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A. F. Oliveira - Uma Babá Perfeita
A. F. Oliveira - Uma Babá Perfeita
OLIVEIRA
Todos pensariam que minha vida é perfeita. CEO de uma renomada
empresa de construções, pai solteiro de duas lindas filhas, boa aparência e
uma mansão maravilhosa para chamar de lar.
Poucos sabiam que eu tinha um único arrependimento, e ele se chamava
Maria Luísa Avelar.
A mulher que um dia foi a dona do meu coração, mas que foi afastada de
mim por causa do destino.
Seis anos depois, ela retorna à minha vida, com um enorme problema nas
costas. Para ajudá-la, eu a contrato como babá das minhas filhas.
Só que algo me diz que esse reencontro não aconteceu por acaso e que
finalmente eu terei uma nova chance de consertar os erros do passado e
construir um novo futuro. Ao lado dela.
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS
Copyright© ANDREIA OLIVEIRA
Este e-book é uma obra de ficção. Embora possa ser feita referência a
eventos históricos reais ou locais existentes, os nomes, personagens, lugares e
incidentes são o produto da imaginação da autora ou são usados de forma
fictícia, e qualquer semelhança com pessoas reais, vivas ou mortas,
estabelecimentos comerciais, eventos, ou localidades é mera coincidência.
Lucas,
Peça perdão às meninas por mim, mas não pude ficar.
Patrícia não iria parar nunca de nos infernizar, e Catarina estava tão
chateada... Ouvi-la dizer que me odeia foi doloroso demais. Então é melhor
que eu vá enquanto ela ainda está com raiva do que iludi-la novamente e
partir seu coraçãozinho duas vezes.
Eu amo vocês.
Amo você. E não se preocupe com o que aconteceu no chalé.
Estávamos os dois de cabeça quente. Não vamos guardar mágoas, só boas
lembranças.
Até um dia, quem sabe.
Sua Malu.
Sua Malu.
De todas as partes do bilhete, esta foi que a mais me feriu. Porque ela
deveria ser minha. Há muito tempo. Só que nada acontecera como eu queria.
Amassei o papel, com raiva, começando a andar pelo quarto, checando
seu armário. Não havia mais nada lá.
Corri para o portão, falando com o segurança, que confirmou que ela
tinha partido há uma hora mais ou menos.
Se eu tivesse saído do quarto das crianças e ido falar com ela...
Mas não era hora de lamentar. Eu precisava agir. Enquanto Patrícia ainda
fosse uma pedra no nosso caminho, Malu não se tranquilizaria. Ela nunca
conseguiria ficar pra valer comigo se o preço fosse a insegurança da guarda
das minhas filhas. Não adiantava eu ir atrás dela, buscá-la e jogá-la nos meus
ombros como um homem das cavernas, porque seria errado. Se ela quis ir
embora, eu precisava deixar.
Depois de receber uma mensagem dizendo que ela estava bem, que tinha
chegado em um lugar seguro e pedindo que eu não a procurasse, não me
restava nada a fazer a não ser tentar consertar a situação toda antes de ir pedir
que voltasse.
Sendo assim fui ao meu escritório, decidido a fazer uma coisa muito
importante: telefonar para minha ex-esposa. Ela também iria ouvir umas
poucas e boas.
CAPÍTULO VINTE E CINCO
Os dois primeiros dias, eu tirei apenas para me lamentar. O que era
patético, é claro, mas apenas me entreguei ao ridículo e deixei as emoções
falarem mais alto.
Assim que saí da casa de Lucas, peguei um táxi e me enfiei em um
motelzinho de estrada barato e limpo. Não consegui dormir, jurando que ele
iria me achar.
O telefone, é claro, não parou de tocar. Lucas não descansou até que lhe
enviei uma mensagem avisando que estava bem, segura e pronta para dormir.
Embora eu certamente não fosse pegar no sono tão cedo. Se é que iria
conseguir em algum momento.
No terceiro dia, bem cedo pela manhã, peguei um ônibus para outra
cidade vizinha. Claro que não a mesma onde Jonas morava, porque não
estava nem um pouco a fim de esbarrar nele por acidente.
Hospedei-me em uma pousada com ares de pensão, bem baratinha,
simples, mas limpa e com uma senhorinha como dona. Como era baixa
temporada e estava vazia, nós fizemos companhia uma para a outra. Falei
com ela que precisava de um emprego só para me manter por algum tempo, e
ela me indicou para uma amiga que tinha uma pizzaria ali perto e que
precisava de garçonete.
O dinheiro que ganhei durante o tempo em que trabalhei para Lucas
estava praticamente intacto na minha conta, porque, morando em sua casa,
não tinha gastos, mas eu preferia que permanecesse assim. Guardar para
emergências – foi o que minha mãe sempre me ensinou.
Como a garota boba que era, com o passar dos dias, comecei a ficar
chateada por Lucas não ter sequer tentado me encontrar. Claro que ele
poderia estar fazendo isso na surdina, mas começava a acreditar que não o
faria. Eu conhecia bem o homem que amava, e ele jamais iria me forçar a
uma situação da qual eu fugi.
