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Revista de Economia Politica e Historia Economica, nimero 33, Janeiro de 2016. Expediente Numero 33, Ano 10, Janeiro de 2015. Uma publicagdo semestral do GEEPHE - Grupo de Estudos de Economia Politica e Histéria Econémica. hito://rephe01.googlepages.com €-mail: rephe0| @hotmail.com Conselho Editorial: Femnando Almeida Glaudionor Barbosa Haru! Salmen Espindola Jean Luiz Neves Abreu Jiolio Gomes da Siva Neto lincoln Secco Luiz Eduardo Simées de Souza Marcos Cordeiro Pires Marina Gusmao de Mendonga, Osvaldo Luis Angel Coggiols, Paulo Queiroz Marques, Pedro Cezar Dutra Fonseca, Romyr Conde Garcia, Rubens Toledo Arakaki Vera Lucia do Amaral Fertini, Wilson do Nascimento Barbosa Wilson Gomes de Almeida: Edigao: Maria de Fatima Silva do Carmo Previdell Autor Corporativo: GEEPHE — Grupo de Estudos em Economia Politica e Historia Econémica. AREPHE - Revista de Economia Politica e Histéria Econémica - constitui mais um periédico académico que visa promover a exposi¢ao, o debate e a circulagao de ideias referentes as dreas de histéria econémica e economia politica. A periodicidade da REPHE é semestral. Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Editorial Este ndmero 33 da Revista de Economia Politica e Histéria Econémica inicia-se com um artigo de Luiz Eduardo Simées de Souza sobre os antecedentes infelectuais de Rail Prebisch, a principal mente por tras da formagao da Comissao Econémica para a América Latina - CEPAL. Fabio Guedes Gomes e Thiago Cavalcanti do Nascimento abordam a integragao econémica numa perspectiva tedrica e a fipologia histérica dos processos na América Latina. Apoena Canuto Cosenza realiza um estudo sobre a Divisdo Internacional do Trabalho. Patrick Galba de Paula aborda os escritos de Marx nos anos 1860 sobre a Ianda. Kilma Gongalves Cezar e Elimar Pinheiro do Nascimento apresentam as questées dos Arranjos Produtivos Locais (APLs) referentes a sua espacialidade como politicas publicas. Paulo Sergio Souza Ferreira apresenta consideragdes sobre a reprodugdo do capital monopolista. Rodrigo Emanuel Borges e Tiago Camarinha Lopes expdem um breve histérico da elaboragGo de matrizes de insumo-produto no Brasil. Rodrigo Badaré de Carvalho realiza uma comparagdo entre Fernando Henrique Cardoso e Caio Prado Junior, em alguns entrecruzamentos das obras dos dois estudiosos. Marcelo Squinca aborda a questGo da formagdo do complexo de abastecimento de energia elétrica no Brasil, Por fim, na se¢do de resenhas, Tallyta Rosane Bezerra de Gusmao examina o livro de Osvaldo Coggiola sobre a hiperinflagdoe as condi¢ées pré- revoluciondrias na Alemanha apés a Primeira Guerra Mundial. Agradecemos a colaboragGo de todos os envolvidos na elaboragdo de mais este nimero da REPHE e convidamos 4 leitura, A Editora Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Ficha Catalogrdfica Revista de Economia Politica e Historia Econémica / Maceié, Grupo de Estudos em Economia Politica e Histéria Econémica - Némero 33, Ano 10, Janeiro de 2015 - Govemador Valadares, GEEPHE, 2007. Semestral 1. Historia Econémica. 1.Economia Politica NIEDUE 90 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Os escritos de Marx sobre a Irlanda nos anos 1860 e sua relevGncia para a compreensdo do subdesenvolvimento! Patrick Galba de Paula? RESUMO Este trabalho busca analisar o tratamento dado por Karl Marx do processo de expansdo das relagées de produgdo capitalistas na Iranda do século XIX com o objetivo de verificar a possibilidade de que este tratamento consista numa abordagem do que seria chamado posteriormente de subdesenvolvimento. Apés a andlise dos escritos de Marx e da literatura sobre © assunto, busca-se sistematizar quais seriam, para Mar, as caracteristicas gerais_ |= de = um subdesenvolvimento especificamente capitalista, Palavras-chave: Desenvolvimento e subdesenvolvimento; Manx; Irlanda; ABSTRACT This paper analyzes the treatment given by Karl Marx to the expansion of capitalist relations of production in nineteenth- century Ireland in order to check the possibility that these writings consists on a approach to what would be later called underdevelopment. After analyzing the writings of Marx and literature on the subject, we try to systematize what would be, for Marx, the general aspects of a specifically capitalist underdevelopment, Keywords: Development and underdevelopment; Mar: ireland. + Aigo apresentado em 10/08/2014, Aprovado em 10/1072014, 2 Mestre em Policas Pobicas, Esratigas e desenvolimento, pelo nsttulo de Economia da UFRJ. E-nal Patickgalba@gmaicom a Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Introdu¢ao E muito comum a atribuicdo a Marx de uma visdo do processo de desenvolvimento capitalista na qual a expanséo das relagées de produgéo capitalistas pelo mundo levariam ao “surgimento de capitalismos auténomes", com caracteristicas semelhantes as do desenvolvimento industrial inglés (KIERNAN, 1974). Assim o avango do capital corresponderia, em Ultima instncia, a um certo nivelamento dos patamares de desenvolvimento pelo mundo (AVINERI, 1968; WARREN, 1973; BREWER, 1990). Em trabalho recente este tipo de interpretago foi chamada de aifusionista por ter a caracteristica fundamental de atribuir ao autor a previsio de uma tendéncia de difusdo do capitalismo pelo mundo, ou das relagdes de produgdo capitalistas, como sendo algo equivalente a uma difusGo do “desenvolvimento” (DE PAULA, 2014, p. 15). Um dos trechos da obra de Marx mais usados como suposta comprovagao desta interpretagao encontra-se no prefacio & primeira edigdo de O Capital. Neste trecho, Manx alerta o leitor alem&o para que se preparasse para ver em seu pais as mazelas que o capitalismo havia produzido na Inglaterra: © que eu, nesta obra, me proponho a pesquisar é 0 modo de produgdo capitalista © suas relagées corespondentes de produgao © de circulagao. Até agora, a sua localizagao clasica € a Inglaterra. Por isso ela serve de ilustracao principal & minha explanagao leérica, Caso 0 leilor alemao encolha, farisaicamente, os ombros ante a situagae dos trabalhadores ingleses na indiistria e na agricultura ou, entao, caso otimisticamente se assossegar achando que na Alemanha as coisas 92 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. eslao longe de estar 10 ruins, s6 posse gfitarthe: De fe fabula narratur?! (MARK, 1983, |-1, p. 12). © trecho acima foi amplamente interpretado pela maior parte do marismo do século XX como uma comprovagde de que para Marx o futuro dos paises “menos desenvolvidos” era seguir os passos dos paises industrials. Trata- se uma interpretagéo —profundamente — equivocada, Recentemente tem-se demonstrado que este tipo de visdio estaria muito mais préxima daquela produzida pela chamada Economia do Desenvolvimento do que de Marx (BONENTE, 2011), e que Marx finha uma nogao muito distinta de desenvolvimento que esta interpretagdo ndo foi capaz de captar (DE PAULA, 2014). A teoria marxiana do capital e seu método so alguns dos aspectos mais negligenciados por esta interpretagdo difusionista de Marx (DE PAULA, 2014, pp. 98-99). Em linhas gerais, poder-se-ia afirmar que uma abordagem mariana do desenvolvimento coerente com o método ontolégico adotado pelo autor para sua critica da economia politica deve necessariamente se fundamentar na teoria do valor & nas demais categorias constantes em O Capital. Tal abordagem, em se considerande a ocorréncia da formagao de um mercado mundial dominado pela grande industria capitalista’, teria como objetivo explicar como a operagao da § Qui rides? De te fabulanaratr! O trecho pode ser traduzido como ‘De quer? Def fala afabule’, segundo nota da ead alma de O Capi fl retado por Marx das sétras de Hordc (Liv |, sta 1.12), “Marg, em sua épeca, considerava que o mercado mundial ainda era dominado pelo chamado capital comercial, principalmerte devido 20 que chamava de faux fas da ciculagdo, 0s custos de transporte © armazenamento das mercadorias ele, ou, em outtas lav, pelo nivel de desenvolvimento técrico. A fomagao de um mercado mundial