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Meméria coletiva e histéria cientifica* Norberto Luiz Guarinello** Vou apresentar algumas reflexdes sobre o tema desta conferéncia e sobre as relagdes entre meméria © sociedade de um modo geral. Meu interesse particular pelas questdes da mem6ria deriva, em grande medida, de minha pr6pria especializagio como historiador, e portanto como produtor de meméria. Vou explicar 0 que me levou a este tema. Sou, a0 mesmo tempo, um historiador da Antigilidade Classica — meu campo de atuagio é a histéria romana — e um arquedlogo. Creio que, por isso, as questées relativas 4 meméria sempre me estiveram muito presentes. Minha atividade como arqueslogo, por exemplo, colocou-me frente a frente com as fraquezas da meméria, com os esquecimentos forgados pelos acasos da preservagao, com a consciéncia do muito que nao pode ser lembrado, porque nao sobreviveu. Mais do que isso, diria, mostrou-me as respon- sabilidades sociais envolvidas na produgio cientifica de memé6ria. O ar- quedlogo, com efeito, opera selegdes mais dramdticas que as do historia- dor. Ele é obrigado a destruir os sitios arqueol6gicos, para escavé-los ¢ preservé-los como documentos. E assim fazendo, o arquedlogo acrescenta aos documentos seus préprios siléncios e desatengdes. Para os arquedlo- gos, meméria ¢ esquecimento sdo os dois produtos insepardveis de seu proprio trabalho — aquilo pelo que nfo se interessou, no momento da escavagiio, aquilo que nao observou, ou que nao descreveu, perdeu-se para sempre. A Arqueologia, de certo modo, me fez ver como a meméria que produzimos é fragil e seletiva. Minha atividade como historiador da Antigilidade, por outro lado, pds-me em contato com uma tradigdo multimilenar de transmissfo, co- mentirio e critica de textos, uma tradi¢fio que se enriqueceu ¢ se encorpou desde Homero. Com uma meméria poderosa e resistente, que me permite abrir as portas de um passado longinquo, para tentar entendé-lo no e para © presente. Fora ¢ fraqueza da meméria, lembranga ¢ esquecimento — minhas proprias circunsténcias profissionais me levaram a refletir sobre os * Conferéncia proferida por ocasido do I Congresso de Ciéncias Humanas das Universidades Federais de Minas Gerais, S. Joao del Rei, maio de 1993. ** Universidade de Sao Paulo. 180 problemas da meméria, sua complexidade, suas contradigdes, sobre 0 modo como a histéria que pratico se insere no conjunto da produgo social de memiérias, Vou falar sobre memé6ria, portanto, do ponto de vista de um histo- riador. Mas quero deixar claro que, obviamente, no considero que os his- toriadores detenham qualquer monopélio natural sobre o assunto € que apenas nés, historiadores, possuamos a legitimidade para falar, pensar € produzir memérias para nossa sociedade. O universo da meméria, de sua produgo ¢ de seus usos sociais é, como disse, extremamente complexo, E a producao historiogréfica ndo € sendo um pequeno segmento da meméria coletiva, um segmento que, a bem da verdade, possui uma esfera de atuago e uma influéncia social relativamente limitadas. Mas as relagdes entre mem6ria ¢ histéria no se restringem a uma questo de limites ou de esferas de abrangéncia, A hist6ria, como disci- plina cientifica, constituiu-se ao longo dos séculos, talvez desde Herddoto ‘ou Tucidides, para institucionalizar-se, do modo como a conhecemos hoje, apenas no curso do século passado. Foi entio que se tornou uma dis- ciplina universitéria e que se organizaram os arquivos péblicos. Esta hist6ria académica e cientifica possui uma relagdo particular com a meméria coletiva € meu objetivo central, nesta conferéncia, seré o de refletir sobre essa relagio. Os vinculos entre meméria coletiva ¢ histéria cientffica podem, na verdade, ser pensados em termos opostos, Podem ser vistos, em primeira lugar, como uma relacdo positiva, pois a histéria produzida por histo- riadores, por especialistas da hist6ria, enriquece as representagbes pos- s{veis da meméria coletiva, fornece simbolos, conceitos, instrumentos rigo- rosos para que a sociedade pense a si mesma em sua relagio com o pas- sado. Mas podem também ser vistos sob um Angulo negativo, porque a hist6ria cientifica se volta regularmente contra as representagdes produ- zidas pela meméria “espontinea” da sociedade, destruindo seus suportes, atacando seus princfpios, seus pressupostos, seus simbolos. Ao mesmo tempo, portanto, em que fertiliza e renova a meméria social, a histéria volta-se contra ela com todo seu peso disciplinar, apon- tando as distorgdes, os exageros, os esquecimentos produzidos pelos inte- resses particulares que animam as memérias coletivas. Nega-lhes, assim, a posse de qualquer verdade ou legitimidade, ao mesmo tempo que se afirma como 0 tnico saber positivo e verdadeiro sobre o passado. E essa contra- posigao entre historia ¢ meméria nfo € um mero capricho de historiadores muito zelosos, mas um dos fundamentos mesmos do prprio discurso historiogréfico, da instituigfio da histéria como um espago de saber. 