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CONSIDERAGOES SOBRE A FILOSOFIA DA IDEIA Cosmonomica: A Proposito DA PuBLICACAO, DE DOOYEWEERD NO BRrasiL Filipe Costa Fontes* RESUMO- © fildsofo reformado Herman Dooyeweerd acaba de ser introduzido no mercado literdrio brasileiro, através da publ pela editora Hagnos, de sua obra In the twilight of the western thought, em portugués, intitulada: No creptisculo do pensamento. Este seré, para muitos leitores, o primeiro contato com a obra deste proficuo pensador. O presente ensaio visa apresentar duas caracterfsticas fandamentais do pensamento de Dooyeweerd, que auxiliardo o leitor a se aproximar de sua obra: didlogo e antitese. O objetivo nao é tanto fornecer uma chave de leitura conceitual para 0 contato com a obra de Dooyeweerd, mas, de forma muito resumida, mostrar como estas duas caracteristicas marcantes da construgio de seu edificio te6rico-filoséfico devem incentivar e nortear nossa aproximagio de seu pensamento. Nés nos daremos por satisfeitos se conseguirmos, por meio desta breve apresentago, apontar a =O autor é ministro da Igreja Presbiteriana do Brasil, Bachare! em Teologia pelo Seminario Toolégico Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceigio ~ vali dacio pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; Licenciado em Filosofia pelo _Centro Universitario Assungiio; Mestre em Teologia Filosstica pelo CPAJ (Centro Presbiteriano de Pés-Graduagao Andrew Jumperi; Mestrando em Educagao, Arte Hist6ria da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. 103 CCONSIDERAGOES SOBRE A FILOSOFIA DA IDEIA COSMONOMICA relevincia do pensamento de Dooyeweerd para a construgao de uma biocosmovisio biblicamente orientada, e promover a aproximagio coerente de seu pensamento. PALAVRAS-CHAVE Herman Dooyeweerd; filosofia da ideia cosmonémica; filosofia reformacional; diélogo; antitese; cosmovisio. INTRODUCAO, Recentemente, 0 filésofo holandés Herman Dooyeweerd (1894-1977) foi introduzido no mercado literério brasileiro, com a tradugio e publicagio, pela editora Hagnos, de sua obra In the nwilight of the western thought, em portugués, intitulada: No crepiisculo do pensamento. Tendo em vista a publicagao desta obra, que introduz Dooyeweerd ¢ sua filosofia na academia teolégico- filos6fica brasileira, 0 propésito deste breve ensaio é considerar duas caracteristicas fundamentais de seu edificio te6rico, que auxiliario seus leitores no contato com sua obra. Para ser mais claro, © propésito nao é oferecer uma espécie de chave conceitual para a Ieitura de Dooyeweerd, mas alertar sobre o modo como deve se dar a aproximagao de seu pensamento, Dooyeweerd pode ser muito bem definido como um filésofo cristo. Com essa expressio, desejamos esclarecer que o edificio le6rico de Dooyeweerd é marcado por duas caracteristicas fundamentais: didlogo e antitese (CHOL, 2000). 1, DIALOGO. ‘Ao afirmar que Dooyeweerd foi um fildsofo cristio desejamos esclarecer, primeiramente, que 0 edificio teérico erigido por Herman Dooyeweerd foi um edificio téenico rigoroso, construido de acordo com as exigéncias da filosofia como disciplina académica © pensamento de Dooyeweerd € um sistema teérico-filoséfico complexo, composto por uma visto propria das mais importantes avenidas do pensar filos6fico, e uma terminologia técnica rigorosa fruto da interago com algumas das mais proeminentes correntes filoséficas de sua época. tais como o neokantismo al. Bee aa aa a NASSAR REVISTA TEOLOGICA, V. 69 -N.67/68, 2008 