentando a interagdo entre os fato- res consiitucionais ¢ 0 meio ambiente, afirma que as eapa- cidades de suporta a frustraglo e de tolerar a angistia en contram substrato genético. Quando os fatores constitucio- nais so menos negativos ¢ o ambiente nio € tio desfavoré- vel, a posigdo esquizoparandide é ultrapassada, deixando sua marea como disposigio, Assim, quando hi o predomi nio de boas experiéncias, a crenea no bom objeto se consti tui eo ego mostra-se mais capaz de lidar com as ansiedades 6 Momentos Mutativos em Pricondlise através do uso de defesas menos violentas. Prepara-se, en- to, ocaminho paraa “posiglo depressiva”, De outro modo, ‘quando hi a prevaléncia das més experiéneias, os impulsos hostis so intensos, acompanhados de grande ansiedade. O ‘ego fragmenta-se,atacando o vineulo entre o selfe os obje- (0s, atingindo o pr6prio selfe também a fungZo perveptiva, E fungao do trabalho psicanalitico elaborar os contli- tos intrapsiquicos, fornecendo ao paciente as fungdes que io foram proporcionadas pelo meio ambiente ao longo de seu desenvolvimento, Em 1955, Winnicott afiemou que, quando 0 desen- volvimento emocional primitive falha, o analista precisa dar a0 paciente a oportunidade de reparar essas falhas, Ele dliserimina duas dimenses no processo de anise: 0 traba- Ino interpretativo, como postulado pela técnica cléssica, e 6 trabalho que dé ao paciente a chance de encontrar na figu- +2 do analista um objeto que supra as fungdes necessitadas para que o desenvolvimento psfquico possa se completar. ‘Winnicott afirma que esses dois tipos de trabalho na andli- ‘© nfo sia incompativeis entre si, Esses dois niveis podem acontecer durante 0 processo de trabalho com um mesmo paciente e até na mesma sesso. Na literatura psicanalitica, encontramos em alguns au- tores a preocupacio, de forma mais clara, com o trabalho psicanalitico feito nessas duas dimensoes. Algumas colocagées feitas por Ferenczi aproximam- se significativamente dessas questdes, sobretudo em Con- fusio de Linguas (1932), Esses trabalhios mostram que se 0 esto primordial ¢ vital da erianga for pereebido, errada- mente, como agressivo, pela me, instala-se uma engrens ‘gem de confusdes, Ferenczi defende uma “elasticidade da Invrodueao a \écnica” a fim de que o analista possa adaptar-se Bs caracte- risticas do seu paciente. Também est presente em Ferenczi 4 idéia do uso terapéutico da regressio, Para ele, o meio ambiente onde o paciente se desen- volveu pade ter proporcionado estimulo excessivo ou ins Ficiente, nfo se adequando as suas necessidades, O analista cnldo ajuda 0 paciente a regredir e responde de maneira positiva aos seus desejos ¢ ansiedades, Balint (1969) segue os passos de Ferenczi ao falar sobre o que denominou de “falta bisica”, Ele afirma que a falta fundamental nasce da desproporgao entre as necessi- dads psicofisioligicas do sujeito, durante as fases preco- ces do seu desenvolvimento, ¢ 06 cuidadas, a atengio, © afeto de que ele disp4s na mesma época, tanto no plan ‘material quanto no afetivo. © paciente tem 0 sentimento de uma falta e ela The parece provir do fato de que alguém ou the fa falta ou este vyeem falta para com ele. Segundo Balint, 888 nova zona & cereada de uma grande angtstia, que se exprime em geral sob a forma de um pedido desesperado para que o analista, desta vez, no the falte. Esse autor também faz uso da re- gressiio como um eficaz instrumento terapeutico, Winnicott (1960) ressalta a importincia da eapacida- de materna (preocupaedo materna priméria) de se adaptar as necessidades do bebs, permitindo, assim, que tenha a ilusto de que aquilo que ele cria realmente existe. A falha dessa adaptagio leva 0 beb8 & formagio de um falso self “Também Winnicott considera a regressii, em alguns casos, um instrumento Gtil no processo terapeutico, como forma de tesgatar aspectos do self verdadeiro, Khan (1964), dentro da mesma linha de pesquisa, de~ eras 8 Momentos Mutativos em Pricanlise senvolve 0 coneeito de “trauma cumulativo”, Ele afirma aque a crianga precisa de um mfaimo de estabilidade bisiea €e confianga da fungiio da mie como escudo protetor, Git ‘588 intensa identficagio que a mie realiza com o seu bobs, ela como um escudo protetor protege-o de estimulagoes externas excessivas. Dessa forma, a crianga tem a possibil dade de contar com alguém que Ihe permite desenvolver-se sem ter que reagir bruseamente perante invas6es provocadas pela estimulagao intensa, (3s fracassos temporitios e inevitiveis da mie sio cor- rigides ao longo do desenvolvimento da etianga e também fornecem estimulos para a aquisiedo de novas fungées im- portantes no crescimento e dominio do ambiente, No entanto, quando esses fracassos forem freqientes ¢ importantes ¢ evarem & invasdo do psiquesoma da crian- ‘a, foxard um nucleo de reagdes patogénicas que Khan cha. ou de “trauma cumulativo”, Khan sugere que 0 analista com as reconstrugses & interpretagdes favorece o aparecimento da dependéncia na situagdo analitica. Afirma que no se trata de ser ou fingie ser para o paciente o objeto primérioe original, mas sim de avaliar a necessidade do paciente em termos do pracesso de ego envolvid e suprir as fungdes da mie como escudo protetor, cua falta levou a distorgo do ego. Little (1966), discutindo a téenica de andlise da trans. feréncia em pacientes boruerlines, descreve tres escotas de pensamento do ponto de vista da técnica, ‘A primeira chamada de “cssica”, caracteriza-se pela crenga exclusiva na interpretagio verbal como meio para se alcangar a meta desejada. Segundo ela, os analistas dessa escola enfatizam a importancia da fantasia inconsciente & Invodugao » ro levam suficientemente em conta os acontecimentos ex- perimentados pelo paciente na infncia, Os analistas desse grupo tendem a considerar como nfio-analisdveis os paci- fentes que niio se adaptam & técnica empregada, (© segundo geupo ¢ constitutdo por aqueles analistas «que consideram que uma experiéncia corretiva necessita ser suprida ao paciente, para que eles suplantem as suas pr6 prias experigneias originais. Para o que acreditam mio ha- ver necessidade que seja feito um trabalho verbal, através do qual se possa estabelecer a conexdo e elaboragao do novo ‘edo velho, da fantasia e da realidade, do mundo interno e do ‘externo etc, Nio € levada em conta a obrigatoriedade de ligar ‘acxperiéncia emocional com ontendimento cognitivo, Para Little, tatase de terapia, nfo de psicandlise ‘0 terveiro grupo aeredita que alguns pacientes apre- sentam problemas resultantes de um cuidado materno que ‘io foi suficientemente bom, no inicio do seu desenvolvi- ‘mento, Trata-se de dreas nflo-acessfveis somente com 0 uso da interprotagdo verbal, O analista precisa suprir ao pacien- te todas ts fangs semelhantes aquelas proporcionadas pela ‘mie suficientemente boa ao bebé, antes que 0 ego possa Utilizar-se das intexpretages verbais, o que ser necessaio como meio de promover a integragio do paciente 0s analstas desse grupo permitem ao paciente liber- dade para ditecionar a andlise, de forma que suas necessi dades pessoais possam ser supridas e trabalhads. Winnicott (1955), ao falar das variedades elinicas da twansferéncia, menciona os pacientes que necessitam regredir para encontrar no seting as fangdes que Ihe permitrao res- {gatas 0s aspectos do self que ficaram detidos em seu desen- volvimento, Winnicott afirma que, para lidar com wna te oe 30 Momentos Mutativos em Psicandlise ‘déncia regressiva, 0 analista deve estar preparado para se- ui 0 processo inconsciente do paciente, se no quiser ser ditetivo e sair da fungdo analitica Para a abordagem clinica que considera fundamental a participagio do meio ambiente na estruturacio da personal dade do paciente, 0 setting analitico 6 um instrumento im- Portante para que o paciente possa encontrar as fungées que Ihe possibilitardo 0 evoluir de sua personalidade, do seu eu. Os elementos bisicos do setting analitico foram for- ‘mulados por Freud a partir de sua experiéncia clinica, O setting mantém alguns aspectos constantes, © que possibi lita methor observagio do desenvolvimento do processo transferencial. Milner (1952) compara © setting @ uma ‘moldura ao redor de uma pintura, A moldura lembra-nos que 0 que esté dentro dela deve ser interpretado de forma distinta do campo extemno a ela. Trata-se de delimitagio de suas dimenses da realidade, ‘As associagSes verbais e pré-verbais do paciente po- dom, entio, ser entendidas ¢ interpretadas por ocorrerem dentro das dimensdes estruturadas pelo serng. Ele € deter ‘minado e formalizado tendo como objetivo a tarefa que se pretende realizar: a andlise, Pata Bleger (1967), € na imobitidade das constantes da situagao analtica que se depositam predominantemente as ansiedades psicéticas. Ble afirma que muitas vezes, ante ‘uma ruptura do setting, aparecem novas configuragoes do ‘material apresentado pelo paciente, No entanto, segundo ele, & quando o paciente o aceita completamente, que po- dom aparecer situagdes mais regressivas ocultas pela acei- {ago do analisando. Bleger pensa que, no comego do de- senvolvimento, hé uma indiscriminacio na dade mae-bebé, Ineroduao a (©.ego forma-se por um processo de diferenciagio. Para que {isso possa ocorrer € necessério, segundo ele, que 0 eZ0 e5- {eja incluido em um ndo-ego, do qual possa ir se iferenci ando, O ndo-ego dé o suporte para que o ego possa softer 0 processo de discriminagio, Sao as fungdes do ndo-ego