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CAPITULO 4 Distribuicado Individual de Espécies 4 Amplitude Geografica “A proposigiio de que cada espécie possui uma amplitude geogriifica tinica é o foco Be toda a biogeografia. Os biogedgrafos estudam muitos fenmenos — locais de ocor- “sSecia de organismos individuais, alteragGes na distribuico local ou regional de uma ‘sepulacdo, as distribuigdes presentes e pretéritas de txons mais elevados ou clados “Gehagens de espécies desdentes de um ancestral comum; ver Capitulo 11), padrées & biodiversidade —mas os processos ecolégicos e eventos histéricos que moldaram. ‘=:amplitudes das espécies sto diretamente relevantes a quase todos eles. " Questdes Metodolégicas: Mapeando e Medindo a Amplitude ‘Sea amplitude geogréfica é a unidade basica da pesquisa biogeognifica, como pode- ‘Ss defini-la e medi-la? A primeira vista, parece imediato. Guias de campo e publi- “cacGes sistemiticas mais técnicas sobre floras ou faunas regionais sio completadas ‘sex mapas de amplitude. Esses mapas so aparentemente faceis de serem prepara- ‘Ges pelos pesquisadores e igualmente ficeis para serem utilizados por outros cientis- % ‘=scomo fonte de dados para estudos biogeogrificos. Antes de comerarmos a utilizar ‘es mapas de amplitude para ilustrar padres e processos biogeogrficos, no entanto, -gevemos considerar de modo critico apenas o que eles nos indicam. Existem trés tipos basicos de mapas de amplitude: esbogo, ponto e contomo. O mapa de eshogo, em geral descreve a amplitude como uma area irregular, fre- ‘=Sentemente sombreada ou calorida, dentro de um limite desenhado & mao (Figu- == 4.1). A linha diviséria supostamente define os limites da distribuigao conhecida Sespécie, mas sua preciso pode variar muito dependendo da extensfo que essa emplitude ¢ conhecida e com que precisto o autor incorporou estas informagdes ‘so mapa, Em geral, 0 autor utiliza seu proprio conhecimento sobre o organismo ‘para inferir suposigdes baseadas em fatos sobre os provaveis limites distribucio- ‘eais quando dados adequados nao esto disponiveis. ‘© mapa de pontos representa pontos onde a espécie foi registrada (Figura 42). Os mapas de pontos so freqiientemente preparados como parte de um es- ‘ado taxonémico de uma espécie e os pontos mostram os locais onde espécimes ‘8 registrados em museus foram encontrados e coletados. Esses mapas fornecem ‘mais, ou menos, informagGes do que os mapas de esbogo. Por-um lado, eles exibem com preciso os registros conhecidos da distribuigdo das espécies. Por 61 62- Capitulo 4 Figura 41 Um exemplo de mapa de esboco da amplitude geografica de uma espécie. Nesse caso, a borboleta em risco de extingao Zegris euphieme, que ocorre no sudoeste da Asia. O limite ‘externo foi desenhado a mao, para incluir as loca- lidades onde a espécie ocorre. (De Bo- rodin etal. 1984.) Figure 4.2 Um exemplo de mapa de pontos da amplitude geografica de uma espécie. Nesse caso, a planta Ambrosia ambrosio- ides, do Deserto dle Sonora. Cada cir- culo representa uma localidade onde se documentou a presenca da espécie, através da coleta de uma espécie e do acondicionando num, herbario. Cada cruz representa um registro adicional baseado num espécime observado e identificado no campo. (De Sonoran Desert Plants, de Raymond M. Turner, Janice E. Bowers e Tony L. Burgess ‘Copyright © 1995 da Arizona Board of Regents. Reimpresso por permissio da University of Arizona Press.) Ambrosia ambrosoides © Coletada * Observada 2tro lado, a localizagao dos espécimes ou outros registros, como a ocorréncia & espécies de passaros, pode representar apenas uma fracdo infinitesimal dos ‘Jegares reais onde os individuos da maioria das espécies vivem no presente ou ‘scorreram no passado, Enquanto sabe-se que uma reduzida maior com amplitudes muito pequenas esté restrita a apenas um ou a um pequeno nii- ‘ero de lugares altamente localizados, os registros documentados da ocorréncia & maioria das espécies representam apenas uma amostra de sua distribuicao seal. Assim, uma desvantagem dos mapas de pontos que eles nao extrapolam aim das poucas localidades amostradas para fazer inferéncias sobre a distri- buic2o potencial das espécies. Algumas vezes, no entanto, o autor desenha uma finha a mao livre em torno da localizacdo periférica, criando uma combinagio dos mapas de esbogo e de pontos (ex., Figura 4.3). Recentemente, os pesquisadores tém obtido informagdies suficientes sobre a ‘sbunciincia dentro das amplitudes geogrificas de algumas espécies, para produzir es mapas de contorno ow cartas topogriificas (Figura 4.4). Devido ao fato de ccurvas de nivel ou outras técnicas grficas serem utilizadas para indicat a variagaio fa densidade, esses mapas fornecem muito mais informagdo do que os demais ‘ipos. Entretanto, as cartas topognificas devem ser interpretadas com cautela, Distribuigao individual de espécies - 63 Figura 4.3 Um exemplo de uma combinagio de mapa de esbogo e pontos da amplitu- de geogréfica de uma espécie. Nesse ‘caso a borboleta em risco de extincao Zerynthia polyxena, que € restrita a uma pequena rea ao norte do Mar Branco, no sul da Eurasia. Cada pon- to representa uma localidade onde a espécie foi registrada. A linha foi construida a mio, para inserir os pon- tos mais externos, incluindo assim, a amplitude geografica conhecida. (De Borodin et al. 1984.) Figura 4.4 Um exemplo de mapa de contorno da amplitude geografica de uma espécie. Nesse caso, a amplitude de inverno do gaio azul, Cyanocitta cristata, exi- bindo variagao geogréfica em abun- dancia. (A) Cada linha de contorno, ou isoclinal, indica uma classe de 20° percentil de abundancia relativa, (B) Uma paisagem tridimensional de abundancia relativa. Os dados de abundancia sao provenientes do Nor- th America Christmas Bird Counts. Os dadios originais desse censo (ruimero de passaros vistos por hora por par- te do campo) foram inseridos em um programa de computador, recebendo {ratamento estatistico, para estimar a abundancia entre as atuais localida- des recenseadas, a fim de produzir os ‘mapas (de Root 1988a.) 64- Capitulo 4 porque as informagdes sobre abundancia geralmente esta disponiveis para apenas um néimero limitado de localidades bastante separadas entre si. Tipicamente, programas de computador e uma técnica estatistica denominadas kriging sio utilizados. para interpolagao entre os pontos de dados, gerando uma paisagem tridimensional que exibe a variagio em relago & abundancia dentro da amplitude. Assim, esteja atento, pois mesmo os mapas de contomo sio representagdes altamente simplificadas da estrutura complexa e dindmica das amplitudes. Todavia, apesar das limitagdes dos trés tipos de mapas de amplitude, eles stio inestimaveis resumos da informacdo biogeogrifica. Apesar de sua preciso poder ser limitada, os mapas geralmente fornecem um quadro em grande escala, razoavelmente preciso e sem desvios, da amplitude geografica de uma espécie. Eles podem ser compilados, computadorizados [utilizando-se softwares como 0 sistema de informagdes geograficas (GIS - geographic information systems)] analisados quantitativamente. Seu emprego € relativamente direto, por exemplo, para medir as varidveis da area, as maiores latitudes norte ¢ sul ¢ as maiores longitudes leste e oeste das amplitudes e utilizar esses dados em estudos biogeo- grdficos comparativos. Veremos varias dessas aplicagdes neste livro. ADistribuigao dos Individuos Mesmo o melhor mapa, no entanto, pode apenas fomnecer um quadro altamente simplificado e abstraido em relagao a distribuicdo geogrifica de uma espécie. AS unidades reais de distribuigdo sao as localizagdes de todos os individuos da es- pécie. Um mapa que exibisse tais localidades seria impossivel de ser preparado para a maioria dos organismos, mas podemos ter uma idéia de como tal mapa se pareceria com uma fotografia aérea, na qual podemos identificar individuos de certas espécies visiveis (Figura 4.5). Rapoport (1982) preparou um mapa da dis- tribuigao de uma palmeira distinta e facilmente reconhecivel (Copernicia alba), + através de uma fotografia aérea, ao longo de uma secedlo de parte de sua amplitu- de, na Argentina (Figura 4.6). Como podemos ver, tanto na amostra obtida da fo- tografia aérea, quanto na dos dados de Rapoport, a distribuicao