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: PRECONCEITO “O bindmio de Newton é tao belo quanto o Vénus de Milo”. A questio é a possibilidade de entender/sentir tais belezas.”. Fernando Pessoa Eu? Parafraseando 0 poeta, atire a primeira pedra quem nunca teve ou soffeu Preconceito. Decerto todos ja ouvimos ou até dissemos alguma versio daquela piada quer preceitua: negro,quando nfo “suja” na entrada, “suja” na saida. E branco? Nao carrega também igual possibilidade? E fazer “programa de indio”?! Quanto € corriqueiro alguém dizer isso sem sequer perceber o que esta reproduzindo de preconceito desde o Brasil Col6nia! E qual professor vai se omitir, negando que ouviu e viu algum (a) colega de profissao naquele risinho zombeteiro, quando menciona a caracteristica efeminada de um aluno seu ou a voz grossa € 0 pavio curto daquela sua aluna?! O mundo esta repleto de preconceito que nem nos damos conta se os reproduzimos. E queiramos ou nao, existe muito a multiplicagao de idéias excludente que cultivamos. ‘Sem querer. Ou quase. Nés professores nao deveriamos ser tao preconceituosos e escola nao deveria ser lugar de preconceito, ja que € um local de formadores de opiniao e de comportamentos cotidianamente. O preconceito, como o propfio dicionario diz, significa: “conceito ou opiniéo formados antecipadamente, sem maior ponderacao ou conhecimento dos fatos, julgamento ou opiniao formada sem levar em conta o fato que os conteste”. (Novo Aurélio- Século XX1). Assim, mesmo sendo professores, e, embora alardeando que nao temos preconceitos, a eles nos arraigamos de um modo tal, que precisamos nos reavaliar constantemente, para que nao continuemos a ser propagadores de tantos preconceitos. Sem querer. Ou quase. Quem, como eu, exerce 0 magistério em escola publica de ensino fundamental e médio, por certo ja ouviu alunos dizerem que eles nao sabem nada e a gente sabe, simpiesmente por sermos professores, como se fossemos seres iluminados. Apesar da atmosiera de desinteresse pelos estudos que impera na escola basica, considero que a maioria dos estudantes de escolas publices ainda nos véem como aquela aura de anjos de nosso saber. Reles fragmentacao. Heranga da nada distante pedagogia tradicional que nos fez o centro do processo pedagégico professores a quem compete segundo Claudino Piletti, “selecionar o saber, ordend-lo de forma légica ¢ transmiti-lo ao aluno que passivamente o recebe”. (PILETTI, Filosofia da Educacao , 1997,p.50). Pois € no rango desta concep¢ao de educar que se instala o risco do que nés professores, quase sem querer, propagandeamos: preconceitos. E, acredito isso acontece de forma muito implicita, pois em gerai nos preocupamos demasiadamente com 0 curriculo explicito, ou seja, com os programaticos; esquecendo-nos de dar mais atengao ao curriculo oculto, que abrange circunstancia de experiéncias em todo 0 contexto escolar que no costumamos realar ou até avaliar, como fazemos em relagdo aos conteiidos especificos referentes s disciplinas que ministramos. Rorém, nos alunos@ muito se refletem idéias, posturas e atitudes nossas que podem ir aos poucos Gonfirmando cristalizages de valores que, ao longo do tempo, poderio inclusive resultar nZo apenas em preconceitos, mas propriamente em discriminacao, que € 0 preconceito transformado na atitude que exclui que marginaliza 0 outro Nao diz 0 Provérbio que cutia no olhou pro préprio rabo para se preocupar com o do macaco? E 0 fujo? Fala do mal lavado? Pois vamos incorporando um fuxiquinho de sicrano aqu outro de beltrano ali e de repente os transformamos em a¢des que impedem os alvos de tais picuinhas de se aceitarem como realmente sao. E sao nossos