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A Sociologia Economica Philippe Steiner
A Sociologia Economica Philippe Steiner
A Sociologia
Econômica
Tradução
Maria Helena C. V. Trylinski
SÃO PAULO
EDITORA ATLAS S.A. - 2006
© 2005 by EDITORA ATLAS S.A.
Steiner, Philippe
A sociologia econômica / Philippe Steiner; tradução Maria Helena C. V.
Trylinski. - São Paulo: Atlas, 2006.
06-2344 CDD-306.3
Conclusão, 119
Referências, 123
Apresentação à
Edição Brasileira
mercados são estruturas sociais, então eles devem ser estudados com
base nas particularidades históricas e sociais que regem seu funciona
mento. Não existe uma categoria abstrata, mágica, opressiva ou eman-
cipadora chamada “o mercado”: o que existe são mercados, construídos
com base na tentativa permanente de seus protagonistas de estabilizar
suas relações uns com os outros. E é exatamente pelo fato de os mer
cados serem tributários das relações sociais e das regulações públicas
que eles não estão acima da vida da sociedade e de seus preceitos e
exigências éticas. Esta abordagem abre um caminho muito promissor
para a compreensão crítica de temas contemporâneos como a respon
sabilidade social, os mercados solidários e o comportamento ambiental
das empresas.
Uma última observação, mas não menos importante. Além da Eco
nomia, a Sociologia Econômica oferece um aparato crítico, teórico e
conceituai que permite subsidiar outras áreas das Ciências Sociais. Re-
ferimo-nos especialmente à Sociologia do Trabalho e Sindicalismo, So
ciologia das Organizações e Estudos Organizacionais e, em particular,
à teoria institucional. Autores como Paul DiMaggio, Walter Powell, Ni-
tin Nohria, dentre outros, que trabalham com temas tais como firmas,
cultura e organizações etc., vêm construindo um frutífero campo de
intersecção entre a área de organizações e Sociologia Econômica. Por
isso, este livro pode ser de grande interesse também para o aluno de
Administração de Empresas.
Assim, esperamos que os alunos dos cursos de Ciências Sociais,
Economia e Administração de Empresas, tanto da graduação quanto
da pós-graduação, possam tomar este livro como referência básica e
fundamental para a compreensão de questões “de ponta” nas Ciências
Sociais hoje.
sável para que se consiga conferir à nova teoria econômica o lugar que
lhe cabe e se consiga garantir o reconhecimento integral de seu saber.
Foi pequena a influência de Pareto: a sociologia econômica, enquanto
combinação abrangente da economia e da sociologia, não teve segui
mento no século XX.
(V
Halbwachs (1873-1945) ocupam posição de primeiro plano, a forte in
satisfação que experimentavam frente ao método seguido pela econo
mia política funcionou como ponto de partida para suas reflexões sobre
ele; sua crítica a esse método era proporcional à sua insatisfação. Se
não sugeriam, como Augusto Comte acabara de propugnar, uma elimi
nação pura e simples da teoria econômica, eles trabalhavam para refa
zer este saber: a sociologia econômica ou economia positivista deveria,
nesse caso, substituir a economia.
Simiand fustiga os economistas porque eles rompem a démarche
positivista do conhecimento ao colocar o comportamento racional do
homo oeconomicus no ponto de partida de suas reflexões. A teoria eco
nômica, afirma ele, estuda os “possíveis” e não os próprios fatos, isto é,
ela estuda o que os homens deveríam fazer se fossem racionais, como
se supõe que eles sejam, para, em seguida, elaborar teorias capazes de
dar conta dos fatos observáveis. O aspecto metodológico da crítica não
nos interessa aqui, o que nos interessa é salientar que Simiand vê com
grande clareza um ponto essencial nesse caso: a economia pura escolhe
como objeto o estudo das conséqüências do comportamento egoísta ra
cional, ela se encarrega da descrição das diversas formas e conseqüên-
cias desse comportamento sem se preocupar com o meio social, históri
co, no qual esse comportamento se desenrola. A sociologia econômica
não age dessa forma: ela realiza pesquisas históricas e sociológicas pre
cisas para demonstrar que o comportamento egoísta, associado a outras
formas de comportamento, varia conforme o contexto histórico e social
para produzir tal ou tal resultado.