Só que minha fuga durou por pouco tempo, porque quase duas semanas
depois de minha partida, eu recebi uma visita na pousada, depois do
cansativo expediente na pizzaria.
Não era Lucas, no entanto.
A mulher elegante me esperava de pé, na sala de visitas, como se tivesse
medo de sujar a saia de seu terninho em alguma das cadeiras ou no sofá puído
que D. Margarida cuidava com tanto esmero.
Eu ainda estava vestindo meu uniforme, e poderia tê-lo trocado,
deixando-a esperando, mas fiz questão de aparecer em sua frente com a maior
prova de que eu era uma trabalhadora – coisa que aquela pessoa ali nunca
precisaria ser.
— Laura? — perguntei, esperando que meu tom de voz demonstrasse
toda a minha surpresa.
Ela se virou na minha direção, toda graciosa, e eu cheguei a sentir o
coração apertar pelo quanto Catarina era uma pequena cópia dela.
A filha da mãe era bonita como uma modelo. Daquelas que se vê em
passarelas, desfilando com lingeries Victoria's Secret.
Eu sabia que era bonita. Nunca poderia ser injusta com minha própria
genética, porque minha mãe era a mulher mais linda que já conheci, com ares
de Elizabeth Taylor, cabelos muito negros, olhos de um azul quase violeta.
Só que eu fazia mais o tipo princesinha Disney. Não havia nada em mim que
parecesse sexy ou que exalasse poder como havia em Laura.
Era fácil ver por que Lucas pensara com a cabeça de baixo ao olhar par a
ela.
Mas este era um pensamento que eu não queria nutrir.
— Oi, Malu. Será que podemos conversar? — Ao menos o tom de voz foi
educado.
O que será que ela estava fazendo ali? Eu já tinha saído da vida do ex-
marido dela, não tinha? Qual poderia ser o seu interesse? Pedir que não
voltasse?
— Claro. Quer se sentar?
Ela olhou para os assentos disponíveis com um pouco de asco, mas
acabou escolhendo uma cadeira e se acomodando na pontinha dela.
Também me sentei, à sua frente.
— Em que posso te ajudar? — Nunca fomos exatamente amigas, mas
tentei ser cordial.
— Na verdade, eu vim aqui te dar um recado. — Ah, pronto. Eu conhecia
o tipo de recado que aquelas mulheres gostavam de dar e não estava nem um
pouco interessada. Dependendo do que fosse, ela seria expulsa dali sem
remorsmo.
— Vá em frente.
Laura suspirou um pouco antes de começar:
— Eu queria que você soubesse que eu não tenho o menor interesse em
prejudicar Lucas e as meninas. Sei muito bem que sou uma péssima mãe e
nunca as obrigaria a ficar comigo tendo o pai maravilhoso que elas têm.
Aquilo me surpreendeu.
— Então acho que você precisa avisar isso à sua amiga.
— Patrícia não é mais minha amiga há um bom tempo. Ela só fala
comigo quando tem algum interesse. Comecei a receber um monte de e-mails
dela quando você passou a trabalhar como babá das crianças, e ela enchia a
minha cabeça todos os dias dizendo o quanto você era péssima e que tinha
medo de que maltratasse uma delas.
— O quê? — minha voz se alterou. Aquela mulher merecia um corretivo.
Pelo amor de Deus. E eu teria prazer em dar.
— No início eu me assustei, porque sabia que Lucas sempre foi
apaixonado por você e poderia estar cego, né? Mas aí eu liguei para Teresa, e
ela me falou o contrário. Lucas também foi bem direto ao contar tudo o que
estava acontecendo, mas eu não sabia. Naquele dia, quando liguei e falei com
Catarina, não tinha a intenção de causar um tumulto. Eu só perguntei a ela
sobre sua partida, mas não sabia que ela não estava ciente.
Engoli em seco me lembrando da forma como Catarina me tratou.
— O que você quer que eu faça, Laura? Patrícia está mancomunada com
seus pais. Não posso permitir que Lucas perda a guarda das crianças.
— E ele não vai. Estou do lado de vocês. Vim ao Brasil para resolver as
coisas. Se por acaso meus pais tentarem entrar na justiça, eu vou testemunhar
a favor de Lucas.
Ergui uma sobrancelha, observando-a, tentando decidir se estava ou não
falando a verdade.
— Como podemos confiar?
Ela deu de ombros.
— Eu preferia que vocês confiassem, mas Lucas me fez assinar um papel
abrindo mão da guarda das crianças de vez. Além do mais, ele poderia, se
quisesse, alegar abandono de lar, já que eu saí do país e fiquei fora por mais
de um ano. Seja como for, eu quero tentar ser mais participativa na vida das
minhas filhas, mas não quero ser mãe em tempo integral. Por mais que eu
ame as duas, do meu jeito, elas foram um acidente.
Como chamar aquelas duas princesinhas de acidente? Ainda assim, ela ao
menos estava sendo decente. Nem todas as mulheres nasciam com vocação
para serem mães.
Ainda assim, algo me incomodava.
— Ok. Posso lidar com isso. Mas antes de você sair de novo da vida delas
e ir viver a sua, preciso que tenha uma conversa de mãe para filha com
Catarina.
— Como assim? — Ela pareceu surpresa.
