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SIGMUND FREUD BRAS COMPLETAS VOLUME 12 INTRODUCAO AO NARCISISMO, ENSAIOS DE METAPSICOLOGIA E OUTROS TEXTOS (1914-1916) ‘TRADUCAO PAULO CESAR DE SOUZA Copysgh dado © = um traluidos de Gessnmel Werke, volume x, (Fankfur: Facer, 2020) caper images dor a aval bor) Ted a Bandera Paulina 7 6-3 “Telon (1)5 wer compunindasleras.com be LUTOEMELANCOLIA Depois que o sonho nos serviu como modelo normal dos distirbios psiquicos narcisicos, fagamos a tentativa de eluci- dar a natureza da melancolia, comparando-a com o afeto normal do luto.” Mas desta vez temos que admitir algo de antemio, para evitar uma superestimagio de nossos resul- tados. A melancolia, cuja definigao varia mesmo na psiquia- tria deseritiva, apresenta-se em variadas formas clinicas, cujo agrupamento numa s6 unidade nao parece estabeleci- do, edas quais algumas lembram antes afecg6es somiticas"* do que psicogénicas. Sem contar as impressbes disponiveis, a qualquer observador, nosso material se limita a um pe~ queno niimero de casos, cuja natureza psicogénica nao per- rmitia divida. Assim, desde jé renunciamos a toda pretensio de validade universal para nossas conclusdes, e nos conso- amos na reflexio de que, dados os nossos atuais meios de pesquisa, difcilmente poderiamos encontrar algo que nio fosse ripico, e nao de toda uma classe de afecgdes, a0 menos de um grupo menor delas. ‘A associagdo de luto com melancolia mostra-se justifica- dda pelo quadro geral desses dois estados.' Neles também coincidem as causas oriundas das interferéncias da vida, a0 ‘menos onde é possivel enxergé-las. Via de regra, luto € a OLIA L5]) ANENTE oR 46; ABE * *Luto”: Thauer € pertinente registrar que esse termo alemio sig- nifica tanto “luto” como “tristeza”; assim, 0 equivalente em portu- ‘guts do adjetivo wraurg &“triste". ** No original, somatic; aqui caberia, provavelmente, o termo “or stinicas", pois uma doenga somética ainda pode ser psicossomitica 1 Abraham, a quem devemos o mais relevante dos poucos estudos psicanaliticos sobre o tema, também parti dessa comparagio [em Zenirallat fr Peychoanalyse,.2,n.6,1912]- {LUTOE MELANCOLIA reagfo & perda de uma pessoa amada ou de uma abstragio que ocupa seu lugar, como patria, liberdade, um ideal ete. Sob as mesmas influéncias observamos, em algumas pes- s0as, melancolia em ver de luto, e por isso suspeitamos que nelas exista uma predisposico patolégica. Também é digno de nota que jamais nos ocorre ver o Tuto como um estado patolégico ¢ indicar tratamento médico pata ele, embora ‘ocasione um sério afastamento da conduta normal da vida. ‘Confiamos em que sera superado apés certo tempo, each: mos que perturbi-lo¢ inapropriado,aré mesmo prejudicial. ‘A melancolia se caracteriza, em termos psiquicos, por um abatimento” doloroso, uma cessagao do interes se pelo mundo exterior, perda da capacidade de amar, inibigio de toda atividade e diminuigo da autoestima,”* + “Abatimento”: Perstimmung, no original. Além das versbes in , € par isso suspeitamos que patol6gica. Também é digno + ver 0 luto como um estado to médico para ele, embora » da conduta normal da vida. do apés certo tempo, e acha- siado, até mesmo prejudicial ‘iza, em termos psiquicos, >, uma cessago do interes- da da capacidade de amar, iminuigo da auroestima,* ‘plead cleanin Sasloe aoe [Pieri WEG taal, I taplanchee-B-Ponlis no MouseaAd). lagen ti exe dc, de, oe Ba ies tates ee ee eee Se npereaale, ase rg gsi dea era peter seapecestinactagpatane See erresnyeacts por eeia arene eer buble eate ole Findon eal LUTOE MELANCOLIA que se expressa em recriminagies e ofensas a propria pessoa e pode chegar a uma delirante expectativa de pu- nico. Esse quadro se torna mais compreensivel para 16s se consideramos que o luto exibe os mesmos tragos, ‘com excegio de um: nele a autoestima no é afetada, De resto €0 mesmo quadro. O tuto profundo, a reagio & perda de um ente amado, comporta o mesmo doloroso abatimento, a perda de interesse pelo mundo externo — na medida em que no lembra o falecido —, a perda da capacidade de eleger um novo objeto de amor —o que significaria substituir 0 pranteado —, 0 afastamento de toda atividade que nao se ligue & meméria do falecido. Logo vemos que essa inibigdo e restrigo do Eu expri- ‘me uma exclusiva dedicaglo ao Tuto, em que nada mais resta para outros intuitos e interesses. Na verdade, esse ‘comportamento s6 no nos parece patologico porque sabemos explicé-lo bem. ‘Também admiticemos a comparagio que qualifica de “doloroso” o estado de animo do luto. A justificativa para isso provavelmente ficaré clara quando pudermos caracterizar a dor do ponto de vista econémico. Em que consiste 0 trabalho realizado pelo luto? Nao me parece descabido expor esse trabalho da forma se- guinte. O exame da realidade mostrou que 0 objeto amado no mais existe, e entio exige que toda libido seja retirada de suas conexdes com esse objeto. Isso des perta uma compreensivel oposicio — observa-se geral- ‘mente que o ser humano no gosta de abandonar uma posiglo libidinal, mesmo quando um substituro jé se anuncia, Essa oposigo pode ser tio intensa que se pro- LTO E MeLANCOLIA dduz um afastamento da realidade e um apego ao objeto ‘mediante uma psicose de desejo alucinatéria (ver 0 ensaio anterior). O normal é que venga o respeito a realidade. Mas a solicitagio desta no pode ser atendida imediata- mente. E cumprida aos poucos, com grande aplicagio de tempo e energia de investimento, ¢ enquanto isso a existéncia do objeto perdido se prolonga na psique. Cada uma das lembrangas e expectativas em que alibi do se achava ligada ao objeto é enfocada e superinvesti- da, e em cada uma sucede o desligamento da libido. Nao i fundamentar economicamente por que é to do- lotosa essa operagéio de compromisso em que o manda- mento da realidade pouco a pouco se efetiva. E curioso que esse doloroso desprazer nos pareca natural. Mas 0 faro é que, aps a consumagio do trabalho do luto, o Eu fica novamente livre e desimpedido.