contoado pela indistiacortespondera a um ramento no qual ocoretia a formagae de uma taxa media de ucos entre os seiors produvos do panto de vista intarmaconal, ea part dai as movimertagées de capitals passariam a ser expicadaspolas osclagdes das taxas de lucos. A prvisdo da formagao de tal mercado muncial decoreria da tendénciaauto-expansva do capital e, asim como a tendéncias| 8 concentragdo e& ceiralzero do capil seria uma de suas ls intiasfundamanisis (MARX, 1983, U1, 200 p. 250} 93 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. lei do valor sobre a economia mundial resulta na sua situagao concreta, ou seja, 0 objetivo seria obter uma concretizagao intemacional da teoria marxiana do valor (DE PAULA, 2014, pp. 125-140). Um aspecto da obra de Mar que mostra que sua abordagem do processo de expansdo capitolista difere em seus fundamentos daquela esposada pela interpretagao difusionista € 0 aparecimento em suas andlises de situagées de "“subdesenvolvimento”, num sentido especificamente capitalista do termo. No que diz respeito as andlises concretas € provavel que © primeiro momento em que Marx tenha se deparado com uma situagao deste tipo, que A.G. Frank (1966) chamaria de “desenvolvimento do subdesenvolvimento”, tenha sido nos escritos sobre a Irlanda durante a década de 1860. A expansao capitalista na Irlanda Para Marx, a principal caracteristica da penetragdo do capital britanico na Irlanda, através da dominagéo colonial, era a destruigGo da industria e a conversGo do pais em fomecedor de matérias primas para a indUstria na Inglaterra. No discurso proferide por ele em dezembro de 1867 na associagao de trabalhadores em Londres, Mar, além de ® A dominagdo bitnica na Ianda perdurou por varios sboulose sob diversas formas. Embera tenham ocarido invasbes angl-normandas na ia desde 0 século Xl, 0 marco inicial da domingo costuma ser dalado em 1607, devdo ao episicto conhecido como fight of the eel, quando os iltmos nobres de oigem gafica que alé entdo no haviam se submetido & coroa briénica se retraram para 0 continente, a0 que se seguiu a ‘onsolidagdo da dominagao brtnica. © periodo captalsta desta dominagdo corresponde, pincpalmente, poca da ‘Unido’, enire 1801 © 1922. Apés um conturbado periodo inlado em 1922 (hish Free Stato, ‘submetéo& cora bianca) que comega a ser superado com a consul de 1837, como inh ac de 1948, «, fnamenta, com 2 proclamagdo ds repibica da Ilanda em 1949, cinco sexlos da ihe se omaram formalmentendependentes 94 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. narrar as atrocidades da dominagao briténica na Iranda, afirmaria: Sob Guilherme ll, chegou ao poder uma classe que tinha como tnico objetivo o lucro, € a industria iflandesa foi suprimida com o objetivo de forgar a Itanda a vender suas matérias-primas para a Inglaterra a qualquer prego. [.] A Unido deu o tito de miseticérdia nas possiviidades de renascimento da _indUstria itlandesa, Em certa ocasiao Meagher! disse: todos os ramos da indistria irkandesa foram destruidos, tudo 0 que restou foi a construgdo de caixdes. [.] Mais de 1.100.000 pessoas foram substituidas Por 9,600,000 ovines. Isto € algo inédito na Europa, 5 russos despejaram os poloneses por russos, ndo com gado. (MARK e ENGELS, 1972, pp. 140-142 — trad. nossa). Também no documento de preparagao (outlines) deste discurso, Marx seria claro ao afirmar que “toda vez que a inlanda estava prestes a desenvolver sua indJstria, ela foi esmagada ¢ reconvertida em uma terra meramente agricola” (MARX e ENGELS, 1972, p. 133). O periodo capitalista da dominagdo britanica era considerado por Marx 0 periodo mais “destrutivo” para a economia itlandesa! ‘Aqui esté 0 que confunde o inglés: eles véern 0 presente regime como algo leve em compara¢do com a antiga opressdo da anda pela Inglaterra. Assim, Por que enido essa forma de oposi¢ao imeconcilidvel e agora? © que eu quero mostrar e que mesmo aqueles ingleses que apdiam os iflandeses no véem, que a [opressao] desde 1846, embora menos bérbara na forma, tem tido um efeito extremamente destrutivo, nao deixando allemnativa sendo a emancipagéo da Irlanda ou uma luta de vida ou morte. (MARX © ENGELS, 1972. p. 126 trad. nossa). ® Thomas Francis Meagher (1823-1867), paticpante do movimento delbertagdo ilandés @ um dos fundadores {4a Confederagdo INandesa de 1847. Preso pela tropas clonais em 1848, foge para os EUA em 1852 ainda ligera a brigada de voluntiios itandeses que Iuia 20 lado do nore na guerra civil americana entre 1851-65, (MARX e ENGELS, 1972, p. 501), " Kevin Anderson, ana'sando este trecho em conexdo com a correspondénca de Marx do perlodo,afima 0 seguinte: Thus, the more capital form of Engish dominalon since the 1846 Great Famine, hough less covertly violent, had basn more destructive than al prevous fom of Englsh rule over the past seven huncred years" (ANDERSON, 2010, p. 131). 95 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Marx havia chegado, em 1867, a esbocgar um programa que viabilizasse um processo de desenvolvimento préprio para a Irlanda. £ 0 que podemos ver na carta de Marx a Engels de 30 de novembro de 1867: Os intandeses precisam de: 1) Autonomia e independéncia da Inglaterra. 2) Uma revolugo agraria, Mesmo com as melhores intengdes do mundo a Inglaterra jamais realizaria isto, mas pode-se conseguir da Inglaterra os meios legais para que os irlandeses possam realizé-la por si mesmos. 3) As torifas protecionistas contra a Inglaterra. Entre 1783 @ 1801 todos os ramos da indUstria irlandesa floresceram. A Unido, a0 abolir as tarifas protecionistas estabelecidas pelo Parlamento inlandés, destruiy toda a vida industrial na irlanda, © pouco de indUstic de linho nao é compensagao. A Unido de 1801 teve exatamente ‘0 mesmo efeito sobre a indstria irlandesa como as medidas relativas & supressdo da indstria irlandesa de Ia, etc, tomadas pelo parlamento sob a dominagao inglesa de Anne, George Il e outros. Uma vez que os irlandeses sejam independentes, a necessidade vai transtormd-los em protecionistas, como aconteceu no Canada, Australia, etc, (MARX @ ENGELS, 1972, p. 148 - trad. nossa). Esta passagem deixa claro que Marx observava um forte papel negative desempenhado pela domina¢ae britanica na Ianda, com destaque para o process de desindustrializagao que teria sido posto em marcha nos marcos desta dominagdo. Marx via a dominagao britanica como um entrave do seu desenvolvimento. Este entrave tinha a ver, basicamente, com dois aspectos, que toravam politicas liberalizantes extremamente nocivas para a sociedade ilandesa, e faziam com que sua independéncia fosse um meio necessdrio para viabilzar um proceso de desenvolvimento préprio. 96 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. A questa@o agraria no subdesenvolvimento irlandés © primeiro aspecto era a questéo da producao agricola, e da necessdria “revolu¢ao agraria” irandesa. A dominagdo briténica ao longo de séculos teve por objetivo “plantar” uma aristocracia territorial, com caracteristicas feudais ou semi-feudais, nos tertitorios irlandeses. O objetivo era constituir uma classe social de proprietarios aristocratas leais 4 dominagGo, evitando assim maiores ameagas ao controle inglés e convertendo © pais em um campo de fomecimento de trabalho barato, matérias-primas e comida para a grande “fabrica da Inglaterra” (MARX e ENGELS, 1972, pp. 126-139). Para possibilitar isto, os sucessivos "“parlamentos” coloniais (ou semi-coloniais, conforme o periodo) votavam todo tipo de lei para impedir que as terras continuassem em mos nativas, desde restrigdes ao direito de heranca, até impostos diferenciados ¢ instituig¢Go de um cédigo penal que punia com a perda das terras quem cometesse “traigées a coroa britanica", entre as quais constaria a profissdio da religido catdlica’, praticada pela ampla maioria da populagdo nativa irlandesa (MARK e ENGELS, 1972, p. 130) Em meados do século XIX parte desta aristocracia, detentora das grandes propriedades’, comega a adotar a § Manx (1872, p. 190-131) nara como os catélios (na verdade, os natives itandeses) no