fenomenologia de Edmund Husserl (SPIER, 1954). Nestas duas correntes, Dooyeweerd encontrou grande parte do ferramental metodolégico e terminolégico que, redefinido parcialmente, contribuiu para a construgiio de seu edificio teérico Para exemplificar a interagio de Dooyeweerd com estas escolas de pensamento apéstatas, tomemos como exemplo 0 neokantismo, A maior contribuigo do neokantismo 3 foi a ideia da necessidade de uma inquirigio critica as condigdes transcendentais que tornam possivel 0 pensamento teérico. Isto é, a necessidade de averiguar a estrutura do aspect analitico,® a fim de verificar criticamente a validsde da suposta autonomia do pensamento tedrico, sob a qual fensamento ocidental fora construfdo. Dooyeweerd afirmava que, no pensamento ocidental, “a autonomia do pensamento te6rico tem sido clevada a uma condigio intrinseca da verdadeira filosofia, mesmo sem ser ju exame critico sobre a estrutura interna da propria atitude tedrica do pensamento” (2010, p.48). Segundo ele, este dogma teria sido “o Unico que sobreviveu ao abandono das artigas certezas da filosofia, causado pelo profundo desenraizamento espiritual do pensamento ocidental apés as duas guerras mundiais” (2010, p.47).7 Esta preocupagio critica, Dooyeweerd compartilhou com a filosofia neokantiana. E dela, Dooyeweerd tomou a expressio “transcendental”, embora tenha atribuido aela um alcance muito mais abrangente e radical que o significado inicial atribuido por Kant. Para Dooyeweerd, 0 ponto de partida transcendental nao se encontra ni categorias da prépria razio, como acontece no pensamento kantiano (KANT, 1987), mas no coracdo fundamentalmente religioso, que a tudo determina e direciona. 6 Dooyewcerd entendia qu realidad temporal se manifesta em diferentes modes de ser, denominadosaspectos modsis. A racionaliade, Dooyeweer atibuiu no nas gv o status de um modo de se rao, gue cle costumava dnominar“aspectoaaltic”. 7 Nisto consist wma das mores contribuigéeséa filosoia de Dooyeweerd eti- ‘Ga, suposta autonomia do pensamento teérico. O propsito central de sua obra traduzida recentemente para o portaguts, No erepscalo do pensumento,€ mostrar que una anise erica das condigdestanscendentsis qu tomam posse 0 pensimento trio evidencia completa dependéncia que o mesmo possi dos maivosreligisos co EU humano, eau, ‘consequentemente, uma andlise tranacendental do deseavolvimento do pensamento ocider. © mais importante dos temas neokantianos, que se tommau parte de seu ‘pensamento ¢ nele permanecen durante toda a sua vida, foi o método transcendental. Dooyeweerd conscientemente se refere A sua propria filosofia como filosofia transcendental e repetidamente afirma que a chave para o seu pensamento s6 podia ser encontrada na sua “critica transcendental do pensamento teérico”, uma frase claramente reminiscente da Critica da Razdo Pura de Kant (1781) e ecoou no titulo inglés do magnum opus de Dooyeweerd. Ali, “pensamento teérico” (mais do que “razio pura”), esta sujeito a uma nova (sto 6, p6s-kantiana) critica, e 0 sujeito no qual ela esta fundada vem a ser ndo um ego Igico mas um ego religioso transcendental, que 6 identifieado com 0 “coragio” da Biblia (WOLTERS. In: MCINTIRE, 1985, P.11-12. Nossa tradugio), Assim, é possivel afirmar que uma das caracteristicas mareantes da filosofia de Dooyeweerd € 0 didlogo. Isto nio significa que Dooyeweerd tenha feito do didlogo a mola mestra ¢ determinante de toda a construgtio de seu pensamento, a ponto de buscar uma sintese terica com as