é complexa, com individuos ocorrendo em aglomeragdes separadas por lacunas. A medida que se aproxima das margens da amplitude, os individuos tendem a estar mais esparsa- mente distribuidos, os agrupamentos menores e as lacunas entre eles maiores. A distribuigdo agrupamento/lacunas dos individuos ao longo da paisagem indica que qualquer tipo de mapa da amplitude de uma espécie nfo € somente Figura 4.5 Uma fotografia aétea proxima a margem da distribuicao local da arvore juniperous osteosperma, no leste de Nevada. Arvores individuais, que so reconhecidas pelos Pontos escuros, geralmente diminuem em famanho e abundancia, a medida que a altitude decresce, da esquerda para a direita Observe trés coisas: (I) a complexidade geral do padrao de abundancia e a dificuldade de definicao precisa das margens da amplitude; Q)a distribuicgo relativamente uniforme das plantas ao longo do plano dé leque aluvial, no topoda fotografia; e (3)adistribuicoagrupada das plantas nas encostas das faces a sudeste ide pequenos montes ao fundo da fotografia. (Fotografia: cortesia do US. Forest Service.) Distribuicao individual de espécies - 65 10,000 Figura 4.6 Abundancia da palmeira Copernicia alba, ao longo de 3 km em seccio de oeste para leste da margem de sua am- plitude geogratica. Os dados foram obtidos de fotogratias ‘aéreas, nas quais palmeiras individuais so facilmente reconhecidas através de suas formas distintas, Note que proximo a margem da amplitude, a abundancia tende a ser baixa ea distribuigdo das arvores tende a ser parecida agrupamentos (como indicado pelos valores de abun- dncia zero). (De Rapoport 1982.) ullviduios por kan? a 8 Eo © 30m Ocste Seegio Leste ‘ema abstragiio e sim uma abstragao dependente de escala. Imagine que sobrepo- ‘0s uma grade na fotografia aérea como na Figura 4.5. O fato de um individuo ser encontrado em uma célula da grade depende do tamanho daquela célula: guanto maior a célula, maior a probabilidade de ela conter pelo menos um indivi ‘Geo. Esse exercicio revela que a margem da amplitude é também uma abstragzo Gependente de escala. Na Figura 4.5, apesar de nfo existir nenhum individuo ‘= canto inferior direito, a exata definigdo do limite distribucional dependera @ escala na qual as localidades dos individuos se conectam para que se possa ésenhar a margem. Além disso, em adig&o aos limites relativamente dbvios da -emplitude, existem “buracos” dentro da amplitude onde no ocorre nenhum in- Gviduo. Entfo, Rapoport (1982) comparou essa amplitude a uma fatia de queijo ‘saico. Mas isso é uma simplificagdo exagerada, porque o tamanho das localida- és nas reas onde nenhum individuo aparentemente ocorre também depende ‘Sescala espacial da andlise. Talvez a melhor representagao do efeito da escala ‘=spacial na distribuigao conhecida de uma espécie ainda seja os mapas classicos ‘& Erickson (1945) da distribuigao do arbusto Clematis fremontii (Figura 4.7). Mesmo uma representaedo fiel da distribuigdo de uma espécie, através de uma ‘fotografia aérea, falha em outra caracteristica critica da amplitude geogréifica de- ‘vido 20 fato de representar apenas uma frago de tempo. A distribuigdio de qual- quer espécie € dindmica, assim qualquer representagdo precisa de uma amplitude ‘eve, em teoria, ser constantemente atualizada para que possa refletir as mudan- ‘=25 que ocorrem quando os individuos nascem, morrem, se movem e quando as. populagdes colonizam novas reas ou so localmente extintas em partes de suas ‘smplitudes anteriores. Andrewartha e Birch (1954), por exemplo, documentaram ‘gandes alteragSes na amplitude geogrifica de muitas espécies de insetos na Aus- ‘alia. Os autores demonstraram através de diagramas como o limite aparente da ~ smplitude varia a medida que as populagdes locais episodicamente se extinguem = depois so recolonizadas por outras populagdes de outras areas (Figura 4.8). Apesar da natureza aparentemente estética da maioria dos mapas de amplitude publicados, tais expanses e contragdes esto sempre ocorrendo em resposta a ‘sariagZo ambiental e atividade humana (ver abaixo e no Capitulo 18). A Distribuigao das Populagdes © Crescimento da Populagao e Demografia © tamanho de uma amplitude, a localizagao de seus limites ¢ a mudanga dos ‘padrdes de abundancia dentro desses limites refletem a dinamica das populages, 2 influéncia das condigées do ambiente na sobreviveneia, na reprodugdo ¢ na ispersio dos individuos. Em 1798, em seu Essay on the Principle of Population ‘(Ensaio sobre o Principio da Populagao), Thomas Malthus mostrou que todos os 66 - Capitulo 4 Figura 47, Representagio clssica de Erickson, da istribuigdo da erva-daninha Clematis {fremontii, no Estado de Missouri, na ;parte central dos Estados Unidos, em escalas espaciais distintas. As escalas maiores exibem a amplitude geogré- fica baseada nas localidades de coleta conhecidas. As escalas sucessivamen- te menores exibem a distribuigao das populagoes. A escala menor mostra a dispersdo de plantas individuais, em ‘uma tinica populacao local. Note que em todas as escalas, a distribuicio é concentrada em pacotes e que as ére- as onde as plantas foram encontradas estdo separadas por setores nao habi- tados. (De Erickson 1945.) Figura4s. Diagrama esquematico _mostrando como a abundancia e a distribuigao de um otganismo hipotético pode variar no tempo e no espago. S40 mostradas flutuagdes em abundancia sobre mui- tos anos, em trés localidades diferen- tes (A-C), separadas por distancias de ‘muitos quilémetros. Observe que todas as trés populacdes flutuam. Na locali- dade A, que supostamente fica na mar- gem da amplitude geografica ou local da espécie, apenas poucos individuos sao intermitentemente presentes, indi cando episédios repetidos de extingao local e recolonizagao. (De Andrewartha e Birch 1954.) ‘Amplitude geogritica 10 milhas “Agrupamento de clareiras de caledrio Clareira exbindo agregados de individuos 100jardas Quilémetros tipos de organismos possuem um potencial inerente a aumentarem de maneira exponencial em nimero, Uma populagio aumenta quando as relages combina- das de nascimento e imigrago excedem as de morte e emigragio. Esse conceito pode ser expresso matematicamente como: r=bti-d-e (4.1) onde r € a tazdo per capita do crescimento da populagao (se r € positivo, a po- pulagdo aumenta; se r & negativo, diminui), 6 e dso as razdes per capita entre, respectivamente, nascimento € morte, e ie @ so, respectivamente as razies per capita de imigrago e emigrago. Com recursos ilimitados e condigdes ambien- ‘ais favordveis, a populacdo crescerd continuamente até o maximo possivel r Ela aumentard seu nimero como descrito pela equacao: aNidt=rN (4.2) ‘onde dN / dt é a taxa de mudanga no nimero de individuos, N, em relacZo ao tempo, ser 6a taxa de crescimento da populagao. Isso ¢ denominado de erescimento expo- nencial ¢ sua relacio pode ser descrita em termos de intervalo de tempo necessario pela populagdo para dobrar seu nimero. Se a espécie continuar crescendo exponen- cialmente, por fim, ela ocuparia a Terra na sua totalidade. O tempo necessiirio depen- seria de r; bactérias e moscas domésticas precisariam apenas de poucos anos, engquan- to drvores de reproducao mais lenta e elefantes, cujos valores de r so baixos, levariam alguns milhares de anos. A populagio humana global tem tido um crescimento em proporgdes quase exponenciais nos tltimos milhares de anos (Figura 4.9). Entretanto, ‘Malthus reconheceu que devido ao fato de os recursos limitarem o crescimento e mui- ‘os ambientes serem imprOprias para a sobrevivéncia, nenhum organismo continua a ‘erescer indefinidamente, como seria de se esperar em uma raziio exponencial. _O Conceito de Nicho Multidimensional de Hutchinson Em 1957, Evelyn Hutchinson desenvolveu o conceito de nicho ecolégico multidi- ‘mensional para definir como as condigdes ambientais limitam a abundancia e a dis- ‘ribuigio. A visio de Hutchinson de nicho consistia em uma modificagaio do primeiro eoneeito de nicho de Grinnell (1917) e Elton (1927; ver também James ef al. 1984; Schoener 1988). Hutchinson percebeu que durante um periodo de tempo e sobre sua ‘Antiga Idade da Pedra Distribuigao individual de espécies - 67 Figura 49 © crescimento estimado da_popula- ‘¢40 humana nos tiltimos 10,000 anos. Observe a forma da