181 Permitam-me remontar ao que considero ser 0 préprio texto de fundagio desse saber — as pdginas ais de Tucfdides, & sua Arqueologia. Aqui encontramos a delimitagSo primeira dessa cisdo: “Os homens (comuns) aceitam e transmitem sem exame as tradigdes sobre os acontecimentos do passado”.? Mesmo os antigos produtores de meméria, diz-nos ele, os poctas ¢ logégrafos, preocuparam-se apenas em agradar a seu puiblico, no se interessando pela verdade, pois ormavam seus relatos com 0 prestigio da fabula ¢ o enriqueciam com fatos incomprovaveis ¢ inauténticos. Desde Tucfdides, portanto, a histéria sc funda, abre espaco para si, opondo-se as demais representagées coletivas do passado. Define- se como um saber critico, ao mesmo tempo modesto, porque se contenta com aquilo que pode ser comprovado, mas também ambicioso, na medida em que visa relatar a verdade ¢ que se cré capaz de produzi-la. O discurso historiogréfico se apropriou, assim, desde hd muito, das fungdes rememo- rativas das memérias sociais, de sua capacidade de selecionar ¢ de eleger um passado, para exercé-las como um saber, um saber que tem uma relacio privilegiada com a verdade. Esta separagfo entre histéria e memGria seguiu diferentes percursos no pensamento ocidental. Nao pretendo percorré-los aqui. O que importa € que, quando a historia se tornou uma disciplina cientifica, no século passado, essa oposi¢o foi um dos fundamentos de sua constituigao como uma ciéncia pautada pela medida da verdade ¢ capaz, como se julgava entéo, de apreender a verdade objetivamente. A fundacdo mesma da histéria como ciéncia carregava em si uma condenagéo da meméria espontanea da sociedade, desautorizada como ideologia, como senso comum, como falsa consciéncia, cujas verdades seriam verdades impuras, contaminadas pelos interesses dos agentes sociais. E a oposigéo entre histéria cientffica e meméria coletiva ergue-se, até hoje, como uma espécie de mito de fundagio, um mito que definiu um saber como cientifico, posi- tivo e verdadeiro, e um nfio-saber, irracional, porque volivel ¢ interessado. Foi J. Le Goff quem o disse, recentemente: “Hé duas histérias, a da meméria coletiva ¢ a dos historiadores. A primeira é, essencialmente, mitica, deformada, anacronica. A tarefa da histéria cientifica é corrigir essa mem6- ria falseada, esclarecé-la e ajudé-la a retificar seus eros”? Mas essa oposig&o, que parecia tio clara a historiadores que queriam descrever 0 passado wie es eigentlich gewesen, j4 nfo se nos apresenta com a mesma nitidez. A prdpria histéria se pergunta hoje se néo seré posstvel, ¢ necessério, redefinir em outros termos a relagao entre 2 TUCIDIDES, Guerra do Peloponeso, I, Prefécio, pp. 20-21 2 LE GOFF, J. “Histéria”, in: Enciclopédia Einaudi, vol. 1, Meméria-Histéria, Porto, Imprensa Nacional, 1984, p. 166. 182, hist6ria cientifica e meméria coletiva. Se nfo podemos, em suma, tentar retragar as linhas dessa pretendida ruptura. Trata-se de uma questiio crucial, que € preciso propor-se. Nao s6 porque a aparente aceleragio do tempo social trouxe ao primeiro plano do debate académico as questes relativas & meméria e & preservagtio do passado, mas, sobretude, porque em nosso século abalaram-se profundamente os alicerces sobre os quais se erguia a idéia de uma histéria objetiva e verdadeira\O préprio estatuto cientifico da histéria e sua legitimidade enquanto saber foram repetidamente postos em questo, deixando marcas profundas na disciplina histérica contempordnea. YO otimismo positivista do século anterior desmantelou-se progressivamente, com esporddicos renascimentos, sobretudo no mundo anglo-saxdo.\A_pretenséo de atingir uma representagiio pura e verdadeira do passado cedeu lugar 4 nogo de que uma certa subjetividade, como diz. P. Ricocur, & inerente ao trabalho do historiador!# Porque nele também se manifestam os interesses, os conflitos ¢ as visties de mundo de s époss. £ em funcao da vida, como afirmava L. Febvre, ¢ como admitimos Comumente hoje, que ¥ Historie investiga 2 morte, € a partir do_presente we i assado.