— Sua garotinha é de um talento extraordinário. Ela vai ser uma grande
desenhista ou pintora um dia, mas você destruiu os sonhos dela,
menosprezando tudo o que ela fazia. Enquanto estiver por aqui, vai conversar
com ela. Mesmo que não a ache um "Picasso", o que seria impossível para
uma criança de seis anos, vai fazer com que ela acredite que é maravilhosa.
Boquiaberta, Laura mostrou-se chocada.
— Tudo bem. Eu não fazia ideia... Mas vou resolver isso. Vou à mostra
de talentos dela no sábado, e você deveria ir também.
— Eu nunca pensei em não ir. — Só não precisava contar a Laura,
que eu planejava ficar escondida, apenas vendo a minha menininha brilhar.
Naquele momento, não sabia mais o que fazer.
— Ótimo. Estamos combinadas, então.
Fizemos uma pausa, e eu acrescentei:
— Só me diz uma coisa: como me achou?
— Ah, isso foi fácil. Evandro, amigo de Lucas, te viu na pizzaria onde
você trabalha. Meio que foi uma coincidência, mas bem providencial. Agora
conseguimos colocar as cartas na mesa.
Sim, era verdade, mas eu tinha mais uma coisa para fazer.
Foi no sábado, na manhã da mostra de talentos de Catarina, três dias
depois da minha conversa com Laura. Consegui o dia de folga na pizzaria,
depois de explicar tudo à minha patroa, que era uma santa.
Arrumei-me, ainda incerta sobre o que fazer em relação a revelar minha
presença na escola ou não. Ainda não sabia se a menina estava magoada
comigo, mas voltei para Montes Altos, deixando minhas coisas na
pousadinha e rumei direto para a casa de Patrícia.
Toquei a campainha, me anunciei e, milagrosamente, fui recebida.
Com um ar superior, aquele projeto de vadia veio na minha direção com
um sorrisinho de canto. Ela também estava bem arrumada, e eu imaginei
exatamente o que pretendia fazer.
— Ao quê devo a honra da sua visita, Maria Luísa? — falou com desdém.
Eu também sorri.
— Vim te trazer uma informação, e eu espero que você guarde muito bem
nessa sua cabeça vazia. — Ela ia dizer alguma coisa, mas ergui um dedo em
riste, interrompendo-a. Aproximei-me um pouco mais dela, como se
fôssemos duas lutadoras de MMA. Eu era alguns centímetros mais baixa, mas
não me intimidei. — Lucas é meu. Não importa o que você faça, de alguma
forma, nós sempre voltaremos um para o outro.
— Bem, se é isso que você vai escolher, temos um problema, bonitinha.
Você sabe muito bem o que eu pretendo fazer. — Seu ar de vitória me fez
alargar o sorriso.
— Você pode tentar — falei em tom de ameaça. — E vai dar com a cara
na porta, sua piranha manipuladora.
— Eu não vou permitir que fale assim comigo.
— E nem eu vou permitir que você me separe do homem que amo.
Menos ainda que tire as crianças dele. No final das contas, Patrícia, você não
vai ter o cara que você quer e ainda vai ter que aguentar vê-lo por aí com a...
neta da costureira.
Virei as costas, pronta para sair, quase satisfeita, mas ela brincou com
fogo:
— Aquela velha pobre e feia deve ter morrido é de desgosto.
Ela podia ter me chamado de qualquer coisa. Ofendido a mim.
Mas mexer com a minha família? Com minha vozinha falecida? Ela
despertou algo muito, muito ruim dentro do meu peito.
Girando de volta em sua direção, o tapa foi certeiro. Eu podia ser
pequena, mas minha mão era pesada.
— Sua...
Mal dei tempo para que a ofensa viesse, apenas lancei outro tapa na cara
dela – daquela vez fazendo-a cair no chão sem um pingo da elegância de
sempre.
Caiu como uma rã, com as pernas abertas e arqueadas, toda arreganhada.
Uma sensação de paz me tomou.
— Um último aviso. Se aparecer hoje na mostra de talentos de Catarina,
vai levar mais uns três desse. E um chute no meio dessas pernas. — Eu já ia
saindo, mas... Estava pronta para a treta, por isso, lancei mais um olhar para
ela. — Curioso que eu provavelmente também vou ficar bem dolorida esta
noite, porque Lucas vai me deixar assim. Ele... — Respirei fundo, quase
suspirando. — Ele tem uma pegada forte, sabe? Só de pensar eu já fico toda
excitada. Que bom que é a mim que ele ama.
Ela ficou resmungando ainda lá caída, mas nem a ouvi. Saí quase
saltitando, esperando que o que falei fosse verdade e que Lucas ainda
estivesse disposto a ficar comigo. Daquela vez para sempre.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
Uma coisinha trêmula e assustada aninhava-se em meus braços, ansiosa e
amedrontada. Catarina seria uma das próximas alunas da escola a entrar no
palco para apresentar seus desenhos – que a professora Janaína organizou em
slides, que ela mesma passaria, enquanto minha garotinha iria dissertar sobre
eles.