* Apliquemos agora &melancolia o que verificamos sobre 0 luto. Numa sérié de casos, é evidente que também ela pode ser reagio & perda de um objeto amado; em outras ocasides, nota-se que a perda é de natureza mais ideal. © objeto nfo morreu verdadeira- + “Desimpedido": ungehemm euja tradugio literal, adotada nas. outras versbes, é “no inibido, desinibido”; mas adotamos aqui ‘essa altemativa, por consderar que em portugués—no portugues do Brasil, pelo menos — “desinibido” denota alguém descontrai- do, extrovertido, © verbo hemmen significa “obstruir, impedis, deter, estorvar”, mas seu substantivo, Hemmung, é normalmente traduzido por “inibigio", como no titulo niigso,sinoma e angi tia, o que implica um certo abrandamento do significado original, de e um apego 20 objeto alucinatéria (ver 0 ensaio ‘ga.0 respeito a realidade. de ser atendida imediata- s, com grande aplicagio nento, e enquanto isso a se prolonga na psique, spectativas em que a libi- senfocada e superinvesti- sligamento da libido. Nao amente por que é t30 do- ‘omisso em que o manda- uco se efetiva. I curioso vos parega natural. Mas 0 do trabalho do luto, o Eu sdido.* ncolia o que verificamos © casos, 6 evidente que > Aperda de um objeto nota-se que a perda é de sno morren verdadeira- 1 tradugao literal, adotada nas sinibido”; mas adotamos aqui ‘em portugués — no portugués 4o denota alguém descontrai- + significa “obstrur, impedir, vo, Hemmung, &normalmente title Inigo, sintoma eangiis~ mento do significado original, LUTOE MELANCOLIA mente, foi perdido como objeto amoroso (0 caso de uma noiva abandonada, por exemplo). Em outros ca~ sos ainda, achamos que é preciso manter a hipétese de tal perda, mas no podemos discernir claramente 0 que se perdeu, e é licto supor que tampouco 0 doente pode ver conscientemente 0 que perdeu. Esse caso poderia apresentar-se também quando a perda que ocasionou a melancolia é conhecida do doente, na medida em que ele sabe quem, mas no o que perdeu nesse alguém. Isso nos inclinaria a relacionar a me- lancolia, de algum modo, a uma perda de objeto sub- traida & consciéncia; diferentemente do luto, em que nada é inconsciente na perda. - No luto, vimos a inibigo e a auséncia de interesse explicadas totalmente pelo trabalho do luto que absorve © Bu. Na melancolia, a perda desconhecida tera por consequéncia um trabalho interior semelhante, e por isso serd responsivel pela inibigao que é pr6pria da me- lancolia. Mas a inibigfo melancélica nos parece algo enigmético, pois no conseguimos ver 0 que tanto ab- sorve 0 doente. O melancélico ainda nos apresenta uma coisa que falta no luto: um extraordindrio rebaixamento da autoestima,” um enorme empobrecimento do Eu. No + 0 termo aqui wsado por Freud & Jehgefil, variante-sinbnimo de ‘Selbugefihl, «por isso traduzido pelo equivalente desse (ef. nota & p- 172). Das verses consultadas, quatro mantiveram essa tradugio, fenquanto a nova espanhola (argentina) eas duas francesas prferi- ram, mais lteralmente,sentiniento yoio, sentiment d'setime di moi © sentiment dma. LUTOE MELANCOLIA Iuto, é 0 mundo que se torna pobre e vazio; na melanco- lia, 60 préprio Eu. O doente nos descreve seu Eu como indigno, incapaz. e desprezivel; recrimina e insulta a si mesmo, espera rejeigio e castigo. Degrada-se diante dos outross tem pena de seus familiares, por serem liga- dos a alguém tio indigno, Néo julga que Ihe sucedeu uma mudanga, e estende sua autocritica ao passados afirma que jamais foi melhor. © quadro desse delirio de pequenez — predominantemente moral —é completa do com ins6nia, recusa de alimentagiio e uma psicologi- camente notivel superacio do instinto que faz todo vi- vente se apegar a vida. ‘Tanto do ponto de vista cientifico como do terapéu- tico seria infecundo contradizer 0 paciente que faz essas acusages ao proprio Eu. De algum modo ele deve ter razio, deve descrever algo que se passa tal como the parece. Algumas de suas afirmagéies temos de confir- ‘mar imediatamente, sem restrig6es. Ele se acha real- ‘mente sem interesse, incapaz para 0 amor e para real zar coisas, tal como diz. Mas isso é secundrio, como sabemos; é consequéncia do trabalho interno que con- some seu Eu, trabalho que desconhecemos, comparivel ao luto, Em algumas outras autoineriminagées © pa- ciente também nos parece ter razdo e apenas aprender a verdade de maneira mais aguda do que outros, que nao sio melancélicos. Quando, em exacerbada autoc: tica, ele pinta asi mesmo como uma pessoa mesquinha, egofsta, insincera, sem autonomia, que sempre buscou apenas ocultar as fraquezas do seu ser, pode ocorrer, pelo que sabemos, que tenha se aproximado bastante »ena pobre e vazio; na melanco- vente nos descreve seu Eu como vezivel; recrimina ¢ insulta a si € castigo. Degrada-se diante seus familiares, por serem liga- 10. Nao julga que Ihe sucedeu te sua autocritica a0 passado; Ihor. O quadro desse delirio de tatemente moral — & completa- e alimentagao e uma psicologi- o do instinto que faz. todo vi- sta cientifico como do terapéu- radizer o paciente que faz.essas \. De algum mode ele deve ter Igo que se passa tal como lhe s afirmagdes temos de confir- 1 restrigdes, Ele se acha real- apaz para o amor e para reali- Mas isso é secundério, como 1 do trabalho interno que con- te desconhecemos, compardvel atras autoincriminagées 0 pa- ve ter razio e apenas apreender sais aguda do que ontros, que uzando, em exacerbada autocri- como