curva do cresci- mento continuo, quase exponencial, do Homo sapiens, que nao apenas cres- ‘ce em abundancia local, mas também se distribui por quase todo o mundo. ‘Todas as populacoes tém a capacidade de aumentar exponencialmente, desde ‘que as condligoes ambientais nao sejam limitantes. A colonizacao de espécies exéticas tipicamente exibe taxas de ‘rescimento quase exponenciais, du- ante um periodo de répida expansio da amplitude. (De Desmond 1965.) Idade __Tempos| BE anos Geemescala NovaladedaPedin___Idade do Bronze ___Idade do Ferro Malia Modemes| = T i t T ate 28 4 ROE i 2 ye a woe ade aOAe 3000 2000aC 00a Tod zaq0 de 68 - Capitulo 4 Figura 4.10 (A) Diagrama bidimensional - temperatura e salinidade ~ do nicho de uma espécie aquitica hipotstica, A érea sombreada re- presenta a combinacio dessas duas varidveis - uma ampla variacSo de temperatura, mas uma estreita variagdo de salinidade sob as quais os individuos podem sobreviver e reproduzir ou. a populagao pode aumentar. Em (B) ¢ (C),a taxa de crescimento da populacio é representada graficamente em funcio de cada variavel, onde a linha tracejada horizontal correspond ao valor zero usado para desenhar 0 espaco de nicho eliptico em (A). Salinidade—> lagio—> CCrescimento da Popul w @) ‘Temperatura > ‘Temperatura —> Salinidade —> Adistribuigao geogrifica, cada espécie esta limitada por um certo nfimero de fatores, ambientais, Ele conceituou o ambiente das espécies como um espago multicimensio nal, ou “hipervolume”, no qual os diferentes eixos ou dimensdes representam varié- veis ambientais distintas. O nicho das espécies represeita as combinagdes dessas va- ridveis que permite a sobrevivéncia dos individuos e a manuten¢do das populagdes. Esse concefto pareve ameacailor e, de fato, & um tanto abstrato, Mas a idéia b sica é realmente muito simples (Figura 4.10). Imagine o efeito de apenas duas va- cis ambientais ~ temperatura e salinidade ~ em algumas espécies aquaticas. Se todas as outras condigdes sf favoriveis, o desempenho individual e o crescimento da populagdo seri limitado pelo efeito conjunto dessas duas variveis. Podemos representar em um grifico a variagdo dessas condigdes, sob as quais 0 crescimento, populacional ser negativo, zero ou positivo, e 0 espaco dentro do contomo zero ou isoclinal, representam 0 espaco do nicho. Na realidade, é quase certo que os organismos aquiticos também seriam limitados por outras vatidveis: talvez a con- centrago de oxigénio dissolvido, espécies em competigio e um predador. Cada uma dessas varidveis representaria uma outra dimensdo do nicho, acarretando em um nicho com volume multidimensional, dificil de visualizar ou desenhar, mas nio tio dificil de imaginar. E facil observar que 0 nicho de varias espécies ¢ tinico, por que cada espécie difere, pelo menos levemente e algumas vezes muito, de todas as outras em relacdo 4 combinagao de condigdes ambientais exigidas para a sobrevi- vvéncia e reprodugo de seus individuos e para o crescimento de suas populagdes. A Amplitude Geogrifica como Reflexo do Nicho A amplitude geogrifica de uma espécie pode ser vista como um reflexo espacial de seu nicho: a espécie ocorre onde as condigdes ambientais so adequadas e fora de reas onde um ou mais recursos essenciais ou condigdes necessirias niio esto presentes. Os limites da amplitude e o padrao de abundancia dentro desses limites, Constantemente mudam & medida que as populagdes locais crescem, declinam, colonizam ¢ se extinguem em resposta & alteracdo das condigbes ambientais. ‘Um dos primeiros estudos sobre nichos ecolégicos de uma espécie ainda hoje € um dos mais completos. Joseph Connell (1961) estudou os fatores ambientais que limitam a amplitude de uma craca, Chthamalus stellatus, na costa rochosa da Tha de Cumbrae, na Esedcia. Como mencionado no Capitulo 3, a zona en- tremarés consiste de uma faixa estreita do litoral que fica inundada pela agua do mar na alta das marés e exposta nas marés baixas. As espécies so tipicamente restritas a uma amplitude modesta dentro da zona de entremarés. Connell uti- lizou alguns experimentos de campo elegantemente simples para caracterizat varidveis importantes do nicho da C. stellatus e para explicar sua distribuigao na poredo superior da zona entremarés (Figura 4.11). Ele mostrou que a margem superior da amplitude € definida pela habilidade das cracas em tolerar o estresse fisiologico de dessecago durante as marés baixas. A margem inferior & definida pela interag7o com outros organismos de entremarés, basicamente por compe- tigdo com outra espécie de craca, Balamus balanoides, e secundariamente por predacdo do caracol Thais lapillus. © éxito do método experimental ¢ ilustrado pelo efeito da remogao da B. balanoides da pequena faixa de praia: nos locais. onde o competidor estava ausente, C. stellatus estendeu sua amplitude inferior avangando para a zona de entremarés, Figura 4.11 -Represenlacao diagramatica dos efeitos da competisio interespecifi ‘Se; de cada efeito, de acordo com a altitude. (Segundo Connell 1961.) Oestudo de Connell € pioneiro na utilizacdo de experimentos de campo na eco- ‘Jbeia. E também um classico que demonstra como trés varidveis de nicho ~ expo- Selo A dessecagdio, competicAo interespecifica e predagio por um caracol — pode icar com eficdcia a distribuigao limitada de C. stellatus nas praias rochosas da de Cumbrae. Observe, no entanto, que estas no sZo as tinicas varidveis de que afetam a distribuigdo dessa craca: por exemplo, algum outro fator(es) ne explica a auséncia da C. sfellatus nos substratos arenosos e pantano- ‘ses que ocorrem a apenas uma curta distancia do sitio estudado por Connell. Enquanto o nicho ambiental multidimensional fornece uma estrutura con- ‘ceitual para compreender como os fatores ambientais limitantes influenciam a ‘s=rplitude geografica e a densidade populacional local, tais varidveis sozinhas “ que os adultos, mas a muda comega a se estabilizar sob a copa das pequenas Sevores do deserto, que fornecem ao jovem cacto 0 microclima de protegio para 4s primeiras décadas de suas vidas (Nobel 1980b). Essas “érvores enfermeiras” Seotegem os cactos arbéreos jovens da noite fria e do congelamento, de modo ‘S:uito similar a protecZo de tomates quando os cobrimos & noite com papel ou plistico —a perda de calor pela radiagao infravermetha do céu € retardada pelas Ssvores enfermeiras. Antes de alcangarem 0 estégio reprodutivo, os cacto arbé- sees crescem acima de suas arvores enfermeiras, freqllentemente matando-as du- sante 0 processo, estando jé grandes o suficiente para no serem afetados pelos congelamentos noturnos. Nobel (1978, 1980a) estudow as relagdes termais dos soncos e brotos utilizando simulagdes por computidor e medigdes diretas de ssmpo. O resultado mostra que o grande didmetro do tronco do cacto arbéreo Sabilita-o a manter temperaturas minimas mais altas de seus brotos e, assim, ter ‘=m distribuigdio mais ao norte do que espécies afins de cactos colunares, Steenburgh e Lowe (1976, 1977) estudaram populagdes de cacto arbéreos do Saguaro National Monument, fora de Tucson, Arizona, proximo ao limite nordes- % © 20 limite elevacional superior da amplitude da espécie. Ocorreu uma extensa seortalidade tanto de cactos jovens, como de adultos, devido a temperaturas excep- Sonalmente baixas ocorridas em Janeiro de 1937, 1962, 1971 ¢ 1978. Em 1971, 0 congelamento aniquilou cerca de 10% dos individuos e danificou severamente ou- ‘0s 30%; muitos dos cactos danificados morreram durante os anos seguintes, como sesultado de infece2o por micrdbios, que se iniciou nos locais onde havia danos por congelamento (Figura 4.18). Essas observagdes em relagdo & mortalidade epis6dica 0 inverno, juntamente com a intima correspondéncia entre os limites norte e leste 2 amplitude das espécies e as areas que experimentaram temperaturas abaixo do congelamento durante mais de 12 horas (ver Figura 4.17), sugerem que baixas tem- peraturas limitam diretamente a distribuigao de cactos arbéreos nessa regio. A distribuigao de muitas espécies de plantas parece ser limitada por baixas semperaturas interagindo com outras condigdes ambientais, como a disponibi dade de égua e composigao quimica do solo. Hocker (1956) estudou a distr Saigo do pinheiro americano (Pinus taeda) no sudoeste