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Cepitulo 1 OS HUMANISMOS E. © MONUMENTO ANTIGO ——_ (Os cortes cronolégicos ttm um valor essencilmente heuris- ‘tico. Eles requerem ser modulados em funcio de excecdes, de antecipagbes € de sobrevivéncias, Verse-8 que o interesse inte- Tectia artistic atibuido por uma pequena elite de Quatrocento ‘405 monuimentos da Antigaidade era produto de uma longa matu- rage e tivers precedentes desde ositimo quartel do século XIV. "Mas nio seria preciso fazer remontar essa génese a tempos ainda mais remotes? Devemos até nos perguntar se, como certos historiadores aventaram, os homens da Antigoidade e da Idade Média ndo langaram esse mesmo olha, de historiador e preserva- dor, sabre as monumentas e objetos de arte do passado. A cleo antiga de obras de arte, que antecipa 0 museu, parece ter surgido no fim do século it a.C. Entre a morte de Alexandre e a cris- tianizacio do Império Romano, o terstério grego revela a cite a culta de seus conquistadores um tesouro de edifcios piblices (tem- pls, stad, teatres, etc.) que devem se afigurar,a ses alhos, como, ‘monumeatos histrices, da mesma forma que, mais tarde, na Euro- pe medieval, os monumentos romanos sriam olhados pelos léri- gos de cultura humanist. $io esses analogias ussriase superficiais? No émbito de uma obra dedicada principalmente ao Ociden- tecristi, no poss evocar a Antiguidade sento de forma pontual; tampouco posso reunir as pecas do debate. Outros o fizeram! ¢ alguns pontos de referéncia bastario, Arte grega clissica e humanidades antigas Reino ce Pérgamo® os atdlidasprocuraram com fervor, som: sibilidade e perseverana, as esculturas¢ os objetos de arte deco- rativa que a Grécia cldsica prods sem jamais ox colecionar Conhecidas pelos testemunhos de Pausinias, de Polbio ede Pini, as colegses dos stiidas no pertenciam nem a categoria dos te: souros,religiosose finebres, tis como foram acumulados nos ‘eimulosegipcios ou no opithSdemar des temples grego, nem 3 categoria de curiosidades, recolhidas 20 sabor das gue, rapinas, ‘ingens ou herangas pels curioses de todos os tempos. Eses ob- jetos foram procuradas,escolhidos ¢alquiridos por sia quads deintinsea, 210a.C., mandiou que se fizessem a primeira escavagSes conhe- "cidas da histria.© mesmo movimento leva-o assim como aseus -sicessores, aadmirar € a mandar copiar em sua capital os grandes _monumentos helenkcos, TT Fades eporar,cpeiaent, alps brs, soph de inpartan- tes biegtin Abop, The Rar Ar Tad The Histor of rn Cala ‘dts Lined Phorm, Pract Nova ou, Hae dR 1582 ‘rules no one teen Sd un oF Fp The ate °F Ang, Boston, Le Brow, 1948; Kranthemey, Rome, Po of Cy 512108, Pann, Penecon Unive Pres, 198) Ar Infect antique dans Tard Mae Ae rnc, Leds, eo Warr, 198. 2, EW Hann, The aualderof Pergamon, hac, Cornel Univers Pres, 1947, 2 ee ‘mais de um soul), que enviaimeditamente, com aguas estitus, ‘em oferenda aos deuses de Roma, J se considerou esse epiasdio® como a data do nascimento simbalico do objeto de arte e do ato de colecioné-los entre os romanos: : sia ‘como acontece com tanta frequéncis em outros cdominia, Rama oferece um espetéculo ambiguo', sobre o qual o ‘olhar do século XX fica tentado a projetr of valores e atitudes da sociedade ocidental,pSs-medieval ou mesmo atl. Roma cone ce colecionadores de ate, eruditos como Asinio Palio, refinados como Atic,vorazes como Stneca, desconfadas come Cicero, api xonados como Verres, a ponto de perder a vida por ela. Roma co- nhece um mercado de arte, especislista, falsérics, corretores Roma espoliou a Grécia em escala equivalente & das pithagens napoleénicas: pense-se nas quinhentas estituas de bronze tiradss do santusrio de Delfos ecujos restos se encontram atualmente no palicio de Diocleciano, em Split, e node Adriano, em Tivali, Roma assist A construcio — executada a mando deste stim impers- jor dentro dos limites da mesma mansio Adriana —do primeiro yuseu de arquitetura em escala natural 3 T.Abop, op: cit, p. 185. 