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a questao tre). po ae i) © DPS&A editora, srifico, mic A violacio dos direitos aurorais € put igo Penal art. 184 € §§; Lei 6895/80), sm busca, apreensio ¢ indenizagdes diversas 198 — Lei dos Direitos Autoras — ants, 122, 123, 124 126). de Cet ouvrage, publié dans le cadre du programme d’aide & la publicat bénéficie du soutien du Ministére Francais des Affaires Etrangeres. Este livro, publicado no ambito do programa de auxilio a publicacio, contou com apoio do Ministério Francés das Relagdes Exteriores. DP&A editora Rua Joaquim Silva, 98 — 2# andar ~ Lapa CEP 20.241-110 ~ RIO DE JANEIRO ~ RJ - BRAS! Tel./Fax (21) 22321768 e-mail: dpa@dpa.com.br home page: www.dpa.com.br Impresso no Brasil 2001 Aeradhso a tados 03 que consrbuiram com ins suse sosees durante a reda;in deste Bros Mare Monique Hirschbom, Jean Reny, Michel Roche Branpis tcher owas boas mt, Mare Pere Leta, Soop ¢ mae pertlarmente Prefacio a edicao brasileira Este livro foi escrito ten: questes aqu e réncia a Fran mas as yordadas sao pertinentes a atros contextos,a comecar pelo do Brasil. Na verdade, ele levanta um grande debate mundial, politico ¢ cientifico, © do lugar da dimensio local nas sociedades contemporineas. A escolha do titulo exprime a ambicio do o: ha cerca de trinta anos, Manuel Castells esctevia A guestis urbana. Na época, a urbanizacio das sociedades e suas conseqiéncias despertavam grandes debates; os discursos sobre a cidade partiam em todas as diregdes; 0 método sistematico dos pesquisadores se mesclava com 0s debates puramente ideoldgicos; socidlogos, economistas, militantes € conceituadores produziam discursos parciais ¢ entremeados que chegavam as vezes is raias da cacofonia. Por mais parcial e contestivel que seja o livro de Castells, ele opie a isto um quadro de raciocinio e questionamento sistematico sobre a cidade € a urbanizacio. Esta mesma ambigio é que anima A questo locak tentar encontrar um fio condutor para organizar um debate. Este se desdobra em trés frentes: quando triunfa uma visio hiperlocalista da sociedade, quando © local definido como 0 baluarte da mundializagio ¢ quando se faz do local o lugar principal da democracia. [As ciéncias sociais se desenvolveram em tomo da hipotese de ‘uma complexificagio das sociedades. Esta supde sobretudo que grupos de pequenas dimensdes, pouco diversificados, aos quais pertencemos por nas uma pressio muito forte sobre os indivi imento, dos quais € dificil sair e que exercem 1uos,! se desfacam diante «de de"Ténnies ou a solidariedade “mecinica” de Durkheim A questio local ry quais a pessoa entta s, pel ‘0 grupo sec representa um fracasso ¢ que o futuro ‘numa volta aos grupos primitios, Isto pode redundar num discurso conservador que, valotizando a familia, sa, cultural ou étnica e a vizinhanca, justfica farces. Mas outras versdes desta corrente sio conhecidas 10 da sociedade: de um lado, o a comunidade reli \dividuo nao existia (€ um dos aspectos da mundializacio de outro, grupos essencialmente marcados pela imidade dos valores, da afetividade, dos modos de vida, da ‘memeéria, que parece dificilmente dispensar 0 enraizamento num lugar. Em suma, 0s socidlogos se perguntam se ainda existe uma sociedade, alguns respondem que ela é substituida pela individuacio ou pela mobilidade, outros que ela dé lugar & proximidade, Decorre dai o valor extremo atribuido & localidade, que se procura justificar por meio de diversas teorias. Encontramos entio o debate que gira em torno da mondializaio, Este assumiu uma forma muito normative mss le lamentivel: por que se refugiar na ideologia, quando se fala ava relagdes de forcas brutais e de dominacio? Tocqueville nao ado" tear sua eficicia a democracia americana e isto no o impediu de mos € seu cariter contagioso. Schumpeter no gostava do ae tampouco explicou por que este haveria de progredis. A mundializas fi é mais que uma doutrina ou a vontade de alguns: € um conees? ‘que ninguém é verdadciramente dono, contexto ainda mal anal = que produz uma “nova distribuigio” com seus riscos, suasinjus° mas igualmente suas vantagens e aberturas. Preticio & eaigto br n Se contentam em decretar definiuwamente que a termo) € se langam A procura wguagem oferece entio um caminho. O a local. BE é assim que se ha de imaginar mundializag rede econémica sem chivida muito localizada, mas muito moderna, ort, que exporta para os quatro cant mundo. A afirmasio do local contra 0 mundial nio se dis sim a dominagio dos Estados Unidos dentro da o: mundial do comércio: é uma posigio menos poética a p fa verdade bem mais interessante, Como quer que sea, a imagem do micro local bem-comportado cor ucro, Infelizmente, esta imagem nio é ld aquelas coisas. Um dos objetivos deste livro é mostrar esse fato. O iltimo debate € 0 da gestio local. © modelo do Estado ‘moderno é questionado de todos 0s lados: peo lie: agressivo, pelo fracasso dos modelos socialistas ou populistas e pelos crimes que thes estio associados. A mobilidade dos indiviiuos, dos bens € das informagées cresce continuamente, 08 con ortamentos se diversificam com tapidez, aumentam espetacularmente sem cessar as dimensdes de certos conjuntos humanos e, sobretudo, das cidades. Por isso, as sociedades se tornam cada vez mais dificcis de governar. Ao mesmo tempo, o modelo dos direitos humanos ¢ do governo democeitico progride, Mas, neste context, ele procura se “refugiar” na democracia local, associada 4 boa governanca, quer dizer, & arte de associar todos 0s atores locais, piblicos ou privados, politicos, sociais 4 acio coletiva pelo bem comum. Alguns no © orgamento participativo de provar a justeza destas afirmagdes, que yiar uma democracia de proximidade, mas (nos paises ricos, os prejuizos), fas vezes a pi em certos pro \V A questo tocal mulados por outros, _mocracia a localidade, que as vezes assume parece paradoxal quando icidade ¢ a complexidade iependéncias em dominios: se uma borboleta «as a8is, isso pode desencadear uma tempestade debates entrecruzados que se referem & dimensio este livro pretende mostrar 0 cardter amente petigoso das ide ¢ das reivindicagdes vex recebidas assim como existe nenhuma razio de aceitar 0s cos de sua reivindicagio, mas no é possivel smente a existéncia desses direitos, nem que eles » de seus fundamentos mitolgicos. Mas é ees ee tH* Perigo dar-thes importincia demasiada: a8 me 3 iicasems as que alguns dizem “frias”, sempre sio ‘cas eméveis, suas cristalizacies sh = es 8 suas acio india ren ‘Jo contextuais: a reivindicagi ‘latamente no espirito para sentir Me a ausincia ncla de seus efeitos. Levar em conta apenas @ PretScio & edigBo br 3 afirmagio ditcitos patrimoniais, em