alunos. O preconceito de hoje podera seré a discriminag&o de amanha, ‘Assim, educadores que somos, somos humanos é, consequentemente, equivocamo-nos, entretanto nio devemos permanecer numa tal agao dita sempre inconsciente, de quem age quase sem querer € vai, de novo sem querer, somando equivocos que culminam em discriminagao. Outra vez persisto na parafrase: atire a primeira pedra quem nunca teve ou sofreu preconceito. Nao somos seres perfeitos, todavia buscamos sermos melhores. E se @ busca é também para nao disseminarmos nossas pré-convep¢es irrefletidas, sugiro a leitura de dois livros pequenos (no tamanho) que, para mim, sio como verdadeiras bibliazinhas me acompanham ha anos, livros aos quais nao me canso de voltar. Sao: 12 Faces do Preconceito, organizado por Jaime Pinsky ¢ Preconceito Lingtistico, o que é, como se faz escrito por Marcos Bagno. Jaime Pinsky, que organiza as 12 Faces do Preconceito (1999, Editora Contexto), oportuniza a discussdo, refletindo sobre: mulheres, raga, homossexualismo, idosos, jovens, lingua, gordos, baixinhos, anti-semitismo, deficientes, migrantes ¢ pobres. oO Organizador deste livro, num dos 12 capitulos, discute pontos bastante necessirios, referente ao preconceito racial, mas também ha aspectos por ele feito para a obra, quando Jaime Pinsky nos adverte de que: “a escola é um lugar privilegiado para discutir a questo do preconceito e até para iniciar um trabalho. Com vistas g atenuar sua forga” (p.7). E no que acredito, por isso escrevo esse longo artigo e fico aqui sonkando com pelo menos meia duzia de leitores até este momento. Bom salientar que o professor historiador entéio lembra quanto representa um importantissimo avango 0 fato de a polemica sobre preconceito ja ser recomenda¢ao do proprio Ministério da Educago. Ressalta Jaime Pinsky “no passado gostavamos de dizer que no Brasil nao existia 0 preconceito, éramos uma “ilha de tolerancia num mundo intolerante, e que o brasileiro era cordial por natureza. Hoje nao temos mais esta iluséo comegamos a perceber que o mostro da intolerdncia pode mudar de cara (ele tem mais de 12 faces), e pode estar ainda mais perto do que imaginavamos”. (. 7), Jaime Pinsky, enfatizando 0 assunto no ambito geral das 12 faces do preconceito que seu livro aborda, fortalece uma idéia que considero fundamental: “tem gente que leva o preconceito na brincadeira, achando que piadinhas e gozagSes sobre as minorias nao tém mais significado. Errado. Certo tipo de conversa de corredor falando de inferioridade dos negros e das mulheres, dos nordestinos e dos judeus, dos velhos, dos gordos, dos baixinhos e até dos jovens tem que ser levado em consideracao e muitas ‘vezes, combatida com veeméncia por ser falsa sem base historica ou biolégica alguma. ‘Acaba funcionando para marginalizar da pratica da cidadania todos os que se enquadram em categorias definidas pelo preconceituoso com merecedoras do repudio coletivo”. (p.8), categorias estas que geralmente nem sao minorias, tomando-se , por ‘exemplo, 0 caso das mulheres e dos idosos que constituem maioria da populacéo brasileira atual, porém ambas extremamente descriminadas. Os preconceituosos de plantio, na maioria das vezes, falam, zombam as escondidas do alvo de seus preconceitos e, apesar de entender que jamais devemos ter dé das pessoas nem devemnos trata-las como incapazes de se defenderem de quaisquer dificuldades ou de supera-las, entendo também que nao podemos nos omitir diante de certos comentarios malvados. Eu propria ja fui testemunha de opinides aparentemente ingénuas do tipo: aluno tal ¢ negro, mas é lindo. A conjun¢ao adversativa “mas” ai empregado comprova a intencdo das duas idéias