petiode anerr a 1776 foram massacrades, sendo paibidos até mesmo de volar para o “palament’,partcipar do exérct, tar propiedad etc. AIS mesmo a produgio de ferizanies ora toda exportada, gorando um progressive ‘empobrecimento do solo, © que Marx chamaria de “Metabolcal Rif’, e estaria na crgem da potato bight e da grande fome ifandesa de 1846 (MARX ¢ ENGELS, 1972, p. 141), Esta abordagem da questio ifandesa fomeceta as bases de toda uma “ecolgia" mansia nos limos anes, prncpalmente em estudos como os de Foster (2000), 2 Em nota a 2*edigde de O Capital, Mane citandmeros que do conta de que em 1870 94,6% do sol itandés consiuiaartendamentos com até 100 acres. € importante nolar que, apesar de autres como Larrain (1999) intepretarem a “TevolugSo agra’ defendda por Marx para a Ilanda como o esiabelacmento de relagSes capialsias no campo, o texto da sero 5, tam f do cap. XXII do vol. de O Capital (MARX, 1963, I, pp. 248 7 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. introdugGo de maquinaria e de relagdes capitalstas de produgdo (contratagéo de assalariados, economia de trabalho, etc.), respondendo & demanda inglesa por produtos agricolas. A concoréncia desta produg¢do moderna combinada com aos altos impostos cobrados dos pequenos arrendatarios leva a ruina grande parte do campesinato ilandés e 0s obriga “mourejar para seu proprietario por um saldrio geralmente inferior ao do diarista comum" (MARX, 1983, 1-2, p. 256], numa combinagdo de formas de exploragao que reduz 0 rendimento dos arrendatarios, portanto, abaixo dos niveis de subsisténcia®, extraindo-thes uma parcela maior que © trabalho excedente. A parcela das temas tomadas aos arrendatarios insolventes 6 transformada de lavoura em pastagens para gado e/ou incorporada num processo de concentragéo das terras. A redugdo da produgéo agricola é drdstica (MARX e ENGELS, 1972, pp. 134-135), e também o conseqUente decréscimo da populagao, seja pela fome, seja pela migragdo para outros paises!! apés sua expulsao do 258) 6 claro em apontar 0 estabelecimonto das relagies capiastas no campo como a principal causa do ‘profundamento do “subdesenvalimeno”ilandés. Neste sentgo também vai entendiment de outros autores ‘que estudaram estes textos, como Mathur e Dx (2008, p. 106) e Anderson (2010, p, 131). Alkm disso, & interessante nolar que ja em 1850 Marx havia redigido um programa para o campo na Alsmanha no qual fonda doscreve a revolugso agra como um precasso no qual “a propiodado feudal confscada fique propredade do Estado e sofa tansformada om colnias operas, que o proletariado rural assocado explore om todas as vantagons da grande exporardo agricola” (MARX e ENGELS, 1850, p. 90). Ainda queso entonda ‘que a ‘revlugdo agra ifandesa da década de 1860 ndo poderia seguir mesmo camo da ale de 1850, pela diferanca nos niveis de desenvolvimento, parece justo supor que no minim ela sign‘igue algo cferente de uma grande proptiedade capitalita, uma vez que de pouco adantatiasubsitur uma classe de propitrios ‘expartadores porous incividuos com os mesmos intresses. ® “Nao estamos falando agora de condgtes em que a rendafundlta, a maneira de expressarna propriedade {undiia © modo de produsso capita, exste formalmente sem a exsténca do modo capilaisa de producso {msi ou sea, sem que o arrendatéro seja um captaista industial, nem o seu modo de cular seja capitalist, Tal 0 caso, or exemplo,na Itanda. O arendatii é, geralmente, um pequeno agrcultor.O que ele paga 20, propretéro na forma de renda frequentemente absorve no apenas uma parte do sou luo, isto 6, © Seu pr6pro mais-rabalho (a que tom dito como possuidor de seus préprios instrumentos do trabalho), mas também uma parte de seu sari normal, que de outa forma recebera pela mesma quantidade de trabalho” (MARX, 1983, 2, . 131), "A popula iandesa tem uma redugdo de mais de 8 mindes para cerca de 5 mihdes de pessoas ent 1840 e o final da década de 1860 (MARX, 1983-2 . 248) Ene o$ que sobreviveram, Marc enumera um «rescimento assombroso de do nimero de doentes (MARX e ENGELS, 1972, pp. 136-137). Curiosamente a populagao atual da iha, considerando a soma da Replica da anda e da regido dos "seis condados’, no norte daItanda, aide contolada pela Inglaterra, martém-se em toro aos 5 mihdes de habitantes,ap6s ter chegado a ter apenas 3 mihées ene as décatas de 1930 e 1960. Nada compardvel aos 20 mihies de 98 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. campo, de modo que a Irlanda se convertera na época de O Capital, “apenas num distrito agricola, separada por um largo fosso de dgua da Inglaterra, 4 qual fornece cereais, Id, gado e recrutas industriais e militares". (MARX, 1983, |-2, p. 252). Por outro lado, apesar de todos estes elementos, a renda da terra, e os lucros por arrendamento cresciam e “com @ fusdo dos amendamentos e a transformacdo de tema culfivada em pastagem para gado, uma maior parte do produto global se converteu em mais-produto” (MARX, 1983, I- 2, p. 252). Surge um grupo de magnatas fundiérios irlandeses que enriquece através da exportagéo pora a Inglaterra, enquanto aumentam a fome, a miséria e as doengas (MARX, 1983, I-2, p. 258). Esta classe proprietaria, que é quem explora ios, adota as teses malthusianas os camponeses arrendaté sobre a populace, atribuindo a causa da fome ao excesso de pessoas, e passa a incentivar a emigragao da populagao agraria, dos antigos camponeses arrendatarios expulsos de suas terras, para outros paises (a propria Inglalera e, principalmente, os EUA) (MARX, 1983, 1-2, p. 258). Como seus produtes se destinavam ao consumo britanico e a industializagdo irlandesa estava bloqueada, nado havia sentido em manter este excesso de “superpopulagdo” na Irlanda. Mesmo com todo o decréscimo populacional, a superpopulagdo relativa no campo (desempregados) “manteve-se em niveis idénticos aos de antes de 1846”, os salarios encontravam-se “em um nivel igualmente baixo" e 0 ‘membros das “bos perddas” da didsporeiNandesa, poeticamente calculados por um dos personages de J oyoe om seu Uysses. 99 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. trabalho se “tornou mais extenuante” (MARX, 1983, |-2, pp. 254- 255). Além disso, numa passagem que aborda a questao dos niveis dos saldrios pagos ao proletariado irlandés, Marx ressalta a dinamica de empobrecimento absolute? que poderia ser verificada: © nivel salarial, sempre muito boixo, elevou-se no campo, durante os titimos 20 anos, mesmo assim em 50 o 60 % [..J. Por tras dessa elevagao aparente esconde-se, porém, uma queda real no salétio, pois ela nem seauer equivale ao aumento dos pregos, entrementes ocorido, dos meios necessdrios & subsisténcia, [..J. © prego dos meios necessérios & subsisténcia aumentou, portanto, quase duas vezes ¢ 0 do vestuério é exatamente o dobro do de 20 anos atras (MARX, 1983, 1-2, p. 255}. O segundo aspecto do “subdesenvolvimento” irlandés analisado por Marx na década de 1860 era a evolucdo da industria. Durante a dominagao britanica, os sucessivos “parlamentos" aprovaram diversas leis que taxavam excessivamente qualquer atividade manufatureira ou industrial's, além de proibir a exportagao deste tipo de artigo (MARX e ENGELS, 1972, p. 129). As conseqUéncias deste aspecto da dominagao foram nefastas. Marx demonsira numeros impressionantes da destruig¢ao da indisiria irlandesa de produtos de 1G, e da industria téxtil em geral (MARX e ENGELS, 1972, pp. 131-132). Mesmo que a Irlanda se tornasse independente, e revogasse estas leis “anti-industriais", sua industria ndo teria condi¢des de concorrer com os produtos ® Vale ressltar que o tratamento dado por Marx em relagio & questo selaral em sua teoria ndo aponta necessariamente para um empobrecimento absoluto da classe vabalhadora na medda em que avanca o modo capilasta da produgdo, mas um empobrecimento relavo (ver a evolugdo do pensamento de Marx sobre o ‘assunto bem come as polémicas em tomo a isso am Mandel, 1268, pp. 143-157). mecanismo da mas-vala relatva,caractristice princpalmente dos pases capitasas industria, da conta de um processo no qual 0 trabalhador ganha