que se transferem para o setting. ‘© que Bleger (1967) chama de nfo-ego parece asse- melhar-se as colocagdes feitas por Winnicott a respeito da Iimportincia do meio ambiente, que dé ao bebé 0 holding para que o processo de formagao de sua personalidade pos- sa acontecer Parece que é através do setting que © paciente vai buscar as fungées relacionadas as primeiras etapas do de- senvolvimento, para resgatar aspecios do eu. ( setting, parece-me, & composto de aspectos senso- riais ¢ nio-sensorias. Dentre os aspectos sensoriais, que se ‘procura manter constantes, estio o tempo da sesso, 0 es- pago onde a sesso se realiza etc. Denlre 0s aspectos niio- sensoriais do setting, estdo as fungdes psiquicas do analis- ta, a sua diseiplina em manter o trabalho anaitico, sua iden- tidade, atitude profissional etc. ara Winnicott (1954), se o paciente esté regredido, centlo, hi duas pessoas na sala (paciente-bebe e analista- ie). Nesses casos, de forma geral, 0 setting em psicandli- se representa a me, na medida em que transmite seguranga ‘0 paciente pelas funges que iré desempenar e represen- tar ao longo do processo. Segundo ele, essas fungdes seri- am o holding, a manipulagio, a apresentaglo de objetos. Dentro do processo psicanalitico, essas fungdes 50 exercidas pela conjugagio do manejo com 0 trabalho de imerpretagao. OSE a 2 ‘Momentos Mutativos em Psicandlise (© manejo earacteriza-se por: a) fornecer um setting ao paciente para que ele possa estar teanguilo ¢ livre de invasées; ) dar ao paciente o que ele necessita: nio-intrusio pela interpretagdo, presenga corporal atenta e sensivel na pessoa do analistaete.; €) aspectos de cuidado que s6 podem ser proporcio- nnados pelo ambiente familiar e social. /0 manejo nao visa satistazer os desejos do paciente, ‘mas fomecer pela adaptacio ambiental (setting), 0 que fal- ‘ou ao paciente no processo de seu desenvolvimento,/Se 0 ma- nejo € eficaz, para as necessidades do paciente, 0 trabalho de itnterpretagdo ser il para ele e no constitu uma invasto, Ea partir do estabelecimento das fungdes necessérias, © com a conseqiiente reintegracto dos aspeetos do eu do paciente que este teré a possibilidade de usar 0 terapeuta ‘como objeto de suas pulses, na transferéneia, a fim de po- der simbolizé-Ias com o auxilio da interpretagio e superar a compuisio a repetiao, Sea atitude do analista néo for suficientemente ade- ‘quad para levar em conta as necessidades psiquicas do seu paciente, este teré que reagir contra a invasio realizada e 0 eu verdadeiro do paciente petmanecers oculto, sem a pos- sibitidade de vi a ser esgatado, Passa a ocorter um proces- so de submissio as teorias do analista, sem que nenhum processo de ctescimento verdadeiro seja realizado. ‘A fungi de holding relaciona-se com a integragao da personalidade do paciente, No processo analftico, a0 se fomecer um setting confidvel, permite-se que 0 paciente realize as regresses necessérias para a elaboragiio posteri- cor. Winnicott afirma que, para que o terapeuta fornega esse 2 Introduce tipo de seguranga, ele precisa crer na natureza e nos proces- 0s de desenvolvimento que levam ao crescimento, O setting assim estabelecido permite também ao p: ciente o estado de nio-integracio, diferente da desinlegra- ‘¢80, que possibilita 0 aparecimento da associagao livre, da ilusio, do jogo e do espaco transicional na sesso psicoterdpica A falha do holding em pacientes muito regredidos pode ser experimentada com intensa angistia, manifestan- dlo-se junto com a sensagdo de desintegraglo, de queda de forma intermingvel, ow através do sentimento de aio poder confiar na realidade externa ‘A manipulagao relaciona-se com a unidade psicos- somatica, em que o psiquismo e o soma estio intimamente interligados entte si.A manipulagio deficiente vai manifestar- ‘se com uma coordenagio desorganizada, uma expressio po- bre de seatimentos através do corpo, por uma presen corpo- ral robotizada, por palidez,transpiracio, até vérnitos-“O- psiquismo estaré apenas vagamente relacionado com o compo. Na sesso de analise, essa funeao seré exercida pela possibilidade que o paciente terd dentro do setting forneci- do, ao manifestar seus estados psiquicos, de simbolizé-los ‘com a ajuda da interpretagio do analista, Evidentemente, 0 {erapeuta necessita ter uma presenga corporal sensivel, ter ‘0 seu psiquismo integrado com o soma para que possa acom- panhar interpretar as manifestagdes corporais de seu paci conte. Uma manipulagdo deficiente, diz Winnicott, impede ue o individuo possa desfrutar da experiéneia do funcio- ‘namento corporal ¢ da experiéneia de ser. A apresentagdo dos objets iniciae poe em movimento {as relagies interpessoais. O terapeuta éinicialmente um ob- 4 ‘Momentos Mutativos em Psicandlise {eto subjtivo, que seré used gradualmente pelo paciente através do process transfrencil como objeto de se im. pulos. Na medida em que ese “sobrevive” em sua funy analitica einterpretativa, poder permit que o paciente vt itegrando e simbolzando a sua vida instiniva ao longo do trabalho analitic. Esse dinanismos leva o pacente a avaliaraonipotécia de suas fantasies, uma vez que terapetta Mo se moifeae em &destrufdo ou sedzido por elas Se. pacente noes tio reredido, ovinulo da ses- so € triangular, © com fregiéncia o sering desempenha fangoes que em nossa cultura sto exercidas pelo pO pai tem sido representado como o “ambiente indestativel”, C ‘acterfsticesvalrizadas da me tas como a firmeza, a pon. tualidade ea auseridade, séo mas tarde associadan figura dl pa. Gragas a essa fungao, a erianga ousaexporimentar desiratvidade, pois haverd garaniacontaa mesma sexs tiralgoindestatvel contra o que se rebel O seting fan. cio 3s veres, come “ambient indestrutivel” © pai € tambem o tereciro, que Ihe dé um papel diseriminador, pois éessencialmente diferente da mie com «quem a crianga estavafundida, E com o pa, ou com aguete ae 0 representa, que a crianga apecnde 0 fato de um ser fhumano poder ser diferente dela mesma e também de ou. ts sees humanos. Oserting também pode vit a ser expe rimentado como o elemento dscriminador,promovendo una ruptara na enipoténia en relagio nates, muitan vezes desejada pelo paciente © pai também limita as FungSes pré-genitas eo de jo incestioso,promovendo a sua simbolizagio. Da mesma forma, o setting pode repesentar essa fungao limitafoa ¢ Auxiiar no proeesso de simbolizagio do deseo. Pee Introdugao 8 Hi ainda uma possibidade, quando a regressio € pro- Fonda, de s6 existir uma pessoa presente na sesso, apesar de, do ponto de vista do observador, existrem duas. Nesse ‘ca80, © analistaé apenas um ebjeto subjetivo do paciente. O nalista com 0 uso da interpretagio e do setting buscar ali ‘var as ansiedades persecut6rias do paciente, com o objetivo de ajudi-lo a existr ou volta a existir como pessoa total SETTING E MOMENTOS MUTATIVOS Dentro do proceso psicanaitico, existe dois as- pects do trabalho que ajuda na mobilizag,transforma- 60 evolugao da personalidad do paciente primeito,proporcionad pelo trabalho, «cada ses- so, com as angst, as dofesas ea transfréncia, 6 0 tra balho pacente feito no decorter de wm longo periodo em ue as trasformacéesesnsiehtsconsepuidos somam-se a0 longodo tempo, Neste trabalho, chamo esse movimento de *peifodos mutativos” O segundo ocoire quando jf hé certa confianga estahelecida no processo, O paciente sente que o anlista Ihe di holding e cle (0 paciente)busea expor nessa nova relago uma necessade que no pode ser satiseita ao Lon- 20 de seu desenvolvimento, na esperanga de que o anaisa © compreenda satisfazendo assim, de forma simbélica, 0 aque busca para completa a evolugao de sua personalidad. F 0 encontto dessa necessidade com 0 objeto procurado que cham aqui de “momentos mutativos” Quando o analista no pode compreender 0 que o pa- ciente buseana sesso e persist em um trabalho interpre 6 Momentos Mutatvos em Pricandlise tativo, que niio leva em conta as necessidades psiquicas do paciente, que nfo puderam ser supridas pelo meio ambie {eao longo de seu desenvolvimento, com freqiléncia,o pro ‘cesso entra em uma situaeio de impasse; 0 paciente revive na situagdo transferencial a nio-compreensiio de suas n eessidades, levando-o a viver uma situagio de intensa an- alist que pode paralisar © processo terapéutic. Neste lio, procuro entocare esclarecer os dinamis- ‘mos na relago paciente-analista que favorecem 0 apareci- ‘mento do fendmeno que chamo de “momentos mutativos”. A compreensdo desse fendmeno pode favorever a amplia ‘940 de nosso trabalho com os pacientes, de forma a ser pos sivel acompanhiarmos a busca que eles empreendem para ‘completar o seu desenvolvimento psfquico, Apresento aqui o resultado da abservagio de proces- 0s psicanaliticos com iniimeros pacientes de diferentes qua- ‘dros psicopatol6gicos, ede diferentes idades (criangas, ado- lescentes e adultos) ao longo de doze anos de trabalho, Descrito de forma breve, 0 setting usado pura a ob- servagio dos fendmenos abordados neste trabalho fo 1. 0 paciente & visto em horas preestabeleci comum acordo, 2. Nas horas marcadas, 0 analista compromete-se ‘comparecer pontualmente, 3. Cada sessfo tem um tempo limitado e, durante esse perfodlo, o analista esté escutando o paciente atentamente 4. 0 objetivo de cada sessio ¢ acompanhar os proces- 08 psiquicos do paciente, para tentar compreendé-10s e em seguida comunicé-la em palavras, 5. 