contraditorias. E negro e por isso no deveria ser lindo, no entanto o & contradizendo 0 que deveria ser motivo por que se as oragdes se conjuntam por adversativas. A adversidade, portanto, € ele ser lindo, que nao poderia ser sendo negro. Tem preconceito maior? Preconceito, pra mim, tudo € igualmente grave, pois os preconceituosos, os ingénuos (se € que isso € possivel) € os convictos, todos parecem reforgar 0 principio de que sio perfeitos e. entdo, nao aceitam a diferenca do semelhante, diferenga que se transforma em inferioridade € aos olhos dos que se embriagam nos preconceitos. ‘Sem querer interceder por alguém em particular, e sem querer ser a defensora dos fracos e oprimidos, pois nao ¢ totalmente assim que vejo quem quer que seja no mundoy niio consigo me calar diante de umas circunstancias até bem comuns de extremado preconceito. Sera que vocé se calaria, ouvindo o “machomachoman” tachar de” florzinha” ou coisa desse género um excelente aluno seu, exatamente porque ele € um cara organizado, sensivel, gentil, amoroso, inteligente, que nao vive socando uns € outros? Sera que vocé se calaria, ouvindo uma aluna sua dizer que tal figura “é um gato eum desperdicio, porque nao parece, mas é gay”. Vooé se cala. quando acontecem coisas parecidas com essas? Entao vooé esta se omitindo e. 0 que € mais grave: vocé camplice dos preconceituosos, pois admite como normais tais situacdes. Mas cuidado! ‘Nao va sair por ai comprando brigas, se nao vocé vira um simbolo de intolerancia, o que no contribui em nada para o debato sobre os preconceitos bem ao contrario. fortalece- (0, Se voce no refaz idéias fixas, preconcebidas ha tempos. Diz outro provérbio: quem cala, consente. ‘Assim, dispomo-nos a destacar neste artigo de jornal aspectos.valiosos de trés das 12 preconceitos ressaltados no livro de Pinsky. Elegemos trés temas: preconceito social, preconceito contra a homossexualidade € contra os jovens. E, embora desejéssemos discutir os 12 que ai aparecem eleitos por aqueles pesquisadores, transcrevemos pontos de vista deles com os quais concordados, na persisténcia de superarmos 0 maximo > possivel nossos preconceitos. E os dos outros. x SOBRE O PRECONCEITO SOCIAL > Escolhi discutir 0 preconceito social primeiro, porque acredito que este tipo é passaporte para outros preconceitos. O preconceito social ¢ como o pai dos demais Preconceitos, como: regional (nordestine pobre pode ser discriminado), racial (negro pobre pode ser discriminado), de género (muiher pobre pode ser discriminada) ete quem escreve sobre esta questdo do preconceito de classe em 12 Faces do Preconceito € Aldaiza Sposati, professora titular de PUC-Pontificia Universidade Catolica, de Séo Paulo, coordenadora do Nucleo de Seguridade e Assisténcia Social da PUC e vereadora pela PT. Partido dos Trabalnadores. na epoca da edigo do livro, 1999. Como o texto “Feios, suios e malvados”, a professora. dentre outras colaboragdes, + nos alerta para a raiz comum a alguns preconceitos 0 elitismo. Na verdade, considero e que todos os preconceitos sio eiitistas. ja que nos, preconceituosos sim, acreditamos que oa 2 visio que temos dos outros vale mais, € a meihor d deve, por isso mesmo sets union, eS Aldaiza Sposati confirma ~o tO elitista € de ciasse € base ue outros oo Preconcesios surjam, Ele associa dinheiro, sucesso e poder come Hae eee, YS entre proprietarios poderosos e pobres desafortunados (p 13) Em seguida, ela ? reforga 0 que j@ sabemos.” o preconceito de classe niio ¢ uma ° novidade no Brasil El surge no inicio do processo de formagio da nossa sociedade O Bras! Coisnia se estruturou dividido em duas classes a dos satire Petia senhores feudais, de uma lado. ¢ a