uma pessoa mesquinha, ‘utonomia, que sempre buscou zzas do seu ser, pode ocorrer, tenha se aproximado bastante LUTOE MELANCOLIA do autoconhecimento, ¢ perguntamo-nos apenas por (que é necessério adoecer para aleangar uma verdade ‘como essa. Pois nao ha diivida de que quem chega a sa avaliagio de si mesmo e a expressa diante dos ou- ‘ros —avaliacao similar & que o principe Hamlet faz de si ede todos os outros’ — esté doente, quer diga a ver- dade, quer seja mais ou menos injusto consigo. Tam- pouco é dificil notar que no existe correspondéncia, a nosso ver, entre a escala do autoenvilecimento ¢ sua real justificagio. Uma mulher que sempre foi boa, ze- losa e capaz nfo falaré melhor de si mesma, na melan- colia, do que uma verdadeiramente imprestavel; etal- vez ela tenha maior probabilidade de adoecer de ‘melancolia do que a outra, da qual nada saberiamos falar de bom, Deve nos chamar a atencao, por fim, que ‘o melancélico nfo age exatamente como alguém com- pungido de remorso e autorrecriminagdo de maneira normal. Ele carece da vergonha diante dos outros, que seria a principal caracteristica desse estado, ou ao me- nos néo a exibe de forma notavel. No melancélico tal- ‘vez possamos destacar um trago oposto, uma insistente lidade que acha satisfag3o no desnudamen- to de si préprio. Nio é essencial, portanto, saber se o melaneélico est correto em sua penosa autodepreciacio, até que onto sua eritica coincide com o julgamento dos ou- 2 “Use every man after his desert, and who should scape whipping?” (Trate cada homem conforme seu mérito, e quem escaparé do agoite?] (Homie, sto 1, cen 2). LUTOENELANCOLIA tros. A questio é, isto sim, que ele de: mente sua situagao psicolégica. Ele perdeu 0 amor- proprio’ e deve ter tido boas razdes para isso. Mas assim nés nos vemos ante uma diserepaincia, que c ca.um problema de dificil solugao. Fazendo analogia com 0 luto, coneluimos que ele sofreu uma perda rela- tiva a0 objeto; suas declaragbes indicam uma perda no proprio Eu, ‘Antes de lidarmos com essa discrepincia, detenha- ‘mo-nos por um momento na visio que a doenga do me- lancélico nos oferece da constituigio do Eu humano. ‘Vemos como uma parte do Eu se contrapée & outra, faz dela uma avaliagao critica, toma-a por objeto, digamos. Nossa suspeita de que a instincia eritica ai dissoci do Eu poderia, em outras condigdes, demonstrar tam- bém sua autonomia, seré confirmada em toda observa- fo posterior. Realmente encontraremos motivo para separar essa instancia do resto do Eu. Aqui travamos conhecimento com a instincia habitualmente chamada de consciéncia morals" n6s a incluiremos entre as gran- des instituig6es do Eu, a0 lado da censura da conscién- cia e do exame da realidade, e encontraremos provas de prio": Selbtachuung, que nas versdes consultadas foi traduido por: “autorrespeito”, propia extimacién,respeto por simis~ ‘mo risptia di sé, respect de rai, er, onsciéncia moral”: Gewisren; Lingua alema tem essa pala- va para designar a conscigncia moral e uma outra, Bewysisein, para a con dgica — diferentemente das linguas ro~ rmanieas, em qu che, Além do bem e do mal, op. cit.,nota 14. ue ele descreve correta- ca. Ele perdeu 0 amor- 1s razes para isso. Mas a discrepdncia, que colo- lugio. Fazendo analogia le sofreu uma perda rela- ¢s indicam uma perda no sa diserepincia, detenha- "iso que a doenga do me- stituigio do Eu humano. {se contrapée & outra, faz na-a por objeto, digamos. Incia critica af dissociada adigdes, demonstrar tam- Grmada em toda observa~ sontraremos motivo para to do Eu. Aqui travamos a habitualmente chamada ncluiremos entre as gran- oda censura da consei + encontraremos provas de gue nas versbes consultadas foi ia eximacin, resper por simis- 4, selfregard. 5 lingua alemd tem essa pala roral e uma outra, Bewyfisein, difecentemente das linguas ro- 1m os dois setidos; cf. Niets- nota 14, LUTOE MELANCOLA que é capaz de adoecer por si propria. No quadro clini- ‘co da melancolia, a insatisfago moral com o préprio Eu é destacada relativamente a outras coisas: defeitos fisi- cos, feitira, debilidade, inferioridade social, muito mais raramente sio objeto da autoavaliagdo; s6 0 empobreci- ‘mento ocupa higar privilegiado entre os temores ou di- zeres do paciente. [A discrepdincia mencionada pode ser esclarecida por meio de uma observago que nio ¢ dificil de fazer. Ou- vvindo com paciéneia as varias autoacusagées de um me- Iancélico, néo conseguimos, afinal, evitar a impressio de que frequentemente as mais fortes entre elas niio se adequam muito a sua propria pessoa, e sim, com peque- nas modificagées, a uma outra, que o doente ama, amou ‘ou devia amar. Toda vez que examinamos 0 fato, essa suposigio é confirmada. De maneira que temos a chave para o quadro clinico, 20 perceber as recriminagiies @ si mesmo como-recriminagdes a um objeto amoroso, que deste se voltaram para o proprio Eu. ‘A mulher que deplora o fato de seu marido se achar ligado a uma mulher to incapaz esta, na verdade, acu- sando a incapacidade do marido, em qualquer sentido {que esta seja entendida. Nao devemos nos admirar mui- to de que haja algumas autorrecriminagdes genuinas entre aquelas voltadas contra si mesmo; permite-se que las aparegam porque ajudam a ocultar as demais ea impossibilitar o conhecimento da situagdo; elas se orig znam também dos prés e contras no conflito amoroso ‘que levou a perda amorosa. A conduta dos doentes tam- ‘bém fica mais compreensivel agora. Para eles, queixar- LUTOE MELANCOLIA -se é dar queixa, no velho sentido do termo.” Nao se en- vergonham nem se escondem, pois tudo de desabonador «que falam de si mesmos se refere, no fundo, a outra p. soa. E esto longe de mostrar, para com aqueles a seu