0 trabalho é realizado em uma sala trangia, que ormalmente permanece constante ao longo do proceso. de Cee Introducao a 6. O analista se abstém de introduzir detalhes de sua vida pessoal e, também, mantém o julgamento moral fora da relagao. 7. O analista procura compreender as diversas refe- réncias fitas a ele pelo paciente sem reagir a elas de forma 8. O analista & pago pelo trabalho que realiza 9. Oniimero de sessies semanais pode variar de acor ddo com o estado regressivo do paciente e dus necessidades psiquicas que este apresenta, 10. Otérmino do proceso ¢ realizado de comum acor- do, quando se considera que os objetivos do trabalho foram aleangados (maior tolerancia a depressio; capacidade de re paragdo; maior contato com a vida interior; prazer de usti- fruir a vida e estabelecer vineulos significativos; maior ea pacidade de auto-anslise et.) Baranger (1961-62) afirma que analista esté na sua fungao, queira ou ndo, como uma pessoa sueita também 20, proceso que esta uilizando. O analista assume uma dire 40 efetiva do provesso que est realizando com a simples Imposicio do enquadre particular que utiliza para trabalhar, através da eleigdo das intexpretagbes que proporciona a0 analisando. Nesse sentido, dentro do modelo psicanaltico, hilo se pode falar do estudo do fato psiquico Sem se levar em conta o psiquismo do pesquisador. Os objetos da inves- tigagio analitica fazem parte também da vida psiquica do dobservador. Esse fato tanto pode contribuie para elucidar os fendmenos observados na sesso, quanto para oculté-los. Portal razio, 6 fundamental para esse tipo de investigagio ‘que o psicanalista tena a possibilidade de auto-analisar suas reagOes contratransferenciais, a im de ampliar seu espaco Es Momentos Mutativos em Psicandlise ‘mental para adquirir melhor contato e compreensio da rea- lidade psiquica de seus pacientes. Dessa forma, sera vital ue o investigador, nessa dea, tenha-se submetido ao prd- prio processo que utilizara no seu trabalho de investigaeao, AA anilise pessoal do pesquisador-psicanalista € 0 que po. derd dar a ele maior possibilidade de aproximagao de seu objeto de estudo: o psiquismo humano, Procuro ao longo deste livro abordaro fendmeno que denomino “momentos mutativos” a luz de alguns coneei- tos fundamentais da técnica psicanalitica A dinimica transferéncia-contratransteréneia & a base do processo psicanaltico. F devido a ela que as transforma: _gdes na personalidade do paciente podem ocoret Este 0 tena do primeito capitulo. Nele, discuto a emergéncia do espaco potencial dentro do jogo transferencial que possibilita © apa recimento das condigses necessrias para momento mutativo, Para ir em busca do objeto e da Fungo necessitados, 0 paciente regride até as etgpas do desenvolvimento onde hou ‘ve uma faa do meio ambiente. © tema do segundo capitulo a repressio nos seus aspectos construtivos, ou seja, a favor aevolugio da personalidade e nos seus aspectos destrtivos, isto é, contra a evolugdo da personalidade, © terceito capitulo trata da buses do objeto. Nele, es- tio descritas as principais fungdes do meio ambiente que facilitam e promover a evolugdo do eu e da estruturagio dia personalidade. Aqui também 6 desenwolvide 0 conceito de ligo de objeto, promotor do momento mutativo, © capitulo quarto aborda 0 conesito de resisténcia. 0 objetivo € diseriminar o fenomeno da resisténcia, da comu- nicagio pré-verbal, que grande parte das vezes emerge em forma de ato | 39 Invodueao © auinto capitulo € dedicado 2 interpretagao. f res- saltada a mportania dese respeitar na formulagao da in- terpetagio, o momento regressvo do pacente. Disete-se 4 ulldade de se levarem conta a psicologia evolutiva na interpretagéo ‘Ao longo dos captlos sto apresentados alguns ca- s0s clinicos que permitem a observagao dos conceitos dis- ceutdos na pric elinica, Relacao Analitica 1 e Possibilidade de Emergéncia dos Momentos Mutativos ‘A nogdo de transferéncia comeca a aparecer nos tra- balhos de Freud ja em 1895 no seu Estudo sobre Histeria, No capitulo TV, Freud afirma que 0 conteddo do desejo emerge na consciéncia do paciente sem qualquer recorda- io das circunstincias que o rodeavam © que o teviam recolocado no passado. O desejo era eno associado & fi- sgura do médico através de uma “falsa conexao” Em 1900, no trabalho A Tnferpretacio dos Sonhos, Froud chama de transferéncin 0 processo de elaboragio onitica, quando o desejo inconsciente, nfo podendo chegar A consciéncia diretamente, burla a censura inserevendo sua ‘carga em um resto diurno pré-consciente, A situacZo analitica favorece a emergéncia dos desejos reprimidos que, por sua vez, investem na figura do anaista «em lugar dos objetos originals. Oanalista funciona aqui como ‘resto diumo do sono. Ao mesmo tempo, favorece a emer- séncia do reprimido e da censura, & a solugdo de compro- :misso presente no sintoma, no sono, na transferéncia, A tworia da transferncia é mais amplamente desen: volvida por Freud, em 1905, no epflogo do caso Dora. Du- rante 0 tratamento analitico, a neurose deixa de produzir a Momentos Mutativosem Psicandlise novos sintomas, porém seu poder nfo se extinguiu e se ma- nifestard na eriagao de um tipo particular de formagiio de pensamentos, na maior parte das vezes inconscientes, que foi denominado de transferéncia, ‘Assim, o paciente reviverd um conjunto de experignei- ‘as emocionais como pertencentes a sua relagio com 0 analis- ta, sem reconhecer que se trata de vivencias no passado, Freud, nesse mesmo trabalho, afirma que o tratamen- {o ndo cria 2 transferéncia, mas a revela, e que o fendmeno que poderia ser o maior obsticulo a andlise passa a ser 0 seu maior aliado, se for detectado ¢ relatado a0 paciente. Ferenczi da uma importante contibuigio, em 1908, 20 cestudo da transferéncia. Mostra que atendéncia a transferir um trago fundamental da neurose. © paciente submetido a0 Principio do prazer distorce a realidade conforme os seus desejos. através da transferéneia que paciente vera o seu analista luz de seus desejos, Ferenczi descreveré como, atra- vvés do mecanismo de introjeea0, © pacienteintrojeta 0 obje- to ao sou ego para hes transfer seus sentimiento. ‘Vemos agui diss colocagdes: 0 papel do prinefpio do. prazer © da introjectio na constituigio do fendmeno transferencial, Esses temas serio ampliados anos mais ta «de por Melanie Klein Em 1912, em A Dindmica da Transferencia, Freud ‘mostra que se a necessidade de amor de um individuo nio se encontra inteiramente satisfeita em sua vida rel, tal pes. soa estaré sempre em atitude de busca, ante & quem conhie- {ga ou encontte, sendo provivel que a libido consciente © inconscienteestejam envolvidas nessa busee. A porgio cons- ciente da libido estar envolvida na busea de forma realis- ‘segundo 0 processo pri- 1a, enguanto a inconseiente 0 fa Relasao Analtica e Possibilidade de Emergéncias dos 43 so, em nica de desargs. Det da nie, ibido tneatfeta do pln se comet 20 aan, buseando Pesermos aver dz gus ibid conscente, sob dermoid ego pe or slna ovine coopera dopcient carn anal, ara jos mane o roses- {avai op mucin eagunt bid nconscons vn thle essa lagi 8 fara a0 proceso pinata Bin 1924, om Recordao, Repetto e Baborado, pred eter a eid ence ransterenin resncin, que jahavia eto em 112, Enguantoo tanto se prope a descr suas pasadas patois, ememora ee poraue vet a fombranga manors aa i ga de Teor paciene pass aie paraiso 0 eemeno fal suc t concogo coma stage pest Nognanto, reed atin, esa epoca, que ofninigo nae a eke meme No an de 1920,em fis Al do Principio do Prax chreptto. Tn Frou, om 0 Egos Mecanamos de Defs, de 1936 organiza esa mesma questo dzendo que hi ans feditia de inpulsose de defsa atruserntn eq éfesivamete um elemento stants nu raga ana, Jeo etntncin do imulos do emer eo, de istinos dod questo sents pelospaciens come esas Asia personalidad; tferénta de defesas te repetndo os atgos pas infants de fnctonanen- todo ego. Nese caso a tansferenianio 6 considrada Ae eo HE ore 4 Momentos Mutativos em Psicanelise Com respeito & atuagdo na transferéneia, Ana Freud diz que hé momentos em que a wansferéncia se intensifiea © © paciente rompe 0 enguadre analitica, Nesse momento, omega a atuar tanto os seus impulsos quanto as suas def sas contra os sentimentos transfereneiais no seu cotidiano, Lagache, em Some Aspects of Transference, 1953, faz uma contribuigio valiosa para 0 estudo do fendmeno cenfocado neste trabalho. Para ele, na repetigao transferencial, estd presente sempre o desejo de completar algo que restou incompleto, de fechar uma estrutura que ficou aberta, de ‘encontrar uma solugZo para o que se apresenta sem resolu- io. E clara aqui a influéncia da Psicologia da Gestalt. 