Em seguida a Durkheim, que define os fatos sociais como “maneiras
de agir, de pensar e de sentir externas aos indivíduos, mas possuidoras
de um poder de coerção sobre ele” (DURKHEIN, 1895, p. 5), Simiand
considera que a sociologia econômica parte das instituições e das repre
sentações sociais dos agentes para estudar os comportamentos econô
micos. Assim, ele estabelece quatro modalidades de ação egoísta, ações
que visam, por ordem de importância, manter o ganho nominal, manter
o esforço, aumentar o ganho, diminuir o esforço. Quando os preços so
bem , os agentes vêem seus rendimentos nominais subirem (em primei
Da antiga à nova sociologia econômica 11
somente mais tarde usufruirão. Posto isto, diz Weber (1921, p. 97):
“O sociólogo gostaria então de saber em que ato humano se traduz
essa pretensa relação e como os agentes econômicos podem computar
as conseqüências desta avaliação diferencial na forma de ‘juros’. Neste
caso, a sociologia econômica procura as relações sociais nas quais se
encontra concretamente expresso tudo o que as análises abstratas do
comportamento egoísta desenvolvidas pelos economistas pressupõem.
Esta concepção foi retomada por Joseph Schumpeter (1883-1950),
para quem a sociologia econômica dedica-se ao estudo do quadro insti
tucional no interior do qual se desenrolam as ações econômicas. Assim,
uma história estilizada ou ideal típica pode tomar-se o suporte da teoria
econômica por meio da sociologia econômica. Weber (1904, p. 153)
propõe três vertentes de trabalho: (1) análise da estrutura das relações
socioeconômicas presentes nos fenômenos; (2) análise da formação his
tórica dessas relações; (3) análise de sua significação cultural. Aí encon
tramos a origem das três dimensões (analítica, histórica e cognitiva) da
sociologia econômica contemporânea. Esta tripartição heurística será,
algumas vezes, utilizada para apresentar a sociologia econômica con
temporânea (ver Gap. 2, Quadro 2). Não obstante isso, a análise própria
à sociologia econômica, ontem como hoje, exige que se enfatizem as
instituições e as ações econômicas.
; Richesse des nations (1776). Este último não tinha uma idéia acanhada
da divisão do trabalho, pois, embora valorizasse os aspectos produtivis-
tas e utilitários das trocas, Smith a eles associava considerações morais
(por mais desigual que seja a sociedade mercantil, ela deve melhorar a
situação de todos, mesmo dos mais pobres), geo-históricas (a sociedade
mercantil ou o mercado como um todo aproxima o conjunto das re
giões acessíveis por meio de transporte marítimo ou fluvial, em con
traste com as regiões interiores) e políticas (a troca generalizada, que
os indivíduos com alguma especialidade devem considerar inevitável,
liberta estes últimos dos constrangimentos políticos feudais). Smith
também levava em consideração aspectos sociais da divisão do trabalho
quando ensina que, como a multiplicação dos bens produzidos por in
divíduos especializados não lograva mais satisfazer ao conjunto de suas
necessidades, não era mais possível fazer circular os bens por meio de
relações políticas (redistribuição das riquezas coletadas pelo poder polí
tico) ou afetivas (alocação dos bens no seio da família). Uma vez que a
divisão do trabalho tornou-se maior, os indivíduos não conseguem tra
var relações políticas ou afetivas suficientes para se munir de todos os
bens de que querem dispor, pois tais relações demandam muito tempo
para ser estabelecidas. Conseqüentemente, a troca comercial, afetiva e
politicamente neutra revela-se fundonalmente adequada à circulação
de riquezas produzidas em maior quantidade em decorrência da divisão
do trabalho.
A seguir, afirma Durkheim, autores como Herbert Spencer propu
seram uma visão da sociedade fundada no modelo da troca. A troca
seria um contrato livremente negociado entre as partes e as obrigações
sociais não seriam mais do que conseqüência desses acordos livremente
estabelecidos entre os agentes. Durkheim rejeita esta explicação, recor
rendo a um argumento socioeconômico similar ao de Smith. Levando
a tese de Spencer ao limite, Durkheim demonstra facilmente sua na
tureza defeituosa. Suponhamos que o vínculo social seja semelhante à
relação econômica livremente entabulada entre as partes contratantes:
a multiplicação das trocas exige que cada indivíduo negocie sem parar
tanto as transações cujo resultado é imediato como as transações cujos
resultados se estendem por um longo período de tempo (empréstimo
16 A Sociologia Econômica • Steiner
Freqüência 0 .
baixa Alta
Montante
Vestuário Alimentação
Fraco "Incerteza quanto à qualidade: "Naturalidade do
não ser muito enganado" preço corrente"
Moradia
Forte "Pagamento sempre muito alto, *
mas não ilegítimo"
* Essa tipologia das despesas da classe operária não contempla despesas altas
freqüentes.