redor, a humildade e a sujeigo que convém a pessoas ‘Ho indignas; pelo contrério, so extremamente impor~ tunos, agindo sempre como que ofendidos, como se lhes tivesse sido feita uma grande injustica. Isso tudo & pos- sivel apenas porque as reagBes exibidas nesse seu com- portamento ainda vém da constelagao ps{quica da revol- ta, que, por um determinado processo, foi transportada para a compungio melaneélic Nao ha dificuldade, ento, em reconstruir esse pri cesso. Havia uma escolha de objeto, uma ligagio da li- bido a certa pessoa; por influéncia de uma real ofénsa ow decepgao vinda da pessoa amada, ocorreu um abalo ne: sa relagio de objeto. O resultado nao foi o normal — a libido ser retirada desse objeto e deslocada para um novo—, esim outro, que parece requerer varias condi- es para se produzir. O investimento objetal demon: trou ser pouco resistente, foi cancelado, mas a libido li- * "Para eles, queixar-se€ dar queixa": Jie Klagen sind Anklagen. Foi adotada a solugdo de Marlene Carone, que conserva jogo de pala- vras do original, Das demais versbes consultadas, a segunda em es- ppanhol, que utiliza “queixa” “querela” seria outra opso em portu= ‘guéss eis o que elas dizem: Sus lamencos son quajas, Sus gusjar {Klagen}[sics entre chaves] son realmente querllas {Anklagen}, Le loro “lamenle” ono “lognance” Les plantes son des plaints pores comure, Leurs plaints sont des plaintee accusarices, Their complaints are ‘ally plant”. Quase todas incluem nota com os termos origin do termo." Nao se en- studo de desabonador ‘no fundo, a outra pes- tra com aqueles a seu {ue convém a pessoas =xtremamente impor- ‘endidos, como se Ihes stiga, Isso tudo & pos- ibidas nesse seu com- #0 psiquica da revol- sso, foi transportada reconstruir esse pro- to, uma ligagiio da li- de uma read ofénsa ow corren um abalo nes- 180 foi o normal —a > destocada para um equerer varias condi- nto objetal demons- slado, mas a libido li- lagen sind Anklagen. Foi 2 conserva o jogo de pala ‘ltadas, a segunda em es- ria ourra opgio em portu- 9s som gusjas, Sus gusjae querellas {Anklagen), Le tes son des plaints pores ‘ries, Their complaines are >m 0s termos originas LUTOE MELANCOLIA ve nio foi deslocada para outro objeto, e sim recuada para o Eu. Mas Ii ela nfo encontrou uma utilizagao qualquer: serviu para estabelecer uma identificagiéo do Eu com o objeto abandonado. Assim, a sombra do obje~ to caiu sobre o Eu, ¢ a partir de entio este péde ser jul- gado por uma instancia especial como um objeto, 0 ob- jeto abandonado. Desse modo a perda do objeto se ‘ransformou numa perda do Eu, e 0 conflito entre o Eu © a pessoa amada, numa cisio entre a critica do Eu eo Eu modificado pela identificagio. ‘Uma ou duas coisas podem ser diretamente inferidas* dos pressupostos e resultados de tal processo. Por um lado, deve ter havido uma forte fixagio no objeto amo- 0505 por outro, e contrariando isso, uma pequena resis- téncia do investimento objetal. Essa contradigio parece requerer, conforme uma pertinente observagao de Otto Rank, que a escolha objetal tenha ocorrido sobre base nareisica, de modo que o investimento objetal possa, a0 Ihe aparecerem dificuldades, regredir ao narcisismo. A identificagao narcisica com 0 objeto se torna, entdo, substituto do investimento amoroso, do que resulta que a relagio amorosa néo precisa ser abandonada, apesar * © problemitico verbo erraven fo traduzido por “infers” nessa fra- se; a5 versdes consultadas oferecem: “perceber”, deduct, coligir, ‘omissio na italiana, deiner, idem, infered. Na frase seguinte, “resis. ‘ncia”traduz Resistenz, que ndo deve sec confundido com Widers- ‘and, usado por Freud para denotar 0 conceito psicanalitico de dif- ‘eultasio ou oposicio ao conhecimenta do inconsciente; esse termo alemdo é mais abrangente que aquele, tem mais sentidos gurados. LUTOE MELANCOLIA do conflito com a pessoa amada. ‘Tal substituigo do pjetal pela identificago é um mecanismo impor- tante nas afeegdes narcfsicas; Karl Landauer péde mos- tri-la recentemente no processo de cura de uma esqui~ zofrenia.? Corresponde, naturalmente, a regressio de um tipo de escolha de objeto ao narcisismo original. Expu- semos, em outro lugar, que a identificagdo & o estagio Preliminar da escolha de objeto, eo primeiro modo, am- bivalente em sua expresso, como 0 Eu destaca um obje~ to. Ele gostaria de incorporar esse objeto, e isso, confo me a fase oral ou canibal do desenvolvimento da libido, por meio da devoragio. Abraham relaciona a isso, justi- ficadamente, a recusa de alimentagio que se apresenta na forma grave do estado melancélico. A conclusto que pede nossa teoria, de que a predis- do a adoecer de melancolia, ou parte dela, reside na predomindncia do tipo narcisico de escolha de objeto, infelizmente ainda careve de confirmagio através da pe \s frases iniciais deste estudo reconheci que 0 material empirico em que ele se baseia nio satisfaz nos- sas pretenses. Se nos fosse permitido supor que a ob- servagio coneorda com nossas inferéncias, nao hesita- famos em acolher em nossa caraeterizagio da melancolia do investimento objetal a fase oral da libido, ente ao narcisismo. Identificagdes com o objeto também nio sio raras nas neuroses de transferén- cia, s40 mesmo um conhecido mecanismo de formagio 5 [Spontanheilung einer Katatonie (Cura espontinea de uma cata~ | toni)] Internationale Zeitslrif fir driche Prychoanatyse,v. 2, 194 amada. Tal substituigfo do ‘go € um mecanismo impor- 1s; Karl Landauer péde mos- veesso de cura de uma esqui- turalmente, & regressdo de um 6 naxcisismo original. Expu- ve a identificagao € 0 estagio sjeto, eo primeiro modo, am- como 0 Eu destaca um obje- -aresse objeto, ¢ isso, confor- 0 desenvolvimento