0 Psiquismo busca certas integracées, experiéneias que fal- tam para por em marcha a sua potencialidade, Por exemplo, um paciente que repete com o seu ane lista uma relagio sédica, estaria também buscando uma so- lugdo para o seu sadismo, para a destrutividade presente em seu psiquismo, Assim, os problemas no concluldes que surgirdo na transfer€ncia so, por sua importéneia, os que ficaram sem solugo em etapas decisivas do desenvolvimento e necess tam de uma relagio objetal para superi-los. Esse aspecto da apresentago de Lagache parcce-me interessante para a clinica psicans locagdes aspectos que se assemelham ao que Winnicott de- senvolve como a “busca de um objeto” e 0 que Bion des reve com 0 seu conceito de “continente”. Esses elementos serio desenvolvidos mais adiante neste trabalho, Melanie Klein com seus trabalhos forneceu uma com: preensio mais ampla do fendmeno transferencial. Ja em 1929, em Personificagdo nos Jogos das Criangas, Klein Relacao Analtica e Possibilidade de Fmergéncia dos 48 ‘mostra que a transferéneia tem relago com a personitica- ‘glo. Gragas a1um mecanismo de dissociagdo e projecio, 0 ‘ego consegue diminuir 0 conflito intexno com o superego c ‘com o id, colocando no analista as imagos internas que Ihe provocam ansiedade. ‘Vemos aqui, nessa contribuigao, o conceito de trans- feréncia baseado nos mecanismos de projegio e introjegaio do objeto interno, Em 1952, emAs Origens da Transferéncia, Klein afr ma que a transferéncia opera a0 longo da vida € influi em todas relagdes humanas. No processo analitico, 0 passado vai sendo revivido gradualmente e quanto mais profunda- ‘mente penetrarmos no inconsciente, ¢ quanto mais para trés possamos levar © processo, maior ser a compreensio da transferéncia, As clapas precoces do desenvolvimento sparecem natrans- fertncia, Dessa forma, 6 possivel eapi-las ereconstrut-as. ‘Com a teoria da fantasia inconsciente, a compreensio da transferéncia se amplia. O conceito de fantasia foi discu- tido por Susan Isaacs em 1948, Segundo ela, a fantasia esté ‘sempre presente e em atividade. O analista pode, ent, in terpretar toda vez.que conseguir eaptar de que forma a fan {asia inconsciente est atuando na relagdo Iransfereneial Assim, Klein, com 0 auxilio do conceito de fantasia in- ‘consciente, pode afirmar que a transferéncia opera nio $6 nos momentos em que o paciente se refere ao analista de forma dliteta ou inditeta, mas também que esti presente continua- mente e que se tata entio da possbilidade de detecté-la ‘As fantasias aglutinam as ansiedades persecutérias © depressivas, sendo essas as angiistias que o trabalho interpretativo transferencial buscaré enfocar 46 Momentos Mutativos em Psicandlise ‘Ouiro conceito fundamental para 0 estudo da tansferén- cia € a descrigo que Klein faz da identificagio projetiva innvojtiva. Fsses dois mecanismos viio permitir compreender manifesagdes trnsferenciais que a6 entio ni eram possiveis de setem estadadas e intepretadas pela tenica psicanaitca ara compreender o que se passa na connunicagio exis lente no vinculo mie-bebé e analista-analisando,| Bion] (1963) fara uso de quatro conceitos conjuntamente; 0 de continente e o da capacidade de verie,aliados aos de iden- tificagio projetiva e intojetiva, ( analista ao receber as identificagées projetivas de seu analisando e conté-las (recebé-las sem buscar descat a), (ransforma-as pelo emprego da sua capacidade de reverie (possibilidade de transformar elementos compos- tos de sensorialidade e sensago, tendentes a evactagobes e ‘descargas, em elementos passiveis de serem pensados), em. terpretagdes que favorecam ao analisando entrar em con- {ato com a sua realidade psiquica, Winnicott, baseado no estudo do desenvolvimento ‘emocional primitivo (1945), vai mostrar em set trabalho sobre a transferéncia (1955) que, quando o desenvolvimen- {to emocional primitivo falha, © que nés temos de fazer & dar ao paciente a oportunidade de reparar essas falhas, Nos neuréticos, ito é, nos pacientes em que a situaglo edipica se estruturou de forma satisfa6ria, poderemos contar com a técnica classica. No entanto, aqueles pacientes que tive- amo seu desenvolvimento perturbado necessitardo regredir ‘no enquadre analitico, a fim de encontrar uma experiéneia conereta que Ihes permita retomar © seu desenvolvimento, Aqui set importante compreender a fungio da “mie suficientemente boa” no desenvolvimento do bebé, | Relagio Analitica e Possibilidade de Bmergéncias dos 47 (0 “falsoself" um aspeeto do self que protege ¢ cculta © self verdadeiro como reagao as falhas na adaptagio. O “falso self organizase como um paddo de conduta que corresponde a falha ambiental Esses conceitos, transportados ao processo psicanall- tico, permitem-nos compreender a necessidade de deter- rminados pacientes em ter 8 oportunidad dentro dessa nova cexperiéncia de voltar ao ponto de partida e iniciar um novo desenvolvimento de seu self verdadeiro, Nisso é fundamen- tala compreensio do analistae a capacidade de nio interfe- rir com o processo de regressio necessério para a retomada do desenvolvimento psiquico do paciente. Tanto utilizando-se do conceito de_raverie de Bion, quanto o de “mie suficientemente box” de Winnicot, esta remos encariinhando-nos para a importncia da instrumenta- lizagao da personalidad do analisa para que o processo psi canalitico progrida de maneira saisfatéria, Precisamos levar em conta, evidentemente, a questio da contratransferéncia. Freud, em As Perspectivas Futuras da Terapia Psica- attica (1910), introxtuziu 0 termo contatransferéncia, Nes- se artigo, Freud afirma que o faturo da terapia psicanalitiea baseit-se em tes grandes fatores: 0 progresso interno, 0 in ceremento de autoridade ¢a repercussdo geral do trabalho dos analistas. Como progresso interno, Freud parece referr-se ‘0 desenvolvimento da terapia e prética psicanalitiea; 0 in- ‘cremento de autoridade significa que, ao longo do tempo, a ands iré merecendo o apoio e respeito pablico; e, na medi- dda em que o trabalho dos analists influ no meio social, isso também repercute em favor da Psicandlise, Quanto ao progresso interno, Freud menciona que a ampliagio do estudo do simbolismo possbilitaia um co- 4s Momentos Mutativos em Psicandlise hecimento maior do inconsciente; cita também a impor- tincia de se conhecere superar a contratransferéncia do ana lista. Afirma que nenfum psicanalista pode ir mais longe a investigago do psiquismo do seu paciente do que Ihe ppermitem seus complexos e resistencias, Freud considera também que a téenica analitica haveria de adotar certas ‘iodificagbes compativeis com a forma da patologia que se busca tratar. Ele menciona a contratransferéncia como um fendmeno que pode funcionar como um obstéculo para o progresso da Psicandlise ‘A solugio para a questo da contratransferéncia pro- Posta por Freud nesse artigo é 1 auto-anslise, mais tarde em 1912 propord como norma a anilise do analista ‘Theodor Reik (1937) apresenta um trabalho interes- Sante em que sfirma que se o analista tem uma atitude re- ceptiva e confia mais na intuigho que no mero raciocinio, poderd captar melhor o que esté se passando no ineonsci tente do paciente, pois hé uma captagto intitiva de incons- ciente 2 inconsciente, como Freud ja havia mencionado em 1915 no artigo O Inconsciente. Reik diz que oanalista deve deixar-se surpreender pela ‘emergéncia de seu inconsciente para ter 0 insight na sesso ‘com o seu paciente. Entretanto, apesar de essas colacactes estarem diretamente relacionadas & contratransferéncia, Reik rio chega a mencioné-ta em seu artigo, ‘A contratransferéncia ¢ estudada mais profundamen- fe anos mais tarde por Paula Heimann (1950) ¢ Racker (1968). A contratransteréncia 6 deserita como a resposta emocional do analista aos estimulos que provém do paci- ente, 2 contratransferéncia & o resultado da influéncia do ‘nalisando sobre o inconsciente do analista ‘Relagao Analtica e Possibildade de Emergéncias dos 49 Ambos autores enfatizam a importincia da contra- transferéncia como instrumento de trabalho do analista. Até cent2o, ela era vista principalmente como um obsticulo ao processo psicanalitico; as suas contribuigdes encaram 0 fe ‘nOmeno como um instrumento itl e sensfvel no desenval: vvimento da andlise, (0s conceitos de transferencia e contratransferéncia tiveram uma evolugdo hist6rica semelhante, Inicialmente, foram encarados como obstéculos para, gradualmente, pas- sarem a fazer parte da técnica psicanalitica como instru- ‘mentos importantes no desenvolvimento satisfatério do proceso, Racker sugere que a contratransferéncia pode influ enciar 0 processo de trés formas: como obstéculo, quando, devido a pontos cegos, 0 analista €incapaz de compreender © paciente; como instrumento, que auxilia 0 analista a cap {taro que se passa com o pacientes € como campo, em que © paciente pode adquitir uma expeviéneia diferente da que {eve otiginalmente. ‘Também classifica dois tipos de contratransferéneia: concordante, quando analista identifica seu ego com 0 ‘ego ou as partes da personalidade do paciente; complemen- tar, quando o ego do analista se identifica com objetos in- temos do paciente, Para ele, as identificagses concordantes so empiticas ¢ expressam a compreensao do analista, en- {quanto as complementares indicam a presenga de contlito, [Na medida em que o analista falha na identificago concor- dante, intensifiea-se a complementar. ‘A possibilidade de o analista compreender, enfatizar ¢ intuir a realidade psfquica do paciente esté relacionada ‘com a identficagio concordante, segundo Racker: 50 Momentos Mutativos em Peicandlise ‘A meu ver, o fundamental & 0 uso que 0 analista dar ’ idemtificagao concordante ou complementar endo tanto o tipo de contratransferéncia, para que o fenémeno seja utili- zado produtivamente para 0 bom andamento do proceso analitico. Freud, Klein e Bion consideram a contratransfe- ‘@ncia sempre uma perturbagdo, a principio, Somente quan- do o analista submete-a a um tabalho de anslise, podendo éentido compreender o seu sentido, € que ela se torna um ins- trumento itil profissional necessta wilizar-se de sua fungi ana- lita para transformar o que observa em sua contratransfe- ‘éncia em compreensio do que se passa no vinculo