dos Aldaiza Sposati sustenta mais daqui de classe tem sempre um conteudo de lo COM © Que Estamos de acordo ~o Preconceito intolerincia, uma forma de ver que néo aceita a —— ; diferenga ou os diferentes”, (p.116) Compreendo que n&o somente ele 7 classe sobrevive da intolerdncia, conforme explica a professora, mas vejo que todo: preconceitos se fortalecem na nossa incapacidade de aceitar 0s outros em suas diferengas em relacdo a nds, portanto, somos intolerantes: preconceituosos sim. ; De todas as significativas preocupagoes de Aldaiza Sposati acerca do preconceito social, ¢ imprescindivel darmos énfase ao que representa a propria origem desse tipo de preconceito ¢ nem somente dele. Segundo ela: “criam-se modelos de comportamento, conceitos do que é bom ou ruim, do que € certo ou errado. E como se todos os assuntos que nos cercam fossem etiquetados ¢ recebessem um lugar numa prateleira, Aprendemos, desde 0 inicio de nossas vidas, a categorizas as coisas e encaixa-las nessa prateleira. Nesse processo, a midia contribui para perpetuar padrées, categorias” (p.177). Desse modo é que assumimos comportamentos, atitudes, valores, na maioria das vvezes impensados, € aquelas pessoas que nisso nfo se enquadram so pressionadas a se transformarem na forma. Eu que jé tenho quase 20 anos de magistério, sempre encontro quem comente que nao aparento ser uma professora, apesar dos dculos ¢ dos livros que no me fazem falta. Motivos? Ah! Sou baixinha. Olha 0 tamanho do preconceito! Dizem que é também 0 meu jeito sempre e despojado, naturalmente meio “teen” de me vestir, Olha o preconceito! So ainda as sandalias coloridas de borracha que apesar do rabicho, so de cabresto. Sao chinelos de pobre, dizem: olha 0 preconceito! Séo os comentarios da maioria ¢ n&o se desgastam nem perante as constantes propagandas de tevé em que desfilam altas ¢ lindas atrizes, modelos maravilhosas, incluidos, claro os atores gatos de dar agua na boca ‘Nunca me esquego de uma rapaz, ex-aluno do ensino médio que disse que eu nao parecia professora, depois que discutimos durante a aula diferencas linguisticas que para ele eram eros. Devem ser ainda, Sio até para professores, mesmo de portugués, Dizia o rapaz que professores de portugués nio existem para questionar isso. E s6 para ensinar 0 certo Professora de portugués deixando escapar uma giria? Disse ele que néo sou boa professora por isso, Olha o preconceito! E esse € 0 preconceito linguiistico que seré, ainda motivo dessa discussio, pois é ele também um dos afluentes do preconceito social (pobre fala errado), como sao seus afluentes todos os que estao nestas referencias que acabo de fazer. Pessoas pobres, dentre outras caracteristicas, geralmente tém baixa estatura, vestem-se mal (ou seja, diferente da moda), falam errado etc. Ah! Pessoas pobres podem ser, alem disso mulheres nordestinas negras deficientes idosas analfabetas feias etc. assim € que reconhego,o quanto o preconceito social € patrono de tantos outros” e como combater tudo isso? Tena ss e Nas palavras de Aldaiza Sposati: a melhor forma de combater © preconeeito é * * aumentar nossa tolerdncia, Tolerdncia aqui entendida nao como contormismo como aceitagdo da diferenca, Desse modo, a tolerdncia é uma estrategia pare aye ns Bw libertemos de certos padrées estabelecidos e que, muitas vezes, nem sabemos a mario de existirem e que violam os direit i e aids forma de igualdade que respen ree ales a Igualdade no quer dizer que todos deva cae direitos iguais para todos “(p.119). O seyundo tipo de preconceito, d contra homossexuais Quem escr z ides. mm ser iguais, mas respeitar principio de lentre os trés que elegi para discutir, é 0 preconceito . : PeRTnven Universidade e sobre este tema é Jean-Claude Bi é ernnardet, fa és quan? cae le Sao Paulo, com o texto intitulado “ser ou nao ser Vivencinds pele cole ey tue© a85uRt© homossexuslidade poucas veses tem ache das piadinhas e risinhos que ndo impedem o preconceito ¢ N\ consequentemente a discriminagao. Muito ao contrario, so forte contributo ao acirramento. De tudo que o professor Jean-Claude nos alerta, ha aspectos relevantes, dentre os quais, 0 que se tefere ao fato de que o jovem pode até nem se ter ainda dado realmente conta de que se tenta atraido por pessoas do mesmos sexo, mas a campanha esta ai, martelando. A campanha pode nao ser muito clara, inclusive porque os adultos tentam evitar a palavra que soa monstruosa para sua formacao moral € religiosa i a, Aiea a ‘ homossexualidade. De forma que a campanha néo é frontal, € insidiosa, ela se insinua. E ES um professor que, tendo notado que dois garotos andam muito juntos, da um grito £ tr durante um recreio ¢ os manda jogar futebol, ou ent&o Ihes atribui carteiras afastadas na ye sala de aula “(p.30). JF & ‘Relembremos a parafrase anterior: atire a primeira pedra quem munca tev 0 sofrer gf PV preconceito. Vai me dizer que voce, professor (a), nunca fez ou sequer pensou em fazer 6 Figo idéntico em circunstancia semelhante? E como nfo ter este Preconceito? Sempre IN © gf te pergunto. Porque € como escreve 0 professor Jean-Claude no seu texto: “os rr rces, os filmes, a publicidade nos muros da cidade ou na televisio. as telenovelas, Tego nos diz como devemos proceder. E 0 reino da heterossexualidade (..). Tudo se dé oe ny peterossexualidade levasse necessariamente & felicidade, 56 ver 0s problemas que cassis formados por um homem ¢ uma mulher tém para se dar conta de que a heterossexualidade nfo é sempre um paraiso”. (p.31). Portanto, se nao queremos conosco este preconceito, precisamos estar muito atentos ‘ao reino da heterossexualidade que realmente existe, modelo aends imposto desde a infancia, outorgando as proprias criangas certas brincadeiras, verdadeiras Cagoadas em velago a outras criangas que no se adaptam aos iguais brinquedos ou néio comungam Sonverses de meninos e conversas de meninas. Assim, ocorre que 0s jovens em situagdes analogas a estas vio percebendo 0 quanto so malfazejos seus sentimentos diferentes dos de outros jovens, efeito entao do ja instaurado preconceito. ‘Nao reluto em concordar de novo com as palavras de Jean-Claude: 0 preconceito manifestado pelos familiares, os amigos, os professores, contamina 0 adolescente. Ele encampa em parte 0 preconceito contra ele proprio. Ble se vé dividido entre o prazer de estar com seu amigo, ¢ uma culpabilidade e uma solidéo que ele nao sabe reconhecer ¢— ‘muito bem. Nada disso facilita qualquer forma de afirmagao, ¢ encaminha para Comportamentos depressivos e para uma vida dupla: precisa escondermanter aparentemente uma vida como 0s outros querem e, as escondidas, satisfazer os seus amores e desejos. (p.30). ‘Aos eventuais leitores, rés ou quatro que tenham persistido até aqui longa € paciente trajetéria pego desculpas pelas também longas citagdes que tenho feito neste artigo, porém, elas dizem aquilo que no acredito e esto ditas da melhor forma Colocados estes répidos pontos de vista do professor Jean-Claude sobre o assunto que hora salintamos, encerro o tema, deixando um questionamento meu serd que ¢ esse tipo de aluno para cuja formagao queremos contribuir independentemente de sua onentagdo sexual? Queremos influenciar alunos a serem depressivos cheios de culpa, divididos entre seu desejo, que irrecuavel, e uma vida falsa de aparéncias ¢ sofrimentos sem precedentes? Nossa omisséo, principalmente