da libido, »raham relaciona a isso, justi- limentago que se apresenta aelancdlico. rossa teoria, de que a pre colia, ou parte dela, reside na rcisico de escolha de objeto, confirmagao através da pes- leste estudo reconheci que 0 ale se baseia ndo satisfaz nos « permitido supor que a ob- ossas inferéncias, ni hesita~ caracterizagio da melancolia 2 objetal A fase oral da libido, isismo. Identificagées com 0 asnas neuroses de transferén- ‘do mecanismo de formaga0 nie (Cura espontines de uma cara- Iarliche Prychoanalyte,¥.2, 1914. LUTOE MELANCOLA de sintomas, sobretudo na histeria. Mas podemos enxer- gar a diferenca entre a identificagao narcisica e a histéri- ca no fato de naquela o investimento objetal ser abando- nado, enquanto nesta ele persiste e mostra influéncia, que geralmente se limita a determinadas agdes e inerva- ges isoladas. De todo modo, também nas neuroses de transferéncia a identificagao é expresso de algo em co- mum, que pode ser amor. A identificagao narcisica € a ‘mais antiga ¢ nos abre o caminho para 0 entendimento da identificagao histérica, menos estudada. Portanto, a melancolia toma uma parte de suas carac- teristicas do luto, e outra parte da regressio, da escolha de objeto narcfsica para o narcisismo. Ela é, por um lado, como 0 luto, rea¢o & perda real do objeto amoroso, mas além disso é marcada por uma condigo que se acha au- sente no luto normal, ou que, quando aparece, transfor- ‘ma-o em patolégico. A perda do objeto amoroso é uma excelente ocasio para que a ambivaléncia das relagoes amorosas sobressaia e venha & luz. Quando existe predis- osigio para a neurose obsessiva, o conflito da ambiva- léncia empresta ao luto uma configuragio patoldgica e 0 leva a se exprimir em forma de autorrecriminagbes, nas quais 0 individuo mesmo teria causado — isto é, deseja- do —aperda do objeto de amor. Essas depressBes neu- r6tico-obsessivas que se seguem & morte de pessoas ama- das nos mostram o que o conflito da ambivaléncia realiza por sis6, quando nio hé também uma retragdo regressi- va da libido. As ocasides para a melancolia geralmente no se limitam 20 caso muito claro de perda em virtude dda morte, e abrangem todas as situagées de ofensa, me- LUTOE MELANCOLIA nosprezo e decepgio, em que uma oposiglo de amor € dio pode ser introduzida na relacao, ou uma ambivalén- cia existente pode ser reforcada. Entre as precondigdes da melancolia nfo devemos negligenciar esse conflito da ambivaléncia, que ora se origina na realidade, ora na constituigio do individuo. Se o amor a0 objeto —a que rio se pode renunciar, quando se tem de renunciar ao objeto mesmo — refuugia-se na identificago narcfsica, 0 6dio atua em relagio a esse objeto substitutivo, insultan- do-o, rebaixando-o, fazendo-o softer ¢ obtendo uma sa- tisfagao sidica desse sofrimento. © automartirio clara~ mente prazeroso da melancolia significa, tal como 0 fenémeno correspondente na neurose obsessiva, a satis facio de tendéncias sédicas e de 6dio'relativas a um obje~ to, que por essa via se voltaram contra a prépria pessoa. [Nas duas afecgties os doentes habitualmente conseguem, através do rodeio da autopunig&o, vingar-se dos objetos originais ¢ torturar seus amores por intermédio da doen a, depois que se.entregaram a ela para nfo ter de thes mostrar diretamente sua hostilidade. A pessoa que pro- vyocou o distirbio afetivo do doente, e para a qual esta orientada sua doenga, normalmente se encontra no circu- Jo imediato dele. Assim, o investimento amoroso do me- lancélico em seu objeto experimentou um duplo destino: parte dele regrediu & identificago, mas outra parte, sob a influéncia do conflito da ambivaléncia, foi remetida de volta 20 estgio do sadismo, mais préximo desse conflito. 14 Sobre a diferenga entre elas, ver o ensaio sobre “Os instintos © seus destinos". formidével naangtsta| de libido, biamos, 6 de suicidio censina que 20 retorno ‘mo como que uma oposicio de amor ¢ tarelagio, ou uma ambivalén- sada, Entre as precondigdes da negligenciar esse conflito da origina na realidade, ora na Se o amor ao objeto —a que tando se tem de renunciar 20 se na identificagio nareisica, 0 2 objeto substitutivo, insultan- 4o-o softer ¢ obtendo uma sa- mento. O automartirio clara~ nce nna neurose obsessiva, a satis- ede 6dio'relativas aum obje- ram contra a propria pessoa. tes habirualmente conseguem, »anigdo, vingar-se dos objetos nores por intermédio da doen- cam a ela para ndo ter de Ihes tostilidade. A pessoa que pro- do doente, e para a qual esta nalmente se encontra no cfrcu- investimento amoroso do me- -perimentou um duplo destino: ficaglo, mas outra parte, soba ambivaléncia, foi remetida de 0, mais proximo desse contlito. significa, tal como 0 . ver 0 ensaio sobre “Os instintos ¢ UTD MELANCOLIA Apenas esse sadismo nos resolve 0 nagdo ao suicidio, que torna a melancolia to interes sante — e tio perigosa. Nés percebemos, como 0 esta do primordial de onde parte a vida instintual, um tio formidével amor do Bu a si proprio, vemos liberar-se, nna angtistia gerada pela ameaga a vida, um tal montante de libido narcisica, que nao entendemos como esse Eu pode consentir na sua propria destruigao. H muito sa- biamos, é verdade, que um neurético nao abriga ideias de suicidio que no venham de um impulso homicida ‘em relagio a outros, voltado contra si; mas era incom= preensivel 0 jogo de forgas em que tal intengio conse- gue se tornar ato. Agora a andlise da melancolia nos ensina que o Eu pode se matar apenas quando, gracas a0 retorno do investimento objetal, pode tratara si mes~ ‘mo como um objeto, quando é capaz.de ditigir contra si a hostilidade que diz respeito a um objeto, e que consti- tui a reagio original do Eu a objetos do mundo