analis- ta-paciente Leon Grinberg (1976) contribui para o estudlo do fe- ‘ndmeno em questo com o conceito de “contra-identifica ‘0 projetiva”. Segundo ele, o conceito estaria relacionado 0s efeitos reais produzidos no objeto pelo uso peculiar de identificagses projetivas provenientes de personalidades te- _gressivas, Na “contra-identifieacio projetiva”, o analista vé-se obrigado a desempenhar um papel que Ihe é forgado pela violencia da idemtiticagio projetiva do paciente. No caso, no entram ei jogo os conflitos inconscientes do analist, ‘mas trata-se de uma reagdo provocada pela intensa identifi. cago projetiva do paciente. As concepgdes de Grinberg quanto a essa questo ‘aproximam-se das de Bion (1962). Melanie Klein (1946) dlesereveu a identificagio projetiva como uma Fantasia oni- Potente, quando o individuo coloca no objeto partes de seu self com as quais fiea posteriormente identificado. Bion, quando fala de sua “tela beta", nfirma que, gragas a ela, 0 | Relagdo Analtica e Possibilidade de Emergéncias dos St cine, aves da dentine projets provocd re mete emoges no tai, nd a tratando de wma fatasiaonipotent, A ientiteag € agit um elemento fandametl na comunicagao de aspctos dela pt auie,priveipalmente quando se tata de exten protur- des enoaios do puigusme, O casera parse se gu main ponn, gts 2 sus anne pessoa, dbsctvar ess vvencis contains ferenciis ato aval, para que consign compreen der mais aplament oe pacene ves ds ssn do pete da observa de sum cotta, sala poder apr doings, ragentagis, eens projets qe opie esr blends permit gu sopranos do igus do pate pos ser meypetos engrossed anasaepcete, Maile vers, eeests da cele Se elle etal le a dec iets pla pinta ver, podendo sofor una evolugio trv det do proceso de bao ‘A cbsrvaglo da ranserécao contatansfefnca Force un visa masala ttl do qu oom ele par anaes, Podee compar ea ponblidade com a ftir a visio inocula, quo perme apterhlo db perspotivaeprofundade de una conn fore sa vis ha ini a lao pet ao salsa inne ecards peguias do pein que alo ania acesies de uta forma para observa d nai. Bo detctardesan necessidades pages que Perit 2 na, lista eer a su nia para gue clase adept aac tscay pigs apresetades pelo sen patente naguele momento espectice da esto, x Momentos Mutativos em Psicandlise 0 trabalho continuo com a transferéncia e contra transferéncia que fornece ao analista as informagies neces sirias para questées como o contetdo, 0 tempo o estilo da interpretagao a ser dada a0 paciente, ‘© analista busca auxiliar seu paciente a ir ao encontro de seu inconseiente, de sua verdad, mas necessita apresentar esses contetidos de tal forma que o pciente possa assimilétos, ‘Aqui deve ser retomada a colocagio de Bion da mie ‘com capacidade de réverie & a de Winnicott da “mie sufiei: entemente boa". Winnicott afirma que a “mic suficiente- ‘mente boa” é aquela que efetua uma adaptagao ativa 3s ne cessidades do bebé, uma adaptacdo que diminui gradativa- ‘mente, segundo a ctescente capacidade deste em aquilatar © fracasso da adaptagio e tolerar os resultados da frustra. 0. Essa adaptagio, segundo Winnicott, exige uma preo- ‘cupacao (concer) fécil sem ressentimentos pars com 0 bebe; @ éxito nesse processo depende mais da devogao ‘io do jeito ou esclarecimento intelectual Ao Falarem devogdo, estamos falando em amore iden- tificagfo, que possibilita 8 mie compreender as necessida- des de seu bebe. © que possibilita ao anatista funcionar em seu traba- tho como “a mae suficientemente boa”, para que possa for- never ao seu paciente intervengies e interpretagdes adequa as ao seu momento psiquico? ‘A anlise pessoal do analista deve ter proporcionado ‘ete o estabelecimento de uma confianga nfo s6 no método {que emprega, mas também na importancia e beneficio con- seguido com o aumento do seu contato com a sua realidade Psfquica, Talvez sejam esses aspectos que conteibuam para estaelecimentodagilo que Bion chamou dee" Oana- elagdo Analitica e Possibilidade de Bmergéncias dos 53, lista através dessa confianga ou (6, busca persistentemente 1 verdade psfquica do seu paciente, com a consciéncia de que € iso que cle poder oferecer de bom e enriquecedor Aquele que o procura. O vinculo com o seu paciente estar miarcado pela solidariedade, pelo reconhecimento do sofri- mento psiquico, que ele conheceu e conhece, perante o qual se inst ago das ansiedades pritni- tivas conseguida em sua andlise pessoal ‘Um outro fator que contribui decisivamente para que © analiste possa funcionar como essa “me sulicientemente boa” dentro da sesso com o seu paciente & 0 fato de poder estar em contato com o bebe que ja foi e com os objetos que foram introjetados a0 longo dos anos, que contsibufram, ‘com 0s cuidados das mais diversas formas, para que esse bobé chegasse a sofrer uma evolugiio, Esse aspecto basta {e importante, combinado com os demais, permite a0 a lista fornecer para o seu paciente as interpretagdes necessi- {adas por ele em uma forma passivel de ser assimilada, Money Kyele, em 1956, comenta que a contratransfe- réncia pode ser adequadamente instrumentalizada a partir de uma dupla identificagio do analista, com o sujeito © © seu objeto, que para realizar a sua taefa precisa colocar-se nos dois lugares Isso acontece, segundo ele, pela identifi cago projetiva do ego infantil do analista com o paciente © pela identificagéo introjetiva da figura parental. Denomina esse processo ce contratransferéneia normal; 0 analista as- sume o papel do pai projetado pela erianga e, por outro lado, pode compreender o papel da erianga, nfo s6 gragas& posi: 40 de pai, mas também a partir de uma identificago projetiva do seu ego infantil como paciente, mobilizada com sua tendéneka a reparar, nentalizou pela el co Momentos Mutativos em Psicandlise Money Kyrle triz em seu trabalho, além da contribui- ‘io para o estudo da contratransferéneia da participagio dos ‘mecanistos projetivos e introjetivos dos aspectos infantis & ‘acluros do psiquismo do analista, a questio da reparacfo, trabalho do analista certamente é uma atividade que visa reparagio como forma de o analista lidar com as suas ansiedades depressivas. A reparagio qui parece estar rela- cionada a busca da verdade como fator “curativo” da reali- dade psiquica Parodiando Winnicot, pode-se dizer que 0 “analista su ficientemente bom” necessitate confianga no método, fé na verdade, ser solidrio ao seu paciente eestar em continuo eon {ato com os fundamentos de seu psiquismo, para que todos esses prinefpios possam ser usados em func do seu trabalho. A situagio da andlise € tiangulada, 0 analista € soli- dario com o seu paciente, muitas veres amando-0 ou od aando-o, mas 0 objeto do analista € o seu trabalho, sua tarefa {ue foi estabelecida pela sua opgiio profissional E na complexidade desse interjogo de transfer€ncia- contratransferéncia que processo progride ou paralisa, Se 4 transferéneia ou contratransferéneia ndo pucler ser eom- preendida e elaborada, 0 proceso poder chegar a um impasse. Mas seré também pela compreensio do dinam 'mo desse vineulo que poder ocorter momentos de insight, omando-se mutativos dentro do processo psicanalitco. Hi na Sessio uma superposigdo da realidad psiquica do paciente-com a do alist, favorecendo a eriago de um campo ‘que permite a simbolizago dos conetdos psiqucas do paciente, Esse campo criado pela interagio da transferéncia com ‘contratransferGneia conrespondle a0 que Winnicott chamou de “espago potencial” Peewee | | Relagdo Analitica e Possibilidade de Emergéncias dos 55 Oespago potencial éo lugar onde ocorre a comunica ‘qo significativa e transformadora, A respeito do seu esta- belecimento, Winnicott (1953) menciona que todo indivi- duo humano no comeco de seu desenvolvimento, em um ambiente que Ihe é proporeionado pela me, ¢ capa de con- ceber a idéia de algo que atenderia A crescente necessidade que se origina da tensfo instintual. Nessa situagdo, a mae se presenta dando o seu seio & crianga necessitada, Essa adaptaglo da mie as necessidades do bebé di a cle ilusio de que existe uma realidade externa cortespon- dente & sua capacidade de criar. Hf uma superposigio entre ‘0 que & mie supre e © que a crianga poderia conceber. 0 bbebé recobe de um seio que faz parte dele ¢ a mie dé leite a ‘umm bebé que € parte dela mesma. E dessa inerseegio entre a realidade psiquica do bebé eda mie que emerge 0 espago transicional, a drea da ilusio potencialmentecriativa. Aqui, trata-se de uma ilusdo que 10 visa i negagzo da realidade exterma ou interna, mas, 0 con- (rério, a uma iusdo que favoreca aemergénciae simbolizaco da realidade intema, permitindo o estabelecimento do conta- to com a realidade externa de forma eriativa, ‘A cexisténcia desse espaco possibilita que a crianga encontree erie © abjeto de que necessita sem se sentir inva- ida pelas injungées do meio ambiente E nesse espago — que contrasta com a realidade in- terna do bebé e da mle e também com a realidade externa — que surge a possibilidade de o bebé existir sem precisar reagir is experiéncias do meio ambiente, ser capa de olhar ‘© mundo eriativamente, encontrar e usar objeto necessita- do, ter experiéncia de relagdes objetais que, uma vez imternalizadas, passam a estruturar 0 seu mundo interno. 