® Nossa prépria época nos propée os mo- delos, os conceitos © os problemas com os quais indagamos as fontes ‘que, para dizer ainda com Febvre, sfo criadas, inventadas, fabricadas pelo historiador, ao propor-lhes suas hipdteses ¢ conjecturas." Reconhecer que a historia que produzimos € seu tempo € que cada época ou momento produz sua prépria representago do passado significa admitir, igualmente, que as_verdades que a histéria produz siio Telativas. provisérias, que so verdades de e par; época. Mas esse Teconhecimento, por sar Vor is eavaals,Teacieariameate, todo 0 com. tetido das verdades que, como diz A. Schaff, so parciais, se acumulam ¢ sobrepdem, mas sio ainda verdades.” O conhecimento histérico é ainda yerdadeiro, cientifico, como o era para L, Febvre ou M. Bloch. Mesmo que, como ciéncia, a histéria carregue as marcas de seu tempo. Mais radicais, sem diivida, so aquelas correntes de pensamento que negam qualquer contetido verdadeiro as proposigdes da disciplina histérica, que Ihe recusam o carter de ciéncia. E isto nfo apenas porque a histéria seria uma arte, 0 conhecimento intuitivo de fatos e acontecimentos particulares, como era para B. Croce, sem a preciso e 0 poder explicativo das ciéncias RICOEUR, P... Histoire et Vérité, Paris, Seuil, 1955, pp. 24-25. 5 FEBVRE, L, “Vers une autre histoire”. Revue de métaphisique et de morale, $8, 1949, p. 438 ® FEBVRE, L. Combats pour l'Histoire. Paris, A. Colin, 1953, p. 7. ? SCHAFF, A. Histdria e Verdade, Sio Paulo, Martins Fontes, 1978, p. 286. 183 exatas.8 Nao! O que se coloca em jogo, hoje em dia, é a relatividade ¢ a imprecisao de todo ¢ qualquer saber, € 0 proprio estatuto cientifico que esté em questao. A posicao da Rissa como citacin a possibilidade de uma ciéncia da hist6ria so atacaifas pelo que se convencionou chamar de pés-mo- -dernismo, ou pés-estruturalismo, ¢ que tem em J. Derrida um de seus arau- tos. Para essa corrente, 0 conhecimento histérico nao seria mais que um mero ¢stiJo narrativo ¢ retérico, ¢ as obras dos historiadores nfo seriam nem mais, nem menos, verdadeiras do que as de ficgao. Para te6ricos como H, White ou F, Ankersmith, 0 discurso histérico no proporia, ngm prody- zitia, _verdades.® O passado, dizem, é algo inatingivel, caético e sem sentido. O esforgo do historiador se reduz A tarefa de tecer uma trama aleatéria, a construir uma narrativa com os elementos encontrados, nao apenas nos documentos, mas sobretudo nos textos de outros historiado- tes. Se tudo € texto, como diz J. Derrida, ¢ se nao existe nada fora do texto, ent&o a realidade como tal, externa ao texto, nao existe.!° A pretensiio da histéria cm constituir-se como saber é falsa ¢ va. Nossa iplina parece correr, assim, 0 risco de dissolver-se no irracional, de perder os vinculos com a necessidade e a verdade. De ver apagadas as marcas de sua distingdo ¢ de sua separacio com a meméria. Para esta visio, com efeito, tudo é igualmente ideologia, opiniao, e os lagos que nos ligam a tealidade sio tracados arbitrariamente pelo sujeito, ou antes, pelo texto que tudo inclui e que a tudo domina, segundo uma concepgdo que Perry Anderson definiu, com precisio, como um subjetivismo absoluto ¢ sem sujeito, o subjetivismo do texto,!2 Uma tal visio da histéria 6, sem diivida, inaceitavel. Ela conduz 4 desrazio, ao relativismo absoluto, A equiparagdo de todas as verdades, a impossibilidade do diélogo e do confronto de idéias. & uma tese conser- vadora, se me permitem. Seu efeito mais imediato € visfvel € 0 imobilismo, a paralisia, 0 esvaziamento de todo conhecimento racional. Nao é de surpreender que tal postura tenha encontrado pouca receptividade entre 05 historiadores de profissdo, ndo apenas por seu caréter estéril, mas pela perigosa possibilidade que abriga de se justificarem todas as formas de dominago e todos os preconceitos. Ora, nés, historiadores, sentimos ® CROCE, B.. “La storia ridotta sotto il concetto generale dell’arte”, in: Primi Saggi, Bari. Laterza, 1951, pp. 16-24. ° WHITE, H.. Meta-Histéria — A imaginagao histbrica do século XIX, Sao Paulo, EDUSP, 1992; ANKERSMITH, F.R., “Historical representation”, History and Theory, XXVI, 3, 1988, pp. 205-228. ‘© DERRIDA, J., Gramatologia, Sé0 Paulo, Perspectiva, 1973, p. 194. 1 ANDERSON, P, A Crise da crise do Marxismo — introdugdo a um debate contemporaneo. Sao Paulo, Brasiliense, 1984, p. 62. 