4 edn treet ow cts irq Pas, Le Seal 1976, Lilla retane romain, Pris Le Sel, {SG mses pre omar nc ew pene a ‘Dois tragoe-— étnicoe cronoligico—marcam sua diferenga em relagdo ans monumentos e ao patriménio histérico ocidental ‘Tedoe os objetor que encantaram os atlidas, depois os romanos, so de origem grega’. Com excegio de algumas obras do comeso cdo século VI, cles pertencem exclusivamente aos perfodos clissi- 0 € helenstico, anslidas que- ram fazer de sua capital um centro de cultura grea. Os romanos ‘procuravamn impregnar-se da mundo pléstico grego pela visio, ‘assim como procuravam imbuir-se do pensamento da Grécia pelo uso de sa lingua. Nao se tratava de uma medida reflexiva e ‘cognitiva, mas de wm processo de apropriaco: fragmentos de ar- ‘quitetura ou de escultura,objetos de artesanato grego, que adqui- riam ium novo valor de uso uma vez assimilades & decoracio das termas, da rua, dos jardins pablices privados, da residéncia, ou ainda apés terem sido transformadios em repositrios da vida do- méstica, 5. Vere et acamcnal de PCr “Les stat de pect i “ree cae pls roe find i stele ant) Rr des eats abs, Pt Les Beis ees, 1380. 5. Ondo de piers es guadade bla oval mia dng (eam en tf ows er er que o ances Star rn 8 Tesla de 1789. fel compar de Ronee: Mas as mesmas tendéncias, pader-se-ia pergunta, ndo caracteri= ‘zum grande parte dos colecionadores de arte atuais? Além disso, 0 ‘estilo eo comportamento do amante da arte parecem manifestos ‘tanto em Pérgamo quanto em Roma, onde Sila” flo iniciador de Verres si Restos antigos e humanitas medieval Care eneemeeenemine tet oreeecrenereeeraias pases a Ferner _ truicio. Dois fatores principais levaram a isso. De um lado, 0 prose- a uso, ainseguranca ea mséria os grandes edificios da Antigtidade "so transformados em pedreirs', ow entio recuperados © desvit- Sesto tararaerepaceentemenenenares— se constr uma ire ea fortaleza dos Frangipani 0 Circus Maxi- ius se enche de habitagSes, que si alugadas pela congregacio de ‘io Guido; os arcos do teatro de Pompéia sio ocupados por co- 7. Bie am epcmene apni su erate de ar de Apo a poo de leon oda as campaniae Paces prpsar bin gut aa de 8. Br Roma, um dere lei em 459 a epg der econ ej etl _merciantes de vinho € por rattri, os do teatro de Marcellus, por ‘uapeiros, adeleirs e taberas. Na Provence, of anfiteatros de Ades so transformados em fortaleza; suas arcadassio fechadas,cons- tuéi-se um quarteirio de habitagées cobre sues arquibancedas © ecdifica-se ums igreja a0 centro, Até nos arcos de triunfo erguen- se torres de defess, como a que fo ergida no aéculo Xi sobre © arco de Sétimo Severo pelos Frangipani _naraotinico depositirio de uma tridigio letrada”e a humanias Renées priticas de economia, em primeiro lugar, adotadas ‘em tempos de uma crise em que a populicao era dzimada, a cons- ‘rugiodispendisa, as tradigSesartesansis decadentes. Noséculo Vi, a atitude do papa Gregorio I ¢ exemplar. Em Roma, toma a sia tarefa de manutengso do parque imobilisio pratica uma politi- ca de reutilizacio que seri contintada por sew sucessor Honésio as grandes residéncia patricia so transformadas em monastérios, suas slas de recepcio em igrejas. Exteriormente, ele recomenda 05 missiondrios: "Nao destruam os templos pagios, mas 56 08 flolos que nels estio. Quanto aos edificis,lmitem-se sap los com dgua benta e neles colocar seus altares e reliqui ‘A condta do bernardo-eremita* é elevada a dovtrina “3 Ba eon eam deta oom fo dtr em 1897, ‘As Atenas de Nise omeane sane, Ch 3 10, Manos, Her deduction dane Angi, 2, Pr Le Soul 1948, ‘Sipsmenteo ep ae "O chats e sae ls, ho qu ‘thor mate gu or renee crouse vu de de ‘pts cm mn apo cs eo Se are de Senco ‘Suma escalator, dens dn xl ups dip clico 20s clérigoso eco de textos fares. © fo por estas obras sho coerentes com as porgGes da Irn eli is Tetras ea aber clio, or promovidos em nome Gas humanidader ora condenados por paganism, Assim, 0 apo Dlhonanias« rts antiga clon dorate esesbreves © parca renascimertos que Panofky chamou de rnascenses, nos cols Vl 1%, no conteto da politica carling, eps no séculosX1 XI, impulsonados pelos grandes sbades humanist Quando Guilherme de Valpiano, Getsin de Sane Benof r= Tore, Hugues de Chny depois Hildebert de Laardin, Joo de Salabry Suge ce Seine Dens, ou Gubere de Nogent oa Roms, com todo 0 entsasm de un clr cisea que admiam os monuments procira dentificslos Encanto intelectual, claro, mas tamibém senstbildade: as obras +0, com uma aura de maravilhos, elas se integram a uma das das “estéticas"” da Idade Média, aquela que Suger defende contra Bernard de Clairvaux. Quando o abade de Saint-Denis manda ‘consertar 0 mobilirio de sua igreja, ce admire "o trabalho mara- ‘silhoso", "a suntuosidade faustosa” de wm painel do atar feito por “artesos birbaros[.] mais frustoso que os nossos"e “a escultura ‘nui delicada, que hoje nfo encontra igual, [das] pastilhas de mar- fim [dla cadeira]", que vai além de qualquer expectativa humans pela "descricdo que oferece das cenas antigas™™. Roce and Resco Western Art, ccna, Aerie. ‘and Wc, 1960, pono ance Lt Rete er oro Fg Fama, 1976 13.0 temo, eidentemente ¢ ene Peston emrest emetendo ‘espn rs Se Ede Bree Ear Chg ede, Boge, O86, ‘empress, Genny Satine, 1975 14 Mami de Sgr sor administration abate | "De dist ORK « SOOTY, ato segundo a wg de E. Pn, Aber Sapo he ‘ABey Check of Sat Denso. ” ‘O valor quase magico atribudo aos remanescentes da Antighi- dade, a curiosidade que despertam, 0 prazer que eles oferecern 0s alos 820 exemplificados nos manuscrtos de dois clériges do ‘século xi. Com seus Minabilia urbis Rome, Benedictus, cénego de ‘Sio Pedro, apresenta, por volta de 1155, 0 primeiro guia dedicado cexclusivamente aos monismentos pagios de Roma, no qual asiden- tifcagSes geralmente fntasstas, so, porém, sempre ligadasa lem- ‘brangaslteririas. Quanto o jurists inglés conhecido pelo nome ‘de Magister Gregorius, ele néo sabe se deve atribuir as maravlhas visitadas durante sua viagem a Roma 3 magia ou ao trabalho dos Ihomens". Quando conta ter percorrida muita milhss, ports ve- ‘es, pata ir admirar no Quirinal uma Venus executada com "uma ppericia tio marailhoese inexplcivel, que ela poreca se raborizar ‘coma propria nude2", ele revel ocompertamento de um amante cae As categorie de AritGteles os paradigmas da teologia erst ‘Um escator roménico integra monstras antiges na representagio cde uma cena bibles; um iluminadbor vestecom trajes medievas os ‘hers da mitologiagrega. O mesmo se di com relacio aos objetos ‘ou monsmentes da Antiguidade: quaisquer que sejam o saber das “Ty Abelrdo mapa defer o etd da Merial, «spent de ‘amo Agen’ “Pere soa tomato ot membrana puede” (Cpe cascode ps ed les sn cost). 18 Ui pate edu poema de Heber rer por R. Keates. cee 2002 19.CE Revaisamce and Renato, pci, « arb E. aay FS Cuts! Ngh te Meiasal Ars Metropol Masri Stade, L932, © 1 Suns, La Srvc de dew iu, Lane, iat Wan. 1980 ‘pessoas que dees dispdem e o valor que Ihes ¢ atribuido, eles so ‘ssimilados dizetamente ¢ inteoduzidos no circulo dae priticas Crist, sem que se tens eriado a sua volta a distnciasimbslica © as interdigdes que uma perspectivahistricafatalmente implica- Ser tina coma cic um precios vaso antigo de pérfito, cengastad, porum caries medieval, entre spas, ab asas€0 pes. cago de uma éuia de prata dourads. De mesma forma, o palicio lmperial de Teves fo tranformado, no sécul IX, em um cate- dal cujo pio, “constitu de marmores de diversas cores", € a3 Portas, “ecabertas de um ouroavermelhado semelhante 20 jacin: {oma caro’, fo admiradon pelo bispo Hincmar, em Vienne, no Lyonnais, templo de Augustoe de Livia, depos de eliminado ‘muro de sua cella, trnsformase, nessa mesma época na igela de Notre-Dame-de-lVie. pees ‘Osmonumentosartiges no so, contudo penas"reciclados «les também so, com a mesma simpicidade e desenvoltura, cor tacos em partes e pedago, incorporados em seuida a contra oes novas, pars embeles lee decors ls Carlos Magno manda vir de Roms e de Ravens, com 2 auto- rizagio do papa Adriano I, 08 mirmores eas colunas que iri wil ‘ar em Aix-la-Chapelle e em Saint-Riquier. Desiderius manda ‘buscar em Roma colunas, bases ecaptéis para sua abedia do Mon tecassino (10665). Suger, ampliando Saint-Denis, se desespers: "Onde vou encontrar cokunas de marmore ou semethantes 29 ‘mérmore? Ea pensava nist, refletia, procurava nas regides mais diversas e mas distantese nada encontrava. Ao meu esprit ansioso ‘86 ococria uma slug ira Roma; no palécio de Diocleciano, com cefeito, e nas outrastermas, sempre admiramos colunas de mi ‘more; fszt-las vie por uma frota segura pelo Mar Mediterrinco,

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