menos em terms de valor, ainda que com isso compre mals valores-de-so. Tanto esta passagem, como a vista acim sobre a extagdo de uma parcela maior que a podugdo excedenle do camponés _arrendatto pelo propritri de tras, revelam um processo de acumlagocrentado para a maior exploracSo 4o trabalho endo para o aumento de produtvidade interessante notara semelnanga com o que Marini (1973) chamaria de superoxpioragdo,referindo-se 8 América Lat ® Marx também nara um periodo da dominago binica no qual howe uma tenttva de consi “cidades, inglesas" na Ianda, projelo que tera fracassado porque eslas cidades sempre acabavam ‘se lomando rlandesas” (MARX e ENGELS, 1972, p. 141) 100 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. ingleses, dado 0 elevado nivel de produtividade do trabalho na Inglaterra se comparado com o da Irlanda. £ por isso que qualquer possibilidade de desenvolvimento também precisaria passar por tarifas protecionistas “proibitivas" em defesa da indstria nascente irlandesa. Isto fica claro ao observarmes a diferenca de tratamento para a questéo do protecionismo, recomendado por Marx como uma necessidade para a Irlanda, e duramente combatido no mesmo periodo como um entrave ao desenvolvimento da Inglaterra. E o que vemos nas diversas passagens de O Capital sobre a derrubada das Corn Laws!4, ¢ demais normas protecionistas na Inglaterra. Em todas estas passagens Mar defende que a aboligao das tarifas protecionistas na Inglaterra levou ao aumento dos investimentos e da produtividade do trabalho na produgao agricola, também impulsionando o desenvolvimento forcas produtivas do trabalho no campo. Subdesenvolvimento e protecionismo no debate sobre as Corn Laws No caso da Inglaterra, a existéncia das tarifas protecionistas levava ao aumento dos pregos dos produtos agricolas, aumentando por sua vez os custos das matérias- primas da indUsiria (gastos com capital constante), bem como * Corn Laws fio nome pelo qual fearam conheidas a log'slagdes que estabolociam tails protecionistas para «a agyicutura inglesa de grdos em geal ene 1815 e 1846. Durante os anos que precederam sua demubada a poltica ingles foi dominada por uma intensa dsputa. De um lado os capitaistas indusiais“hre-cambisias" efendiam sua derubada, que cbjetvavam uslzar come um mecanisma para vabizar a toca entre seus Produtos industalizados produlos agrcolas no exter, e também como arma de negociagdo para a ‘errubada de barreiras allandegéias aos seus produos industrials. Do auto 0s proprelros rurais defensores da manctenco das tarifas proteconistas afmavam que sua derubada levaia @ economia rural inglesa & bancaroi. Marx analisou esta questo em diversas passagens de O Capital, e utlzou como istar3o de seus argumentos em diversas otras (MARX, 1963, 1, pp. 17, 223, 24, 230; 12, pp. 67, 69-70, 232236), 101 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. dos alimentos que compéem o consumo dos operarios (gastos com capital varidvel). Sua derubada permitiia & industria inglesa reduzir os custos de suas matérias-primas, além de permitir uma reducdo real de saldrios dos operarios sem que isto levasse a uma redugdo do equivalente em termos de alimentos (mercadorias de consumo de massas) destes saldrios, 0 que equivale, em certo sentido, a uma forma de manifestagao do mecanismo da mais-valia relativa, Por outro lado, devido & existéncia de um capitalismo avangado, a concorréncia com os produtos agrarios importados levaria a uma maior concentragéo de capitais (aumento da composig¢ao organica) na produgdo agraria_inglesa, aumentando a produtividade do trabalho e 0 excedente ali produzido. No caso da Irlanda, a inexisténcia de tarifas impediria qualquer possibilidade de constituigao de uma industria, uma vez que os capitais existentes se concentrariam no campo, produzindo para exportar para a Inglaterra. A utlizagao destes capitais para a industralizagao seria extremamente dificultada devido 4 impossivilidade de que uma industria nascente pudesse concorer com os produtos industriais ingleses, dada a maior produtividade do trabalho decorrente da maior concentragéo de capitais na forma de maauinatio, acesso a matérias-primas, etc, ou seja, mais capital ¢ maior composi¢ao organica do capital Outro ponto interessante desta comparagdo € 0 conflito social expresso no debate sobre a politica econémica no caso da Irlanda e no caso da Inglaterra. Este aspecto é observado por Marx e tem uma grande importancia em sua andlise. Marx 102 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. afirma que no caso da Inglaterra, embora os proprietarios rurais fossem muito mais representados na house of commons, a capacidade dos copitalistas indusiriais de pautar a sociedade com sua campanha “anti-corn laws", buscando até mesmo mobilizar neste sentido contingentes da classe operdaria's, termina sendo decisiva. Aqui 0 conflito entre a modema acumulagéo industrial eo capitalismo atrasado do campo, de baixa composi¢ao organica e com boixa produtividade do trabalho se expressa no luta entre industriais proprietarios rurais nas ruas, e no parlamento entre whigs (liberais) tories (conservadores) e termina com a vitéria dos primeiros sobre os Ultimos. Esta vitéria expressa na revogagdo das Com laws e das tarifas alfandegarias para o algoddo e outras matérias-primas foi de tal importancia que fez “raiar o império milenar” do capitalismo inglés (MARX, 1983, |-1, p. 224). Outros confltos semelhantes foram identificades por Marx em outros paises onde a produgdo capitalist avangava. No caso da Fran¢a a disputa entre capital industial e proprietrios de terra “se escondia atras da ‘oposigao entre minifundios e latifndios” (MARX, 1983, I-1, p. 17). A incapacidade dos capitalistas industriais franceses para ganhar © apoio da classe dos pequenos proprietarios rurais, 'S Marx narra a tentatva da chamada anticomaweague, associagdo dos indusais lire-cambistas, de ganar 0 apoio dos operéios em defesa de sua demands, chegando a promeverproteslos com fides de pao, 108 pequenos representando a aleniagdo dos operérios com as Com Laws, @ 08 grandes representando 0 salto em sua deta caso fossem derrubadas. Apona, no entanto, que “a reaidade comprovou a ment dessas promessas. O capital industal da Inglaterra, que se foaleceu por meio da revogatdo da leis do igo, reforgou seus ataques aos interesses vias da classe trabalnadora® (MARX, 1983, |, p. 222) O unico beneficio para os ‘operariosviia com a aprovagao de ei que lmitava a jomada em 10 horas davis também aprovada nos anos de 1846-47 apesar da resistncia dos capitalists live-cambsta, sob grande pressdo do movimento carta, ‘com 0 apoio dos propreltos ruras tories “sedenlos de vinganga (MARX, 1983, I, p. 224). Aqui fica cara uma “importincia propia’ (o que nas termos do marsisma contemporéneo seva chamado de “aufenomia relatva’) do Estado e da poltica na andse de Mark. A aprovagao da jomaca de 10 horas, mais precsamente a “vinganga dos tries’ no aparece como uma “necessidade do processo de acumulacdo™ nem como mera "expressdo dos inleresses de classe", as expresséo do desenvalvimento da lua poli que tem sua génese nas dispulas em fono ao processo de acumulagSo, mas que pode em certos momentos adguirr uma dndmica répia 103 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. pequeno-burgueses, surgida com as reformas agrarias ocomidas apés 1789 6 base da célebre andlise que faz Marx do bonapartismo francés, em especial do governo de Luis Bonaparte apés o golpe de 1852 (1852-1870). O golpe e a restauragdo que coroou Bonaparte como Napoledo Ill era, para Mar, a expresséo politica da imposicao das necessidades da acumulagao de capital 4 propria burguesia € ao proletariado por uma république cosaque'’, aparentemente auténoma frente ds classes, mas que em Ultima instancia representa a numerosa classe dos pequenos proprietarios rurais (MARX, 2006, pp. 127-144) No caso dos EUA a expressdio maxima deste conflite se d@ na guerra civil (1861-1865), onde os Estados industriais do norte (Unido) se opdem aos Estados escravocratas e exportadores de