dos Estados Unidos € Distribuigto individual de espécies -75 76 - Capitulo 4 Figura 4.18 Seqiiéncia de fotografias de uma es- tacio de cactos arbéreos, proximos a Redington, Arizona, nas proximida- des do limite superior de elevacio e ‘na margem norte da amplitude da es- pécie. (A) Em 1961. (B) Em 1966, mos- trando a perda de um individuo bem desenvolvido (centro acima do solo) e cicatrizes (em branco proximo & extre- midade da haste) bem como a perda de ‘muitos outros, como resultado de uma nevasca severa, em 1962. (C) Em 1979, exibindo muita mortalidade adicional devido a nevascas severas em 1971 1978; muitos dos individuos ainda em péestiio mortos ou esto morrendo. (A eBeortesia de J. R. Hastings;C cortesia de R.M. Turner) concluiu que as margens norte e oeste da amplitude eram definidas pelas baixas temperaturas em conjunto com a baixa umidade do solo. Ele sugeriu que isso € resultante da incapacidade das raizes em reter gua suficiente para substituir as quantidades perdidas pela evaporagaio, quando as temperaturas ambientais estavam baixas, Shreve (1922) notou que os limites elevacionais superiores de ‘muitas espécies de plantas do deserto parecem ser fortemente determinados pela temperatura, porque ocorre mortalidade excessiva da populagdo nas altitudes mais altas, durante invernos excepcionalmente frios. Entretanto, muitas dessas mesmas espécies, como a fouquiéria (Fouguieria splendens), ocorrem em alti- tudes muito mais elevadas ¢ toleram temperaturas de inverno substancialmente mais frias em solos caledrios do que em graniticos ou outros tipos de solos 20- nais (Shreve 1922; Whittaker e Niering 1968), Muitos pesquisadores tentaram determinar a causa da extensiio vertical das florestas, ou seja, os limites superiores de altitude das arvores nas montanhas. ‘A posigio geogrifica em grande escala da distribuicao altitudinal das florestas parece estar relacionada as temperaturas médias ou maximas durante os meses quentes da estagdio de crescimento, assim como 0 reflexo disso na variagio en- tre a latitude e a altitude (Figura 4.19), apesar de ser influenciada localmente por outros fatores, como a profundidade de neve, ventos ¢ equilibrio energético (Daubenmire 1978;-Stevens e Fox 1991). Nas extensdes verticais das florestas, as drvores ja estabelecidas em geral vivem por um longo tempo, mas seu cres- cimento muito lento e a reprodugao bem sucedida e o desenvolvimento de ‘mudas so raros. Os pinheiros de cones rugosos (Pinus longaeva), que freqtien- temente crescem apenas abaixo do limite vertical da floresta nas montanhas do sudoeste dos Estados Unidos, s4o os seres vivos mais antigos conhecidos, com mais de 3.000 anos de idade. Eles crescem lentamente e produzem uma madeira excepcionalmente pesada e densa, muito resistente ao apodrecimento (Figura 4.20). Os anéis de crescimento anual desses pinheiros fornecem um valioso re- gistro da historia climatica do sudoeste americano, porque a largura de cada anel é proporcional a uma estagao de crescimento satisfatéria no ano que ele foi desenvolvido (Fritts 1976). Em alguns lugares, os pinheiros mortos formam um limite altitudinal de floresta “fossil”, acima da floresta viva atual, Aparentemen- te, essas dreas algum dia ja foram adequadas para o crescimento dos pinheiros, Distribuigio individual de espécies -77 Figura 4.19 Relagio do limite da mata (timberline) em relagéo & altitude e a latitude em trés das principais cadeias de ‘montanhas na“América do Norte. Em. geral, 0 limite ? dda mata aumenta na altitude com latitude decrescente, eer iiee easbadiay refletindo a influéncia do aumento da temperatura. Observe, no entanto, que a relacio é diferente em cada cadeia de montanha, devido a outros fatores, tais como vverao mais longo na estacio de crescimento. Observe ‘abcde também que na extensao da cordilheira priméria (a cadeia que se estende descle as Montanhas Rochosas a0 norte, até o Panama), néo existe essencialmente nenhuma mudanga na altitude do limite da mata dentro dos trépicos e subtrépicos, entre 35 ° N de latitude e o Bea eee mee Aaa equador. (Segundo Daubenmire 1978.) Cordilheira priméria Grau N de latitude as mudangas climaticas durante os diltimos séculos destruiram as arvores € ‘ocaram uma redugao de sua amplitude altitudinal (La Marche 1973, 1978). Ao contrario de plantas e animais sésseis (como as cracas discutidas anterior- ), muitos animais podem se mover em busca de microambientes favordveis im poclem evitar condigdes abiéticas mais estressantes. Todavia, mesmo os is extremamente méveis, como os peixes, podem ser diretamente limitados fatores fisicos, como temperaturas ambientais. Peixes do género Cyprinodon exritérmicos e eurialinos, podendo tolerar uma grande variagao de tempera- e salinidade (Brown 1971e; Brown e Feidmeth 1971; Soltz.e Nalman 1978). Ecies desse género ocorrem em ambientes fisicos rigorosos, incluindo tios pantanos em desertos, e pequenas pocas em estuirios e mangues sob a cia das marés, onde a temperatura e salinidade podem variar bastante. Al- populagdes tabitam até mesmo fontes quentes, apesar de geralmente no sm temperaturas que excedam os 43° C (que é altissimo para um peixe). deles sobrevivem em setores menores de temperaturas das fontes quen- inferiores aos limites letais. A distribui¢do local de uma dessas populagdes, ‘espécie C. nevadensis, proximo ao Vale da Morte, na Califérnia, é diretamente ‘Seitada pela temperatura (Brown 1971c). Os peixes ocorrem em todas as partes “& Sguas com temperaturas abaixo de 42° C, incluindo pequenas pogas com ape- ‘S55 pouco centimetros de éguas mais quentes (Figura 4.21). Ocasionalmente, in- “Seiduos incursionam pata dguas letalmente quentes € morrem instantaneamente ema demonstragao clara do eixo do nicho termal! Menos freqiientemente, mu- ‘#22cas ripidas nas condigdes do tempo fazem com que as Aguas letalmente quen- ‘= fluam rio abaixo a partir da fonte, aprisionando milhares de peixes em poras, ‘sede so mortos quando a temperatura eleva-se acima de 43° C. ‘Como em muitos organismos, alguns peixes adultos so tolerantes a uma grande “sssiacio de condig6es fisicas do que nos estégios iniciais de crescimento. Os ovos “= C.nevadensis se desenvolvem normalmente em Aguas entre 20° e 36° C, apesar “Gs adultos dessa espécie poder suportar temperaturas entre 0° e 42° C (Shrode $975). Os ovos também so menos tolerantes & salinidade do que os individuos ‘ssultos. Conseqilentemente, peixes adultos podem ser encontrados em habitats es- -seadouros, onde a reprodugao é impossivel, contanto que tenham-a possibilidade & imigrar dos micro-habitats fontes proximos, favoriveis ao desenvolvimento dos ‘se0s. Por outro lado, espécies de Cyprinodon sfo notadamente ausentes em algu- Figura 4.20 "Ge pinheiro de cones rugosos (Pinus longaeva) crescendo préximo ao limite de mata ‘Seberline) nas Montanhas Brancas, na California. Como & fipico dos individuos nas -Ssxgens superiores de altitude da amplitude, este pinheiro apresenta muita madeira ‘Seria e uma forma crescimento altamente contorcida. (Cortesia de A. Kodric-Brown.) 