externo (ver “Os instintos e seus destinos”). Assim, na regres- so da escolha de objeto narcfsica 0 objeto foi elimina~ do, é verdade, mas demonstrou ser mais poderoso que 0 proprio Eu. Nas duas situagdes opostas do total enamo- ramento ¢ do suicidio, o Eu é subjugado pelo objeto, ‘embora por caminhos inteiramente diversos. ‘Quanto a uma caracterfstica notavel da melancolia, a proeminéncia do medo de empobrecer,é plausfvel supor «que deriva do erotismo anal arrancado de seus vinculos « transformado regressivamente. ‘A melancolia nos situa perante outras questées ainda, para as quais no temos todas as respostas. O fato de de~ LUTOE MELANCOLIA saparecer ap6s um certo tempo, sem deixar trago de grandes mudangas, é uma caracteristica que partilha com © luto. No caso deste, tivemos a explicagio de que é pre- ciso tempo para a detalhada execugio do mandamento do exame da realidade, e depois desse trabalho o Eu tem liberada do objeto perdido a sua libido. Podemos imagi- nar 0 Eu ocupado em trabalho semelhante na melancolias 1nos dois casos, falta-nos a compreensio econémica do processo. A insSnia, na melancolia, testa provavelmente a rigides do estado, a impossibilidade de cumprir a reti- rada geral de investimentos que o sono requer. O com- plexo da melancolia se comporta como uma ferida aber~ ta, de todos os lados atrai energias de investimento (que chamamos de “contrainvestimentos” no caso das neuro- ses de transferéncia) e esvazia o Eu até o completo empo- brecimento; com facilidade pode se mostrar resistente 20 desejo de dormir do Eu. Um fator provavelmente soma tico, que nose explica de forma psicogénica, apresenta- ~se na atenuago que costuma ocorrer nesse estado de- ois que anoitece. Ligada a essas observacies est a questi de se néo bastaria uma perda no Eu, sem consi deragio do objeto, para produzir o quadro da melanc ixico direto da libido do Eu no poderia resultar em certas formas da doena, A peculiaridade mais singular e mais carente de ex plicago, na melancolia, formar em mania, um estado com sintomas opostos aos dela. Nao é toda melancolia que tem esse destino, como se sabe. Muitos casos evoluem com recidivas periddicas, tempo, sem deixar trago de ccaracterfstica que partilha com mos a explicacio de que é pre~ ida execugéo do mandamento lepois desse trabalho o Eu tem ‘sua libido, Podemos imagi- tho semelhante na melancolia; 1 compreensio econémica do lancolia, atesta provavelmente ossibilidade de cumpric a reti- ' que 0 sono requer. © com- xporta como uma ferida aber- vnergias de investimento (que timentos” no caso das neuro- +ia 0 Euaté 0 completo empo- pode se mostrar resistente a0 1 fator provavelmente somé- oma psicogénica, apresenta- ma ocorrer nesse estado de- a essas observagies esti a ma perda no Eu, sem consi ‘uri 0 quadro da melancolia, }xico direto da libido do Eu as formas da doenga, gular e mais carente de ex- siste na tendéncia a se trans- >.com sintomas opostos aos. que tem esse destino, como n com recidivas periédicas, LUTOE MELANCOLIA em cujos intervalos percebemos muito pouca — ou ne- snhuma — tonalidade de mania. Outros exibem a regu lar alterna de fases melancéticas e maniacas que le- vou a proposigo de uma loucura ciclica. Seria tentador ‘iio aprender esses casos como psicogénicos, se 0 tra- balho psicanalitico nao tivesse permitido solucionat ¢ influir terapeuticamente em varios deles. Portanto, é ‘do apenas licito, mas até mesmo imperioso estender & mania a explicagao psicanalitica da melancolia Nao posso prometer que essa tentativa serd comple- tamente satisfatéria. Na reali ide, ela deve apenas tor~ nat possivel uma orientagio inicial. Dispomos, aqui, de dois pontos para nos sustentarmos: 0 primeiro, uma im- pressio psicanaliticas o outro, o que poderfamos chamar de uma experiéncia econdmica geral. A impressio, jé comunicada por diversos pesquisadores psicanaliticos, é que a mania nao tem contetido diferente da melancolia, que as duas afecgées Iutam com 0 mesmo “complexo”, ao qual o Eu provavelmente sucumbe na melancolia, en- quanto na mania ele o sobrepuja ou pBe de lado. O outro onto de partida nos é dado pela experiéncia de que em todos os estados de alegria, jibilo, triunfo, que nos for- rnecem 0 modelo normal da mania, percebem-se os mes- mos determinantes econémicos. Nesses estados, uma interferéncia torna afinal desnecessério um grande dis- éndio de energia psiquica por muito tempo mantido ou feito por habito, de modo que ela fica disponivel para Outros usos e possibilidades de descarga. Por exemplo, quando um pobre-diabo é subitamente aliviado da eréi ca preocupagdo em obter 0 pio didtio, ao ganhar uma LUTOEMELANCOLIA enorme soma de dinheiro; quando uma prolongada trabalhosa pelejaé finalmente coroada de &xito; quando alguém consegue livrar-se de uma s6 vez de uma opres- siva coergio, de uma dissimulagao que se arrastou por longo tempo etc. Todas essas situagdes se distinguem pelo animo elevado, pelos sinais de descarga de uma fo jubilosa e por uma maior propensio a todo tipo de ago, exatamente como mania e em absoluto con- traste com a depressio e a inibigo que hé na melancolia, Podemos arriscar a afirmagio de que a mania no é se- ‘do um triunfo desse tipo, com a diferenga de que nela Permanece oculto ao Eu aquilo que superou e sobre o que estd triunfando. A embriaguer aleodlica, que per- tence & mesma classe de estados, poderé — na medida em que for alegre — ser explicada da mesma forma; trata-se provavelmente da suspensio, obtida por via t6 xica, do dispéndio com a repressio. A opinizo leiga ten- de a imaginar que a pessoa em tal condigo maniaca tem ‘muito gosto no movimento e na ago porque est “bem- ~disposta”. Esse falso vinculo deve ser