nome de um culturalismo radical nasee, a meu ver, disfargada uma verdadeira hipoe de boa con cia. Nas grandes cidades, muitas reivs 1Gbes localistas exprimem acima de tudo uma insuficiéncia de acesso ans recursos socais,a comegat pelas da mobilidade. Outras (as dos nimbiesamericanos, por exemplo) ‘exptessam uma vontade cle marcare de fazer respeitar uma diferenga social. Muitas vezes, a reivindicagio localista é antes de tudo um sintoma, Por outro lado, na escala local, na do bairro, da cidade, ou da mictottegiio que alguns problemas da vida diiria podem ser regulados, por exemplo, os que se teferem 4 organizacio dos servigos piblicos. A solidariedade e a sociabilidade podem se desenvolver dentro de redes muito dispersas, mas sio muitas vezes mais ficeis de criar quando se apéiam na vizinhanga. Enfim, 0 quadro local pode servir para se organizarem grupos muito unidos, ox coalizdes para a ago. Tudo isso, porém, nada tem de obrigatério e automitico. lids, as delimitagdes da localidade sio méltiplas € contingentes. ‘A vizinhanga,o bairro, a cidade ou a regio urbana constituem pontos de referéncia relativamente estiveis, mas, conforme 0s contextos, estes niveis se definem diferentemente, € muitas coisas ou quase nada pode ocorrer ai. Certos individuos, apesar de no terem nenhuma insersio na vizinhanga ou no baitro, vivem socialmente muito integrados, mas por meio de outros canais: cada um de nés utiliza diversos meios para organizar suas relagdes com 0 mundo, mas enquanto alguns podem utilizar uma gama muito variada, outros s6 dispdem de poucos meios que sio entio, freqiientemente, muito ligados & localidade. Quaisquer que sejam as justificagdes histéricas, naturais ou is utilizadas, todas essas configuragdes locais sio construidas por atores que as constituem em “contextos de agi”. Mas, uma vez estabelecido este dado sociol6gico, econdmico ¢ politico do cardter contingente ¢ consteuido com configuragdes locais, uma vez A questio 4 admiido que elas servem de mediagio ou de lugar de atticulagig Ga acio ~ este assunto é desem numa grande parte dene Tivro ~ fica ainda a questio em ter . formas muito variadas. No mundo moderno, a dupla proximidade/ dstiaca constitu um duplo principio de percepsio e de organizacio da experiéncia, tanto na ordem das relagdes sociais quanto das relagdes econdmicas ou politicas. O « das distancias _Beogrifcas pelos transportes, das distincias politcas pela onganizacio dos apatelhos do Estado (administratvos, policias, judiciétio..), das distincias sociais pela redistribuiglo, das distincias econémicas pelo contrato ete. representa riscos. A proximidade e a distincia rio sio apenas constatagdes reais, mas sio construidas. Todavia, clas sio bem marcadas pela distincia geogrifica. A prépria imidade € construida ¢ acima de tudo, espacial A hipétese pés-moderna consiste em dizer que a relacio Proximidade/distincia perde todo significado e, dessa forma, a Proximidade nio tem mais sentido. A isso se opde a hipotese de sadicaizacio da modernidade que, pelo menos neste caso, me parece te: arelagio proximidade/ distancia conserva seu cariter Ye com a mesma rapidea um ico, € apenas uma questi de dinheiro. ivet sem nenhum contato com meus ‘2inhos. Se de repente a produgio social da proximidade nio é ‘nals uma novidade, sio as condigdes desta produgio que mudam. Como seria esta proximidade, ue necessariamente no é mais Meas Lahat M2 economia, no morar, no modo de vids, na Fo cen aS Telagdes sociais, na organizaca e na vida politica? penn PerOBtses que poderiam prolongar este livro. Elas Posso da mesma forma v 8 Preticlo & eaigdo brasileira ‘os que se referem a vida difria), das otganizacionais (em p: formas do espaco urbano ‘que organiza “ pessoas) € da ges clas constroem proximidade € n uma interrogagio sobre as relaghes que a proximidade mantém com aidentificagio (no sentido psicanalieo),a confianea (na definigao de Giddens), 0 sentimento de pertenca, a mo} em torno de tum projeto ou de uma crenga Ses juridicas (sobretudo as cia. Implicariam igualmente Introdugao Nos dias 30 ¢ 31 de maio de 1975 se realizou na Universidade de Patis-Dauphine um coldquio publicado dois anos depois (Siz, 1977) sob 0 titulo O objeto local. O liveo comesa com uma pergunta: “Deveremos renunciar 20 mito local: esse pequeno territério em ‘que a maior parte de nossos contemporineos ainda procuram suas raizes? O centro: poder andnimo e sem lugar, entidade onipresente, monstro ftio, nio o engoliu? E com ele todos os nossos referencias, terrenos, afetivos? Haverd ainda um ‘poder local’ E, questio ainda ‘mais inquietante: haverd realmente um OBJETO LOCAL?” (ep. cit, quarta capa). No contexto hist a descentralizagio — ico e politico da época alguns denunciam ‘em ptocesso — como um ardil do poder, outros se apresentam como os novos defensores de um novo localismo, € 0 proprio L. Sfez, que se mantém num equilibrio entre estes © aqueles, escreve: “O local éa pritica que contesta, é © espirito que diz nio. Ko dispositivo critico... Ele trabalha os multipossiveis.” Mas acrescenta: “Ele pode causar a anarquia e seu oposto, o fascismo. Pode favorecer o nascimento de uma sociedade de “compos m que cada unidade autogerada poderia inovar a sua maneita..” (p. 14-15). Apesar da diversidade de suas andlises, os oradores concordam num ponto: ¢impossivel definir um objeto local e principalmente dar-lhe um contorno territorial preciso. E essa conclusio parece mais forte porque decorre de um debate pluti ar e contrasta com a trangiila seguranga que a seguir revelario os defensores da descentralizagio. Essa verificagio acusa uma ruptura, Vale a pena lembrar: no periodo do pés-guerra, a polarizagio sobre Paris eresce com uma A questo local a aris et le desert francais (GR: eguida 0 crscimento econdmico abala as fo cenirio local permanece do pos-guerra comecam a se retirar €a le pela V Repablica provoca ui ° manicipais, Entretanto, uma nova classe média urbana emerge, a vida social ea vida cultural (primeiro com os militantes da educagio popular ¢ o teatro descentralizado) se desenvolvem, Mas a Zo local das sociedades, que em outros paises icimente se impde aos espiritos. Torna-se realidade 7) , 4 descentralizagio ocorreu na Franga e se tornow ce uma reforma privilegiada em escala mundial; o sistema dos blocos politicos naufragou, dando lugar 4 hegemonia de um 86 poder ¢ libertando miiltiplas microrreivindicacées nacionais; 4 metropolizacio triunfa.. Os instrumentos com que pensamos 0 mundo se metamorfosearam em relagio a esses blocos politicos; os debates ideok Por cos e politicos mudaram de objetos. ‘al recolocar, em termos atuais, as questdes de entio € ‘etit 0 que as experiéncias