Eu queria poder protegê-la de seu próprio medo. Queria poder tirá-la dali
e desistir da história de mostra de talentos, só porque eu sabia que minha
filhinha estava apavorada. Sentia-me um péssimo pai por não poder fazer
nada. Mas se a convencesse a desistir, estaria mais errado ainda. Minha Cathy
merecia ter seu talento reconhecido.
Afastei-a um pouco de mim, olhando para seus olhinhos vidrados e
chorosos.
— Vai dar tudo certo, querida. Você é maravilhosa.
— Mas a Maria não está aqui — ela fungou. — Eu não vou conseguir
apresentar sem a Maria — lamentou como se aquele fosse o fim do mundo.
Ok, poderia não ser, mas eu também estava triste pela ausência. Não
apenas pelo fato de ela não ir à mostra – o que chegava a me deixar um pouco
decepcionado, porque jurava que ao menos pela minha filha ela teria essa
consideração –, mas por tudo.
Porra... eu sentia falta dela. De um jeito que me provocava uma dor física.
Eu ia da saudade à magoa em dois minutos. Era só entrar no quarto dela,
olhar para algumas de suas coisas que ainda estavam lá que meu coração se
apertava no peito de tal forma que eu poderia jurar que ele estava sendo
esmagado dentro de mãos firmes, ao ponto de explodir.
Só que, ao mesmo tempo, tentava me perguntar se o que sentíamos era
assim tão forte para ela. Se fosse, não teria voltado? Não estaria ali ao meu
lado, ao menos por minha filha? Laura fora falar com ela, e eu jurei que Malu
surgiria imediatamente, correndo para mim, e nós dois finalmente nos
entenderíamos.
A cena seria quase digna de um romance, mas eu a desejava. Clichê,
brega e melodramática – eu aceitaria tudo isso.
— O papai não serve? Sua irmã. Tetê. Até sua mãe veio — tentei animá-
la.
— Eu sei. Mas eu fui muito malvada com a Maria. Eu queria pedir
desculpa.
— Você vai poder, querida. — Nós dois iríamos poder pedir desculpas a
Malu, eu tinha certeza. Não era possível que nossas chances tivessem se
perdido.
Eu ainda estava agachado, falando com minha garotinha, quando a
professora dela se aproximou.
— Cathy, vamos? Você é a próxima.
Catarina travou, e eu quase tive vontade de não permitir que saísse dos
meus braços. Era muito doloroso para um pai ver sua princesinha chorando,
mesmo que fosse por uma coisa simples, nada grave. Queremos ser os super-
heróis de nossas filhas, queremos que nos vejam como seus protetores e que
nos busquem como refúgio sempre, só que, infelizmente, às vezes era
necessário soltá-las.
Minha menininha precisava brilhar.
A professora Janaína a levou pela mão, com toda a sua paciência, e eu
fiquei ali parado, apenas observando-a partir, olhando para mim por cima do
ombrinho.
— Ela vai ficar bem — a voz de Laura surgiu ao meu lado. Era
impressionante o quão distante era das filhas; como se fosse apenas uma
amiga da família.
— Sim, mas perguntou por Malu. Você foi mesmo falar com ela, não foi?
— Porque eu duvidava. De verdade. Mas tentei lhe dar um voto de confiança,
afinal, era a mãe da minha filha e tivemos uma história juntos.
— Não tenho motivos para mentir, Lucas.
Cruzei os braços contra o peito, ainda desconfiado, enquanto fazia um
sinal para Teresa se aproximar com Alice, porque eu queria encontrar um
lugar mais à frente.
Sentamo-nos na segunda fileira, aguardando durante a apresentação de
bateria de um garotinho de uma série acima de Catarina. Ele era bom, e eu
sorri, imaginando que seria legal, um dia, ter um menino, embora eu estivesse
mais do que feliz com minhas duas garotinhas.
Mas com Malu...
Afastei o pensamento antes de ele se manifestar.
Quando Catarina foi anunciada, minha linda menina entrou no palco
como um bichinho do mato. A professora a ajudou a passar os slides, e ela
explicou seus dois primeiros desenhos como tínhamos ensaiado naquela
última semana.
Já estávamos chegando no terceiro quando Cathy simplesmente perdeu
seu olhar na porta do auditório, ficando em silêncio. Olhei para o local para
onde ela estava olhando e vi Malu.
Linda, com um vestido azul, delicado, e ela enviava um beijo para a
menina no palco, depois fazia um gesto incentivando-a a continuar.
Então os olhos de Malu se encontraram com os meus.
Eu a vi respirar profundamente, ainda parada, enquanto Catarina voltava a
relatar sobre cada desenho. A vozinha da minha filha soava ao fundo, mais
animada, enquanto Malu começava a caminhar na minha direção.
Havia uma cadeira vaga ao meu lado, onde ela se sentou sem dizer nada.
Demorou alguns segundos para se voltar para mim, olhos nos olhos, tão perto
que precisaríamos nos aproximar muito pouco para nos beijarmos.
— Oi — ela sussurrou, com aquele jeito meigo e doce que me
desmontava.
— Oi — respondi, sentindo-me atordoado com sua presença.
Fazia uns bons dias que não nos víamos, e era ridículo pensar que ela
parecia ainda mais bonita do que na última vez.