matérias-orimas do sul (Confederados), que tentam separar-se da unido antecipando a possibilidade da aboligdo da escravidée. Marx vé a guerra civil americana como uma tentativa dos Estados do sul de subordinar 0 pais a si e a sua ldgica de acumula¢ao, algo préxima da légica “subdesenvolvida" do capitalismo inlandés, baseada nado no aumento da produtividade do trabalho, mas no aumento da exploragao. Eo que vemos na passagem abaixo, retirada de um artigo de Marx para o jornal austriaco Die Presse de 7 novembro de 1861 Assim, na verdade, teria lugar nao uma dissolugao. da Unido, mas uma reorganizagdo da mesma, uma reorganizagao com base na escravidao, sob ‘9 controle reconhecido da oligarquia escravista, [..] © sistema escravista infectaria toda a Unido. Nos estados do norte, onde a escraviddo dos negros ¢ invidvel na pratica, a classe trabalhadora branca seria gradualmente rebaixada ao mesmo ® Repibica cossaca, 30 mesmo tempo burguesa @ autora, ue se afasla progressvamnente dos idea's democrtons da revolugdo francesa, 104 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. nivel de miséria. [sso estaria de acordo com o Glardeado principio de que apenas algumas ragas sao capazes serem livres, e que, como no sul do trabalho real é do negro, assim, no Norte, é a sorte do imigrante alem&o, do ilandés, ou de seus descendentes diretos. (MARK, 2005, vol. 19, pp 50- 5) ~ trad, nossa}. Aqui é necessério um paréntese. Embora nao visse os proprietarios rurais escravistas do sul dos EUA exatamente como "“capitalistas" Marx deixa claro em O Capital que ‘apesor da inexisténcia de relagdes capitalistas de produgao (trabalho assalariado), a subordinagdo da sua produgdo 4 exportagdo € ao mercado mundial capitalista, e logo a produgGo de valores-de-troca em substituigao 4 anterior produgdo voltada aos valores-de-uso, impunha a eles, em diversos aspectos, as mesmas “leis, como a necessidade do aumento da mais-valia (sobretrabalho)!’, No que se refere as formagées pré-capitalistas em geral Mar é claro ao afirmor que “em todas o objetivo econémico é a produgao de valores-de-uso" (MARX, 1986, p. 77] © capital nao inventou 0 mais-trabalho. Onde quer que parte da sociedade possua o monopélio dos meios de produgao, 0 trabalhader, livre ov nao. tem de adicionar ao tempo de trabalho necessério @ sua auto-conservagao um tempo de trabalho excedente deslinado excedente destinado a produzir os meios de subsisténcia para o proprietario dos meios de producdo, seja esse proprietério aristocrataateniense,teocrata etrusco, cidadéo romano, bare romano, "Nos Grundsse, nas Fomagbes econbmicaspré-apitastas’, Marx 6 ainda mais claro ao afar que neste sentido, oda subordnago lgica do capital eda reglago pela li do valor estes propitios escravocralas| fexportadores vinculados ao mercado mundial poderam ser considerados captalstas, ainda que néo 0 ppudessem do ponto de vista das relagdes de producaoestabelcidas ‘A produgao de captaltas e trabalhadores assalarados portant, um produto fundamantal do processo pelo qual o capital se vansfrma em valores. [.] 0 conceito de capital implica que as condgdes objetivas do trabalho — que so 9 proprio produto do captal ~ adquirem uma petsonaldade conta o trabalho, ou, 0 que vem a sero mesmo, 0 que passem a constluir ropiedade aleia,néo do tabalhador. |. to € [a afrmativa de que haveriacaptalistas entre romanes e egos], apenas, outa modo de dzer que om Roma e na Grécia oabalto gra live, allmagio que esas cavaeitos dfciment faiam. Se falamos, agora, dos propretios das plantations da América como capitalists, @ que sejam caplalstas, isto se baseard no fato {eles extrem como anomalas em um mercade mundial baseado no trabaho lve, (WARX, 1986, p. 110 105 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. escravocrata americano, boiardo da valéquia, o modemo senhor de terras ou © capitalsta. E claro, eniretanto, que se numa formagdo sécio- econémica predomina nao 0 valor de troca, mas © volor de uso do produto, 0 mais-rabaiho é limitado por um circulo mais estreito ou mais amplo de necessidades, ao passo que nao se origina nenhuma necessidade imitada por mais-trabalho do proprio cardter da produgdo (MARX, 1983, |-1, p.190). Mas nos casos em que a formagao social que apresenta relagdes sociais de produgdo pré-capitalistas (escravidao, coréia) € arastada ao mercado mundial dominado pela produgdo capitalista, no caso em a “mais-valia", o sobretrabalho ou mais-rabalho em termos mais rigorosos, deixa de restringirse a “produgao de meios de subsisténcia para © proprietario dos meios de produgdo” e passa a tratar da produgde de mais-valia, exatamente no sentido em que passa a ser subordinada as leis do capital em geral, entao: Tao logo. porém, 0s poves, cuja produgo se move ainda nas formas inferiores do trabatho escravo, corvéia, etc, sao arrastades a um mercado mundial, dominado pelo modo de produgao capitalista, © qual desenvolve a venda de seus produtos no exterior ~— como _interesse preponderante, os horores bérbaros. da escravatura, da servidéo, etc. sdo coroados com 0 horror civilzado do sobretrabalho. Por isso, 0 trabalho dos negros nos Estados sulistas da Unido Americana preservou um cardter moderadamente patriarcal, enauanto a produgdo destinavo-se sobretudo ao auto-consumo direlo. Na medida, porém, em que a exportagdo de algodao tomou- se interesse vital daqueles Estados, o sobretrabalho dos negros, aqui e ali o consumo de suas vidas em 7 anos de trabalho, tornau-se fator de um sistema calculado e calculista. Ja nao se tratava de obter deles certa quantidade de produtos Uteis. Tratava- se, agora, da produgée da prépria mais-valia. Algo semelhante sucedeu com a corvéia nos principades do Dandbio, A comparagéo da avidez por mais-trabalho nos principades de Dandbio com a mesma avidez nas fdbricas inglesas oferece interesse especial, porque © maistrabalho na corvéia possui_ forma independente, palpavel (MARX, 1983, [-1, p. 191) 106 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. E neste sentido que Mar envolve a si e, através da 1° intemacional (Associagdo Internacional dos Trabalhadores) parte do proletariade europeu, em uma intensa campanha pela vitria do norte na guerra civil americana. Por um lado, Marx defende que a internacional combata entre os operarios as tentativas do governo inglés de intervir no conflito em apoio aos Estados do sull®, Para Marx assim como a exportagao havia criade uma formagéo social “anémala” no sul dos EUA, ao mesmo tempo escravista (do ponto de vista das relagdes sociais, de trabalho), capitalista (do ponto de vista da subordinagao ao valor-de-troca, e, logo, da regulagao da produgao pela lei do valor) e dependente das exportagées para a industria inglesa, também a indUstria inglesa tinha um certo grau de dependéncia das matérias-primas produzidas por mos escravas nos EUA, motivo pelo qual desejava intervir no conflitol?. Por outro lado Marx vé na aboligéo da escravatura no sul NGo apenas uma medida valiosa em termos humanos, mas também o caminho pelo qual os proprietarios escravocratas seriam desfituldos de suas posigdes de poder, de modo a viabilizar uma resultante da politica econdmica que superasse aldégica “subdesenvolvida" da acumulagao existente no Sul. "8 Sobre it, vor Anderson (2010, pp. 90-92), © Manx (2005, vol 19, pp. 18-20, "Ver Anderson (2040, pp. 134-137). Aqui interessante notar que est relagdo na qual um pals se integra 20 mercado mundial na condigdo de fomecedor de matéias pimas e alimentos para uma poténciaindustial também tem conseqiéncias para o pals industal, em geral posivas, mas em alguns casos indesejvels. 