78 - Capitulo 4 Figura 4.21 ‘A temperatura limita a distribuigao local do ciprinodonte (Cyprinodon nevadensis) no fluxo de superficie de uma fonte quente, proximo a Vale da Morte, California. O canal prin- cipal de fluxo rapido esta acima da temperatura letal de 43° C; 0s peixes sio aprisionados, mas capazes de sobreviverem, no lado mais frio da poga (ampliado, a direita). (De Bro- wn 1971c.) mas fontes ftias ¢ outros habitats onde os adultos podem crescer e sobreviver, mas ‘nfo existe nenhum microclima favoravel aos estdigios iniciais de vida. ‘Além da temperatura, outros fatores fisicos e quimicos como umidade, luz, oxigénio, pH e elementos do solo e da agua limitam as distribuigdes dos animais, tanto individualmente quanto em interagdes entre si, Um exemplo simples de tal interagao € o efeito da temperatura e da concentragao de oxigénio em muitos peixes e invertebrados aquaticos. A medida que a temperatura da Agua aumenta, sua capacidade de reter oxigénio € outros gases dissolvidos diminui. A combinacao resultante de alta temperatura € baixa concentracdo de oxigénio ¢ muito estressante para muitos peixes invertebrados aquéticos, porque as altas temperaturas provocam elevadas taxas metabolicas e aumentam a demanda por oxigénio. ‘Alguns poucos exemplos adicionais serdo suficientes para ilustrar os limites distribucionais que podem ser atribuidos, pelo menos em parte, a fatores como umidade, salinidade e quimica do solo. Muitas plantas terrestres sao limitadas por baixa umidade do solo nas margens mais secas de suas amplitudes, do mesmo modo como ocorre com a temperatura nas margens mais frias. Em {quase todas as plantas vasculares, a taxa fotossintética declina a medida que a umidade do solo diminui. As plantas podem compensar baixa absorgao_ de Agua, fechando seus estématos e reduzindo a ‘transpiragao nas folhas, mas com {sso as taxas de fotossintese também sto reduzidas. ‘As plantas possuem diversas adaptacdes anatOmicas, fisiolégicas e feno- légicas que as capacitam crescerem em um amplo regime de temperatura, umidade e luz (Bazzaz 1996). Por exemplo, espécies que podem crescer sob luz solar plena ¢ constante em solos secos (xerofiticas) exibem mui~ tos mecanismos especializados para manter seus estématos abertos, mesmo baixos niveis de aguas em suas folhas. Em contraste, espécies de am- es mais timidos ¢ escuros (mesofiticos) tipicamente fecham seus est6- quando sujeitas a seca e temperaturas estressantes e, na auséncia de Samento por evaporagao, suas folhas armazenam altas cargas de calor, itemente fatais. Por outro lado, as xerofiticas tipicamente possuem ss de fotossintese relativamente baixas quando a agua disponivel é abun- -além de serem intolerantes & sombra. Uma conseqlléncia disso é que plantas mesofiticas so fisiologicamente incapazes de crescer em solo Se, enguanto que as xerofiticas podem crescer onde a umidade é baixa, do competitivamente exclufdas em solos mais encharcados pelas som- das mesofiticas, que tem taxas de crescimento mais altas (ver Odening ‘ai 1974) (Figura 4.22). Essas descobertas fisiolégicas fornecem a base mecanismos para a conclusio de Shreve (1922) e outros ecdlogos de de que em gradientes crescentes de aridez, os limites de distribuigo plantas sao determinados grandemente pela habilidade em tolerar a baixa “dade do solo. Individuos mortos durante as secas prolongadas sto comu- ‘observados em populagdes locais nas margens da amplitude de uma Je (ex., Sinclair 1964; Westing 1966). Tipos similares de intercambio taxas de fotossintese e habilidade de tolerar baixos niveis de nutrientes, sslinidade, pH extremo ou altas concentragdes de minerais toxicos pro- .ente sdo responsdveis, pelo menos em parte, pelas falhas de muitas ibuigdes de espécies de plantas que ocorrem localmente em solos com ss caracteristicas, enquanto espécies com adaptacdes especiais a esses de solos, sao freqiientemente restritas a eles (Whittaker 1975). a Esses tipos de fatores fisicos e quimicos também limitam a distribuigao dos smais. Devido a sua fisiologia osmorregulatéria, a grande maioria dos inver- € peixes de agua doce sio intolerantes & salinidade, enquanto espécies fas ndlo podem sobreviver em aguas doces. Uma conseqiiéncia disso é que ssnos salobros ¢ estusrios nao so habitados nem por espécies marinhas, nem espécies de agua doce, mas sim por espécies eurialinas especializadas que tolerar grandes variagées, geralmente didrias, na salinidade, provocadas s efeitos das marés, das inundagdes e das tempestades. -Apenas poucas espécies de organismos especializados ocorrem em lagos ¢ . que chegam a ser mais salgados que © prdprio mar. O Lago Salgado, ‘Utah, por exemplo, tem uma salinidade aproximadamente sete vezes maior Figura 4.22 Distribuigao individual de espécies -79 ‘Twas de crevetmonto oe Arbusto creosote Salgqueiro do dleserto 0 1020-30 40-30-60, -70 -80 -80 —109, Agua potencial (bars) Estresse de seca—> Intercambios entré a taxa de crescimento e a tolerancia a seca em duas espécies de arbustos de deserto: o arbusto de creosoto (Larrea tridentata), que cresce em alguns dos Gesertos mais secos da América do Norte e o salgueiro do deserto (Chilopsis finearis), que tem uma amplitude _geogréfica sobreposta, mas é mais mesofitico a0 longo dos cursos d’égua onde o solo é permanentemente timi- ido. Observe que nos niveis de umidade mais elevados (cegido cinza-claro), osalgueiro do deserto tem uma taxa fotossintética iquida mais alta e & capaz. de érescer mais rapido e competitivamente exclui o arbusto creosoto, ‘mas quando 0 solo é mais seco (regido cinza-escura), 0 arbusto creosoto tem uma taxa de crescimento mais alta. (Segundo Odening etal. 1974.) 80 - Capitulo 4 Figura 4.23. Efeito de um incéndio natural causado por raios nas savanas préximas de El- ‘gin, no Arizona. (A) Poucos dias apéso incéndio, em Junho de 1975. (B) Varios ‘meses apos, em Setembro de 1975. (C) ‘Onze anos mais tarde, em Fevereiro de 1986. Observe que enquanto 0 carva~ Iho perde a maior parte de suas folhas devido ao fogo, apenas alguns, como os do centro, pereceramn ou sofreram ‘maiores danos, O incéndio mata os arbustos invasores e algumas arvores, ‘mantendo um habitat de mata aberta e ‘grama. (As fotografias sao cortesias de R.M. Turner) que a égua do mar. O lago ndo contém nenhum peixe e suporta apenas dois invertebrados macrosc6picos, 0 camariiozinho-das-salinas (Artemia salina) © 0 béntico Ephydra cinerea, Muitas espécies de peixes ¢ initmeros invertebrados habitam os cursos d”gua e pantanos que deséiguam no lago. Esses animais tém abundantes oportunidades para estender suas amplitudes ¢ colonizar o lago, mas sii impedidos de fazé-lo devido a incapacidade de tolerar a alta salinidade. Isso 6 ilustrado pela ampla mortalidade que ocorte quando tempestades ocasionais de ventos langam agua salgada do lago para os pantanos adjacentes. (a) 8) © Distribuigao individual de espécies ~ 81 ‘outra classe de fatores que influencia as distribuigdes locais ¢ geogréficas tos organismos incluem incéndios, furacdes, erupedes vulcénicas e outros es de perturbaciio destruigao de grande escala. Esses desastres naturais sio es de destruir completamente habitats e seus habitantes. Nas regides onde Gstirbios ocorrem com alguma freqiiéncia, eles constituem um componente do meio (Figura 4.23), Muitas espécies so dependentes desses distiir ‘periddicos para continuarem sua existéncia, havendo um padrio regular de ‘zaciio e substituigio de espécies apés 0 distirbio, 0 que os ecologistas minam de sucessdo secundéria. Por exemplo, 0 pinheiro Pinus banksiana, ‘este da América do Norte, ¢ 0 pinheiro P. contorta, nas Montanhas Rocho- ‘pessuem cones fechados que requerem o calor dos incéndios florestais pe- pata liberarem suas sementes. Processos similares de sucessto ciclica no chaparral da costa da Califérnia e nas florestas de coniferas da regio Montanhas Rochosas, que sio varridos por incéndios periédicos. As ilhas e os recifes de coral da regido do Caribe so ocasionalmente, mas -avelmente, dizimados por furacdes. Os habitats na regio de entremarés em ‘© mundo estdo sujeitos as fortes pressOes das ondas ¢ ao deslocamento de ss durante as grandes tempestades. Por outro lado, distiirbios naturais periédicos podem ser suficientemente se- « freq{lentes para impedir a expansfo de algumas espécies, em dreas onde Sam sobreviver, Em muitas planicies de gramineas, incéndios causados por ‘constituem um processo natural do ambiente. Nas margens entre a floresta planicies de gramineas, onde a umidade do solo é alta o suficiente para a ve- » florestal comegar a se estabelecer, incéndios fregtientes podem impedir Ecvores ¢ arbustos estendam suas amplitudes (ver Figura 4.23). A supressaio Secéndio artificial nos ultimos 200 anos, contribuiu para a expansiio de flores- ‘© éreas arbustivas em detrimento de areas de pradarias e outros habitats de ao longo da margem leste da Planicie Central, na América do Norte (ex., sn e Brenner 1951; Hartnett et al. 1996). Um fenémeno semelhante ocor- ‘margens mais secas da Planicie Central, no sudoeste da América do Norte, ‘© incéndio exerce influgncia na margem entre os gramados e o deserto de .s. A supressio do incéndio, juntamente com a pastagem de rebanhos, tem empenhado um grande papel na desertificacio — a degradagao dos gramados © favor dos arbustos de deserto — no’ sudoeste dos Estados Unidos, norte do ssico, além de outras regides do mundo (Figura 4.24; Johnston 1963; Bahre 55). Em muitos desses lugares onde