Malu virou-se para o palco, para olhar para a minha filha, que continuava
sua apresentação muito mais confiante.
O último desenho de sua pequena exposição era o que fizera na escola, no
dia em que a professora Janaína falara com Malu. Éramos nós.
Durante aquelas duas semanas desde a partida de Malu, conversei com
minhas filhas e contei a elas nossa história. Falei sobre como nos
apaixonamos no passado, mas sem mencionar que a chegada de Catarina
atrapalhara nossos planos. Apenas falei que nós nos separamos por
circunstâncias da vida. Ambas ficaram encantadas, e Cathy disse que era
quase um conto de fadas; a história perfeita de A Noviça Rebelde, que só
faltava Malu voltar como a Maria voltara para a família Von Trapp.
As duas já sabiam que, caso isso acontecesse, o papai delas tinha
interesse em namorar sua babá. Nada poderia tê-las deixado mais felizes.
Só que Malu não voltou, como elas acharam que aconteceria, e Cathy
começou a se culpar. Naquele momento, sobre o palco, minha menininha
sorria como se tivesse ganhado um maravilhoso presente de Natal.
Tínhamos ensaiado algumas coisas para ela dizer a respeito do desenho
que era mostrado naquele momento, mas Catarina apenas olhou para mim e
para Malu, soltando:
— E esta aqui é a minha família.
Sim. Aquela era a nossa família.
Ou eu esperava que se tornasse muito em breve.
Todos nós a aplaudimos – eu, Malu, Laura, Tetê e até Alice, de pé, é
claro – e deixamos que Janaína a trouxesse até nós.
No momento em que se aproximou, a pequena se jogou nos braços de
Malu, que a ergueu do chão em seu colo. A cabecinha de cabelos claros
encostou-se em seu ombro chorando de soluçar. Ao lado delas, eu podia
ouvi-la:
— Eu pensei que você nunca mais ia voltar — Cathy falou, com a voz
embargada.
— Eu não perderia isso aqui por nada — Malu também estava
emocionada.
Catarina se afastou um pouco, para olhar Malu nos olhos.
— Quando eu disse que te odiava, eu não estava falando sério, tá? Eu te
amo, Maria. Muito.
Vi Malu vacilar um pouco, e seus lindos olhos azuis se encheram de
lágrimas.
— Eu também te amo, Tatá. Você e a Lili.
Ouvindo seu apelido, Alice caminhou em direção à sua babá, agarrando-a
pela perna.
Deixei-as ali por um tempo, mas foi Laura quem as interrompeu.
— Sabe o que eu acho, meninas? — ela falou por cima de todos. Como
Catarina fora a última a se apresentar, todo o auditório estava um falatório,
mas minha ex-esposa sabia se fazer ouvir. — Que a mamãe aqui poderia
levar vocês duas e a Teresa para almoçarem e passarmos a tarde no shopping
para que o papai e a Malu possam conversar, o que acham?
As meninas não pareciam querer largar Malu, mas Cathy logo assentiu.
Alice resmungou um pouco, mas depois de ser colocada no chão, a mais
velha falou algo no ouvido da menorzinha, que concordou rapidamente.
— Obrigado — sussurrei para Laura, que deu uma piscadinha para mim.
Ela levou Catarina pela mão, enquanto Tetê pegava Alice no colo, e as
duas meninas deram tchauzinho para nós.
Quando estávamos sozinhos em meio às outras pessoas da escola,
olhamos um para o outro, um pouco desconfortáveis, mas eu esperava que
essa sensação logo passasse. Precisávamos conversar, mas eu também
precisava beijá-la. Precisava aplacar a saudade que estava sentindo.
— Enfim sós — brinquei.
— Olha, Lucas, eu... — ela ia começar, mas eu a impedi, erguendo a
mão.
— Vamos para casa antes? Lá poderemos conversar com mais
privacidade.
Malu assentiu, e eu coloquei a mão em suas costas para guiá-la até a
saída, só por causa da necessidade que sentia de tocá-la.
Esperava que as coisas se resolvessem, porque eu não iria aguentar nem
mais um dia sem ela na minha vida.
CAPÍTULO VINTE E SETE
Era estranho pensar naquela casa vazia, sem as crianças e sem Teresa. O
silêncio não combinava com ela, por isso o bater da porta, quando Lucas a
fechou, trancando-a, quase me sobressaltou.
Sentia-me nervosa, porque não fazia ideia de como se daria a conversa
que eu sabia que precisávamos ter, mas esperava que Lucas me ouvisse e
compreendesse meus motivos. Nós dois tínhamos errado. Nós dois tínhamos
razão em muitas coisas também. O que precisávamos era externar nossos
sentimentos e deixá-los tomarem as rédeas.
Voltei-me para ele quando entramos, girando meu corpo, porque estava
atrás de mim, e testemunhei o olhar mais intenso que alguém poderia me
lançar. Um olhar que me dizia tudo e nada; que me fazia questionar o que
aconteceria dali em diante.
— Lucas, eu... — tentei começar a falar, mas ele levou um dedo
gentilmente à minha boca, me calando.
— Não diga nada.
— Mas eu preciso me explicar. Preciso que entenda que...
Um braço possessivo enlaçou minha cintura.