sendo professores, também pode tomar favoriveis preconceitos ¢ discriminacdo, esta que é “preconceito em aco”, confirmagdo das palavras de Jaime Pinsky. (p.7) DISCRIMINANDO OS JOVENS 0 ultimo tipo de preconceito que pretendo abordar neste artigo € muito comum Da se contra os jovens, geralmente mira da varios preconceitos. No entanto, um aspecto que flo posso deixar de levantar, refere-se aos preconceitos que demonstram ter muitos de nossos jovens alunos Possivelmente ainda nilo pararam para refletir sobre certas idéias cristalizadas no tempo, adquiridas por intermédio da familia, dos amigos, da midia e da proprin escola, que assim os reproduzem. Este é um motivo que reforga a necessidade de questionar tais tematicas no contexto escolar No livro 12 Faces do Preconceito, que ‘ora enfatizamos, quem escreve acerca do preconceito contra jovens é a articulista do caderno “Folhateen", do Jornal Folha de Sao Paulo, o escritor Gustavo loschpe. Tem seu texto 0 titulo: “Entre a mamadcira ca camisinha”, onde ele chama nossa atengao para um argumento de que fs vezes nos esquecemos " preconceito contra os jovens é peculiar ao contrario da maioria das outras categorias, 0 algoz. ja foi vitima. Quer dizer: um branco nunea foi negro (...) Um homofSnico nfo ¢ homossexual, o machista nunca foi mulher € o jovem jamais foi velho, Assim, desses podemos dizer que sua discriminagdo ~ ainda que horrenda ~ abre certa possibilidade de compreensto ldgica. O que dizer, entéo, do adulto que discrimina 0 jovem — tendo ele mesmo passado por fase semelhante h4 nao muito tempo?"(p.52). Para se ter este preconceito, 0 escritor Gustavo loschpe aponta diversas causas, dentre elas, duas parecem mais prementes: o recalque de quem inveja os que tém a vida x toda pela frente, ¢ a tentativa de proteger os jovens. (p.52). Sejam quais forem as razoes de os mais velhos discriminarem os jovens, no deveriamos jamais nos colocar na posicao de sabichdes, os mestres, os professores, aqueles que, de acordo com a pedagogia tradicionalista, somente ensifidm ¢ nada aprendem com os outros. A constante aprendizagem que se da em comunhao com o mundo n&o pode prescindir do intercambio com os jovens. Com eles saimos talvez da nossa mesmice, equilibramos nossas manias de sébios e nosso quase incorrigivel perfeccionismo. © jovem é pratico, sincero ¢ precisamos cotidianamente aprender a respeitar suas diferengas, Ao que ndo basta tolerdncia, como se estivéssemos apenas suportando-os. E preciso cultivarmos a amorosidade a existéncia humana, a fim de nos desvencilharmos , no s6 deste preconceito,mas de outros No seu texto “Entre a mamadeira e a camisinha”, Gustavo loschpe muito mais se coloca na perspectiva de o jovem aprender a se defender do preconceito de outros contra si proprios. Mostra dificuldades que ha em ser-se jovem e indica modos de driblar tais situagbes. Ele recomenda aos jovens: “quando vém lhe passar a m&o na cabega, com olhares benevolentes ¢ caras de um desprezo comiserado, na tentativa implicita de rebaixa-lo permanentemente A condicdo de vitima, de quem precisa de ajuda, de quem tem um Brande futuro, mas uma porcaria de presente — esses s40 0s momentos que no podemos deixar passar em branco, Sao os momentos de recusar a piedade, a benevoléncia, o afago fio € insincero e pegar 0 chapéu e partir para estrada a procura de um abrago ‘amigo ov, quem sabe com sorte, de uma professora simpatica.” (p.55). | Professora simpética? Eu? Sou. Ah meu Deus! Esse adolescente zoadento aqui vizinho que no para de ouvir Shaman, Eminem, Evanescence etc, etc, nas 24 horas do dia'Preconceito? Eu? Se a essa altura, ainda mantenho o privilegio de um ou dois