incéndios naturais queimavam vastas ére- queimadas planejadas devem ser usadas como uma ferramenta de administra- ‘para preservar os gramados e impedir a invasio da vegetagao de floresta ¢ de jes exoticas. As reservas de pradarias de grama alta no centro-norte dos Es- ie Unidos, por exemplo, so pequenas demais para que possam experimentar habitats e al- titudes normalmente ocupadas. por ambas as espécies. Tais experimentos naturais sfo boas evidéncias de exclu- so competitiva, que nesse caso foram confirmadas por estudios de campo. pela primeira espécie, isso implica que em todas as areas onde a primeira espécie esti presente nesses habitats, a segunda ¢ limitada pela competieao. As florestas as formages arbustivas do oeste dos Estados Unidos so habitadas por mais de 20 espécies de roedores do género Extamias, Nas montanhas do sudoeste, duas ou trés espécies tipicamente ocorrem nos arbustos e nas florestas, mas elas esto segregadas pelo habitat e pela altitude. A Eutamias dorsalis habita formagdes ve~ getacionais abertas, xéricas, em baixas altitudes e é substituida nas florestas de coniferas mais densas, em altitudes mais elevadas, por uma espécie do grupo de E. quadrivittatus, Uma terceira espécie, E. minimus, algumas vezes est presente nas florestas de abetos e acima dos habitats do limite de vegetago, nas cimeiras mais proeminentes. Existem pelo ménos 24 cadeias de montanhas isoladas e desertos, onde habitats apropriados parecem estar presentes, mas uma dessas espécies est ausente, aparentemente porque, ou nunca colonizaram, ou se extinguiram no pas- sado. Em todos os casos, independente da auséncia dessa espécie, as remanescen- tes expandiram suas amplitudes para incluir todos os habitats florestados, desde a ‘margem dos desertos até o limite de vegetagdo altitudinal (Patterson 1981; Figura 4.26). Tais exemplos de nicho e expansio de amplitude sto evidéncias particu- larmente convincentes de competig#o quando, como no presente caso, mudangas similares de distribuig&o ocorreram isoladamente em varios lugares. Os mecanismos de interagao competitiva entre essas espécies de roedores foram investigados de um modo um tanto detalhado. Brown (1971) colocou estagdes de alimentagdo e observou as interagdes comportamentais na estrei ta zona onde as amplitudes de E. dorsalis e E. umbrinus entram. em contato. Ele concluiu que E. dorsalis, a espécie mais agressiva e terrestre, foi capaz de excluir £, umbrinus das matas abertas, onde os roedores vagueiam muito pelo solo, tentando defender com agressividade os recursos alimentares em seus ter- ritdrios. Entretanto, nas florestas mais densas, onde a alimentagdo é mais dificil de ser protegida, porque & abundante e os roedores podem se deslocar pelas Arvores, E. umbrinus prevalece porque E. dorsalis gasta um tempo excessivo € energia em perseguigdes infrutiferas. Chappell (1978) estudou uma situago mais complexa, onde as amplitudes de varias espécies entram em contato em Sierra Nevada, na California. Também observou que essas distribuigdes mutua~ ‘mente exclusivas poderiam ser primariamente atribuidas & influéncia do habitat no resultado das interacdes competitivas Tais “experimentos naturais”, que implicam a limitagdo das amplitudes geo- grifieas através da competico, nao se aplicam somente a pequenos mamiferos. Eutamias sumbrinas Ewamias —Y dorsalis ‘Montanas Rubi Cadeia Cobra Pico Piloto Nove México Bucamias ‘guadrivitatus Euanias —Y dorsalis Montantas Oregan Monte Taylor ‘Montanhas Madalena ‘Dismond (1975) fomneceu varios exemplos de nichos e expansdio de amplitu- ‘sss m pissaros na auséneia de espécies competidoras, em cadeias montanhosas dentro na Nova Guiné e ihas préximas. Schoener (1970) e Roughgar- ‘> (1996; ver também Roughgarden et al. 1983; Pacala e Roughgarden 1985) -yeram varios casos entre lagartos Anolis em ilhas das Indias Ocidentais. vez o melhor exemplo em plantas seja a segregagiIo de duas espécies de tift- ‘= 20 longo de um gradiente crescente de profundidade nos pantanos na parte ‘ssstral da América do Norte. Em uma série de experimentos de transplantes re- “Spe0c0s, Grace ¢ Wetzel (1981) mostraram que Typha latifolia foi pouco afetada sua congénere, Tangustifolia, Na auséncia de seus competidores, no entanto, ‘engustifolia poderia crescer em toda a extensfo do gradiente. A competic¢ao nao precisa necessariamente envolver espécies similares para fnaja a limitagdio das distribuigdes. De fato, os tipos de interagdes entre espécies “Semamente relacionadas ecologicamente descritas acima provavelmente corres- ‘seedem apenas a uma pequena parte de todas as relagdies de competigaio experi- por um dada espécie. Por exemplo, plantas distantemente relacionadas '& Giferentes formas de crescimento freqiientemente experimentam uma competi- ‘ntensa e assimétrica (Johansson e Keddy 1991), Foi descrito acima como as Sgdes fisicas estressantes e o fogo limitam as distribuigdes de muitas espécies plantas € tipos de vegetagdo. O outro lado da histéria & que as plantas menos tes ao estresse abidtico (seca, fogo e inundago) em geral sao competidores Fores (Keddy e MacLelan 1990). Por exemplo, enquanto algumas interagdes relago ao fogo, & pastagem e a seca poclem impedir arvores ¢ arbustos de “ssadirem as pradatias, essas plantas lenhosas so competidoras superiores onde condigdes no so to severas. Elas nfo apenas podem impedir o estabele- to de espécies de pradarias, mas durante.os tiltimos dois séculos, & medida ‘222 fieqiléncia de queimadas foi reduzida e o regime de pastagens alterado, essas lenhosas invadiram de modo agressivo as pradarias e substituiram as plan- “es herbiceas (Steinauer e Collins 1996) (ver Figura 4.24), Tais relagdes assimé- Seas de nicho, nas quais uma espécie ou um grupo funcional inteiro de espécies & lo pela competieo, enquanto o outro ¢ restrito devido a sua incapacidade de ‘Spier 0 estresse fisico, parecem ser extremamente comuns entre muitos tipos de “Sezznismos ~ lembrem-se dos estudos de Connell com as cracas, ‘Predacio. A predagdo pode ser definida como qualquer interago entre duas espé- ‘Scena qual uma se beneficia ea outra softe prejuizo. De acordo com essa definigo, _ssrelacdes entre herbivoros e suas plantas comestiveis ou entre parasitas e seus hos- ‘pedeiros, poderiam ser classificadas como predagdo. As interagdes predador/presa ‘sedem limitar a distribuiedio de ambos os participantes porque, por um lado, os ‘=eedadores podem depender da presa para se alimentar out de outros beneficios ne- -S=ssirios para suportar suas proprias populagdes, enquanto, por outro lado, os pre= ‘adores podem limitar a populacdo de presas, matando ou ferindo os individuos. ‘Quando os predadores sao altamente especificos, & 6bvio que suas distribuigdes ‘ependem em parte da disponibilidade de presas apropriadas. Nao € surpreenden- = o fato de as amplitudes geograficas de muitos parasitas especificos ou de herbi- ‘soros corresponderem quase precisamente & amplitude de seus hospedeiros ou de ‘ss2s plantas comestiveis. Assim, a distribuigdo da borboleta Euphydryas editha ‘ss costa da Califfsria ¢ limitada as imediatas vizinhaneas do solo rochoso, & qual ‘ss: planta hospedeira, Plantago hookeriana, é restrita (Ehrlich 1961, 1965). Com ‘sereza, até mesmo predadores altamente especfficos podem exibir amplitudes -Scenores que seus hospedeiros, porque em algumas reas suas populagdes esto Szvitadas por outros fitores além da disponibilidade de presas adequadas. E muito mais dificil documentar casos nos quais as distribuigdes de populagdes ‘& presas siio limitadas por seus'predadores. Alguns dos melhores exemplos en- ‘solvem introdugdes de predadores em regides onde originalmente nao ocorriam. Distribuigao individual de espécies - 85 86 - Capitulo 4 Em alguns casos, essas introduces constituiam tentativas intencionais de con- trolar pestes. Dois exemplos bem sucedidos desse controle biolégico envolvem a drastica redugo em populagdes de plantas, através da introdugao de herbivoros. cacto-péra espinhoso (Opuntia stricta) foi introduzido na Austrilia na metade dos anos 1800 para servir de planta ornamental em um jardim. Por volta de 1900, ‘ocacto escapou do cultivo e invadiu as éreas de pastagem, tornando-se ento uma peste. Em 1926, os cientistas australianos introduziram