escolas de pensamento apéstatas, como veremos a seguir, ¢ sim que a filosofia da ideia cosmonémiea néo foi construfda num vacuo temporal, mas num momento histérico especffico, num debate direto com as correntes filosGficas mais vigentes neste momento. Na filosofia de Dooyeweerd, a possibilidade do didlogo se sustenta em duas bases distintas. Em primeiro lugar, ela é sustentada pela doutrina da graga comum, Primeiramente, seguindo a tradigao agostiniana e calvinista,’ Dooyeweerd admitia ser posstvel ao impio chegar a0 conhecimento de momentos de verdade sobre 0 mundo,’ 0s quais 0 pensador cristo também deve se apropriar para 8 “Desta passagem podemos inferir que & superstcioso recusar-se a fazer qualquer uso de autores seculares, Porque, visto que toda a verdade procede de Deus, sealgumm fmpio disser algo verdadciro, nfo devemos ejeiti-o, porquanto © mesmo procede de Deus. Além disso, visto que todas as coisas procedem de Deus, que mal haveria em empregar, para a sua lr, tudo quanto pode ser coretamente usado dessa forma.” CALVINO, Jogo. Comen: tario a Sagrada Eseritura: As Pastorais — I Timéteo, Il Timsteo, Tito e Filemom. Sao Paulo: Fdigtes Puracletos, 1998. Comentisio de T. 1.12, p. 318. 9. “Momentos de verdade” é a expresso usada por Dooyeweerd para se referir&s verdades, sobretudo referentes ao estado odin das coisas, &s quais 0s sistemas de pen- samento apéstatas podem chegar Trata-se do que Van Til chamou de “capital emprestado”, aguilo que a graga comum de Deus permite 20s impios compreender, mas que, de fato, pertence aos santos. 106 a gl6ria do Criador (DOOYEWEERD, 1984, vol.1, P.115-116). Em segundo lugar, a possibilidade de didlogo se sustenta pelo carter cosmonémico de sua filosofia. A base desta defesa reside na lei de Deus que estrutura tanto a realidade temporal na qual vivem impios e cristos, quanto a faculdade te6rica de ambos (VAN TIL, 1997). Dooyeweerd pontua que a possibilidade de um contato real entre as diferentes escolas filoséficas, inclusive o didlogo entre uma escola cristd ¢ outra apéstata, se deve a quatro razGes: (1) todos os fildsofos buscam explicar a mesma realidade; (2) consequentemente, todos os filsofos lidam com 0 mesmo estado de coisas (state of affairs) para verificar seus apontamentos; (3) todos os filésofos esto sujeitos as leis estruturais" do pensamento te6rico, e consequentemente, todos eles usam as mesmas regras para determinar a validade de seus argumentos; (4) no que diz. respeito a filosofia ocidental, todos os filésofos participam da mesma tradigo histérica ou comunidade de pensamento (DOOYEWEERD, 1948, 2.31 apud CHOI, 2000). Sendo assim, ao afirmar que Dooyeweerd foi um fildsofo cristo, estamos, primeiramente, afirmando que ele construiu um edificio te6rico-filoséfico técnico rigoroso, em interagio com a filosofia de seu tempo. 2. ANTITESE Aexpressio fildsofo cristio aponta também paraocompromisso de Dooyeweerd com o senhorio de Cristo os pressupostos da Palavra de Deus. Abraham Kuyper, um dos antecessores de Herman Dooyeweerd, e que exerceu sobre ele enorme influéncia, afirmou em uma de suas palestras: “... nfo hé um tinico centimetro quadrado em todos os dominios da existéncia humana sobre 0 qual Cristo, que é © Soberano sobre tudo, nao clame: é Meu!” (BRATT, 1998, p.488) a frase de Kuyper, que ficou muito conhecida no meio teol6gico reformado, é uma expresso do conceito de religiio seguido por Dooyeweerd. Ao contrério do entendimento corrente na filosofia 10 © termo “esirutural” € essoncial para a compreensio deste ponto, Doayeweerd cst tratando aqui das condigdes Gltimas que possbititam e normatizam funcionamen- 1 da realidade. Ao dizer que todos 0s fildsofos estio syjeitos as mesms leis estuturais, Booyeweerd no esta se referindo as regras légicas propostas conscientemente, mas AS regras estruturais estabelecidas pelo Criador, dentro das quais funciona o aspecto légico. 