decisivas que nos separam desse co}6guio nos ensinaram: este livro poderia ser chamado Vite anos depeit. Uma inversio do contexto - Na €poca do Objeto local, prevaleciam, nas sociedades amare Processos de homogeneizacio, ligados a0 senvolviment is : Ficos de nnn consumo fordista e a emergéncia nos paises a camadas médias cada vez mais vas torno desse consumo, Providénciatriunfava aparecia como um ol tas oxganizadas em © Estado-nacio em sua forma de Estado- © administeacio generalizada da vida didria bjetivo accitivel, desejavel para alguns ¢ em Introdugio 19 tealizavel. Apesar da descolonizacio, o modelo ico das antigas poténcias coloniais se impunha ~ muitas €conémico ~ aos novos Estados independentes. O universalismo ocidental e etistio encarava universalismo libertador — ou pelo menos muitas vezes percebido o tal — do marxismo ¢ da revolugio, e se casava bem com ele ogia da libertacio, texto, a recusa do homem unidimensional do smo, como o da submissio socialista aos aparelhos burocraticos, se apoiava na afitmagio da liberdade do homem, indissoluvelmente ligada & sua capacidade de tesponsabilidade coletiva. A exaltagio da comuna iugoslava ou do Kibutz exprimia exatamente isso, € nfo uma procura de identidade ou de afirmagio na corrente de autogestio, iniciadora, na Franca de uum sindicalismo de empresa, portanto, bem mais local, do qual a aventura da empresa Lip é uma figura emblemitica. A critica do modelo tinico de consumo, como a do Estado que produz a felicidade (?) das pessoas, apesar dos pesares, a ponto de administrar tudo, tinha necessidade de se apoiar na afirmacio das especificidades locais para obter éxito ¢ estas tltimas ‘constitufam um ponto de ancoragem para as pessoas se perguntarem sobre a validade de um universalismo a respeito do qual apenas se mencionava a quantidade de crimes que, em seu nome, tinham sido cometidos. ‘Tudo isso era alimentado por uma evolucio das ciéncias humanas que, ainda dominadas por grandes teorias hereditirias de uma epistemologia nomolégica, comecavam a duvidar de si mesmas ¢ 2 privilegiar a singularidade — terra nova sélida em meio as areias movedigas de incertezas sobre 0 conhecimento expressas radicalmente por algumas epistemologias extremistas como as de Feyerabend (1975). ‘contramos diante de uma situagio inversa. A onda 1 feigil governabilidade dos grandes Hoje nos en‘ ncoliberal, o fim dos blocos, A questo local » se tem certeza de que esse triunfo esteja na capacidade de pensar o local, encontra no centro re a intercomunicabilidade, 0s poderes de se desenvolvem essencialmente a respeito da escala local. A questi esti om no cere de um guestionamento mais tas ¢ é nessa circulacao, neste con! que ela deve ser pensada, sem com statuto de ideologia, ou ‘ientifico, num Introdugio Pl Seis questées essenciais pela referéncia aide 2, Apresenta-se ela entio como uma realidade estavel ou \issociével do passado, patrimonial? 3. A mundializagio da economia e das culturas, a mobilidade generalizada, 0 desenvolvimento do imaterial e da comunicagio letrdnica colocam em questio a localidade? Esta se torna 0 lugar da resistencia & mundializagio? 4, A localidade esta det campo e da cidade pequena ou média? Seri possi localidade nas “metépoles” ou na Califérnia? forma assume ela? ‘el imaginar a Neste caso, que 5. O escalio local sera o tinico possivel, ou a0 menos 0 melhor, para a gestio de sociedades cuja governabilidade diminui? Quais sio as grandes caracteristicas desta gestio local? 6. Que é um territ6rio local? A partir de que critérios ¢ com que instrumentos conhecé-lo? Como produzi-lo, administri-lo? Uma sétima questio tem também importincia, mas sera abordada aqui apenas por alto: & a das relagdes entre o local das, regides ricas do mundo € a das regides pobres. “Tentando responder a essas questdes, nio nos voltaremos apenas para o mundo académico, mas também aos atores, sugerindo as conseqjiéncias que podem ter as respostas para olegislador, o manager urbano, 0 urbanista, 0 gerente de servigos, ator local “sem qualidades”, Nio estara ai uma validagio indispensvel para um trabalho de ciéncias sociais? A questéo loca) 2 umprocesso dectariicaci0 Nio podemos, porém, deixar oe ioe g leratora sonsiderivel em que se trata da questio local ¢ que influencia See sss percepes at nos debates mais operons, 2 -scobre um espectro muito amplo e vai das formulagSes a ee js teorias mais rigorosas. Ela atravessa as disciplinas, aan a anand interrogagbes contemporineas. O exame das principais definigSes do local mostrara sua diversidade: contrariamente a0 que as vezes se pretende, nao se trata absolutamente de um discurso univoco. Por uma espécie de paradoxo, o local, que aparece como ancoragem, como estabilidade, esti no ponto de encontro de uma rede vaga e instivel de idéias e definigdes, Todavia, seria um erro ater-se ao que é diretamente consagrado ao local: a literatura sobre a mundializagio, outra palavra-imagem que focaliza uma diversidade de questdes e , nos informa a respeito da mesma forma sobre as definigdes e problemas da localidade contemporanea. Esse duplo caminho mostra a riqueza ¢ a diversidade das contribuigdes, a0 mesmo tempo a auséncia de um quadro que constitua ‘ealmente uma questio local. Entretanto, através de lugares, figuras da localidade € de problemas de gestio, essa afirma empiticamente os problemas da governanca, Seu exame ofereceri 4 incispensivel ¢ exata dimensio deles a0 trabalho de anilise titica dos debates ¢ teorias, Esse € 0 percurso necessiri colocadas. Partiremos em s¢ io das e ‘0 antes de responder is questdes ‘guida do proceso de localizacio, € ae us 08 dos territérios, para entrarmos numa “Gos modelos de localizagio e uma defini¢Zo dos dados da questio local local, sobretudo nas metrd nes cmp seis meee Desta forma, teremos em mente € Bournicavn, 1982) a célebre citagio (BouDON de Max Weber, em que ele afirma sua Introdugio 2B vontade de combater 0s conceitos coletivos que entulham o raciocinio socioldgico. Pensar a complexidade néo raquer a eluboragao de instrumentos cada vex mais complexos, mas antes a clocacao de quadros cde anélise simples, que podem ser partlbados e atilizados de miitiplas ‘manciras (é na utilizagao deles que se encontra a complexidade), capazes de esclarecer 20 mesmo tempo 0 que numa situacio € -ompravel e o que é especi | | | capitulo1 — Q objeto local No ano em que foi publicado L’abyet local, 1977, 0 Centro nacional da pesquisa cientifica organizava um amplo programa em cigncias sociais para promover estudos locais sobre a mudanca. Alguns anos mais tarde, um de seus responsiveis (La constata adificuldade que também os socidlogos e antropélogos, em construir