leitores, relembro-Ihes que 0 objetivo precipuo deste artigo € agugarmos a polémica dos Preconceitos @ partir de duas obras imprescindiveis, especialmente aos professores que ane no exercicio urgente de se contraporem aos preconceitos Somos -— 6. | Presoneivoros porque somos muito individualistes, egointas, egocéntricos Nao eGo! J @ietemos vero ou, ouvir suns ids Temos medo de muda’, assimilando nosso oP 68 remelhamte. Acteditamos que 16 a9 nossas idéias e iniciativas brilhantes ¢ que tém de 4 A propria sociedade capitalista, um modelo do lucro, tambem providenci tais sentimentos € atitudes. Vivemos num mundo de competigdes em que quase todos | brigamos para chegar a frente, Assim igualmente se constroem os Preconceitos. Tudo é ' bem favoravel a sermos desse jeito, mas nao precisamos ser. A fim de instigar um tema tao controverso, exploramos sinteticamente trés das 12 Faces do Preconecito Linguistico, o que é como se faz de Marcos Bagno, um jovem Jinguista que se contrapde totalmente a metodologias como a do professor Pasquele Cipro Neto que, em rede nacional de televistio educativa, propaga o ensino na gramatica normativa de modo incontestavel, sem prevaléncia de usos da lingua que as pessoas realmente falam. Marcos Bagno faz. -8e opositor a este ¢ a quaisquer professores de nossa lingua que nao tratem o ensino como um tema politico, porque para ele tudo que tratar de seres humanos é politico. Segundo Bagno, precisamos estar vigilantes para nfo. « incorremos no equivoco milenar dos gramiticos tradicionalistas que estudam a lingua como uma coisa morta, desconsideradas as pessoas vivas que a falam. Conforme Bagno, © Preconceito linguistico surge em parte devido a confusao que, ao longo da historia, foi criada entre lingua e gramatica normativa. Diz ele que nossa tarefa mais urgente, como Professores de portugués, é desfazermos essa confuséo. Exemplifica, dentre outros, que uma receita de bolo nao é um bolo, como também a gramitica nfo é a lingua. Repito suas valorosas palavras: “a lingua é um enorme iceberg, flutuando no mar do tempo, e a Sramatica normativa € a tentativa de descrever apenas uma parcela mais visivel dele, a chamada norma culta”. (p.910). Muito me comove, no prefacio deste livro, a homenagem que Bagno faz 4 familia de sua mulher, veiculando na capa da obra uma foto de seus pais. Com a atittide declara o autor que seu livro foi pichado de demagégico, por nao poderem eles ler, j4 que séo um “prato cheio”, palavras do linguista,” para alguns dos preconceitos mais vigorosos da nossa sociedade: negros, nordestinos, pobres, analfabetos”. (p.12). w” Ressalta que a capa do livro e ele proprio nao constituem demagogia, mas op¢ao sua consciente, politica: “aprender a amar estas pessoas pelo que elas so, deixando de lado todos os rétulos discriminadores que tentam classifica-las em categorias supostamente inferiores as que eu ¢ pessoas de minha extragdo social ocupamos, tem sido uma liga. fundamental para toda a minha vida pessoal e profissional”. (p.12). Falando em preconceito linguistico, talvez até bastasse somente e 0 que acabamos de destacar, porém nos damos o direito de ainda evidenciar, dentre as quatro partes que compéem a publicaco de Bagno, a parte I: “a mitologia do preconceito linguistico”. E ai onde o mestre em linguistica vai rebater oito mitos amplamente difundidos em nossa lingua materna. Deles, escolhemos alguns, a fim de os referirmos, para o que apenas transcreveremos algumas das formas de o pesquisador os desmistificar Mito 2: “Brasileiro nao sabe portugués/ S6 em Portugal se fala bem portugués” Bagno desmistifica: “F: a mesma concepgto torpe segundo a qual o Brasil ¢ um pais subdesenvolvido