107 ‘CONSIDERAGOES SOBRE A FIL contemporanea, em que religido se refere a um aspecto limitado & estangue da vida de um individuo e da realidade, para Dooyeweerd, 6 termo possui extensdo abrangente. Segundo ele, 0 termo religiéo niio pode ser entendido como restrito a esfera da fé, mas indica 0 caréter essencial da criagdo, pelo qual tudo foi criado e permanece coram Deo (NASH, 1982, p.78). Em suas proprias palavras, religio “60 impulso inato do ‘eu’ humano que se dirige a verdadeira ou falsa origem absoluta de toda diversidade temporal de significado, que se encontra focalizado concentricamente no eu” (DOOYEWEERD, 1984, vol. 1, p.57, nossa traducZo). Neste sentido, é possivel dizer que tudo € religiao. Esta concepeao de religido uma consequéncia da crenga de Dooyeweerd no carter essencialmente religioso da criagiio. Choi confirma que “o ponto de partida de Dooyeweerd centraliza-se em toro da criagdo como descrita na Biblia” (CHOI, 2000). Como ser criado por Deus, todas as coisas que o homem faz possuem um cardter essencialmente religioso ou teo-referente, ou seja, se referem a Deus positiva ou negativamente." Em todas as esferas e dimens6es da vida: lazer, trabalho, familia, ciéncia, politica, economia, relagdes sociais, as acdes do homem sio atos de adoragiio ao Deus verdadeiro, Criador detodas.as coisas, ouidolos criados pela prépria imaginagao humana. 11 No artigo “Reflexdes eriticas sobre weltanschauung: Uma andlise do processo de formagéo e comparihamento de cosmovisdes numa perspectiva teo-referente”, Oli veira explicita © conceito de “eo-referéncia’ revelando sua origem uso comum de sta pena, “Teo-teferéncia’ & um conceito empregado por D. C. Gomes para indicar que Deus € 1 ponto de referéncia dimo de toda existénca, tanto do homem regenerado pelo poder do Espirito e de Palavra de Deus, quanto do homem nfo-regenerado. GOMES, Davi Charles. [A metapsicologia vantiiana: uma incursio preliminar. Fides Reformara XI: 1 (2006), p. 116, nota 14. A teo-referéncia negativa, como & qualificada a existéncia do homem em constante apostasa, sed sempre como forma de emancipagao em relagio a Deus erebelido contra a sua Palavra. A teo-referéncia positiva indica a cxisténcia ea apreensio da realida- de no interior de um contexto de significado redentivo ou biblicamente orientado, A teo~ referéacia (negativa ou positiva) 6 a condicio originéria de todo horizonte de compreensto « interpretagio humanas. Isso quer dizer que a vida-no-mundo ser sempre encarada no Interior de umn campo de significado de amor ou de rebelifo contra Deus.” OLIVEIRA, F. de A. Reflexes crtieas sobre weltanschawung: Uma andlise do processo de formagio ‘compartilhamento de cosmovisbes nua perspectiva teo-referente, Fides Reformata, Sto Paulo, XI, 1, p.31-52, janjun, 2008. p31 108 FP ’SS’SCN Ee Se tudo existe por causa de Deus, entio se segue que @ criagio toda deve dar gloria a Deus. O sol, a lua e as estrelas no firmamento, 08 piissaros do ccéu, toda a natureza a0 nosso redor, mas, azima de tudo, o préprio homem {que, como sacerdote deve fazer convergir para Deus toda a criaglo e toda vida