um “paradiema do local”, Mas, por que um “paradigma” (no sentido de um quadro de questionamento e raciocinio especifico) do local? A localidade as vezes nio passa de uma circunscricio projetada por uma autoridade, em razio de principios que vio desde a a critérios puramente técnicos. Em outros casos, ela exprime a proximidade, 0 encontro diétio, em outro ainda, a existéncia de um conjunto de especificidades sociais, culturais bem partithadas. Nada em tudo isso convida a elaborar um quadro de ‘questionamento, um paradigma ou simplesmente uma questio do local. Todavia, ambas existem: tanto uma questio do local que reflete as grandes preocupages do tempo, quanto um paradigma multifragmentado, caleidoscdpico, representativo da diversidade € das hesitagdes das ciéncias humanas contemporineas. Vamos examind-las uma a uma, 1. A vulgata localista ‘Uma idéia explicita ou implicita do local se impés. Acima da ‘competéncia dos especialistas dos estucdos de comunidade que, como diz J, Lautman (p. 322) “consideram em geral como adquirido 0 direito pertinente de tratar sua sociedade como uma rotalidade ¢ as A questo local 6 "humanidade élocal ao mesmo tempo Fe jectual conhecido afirma com firmeza num pesquisa pode aio ser boa. Em resposta, um outro confessa cia do enraizamento € seu inc am que umn individuo, um grupo que nio é “de algum nserido num microconjunto social ligado a um 10, nio pode ter uma experiéncia s ial e humana completa, mesma coisa a propésito da religido. ‘macio radical do local passa igualmente pela valorizacio arias territoriais. Associam-se entio ce luta de uma heranga partilhada, aque toda especificidade constitui um instrumento de resisténcia ‘uma modernidade perigosa (as especificidades nacionais se erguem altzacio como as especificidades locais contra 0 © f€ na proximidade: no s6 small is beautiful, mas consti um oe nem & Vetdade social. A combinago dos trés ‘sttui um coquetel explosive, também a “bas veto, socal ou teligioso, dentro do qual cotter 1 objeto local A Esta vulgata recorre a um mundo de pressupostos ¢ exame: “Todos ni por esse fato, mas todos se viam atingid estavam mortos Mas por que esse sucesso? Em La tradition sociologique, Robert A. Nisbet (1984) lembra como 0 pensamento esclarecido do século XIX desprezou tudo a ponto de fazer do conselheito municipal a encarnagio do imbecil. A sociologia se teria constituido em grande parte em oposigao a esse ponto de vista e em conivéncia (pelo menos indireta) com 0 conservadorismo. Ainda que a interpretacio de Nisbet possa ser contestada, ela nos lembra que aatitude dos intelectuais com relacio ao que é local foi objeto de movimentos contrarios, 0 que mostra muito bem Théodore Zeldin em L’bistoie des passions francaises (1978), quando ele narra ‘como 0 regionalismo passa alternativamente por fases de rejeisio e embaraco. E que a interrogacio sobre as sociedades, em todas as suas dimensdes (filos6fica, politica etc.) enfoca objetos, que, num certo momento, parecem portadores de todas as grandes questdes. O Estado, as classes sociais, a democracia, as grandes organizagdes foram lugares de intertogagio amplamente partilhados durante todo um momento de nossa histéria. Durante os ltimos decénios, © interesse muitas vezes foi direcionado para tudo que representa a “base” por oposigio aos grandes aparelhos sociais: a empresa, 4 familia, 0 local, os movimentos de protesto e as diversas formas de afirmacio de identidade. Esses objetos privilegiados servem de base 2 um discurso de conjunto sobre a sociedade. que era loca ‘Trés grandes interrogacées Por essa razio a vulgata localista é marcada por trés grandes interrogagGes relacionadas com a constituigio do vinculo social € da identidade, a especificidade do politico ¢ a articulagio entre as diferentes escalas da organizagio social. A questao local 8 Pertengas? bastante complementares © nio A divisio do. taridade, 0 que permite aumentar as trocas, social cria diferencas com Em segundo logan, 0 sentimento de pertenga & humanidade que nos leva a vinculos com os outros seres humanos: fora da ki fnculo sexual e familiar; afirmagio de um destino comum da humanidade por grandes sistemas religiosos e Por fim, fe viver junto, de partilhar uma mesma ic: a proximidade surge entio como produtora do ial e 0 camponés sedentério como o ser social por exceléncia, A troca ¢ a complementaridade justificam as grades de paiileglam a estratificagio social. O universalismo, mas rismo religioso € certos nacionalismos se referem 20 a rem 20 sentimento de pertenca 4 humanidade. Privilegiar 0 siver- -m de evitar posicionamentos hoje muitas vezes nem o universalismo, nem © edepretender fi ‘ Sxtetefindamentacsemexpergncia dia. ‘Acima da partlha m mesm = eo eto ou de uma mesma atividade profissional, o ##er~ uma expressio particularmente forte na idéia do local. vés dele é: Tre ge ese desenvolvem as ies deidentidade (NICO, . Sem di divida, as grandes paixdes de identidade Xe sete inserio dos indviduos em grupos © das 105 e esses grupos, 0 objeto local 2 mn questi: depois das experiéncias tigicas do séoulo XX, fascismo, ‘salinismo..., com a democracia mediitica, com as transformagoes ‘dos mundos em gestio coletiva, a mundializagio eo questionamento do Estado do Bem-Estar, torna-se banal perguntar sobre a natureza, a especificidade do politico e em particular sobre 0 que é o Estado ‘c sobre as relagdes que ele mantém com a sociedade. O local da tama resposta, que reduz 0 Estado as suas funcoes mais cissicas (garantir 2 ordem interior e a protecio exterios), privilegia a democracia direta ¢ mais geralmente os circuitos de legitimidade menos mediatizados. Essa resposta € econdmica, sedurora ¢ admite varias interpretagdes. Coma grande revolusio da mobilidade e das telecomunicacées, 1a questio das escalas da organizacio social se impde igualmente ‘Também ela assume um cariter muito geral, na medida em que contribui ao mesmo tempo para organizar uma percepgio do mundo e para definir prineipios de agio: privilegiar as grandes civilizagdes, como faz J, Soustelle (1967), conduz a uma visio bem diferente do mundo do que a de exigit a radical heterogencidade das culturas, A hipétese braudeliana da economia-mundo produz ‘uma outra interpretagio diferente da insisténcia na autonomia de pequenos espacos econémicos. A maneira como se concebe 0 6timo de populagio e superficie para uma cidade, uma circunscriss0 administrativa etc. ulttapassa a pura técnica. O local oferece uma resposta que prvilegia a diversidade, as diferengas, a moliplicidede das escalas e a forga das pequenas unidades. Isso leva @ pensar # mundializagio como uma obrigagio “artificial” imposta Unt ‘organizagao