56 Momentos Mutativos em Psicandlie [Nesse sentido, é importante sublinhar que © bom ob- {eto nio & simplesmente 0 objeto que gratifica as necessi- ‘dades instintvas do bebé, mas é o objeto que, através da celaboragzo das idemtificagdes projetivas recebidas, pode de- volver compreensio no trato com o bebs, permitindo que 0 seu psiquismo possa evoluir ‘Um paciente de treze anos de idade diagnosticado como Psieético disse ao seu terapeuta depois de dez meses de tra- balho: "Quando eu te conheci, pensei que voe8 fosse um lo- bisomem © que quisesse me comer; depois, achei que voo8 era de vidio se eu encostasse voot quebrava; agora, sei que ‘voce ¢ filtro onde poe égua suja esa gua limpinha pra beber” sxe menino, com tal associaedo, expressa de forma interessante a sua compreensio da fungdo elaborativa do objeto. [No campo terapéutico, podemos nos servir do con- ceito de espago potencial para investigarmos as manifesta- ‘Ges do interjogo da transferéncia-contratransferéncia, Green (1975), contribuindo com o estude dessa ques- ‘0, afirma que o analista nfo é um objeto real e nem un objeto imaginério, e o discurso analitico ndo é o discurso do paciente, nem & o do analista e nem a soma dos dois. Para Green, o discurso analitico é a relagdo entre dois discur- ‘sos que no pertencem nem a0 campo do real nem a0 do ima- inrio, Essa telagdo vai ser chamada por ele de “relaciona- ‘mento potencial”, 'No entanto, o aparecimento do espago potencial no proceso psicanaltico nio é tarefa simples, Winnicott (1953) enuncia sua tese dizendo que a psicoterapia se efetua na sobreposigio de duas seas do brin- car: a do paciente © a do terapeuta. A psicoterapia tata de Relagao Analtica e Possbilidade de Emergéncias dos 57 dduas pessoas que brincam juntas. Em conseqiléncia, quan: 40 o brincar nao € possivel, o trabalho efetuado pelo terapeuta ¢ dirigido, entéo, para trazero paciente de um es tado em que nfo € capaz.de brincar para um estado em que (0 6. Pata ele, isso também se aplica aos adultos. Nestes, 2 ccapacidade de brincar manifesta-se naescolha, nas inflexdes dla vor, no senso de humor e, adicionarfamas, na capacida- de de usar o contexto analitico e a transferéneia como ins- trumentos de evolugdo da sua realidade psiquica, Da parte do analista, esse processo também vai de- pender da capacidade que teré de fornecer ao seu paciente lum campo onde este possa expressar-se sem ser excessiva ‘mente invadido por interpretagdes desnecessérias ow fora do tempo de elaboracio do paciente, ‘© “brinear” do analista pode ser deserito como a ha bilidade de usar o estilo, o tempo da interpretagio e o en- ‘quadre como procedimentos que favorecam a expresso de aspectos da mundo interno do paciente © a sua posterior claboragao, Enteetanto, algumas vezes, a0 lado de seu paciente, & © analista que nao sabe brincar. E aqui estamos diante da questi da contratransferencia mencionada anteriormente, ‘A capacidade de brincar exige cert flexibilidade do analista, conseguida pela elaboragao de suas angistias em sua andlise pessoal, pela identificagdo com os objetos que the prestaram cuidados ao longo dos anos e pelo contato com 06 aspectos primitives de seu psiquismo, Um Fator m= pportante também é a forma como o analista velaciona- com a Psicanilise, pois se 0 analista relacionar-se com a sua cigneia de Forma dogmética ou religiosa, néo poder utilizar-se dos elementos que a Psicanélise fornece para te sa Momentos Mutativos em Psicandlise alizar 0 seu trabalho de forma criativa, Mas esse é um pon: to que também precisa ser abordado na andlise pessoal do analista Passarei a apresentar um caso elinico, a fim de ilus- rar as quest6es discutidas acima, MARCIO: 0 CONGELAMENTO DO SELF “Mircio era um menino de teze anos quando seus pais, sob a orientagao da escola de seu filho, procuraram uma psicopedagoga para ajudé-lo nos seus problemas escolares. primeiro contato dele com a psicopedagoga foi de imediato curregado de tens e angistia, Quando Mércio foi chamado com sua mie na sala de espera para a primeira centrevista com a profissional, ele entrou com sua mie, mas de costas. Ao entrar na sala da psicopedagoga, teve uma cise de choro e saiu corcendo em direcao & mua, onde sua ime foi buscé-lo, ‘Apés nova tentativa, a psicopedagoga conseguiu con- tato com Marcio c encaminhou-o para um estudo de caso, esse estudo, foi constatado que Mércio tinha pro- fundas perturbagdes emocionais e que suas dificuldades es- ccolares eram resultado da forma como ele lidava com suas angtistias. Ao final do estudo de caso, foi indicado um aten ddimento psicoterépico para Métcio, [Na primeira entrevista, compareceram Marcio, seu pai pai de Mércio tinha quarenta e dois anos, era enge- hnheiro em uma empresa multinacional hi oito anos. Mos trava-se preocupado com 0 comportamenta do filho. Dizia Relapao Analtica e Possibilidade de Emergéncias dos 59 que ofilho era muito Fechado e no fazia amigos; na escola cra tejetado pelos demais. Procurava incentivar Marcio a fazer contatos. Achava também que nio conseguia fazer Contato com o fil, ‘A mie de Marcio tinha trinta e nove anos ¢ dedicava- se totalmente ao lar. Era uma mulher bastante angustiada, enquanto falava torcia as maos e com frequéncia interrom- pia a fala de sew marido para acusé-lo de nio compreender o filho, Ela tinha tido um epis6dio depressivo apés 0 nasei- ‘mento do filho, quando seu pai, avd de Métcio, faleceu, ‘Tr€s anos depois do nascimento de Marcio, ela teve Marcio e sua irma brigavam com freqiéncia, ‘Macio durante a entrevista ouvia 0 que os pais fala. vvam, is vezes parecia envergonbado pelo que 0s pais dizi- ‘am, Nesses momentos, enrubescia-se e abaixava a cabeca ‘Comenton que tinha dificuldades na escola e que todos go> zavamn dele Quando the foi perguntado © que achava de iniciae ‘uma psicoterapia, disse que gostaria de pensar. ‘Seus pais insistiram para que fosse combinado 0s ho- vias das sessdes no dia mesmo da entrevista, Porém, op- {ou-se em dar o tempo necesssirio para que Marcio se deci- disse a iniciar © processo. Era essencial que 0 desejo de Mitcio em ser auxiliado pudesse ser respeitado. Pelo observado na entrevista, prineipalmente pelo que ele demonsirava em nivel pré-verbal, parecia que para cle cera fundamental fentar eriar um vinculo com o analista que ele pudesse considerar seu, sem a mediago dos pais, ‘Antes do término da entrevista, o pai de Marcio pedi a0 profissional um cartéo de visita, Foi dado a ele o cartio, 6 Momentos Murativos em Psicandlise © pai de Marcio sorriu quando recebeu o eartio ¢ passou a Mico dizendo que era para ofilho, pois assim ele iria guar- dando os cartes que recebesse das pessoas para ir tendo as coisas dele. Marcio enrubesccu-se intensamente, negando-se a pegar 0 cartao; apés insisténcia do pai, guardou o carlo no bolso. ‘Apés 0 término da sesso, os pais de Mércio estende- ram a miio para se despedirem; quando sairam da sala, Miicio estendeu a mfo dizendo que ligaria para dizer 0 que teria resolvido sobre fazer ow néo a psicoterapia, No dia seguinte, Marcio ligou dizendo que queria fa- 2er psicoterapia e pedindo que fossem maxeados os horri- 6s, Foram estabelecidos duas sess6es semanas Preparei, como material auxiliar de expresso, uma eaixa que continha paptis suite, lapis pretoe de cor, euache, barbante, argila, arame, borracha, tesoura, papel laminado, baralho e jogo de damas. [Em sua primeira sesso, Marcio entrou na sala de psicoterapis a0 ser chamado e sentou-se em uma poltrona 4 lado do analista, Descrevi o enquadre do processo que ira ser realiza- do, Mércio ouviu atentamente, em seguida explorou o que ‘inha na caixa sem se decidir a realizar alguma coisa com 0 ‘material dispontvel. Eno disse: (P) —Eu gosto de aprender a consertar coisas, as ve- 2es conserto a enceradeira de minha mae, o interruptor de luz, vejo 0 micu pai consertar o carro e ew ajudo ele (A) — Voce espera que aqui voce também poss apren- der a consertar 0 que voce acha que esté estragado em sua vida?! Relago Analitca e Possibilidade de Bmnergéncias dost Mircio sort, pega a eaixa com 0 material, olha um dos objetos, pega 0 arame e procura amassé-lo com a pres sito dos dedos, em seguida desamassa-o e volta a colocé-lo nna caixa. Parecia testar a flexibilidade do arame. (A) — Parece que voo® pergunta como eu sou, que {ipo de relacionamento sera 0 nosso e com o que voc® vai ccontar para fazer os consertos que voe® dese. Marcio fez um longo silencio, sentado na poltrona ‘olhava ao redor, parecia angustiade, olhow 0 analista, cenrubesceu-se e disse: (P) — Eu euido de passarinho, eu tenho um canatio. le se chama Tito, mesmo quando abre a porta da gaiola ele io sai, (A) —Por que voee acha que ele nao sai? (P) — Ele tem tudo que precisa dentro da gaiola, em alpiste, tem agua e fora € perigoso, tem o gato que pode comer ele, (A) —E possivel que aqui voce se sinta como o Tito. ‘ocd estd acostumado a ficar af dentro de vocé, onde vocé se sente seguro, ¢ fer agora que se relacionar comigo te as susta porque voe# fica descontiad que eu possa fazer algo rim com voo’. Marcio ouve a interpretagofeita, parece surpreso, fica algum tempo mais em siléncio. No término da sessfo, es- fende a mao a0 analista para se lespedir e vai embora, Algo foi experenciado nessa sessdo que, penso hoje, deveria ter sido formulado e nao 0 foi. Desde 0 inicio da sessio, quando Mércio comegou a verbalizar 0 seu desejo de consertar as coisas, em nivel pré-verbal, observei que cle fazia um esforgo para Falar algo, para gue eu pudesse conhecé-1o. Buscava mostrar aqueles aspectos que ele mais @ Momentos Mutativos em Psicandlise apreciava em si mesmo, os aspectos