uma mariposa (Cacto- blastis cactorum), cuja larva alimenta-se especificamente de Opuntia em sua ter- ranativa, a Argentina. Em 1940, O. stricta havia sido efetivamente controlado no leste australian, apesar de pequenos agrupamentos do cacto e populagdes locais da mariposa permanecerem (Dodd 1959). Infelizmente, muitas outras espécies de plantas exéticas esto invadindo os habitats australianos e a pesquisa por agentes apropriados de controle biolégico ainda esto em estigio inicial De modo similar, a erva daninha de Klamath (Hypericum perforatum) da Eurdsia foi introduzida no noroeste da América do Norte por volta de 1900 e tor- nou-se uma peste na agricultura, mas foi subseqilentemente controlada através da introdugao de um besouro herbivoro especifico (Chrysolina quadrigemina). Na parte sul de sua amplitude, essa erva daninha persiste apenas em pequenas populagdes ao longo dos acostamentos das estradas e areas sombrias, mas a populao de besouros ndo se adapta em climas frios e as ervas daninhas sto mais bem distribuidas na Columbia Britinica (Huffaker e Kenriett 1959; Harris et al. 1969). Em ambos os casos, tanto os cactos quanto as ervas daninhas foram reduzidas em suas populagSes, através da introdugo de herbivoros especificos, resultando em distribuigdes locais muito limitadas, mas isso nao alterou muito a distribuigdo das pestes em uma escala geogrifica maior. Talvez os melhores exemplos de eliminagiio completa de populages de pre- sas em partes de suas amplitudes geogrificas com a introdueao de predadores no especificos sejam as introdugdes artificiais de grandes peixes predadores em determinados habitats de gua doce. Muitos dos pequenos peixes nativos do su- doeste dos Estados Unidos vém softendo grandes redugdes em suas amplitudes ‘geogtificas e completa extingaio de populagdes locais como resultado da intro- dugiio de grandes peixes predadores (especialmente Micropterus salmoides) em seus habitats (Miller 1961a). Os peixes nativos nao estao adaptados aos grandes predadores generalizados, porque evoluiram em lagos isolados, ribeirdes e lago- as durante milhares de anos. Zaret e Pame (1973) documentaram um exemplo semelhante, a extingo de pelo menos sete espécies de peixes nativos no Lago Gatiin, Panamé, aps a introduao do peixe predador Cichla ocellaris. Muitas das 300 espécies endémicas de peixes ciclideos declinaram apés a introdugao da perca do Nilo (Lates niloticus) no enorme Lago Vitoria, na Africa Central. A truta do lago (Salvelinus namaycush) & amplamente distribuida no norte da América d6 Norte, mas no é adaptada a presenga de lampreias dos géneros Petromyzon e Entosphemus, as quais sio predadores vorazes. AsiCataratas de Nidgara antigamente impediam Petromyzon de entrar nos Grandes Lagos supe- riores, que suportavam grandes populacdes de trutas do lago. A construgio do Canal de Welland permitiu que a lampreia colonizasse esses lagos. O resultado foi um declinio acentuado das trutas do lago nos Grandes Lagos superiores, ape- sar dos grandes esforgos para controlar esse predador na tentativa de preservar essas trutas de grande valor comercial, Nos exemplos anteriores, os efeitos de predadores nas populagdes de presas sio particularmente claros, porque podemos observar as respostas & introduc artificial de predadores, Sem essa perspectiva histérica, seria dificil inferir até que ponto as presas sao limitadas por seus predadores. Hoje, conjuntos isolados de Opuntia, na Australia, nao esto infestados com Cactoblastis. Similarmente, é di-~ ficil observar os peixes predadores atacando suas presas no sudoeste dos Estados Unidos, porque os peixes nativos jé foram eliminados da maior parte das éguas sade esse predador introduzido estava presente. E comum que muitas populacdes presas sejam limitadas, pelo menos em parte, por seus predadores, mas é dificil + evidéncias convincentes sem a execugdo de experimentos manipulaveis. Enquanto os efeitos dos predadores foram estudados por muitas décadas, os tos dos parasitas e micrébios transmissores de doengas receberam menor isio dos ecologistas e biogedgrafos, até pouco tempo atris. No entanto, é ivel que eles também podem limitar as abundéncias locas e distribuigdes ee icas. Existe um niimero crescente de exemplos nos quais plantas e animais sésticos foram capazes de-expandir suas amplitudes em dreas previamente habitadas, apés a eliminagao ou 0 controle de seus parasitas ou patégenos. ‘modo andlogo, existem exemplos de contragdio de amplitudes, decorrentes da lueao de parasitas ou doengas por intermédio humano. A influéncia da ma- ‘a avidria em pissaros havaianos nativos é um exemplo, Desde que o primeiro ano chegou as ilhas, esta avifauna endémica diversificada vem sofrendo ex- Ses, contragdes de amplitude e redugdo de populacdo (Ver Capitulo 18). Uma inicial de extingSes, supostamente decorrente principalmente da caga e da i¢do do habitat, iniciou-se com a chegada dos polinésios, cerca de mil anos Muitas extingdes ocorreram com o estabelecimento dos europeus, que co- ou a menos de 200 anos atrés. Os europeus niio apenas causaram destruigées habitats e introduziram competidores de aves e predadores mamiferos, como bém iniciaram uma guerra biolégica, Juntamente com as espécies dom corujas, mascotes e piissaros de caga — algumas vezes deliberadamente libera- ‘no ambiente ~ veio a maliia avidria (Plasmodium). Esse parasita tornou-se adémico em éreas de altitude modesta, onde sua persisténcia e transmissao so voriveis devido a altas temperaturas, disponibilidade de mosquitos transmis- s € aves hospedeiras exéticas e resistentes. Enquanto ¢ dificil desmembrar as iuéncias de interacZo miltipla de todos os fatores que afetam as espécies de ses nativas, a maléria aviéria claramente desempenha um papel principal na ex- io local de muitas aves havaianas endémicas das altitudes mais baixas, mes- em Areas onde ainda existem habitats relativamente no perturbados (Warmer 1968: van Riper et al. 1986). Mutualismo. A terceira classe de interagdes interespectficas ¢ 0 mutua- mo, onde cada espécie beneficia a outra. Exemplos de associagdes mutua- ‘Sticas sdo fornecidos pelas plantas e seus animais polinizadores e disperso- de sementes, pelos corais e suas zooxantelas fotossintéticas (algas) que ‘ivem em seus tecidos, pelas formigas e afideos e por alguns peixes e seus Sespedeiros. Comparado com competigao e predacao, o mutualismo tem sido ouco estudado pelos ecologistas e biogedgrafos (Boucher et al. 1984; Bou- cher 1985; Fleming ¢ Estrada 1993), Ainda hé muito o que apreender sobre ‘es efeitos dessas associagdes mutuamente benéficas em relagao a abundancia =A distribuicdo das populagdes participantes. Quando as relagées mutualisticas so obrigat6rias para pelo menos um dos sarceiros, a interagdo tem uma influéncia crucial na distribuiggo, Algumas po- sulagdes de plantas so dependentes dos servigos de polinizadores especificos ‘pera a reprodugio sexual. Por exemplo, o trevo vermelho (Trifolium pratense) frocriava em pequena escala apés ter sido introduzido na Nova Zelandia, até que su polinizador, a mamangaba (Bombus spp.), foi também introduzida (Cum- Ser 1953; Free 1970). Janzen (1966) estudou a associagdo entre formigas do ‘ginero Pseudomyrmex e Arvores e'arbustos do género Acacia, nos trépicos do Novo Mundo. Apesar de muitas espécies de Acacia nao ter nenhuma formiga -ssociada, e algumas espécies de Pseudomyrmex niio serem necessariamente de- pendente das acicias, as relagdes so aparentemente obrigatérias para inimeras, species. A arvore fornece & formiga'espinhos dilatados ond podem construir sinhos, além de abastecé-la com alimentos ricos em agticares, éleos e proteinas. Distribuigao individual de espécies - 87 88 - Capitulo 4 a arcilchs colubris Eh Arcalctus alexandri Bi cape costee Ti Gilpteanna ZZ Selasphorusplatyereus I Selasphorusrufs [Bl Selasphorus sas (stata clipe Figura 4.27 Distribuigdo de colibris de zonas temperadas da América do Norte algumas das plantas que 05 mesmos forrageiam em busca de néctar. (A) Amplitudes de procriagao de oito es- ‘pécies de colibris que ocorrem substan- cialmente na fronteira ao norte dos Es- tados Unios/México. (B) Amplitudes sgeograficas de nove espécies de flores fubulares vermethas, comumente vi- sitadas pelos colibris em apenas um sitio no Arizona (circulo). Seria mui- to confuso representar as amplitudes de aproximadamente 130 espécies de flores utilizadas pelos colibris. Obser- vve que apesar das intimas relagdes de mutualismo, existem. poucas relacdes entre as amplitudes geogréficas das plantas especificas e seus polinizado- res. (De Kodric-Brown e Brown 1979.) 