social mais “natural” fandada nas entidades pequenss © médias que resistem a ela. UN TBESKAO local isso responde a uma vulgata centrist compreender ntea relagio inante e se 0 passo que Os cantores do ente em posigio de defesa, igata mundialista emerge, ¢ com ela as, ‘am mais complexas. P ‘ima, quer se exprima na ce definitivamente que entre “tela” Francoise Choay (1997), por iberespago”, admite que o futuro diante de si e cobrem campos tio ricos lade dos humanos” (p. 99), mas, objetario finante, € que i deg jicamente d aes Estado se encontram hal Em compensacio, uma esta adores adotaram a crenga politica americana no ai ‘ilham o famoso ide. O ser social se definiria pela pertenga a um grupo vinculos do sangue, da lingua ¢ do é stidade no requer necessariamente esse _lnspo ¢ os texos de Max Webet, por exemplo, nio "an nada uma tal tar oman hipostasia, Esta consegue ches em ia de uma ia satisfacio — através de diversas ~ servitia de base a configuragdes (bairros, fundamentalmente heterogéneas. tipo de us justifies — s as cidades contemporineas, lade comunitari formas de convivialidade. Populagbes periféricas) spe spresenao debate entre aque 2 ha ate entre aquees por quem oqo ae a in testi (Por exemplo o air) «aque 2s formas deexpressio, menos localizadas © objeto local 3 natual ¢ orginica” ¢, mais fundamentalmente, tende a fazer de toda cultura humana uma relagio entre 0 homem, o lugar e 0 sagrado, Acevidéncia da falta Essa antropologia mobiliza em seu favor evidéncias histOricas € etnolégicas, mas igualmente uma “evidéncia de fal ica do periodo contemporineo. As primeitas estio tes em numerosos trabalhos de historiadores, gedurafos, exndlogos. Veremos apenas um exemplo, Maurice Leenharde explica (Leexsanpr, 1953) que se, entre os Canacas, 0 lia grande maloca © o altar tém o mesmo nome, isto se explica por uma imagem teenitia em que a moradia é a projegio do homem no chio, o cli, sua projegio na sociedade ¢ o altar, sua projecio no invisivel. Estes elementos estio totalmente unidos para 0 Canaca, que ja no esta fora de seu habitat (marin). Escreve Leenhardt: “E que 0 madi, nogio nascida do espeticulo das arvores a partir das quais 0 26 parece ter desenvolvido a vida, 0 madi conta wma histo © 20 contato dessa histéria, o Canaca se sente 20 mesmo tempo como ‘ele mesmo € como participante da morada pacifica em que se encontra, Todo esse exemplo dominial,arquiterural afeiv, paternal Visivel,invsivel, todo esse conjunto, sua histra humana e mica € que devemos ouvir, quando traduzimos imperieitamente 697 pelos termos empobrecidos de habitat ou de aldeia das pessoas ce Grande “Testa” Vemos como €difil dizer que existe nsso nxdo uma reaidade contingente, que as coisas poderiam ser de overs format e como € era a eet ned dex PICSoEo ea eee da humanidade, uma evidéncia antropolgica “Comunidades rari de racioinio escolhida por Marcel Gauchet pass ve aceite se areligo nadia tvesse de Bncpaeia Unters, a * Adotando-se a mesma linha So mean ms el : = (ef. Gavcuer, 1977) ‘uma necessidade antropolgi A questi loca) porineasainda quando vn osentimento- dec eepemente 02 tert, de exper fa cont partic Golorosa auséncia de um s20} ddo catiter migrat6rio da experiencia social e pessoal que poderiamos chamar uma perda Formulacio radical, que convida a fazer ica, mas 4 qual somos rida parece ela na experiéncia a passarmos da evidéncia & pelo menos nessas versdes Um local cognitivo Kevin Lynch (1976) abriu 0 caminho de uma aproximagio truido. Alguns anos mais tarde, P Pellegrino tre as representagies doterritirio eas identidades individuais e coletivas, na Suiga romanda, nas encostas de vinhais nas proximidades de Lausanne ¢, mais acim, 1a reziio do Jura (vale do Joux). A partir de uma definigio classica ada em Kant), esses autores caracterizam # piciidade” como “forma de expago culturalmente construe pela qual uma pessoa apreende os objetos a0 se posiciona® (PrueckNo et al, 1983, p. 25). A definicao de uma posiséo N° mundo se di por um ¢ rte que junto de processos de reco! —_ a “Thereof migratory character of his fodeen man] experience of S060 has heen win might be eile a metaphysical os of home” Peter TBE "apte Bene ¢ arsed Keli, Te Hames Mind Madris nd Cette eeendsorth, Penguin, 194,77, ado por Mode ¢ Robs, 1992) a diversos registros da elaboradas por J. Piaget, se di a partir do grupo do individuo) ¢ prevalece a fa atividade cotidiana; trumentos de avaliagio ou de (0 que corresponde ao egocentris oposigao nés/os outros; “téeni “operatotio” quando se apela para célculo independentes daquele que © territério se torna uma circunscricgio pensada com relacio a um sistema institucional. “Toda espacialidade exprime a pertenga a um mir, que se constadi € se manifesta em recortes territoriais. O espaco de pertenga resulta do conjunto dos recortes “que especificam a posicio de um ator social € a insergio de seu grupo de pertenga num lugar”, 0 espaco de referéncias define o sistema de valores espaciais em que seinserem esses recortes ¢ organiza a relacZo do aqui com o alhures. As espacialidades sio diversas elas se transformam continuamente € se entrecruzam. Isso poderia levar a considerar que a definicio de uma localidade (um és € um territétio delimitados, estiveis € claramente diferenciados do resto do mundo como no vale de Joux) s6 intervém em condigdes particulares de forte integragio de estabilidade de um grupo cujos membros produzem uma espacialidade imével e fechada. Nao haveria entio nenhuma necessidade da afirmagio local. Mas, a0 se eferirem a Piaget (1965),? nossos autores postulam que toda espacialidade se estrutura de maneira egocéntrica (ou sociocéntrica), € por outro lado, sua * Bacreve Piaget, p. 65: “.. ocoree de inicio a assimitagdo pritica do real aos casa and sertno not, em om de eer ma regu es enact eoreo ene 4 scm Tengu au bos para un cla cla oo ase» ails tepsenas do seal tos eaucmas leis do pesaent een re getencos au meta ge a no eon oh oP Corda, man em nie las, soe enfin» simlgo aera ce esque peng + code dav mi earn epee snenisn com ecg so cue denies A questo toca) our 0 tertitstio de pertenga se constitu, passo que no das margens do lago ele corresponde a cada povoado. Entretanto, na medida em que a pertenca € uina telacio direta com reconhecimento reciproeo, ea de uma proximidade imediata. O raciocinio, portanto, nio a partic do vale intel fancionam antes como espagos de referéncia. inio € bem representativo da orientagio éias amplamente partilhadas: ognitiva”, ~—O homem se define, se constréi, através do conhecimento de ‘ato, O tinico problema é saber se esse proceso seu entorno in se dé uma vez por todas na primeira socializacio ou se ele se reproduz a cada