184 nossa atividade nao como uma criagdo ficcional, mas como embricada na realidade de modo distinto da literatura. B isso em varias dimensdes. Em primeiro lugar, porque o passado que investigamos nio é, por assim dizer, um processo onirico ¢ indeter- minado, aberto a todas as significagdes, mas a condigdo mesma, concreta € positiva, de nossa existéncia presente. Nem é o historiador livre para criar passados, como se tragasse sua trama por caminhos desimpedidos, mas deve falar do passado através de documentos que siio, também eles, bastante reais. Podemos coletd-los, consulté-los, criticé-los, analisé-los. B através de sua mediagdo, e s6 dela, que temos acesso as realidades passadas. Mas ndo é s6 isso: a histéria liga-se & realidade também por ser parte dela, por ser um produto social, produto de um lugar socialmente determinado ¢ historicamente constituido. Um lugar institucional, a partir do qual os historiadores propdem representagdes do passado que no siio meros exercicios inocentes de estilo, pois interagem com a meméria e com as representagSes coletivas. E por ser representagio, nem por isso € menos eficaz. Se a hist6ria, enquanto disciplina, possui sua subjetividade, esta ndo é a subjetividade individual de cada historiador, nem aquela, sem sujeito, do texto, mas a subjetividade de um lugar, institufdo como tal e custeado pela propria sociedade contemporanea. Histéria cientffica ¢ meméria coletiva nfo se confundem, assim, como facetas intercambidveis de uma mesma viso irracional do mundo, mas se constituem e se diferenciam pelos lugares distintos em que sio produzidas. Ambas sao produtos sociais e, como tal, ambas sio marcadas pelas determinagies de seu local de produgdo. Embora se yoltem igual- mente para o passado, memoria ¢ histéria fazem-no de modos distintos ¢ € essa diferenca mesma que funda a possibilidade de uma hist6ria cien- tifica. Espero que estejamos de acordo, até aqui. Nos tltimos anos, no entanto, desenvolveu-se uma outra critica a essa histéria cientffica, uma critica que se volta ndo contra sua posigio como ciéncia, mas contra a fungiio e os efeitos do conhecimento cientifico sobre a sociedade. Nao se trata aqui, como para os pés-modemos, de mergulhar todo conhecimento nas profundezas insonddveis do irracional, mas sim de desmascarar a utilizagio politica do préprio lugar onde se produz esse conhecimento. O que se denuncia é o uso da ciéncia histérica como instrumento de poder e de dominagio, é 0 efeito normativo, repressivo, que a histéria, como meio de agiio do Estado, exerce sobre e contra as memérias espontineas, que brotam do seio da sociedade. Acompanhando a valorizago crescente das tradigdes orais, da cultura popular, das memérias produzidas por grupos marginais ou dominados, autores como Ralph Samuel, do influente grupo inglés “History Workshop”, propugnam uma desprofissionalizagao 185 da histéria, defendendo a validade e a veracidade das memérias coletivas negando, @ prética profissional, qualquer direito ao monopélio do saber sobre o passado.!2 Essa perspectiva, que se origina, certamente, de posigdes politicas diametralmente opostas as dos irracionalistas, tem encontrado um apoio crescente em nosso pais. Para E, de Decca, por exemplo, a meméria produzida pelos historiadores € uma memsria sem vida, desencarnada, um produto da sociedade industrial, que aniquilou os antigos lugares da meméria coletiva e espontanea: “A meméria hist6rica”, diz ele, “além de destruir a meméria coletiva, transformando-a em memiéria- protese de computadores, destitui também a prépria historia de seu sentido critico”.!3 A hist6ria, portanto, parece culpar-se pelo sentido que impée As representagées coletivas, pela propria critica que aplica as memérias espontineas. Os efeitos dessa perspectiva podem ser observados, por exemplo, no belo Lembrangas de Velhos, de Ecléa Bosi, no qual a autora envergonha-se de definir sua propria atividade como “cientifica”, pre- ferindo, apenas, calar-se, para deixar fluir as memdérias dos velhos, sem impor-lhes qualquer diregio, norma ou sentido."* A hist6ria, portanto, como conhecimento cientffico, seria uma forma de poder ¢ uma forma esptria, um instrumento de dominacao e de legi- timagio das estruturas existentes, um modo de fazer calar as memérias espontaneamente produzidas pela sociedade. Trata-se de um ataque sério e influente. Um ataque ao lugar mesmo em que a histéria € produzida, & legitimidade desse lugar em proferir verdades, ditar normas, propor expli- cagées € sentidos. Um ataque, cm suma, sua posicio diante dos outros lugarcs de meméria, nao para igualé-los a todos, mas para mostrar que sob sua legitimidade escondem-se relagdes de poder ¢ de opressio. O discurso histérico, desta forma, como atividade critica por exceléncia, corre assim o risco de se dissolver, ao voltar-se sobre si mesmo. E preciso refletir seriamente sobre tais posigées. B preciso repensar, de modo amplo, a oposigo entre hist6ria e meméria e a propria situagio da histéria como um dos lugares de produgio da meméria coletiva. “Lugares da meméria” — a expresso tornou-se, nos tltimos anos, um termo corrente, sobretudo a partir da obra coletiva, dirigida por P. Nora, Les lieux de la Mémoire. A pr6pria difusio do termo demonstra que no foi apenas nossa concepgio do que seja a hist6ria cientifica que se alterou, mas também o modo como a prépria meméria é entendida como 12 SAMUEL, R.. “Déprofissionaliser I'Histoire”, Dialectiques, 1980, pp. 5-17. 