— Eu não preciso ouvir explicação alguma. Você precisa que eu me
explique? — Ao dizer isso, puxou-me mais para si, deixando nossos peitos
colados.
— Não. De jeito nenhum. — Arfei.
— Então vamos considerar assunto encerrado? — Lucas inclinou a
cabeça, aproximando nossos lábios.
— Por mim tudo bem.
— Ótima discussão, senhorita.
Sua boca tomou a minha sem sequer me preparar para a intensidade que o
beijo tomaria. Lucas não começou lento ou delicado; ele abriu meus lábios
num rompante, invadindo-os, fazendo com que sua língua acariciasse a
minha sem pudores, sem hesitações. Era um beijo de retorno, um beijo de
reconquista, de tesão, desejo, amor e esperança – de que a partir daquele
momento as coisas finalmente se acertariam.
Nossos suspiros se entrelaçaram assim como nossas respirações, enquanto
Lucas tirava meu vestido por cima da minha cabeça. Tirou sua blusa também,
exibindo todo aquele peitoral musculoso só para me tentar mais ainda. Fui
erguida do chão com o mesmo movimento súbito com que fui beijada, e ele
entrelaçou minhas pernas em sua cintura, prendendo-as ali e me levando até a
parede mais próxima, onde amparou-me. Uma mão sorrateira se esgueirou
por entre nossos corpos, pelo ínfimo espaço que os separava, e ele encontrou
meu clitóris, massageando-o. Começou gentil, apenas testando, mas seu outro
braço, que se mantinha sob a minha bunda, sustentando-me, ergueu-me um
pouco mais alto, para lhe dar espaço para me penetrar e me masturbar.
Naquele momento eu agradeci por estarmos sozinhos em casa, afinal, o
grito que eu dei quando Lucas encontrou o ponto mais sensível dentro de
mim deve ter ecoado por toda a propriedade.
Agarrei-me a ele com braços e pernas firmes, lutando contra a onda de
entorpecimento que o prazer me causava, mas minha cabeça tombou em seu
ombro, enquanto meus dentes mordiam sua carne, sem nem ter medo de
machucá-lo. Para ser sincera, isso pareceu deixá-lo mais excitado, porque
intensificou seus movimentos – mais fundo, mais forte –, sem parar, sem
piedade, até que eu gozei.
Lucas não me colocou no chão, no entanto. Ele me carregou naquela
posição até a mesa de jantar, deitando-me sobre ela e me puxando para a
beirada. Tirou minha calcinha e abriu minhas pernas ao máximo, sem dizer
absolutamente nada, então caiu de boca na minha boceta molhada, que ainda
latejava e se recuperava do orgasmo anterior.
— Lucas... você está querendo me matar hoje? — arfei, quase em
desespero, porque sua língua já começava a circundar meu clitóris, com a
pontinha, de forma torturante.
— Não, Girassol. Quero te dar um orgasmo por cada um dos dias que
ficamos separados.
Claro que ele estava brincando, mas o filho da mãe se empenhou.
Chupou-me com vontade, em todos os pontos certos, usando a língua para
me penetrar, deslizando-a por minha extensão lubrificada como um
explorador sedento. Ele não apenas estava fazendo o melhor sexo oral que já
experimentei porque queria me dar prazer, Lucas parecia ansioso por me
provar, como se o meu gosto fosse a iguaria mais deliciosa para aquela tarde.
Apertava meus quadris com suas mãos enormes, como se também não
conseguisse se controlar em me tocar. Como se precisasse afundar os dedos
na minha carne para saber que eu era real.
Nutrindo o mesmo sentimento, afundei minhas unhas em seus ombros
musculosos, sentindo a rigidez e a tensão. Com a outra mão agarrei os fios
sedosos de seus cabelos, tentando trazê-lo mais para mim, porque estava
prestes a gozar novamente.
Quando o orgasmo chegou, este me pegou de jeito, deixando-me quase
sem movimentos, desfalecida sobre a mesa.
Não satisfeito, ele deixou minha boceta e começou a deslizar beijos pela
minha coxa, subindo, chegando à minha barriga, até os seios, afastando o
sutiã. Enquanto eu me recuperava, ele tomou um mamilo na boca, sugando-o,
fazendo-me soltar um gemido fraco, que era tudo o que eu tinha forças para
fazer.
Tomou o outro, imitando o movimento, provando-o da mesma forma
como me dera o sexo oral. Sem me privar de nenhum instante de prazer.
Assim que se deu por satisfeito, ele me tirou da mesa, pegando-me no
colo como uma noiva e me levando escadas acima, para seu quarto.
Fui deitada sobre sua cama, mas ele rapidamente me virou de barriga para
baixo, e eu senti sua língua traçando um caminho de baixo para cima, desde
meu cóx até meu pescoço, onde ele chupou com força, o que eu sabia que
deixaria uma marca.
Olhando por cima do ombro, vi quando se afastou para terminar de
despir-se também.
Içando meus quadris da cama, ele me deixou de quatro. Esticou a mão
para a mesinha de cabeceira, pegou uma camisinha, colocando-a em si
mesmo e me penetrou, bem devagar, encaixando-se como se fôssemos duas
peças perfeitas.