ver que ocorre socializagio num novo contexto, — Esse entomo imediato € 20 mesmo tempo material e social (grupo de pertenca), € ambos sio indissociaveis. ; —O conhecimento que dele temos se exprime € se organiza na representacio do territério. Mas este 6 pode ser 0 tertitone proximo, aquele sobre o qual atuamos (pensamento técnico de Piaget) os (sociocéntrico). com o gual nos identificar de jadas constituem uma forma & ¢ uma segunda orientagio dela no oferece verses mais radicais e menos abertas. antropologia da localidade, Um local interacionista jo Essa forma de anteopologia da localidade parte da airs ‘gue nossa identidade, até a mais individual, € construida a Pp ores om grupo de pertenca, Esse tiltimo, ainda que afetado por f# © objeto local 35 iinteragdes e de sua logica. Eo que faz Bernard Poche, tomad como referéncia nica em razio do cariter particularme sistemitico de suas éncias, Seu raciocinio, inspirado na fenomenologia de Alired Sch se resume em quatro etapas: 1. O vineulo soci € um processo de construgio do sentido: viver-junto consiste, em primeiro lugar, em claborar representagies comuns do mundo, 2. A consteugio social do sentido se forma a partir do “mundo da vida cotidiana”, quer dizer, conforme o sentido que Seitz dia essa expresso, 0 conjunto dos “objetos atingiveis”. “O luzar que ‘meu corpo ocupa no mundo, meu Aqui é 0 ponto de partida de minha orientacio no espago... Assim também, meu Agora éa origem de todas as perspectivas temporais que me permitem organizar os elementos do mundo nas categorias antes /depois, passado/ futuro, simulténeo/sucessivo” (ScHOT2, 1987, p. 120-121, citado por Pocte, 1996, p. 123). O raciocinio anterior esti proximo, mas ncle a ordem da percepcio € das operagdes intelectuais era questionada em sua esséncia, enquanto aqui se trata das condigSes em que pode existir uma atitude cognitiva de ordem mais metatisica, qualificada de atitude natural, que consiste em “suspender qualquer diivida quanto NOTE, did, p. 1275 Pocnt, iid, P. 123) © é uma etapa indispensivel de toda relagio com o mundo. 3, Essa suspensio da divida quanto a0 mundo se aplicari 20 outro na medida em que a relagio, a comunicagio, se operar na co- resenga, o que nio para na relagio face a face, mas na partilha de um mesmo mundo da vida difria (expresso por uma mesma a 1 WESEO locas 4 Prem finda ituida pela co ” transcen« uma dessas forca © nem [uma] definigig ta pela etologia, mas I dada para tal” n forma o mundo da vida diéria, sendo ele x da relagio com 0 mundo do individuo, mas igualmente da rela¢io com o outro, da construgio comum do cial. Sua irredutibilidade se funda numa “nem uma cate; trata COMO 0 espa como a que é pri 1 da experiéncia sen: s ou dos artefatos, 0 que leva igualmente a esta 0 significativa da etnia (PocHE, 1992c, p. 42): “O que por etnia... € uma combinagio do grupo social, do territério ¢ do sistema de representagio que apresenta duas caracteristicas: por definigio ela é parcelar, quer dizer, nenhuma argumentacio, nenhuma racionalidade pode fazer convencer que ¢ preciso assi Ja ou fundi-la com uma outra; ¢ ela depende unicamente da representacio coletiva... ela estd fundada na construgio sensual de uma forma social e nada tem a ver com ume funcionalidade, com uma finalizagio qualquer, sobretudo poli ede As fronteras do local no sio a preocupagio principal, ¢ & niio se define em termos de escala, € tampouco Ihe € cole cariterimutivel (oct, 1996). Todavia, o local é necessariament mitado em suas dimensdes pelas do mundo da vida ce es co-presenga, Além disso, persiste um problema: como 20"* la jo quercor ; sto que ‘Também af enconteamos ainspragio fenomenolégiea numa versio MT (€ceramente soft sua inflaénci) 0 livro de R. Ledru, La orm cite (Lepncr, 1984), © oby local ” de produgio (mas , $e admitimos que 0 Porque se apéia numa corrente atualmen sociais: sociologia fenomen: que converte a vida de todos os dias em nivel s as superestruturas de Estado so entio apenas dispo: (ou miquinas de guerra) destinados a levar a desgraca o sentido e as formas que procedem desse nivel em proveito de um grupo ou de uma ideologia. Da etologia ao territério natural A referéncia ao tetritétio abre outras perspectivas. Em Goffman (1973), 0 “tertitétio do eu” se desloca com 0 individuo e caracteriza uma maneira de organizar as relagdes com os outros: a evitagio fisica; 0 paleo € os bastidores sio categorias te implicam nenhuma imutabilidade do territéria, Remy e Voyé (1981) se situam na mesma linha quando mostram como as caracteristicas do espaso construido € os cédigos que presidem a sua produgio estdo diretamente ligados 4 experiéncia de individuos que entram em relaco com outros individuos sobre um territério. Encontramos af uma outra versio do postulado que fundamenta as diligéncias anteriores: o individuo, enquanto esti em relagio com outros, a inteusio territorial aparece imediatamente. 38 A QUeSti0 loca) Ascherafte Scheflen veranista que chega aque pretende para frente, os que fo respeito de mi , impae-se uma odservacio: se uma praia cheia demais aftgenta algumas pessoas (ceri realmente por receio de incomodar os outros?) ainda sobea jente para ninguém ter remorso de se instalar em qualquer outra parte. Deveriam resultar dai conffitos tertitoriis. Mas E raro acontecer que uma praia se transforme num palco de guerra porque algam novo ocupante invadiu o tertitério de um outro, O que nio ocorreria em outros lugares; ¢ isso significa que 0 estatuto do territério, apesar de tudo, tem importancia, porque a propriedade privada constitui, por exemplo, uma qualificagio essencial. Dessa observacio de bom senso, partimos facilmente para a idéia de um rio privilegiado, para um individuo ou para um grupo, territério sobre 0 qual os comportamentos tetritoriais sio os mais fortes ¢ os mais acabados e que serve de referéncia ao conjunto desses comportamentos. ‘Como se constituem esses territérios privilegiados? Nada impede considerar que cles so puras construgées: afinal, a famosa bandeita com o slogan “Sam basta” (Lauive p'Epinay, 1987), suporte de comportamentos territoriais simplificados mas radicais (tudo é uma intrusio que se combate vigorosamente), € apenas o resultado de ‘um sistema de poupanga e de empréstimos e também de um recorte de parcelas, em geral por ocasiio de uma operacio de loteamento. Mas também nada impede, principalmente em se tratando de grupos, INE os fn ‘ ‘ve nos interroguemos sobre o carter preexistente, nafurah dos tersitérios. O naturalismo geogrético Segundo seus zeladores, al de la Blache, a0 inventat © Possibismo, teria livrado a geogra fia das ciladas do determinismo. A propésito da vinha na Franga (BExTRAN