reparadores. Preso de intensa ansiedade persecut6ria, procurava dentro de si uma fala que pudesse manter o fluxo de comunicagdo. Apresen- tou-me ao Tito, representante do eu frigil e amedontado, ‘Todo esforgo feito por ele de tentar comunicar-se nao fo integrado nas interpretagdes. Minhas interpretagaes fo- calizaram-se no que necessitava ser “consertado”, nas an siedades persecutorias, o que contibuiu para arevivescéncia ra situagio analitica de seus sentimentos de rejeigao e de amor pr6prio ferido, Na verdad, s6 pereebi esses aspectos seis meses mais tarde, como descreverei a segui ‘© que me impediu de integrar esses elementos, des- critos acima, nas intexpretagies? Diria que por questdes contratransferenciais ndo pude ser para Marcio um “terapeuta suficientemente bom”, pois era um analista demasiado aflito. Tinha a preocupagio em trabalhar bem, isso para mim signifieava seguir uma “ne- ara” tecnica, que na realidad servia como apoio para uma identidade profissional instavel, A regra, que havia apie dlido, ressaltava a importancia de se ficar atento a transfe~ éncia negativa e aos aspectos destrutivos da personalidade do paciente. Precipitei-me fazend a interpretagi da trans- feréneia negativa, sem levar em conta a transfer€ncia posi iva presente naquela sesso. Na minha afligio, nao reco eet o enorme esforco que o paciente fazia para sar de seu isolamento e comunicar-se. Acabei tendo uma visdo parcial do meu paciente, o que me impediu de estabelecer um con- {ato mais préximo com as suas necessidades, Se tivesse tido uma compreensio mais completa da comunicagao, poderia lalver the ter dito: "Voce ¢ Tito, que esté sozinho em sua Relacio Anattica e Possibilidade de Emergéncias dos 63 agaiola, ¢ quer que eu entre para fica junto, ajudando voe® a ficar forte para um dia sait e enfrentar 0 gato”. Talvez. isso tivesse poupado os seis meses de espera c silencio, Na sesso seguinte, Marcio veio pontualmente, entrou, sentousse © apesar das diversas intervengGes que fiz, ainda ccontaminadas pela aligio, permaneceu em silencio e tao usou ‘nenhum material disponivel durante toda a sesso, Esse mesmo palo repercuti-se por seis meses. Duran te esses meses de silénco, inhas intepretades jf nfo me con- vveneiam e passe também ficarem siféncio ao lado de Mécio| buscando compreend-lo melhor, Mina atengio votou-se pai as manifestages pré-vertnis clo compostamento de Marcio. Gradualmente, foi possivel compreender algo do que se passava con Marcio, do que ele parecia esperar da rela- io, Apesar dos siléncios das sessdes, parecia que Marcio ritava as suas angtistias, seu desamparo, preso em urn mun do buscando expresso. Nessa altura, nfo existia nenhuma interpretagio, so nie 0 didlogo silencioso e mudo. Houve um momento no processo que senti que tinha algo a dizer a Marcio sobre o que ocorrera durante os meses de siléncio e sobre o que eu compreendia dele. Comuniquei a ele o que pensava a respeito da situa ‘gio, Disse como achava que ele tinha se sentido rejeitado e no compreendido por mim na primeira sessdo, quando ti- nha feito esforgo para se comunicar comigo. Disse também que sabia que ele ficava muito angustiado c triste, mas que ro sabia como falar @respeito do que sentia, 0 que 0 dei- xava sentir-se s6 e desamparado sem saber como sait da uela situagio aflitiva, Comunicar-se com 0 outro ou ter contato consigo o deixava perdido e assustado, 66 Momentos Muativosem Psicandlise ‘Tudo 0 que the disse era resultado da elaboragio do que havia sentido ao seu lado. Penso que a identificagio projetiva usada como meio de comunicagdo foi aqui esscnctal ‘Miarcio ouviu tudo atentamente disse (P) —Nés podiamos pintar um quatro. (A) — Esta bem (peguei uma eartolina ¢ coloquei en- tte ns). (P) — Voce desenha, eu pinto, Com o lépis na mio, eu othava para a eartolina pen- sando 0 que eu desenharia, 0 que pudesse ser representati- vo daquela situagao que viviamos. Méreia surpreendeu-me passando 0 dedo indicador sobre a cartolina. Segui o dedo dele com o lépis, ¢ assim surgiu o primeito desenho, Nele, estavam representadas duas montanhas, u@s nuvens, a0 pé ‘das montanhas uma casa feita com toras de madeira ¢ alg- mas devores, Mircio tomou 0 desenho e com guache branco foi pintando-o euidadosamente, Com as demais cores, fazia Sombra diluidas no branco mostrando quais as cores otigi- nais de cada elemento do desenho, Assim, a casa tinha um eve sombreado marrom, as copas das érvores tinham som breado verde. ‘Apés terminar a pintura, ele disse (P) — Esté tudo congelado! (A) —Acho que é assim que voce sente por dentro. (P) —Estou pensando em dat esta pintura para a mi- ‘nha mae, (A)— Yooé parece sentir que a sta relagio com a sua imiie tem estado dentro de voc® congelada, sem calor. Ao dar © quad a ela, € a sua forma de tentar aquecer seu con- tato com ela, [ee | Relagao Amalia e Possiblidade de Bmergencias dos 65 (P) — Voce raz outea cartolina para a prGxima ses- io? Eu queria fazer um outro quadro, Coneordei com o pedido, Na sessio seguinte, um novo desenha comegou a for mar-se com © mesmo método de execugao do anterior. Marcio deslizava seu dedo sobre a cartolina e eu o seguia ‘com 0 lapis, O desenho era um veleiro atracado em wma praia. Marcio pegou o desenho ¢ pintou, aqui jé existia co- lorido, eéu azul, mar verde, areiabege, basco de easco branco fe velas amareladas. Estando 0 desenho pronto, Mércio disse: (P) —E uma paisagem bonita, mas 0 barco se uproxi- ‘mou demais da praia e esté preso em um banco de area, (A) — Voot esti como 0 barco se sentind preso, sem poder funcionar (P) — Vou dar para o meu pai (A) — Eo seu jeito de fazer andar a relagio com sew Pai, Aqui também estivemos congelados atracades. por muito tempo sem poder seguir adiante ‘Voc® disse que o barco se aproximou demais da praia, Sera que vocé esti quetendo dizer que se aproximar, rela: cionar-se,& perigoso porque aprisiona? ‘Mitcio fica em siléncio até 0 final da sessao. [Na sessfo seguinte, Mércio passa o tempo da sesso desenhando, primeiro uma casa (ver Anexo 1), Ble diz que é um desenho de sua casa, sponta para as janes explicandoa que dependéncia da casa correspondem, Ha um muro alto a0 redor com algumas devores para prote ger a casa dos curiosos e dos ladrées. H4, ainda, uma placa na porta onde esté escrito “cuidado edo bravo”. No quintal, lum gato esté de olho no passarinho para comé-lo 6 Momentos Mutatvos em Psicanlise igo ale que, por um lado, deseja que eu o conhega, por isso me apresenta sua casa, mas, por outro, receia que eu me aproxime demais, pois teme as minhas intengdes, io sabe se sou um curioso que quer bisbilhotar a sua vida, ‘ou mesmo um ladio que pudesse atacé-lo ¢ fazer coisas ruins com ele, que, paraele, as pessoas eram como o gato 0 passarinho, sempre prontas para comer umas as outa. Miicio ouve ¢ desenha um avido caindo onde um ba- lo mostra que alguém grita dentro clo avis: “socoro! Ah sou muito jovem para morrer!” (ver Anexo 2). igo que ele parecia senti-se em perigo, como que 'mortendo por dentro, fcando triste sem se interessae por nada, le diz que nao tem amigos e que acha que os colegas ro gostam dele. ‘A partir do primeiro desenho da sessio, procuro mos- trar-the que ele quer aproximar-se das pessoas, mas tende & achar que podem ser inimigas e machucé-lo e que, por essa razdo, preferiaafastar-se dela 'A pattir da sessio seguinte, Marcio sugere que dese- ‘nhemos juntos de tal forma a ie Formando uma historia, Nessa histéria, havia dois personagens, Juba (que representava o analista) ¢ Tuba (que representava Maco). A cada sesso, ‘inhamos um episédio que se conectava com 0 da sessio anterior. Os personagens conversavam entre sie, através do Juba, eu interpretava 0 Tuba. Esse cielo durou muitos me- ses (aproximadamente dezenove meses) ‘Através das hist6rias, vitios temas eram tratados (por cexemplo: violéncia, destruigZo, suicfdio, morte, rivalidade, canibalismo etc.) Parecia que Métcio utilizava os desenhos e historias {que criava como forma de se aproximar de impulsos e fan- [ | i Relagao Analitica e Posiblidade de Emergéncias dos 67 tasias que tanto temia (ver Anexos 3, 4, 5 para exemplos desse ciclo), Gradualmente, os dislogos comegaram a ocorter di- retamente na relagdo, até © ponto em que Méccio abando- nou © material grfico e passou a fazer suas sessbes em ni vel predominantemente verbal ‘Uma pergunta feita por Marcio nessa época exem- plifica de que forma ele havia se distaneiado de sua vida afetiva. Ele perguntou como eu podia saber se ele estava triste ou alegre. Disse a ele que quando se falava, a vor trazia uma melodia que expressava a emogio, Marcio ficou muito surpreso e passou a observar a melodia de sita vor. € a dos outros também, © proceso de trabalho com Miircio durou seis anos, O que gostaria de enfocar aqui & a experiéneia do impasse vivido no interjogo transferéneia-contratransferen- cia seguido de momentos mutativos, Desde o inicio do contato com Marcio, havia, através de aspectos pré-verbais, anecessidade dele em se assegurar que a sua auto-estima no fosse atingida. Era um garoto ‘com um conceito de si mesmo muito desvalorizado, A ansi- edad persecutria era intensa, 0 que o levava a paralisar 0 Contato com o outro e com a sua realidade psiquica. Esses dinamismos levaram-no a um profundo senti- mento de solid e depressio, ‘Ao se iniciar © processo, a ansiedade persecutstia era inensa, 0 analist nfo compreenden o esforgo que Marcio fa- ia para