desfeito, natural- mente. Foi cumprida a mencionada condigao econémica na psique; por causa disso a pessoa se acha, por um lado, de animo tdo alegre, e de outro, tio desinibida na aco. Se reunimos esses dois pontos, temos o seguinte. Na mania, o Eu tem de haver superado a perda do objeto (01 0 luto devido a perda, ou talvez 0 proprio objeto), ¢ fica entZo disponivel todo o montante de ct ‘mento que o doloroso sofrimento da melancolia havi atraido do Eu e vinculado. Ao langar-se como um fa minto em busca de novos investimentos de objeto, 0 ‘05 quando uma prolongada e tente coroada de éxito; quando ‘ede uma s6 vez de uma opres- simulagio que se arrastou por essas situagtes se distinguem os sinais de descarga de uma 1a maior propensio a todo tipo © @ mania e em absoluto con- inibigZo que hé na melancolia, aco de que a mania nao é se- », com a diferenga de que nela aquilo que superou e sobre 0 nbriaguez alcodlica, que per- 2stados, poderé — na medida «explicada da mesma forma; { suspensio, obtida por via t6- “epressii. A opinifo leiga ten- vem tal condigo manjaca tem © enaacio porque esté “bem- tulo deve ser desfeito, narural- neionada condligéo econémica a pessoa se acha, por um lado, >utro, to desinibida na aco. ppontos, temos o seguinte. Na + superado a perda do objeto ou talvez 0 préprio objeto), ¢ © montante de contrainvesti- ‘rimento da melancolia havia >. Ao langar-se como um fa- 5 investimentos de objeto, 0 LUTOE MELANCOLIA ‘manfaco também mostra inequivocamente sua liberta- 40 do objeto com o qual sofreu. Essa explicagio soa plausfvel, mas é, primeiro, ainda pouco precisa e, segundo, faz surgirem mais questdes e diividas do que podemos responder. Nao nos furtaremos a uma discussio delas, ainda que nao possamos esperar, através dessa discussio, encontrar o caminho da clareza. Em primeiro lugar, o luto normal também supera a perda do objeto e absorve, enquanto dura, todas as cenergias do Eu. Por que entZo, uma vez decorrido, ndo hd sequer indicios de se produzir a condigio econémica para uma fase de triunfo? Acho impossivel responder de imediato a essa objego. Ela nos lembra que nem ‘mesmo somos capazes de dizer por quais meios econ6- micos 0 luto realiza sua tarefa. Mas talvez. uma conjec- tura possa ajudar quanto a isso. A cada uma das recor- ages e expectativas que mostram a libido ligada ao objeto perdido, a realidade traz.o veredicto de que 0 ob- jeto nao mais existe, e o Eu, como que posto diante da questdo de partilhar ou nio esse destino, é convencido, pela soma das satisfagdes narcisicas em estar vivo, a romper seu vineulo com o objeto eliminado. Podemos imaginar que esse rompimento ocorra de modo tio len- toe gradual que, ao fim do trabalho, também o dispén- dio que ele requeria foi dissipado.? 5 Até agora o ponto de vista econdmico recebeu poucs atensio nos trabalhios psicanaliticos. Uma excegio & 0 artigo de Victor ‘Tausk, “Enewertung des Verdsingungsmotives durch Rekom- pense” [Desvalorizacdo por reeompensa do mative da repressio), Jr- ‘ematonale Zeiscrif fr riche Peehoanaiyee Vy 1983. (To EMELANCOLA E tentador buscar, a partir dessa conjectura sobre 0 trabalho do luto, o caminho para uma descrigao do tra~ balho da melancolia. Nisso logo deparamos com uma incerteza. Até 0 momento quase no consideramos 0 ponto de vista topol6gico na melancolia, e nao nos per- guntamos em quais e entre quais sistemas psiquicos acontece o trabalho da melancolia. Dos processos psi quicos dessa afecgio, o que ainda se passa relacionado 40s investimentos objetais inconscientes abandonados, © © que relacionado a seu substituto por identifica dentro do Eu? A resposta répida e ficil seria que a “representa inconsciente (da coisa) do objeto” é abandonada pela li- bido”. Mas na realidade essa representa de intimeras impresses singulares (tragos inconscien- tes delas) e a execugdo dessa retirada de libido nao pode ser um evento momenténeo, e sim, como no luto, um processo demorado, de lento progresso. fi dificil dizer se comega em muitos lugares ao mesmo tempo ou se comporta alguma sequéncia determinada; nas andlises pode-se frequentemente verificar que ora esta, ora aquela recordagio é ativada, e que as queixas sempre iguais, fatigantes em sua monotonia, tém origem numa fundamentagio inconsciente, diferente a cada vez, Se 0 objeto nfo tem para o Eu uma grande significagio, re- inconsciente (da coisa) do objeto": “unbewupte ang des Objekts". Freud usa o sinénimo Ding, era le Sache; ver nota sobre a versio de Wortvorstellung & iconsciente”,p. 146, ir dessa conjectura sobre 0 para uma descrigdo do tra- ogo deparamos com uma {uase no consideramos 0 ‘melancolia, e nao nos per- quais sistemas psiquicos colia. Dos processos psi- ainda se passa relacionado conscientes abandonados, bstituto por identificagio, seria que a “representacdo jeto" é abandonada pela li- eptesentacio é constituida ulares (tragos inconscien- ‘tirada de libido no pode e sim, como no luto, um progresso. F dificil dizer 5 ao mesmo tempo ou se determinadas nas andlises ‘ificar que ora esta, ora e que as queixas sempre otonia, tm origem numa diferente a cada vez. Se 0 4 grande significago, re- coisa) do objeto”: “undewyfte veud usa o sinénimo Ding, em rersio de Wortvorstellang © "sp. 146, LUTOE MELANCOLIA forgada por mil nexos, ento sua perda nao é capaz de produzir luto ou melancolia. Portanto, a caracteristica de executar passo a passo o destigamento da libido deve ser atribuida igualmente ao luto ¢ a melancolia, baseia- -se provavelmente na mesma situao” econémica e ser ve as mesmas tendéncias. Mas a melancolia, como vimos, tem algo mais no contetido que o luto normal. Nela a relagdo com o obje~ to nio é simples, sendo complicada pelo contfito