insiste no fato de que a encontrarnos (antes da de ferro) onde as condigdes ecoldgicas Ihe sio favorave que R. Dion mostra que ela se desenv 20 passo ve nas proximidades das cidades, onde se concentram os consumidores de vinho, As duas explicagdes nao se contradizem, e ambas podem patticipar de uum determinismo geografico, mas a preferéncia dos gedarafos, ha muito, é pela primeira (naturalista) ¢ nio pela segunda. M. Roncayolo mostra que esse naturalismo se desenvolveu através, de teorias como a das bacias vertentes, segundo a qual 0 mundo se organiza ¢ se divide a partir dos espigées, ou também como esse determinismo geol6gico, introduzido no século XIX pelos cengenheiros das minas e que faz das regides geogrificas 0 decalque das regides geolbgicas. ponto essencial esta finalmente na importincia atribuida duravelmente pela geografia a regio natural: um objeto que ela procura constituir e sobre o qual ela debate durante uma grande pparte de sua histéria e, numa certa medida, ainda hoje. O naturalismo consiste em considerar que 4 regio natural corresponde uma atividade, uma organizagio sociopolitica, um grupo humano especifico, ‘Quanto mais refinada a ciéncia, quanto mais capaz de recolher dados, caracterizar sistemas (ajudada nisso pelos desenvolvimentos a ecologia), tanto mais ela é tentada a passar da regiio a entidades, tetritoriais menores. Bla define entio territérios naturais em grande niimero. E uma vez feito isso, ainda que a pessoa seja prudente, é bem tentador procurar o grupo humano correspondente, “Bs brado no 185) a0 determinismo em geo imo dossé dedicado por Estar gerapigue A eesti cujas expecificidades reflitam as do terstéx Std, ou o demonstre a realidade deste tertitério a0 se apr Bro g rn Se apropriar ie Sem diivida, uma boa parte da geouratia rom, ‘es tipo de atitude. Todavia, surgem outros a adong et" Se esses especialistas de poll 2 Por exer cas puiblicas do me, ‘palmer i (rincipalmente norte-americanos), para os quais é oq eme iy S quais € natu melhor nivel para se organizar uma combinagio ment ® coletiva nio é 0 que foi definido Ma aio pelos cortes politi it icos (cor distrito), mas 0 que corresponde aos ecossistema (Comuna, S, sobretudo i bacias vertentes (em escala de um tiacho, por exemplo) s a um “territério natural”, encoraja a formagio de grupos de interesses nesta base ¢ a Ihes atribuir uma naturalidade. Vemos, am disso, a forga que podem adquirir construgses ideolégicas que associam naturalidade territorial e socialidade nativa, De repente, se torna facil afirmar a existéncia de wm local territorial imutivel socialmente fundador. Alguns nao podem passar sem ele. 3. 0 local herdado Para fazermos do local um “objeto” tinico de importincia maior, para termos dele uma concepgio substancialista, néo precisamos dar-the um estatuto de necessidade antropologica, a referéncia 4 historia pode ser suficiente. A forca do pasado al Dois textos franceses, quase contemporancos, Lita - France, de Fernand Braudel (1986), e L invention de la Franc, de i 7 Le Bras e Emmanuel Todd (1981), permitem compreene que esta em questio nesta referéncia. Estas duas obra diferentes, desenvolvem um mesmo ponto de Vs fundamental diversidade da Franca, que constitu’ * especificidade e fundamentaria a identidade nacional alta Braudel se opée mais explicitamente a um discurso "i itica de U™ fechado emergente, 0 de Le Bras e Todd associa # e% 0 objeto local a universalismo ani icamente francés com uma tentativa lem: mostrar que levar em consideragao espe ingo peazo permite consttuir uma representagio da Franca fundada na diversidade _ segundo eles, cid ais inseridas a ena abertura Exemplos um pouco paradoxais, esses dois livros levantam a questio do papel da heranga, da import desenvolvem a longo prazo para compreender as realidades sociais ecido nas ciéncias, dos fatores que se icas. Encontramos 0 debate bem entre os que sustentam a explicacio histérica, genética, ou fica, e os que defendem uma explicacio contextual, sistémica ou estrutural. ‘Tudo isso no tem a ver apenas com fatos locais. Por que enti ver nisso os fundamentos de uma teoria do local? A razio é simples, ¢ Braudel nos da uma ilustracio muito clara quando nos apresenta a aldeia, considerada, acima das diversidades de implantagio no espaco (habitat agrupado ou disperso), como a uunidade social de base na Franca tradicional (t. 1p. 131): “Aaldeia tende a viverno isolamento; ela tem suas instituigies, seus senhores, sua comunidade, seus bens coletivos, suas festas, sua sociabilidade, seus costumes, sua linguagem, seus contos, suas cangdes, suas dangas, seus provétbios, seus lesz/ obrigatérios com relacio as aldeias vizinhas.” E muito comum a idéia de uma unidade social de base, necessariamente local em vista daquilo que historicamente as coletividades constituiram em torno da explora¢io de um territério. As ciéncias sociais facilmente associaram a complexificagio das sociedades com a ampliagio dos grupos € dos territérios. ‘A partic dessaidéia, se desenvolve um raciocinio que encontramos nna maior parte das teorias do local herdado: ) O passado pesa de mancira determinante sobre o presente, portanto, a genealogia constitui o instrumento maior de compreensio do social, © MESH loca, sociedades evoluem de pequenos conjuntos mai " Para conj 0s, mais est € nos quais a relasio com o te ti ‘menos imediata, ‘ ©) Nestas condigdes, 0 que € expres mais direta d, do passado & sempre de ordem local, funda 8 etanga 2 sem ser natural E preciso entio responder a trés grandes perguntas ~ Como esse local herdado age sobre as realidades presente? — Como se transformou ¢ se transforma? : ~ Que atitude adotar com relagio a ele? A partir de um 0 antropéiogo e a identidade local Podemos querer explicar a maneira como se exprimem em nossas Sociedades estruturas antropoligicas fundamentais e perguntat sobre a persistencia de a {Dersstncia dessas estruturas, que estio mais no fundo da hist6ra tumana do que do homem propriamente. nie que coe Le Bras ¢ Todd: as estruturas antropologicas sera tttvessam a historia, A familia comunitira pode ser a realidade sob 0 efeito da revolucio industrial ¢ das err tasPermanecs sem divida presente “em cers cabs cont coesvo e 0 que hide facia a implantagio do usin, pois ele mobiliza solidariedades da mesma , mesmo nos grandes um lugar privilegiado de =— Ons Crpaade anuce que se desta 2a fargulmene ais OW menos lendicio Conquistadores) €6 grande ire dem retiério, © que rms ii de Sonhae (com, por exemplo, o destino hist ~ Por exemplo, 0 destin dos ciganos ou a evocagio das grandes hordas de up que se desloca em terntris sempre NO¥OS © objeto local 2 reseatagies € de codigos se exprimem