2 Marx chaga a enviar uma corespondénciaparao presidente american Abraham Lincoln, onde em nome da Intemacional Marx pressiona pela abolgdo da escravatura © manifesta apoio ao presidente neste sentido. A rmensagem da AIT fi respendida por Lincoln através do embaixador na Inglaterra Charles Francis Adams, na {qual Lincoln agradace o apcio “de tantos amigos da humanidade e do progresso ao redar do mundo’. (MARX 2006, vol 20, pp. 18-20 6 1972, pp. 239-240) 107 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. No caso da Irlanda, no entanto, tudo indica que a impossibilidade de que 0 conflito entre capitalistas industriais e proprietarios rurais se desenvolvesse no mesmo sentido que havia ocorride na Inglaterra, na Fran¢a ou nos EUA residia no fato de que a industria (seja "doméstica” ou capitalista) havia sido completamente arrasada pelos anos de dominagéo, ¢ encontrava-se impedida de se desenvolver adicionalmente pela concorréncia da industria inglesa. A conseqUéncia social deste fato era que, ainda que conquistasse sua independéncia, seguiria inexistente na Iranda uma classe de capitalistas industriais em condigéo de impor aos proprietérios de terras uma politica econémica que viabilizasse o desenvolvimento de um processo de acumulagéo préprio, que precisaria da protegéo de “tarifas proibitivas contra a Inglaterra". Esta politica jamais seria aceita pelos grandes proprietarios rurais exportadores irlandeses que a partir da aprovagao das Com Laws, justamente em busca de maiores luctos, aprofundaram tanto as relagées capitalistas quanto os investimentos na produgdo agraria. Marx parece ver, entretanto, no proletariado rural ¢ nos camponeses pobres 0 sujeito social e no préprio movimento nacionalista irlandés, o Fenian movement, 0 possivel sujeito politico desta transformagao. Por tudo isto nao parece coerente atribuir a revolugdo agraria que Mar defendia em 1867 ao mero estabelecimento de relagées capitalistas no campo. 2 0 movimento nacionalistaiandés, cujos aivstas também eram conhecides na época de Mark como Fenians, recebeu amplo palo paltca ¢ também fnanosre da AIT, em mutos casos por popostas de Mace. Um ‘aso emblematco 6 a campanta em tomo A lvettagéo de Jeremiah ODonovam Rossa (1831-1915). Este lider do movimento Fenian ci preso © conderado a prisdo porpétua em 1865, apés sua parbcipagao em uma tentativa de insureigdo contra a dominagao btiica. Em 1869, mesmo na prso fo elt com uma massiva volagdo para a house of cammons do patlamento rinic, expessandoo rechago popular @ dominago, Neste perodo, Mant e Engels almentam esperancas que o mesmo movimento que leu aelei¢do de Rossa, poderia ter condigdes de avangar no sentido da independéncia nacional andesa. Em 30 de naverbro de 1869, por nicatva de Mar, o conselho gral da AIT vota pela primeira vez uma resolugo em defasa da independéncia da anda e pela anita aos presospolticos do movimento Fenian, A amla campanha que se sequl resultou ra libetagdo de Rossa pelos ingleses em 1870 e no seu exo nos EUA, ande segu atuando pele causa da independénca éa Handa. Ver Marx e Engels (1972, p. 505) ¢ Anderson (2010, pp 195-138 108, Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Fica também evidente a atribuiggo de uma grande importéncia 4 questéo politico-institucional na andlise de Marx como terreno onde se expressa a contradi¢de entre as distintas formas de acumulagao “desenvolvida"¢ “subdesenvolvida". Nao parece absurdo supor que a “revolugao agréria" a que Mam se refere como uma necessidade para o desenvolvimento da Iranda tenha a ver também, seno principalmente, com a expropriagdo destes grandes proprietarios exportadores como forma de solapar as bases de seu poder e influéncia sobre as instituigdes?? e que tem como resultante politica uma legislagdo que impele a economia do pais no sentido do “subdesenvolvimento", Sobre 0 papel deste setor Marx assinalava: Além disso, © proprietério, que néo faz absolutamente nada para a meihoria da terra, também expropria seu peaueno capital, que o arrendatério, em grande parle mediante seu préprio trabalho, incorpera na terra. Ito é precisamente o que um usurétio fara em 2 Parece também ir neste sentdo a seguinte passagem da carta enviada por Marx a Kugelmann de 29 de roverbra de 1869: “The primary condition of emancipation here—the overtrow of the English landed olgarchyremains unattainable, since its positons cannot be slormed here as long as it holds is stonaly fentrenched outposts in Ieland, But over thre, once affairs have been laid in the hands of tho ish people thamsalves [wil be infintly easier there than here to abelsh the landed aitecacy to alge extent the same persons as the English landlords) snoe in Ireland it's not merely an economic question, but also a national one, 25 tne landlords there are not, as they are in England, traditional dignitaries and representatives, but the ‘morally-nated oppressors ofthe natonaliy’. (NAR, 2005, vol 43, p. 390-391). O que fica claro também neste techo & a perspectiva intemacionalsta de Marx, quo via na independéncia da Wanda um paso decisivo para as possbildades da vitsia de uma revolucdo socialist na Inglaterra. No enlano, reduzir a isto a Importinca da ands da Manda fea por Marx, como faz Larain (1999), s6 podera ocorer caso ignoréssemnos completamente todos os trechos de © Capital e dos demais tabalhos de Marx do periogo que tralam da evoligdo da economia itandesa, ou se as consierassemos meramente instumentais a suas posigbes policas, o que equvaleria a negar obra econdmica de Manx qualquer caratr cient. = Nos casos analisados por Marc é interessante nolar a progressiva fr polca dos propitris urls como expressto dos graus de subordinago da economia & exportacso de matéras-primas para a indistia estangeira. Enquanto na Inglatera, primera polénca indus, os propritiios s80 dertados de forma relatvamente simples, na Franga a solugao jé demanda uma série de goles ¢ uma forma dierencade, Dbonaparsta, de compromisso e de gover e nos EUA uma sangrerta guerra ci Entre estas formas poderia também ser inllda uma outa, a cramada ‘via prussiana” de Lénin (1980, p. 30) e a“revougao passiva" do rissorgimeno taiano na anise de Gramsci (2004, p. 393), ambas carectizando um tipo conservador de tratamento da “questi agraia" no qual a préptia classe de propretériosruais evolu no sentido de se tomar uma classe de captalistasindustrais, sem ter nunca chegado a votlarse para o abastecmento de matéias+ prmas para a indistia estrangira. Parecem ser rlovantes em fodos os casos as ralagSes estabelecidas com as poténias industrials mais angas, os nve's de concorrncia ne mercando mundial capitalisia na época do processo de industaizacdo e a evolugo da uta de classes e da agdo independents da classe opera, que cada vez menos parece suscatvel a um papel secundério como o desempennado junio 8 burguesia francesa na revolugo de 1789. 109 Revista de Economia Polica e Histéria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016 circunsténcias semelhantes, apenas com a diferenga de que o usurdrio que. pelo menos isco seu préprio capital na operagdo. Este saque continuo é 0 centro da disputa sobre a legislagdo agréria irlandesa, que, essencialmente se resume em obrigar © proprietario, quando rescinde o contrato. de arendamento, a indenizar o ‘arrendatario suas melhorias na terra, ou para o seu capital incorporado na tera. A isto, Palmerston costumava responder cinicamente: “A Camara dos Comuns & uma casa de proprietérios de terras". (MARX, 1983, Ill-2, p. 131). Por fim a expressdo sintética, termémetro e resultado do processo de subordinagéo da economia irlandesa era a evolug¢do do rendimento nacional. Marx calcula que entre 1853 € 1864 0 acréscimo anual médio dos rendimentos na Inlanda (algo préximo da variagao do produto interno), foi de 0.93 %, enquanlo na Gré-bretanha este ndmero chegava a 4,58 % (MARX, 1983, I-2, p. 255). O redescobrimento dos escritos irlandeses de Marx e sua importancia no debate sobre desenvolvimento e dependéncia © primeiro autor a chamar a aten¢ao para os escritos de Marx sobre a Irlanda no que diz respeito a relevancia no debate sobre desenvolvimento foi o japonés Kenzo Mohri (1979). Nesta segdo serd feita uma rapida contextualizagao a respeito, para a partir dai apontar virtudes e também alguns limites do resgate dos textos de Marx discutidos aqui. Apés a Segunda Guerra Mundial mais de 50 paises obtiveram sua independéncia das antigas metrépoles européias. Junto com a América Latina vao dar origem a um 2 Henry