13 DE DECCA, E., “Meméria ¢ Cidadania”, in: O Direito 4 Meméria — Patrimonio Histérico e Cidadania. Sa Paulo, Depto. do Patrimonio Hist6rico, 1988, p. 133. 14 BOSI, E., Meméria e Sociedade — Lembrangas de Velhos, 2* ed, Sio Paulo, EDUSP, 1987, pp. 1-2. 18 NORA, P. (org). Les lieux de la Mémoire, Paris. Gallimard, 1984, 186 uma forga social. Nao se trata mais, apenas, das determinagées da memoria individual, como era para H. Bergson, ou da meméria coletiva como uma fungao social integradora, como para M. Halbwachs. Falar em lugares da meméria pressupde, precisamente, uma pluralidade de memérias distintas, particulares, produzidas por instituigdes ¢ grupos sociais diferentes ¢ que podem utilizé-las como meio de ago e conflito. A meméria coletiva, deste modo, aparece-nos hoje como uma realidade complexa, articulada em lugares que propdem representagdes distintas, que se defrontam. Para entendermos melhor a especificidade da meméria cientifica e sua posigao diante das diferentes e variadas memérias sociais, € necess4rio que nos perguntemos: afinal, o que é meméria? Qual a fungao exercida pelos lugares que ocupa € que se ocupam dela? Por que a produgio de meméria é, enfim, tio relevante em termos sociais? Trata-se de uma questo dificil e, para respondé-la, permitam-me refletir um pouco sobre a propria espessura semintica do termo meméria e de sua ctimologia. Meméria é uma palavra que nos veio do latim, preservando, em portugués, os dois sentidos fundamentais que possufa na origem. Me- méria, em primeiro lugar, € algo que nao est4 em lugar algum, porque ocu- pa e preenche todos os lugares. E um substrato, reposit6rio dos produtos, de nosso passado que sobrevivem no presente, condigio mesma do tempo presente. E a trama dos vestigios, oriundos de diferentes épocas e con- digdes de produgiio, que constitui a espessura mesma daquilo que existe, como cristalizagdo e permanéncia do que nfo morreu, daquilo que nos liga aos mortos na medida em que sobrevive no presente. Hé, como observa H. Koselleck, muitas temporalidades, muitos passados inscritos no nosso presente,!® vestigios que sio o manancial passivo de qualquer reflexio sobre o pretérito, lastro que determina a possibilidade de qualquer me- méria. E uma regra de ouro, nem sempre atendida: nao se pode rememorar © que desapareceu por completo, sem deixar tragos de si, mas apenas aquilo que sobrevive, concretamente, no presente. Nosso passado tem uma existéncia material, conoreta, inscrita nas estruturas do presente. E apenas através desse passado-presente que podemos refletir sobre a histéria. Mas a memiéria ndo 6, apenas, um substrato passivo, um manancial de sobrevivéncias vestigiais. Ela ¢, sobretudo, e este é seu segundo e mais conhecido sentido, um principio ativo, um trabalho, como a chama M. Chaui.!? A meméria € uma reflexio sobre o passado, um debrugar-se 16 KOSELLECK, H.. Futures Past. On the Semantics of Historical Time. Cambridge- Massachusetts, MIT Press, 1985, p. 94. 1 CHAUL, M.S. “Apresentagio”, in: Bosi, E., op. cit,, p. XX. 187 sobre esses vest{gios presentes para selecioné-los, agregi-los, condens4- los, destrinchando a espessura temporal do agora, para dar sentido, nio tanto ao passado, como ao préprio presente. A memoria é, assim, uma forma de ago, uma ac&o representativa, parte da atividade auto- representativa que uma sociedade, grupo ou individuo produzem de si, para assumirem c defenderem sua identidade e para orientarem sua ago individual ou coletiva. A meméria é, no fundo, um jogo dos sentidos possiveis nos quadros, mais ou menos indefinidos, do tempo. Um jogo que se alterna entre duas dimensdes distintas do ato de rememorar. Voltemo-nos, por um instante, para estas iltimas. A memGria, em primeiro lugar, como fundamento mesmo da tradi¢ao de uma cultura, como produto social, liga-se & reprodugao da sociedade, organiza e reproduz constancias, repetigées. Confere um sentido de permanéncia e de unidade no tempo, de identidade a grupos espectficos ow A sociedade como um todo. Podemos observar esse caréter unificador da meméria, por exemplo (mas nao s6), nas atividades coletivas que se reproduzem ciclicamente, nas festas cfvicas ou populares, nos ritos religiosos ou nos rituais politicos, como as eleigdes. Tradigées inventadas, no dizer de E, Hobsbawn, socialmente produzidas, que reproduzem indefinidamente um mesmo ato original, posto fora do tempo, que se manifesta ciclicamente, como os tempos da natureza, como que atestando que a sociedade, ¢ os grupos dentro dela, permaneceram os mesmos, que as regras que definem sua unidade, sua identidade ¢ suas relagdes recfprocas ndo mudaram pela ago do tempo.!