estabelecer conta, isso pareceu ter inerementado ainda mais as suas angistias, Maio defendew se fugindo para “o interior da gaiola”, ou sea, reraindo-se em uma atitude de controle intenso sobre a relagdo que acorria na sala oe Momentos Mutatvos em Psicandlise E possivel que 0 analista tenba reproduzido com 0 paciente algo que se passou na relagdo mie-bebé, quando entio ocorreu 0 congelamento do psiquisme de Marcio. Ele mostrou isso, de certa forma, a0 desejar levar o primeiro ‘quadiro realizado para dar a sua mie. Ficou estabelecido o impasse na situagio analitica [Emergiu para o primeito plano a comunicagio baseada na identificagao projetiva, permitindo gradualmente que se pu- desse compreener 0 que ocorria na relago, Esse movimento persistiu até o momento em que foi possivel verbalizar 0 que tinha sido captado,e o impasse foi superao, Do ponto de vista do analista, foi necessirio que 0 mesmo repensasse a sua relaglo com 0s seus ideais e vol- lasse para o contato mais pleno com o paciente, © anatista patece ter reproduzido a experigncia pri- mitiva, sendo precipitado ao lidar com o paciente, como alternativa resto ter reconhecido 0 erro cometido,refzen- do a relagdo com Macio, Ap6s o contato com o psiquisme do paciente ter ocor ido, este se comunicou em nivel das identificagies projetivas, 0 que do conseguia comunicar de outta forma, Quando Marcio propds a pintura, algo interessante ‘ovorreu: iniciou-se com o analista 0 jogo transicional, se- ‘melhante ao jogo do bebé com o peito da mie. Ble passou & sar o analista como uma extensio de si mesmo, através da qual buscasse criar uma imagem que representasse seu mun- do interno. Ele parecia precisar de um acompanhante, mes. ‘mo mantido sob controle onipotente, a fim de poder en- frentar 0 mundo glacial e entravado de sua realidade psi. guica. Marcio propds um jogo que permitiv a criagao do espago potencial, para a aparigéo do objeto transicional. O Relogto Analiticu e Possiilidade de Bmergéncias dos 8 analista dew ao paciente a ilusio de que seria prolonga- mento de seu brago. O paciente deu a0 analista a ilusio de {que seria 0 prolongamento da seu pensamento Houve o aparecimento do desenho da casa e das mon- tanhas congeladas. Do ponto de vista da telagi terapéuti ca, poderiamos entender esse deseno como a representa 0 do paciente e do analista paralisados, congelados du- ranle um certo perfodo (as duas montanhas congeladas). Aparece a casa de toras de madeira, talver a gaiola em que ‘Tito esteve sozinho sob a neve e, agora, tendo o analist ime como companeiro, Do ponto de vista do objeto inter- no, poderfamos compreender a pintura como uma represen: lagi da mae deprimida, sem possibilidade de contato afetivo com o bebé. © arco encalhado como sendo o processoanalitico em impasse, analistaparalisado por seus ideas, bem conto o pi “Temos, nos dois desenhos, o estar no mundo (casa na pa gem) fazer no mundo (0 bateo) em estado de paras, [No instante em que houve um espago entie Marcio & ‘© analista passivel de acolher essas vivencias persecut6riss depressivas, a situagio mudou de configuragio e come {ou a existr vida e movimento no vinculo, 0 gelo comegou a “derreter”,o barco comegou a “na- vegar Estivamos na presenga do espago potencial, os dese- nos existiam como fendmenos transicionais, que surgiam «da relagio paciente-analista 1 no espago potencial que apareceu o interjogo iden- lifieagao projetiva e idenificagdo introjetiva como manera {de comunicagio e como mecanismos promovedores da evo- lug da realidade psiquica, 0 Momentos Mutativos em Psicandlise Marcio wilizou-se desse espago e, gradualmente, co- rmunicou as suas angustias, AAs hist6rias funcionaram durante um perfodo como forma de aproximagio das fantasias existentes na relagio transferencial. Tudo parecia um “jogo”, como s6 se tratasse de aventuras de dois personagens desenhados no papel. ‘Na relagdo direta, Marcio portou-se como se tudo aqui lo que emergia nio livesse conexo com o vineulo pacien- te-analista, O jogo propiciava que Marcio fizesse uma dissociagZo que o ajudava a encarar as suas angtstias gra- dualmente, ‘Ap6s esse perfodo, pudemos presenciar que aquelas diversas fantasias que apareciam nos desenhos fossem verbalizadas na relagdo direta com o analista Nos fenmenos descritos acima, podemos observar ue este campo, o"espago potencial”, permite que as diver- sas angdstias possam ser expressas com menor ansiedade Persecutsria. A realidade psiquica flui em ditegao a ‘conscientizagao e posterior simbolizagao, ‘Winnicott (1953) afirmaya que uma interpretagio dada fora do espago potencial poderia ser encarada como uma tentativa do analista submeter seu paciente, correndo 0 ris- co de faciftar uma dissociagdo entre mente e vida instinti- va, A interpretagio dada dentro do espago potencial evolui naturalmente da relagdo que esté sendo vivida, E ura for: mulagio verbal que fornece 0 holding) 0 continente, 0 m0- delo que toma a realidade psiquica pensével e simbolizavel, Green (1975) expressa a sua compreensio do contex- to psicanalitico através do conceito de espaco potencial do seguinte modo: “O objeto analitco ndo & nem interno (para o anali= WS Relago Analiticn © Possibilidade de Emergéncias dos 11 sando ou para 0 analista), nem externa (para um ot outro), mas esta situado entre os dois. Assim, correspond exata- mente & definigdo de Winnicott do objeto transicional © & su localizagio na drea intermediéria do espaco potencial, ‘© espago da “superposiedo” demareada pelo contexto ana- litico, Quando um paciente termina sua an‘lise, significa due no apenas tenha “intemalizado” a interagao analttica, ‘mas também que pode consigo arrebatar o espago potencial 4 fim de reconstituir 0 mesmo no mundo externa, da expe rincia cultural, através da sublimasao e, de modo mais geral, da possibitidade de emparelhamentos ou (antes digamos) se acoplamento”(p. 291). ‘A existéncia do expago potencial na sesso analitica cesté condicionada a possibilidade do paciente de utilizar-se das identticagdes cruzadas (projetivas e introjetivas) como instrumento de comunicagdo, do nivel tolerével das ans dades persecut6rias © depressivas, De parte do analista de- pende de suas ansiedades bésicas estarem suficientemente claboradas para estar disponfvel a seu paciente, e da eapa- cidade que tem o analista de manter 0 espago da sesso li- ve de intrusbes (identificagées projetivas sobre © seu paci- ente, dealizagio teérica, idealizagio de procedimentos tee- nicos etc.) 0 espago fornecido necessita ser um campo vi- brante com sua presenga afetiva atenta, mas aberto, para aque nele o paciente possa recriar as experiéncias neces as para o seu desenvolvimento psiquico. E nesse ponto que penso que se inserem as coloca- {g0es feitas por Bion (1970) quanto & necessidade de 0 ana- Tista nfo evocar desejo ou meméria na sesso analftica, para {que paciente e analista possam encontrar-se com o desco. hecido na sesso. n Momentos Mutativos em Psicandlise Rosenfeld (1987), em seu dikime liv Impasse and Interpretations, telata indmeros casos de situagio de impasse na sitwagdo analitica, Auavés dos relatos clinicos, Rosenfeld descieve como as dificuldades do analista de ‘compreensio, de contengio, de lexibilidade, vio impedin- do que 0 proceso analitico desenvolva-se de modo satisfatrio. Mostra que tais difculdades do analista for- ‘sam o paciente a reviver no contexto analitico as relagdes objetais que caracterizam seus conflitas bisicos, Rosenfeld afirma que € essencial que © analista fique cons ciente de que a situagio analitica¢ tansFereneial sio afeta- das nio 56 pelas experiéncias passadas do paciente, mas também pela conduta, pontos de vista e contratransferén- cia do analista, Esse autor acredita que, para analisar a agres- sio do paciente, € necessério abordar analiticamente a vvulnerabilidade e defesas com muito cuidado, Estar atento quio profundamente o paciente teme ser rejeitado e neces: sita idealizar o analista para criar uma atmosfera benigna nna sessii, Sugere aproximagdo gradual do paciente, para ue 0 excesso de confrontagdo no provoque expressies confusionais produzidas pelo medo do paciente de reviver ra transferéncia as suas elagbes objetais traumatizantes. Rosenfeld conclu que « andlise nio pode ser levada ‘com muita rigidez, Acredita ser importante sentir-se envol vvido com o paciente e no assumir um distaneiamento atti ficial, Para ele, € essencial que o paciente sinta a anélise ‘como revificadora © que o analistaesteja cOnscio de como © proprio setting e a sua técnica podem excercer um efeito mortalizador, Rosenfeld enfatiza a importineia de o analista estar realmente em contato com o seu paciente para que possa recriar a sua técnica, a fim de que ela se adapte as necessi- Relagto Anaitieu e Possiilidade de Emergéncias dos 3 dades do paciente, $6 assim podemos favorecer 0 apareci mento do espago potencial e manter as sessies realmente vivas e eriativas, Dessa forma, permitimos que o paciente ppossa no $6 tomar o inconsciente consciente, mas também fazer da andlise uma experiéncia na qual momentos trans- formadores, momentos mutativos, possam ocorrer. Ea par- tir desses momentos que © paciente pode ter, além de insight sobtea sua realidad psiquica, experiéneias na situagio ana Iitia, quando aspectos do seu mundo interno podem vie & tona pela primeira vez, mudando a qualidade de vida do paciente

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