John Temple, conhecido como Lon Palmerston, fo! primeiro-ministo do Reino Unido por dois mandats no periodo ene 1855 ¢ 1885, lo Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. “terceiro mundo” formalmente —_independente, mas “subdesenvolvido” Buscando oferecer um “caminho para o progress” destes paises, as principais teorias da Economia do desenvolvimento, como 0 artigo de A. Lewis (1969) e Rostow (1974), caracterizam-se por compartilhar uma identificagao praticamente imediata entre as nogées de "desenvolvimento" e “desenvolvimento capitalista", como expansdo das relagdes de produ¢do capitalistas (BONENTE, 2011). Um questionamento destas teorias seria realizado por Paul A. Baran (1977)? ¢ aprofundado por A. G. Frank (1968) € pela Teoria da Dependéncia. Aqui o subdesenvolvimento aparece como uma conseqUéncia da prépria expansdo das relagdes capitalistas nos paises “pobres" (satélites / periferia), ocorrida em fungdo do abastecimento de matérias primas para a indUstria dos paises desenvolvidos (metrpoles / centro). Esta posigdo ficaria conhecida como neomanista. Em resposta aos trabalhos de Baran, Frank e dos dependentistas surge toda uma produgdo bibliogréfica que busca discutir e estabelecer qual seria a nogdo de desenvolvimento presente na obra de Karl Marx. © objetivo desta produgdo é estabelecer se as formulagées de Mam “autorizariam” ou néo este neomarxismo. Dentro desta produ¢ao, a interpretag¢ao mais difundida da nogdo de desenvolvimento presente na obra de Marx é a 2 Os tabalhos de Leis, Rstow e Baran sdo respecvamente de 1954, 1960 6 1967. ni Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. que chamamos de “difusionista”, ou seja, uma visio que iguala o desenvolvimento 4 expansao capitalista Este tipo de interpretagdo teve grande ressonancia ao longo da segunda metade do século XX, uma ressonancia de tal ordem que mesmo criticos deste tipo de visdo e, em alguns casos, mesmo autores com simpatias por visdes relacionadas & teoria da dependéncia ou as teorias da troca desigual, cederiam a ela em suas obras, aceitando, ainda que com diferentes graus de contradigdes, a interpretagéo que identificava estas teses difusionistas na obra de Marx. Os exemplos disso vém desde o proprio Baran’, até Dos Santos”, passando por Sutcliffe, Amin, Brown®, —_ Williams®!, 2 -Quaisquer que lonham sido sua velocdade © os seus ziuezaqueaies caninhos, a dregio geal do movimento sin parece ter sido a mesma, tana nosescls aasados como nos vanguardefos"(BARAN, 1877, p. 210). € muto importante ressatar, etelant, que enbora neta cag da sua Economia Pica do Deservaiimento, publead incilmenie em 1967, Baran adersse de forma dara & ineprelago que chararos de dtsrisia da obra de Ware, e erboa esta passagem tena sid exeustvamele utizada para ressaar a oprido de Baran sobre o tema, em obra posterior, mals reisamente no désico Captalsmo ‘manopalsta, ert om parr com Paul Snoazy (gubleado om 1956), podo-s vr a saute passogom: Em retrospect, ndo poderos dear de lamertar que Marx no tenha ressallado, de forma enc, desde onc, que o capo desenolo da Gr-Sretanta (ede um punhado de ‘outs palses da Europa © América do Nore) tnha, como contaparia, a exporagio ¢ consequenle subdesenvoWimento de grande pare do resto do mundo. Ele tnha plena ‘conscdncadossarlagdo |. lém dso, tratamanto dado por Marx & acumulaéo primitva ressalou 0 papel tical cesempenhado pelo saque 8 colnias no aparecmonlo do capalsmo avangado na Europa. Poderos ver agor,porém, que a oss de Wars, no ‘anplando seu modelo teérico para incir tanto 0s segments desanvlidos do. mundo ‘capaliia como os subdosenvtos~ uma amiss qu elo podoria tor reparao, so tvesso fo tompo bastante para con sou tabaho ~ tov o cto ini de focalaaraatendo, lemasiado excusivamenie, sobre 0s paises capaltas deservoldos. Somente nos utimos anos a importéncia densa da inle-eagdo datca do desenohimenio @ ‘subdesenlvimenio comeroua so lnament apreciaa’(BARAN e SWEEZY, 1878p 16). 2” Para Man. a mademitade se denifiava com a evolu demecraicosuguesa. Ttavas de uma vis Casita © Fistéca do um madola cujas pretenses universes dervavam do sua oigam de cass, io 6, a eologa burguesa. [| Mas para Mar, essa formacdo socal rpresntava apenas um estigo. 40 Sobre iso. Chica afmaria que un dos principals robles dos marsistas de sua época que esudavam o desenvohimento saa sua ndepoigo de buscar suaecescberis no pnsamenio de Marc ou lez 508 desatango com o saos do sua NX: (CALCOTE, 198.105) n3 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. condigées objetivas para o desenvolvimento do capitalismo nos paises colonizados Diante destas andlises de Marx sobre a questéo ilandesa, ao contrario do afirmado pela interpretagdo “‘difusionista", para Mohri a posi¢ao tedrica para a qual Marx estava se dirigindo em seus Ulfimos anos poderia ser caracterizada da seguinte forma: A integrag&o forgada da velha sociedade no sistema capitalista e no mercado mundial pela pressdio externa do comércio briténico (ou seja, do comércio com uma economia industial) ¢ a transformag¢ao —resultante desta sociedade determinaria um curso de desenvolvimento de sua economia e de uma esirutura de suas forcas produtivas completamente dependentes ‘segundo @ sua maior ou menor susceliblidade para exportagdio'% (MOHRI, 1979, p. 40 trad. nossa) Ou seja, a andlise de Marx aqui apontava o despertar de uma abordagem do subdesenvolvimento: 0 capital britanico, ao invés de desenvolver o capitalismo na Iranda, estava "subdesenvolvendo” suas for¢as produtivas no sentido de uma economia agraria e impedindo o desenvolvimento de uma industria. Ao invés de uma dupla missdo destrutiva e regeneradora (como apontadas por Marx nos artigos de 1853 sobre a india) o papel do capital britanico seria o de uma “dupla missdo de destruigéo, 0 que significa tanto a destruigdo da velha sociedade quanto a destruigéo de algumas das condigées essenciais para a regeneragdo de uma nova sociedade" (MOHRI, 1979, p. 41). © elemento mais relevante para Mohri parece ser a mudanga na visdo que finha Marx sobre © papel da expansdo capitalista. no mundo “ndGo-desenvolvido": ao invés de 28 A referénca de Moh nesta fase 6 a uma cata de Marx aN. Danilson de 1879 (MARX, 1873), 4 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. industializagao, subdesenvolvimento e subordinagGo das economias aos processos de acumulagao extemos, dos paises industriais. Mohri atribui a esta mudanga de opinido, por um lado, ao aumento do envolvimento de Marx com a questdo idandesa, mas também a um progressivo aprofundamento dos estudos de Mam sobre outras sociedades, como a russa (MOHRI, 1979, p. 34) © aspecto fundamental da repreensdo de Mohri aos criticos marxistas da Economia do desenvolvimento era justamente que ao ignoror os avan¢os feitos por Man neste terreno, estes terminavam por perder um ponto de apoio fundamental para sua prépria posi¢ao. Nas palavras de Mohri: ‘A minha preocupagao foi a de chamar a atengao para varias sugestées contidas nestas criticas’ de Mar que parecem ser leoricamente valiosas e, desta forma, ojudar a reconstituir uma perspectiva critica que possa efetivamente resolver as questées que enfrentamos aluaimente. O que se tomou claro, como um resultado do que eu poderia chamer de intercomunicagdo de perspectivas, é que (1) 08 criticos de Marx esto basicamente cerfos em sua percep¢do do papel histérico da expansdo do capital britanico, e (2) as conclusées @ que eles chegaram sdo de falo virlalmente id€nticas aquelas para as quais 0 préprio Mar continueu a caminhar ao longo de sua incansavel jomada de investigagao teérica, na segunda metade de suc vida. (Mohri, 1979, p. 41 - trad, nossa) O resgate feito por Mohri destes escritos de Marx sobre a anda teve um efeito devastador sobre a interpretagdo difusionista, especialmente se considerado em conjunto com 0s trabalhos do mesmo periodo que advogaram esta tese da mudanga radical de Marx. O ponto especifico que os textos sobre a Irlanda sdo especialmente relevantes 6 0 seguinte: Para a interpretagdo mojoritéria da obra de Mar, 0 significado