que se desenvolve nela (KUYPER, 2C02, p.62) ‘Tendo em vista sua nogio radical de religifo, a filosofia de Dooyeweerd nfo foi marcada apenas pelo didlogo, mas também pela antitese. Segundo ele, “a graga comum nao elimina a antitese (oposi¢ao) entre 0 motivo basico da religido cristi © 08 motivos bésicos apéstatas” (DOOYEWEERD, 1579, p.38. nossa tradugio), Dooyeweerd entendia haver uma antitese irreconcilidvel entre os pressupostos religiosos que fundamentam 0 pensamento cristo © © pensamento apéstata, Esta nao se trata apenas de uma antitese teorica, em termos hegelianos, uma simples oposi¢ao de ideias que busca uma sintese superior, mas uma irreconcilivel oposigao entre a verdade e a apostasia, ou entre o reino de Deus e o império de Satands. Por isso, o didlogo entre o pensimento cristo e 0 apéstata no deve visar uma sintese tedrica, o que seria impossivel em termos mais profundos, mas deve ter como finalidade principal a restauragdo da comunidade cientifica e filoséfica de pensamento (DOOYEWEERD, 1979, p.6). Desta forma, além de se preocupar com seu cardter técnico € rigoroso, Dooyeweerd se preocupou com a pureza de seu edificio te6rico. A apropriagio dos temas e aspectos metodol6gicos comuns as escolas de pensamento apéstatas de sua época no se deu de maneira acritica e irrefletida. Pelo contrério, esta apropriagao se deu acompanhada de redefiniges realizadas & luz dos pressupostos religiosos centrais da Revelagio. Ou seja, Dooyeweerd se esforgou para que seu edificio tedrico nao se tomass® religiosamente sintético," i isto é, uma interagio acritica entre os pressupostos religiosos da | Palavra de Dens e pressupostos religiosos de sistemas filoséficos apéstatas (NASH, 1982, p.27). Para isto, ele levou as tiltimas consequéncias sua f& em Cristo € ndo dissociou suas conviegées istic: a, seu. compromisso de fé, de seu conhecimento 12 Dooyeweerd denominou ‘sinéticos' os sistemas tericos originale estruturalmente ctistGos, mas que incorporam elementos de sistemas teéricos apésttas,cujo ponto de par- ‘ida 6 imanente 109 CCONSIDERAGOES SOBRE A FILOSOFIA DA IDEIA COSMONONICA tedrico. Se, ao chamarmos Dooyeweerd de fil6sofo, temos em mente 0 fato de que ele construiu um edificio técnico rigoroso, ao qualificar sua filosofia com o termo crista, temos em mente 0 fato de que ela, com todo 0 rigor exigido, se esforga por esposar unicamente, até onde € possivel em um mundo decafdo, os pressupostos religiosos centrais da Palavra de Deus. So de sua pena as seguintes palavras: Nossa filosofia aceita ousadamente a “rocha de escindalo da Cruz de Cristo” como a pedra angular da epistemologia. E assim, ela também ntro da limitagao e fraqueza da came, nds compreendemos a absoluta verdade aceita a cruz do escandalo, do desprezo e da rejeigio dogmstica. De de nosso conhecimento de Deus derivado de sua revelagio, em oraglo & adoragao (DOOYEWEERD, 1984, vol. 2, p.562, nossa traducio).. O edificio tedrico de Dooyeweerd foi construido, basicamente, numa interagio com dois movimentos de natureza e alvos completamente distintos; 0 neocalvinismo holandés ¢ a filosofia alema contemporanea. O neocalvinismo holandés forneceu a Dooyeweerd uma biocosmovisio biblicamente orientada, centrada na Escritura, que Ihe permitia olhar o mundo de maneira teo- referente. A filosofia alema, por sua vez, forneceu o ferramental te6rico-metodolégico, por meio do qual foi possivel expressar esta biocosmovisdo teo-referente em uma filosofia técnica rigorosa. Pode-se dizer que, por meio da interagiio com o ferramental te6rico- metodolégico da filosofia alem& contemporanea, sobretudo 0 neokantismo ¢ a fenomenologia de Husserl, os temas e pressupostos do neo-calvinismo holandés ganharam uma formulagao técnica & conceitual (OLIVEIRA, 2004)."