2 0 A Sociologia Econômica • Steiner
quer dizer ilógico: uma ação não lógica pode ser o que de melhor se pode
fazer em uma época específica com os conhecimentos que então se tem. As
ações sem objetivo subjetivo são extremamente raras; Pareto, nesse ponto,
vai ao encontro da opinião de Weber, para quem as ações sem propósitos
objetivos são mais numerosas do que as outras (a magia é um exemplo disso:
os encantamentos não farão chover). 0 caso mais interessante a respeito des
se assunto é o de uma ação na qual os dois propósitos, subjetivo e objetivo,
existem, mas não tendem ao mesmo fim. Mais abaixo veremos um exemplo
muito importante disso quando enfocarmos a ação do empreendedor em
situação de concorrência perfeita.
O caso do empreendedor
0 imperialismo econômico
Por este termo, designa-se a estratégia de investigação que considera a
teoria econômica como a "gramática gerai" da ação humana, como o modelo
imprescindível a qualquer teorização em ciências sociais (LAZEAR, 2000). A
razão invocada para isso, simples e poderosa, é que a ação é sempre uma
alocação de meios escassos (o tempo é sempre limitado) a possibilidades di
versas; em resumo, a ação é olhada de acordo com o modelo da ação racional
instrumental, que está na base da teoria econômica. Os estudiosos mais ex
tremados, como Ludwig von Mises (1929, p. 23-35), chegam mesmo a negar
a existência da ação irracional já que bastaria conhecer as representações do
agente "irracional" para constatar que o que nos parece loucura a ele parece
uma ação racional.
Valendo-se desse princípio, a partir dos anos 70 a análise econômica es
tendeu-se a um grande número de fenômenos não econômicos e ocupou um
lugar, agora bem consolidado, tanto em ciências políticas, em demografia,
quanto em sociologia (a Rational Choice Sociology desenvolvida em torno de
James S. Coleman).
Esse termo possui ainda um outro sentido quando com ele se designa não
mais uma prática científica, mas uma representação social na qual os pro
blemas humanos, sociais, políticos são encarados em termos essencialmente
econômicos. É o que usualmente é chamado de "economicismo". Não se
trata mais da prática e das representações de um mundo acadêmico, mas de
representações, se não comuns, pelo menos amplamente difundidas, de uma
forma central do imaginário moderno, escolhido como problema e como ob
jeto de reflexão (LEBARON, 2000), que exige, como veremos adiante, uma
sociologia do conhecimento econômico.
Abstrações úteis...
Formas de inserção/
Tipos de questão Origem Significação
Funcionamento
que concernem às Histórica Cultural
relações mercantis
Estrutural Setor de eletri Mercado de trabalho -
cidade Mercado financeiro
Cultural Seguro de vida, - Seguro de
filhos, heranças vida
Política Estratégias Terceiro setor Doação de
industriais órgãos
Cognitivo Formas de Dispositivos de
racionalização enquadramento e de
cálculo
A sociologia econômica do mercado 4 3
A d é m a rc h e da sociologia econômica
SOCIOLOGIA ECONÔMICA
Esfera Relações
econômica profissionais
í Volume do \
l emprego comercial J
Qualidade do s e rv iç o ^ n. Produtividade
Forma da Organização
concorrência industrial
diferentes após tal trabalho. É neste ponto que se pode analisar melhor
a opinião de que o interesse econômico não é nem um fato natural, nem
um fato definitivo, nem um recurso que pode ser utilizado com facili
dade. 0 que se espera dos indivíduos é que eles raciocinem em termos
de índices novos (índices que Schiller propõe criar), como, nos dias
de hoje, são muitos os indivíduos capazes de raciocinar e considerar
evidentes índices, como o índice de preços ou os índices dos valores na
Bolsa, ou seja, capazes de considerar aceitáveis formas novas de medi
das abstratas e de ajustar a elas aspectos essenciais de sua vida.