* A meméria, nesta dimensao, recupera ¢ reproduz 0 mesmo no tempo. Nega, assim, seu carter dissolutor ¢ a produgdo incessante da mudanca. Fixa os sentidos ¢ as identidades, permitindo A sociedade, aos grupos ¢ classes em seu interior, tragar suas origens, garantir ¢ reconhecer sua permanéncia e sua identidade a despeito do tempo. Mas a meméria nao é, tio-somente, uma eterna repeticao do mesmo, do idéntico a si. Ela também é, potencialmente, uma ago reflexiva, uma inquisigdo proposta ao tempo, nao buscando identidades ¢ permanéncias, mas as diferengas, as transformagées, a mudanga. A memdria pode ser, assim, a afirmag&o do prdprio tempo, de sua eficdcia transformadora, Um meio para reconhecermos a transitoriedade de todos os presentes, a permanente mudanga dos momentos vividos em futuros que serio distintos do agora. Neste sentido, a memoria é uma reflexdo sobre a mudanga, como dimensio inerente do tempo das sociedades humanas, uma tomada de consciéncia sobre a produgao da diferenga, uma negacdo do 18 HOBSBAWN, E. “A Invengio das Tradigdes” in: Hobsbawn, E. & Ranger, E. (Org). A Invengdo das Tradigoes. Rio de Janciro, Zahar, 1984, pp. 9-17. 188 mesmo pelo reconhecimento de sua inevitével transformagio em outro. Ela traz em sia possibilidade de vermos o presente, ndo como uma realidade fixa e imutdvel, como algo eterno, mas como um produto humano, como um momento de passagem, uma ponte através da qual o passado constréi © futuro. E é para o futuro que se volta, assim, essa meméria ativa, afirmando 0 poder e a forga da ago humana sobre sua propria historia, desnaturalizando 0 tempo humano. A meméria coletiva é, deste modo, um meio fundamental da vida social, uma das dimensGes da agao coletiva ¢ um vefculo de poder. Poder, por exemplo, de transmitir ou perenizar uma meméria de si, ou de propor ou impor uma dada meméria & coletividade; poder de criar, refazer ou destruir identidades sociais, de dar sentido, corpo e eficdécia aos atos coletivos. O ato de meméria é um ato de poder ¢ o campo da meméria, o espago onde atuam seus lugares, € um campo de conflitos. Como afirma J. Le Goff, “a meméria coletiva foi um importante elemento da luta das forgas sociais pelo poder. Tomar-se senhor da meméria e do esquecimento é uma das grandes preocupagées das classes, dos grupos, dos individuos que dominaram e dominam as sociedades histéricas. Os esquecimentos e os siléncios da histé6ria so reveladores desses mecanismos de manipulagao da meméria coletiva”.® A memoria nfo é, portanto, um espago harménico e uniforme, nem se constitui, sobretudo hoje, num campo homogéneo, onde reine absoluta uma meméria hegeménica, uma s6 representagio do passado, seja aquela do Estado ou dos grupos dominantes. E verdade que os estados-nacio- nais, surgidos no perfodo modemo, usurparam para si muitos dos antigos lugares da meméria, reformando os calenddrios, reorganizando as come- moragées coletivas, propondo novos simbolos € novas tradigdes, que Ihes conferiam unidade ¢ legitimidade politica. verdade, igualmente, que esses estados-nacionais condicionam ainda, em larga medida, a produgdo social de meméria, financiando e institucionalizando o ensino e¢ a pesquisa histéricas ¢ formecendo, porque nfo, 0 quadro fundamental pelo qual sio pensadas as sociedades atuais e seu passado. Mas também é verdadeiro que, a despeito dos esforgos nesse sentido, essa centralizagio no con- duziu 4 produgio de uma meméria unificada e monolitica. Pelo contrério, assistimos hoje a uma verdadeira proliferagdo de mem@rias particulares, de modos diferentes de se representar o passado, mostrando que o processo de sua reinvengio nao é apangio exclusivo do Estado ou dos grupos que o dominam polftica e economicamente. A Ultima década, sobretudo, 1° LE GOFF, J. “Meméria”, in: Enciclopédia Einaudi, vol. I, Meméria-Histéria, Porto, Imprensa Nacional, 1984, p. 13. 