1S Ipomopsis aggregt ES Penson brats a Case integra BD coset estrvontana Bil Aguilegia rternata Silene lc (El Echinoerenstriglociditus EE Lobe carnlis Em contrapartida, as formigas atacam os insetos herbivoros ¢ vertebrados que tentam se alimentar dessas arvores ¢ limpam a vegetagao circundante, reduzindo a competi¢ao com outras plantas. Tais especializa¢des co-evolutdas aparente- mente tornaram essas duas espécies to dependentes entre si, de modo que suas amplitudes sto virtualmente idénticas. Entretanto, esses exemplos de intimas associagdes ecolégicas ¢ biogeografi- ‘eas podem ser excepcionais. Freqlentemente, as relagbes entre os mutualistas, pelo menos em nivel de espécies, naio sto to obrigatorias e a influéncia da intera- ‘gdo nas distribuig6es geogréficas nao € assim tfo aparente. Em geral, pelo menos ‘um dos parceiros nao requer o beneficio do outro, ou muitas outras espécies po- dem executar a mesma fungao, Assim, muitas relagdes entre planta/polinizador & planta/dispersor de sementes nao sdo obrigatoriamente desempenhadas por uma espécie especifica, pelo menos nas Zonas extra-tropicais (Waser et al. 1996). ‘A Figura 4,27 exibe as relagdes entre as amplitudes geograficas na América do Norte de oito espécies de colibris ¢ algumas espécies de plantas com flores vermelhas e tubulares nas quais eles encontram seu alimento e polinizam. Nao existe nenhuma correspondéncia entre as amplitudes de pares particulares de colibris e espécies de plantas, mas a distribuigdo se configura de modo que, in- dependente de onde ocorram, os colibris terdo flores se alimentarem e as plantas terdo colibris para a polinizagto (Kodrie-Brown e Brown 1979), Uma relagao similar € observada nas amplitudes do peixe-palhago (Amphiprion spp.) © as | Ampiprion clark EB Reteracts malu HE Macrodacnsta doreensis ss do mar, com os quais estdo associadas (Figura 4.28), Enquanto todos ex-palhacos parecem necessitar da protecao das anémonas e alguns tipos as serem incapazes de existir sem os peixes-palhacos, espécies parti- =: s20 muito mais permutavei edes miiltiplas. Além dos casos em que € possivel isolar o efito li- de uma espécie em relagio & distribuigdo de uma outra, existem muitas es nas quais as amplitudes so estruturadds por interagdes bidticas mais Tais limites podem ser o resultado de diferentes efeitos de interagao de ‘espécies (ver a discussdo sobre competicdo entre plantas arbéreas e her- ‘scima). MacArthur (1972) observou que os limites sul das amplitudes de especies de péssaros norte-americanos, aparentemente ndo poderiam ser nem ao clima (porque o clima fica mais estavel em latitudes mais bai- ‘sem ao habitat (apesar dele poder ser importante para algumas espécies), +2 alguma espécie particular de competidor ou predador. Ele sugeriu que tas dessas espécies, o fator limitante deveria ser uma competicao difusa mento no niimero de espécies tropicais, MacArthur notou, por exemplo, 202 espécies de passaros terrestres que procriavam no Texas, apenas 29 procriavam no Panam, mas o Panama possui um total de 564 espé- ppassaros terrestres que procriam neste local. Uma das poueas espécies tanto nos Estados Unidos, quanto no Panama é 0 candrio amarelo 2 petechia), um pequeno insetivoro ciscador de folhagens. Nos Esta- os, 0 candrio amarelo é abundante em uma ampla variedade de habitats stos e florestas, mas no Panamé, é restrito aos mangues e pequenas ithas (Figura 4.29). Devido ao fato das florestas do Panama conterem mui- jes de passaros ciscadores altamente especializados, enquanto os man- + ithas tém poucas dessas espécies, MacArthur atribuiu a distribuigzo dos Ses amarelos como resultado de uma competicao difusa— efeitos negativos dos de competigo com muitas outras espécies de péssaros. entanto, nesses casos isolados existem poucas evidéncias fortes de que siedo por si s6 é responsavel pelos padrdes de distribuigdo observados. fatores, como predadores, parasitas, doencas e mutualismo também senham papéis de grande importancia na distribuigo. Lembre-se do oda malaria aviaria, que limita as distribuigdes elevacionais de varias es de aves nativas, nas ilhas havaianas. Na auséncia de evidéncias © epidemiologicas em relacdo & funedo deste parasita, seria facil erroneamente as distribuigdes restritas das espécies nativas, sendo ste decorrente da competicao com os pissaros introduzidos. Beriness Distribuigio individual de espécies - 89 Figure 4.28 Distribuigéo do peixe-palhago indo- pacifico (Amphiprion clarkii) e de duas anémonas do mar (Hetera ctis malu ‘© Macrodactyla doreensis) que servem como seus hospedeiros. Amphiprion larkii 6 0 tinico peixe que € mutualis- ta com H. mialu, mas ele utiliza outras anémonas, incluindo M. doreensis. AS~ sim como os colibris e as flores mos- trados na Figura 4.27, mesmo os mu- tualistas relativamente préximos que sofreram co-evolucao podem ser capa~ zzes de trocar de parceiros e, portanto, ‘no necessariamente tém amplitudes coincidentes. (Dados nao publicados, cortesia de D. Dunn.) 90 - Capitulo 4 Figure 4.29 Amplitude geografica do candrio am: relo (Dendroica petechia). Esse passaro & amplamente distribuido em zonas tem- peradas da América do Norte, mas nos {r6picos ele é restrito aos mangues e ilhas costeiras. MacArthur (1972) sugeriu que a competicéo difusa de muitas espécies de paissaros insetfvoros em intimeros ha- bitats, nas terras tropicais da América & responsével pela distribuigao limitada do canério amarelo nos trépicos. Dendroica petechia [Populacio continental TB Mangue e populagao ilhéu (1989, 1991, 1993) sugere que em ambientes com estresse abidtico, assim ‘como os pantanos salobros e as zonas entremarés, as interagdes mutualisticas podem ter tanta influéncia na distribuigao © abundincia de uma espécie, quanto a competigao e a predacio. Nas Uiltimas décadas, estudos ecolégicos documentaram uma variedade de interagdes complexas envolvendo muitas espécies. Existe farta literatura sobie interagdes indiretas, sobre reagées em cadeia “bottom-up” e “top-down” em teias alimentares e sobre os efeitos ramificadores das “espécies-chave” (ex., Carpen- ter 1988; Schmitt 1987; Strauss 1991; Wootton 1992; Jones ¢ Lawton 1994). A grande maioria desses estudos utilizou experimentos manipulativos em peque- nas escalas de tempo e espago para demonstrar como interagdes complexas po- dem influenciar abundancias e outras caracteristicas ecoldgicas de uma espécie dentro de comunidades ecolégicas locais. Enquanto hé todas as razdes para se suspeitar que esses tipos de interagdes multiespecificas também influenciam a distribuigao e a diversidade de espécies em escalas geograficas, nao se tem uma documentagao rigorosa disso, Uma énfase maior em fenomenos de grande esca~ Jae em métodos nio experimentais devem conduzir a uma compreenséo melhor — das conseqiiéncias biogeogréficas dessas interagdes complexas. Ssimeros exemplos de tipos de fatores abidticos e bidticos que limitam Gmades geogrificas das espécies, ¢ apropriado agora delinear algumas gerais. Primeiro, uma observago: apesar de todos os exemplos pode nio ser produtivo buscar por fatores limitantes Ginicos ou simples para as distribuigdes geogréficas de muitas espécies. Nao ‘oma dada espécie pode ser limitada por diferentes fatores, em diferentes ‘sua amplitude, mas mesmo em uma érea Jocal, muitos fatores podem = de modos complexos para impedir a expansdo das populagies. essa complexidade, no entanto, existe uma sugestio de padrao, bas ‘secinente ao que foi dito acima: muitas espécies parecem estar limitadas “<= lado em um setor da amplitude pelo estresse abiético e no outro, por -Ses bioticas, Esse padrio é particularmente observado em estudos de dis- 20 longo de gradientes ambientais, como os dos organismos sésseis entremarés-e das plantas ao longo de gradientes continentais de tempe- ‘¢ umidade, Uma caracteristica interessante de muitos desses exemplos € “ee

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