O trabalho que a sociedade realiza em si mesma para construir mer
cados faz deles instituições, no sentido de Durkheim e de Veblen. Insti
tuições são maneiras de fazer, de pensar e de sentir que os indivíduos já
encontram presentes na sociedade; elas determinam a maneira como o
indivíduo apreende o mundo social e suas práticas que, em contrapar
tida, alteram as instituições mercantis. Vamos tentar demonstrar isso
examinando alguns mercados “especiais”, os mercados em que circulam
as “pseudomercadorias”, no sentido de Polanyi: a moeda e o trabalho.
fato de que o grupo social é definido pelo uso desse meio em suas tran
sações (SERVET, 1999).
Há muito tempo a moeda é objeto de uma atenção contínua por par
te de sociólogos economistas, como Simmel (1900) ou Simiand (1934),
que enfatizaram o papel da confiança, ou da fé no futuro, quando das
transações monetárias. O uso social da moeda é uma dimensão impor
tante da sociologia econômica.
Os mercados financeiros
Nesse ponto, não se pode deixar de perguntar por que todos os in
divíduos não adotam tal método de obtenção de emprego. É aqui que
a estrutura social, na qual a ação dos indivíduos está imersa, assume
toda a sua importância. Não se pode afirmar taxativamente que existe
de fato uma situação na qual o indivíduo tomaria uma decisão frente a
um conjunto de escolhas possíveis. Na realidade, o que acontece é que
alguns têm os bons contatos, e outros não os têm:
cidem sobre uma parte do lucro das empresas. Eles definem as relações
entre os proprietários (detentores dos direitos) e os outros membros da
sociedade (os assalariados, os consumidores etc.). As formas de gover
nança definem a concorrência e a cooperação, bem como a organiza
ção da firma. O direito econômico desempenha nesta última um papel
crucial, tanto na sua formulação quanto nas maneiras que regulam seu
funcionamento; nestas últimas contam-se as estratégias de luta entre
os atores que atuam no mercado, no nível nacional ou internacional.
As regras que regem a permuta definem quem pode realizar uma tran
sação com quem; é preciso, além disso, que sejam estabelecidas regras
que concernem às medidas, aos transportes, aos seguros, à execução
de contratos. Em suma, é preciso todo um conjunto de dispositivos
materiais (metrologia) ou virtuais (as “tecnologias invisíveis”, como as
regras contábeis ou o direito) para que a troca possa ter lugar, como
mostram os estudos sobre as transações mencionados no Capítulo 2. As
concepções a respeito do controle são uma forma local de cultura; elas
definem as maneiras de agir nessa forma de coesão particular que é a
concorrência; pode-se dar como exemplo disso, no nível microssocial, o
estudo do mercado financeiro feito por Abolafia, que traz as definições
do que é um comportamento aceitável (agressividade mercantil) e do
que não é aceitável (o oportunismo que coloca em risco a confiança no
mercado ou sobre o mercado).
Fligstein salienta duas causas de instabilidade no mercado: a pri
meira vem de uma concorrência entre empresas baseada nos preços;
a segunda tem origem nos conflitos internos da empresa a propósito
das formas de organização e de controle. Para pregar uma peça no
primeiro risco, a empresa pode recorrer à cooperação com outras em
presas; assim, a cooperação tem um papel a desempenhar desde que
nessa tentativa as empresas não infrinjam regras legais que coibem es
ses acordos; da mesma forma, as integrações, horizontal (a aquisição de
empresas concorrentes) ou vertical (compra dos fornecedores), são es
tratégias bastante comuns. A empresa procura, mas nem sempre conse
gue, se estabelecer em um “nicho” de mercado, isto é, procura realizar
uma diferenciação qualitativa de seu produto de maneira a segmentar o
mercado e reduzir a concorrência por meio dos preços. No que concer
ne à segunda causa de instabilidade, Fligstein enfatiza a complexidade
A construção social das relações mercantis 75
Conclusão
8 = 2L/g (g - 1 )
c /B = ( g - i ) - , .Sf,
C'a = ( g - M G x } r '
C m = 2-^gik(n)ígjk.[(g - 1).(g - D ]-1
Tomemos três redes típicas para mostrar como estas medidas exprimem a
posição dos agentes em uma rede.
1 2 3 4 5 6 7
C H IH =}-C H >D -a
Linha
Comprimento da rede
0 1 Mais de 2
Características dos indivíduos
Têm menos de 34 anos 28,0 48,3 60,0
Estão muito satisfeitos 76,0 53,6 40,0
Procuraram seu emprego 48,0 72,4 77,8
Pensaram recentemente em mudar de emprego 20,0 34,5 70,0
Ficaram desempregados 0,0 8,7 20,0
dos que tinham referência passaram por essa fase; uma porcentagem
próxima dessa (83%) concernia a empregados que queriam mudar de
função dentro do banco. A vantagem não se esgota nesta primeira fase,
já que a diferença entre as duas categorias de candidatos é nítida no
nível das propostas de emprego: 30% dos candidatos com referências e
55% dos empregados que procuravam uma mudança dentro do banco
receberam uma proposta contra 3% dos que não possuíam referências;
a diferença é, contra estes últimos, de 1 para 10 e de 1 para 18.