189 conheceu uma exploséo de novas memérias, produzidas “espontanca- mente” ou nao, ¢ que tem como objeto, ¢ por vezes como autores, grupos sociais antes calados, ou excluidos do discurso social, como os negros, as mulheres, os homosscxuais, os operdrios, num esforgo para redefinir sua posigao diante da sociedade e para construir uma identidade no tempo que dé sentido a sua identidade de interesses ¢ de agdo. Essa necessidade de memérias particulares, que falem de um grupo para si mesmo ou para a coletividade, no é apandgio dos “excluidos”, mas € algo sentido mesmo pelos grupos dominantes, como mostra a expansio das “hist6rias de em- presa”, que unem o esforgo de fundamentar sua “publicidade” numa tra- digo A busca de uma identidade € de uma orientagdo para a agdo futura. Ora, essas memérias sociais, mais ou menos esponténeas ou particulares, nao se encontram, necessariamente, em conflito com a histéria cientifica. Em primeiro lugar, porque essas chamadas “memérias esponta- neas” nao sao, afinal, 140 esponténeas assim. Elas se utilizam, inevita- velmente, de pressupostos, conceitos, estruturas cognitivas que fazem parte das representagdes sociais dominantes. O discurso que produzem no €, tampouco, uma transcrico pura de eventos passados, nem uma recuperagiio imaculada de fatos e simbolos pretéritos. Ele € produzido, em grande parte — suma ironia! — a partir das reflexées, dos conceitos ¢ do trabalho dos historiadores profissionais.2° Hi, porém, um outro elemento a ser considerado. O proprio lugar da disciplina hist6rica no € um espago homogéneo, mas também um campo de conflitos. Néo podemos mais encaré-lo como uma caixa de ressonfncia da voz monolitica do estado-nacional ou das classes domi- nantes, como o foi por muito tempo, ¢ sim como uma estrutura de poder que, em parte ao menos, tem suas prOprias regras, seus préprios domi- nantes ¢ dominados, aqueles que controlam os postos universitérios, que elaboram os curriculos, que tem acesso aos meios de comunicagao, ¢ aqueles que se submetem ou que, pelo contrdrio, se voltam contra essa prépria estrutura. E por ser uma estrutura de poder, ¢ por absorver ¢ expressar em si mesma os conflitos, os choques de interesse e as distintas ‘is6es de mundo da sociedade como um todo, a disciplina histérica se abre para as demandas sociais, responde a elas, produzindo, também ela, memérias distintas e contraditérias entre si. O lugar da histéria, assim, define uma forma de produgio de saber, um modo de memoria, mas nao o faz de modo absoluto, uno € definitivo. 2 Veja-se GIDDENS, A... Social Theory and Modern Sociology. Cambridge, Polity Press, 1987, pp. 4-15. 190 Porque € um lugar que pode ser ocupado por grupos diferentes, que pode ser usado para rememorar, celebrar, glorificar 0 passado ¢ o presente, mas também, e sobretudo, para criticd-los, para defrontar-se com os vestigios do passado, demonstrando como e porque o presente foi produzido, de que modo as relacSes econOmicas, culturais © politicas determinaram, no curso da hist6ria, que grupos ¢ individuos conseguiram algar-se sobre a morte € perpetuar uma meméria de si. Mais do que tudo, é um lugar, também ele, em perpétua transformago, cujo controle € 0 espago de uma Iuta, que no precisa ser suprimido para ser altcrado. A histéria que fazemos nao € mais, assim, apenas a historia do Principe, para usar a expressdo de M. Certeau, nem aquela que visa apenas agradar seu pUblico.1 Ela se inscreve, precisamente, no espago instaurado entre ambos — 0 estado € o piiblico —, um espago ao mesmo tempo relativamente aberto € potencialmente critico. A tf mencionada fragmen- taco, pulverizago ou esmigalhamento da histéria cientifica em histérias particulares — um dos argumentos prediletos dos irracionalistas para negar qualquer verdade a ciéncia hist6rica, nada mais € do que um sintoma, um sinal dessa abertura da hist6ria &s realidade de sua época, as demandas que lhe so dirigidas pelos grupos sociais. Como disse no inicio, 36 existe hist6ria, reflexdo histérica, a partir do presente. Esse vinculo, no entanto, € mais profunde do que comumente se admite. Nao sfio apenas os interesses de uma época que estio em jogo. F a propria estrutura do presente, 0 modo como a realidade se impie a nés, que municia e guia nosso olhar ao refletirmos sobre 0 passado. Se a histéria cientifica se transforma, nao o faz por um simples impulso interno, mas porque o presente também se altera, e rapidamente, porque os su- portes tradicionais da meméria estéo sendo destrufdos numa yelocidade sem precedentes, porque vivemos num tempo que nos parece vertiginoso © que nao conseguimos mais explicar, inteiramente, pelas grandes sinteses de outrora. Essa insuficiéncia reflete-se na produgao