Uma perfeição, uma sintonia, que eu sabia que nunca encontraria com
mais ninguém.
— Porra, Malu... — praticamente rosnou, ofegante e com a voz mais sexy
que eu já tinha ouvido.
O som de nossos corpos batendo um no outro, de seus grunhidos, a
sensação pele com pele, as mãos de Lucas me puxando com força, enquanto
investia e literalmente me fodia como um louco... tudo estava culminando
para me levar à loucura. Eu o sentia grande dentro de mim, pulsando,
estocando, tomando-me por inteiro.
Meu corpo já pertencia a ele, assim como meu coração. Não havia palavra
no mundo que pudesse denominar a plenitude de se estar com quem amava,
de ser amada por alguém que era o início e o fim de tudo.
Nós dois chegamos ao orgasmo – eu primeiro, e ele um pouco depois –, e
eu me lancei na cama, de barriga para baixo. Lucas, ao meu lado, me puxou
para si, fazendo-me deitar em seu peito.
— Eu quero dizer uma coisa aqui e agora. Não vou mais permitir que
nada, absolutamente nada, nos afaste. Está ouvindo, Girassol? — ele falou
com uma voz decidida, e eu consegui apenas assentir, balançando a cabeça
contra seu peito. — Acho que deveríamos nos casar.
Daquela vez eu consegui erguer a cabeça, olhando para ele com olhos
arregalados.
— O que... o que está dizendo? Casar de casar mesmo? Aliança, igreja...
— E tudo o mais que você quiser.
Continuei muito chocada.
— Não é um pouco repentino? — a pergunta escapou, mesmo que não
fosse minha intenção dizê-la em volta alta.
— Levando em consideração que nos amamos há mais de seis anos, acho
que estamos até atrasados nessa conversa. Eu deveria ter mencionado quando
nos encontramos naquele bar. Algo tipo: “Oi, Malu, quanto tempo não te
vejo! O que acha de nos casarmos?”. — Não pude conter uma risada, que
explodiu do meu peito e me obrigou a me apertar ainda mais contra ele.
Que sensação boa.
— Eu com certeza teria aceitado — brinquei.
— Que idiota eu fui!
Lucas inclinou-se para me beijar, e eu também me estiquei, encontrando
sua boca, mas também o olhar mais doce e terno que um homem poderia
dedicar a uma mulher.
— Eu te amo. Você sabe disso, não sabe? — Assenti. — Eu teria te
amado em silêncio para sempre, mesmo se você nunca mais tivesse voltado
para a minha vida. Acredita em mim?
Suspirei bem fundo, buscando ar suficiente para responder.
— Sim. Acredito, porque me sinto da mesma forma. Nunca deixei de te
amar. E nunca vou deixar.
Ao ouvir isso, Lucas me girou na cama, colocando-me deitada de costas,
avolumando-se sobre mim para mais um beijo.
E eu me vi pronta para ele mais uma vez, como sabia que sempre estaria.
CAPÍTULO VINTE E OITO
MESES DEPOIS
Foi uma jornada e tanto. Sete anos desde que nos conhecemos até
chegarmos àquele ponto. Relacionamentos diferentes, pessoas em nossas
vidas, duas filhas na minha. Se qualquer um de nós parasse para escrever
nossa história, para que alguém pudesse ler, ela seria quase como um conto
de fadas, não?
Ou algo, de fato, como A Noviça Rebelde.
Depois de um pedido formal, com direito a alianças e às meninas me
ajudando com suas carinhas pidonas, lá estávamos. Eu no altar, observando a
mulher da minha vida entrar na igreja, com minhas duas filhas à sua frente,
espalhando pétalas de girassóis pelo chão, com a música Edelweiss tocando
ao fundo.
Minha linda noiva sorria radiante, iluminando tudo ao seu redor, e ela
estava tão linda, com seu vestido tomara que caia, simples, com um laço
delicado sob os seios, rendas e um véu apenas do tamanho de seus cabelos,
com uma tiara prateada, que eu não consegui não me emocionar.
Entrava sozinha, caminhando lentamente, e eu contava cada passo como
um a menos para ter a mulher da minha vida como minha esposa.
No momento em que ela surgiu, bem à minha frente, minha vontade foi
de pegá-la no colo e fugir, só para podermos ficar sozinhos. Para eu poder
tirar aquele vestido e beijá-la dos pés à cabeça.
Controle-se, Lucas, você não é um adolescente cheio de hormônios.
Beijei-a na testa, em sinal de carinho, e nos voltamos para o padre, que
começou a cerimônia.
Ele disse belas palavras, estimando nossa fidelidade e o respeito, e no
momento em que anunciou que Malu era minha esposa, finalmente, e que eu
poderia beijá-la – mais finalmente ainda –, agarrei-a pela cintura, tirando-a do
chão e a beijei enquanto a girava, ouvindo os aplausos de todos ao nosso
redor.
— Minha esposa. Enfim pertencemos um ao outro — sussurrei para ela,
sentindo o peso de cada uma daquelas palavras. Cada uma valia por um dos
anos que ficamos separados.
A festa foi bem íntima, apenas para os amigos mais chegados, e eu passei
boa parte dela na pista, dançando com minha esposa e minhas meninas. Não
me importava com os convidados; aquelas três eram o centro do meu mundo.