* 15 A pesquisa de Oliveira, A relevdncia transcendental do Deus et animan scire no pensamento de Herman Dooyeweerd, possui uma segio denominada "Os antecedentes culturais eintelectuais do pensamento de Herman Dooyeweerd” que trata com profundidade da inluéncia destes antecedentes na obra do filbsofo ho- landés, e remete a duas obras baslares quanto a esta questio. Sao elas: KNUD- SEN, R. D. Dooyeweerd’s Philosophical Method. Palesta feita na Conferéncia ‘Anual de Filosofia do Wheaton College. Wheaton, Ilinois: Wheaton College, 1962. Esta palestra foi mais tarde incluida num texto mimeografado do préptio Knudsen intitulado Philosophia Reformanda: Reflections on the Philosophy of Herman Dooyeweerd, 1971; e WOLTERS, A. M. The Intellectual Milieu of Her nian Dooyeweerd. Este texto se encontra na obra The Legacy of Herman Dooye- tweerd: Reflections on Critical Philosophy in the Christian Tradition, cujo editor geral CT. Melntire EVISTA TEOLOGICA, V. 63 N. 67/68, 2008 CONCLUSAO Dooyeweerd foi um fildsofo cristaio. Com isso, queremos dizer que Dooyeweerd desenvolven um edificio filoséfico biblicamente orientado. Isto nao significa que a filosofia de Dooyeweerd seja uma filosofia perene. Ele proprio reconhecia a impossibilidade de uma filosofia deste tipo (DOOYEWEERD, 1984, vol.1, p.117) Assim como qualquer outro sistema tedrico desenvolvido num mundo decafdo, a filosofia da ideia cosmonémica esti sujeita a imprecisGes, e conviveu com opositores. Contudo, por ter sido construfda sobre 0s pressupostos religicsos centrais da Escritura, a filosofia de Dooyeweerd se apresenta como uma proposta a ser considerada por todos aqueles que desejam esposar uma visio de mundo coerentemente cristé. O edificio te6rico-filosGfico de Dooyeweerd foi e tem sido fundamento para o desenvolvimento de edificios te6rico-cientificos biblicamente orientados. Dentre os mais influentes pode-se como exemplo citar a teoria estética de Hans Rookmaaker. Séo as seguintes suas palavras sobre Dooyeweerd: Durante aquele tempo decisivo eu fui epresentado ao Capitio (depois Professor) Mekkes. Foi justamente na ocasido cm que estévamos sendo evados para o Neu-Brandemburgo. Eu ouvi sobre Dooyeweerd pelo Capitiio Mekkes e comecei a ler livros de Dooyewecrd. Particularmente, eu os devorei. Porque eu descobri, desde a primeira pagina, que alguém estava falando precisamente sobre esta questio, ¢ ofereceu uma clara soluge que © cristo tem uma clara tarefa também como filésofo. Ele mostrou que 0 pensamento cristo nio esti fechado para fora, mas aberto, de fato. ,, mostrando que ser Kantiano ¢ cristo era irreconcilidvel, mas Desta forma & que a obra de Dooyeweert tornou-se decisiva para mim. Ele removeu os tltimos obstéculos que ainda estavam obstruindo 0 caminho 20 Cristo biblico. Ao mesmo tempo, ele foi Fara mim um tipo maravilhoso de catecismo (ROOKMAAKER, 2002, vol. 2, p.11). Contudo, uma aproximagiio proveitosa do pensamento de Dooyeweerd, deve considerar, além da atmosfera intelectual crista, neocalvinista, que caracteriza seu pensamento, 0 fato de que seu pensamento 6 um edificio tedrico-filoséfico complexo, imbufdo do rigor exigido pela filosofia como disciplina académica. Isto significa que é como um fil6sofo que Dooyeweerd precisa