atribuido 4 tendéncia de avango (auto-expansdo} ns Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. do capital por todo o globo, a artilharia pesada que "derruboria as muralhas da China", era o progresso, o desenvolvimento de capitalismos industrials. As andlises de Mar sobre a Irlanda provam de forma categérica que ndo era assim que pensava o autor. Isto fica ainda mais claro quando comparamos dois trechos do livro | de © Capital. Enquanto em relagdo 4 Alemanha, como visto anteriormente, Mar via como tendéncia o surgimento de uma grande industria capitalista, no caso da Irlanda, medida que avangavam as relagées de produgdo capitalistas, a tendéncia observada por Marx na mesma obra néo era a de se tomar um pais capitalista industrial como a Inglaterra, mas de se tornar “pastagem de ovelhas e gado para a Inglaterra” (MARX, 1983, |-2, p. 259). Autores mais recentes que seguiram advogando interpretagées da obra de Marx que igualam as nogdes de desenvolvimento e expanséo capitalsta tiveram abrir mao parcialmente deste fipo de visdo, no minimo registrando a existéncia de “contradi¢ées" e de uma “tensGo permanente” es do tema na obra de Marx (LARRAIN, 1999, pp. 230-234), ov entao buscaram adaptor sua interpretagao a entre distintas vis estes escritos, tentando restringir sua importancia & questao do colonialismo” para que fosse possivel manter as igualdades enire expanse capitalista, desenvolvimento e “progresso” por um lado, e subdesenvolvimento, “atraso” e “pré-capitalismo" por outro (VUJACIC, 1988 © BREWER, 1990}. vatago da interpreta cifusioistapade ser vsta em malar detalhe em De Paula (2014, pp. 35-48). 16 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. © trabalho de Mohri, portanto, teve o mérito fundamental de ressaltar estas andlises concretas que Man produziu a partir dos anos 1860, que j eram produto de uma reflexdo mais profunda sobre o sistema capitalista e sobre as leis gerais de movimento do capital, uma vez que foram produzidas apés Marx ter formulado seu método da critica da economia politica, e dado grandes passos no sentido da execugdo desta critica, como os Grundrisse de 1857, os estudos de 1861-63 e 0 primeiro livro de O Capital de 1867 etc. Entretanto, Mohri compartiiha com os demais autores que viram uma mudanea radical na viséo de Marx sobre o tema uma limitagdo fundamental. Esta interpretagdo em geral comunga de um mesmo pressuposto da interpretagao difusionista: a recusa, ainda que nao declarada, de uma teoria critica do desenvolvimento capitalista que decorra da critica da economia politica, das teorias do valor, da acumulagao e das leis de movimento do capital conforme descobertas por Marx em © Capital. Conclusdes Em suas andlises concretas do subdesenvolvimento ifandés dos anos 1860 Marx identificou uma série de caracterislicas que nao parecem se restringir apenas aquele caso. Entre elas poderiamos citar: a) expansao principalmente quantitativa das forgas produtivas (MARX, 1983, II-2, pp. 162- 163); b) incipiente divisdo interna do trabalho ocasionada pela retragdo da industria (Idem; MARX e ENGELS, 1972, p. 48); ¢} tendéncia da acumulagao centrada na maior exploragao do trabalho (mais-valia absoluta) ¢ menos nos aumentos de 7 Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. produtividade (mais-valia relativa) (MARX, 1983, II-2, p. 131) e d) taxas comparativamente menores de crescimento em relag&o aos paises industriais (MARX, 1983, |-2, p. 255). Toda esta andlise de Marx permite compreender o subdesenvolvimento como uma expresso contraditéria do processo de formagao da economia mundial como totalidade do capital, suas caracteristicas relacionam-se principalmente com aspectos fundamentals desta expanséo capitalisia € menos com aspectos especificos do coso inlandés, ainda que estes tenham, obviamente, muita relevdncia no caso analisado. Utilizando como referéncia esta andlise irlandesa de Marx, poderse-ia identificar o subdesenvolvimento (neste caso um “subdesenvolvimento especificamente capitalist”) como um avango regional das relagdes de produ¢do capitalistas que, expressando 0 processo contraditério de formagao do mercado mundial, ndo leva ao surgimento de um “capitalismo industrial" proprio, mas a um crescimento prioritariamente quantitativo das forgas produtivas em fungdo das necessidades da industria estrangeira (DE PAULA, 2014, cap. 3). De qualquer forma, é necessario ter claro que por mais gerais que sejam os aspectos apontados por Marx em suas andlises concretas, a simples enumeragdo deles néo podera jamais substituir uma teoria ontolégica e dialética sobre a sociedade capitalista. As semelhangas podem nao passar de semelhangas. £ tarefa da ciéncia, além de descobrir as leis internas que governam os fenédmenos, buscar elucidar os elos 8 Revista de Economia Poltca e Historia Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. intermedidrios as relagdes causais entre os fenémenos e suas leis internas € as possive's contradigdes entre estas instancias, justamente para possibilitar a compreensdo de sua especificidade e estabelecer os limites das abstragées. Neste ponto, o da auséncia de qualquer tentativa de construgao de uma teoria do desenvolvimento calcada na teoria do valor de Marx, revela-se uma importante limitagao da maior parte dos estudos até agora realizados sobre o tema. Se, ainda assim, quisermos tragar algum tipo de comparagao, dentro de uma andlise mariana, do suodesenvolvimento _irlandés + com —outros._—casos. contemporaneos de subdesenvolvimento, como o brasileiro, saltaré aos olhos uma diferen¢a fundamental do ponto de vista da evolugdo da economia mundial capitalista: enquanto ‘© mercado mundial no qual se inseria a Iranda de 1860 ainda era dominado pelo capital comercial ¢ 0 grau de expansdio das relagées capitalistas pelo mundo ainda permitia alguma esperanga de desenvolvimento capitalista “auténomo”, sabemos que os avangos da técnica e da produgao capitalista ja levaram a termo a “partilha do mundo entre as grandes poténcias” pelo menos desde os inicios do século XX. Desde entdo 0 controle dos paises industriais sobre os processos de acumulagao no mundo subdesenvolvido assumiu formas muito mais sofisticadas (exportagao de capitais, “financeirizagéo", endividamento __extemo, propriedade intelectual etc], de modo que seria razodvel supor que mesmo as medidas propostas por Marx aos idandeses fossem ainda insuficientes em situagdes como a brasileira. ny Revista de Economia Politica e Histiria Econdmica, nimero 33, Janeiro de 2016. Se levarmos tudo isto em consideragao saltaré aos olhos @ fragilidade das esperan¢as (neo) desenvolvimentistas segundo as quais com financiamento barato, “inovagao", alguma regulagao de capitals e medidas socials compensatérias (supostamente _redistributivas), mas mantendo-se todos os aspectos fundamentals da inser¢ao internacional e da estrutura de classes interna, seria possivel o surgimento de capilalismo industrial brasileiro e a tao esperada concretizagéo do eterno sonho “emergente”. Se isto, para uma perspectiva maniana, pareceria impossivel na Ifanda de 150 anos atrds, poderia terse tomado possivel agora? Referéncias Bibliografias: AMIN, S. (1974). Accumulation on a World Scale: A critique of the theory of underdevelopment (2 volumes). New York: Monthly Review Press. ANDERSON, K. B. (2010). Marx at the Margins: On Nationalism, Ethnicity, and Non-Western Societies. Chicago: University Of Chicago Press. AVINERI, S. (1968). Introduction. In Karl Marx on Colonialism and Modernisation. Nova York: Doubleday. BARAN, P. (1977). A economia politica do desenvolvimento. 4° Ed Rio de Janeiro: Zahar editores, 1977. BARAN, P. © Paul Sweezy (1978). Capitalismo monopolista: Ensaio sobre a ordem econémica e social americana, 3° edigdo. Rio de Janeiro: Zahar. BONENTE, Bl. (2011). Desenvolvimento em Marx e na teoria econémica: por uma critica negativa do desenvolvimento capitalist, Tese (Doutorado em Economia) - Universidade Federal Fluminense, 2011 BREWER, A. (1990). 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