porque sua populagao nio é uma raca “pura”, mas sim o resultado de ma mistura ~ negativa ~ de racas € a indigena, sio “inferiores” do branco europeu, Por isso nosso “‘povinho” so pode ser o que é" (...)” Quando dizemos que no Brasil se fala ponugués, usamos esse nome simplesmente por comodidade e por uma razie hustonca. justamente a de termos sido uma colénia de Portugal. Do ponto de viste linguistico, porém a lingua falada no Brasil ji tem regras de funcionamento ~ que cada vex mais se diferencia da lingua falada em Portugal” (p 24), Mito 3. “Portugués ¢ muito dificil” Bsagno dismitifica “Achamos que “portugués-¢ uma lingua dificil” porque temos de decorar concertos e fixar regras que no significam nada para nos No dia ew que nosso Se ego? Portugués se concentrar no uso real, vivo e verdadeiro da lingua portuguesa 0 Brasil € bem provavel que ninguém mais continue a repetir essa bobagem Todo falante de uma lingua sabe essa lingua. Saber essa lingua, no sentido cientifico do verbo saber, significa conhecer intuitivamente e empregar com naturalidade as regras basicas de funcionamento dela”. (...) “ Tantas pessoas terminam seus estudos, depois de 11 anos de ensino fundamental e médio, sentindo-se incompetentes para redigir o que quer que seja. E nao € a toa: se durante todos esses anos os professores tivessem chamado 4 atengao dos alunos para o que é realmente interessante e importante, se tivessem desenvolvido as habilidades de expresso dos alunos,em vez de entupir suas aulas com Tegras ilégicas e nomenclaturas incoerentes, as pessoas sentiriam muito mais confianga € prazer no momento de usar os recursos de eu idioma”. (p.35-39). Mito 8: “o dominio da norma culta é um instrumento de ascenso social”. Bagno dismitifica: “Achar que basta ensinar norma culta a uma crianga pobre para que ela “suba na vida” € 0 mesmo que achar que é preciso aumentar o numero de policiais nas ruas e de vagas nas penitenciarias para resolver o problema da violéncia urbana”. (...) “E preciso garantir, sim, a _ todos os brasileiros 0 reconhecimento (sem o tradicional julgamento de valor) da variago lingiiistica, porque o mero dominio da norma culta nao é uma formula magica que, de um momento para outro, vai resolver todos os problemas de um individuo carente. E preciso favorecer esse reconhecimento, mas também garantir 0 acesso a educagao em seu sentido amplo, aos bens culturais, 4 saude e & habitag&o, ao transporte de boa qualidade, a vida digna de cidadao merecedor de todo respeito. O que esta em jogo nao é a simples” transformacao” de um individuo que vai deixar de ser um” sem — lingua padrao” para tornar-se um falante da variedade culta. O que esta em jogo é a transformacao da sociedade como um todo. ”(p:70-72). Encerrando esta discussio sobre preconceito, conclamo o leitor a fazermos a contagem regressiva, a fim de comecarmos o debate acerca dos preconceitos, caso: op¢&o a) pesemos em dizer; op¢ao b) digamos; op¢&o c) escutemos alguém dizer frases cristalizadas no tempo, como: “lugar de mulher é na cozinha”. “Homem no chora”,” crianga nao tem querer”, “pobre fala errado”, “AIDS é doenga de homossexual”,” indio €é preguicgoso”, “lugar de velho é no fundo da rede”, “servigo de branco é limpo”,” nordestino tem cabeca chata”,” matuto é ignorante “... uuuufa! Quanto tem preconceito! Vinicius de Morais poeticamente j4 dizia: “as feias que me perdoem, mas beleza é fundamental”. E o Raul Seixas é que canta ali no outro vizinho zoadento: “co Diabo é 0 pai do rock”. Estou bem de vizinhanga!Adolescentes barulhentos roqueiros gordos... opa!! Preconceito?7Eu? Mailma de Souza Professora

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