ser lido, sob pena ay CONSIDERAGOES SOBRE A FILOSOFIA DA IDEIA COSMONOMICA de ser mal interpretado e mal compreendido. Sua terminologia e conceitos precisam ser interpretados & luz da atmosfera intelectual que forjou 0 seu pensamento, e, sobretudo, a partir do todo de seu préprio sistema, € nao a partir de conceitos pré-estabelecidos por qualquer outra dea do saber. Isto é 0 que queremos dizer ao afirmar que Dooyeweerd foi um FILOSOFO CRISTAO. REFERENCIAS BRATT, James D., Abraham Kuyper: A Centennial Reader, 1998, CALVINO, Joio. Comentario a Sagrada Escritura: As Pastorais -I Timéteo, II Timéteo, Tito e Filemom, Sio Paulo: Edigdes Paracelsus, 1998. CHOI, Young Joon. Dialogue and Antithesis: A Philosophical Study on the Significance of Herman Dooyeweerd’s ‘Transcendental Critique. 2000 (obra nao publicada) DOOYEWEERD, Herman. No creptisculo do pensamento. Sio Paulo: Hagnos, 2010. DOOYEWEERD, Herman, A New Critique of Theoretical ‘Thought. 3 ed. Ontario, Canada: Paideia Press, 1984. 3 v. DOOYEWEERD, Herman. Roots of Western Culture: Pagan, Secular, and Christian Options. Toronto: Wedge Publishing Foundation, 1979 KANT, Immanuel. Critiea da razio pura, Sio Paulo: Nova Cultural, 1987 KUYPER, A. Calvinismo. Sao Paulo: Cultura Crista, 2002. MCINTIRE, C. T. (Ed.). The legacy of Herman Dooyeweerd: Reflections on Critical Philosophy in the Christian Tradition, Lanham: University Press of America, 1985 NASH. Ronald H. Dooyeweerd and the Amsterdam philosophy. Grand Rapids, Michigan: Zondervan Publishing House. 1982. OLIVEIRA, F. A. A relevancia transcendental do Deum et animan scire no pensamento de Herman Dooyeweerd (Tese de Mestrado). Teologia Filoséfica, CPAJ, Sao Paulo, 2004. 12 REVISTA TEOLOGICA, V. 69 -N 67/68, 2009 OLIVEIRA, F. de A. Reflexes criticas sobre weltanschauung: Uma andlise do processo de formacio e compartilhamento de cosmovisdes numa perspectiva teo-referente. Fides Reformata, Sao Paulo, XIII, 1, p.31-52, jan/jun, 2008 ROOKMAAKER, H. R. The Complete Works of Hans Rookmaaker. Carlisle: Piquant editions, 2002 SPIER, J. M; FREEMAN, D. H. An introduction to Christian philosophy. Philadelphia, PA.: The Presbyterian and Reformed Publishing Company, 1954 VAN TIL, Comelius. Jerusalem and Athens. The Works of Comelius Van Til. New York: Labels Army Co, 1997. ABSTRACT The Reformed philosopher Herman Dooyeweerd has been recently introduced in the Brazilian literary market through the publication, by Hagnos Publishing House, of his work Jn the Twilight of the Western Though, which in Portuguese is entitled: No crepiisculo do pensamento. This will be, for many readers, their first contact with the work of this prolific thinker. The current essay aims to present two fundamental characteristics of Dooyeweerd’s thought, which will help the reader to get close to his work: dialog and antithesis. The objective is not to provide a key to the conceptual reading of Dooyeweerd, but, very concisely, to show how these two distinct characteristics of the construction of his theoretical-philosophical building should motivate us and guide us as we approach his thought. We will feel that we've succeeded if we are able to show the relevance of Dooyeweerd’s thought for the construction of a biblically oriented world and life view, and to promote a coherent approach of his thought. KEYWORDS: Herman Dooyeweerd; philosophy of the cosmonomic idea; reformational philosophy; dialog; antithesis; worldview.

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