Fui praticamente arrastado para a mesa de jantar, onde me acomodei com
minha mulher ao lado e minhas duas meninas. Antes de começarmos, eu me
levantei e bati com a faca na taça, pedindo alguns instantes para que me
ouvissem.
Eu tinha mesmo algumas coisas a dizer.
Olhei para a minha esposa, que me observava, com um sorriso enorme no
rosto. Linda. Mais bonita ainda por parecer feliz. Era assim que eu queria
mantê-la.
— Gostaria de agradecer a presença de todos. Qualquer homem
apaixonado diria que o dia de seu casamento é um momento especial, mas,
para mim, o gosto dessa vitória é um pouco mais doce, porque ela é almejada
há muito tempo. — Respirei fundo, tentando conter a emoção. — Há sete
anos eu conheci uma garota linda. Éramos jovens demais, mas o sentimento
que nos possuiu era forte o bastante para sobreviver a vários tipos de
obstáculos. O destino nos separou, mas nos uniu novamente. E hoje estamos
aqui, celebrando essa batalha vencida e prontos para todas as outras que
vierem. — Olhei para ela, que estava com os olhos cheios de lágrimas. — A
nós e à nossa família.
Todos ergueram suas taças, e Malu se levantou, me beijando, selando
uma promessa de que aquele era apenas o início de nossas vidas.
Jantamos, voltamos a dançar e os convidados foram lentamente se
dispersando.
Teresa e as pessoas que contratamos para trabalhar em todo o evento
ajudaram a organizar as coisas, e Malu me avisou que tinha uma surpresa
para mim, que eu poderia apenas subir para trocar de roupa, mas que deveria
retornar ao quintal depois.
Assim o fiz. Vesti uma camiseta e uma calça de moletom, sendo
praticamente empurrado por Catarina e Alice, ambas muito animadas.
Quando cheguei ao quintal da casa, Malu não estava à vista, mas eu a
senti chegar, e uma venda foi colocada nos meus olhos.
— O que é isso? — perguntei divertido, imaginando que seria alguma
brincadeira entre nós quatro.
— Vamos lá, Lucas... vamos brincar de cabra cega. Quem você for
pegando, você pode tirar a venda e ver a mensagem que tem para te passar —
Malu explicou, e eu comecei a ficar confuso.
Que mensagem?
Mas tudo bem... decidi entrar no clima.
Eu seguia direções de sons, de passinhos, de risadinhas abafadas, mas
elas escapavam de mim no último minuto. Estavam empenhadas em dificultar
as coisas, mas eu nem me importava. Era um momento de alegria com
minhas meninas, e eu estava mais feliz do que poderia expressar.
A primeira que peguei foi Alice. Apesar de ser menorzinha, com seus três
anos, ela ainda tinha os passinhos mais desengonçados, então consegui
segurar seu bracinho.
Assim como Malu orientou, eu tirei a venda. As outras duas se
esconderam, mas minha pequenininha abriu um papel A4, onde estava
escrito: VOCÊ VAI.
— Eu vou o quê?
Ela encolheu os ombrinhos e saiu correndo.
Bem... só me restava entrar novamente no jogo recolocando a venda.
Foram precisos mais alguns breves minutos para que eu conseguisse
alcançar Catarina.
Repeti o movimento, tirando a venda e me deparando com mais uma
parte da mensagem: SER.
— Você vai ser? Mas o que vocês estão aprontando, hein? — indaguei já
ansioso, mas totalmente alheio ao que estava acontecendo.
Pela terceira vez coloquei a venda, mas não demorei a colidir com um
corpo curvilíneo, delicado, que minhas mãos conheciam tão bem. O cheiro de
Malu me invadiu, e eu sorri enquanto tirava a venda.
Mas não estava preparado para o que vi em suas mãos. Seu papel dizia:
PAPAI NOVAMENTE.
VOCÊ VAI SER PAPAI NOVAMENTE.
Esta era a mensagem.
— O quê? Isso é sério? — perguntei para Malu.
— Muito, muito sério. Descobri alguns dias antes do casamento, mas
queria criar algo especial para te contar.
Especial? Aquilo foi lindo, mágico.
— Ah, meu Deus! — Agarrei Malu, da mesma forma como fiz no
casamento, tirando-a do chão e beijando-a. — Obrigado, obrigado! —
sussurrei para ela, e enquanto a girava, completamente incapaz de colocá-la
no chão, Alice e Catarina surgiram, cada uma abraçando uma das minhas
pernas, também comemorando a chegada de mais um membro da família.
Mais um filho. Ou filha.
Mais uma criança para alegrar aquela casa, correr pelo quintal... mais um
serzinho a quem eu queria que educar, proteger e amar. Alguém gerado com
a mulher da minha vida.
Que presente!
Enquanto eu abraçava minhas meninas, tocando a barriga de Malu e
ajoelhando-me para beijá-la, depois de colocá-la no chão, algo dentro de mim
se agitava com uma emoção nunca sentida.
A vida era perfeita, e seria mais ainda a partir daquele momento.
EPÍLOGO
QUINZE ANOS DEPOIS
FIM