Tríade interdita
Il
Redes sociais e funcionamento dos mercados 8 9
Daí se origina a assertiva sobre a "força dos vínculos frágeis": são os vín
culos frágeis (relações amigáveis distantes ou relações profissionais) que têm
maior capacidade de trazer informações novas e pertinentes no interior de
uma rede de relações fortes (de família ou de amizade).
Os colegas e a carreira
+ -4
2 3 4 5
1 0 0 0
2 1 — 0 0 0
3 1 1 — 0 0
4 1 1 0 —
5 0 0 1 1 —
2
92 A Sociologia Econômica • Steiner
i^tjjtk
A3
Redundância por coesão Redundância estrutural
Hipóteses
Minir- Consequências
sobre compor Mega-rede
rede sobre os preços
tamento
Economia Hiper-racionali- Expansivo Indiferenciado Volatilidade
dade e confiabi decrescente de
lidade acordo com o
tamanho do
mercado
Sociologia Racionalidade Restritivo Diferenciado Volatilidade cres
econômica limitada e opor nos grandes cente de acordo
tunismo mercados com o tamanho
do mercado
volumes e qualidade), e eles conhecem sua função custo. A partir daí, sua
decisão se resume em fixar um preço para uma dada qualidade e quan
tidade do produto de tal maneira que a diferença entre seu rendimento
e seu custo seja a maior possível. O problema principal de que trata o
modelo de White é o de saber se a estrutura global que resulta das deci
sões individuais de produtores realmente interdependentes no mercado
é viável, ou seja, trata-se de saber se ela própria pode se reproduzir.
Nesse modelo, os produtores não sabem nada a respeito do que fa
zem e querem os consumidores, vistos unicamente como um agregado
de compradores cujas preferências e escolhas não contam, já que são
dimensões não pertinentes numa sociologia puramente relacionai que
não leva em consideração o indivíduo isolado e autônomo nas suas
volições (WHITE, 1992). Esse aglomerado de compradores intervém no
modelo, validando, ou não, as escolhas do pequeno número de produ
tores que tomou as decisões referentes às quantidades a serem oferta
das dos produtos, sua qualidade e seu preço.
A condição para a existência de uma estrutura de mercado estável é
a presença de uma mesma relação qualidade/preço em toda a gama de
qualidade do produto. Em qualquer hipótese, há, então, uma acomoda
ção entre os produtores e o conjunto de compradores para que os pro
dutos sejam classificados segundo uma mesma ordenação de qualidade.
Os “nichos” procurados pelos produtores, as decisões destes últimos, le
vam a fluxos que descem em direção ao conjunto de consumidores, que
valida essas decisões, pois a avaliação feita pelos dois lados do mercado
é a mesma. Por conseguinte, os produtores podem, no período subse-
qüente, reproduzir sua escolha anterior, e assim perpetuar o mercado
no qual estão envolvidos em termos da produção de uma quantidade e
de uma qualidade determinadas de um produto. A estrutura relacionai
é estável, já que os comportamentos dos atores levam à reprodução das
condições estruturais do mercado.
A partir dos parâmetros das funções de custo dos produtores e de
satisfação dos consumidores, White extrai uma tipologia dos merca
dos que leva em conta três formas viáveis de mercado; elas possuem
características nitidamente diferentes, conforme as relações existentes
1 0 4 A Sociologia Econômica • Steiner
Condusão
gida pela preocupação com sua aplicação prática - que os experts dos
ministérios, das empresas, ou os analistas financeiros dominam as ferra
mentas da teoria econômica, é difícil admitir que os outros atores pos
suam tal competência. De uma perspectiva sociológica (STEINER, 1998,
Cap. 1), não há como deixar de reconhecer que os conhecimentos de
economia dos agentes vêm de outras fontes; eles são extraídos de valores
diversos ou de exigências axiológicas de ordem política, ética, religiosa
que conformam o modo como os indivíduos pensam sua existência.