da am- bivaléncia. Essa € ou constitucional, isto é, propria de todo vinculo amoroso desse Eu, ou nasce das vivéncias ocasionadas pela ameaca da perda do objeto. Por isso a melancolia, no tocante aos motivos, pode ultrapassar bastante o luto, que via de regra é desencadeado somen- te pela perda real, a morte do objeto. Portanto, na me- Jancolia travam-se intimeras batalhas em torno do obje- to, nas quais 6dio e amor lutam entre si, um para desligar a libido do objeto, 0 outro, para manter essa posigdo da libido contra 0 ataque. Nao podemos situar essas lutas em outro sistema que nfo 0 Jes, a regio dos tragos mnem@nicos das coisas (em oposigio aos investi- mentos de palavras). La também ocorrem as tentativas de desligamento no luto, mas nesse iltimo nada impede ‘que esses processos continuem pela via normal até a * “Situagio": Verhlinise — 0 termo Verkitene (no singulas)sig- nifica “relagio" (também amorosa); jé o plural, aqui usado, tem também 0s sentcos de “stuagio, circunstineias”; por isso as tea- ddugdes consultadas variam: “relag6es”, crcunstancias, proporciones, sircston, situation, rapport, situation. LUTOE MELANCOLIA através do Pes. Esse caminho se acha blo- queado para o trabalho da melancolia, talvez devido a ‘muitas causas ou a agio conjunta de causas. A ambiva- léncia constitucional pertence, em si, 20 reprimido; as vivencias trauméticas com 0 objeto podem ter ativado ‘outro material reprimido. Assim, tudo que diz respeito ‘esses conflitos da ambivaléncia permanece subtraido consciéncia, até que sobrevém o desenlace caracteristi- co da melancolia. Ele consiste, como sabemos, em que 0 objeto, mas apenas a fim de se retirar para o lugar do Eu, de onde havia partido. Refugiando-se no Eu, 0 amor escapa & eliminagdo. Apés essa regressio da libi- do, o processo pode se tornar consciente e é representa do na consciéncia como um conflito entre uma parte do Ew ea instancia critica, Portanto, o que a consciéncia ver a saber do traba- Iho da melancolia nao é a parte essencial dele, nem aquela a que podemos atribuir infuéncia na resolugao da doenga. Vemos que o Eu se deprecia e se enraivece consigo, ¢, assim como o doente, no compreendemos aonde isso pode levar e como pode mudar. £ antes parte inconsciente do trabalho que podemos atribuit aquela fungao, pois nao é dificil enxergar uma analogia essencial entre 0 trabalho do luto e o da melancolia. A sim como o luto leva o Eu a renuneiar a0 objeto, decla- rando-o morto e oferecendo ao Eu o prémio de continuar vivo, do mesmo modo cada conflito da ambivaléncia re~ laxa a fixagdo da libido no objeto, desvalotizando-o, depreciando-o, até abatendo-o, por assim dizer. Ha a Pes. Esse caminho se acha blo- > da melancolia, talvez. devido a > conjunta de causas. A ambiva- artence, em si, a0 reprimido; as ‘om 0 objeto podem ter ativado lo, Assim, tudo que diz respeito ivaléncia permanece subtraido orevém o desenlace caracteristi- ansiste, como sabemos, em que © meagado abandona finalmente 0 m de se retirar para o lugar do ‘tido, Refugiando-se no Eu, 0 Ho. Apés essa regressio da libi- ornar consciente e é representa~ tum conflito entre uma parte do nsciéncia vem a saber do traba- é a parte essencial dele, nem atribuir influéncia na resoluga0 © Eu se deprecia e se enraivece © doente, ndo compreendemos como pode mudar. B antes & rabalho que podemos atribuir 6 dificil enxergar uma analogia 10 do luto e 0 da melancolia. As- Bua renunciar ao objeto, decla- ndo ao Eu o prémio de continuar ada conflito da ambivaléncia re~ > no objeto, desvalorizando-o, tendo-o, por assim dizer. Ha a LTO E MELANCOLIA possibilidade de que 0 processo chegue ao fim no siste- ‘ma Tes, seja apés a raiva ter se esgotado, seja apés 0 ob- jeto haver sido abandonado por nao ter valor. Ignora- ‘mos qual dessas duas possibilidades poe fim & melancolia regularmente ou com maior frequéncia, ¢ como esse término influencia o curso posterior do caso. Nisso 0 Eu talvez desfrute a satisfago de poder se enxergar como 0 melhor, como superior ao objeto. Ainda que aceitemos essa concepe0 do trabalho da melancolia, ela no pode nos fornecer a explicagio que procuramos. Analogias tomadas de outras areas pode- riam apoiar nossa expectativa de derivar a condigo eco ndmica para o surgimento da mania, apés transcorrida a melancolia, da ambivaléncia que governa essa afecgio; mas ha um fato que desmente essa expectativa. Dos trés pressupostos da melancolia — perda do objeto, ambiva- lncia e regressio da libido para o Eu —, os dois primei- 10s so também encontrados em recriminagdes obsessi- vvas ap6s casos de morte. Nestes a ambivaléncia que certamente constitui a mola do contfito, e a observagao ‘mostra que, passado ele, nada resta que semelhe o triun- fo de uma disposigdo maniaca. Isso nos leva.a considerar o terceiro fator como o tinico influente. Aquele aciimulo de investimento inicialmente vinculado, que ap6s o tér- ‘mino do trabalho da melancolia é liberado e torna posst- vel a mania, deve estar ligado a regressio da libido ao narcisismo. O conflito no Eu, que a melancolia troca pela luta pelo objeto, deve atuar como uma dolorosa fe- rida que pede um contrainvestimento extraordinaria- ‘mente elevado. Mas sera conveniente nos determos aqui, LUTOE MELANCOLA deixar um maior esclarecimento da mania para quando Uvermos alguma compreensdo da natureza -onémica Ga dor Fisica, primeirament, e depois da dor psiquica ue lhe éanloga, Pois bem sabemos que ainter-relarie dos complexos problemas psiquicos nos faz interromper ada investigagio e deixé-lainconclusa, até que os real, 6 Ver prosseguimento deste exame da mania em Pa Imassaseondlise do Be, ras (cap. x]

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