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Retumbares metálicos enchiam o ar no pátio interior do Palácio.

Duas figuras, uma masculina e


de maior altura, a outra feminina e de movimentos ágeis. Dançavam de espadas em mão, desferindo
golpes e bloqueando outros, efetuando piruetas e desvios, no entanto, rapidamente se precebia que tal
confronto era amigável. Ambos sorriam, ambos carregavam espadas de lâminas redondas.
Alistair e Valéria Tor, um mais velho, a outra mais nova. Filhos do Rei Aldric, príncipe e
princesa.

Valéria Tor viera do Oeste sobre a identidade de uma simples comerciante ambulante. Imagine-
se a desgraça se se viesse a saber que a filha mais nova, do adorado Rei Aldric, se escapulira a meio da
noite. Que monarca seria ele se não conseguisse manter a própria família em ordem?
Valéria, a “Princesa Esqucida”, como era tão amávelmente referida por grande parte dos
membros da corte de Arrinia, passara as fronteiras dos domínios do seu pai numa manhã
particularmente gelada, deixando para trás os confortos de uma vida fácil e despreocupada. Nunca saíra
do reino; o senhor seu pai nunca a escolhera para visitas oficiais e tanto melhor, pois Valéria
considerava-as seriamente aborrecidas. Entretia-se então a percorrer os salões, jardins, cozinhas e a
biblioteca do palácio. Conhecia a centenária estrutura tão bem que era capaz de a atravessar de olhos
fechados. No entanto, era capaz de observar os guardas a marchar por horas, encantava-se
perdidamente por histórias de cavaleiros corajosos e canções sobre donzelas em aflição. De todos os
torneios que vira, o seu cavaleiro preferido sempre fora o seu irmão, Alistair Tor, herdeiro do reino e,
foi com ele que manuseou pela primeira vez numa espada, como prenda do seu décimo-quarto
aniversário.
Pequenos flocos de gelo aterravam-lhe sobre o cabelo cinza, usado numa trança sobre o ombro
esquerdo. A estrada por onde a carroça seguia era solitária, ladeada apenas por árvores despidas de
ramos retorcidos e povoada pelo ocasional coelho que saltava pela neve. Com ela viajavam mais três
indivíduos. O condutor, um homem idoso de pele enrugada e disposição semelhante, um comerciante
de bigode ondulado, carregado com uma mala repleta de pequenas lupas dos mais diversos feitios e
formas e uma mulher de face tapada por um capuz negro.
A estrada esburacada causava grandes tremores no interior da carroça, levando o comerciante a
expirar audívelmente. Desiludido por não receber qualquer atenção, dirigiu-se a Valéria.
– Porque carrega uma espada, menina?

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