Um economista como Solow (1990, p. 2) insiste, aliás, no fato de
que são os conhecimentos do senso comum e as representações usuais
dos agentes que importam quando se trata de compreender seu com
portamento e suas reações. A partir do momento em que se aceita que
os conhecimentos e as representações dos agentes desempenham um
papel importante em suas ações, sua adequação às regras da teoria eco
nômica deixa de ter importância. Para uma sociologia econômica que se
ancora em uma sociologia do conhecimento econômico, o ponto digno
de atenção está no descobrimento dos conhecimentos efetivamente mo
bilizados, ou mobilizáveis, pelos agentes, na compreensão do sentido
das ações desses agentes, a que podem conduzir esses conhecimentos
e, finalmente, na explicação que se pode dar das ocorrências mercantis
que decorrem desses comportamentos. Esta idéia não deixa de ter in
teresse, como ficou patente graças ao questionário que Shiller (1989,
Cap. 23) aplicou nos traders americanos quando do craque financeiro
de 1987. Embora estes operadores façam uma avaliação prudente dos
problemas com os quais a economia se defronta, a queda do Dow Jo-
nes foi espetacular (- 22,6% em um dia). É bom saber que os traders
tinham na memória a crise econômica de 1929, referência que explica
parte de seu comportamento naquele dia.
Qual é a natureza desses conhecimentos? Comparados aos conheci
mentos dos virtuosi da teoria econômica, esses conhecimentos, segura
mente, carecem de rigor, de amplitude, e serão, na melhor das hipóteses,
considerados como versões muito aviltadas do saber da teoria atual.
Façamos uma apreciação do conhecimento (imperfeito) que os cida
dãos têm dos dados econômicos e do funcionamento da economia. Uma
pesquisa realizada nos EUA (WALSTAD, 1996,1997) realça o estado de
A inserção cognitiva e o mercado 111
Q u ad ro 8 A ilusão monetária.
posta modal era Charles, em seguida Bernard, depois Alain, o que quer
dizer que a inversão das situações, real e nominal, foi escolhida com
mais freqüência. Os autores do estudo se mostram, aliás, cautelosos
quanto à possibilidade de mudar o comportamento dos agentes por
meio da teoria econômica, tanto o raciocínio em termos nominais pare
ce mais natural, mais fácil de utilizar e capaz de funcionar corretamente
em muitas situações (em situações em que não há variação dos preços).
Este fenômeno não havia escapado a Simmel quando ele estudava as
conseqüências sociais da introdução da moeda nas trocas. A referência
a Simmel não tem apenas um interesse histórico: como Boudon (1990,
Cap. 3, p. 10) demonstrou, Simmel foi também o ponto de partida de
uma proposição importante para a sociologia do conhecimento, propo
sição segundo a qual os erros resultam dos a priori que os indivíduos
utilizam, inclusive quando fazem raciocínios corretos. No caso, a moeda
é um padrão de valor, mas ela não desempenha mais esse papel no caso
de variações complexas nas taxas de inflação.
Não obstante isso, considerada nas três dimensões lembradas aqui, a so
ciologia econômica tem um programa próprio na medida em que se dedica
ao exame do que Weber chamava de estudo das conseqüências sociais da
generalização de tal, ou tal, forma de troca; ela também tem um programa
próprio, visto que parte de um esforço mais empírico no qual a racionalidade
é mais uma variável do que um dado (SWEDBERG, 1994).
As pessoas que se erguem contra estes discursos técnicos não são ne
cessariamente insensatas, diz esse autor. Elas contribuem para colocar
questões cruciais quando se trata de examinar as conseqüências sociais
do desdobramento de tal ou tal configuração econômica. Em virtude
disso, a sociologia econômica adquire uma dimensão mais diretamente
política no contexto atual, em que a argumentação econômica é um
componente forte do debate público em todos os níveis.
Conclusão
_____ . The old and the new economic sociology. In: FRIEDLAND, R.; ROBERT-
SON, A. E (Ed.). Beyond the marketplace. Aldine d e Gruyter, 1990.
_____ . The nature of economic relationships. In: SWEDBERG (1993).
_____ . La construction économique des institutions. In: ORLÉAN (Ed.). Paris:
PUF, 1994a.
1 28 A Sociologia E conôm ica • Steiner
KIRMAN, A. E The intrinsic limits of modem economic theoiy: the emperor has
no dothes. Economic Journal, 1989.
_____ . Whom or what does the representative individual represent? Journal o f
Economic Perspectives, 1992.
R eferências 129