historiogréfica, que se torou mais monogréfica, mais particularista, mais atenta ao detalhe que a0 conjunto. Mas nfo devemos desistir da busca de uma concep¢o global das sociedades humanas no tempo e sim, pelo contrério, amplié- la? Devemos abandonar © provincianismo de uma hist6ria “européia”, no duplo sentido de centrar-se na Europa ¢ de ter-se originado dela, em prol de uma historia verdadeiramente mundial, que produza uma visio integrada do passado e que corresponda a integragio das sociedades 2\ CERTEAU, M. A Escrita da Histéria. Rio de Janeiro, Forense, 1982, pp. 18-22. % Veja-se BURKE, P. “Abertura: a nova histéria, sev passado e seu futuro”, Burke, P. (org.). A Escrita da Histéria — novas perspectivas. Sio Paulo, UNESP, 1992, pp. 35-7. 191 humanas no presente. Nao se trata, contudo, apenas de incorporar novos temas, novos objetos, mas de abrir a tradigao européia, que deu origem histéria, a outras formas de pensamento e visées do mundo, para que cla ndo seja, como é, a universalizagéo de uma visio particular. F uma questo crucial e complexa e o espago de manobra parece, ainda, restrito, Talvez devamos nos conformar cm sermos “europeus” em nossa forma de pensar, embora ndo o sejamos politica ou economicamente. A hist6ria, como disciplina cientifica, no é simplesmente uma “ciéncia”, em qualquer dos sentidos que se dé a esta palavra. E mais do que isso. Ela faz parte da histéria cultural européia, que consideramos como a nossa propria. Ela participa de uma longa tradigao escrita, que por quase 3.000 anos acumulou ¢ construiu quadros, conceitos, sistemas para se pensar, de modo rigoroso, a sociedade humana ¢ a histria. Tradigao que, freqlien- temente, voltou-se sobre si mesma, para reciclar-se ¢ criticar-se. E verdade que seu controle ¢ o controle de sua difusio foram, durante muitos sé- culos, apangio dos grupos dominantes. & também verdade que seu em- prego depende de certos instrumentos fundamentais, como a alfabetizagao © © acesso ao ensino, que em nossa sociedade so desigualmente distri- bufdos, Mas a histéria, como parte dessa chamada “cultura erudita”, como tradigao escrita, ndo € a escrava fiel de um grupo exclusivo, nem 0 produto particular de uma s6 forga, mas uma produgao cultural coletiva, um quadro sofisticado para pensarmos a realidade ¢ nos propormos a transformé-la. A oposigdo entre meméria e histéria é, em grande parte ao menos, falsa ¢ occulta uma outra oposigdo, a meu ver igualmente inexata, entre cultura erudita e cultura popular. H4 uma tendéncia difusa, entre os historiadores, nuina espécie de mea culpa tardio, de criticar o cariter normativo, for- malizante ¢ classista da cultura erudita, opondo-Lhe uma cultura popular espontinea ¢ vivificadora. Néo me parece o melhor caminho para reequa- cionarmos essa relagéo. Nao € possivel para nés, historiadores, aban- donarmos completamente 0s quadros que nos oferece a tradigo. Nisto os irracionalistas tém certa parcela de verdade, Essa tradigao, que confundem ¢ identificam com a “razfo" ocidental, € imperial e monopolistica, pois para criticd-la temos de nos valer das armas que ¢la prépria oferece, Nilo existe espaco conceitual fora dela. E preciso, portanto, saber apropriar-se dessa tradigao, de sua forga representacional, para falarmos de ¢ para a sociedade, para produzirmos sentidos, propormos e criticarmos interpre- tages, para elaborarmos formas de representacao da hist6ria para nossa sociedade. Para que delas se apropriem, a seu proprio modo, os diferentes grupos sociais, envolvidos no eterna processo de repensar seu presente e de preparar as condiges do futuro. RESUMO © texto aborda algumas ques- wes conceituais e politicas da relapdo entre a Histéria produzida nos meios académicos, a chamada “Historia Ci- entifica” e 0 conjunto da producéo social de meméria. So analisadas al- gumas vertentes da historiografia con- tempordinea, que procuram pensar tal relagdo, seja propugnando uma total cisdo entre Meméria e Histéria, seja fundindo-as completamente, como di- ‘mensées equivalentes da atividade re- presentacional das sociedades contem- pordineas. ABSTRACT This article explores some political and conceptual issues, rela- ting 10 the relationship between His- tory, as an academic product, the so- called Scientific History, and the social production of memories as a whole Some recent trends propugnate a radical rupture between Memory and History, as well as those that abso- lutely unify them, as equivalent di- mensions of the representational acti- vity of contemporary societies. 193

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