nos rit a definem mais como um conjunto de permanéncias que caracterizam um individu ou um grupo. Colocadas em perizo parcialmente - como uma ruptura (do conttitio ji nio € mais ‘modernidade), essas permanéncias resistem porque elas se beneticiam de uma ancoragem sdlida. Mas, fora da comunidade de sangue, de teligido e de lingua, a pritica de um mesmo tertitérioe a um conjunto de regras comuns da vida diiria e de bens cultursis constituem 0s Gnicos meios de ancoragem realmente Mas 0s debates sobre a identidade giram em toro de outros objetos: a religiio, a cultura, a etnia, a minoria exes a localidade € apenas contaminada por esses objetos. E, pois, tentador endossar 0 ponto de vista de Manuel Castells (1997, p. 64): “As comunidades locais, construidas na acZo coletiva e preservadas pela memoria coletiva, sio fontes especificas de identidade, Mas essas identidades, na maior parte dos casos, so reagdes de defesa contra a imposi¢io da desordem global, da mudanga rpida e inevitivel. Elas constroem tefiigios, no paraisos.” ” Entretanto, as teorias da identidade precisam de provas € s€ voltam cada vez mais para a evidéncia etnoléica. As especificdades locais representam uma fonte inesgotivel dessas provas ¢ desta forma pequena nagio fortemente territorializada, quase local, com 1 cultura, sua lingua, sua religiio, seu patriménio, seus ttagos muitas vezes eufemizado), se toma objeto de de estruturas (ou de tracos de identidade) arreferéncia do agile agora es se transformaram € se tran} Iquer mudanga Positiva, é ums lanéncia, Se esta mesmo quando considerada posteriormente como agressio que incrimina uma totalidade e uma perm nio € resguardada, a conseqiigncia ou é uma nova totaidade tem vocagio & permanéncia, ou a desorganizagio radical, As ini atitudes possiveis para com essa heranga sio a everéncia ¢ 5 conservacio ou a revolta prometéica, Em suma, como no Clebila (1991) de J. Duvignaud, a alternativa esta entre viver totalmente na tradigio ou partir d jtivamente. local como forma social O historiador e o socidlogo oferecem respostas bem diferentes. Quando Braudel descreve a aldeia do antigo regime, quando Max Weber explica o nascimento da cidade ocidental, ou ainda quando Bernard Chevalier analisa a formagio das “boas cidades” na Francs, insistem na constituigio de configuragdes sociais que englobam fendmenos de diferentes ordens (religiosa, econdmica, juridica. je implicam atores, individuos e grupos sociais. Essas configurasées ds quais ¥. Barel, em sua Ville médiévale (1975), aplica tigorosamen® 0 modelo sistémico, constituem formas socials. ie atividade (POF também a lugares jo de Essas formas correspondem a dominios d exemplo, os grupos ¢ instituigdes profissionais) mas e por ocasi 12 mas muitas vez ina vida ditias de integragio coletiva. Essa ultima ocorr acontecimentos, como uma grande peregrinacio, se da principalmente antes do periodo moderno, ay lee Vera respi a interessante ineepretagio das Former dentist dada por B, Lacroix (1977). 0 objeto local s através da or formas soc rem princ’ integragio soc! outras fe ow aslugare de mancira especifica. Fistas aparecem em circun Weber mostra, por exemplo, que o cristianism mais eficécia do que 0 islamismo e anteriores, permitiaa constituicio de co B. Chevalier (1982, p. 65-90), a0 analisar as tra caracteristicas da formacio das “boas cidades”. Un s importantes é a emergéncia dos “bons burgueses ¢ servidores do Estado”. Mas a sociedade urbana anterior é marcada pela forte presenca da nobreza e da dominacio de cambistas (que especulam © valor dos metais preciosos) ou banqueiros, em suma, plutocratas, diz Chevalier. A doenga ¢ a guerra que grassam no século XIV provocam a derrocada das fortunas ¢ linhagens. As pessoas que salvam estas e aquelas se instalam nas terras nobres que ¢ ou obtiveram mediante aliancas matrimoniais, como # em geral 20 fugir da cidade. O espaco esti livre para que “os lewrados, os burgueses ¢ comerciantes”, como diz Christine de Pisan, em outros termos, os intelectuais das profissbes judiciirias juridicas e médicas, 08 negociantes ¢ os titulares de diversos cangos reais aproveitem as novas oportunidades, ocupem altos cargos, até inventarem 0 titulo de honra que Ihes permitir’ rapidamente compostarem-se como uma nova nobreza. A oportunidade estabelece a configuracio, mas esta atravessa a hist6ria (pelo menos por dois séculos). Encontramos ai, depois da insisténcia na forga de integragio das formas sociais locais, um outro aspecto desta orientagio, que € acentuar a capacidade que tém tais formas para atravessar 0 tempo, redefinindo-se sem realmente se modificar. Falar de local herdado implica entio imutabilidade. H. Mendras ¢ M. Forsé (1983) im este modo de raciocinio a uma aldeia dos Mauges, das a nobreza estudada por um longo periodo, 1 organizada num es em todas as esfera Pois até Aquela ho} emigracao. A exp! for emprego bem long, ¢, as familias permanecey se modifica profundamente, ‘mas os agricultotes escolh Privilegiam © tabaco, uma cultura » obtida por intermédio de redes manter um estilo de relacoes é ; ses humanas que Ihes é bem mais Emile Guea pura elagio de mercado, “Todas as insttuigdes se ttansforman ¢.2 aldcia jé mio € mais nem “feudal” nem “teoeritica” coms ba vinte anos, embora seus costumes nio tenham mudado", coneluem Rossos autores. Agnés Bonnaud (1998) aplica de modo muito convincente 0 mesmo tipo de anélise a uma outra “zona rut Aubrac, d oder nizaga Ne Set tipo ‘Ob contrat politias de influéncia, que permi Trés questées de método Entretanto, no podemos omitir trés grandes questoes de método. Em primeiro lugar, deveremos falar de sistema local? Isso permite associar fortemente uma abordagem analitica ¢ a idéia de integra¢io. Como mostra, por exemplo, J-C. Lugan (1984), uma pequena cidade se distribui em subsistemas, auténomos em seu funcionamento mas que se articulam com os outros no sistema local. Essa reconstrucio ajuda a compreender como a modangs¢ integrada. Por outro lado, a hipétese sistemista nos leva B fechamento ¢ a afirmasio radical do local. Realmente, 0 observamos sistemas de agio (como entre 0s eran 7 CSO)? que se fazem e se desfazem em fungio dos objetivo Fr Grémion, Centro de Sociologia das Organizagdes: M, Crovier, B. Friedbetts P €.Grémion, J-P. Worms ete. ” 0 objeto local ‘que alguns tenham spamos os sistemas definidos pelos fis, uma vez que 0 para deixar de existit. Esse risco é istemista a a.um tipo de rages locals uma s cidades, por exemy (as pequena ‘A segunda questio € a da sociedade local. Q descreve a estratificagio social nas Bonnes Viles cle se rofere a todas as eae gps nam exe

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