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DESCRIÇÃO
Construção das principais linhas norteadoras da arte arquitetônica do entorno do Mediterrâneo
na Antiguidade.
PROPÓSITO
Listar as características das sociedades que compõem o ideal de civilização ocidental
presentes entre o Crescente Fértil e os espaços de Grécia e Roma, relacionando as
concepções de arte e poder nessas sociedades.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
MÓDULO 2
MÓDULO 3
INTRODUÇÃO
Faremos um breve passeio sobre as arquiteturas da Antiguidade. O mundo e as sociedades
são muito mais amplos do que abordamos; contudo, os desdobramentos da história criaram um
ideal civilizacional contemporâneo pautado, em especial, nas sociedades greco-romanas.
Entretanto, precisamos não ser
etnocêntricos e perceber que é inegável a influência do
Crescente Fértil para a cultura dessas sociedades. Por isso, reconhecer sua arte e arquitetura
será fundamental.
ETNOCÊNTRICOS
Centrados em nossa própria cultura
CRESCENTE FÉRTIL
MÓDULO 1
ARQUITETURA GREGA
Imagem: Shutterstock.com
Acrópole e Partenon de Atenas.
Engana-se, porém, quem pensa que o edifício permaneceu lá, intocável, por todos esses
séculos, servindo apenas de espaço de contemplação:
O Partenon foi igreja cristã na época do Império Bizantino, destinado ao culto da Virgem Maria.
1458
Quando Atenas foi tomada pelo Império Otomano, foi convertido em mesquita.
1687
O edifício que os turistas fotografam entusiasmados não é, nem de longe, idêntico à construção
original. Apesar disso, nenhuma das alterações que sofreu foi suficientemente poderosa para
descaracterizá-lo: ele permanece um dos símbolos mais emblemáticos
não só da Grécia
Antiga, mas de toda a arquitetura ocidental, já que inspirou diversas outras construções ao
longo dos séculos.
Foto: Zigres/Shutterstock.com
Antigas ruínas do Partenon e Erechtheion na acrópole de Atenas. Na capital grega, a
acrópole é um marco histórico significativo, Zigres, 2018.
O QUE É UM CLÁSSICO?
Certamente, o termo “clássico” é bastante comum em nosso dia a dia, não é mesmo? Mas
afinal, qual é a origem desse significado?
A noção de “clássico” tem origem na Roma Antiga. A palavra classicus estava associada aos
cidadãos que, pela riqueza e pelo prestígio, pertenciam à primeira classe. Esse sentido foi
transposto para os textos escritos,
quando se passou a distinguir o escritor clássico (scriptor
proletarius ), mais prestigiado, do scriptor proletarius .
Os textos canonizados pelo termo “clássico” seguiram não apenas sendo estudados, mas
classificados a partir da alcunha dada na Roma Antiga. Assim, escritos latinos e gregos
passaram a ser selecionados e qualificados como “clássicos” até que assumiram
o adjetivo
como nome próprio: a expressão Antiguidade Clássica designa, até hoje, algum aspecto ou,
no limite, a totalidade de experiências histórico-culturais da Grécia e Roma antigas.
O mesmo
princípio se aplica a casos específicos, como arquitetura clássica.
Mas seria equivocado afirmar que esse entendimento é o único possível. A ideia de
“qualidade”, provável influência da lógica censitária da Roma Antiga, tem outro sentido
atualmente.
RESUMINDO
Clássico, em outras palavras, seria aquilo que é “de primeira classe” – melhor por suas
características e virtudes do que todo o resto. Trata-se de uma acepção que guarda consigo
profundas consequências políticas, sobretudo porque nosso gosto, nosso prazer
estético, é
formado e reproduzido na experiência social, e essa disposição nos faz crer que determinado
modelo representa o paradigma a partir do qual todos os demais devem ser julgados, além de
um sentido de
resistência, persistência e perenidade quando se fala em “clássicos”.
Os desenvolvimentos do conceito, sobretudo entre os séculos XVII e XIX, fizeram com que
seus sentidos oscilassem e que não houvesse necessariamente vinculação com o passado dos
povos antigos. Assim, pode-se falar em “clássicos da literatura espanhola”,
expressão que
representaria uma contradição com o sentido original, mas que coexiste e reforça o sentido de
“imortalidade”: tornaram-se “clássicas” todas as obras a que, por força da popularidade,
são atribuídas a
capacidade de permanecer como referência, blindadas do
esquecimento. Até mesmo a expressão “nasce um clássico” passou a ser praticada como
hipérbole, como elogio a uma obra recente e que se julga qualificada para não ser esquecida.
Imagem: Shutterstock.com
Muro com textura adobe.
O território grego não ganhou fama por sua fartura de recursos. O relevo montanhoso e a
aridez do solo são bastante conhecidos, ainda que a topografia da bacia do Mediterrâneo seja
heterogênea. As terras agricultáveis, como se discute, eram muito limitadas,
correspondendo a
cerca de 20% do território. Se, por um lado, aprendemos a reconhecer os méritos do engenho
humano por sua capacidade de superar as desvantagens, por outro, não podemos ignorar que
essas mesmas desvantagens
estão na base das soluções encontradas.
As condições materiais (e naturais) não são meros empecilhos à engenhosidade, mas uma
variável indispensável para entender a forma com que os povos antigos interferiam na
paisagem.
Foto: Shutterstock.com
Grande peça de mármore e um martelo após a divisão do mármore para trabalhos futuros.
Os mármores de Quios (norte do mar Egeu) se tornaram célebres não apenas pelo uso como
matéria-prima para esculturas, mas também para a construção e decoração de edifícios.
Foto: Shutterstock.com
Grande rocha vulcânica no vale da montanha Hrafntinnusker. A montanha leva o nome das
rochas de vidro preto, obsidiana.
Melos, por sua vez, situada ao sul das Cíclades, se tornou referência no comércio de
obsidiana, uma rocha ígnea extrusiva constituída basicamente de vidro vulcânico, muito
utilizada na Antiguidade para produzir
pontas de flecha e de lanças, e outros instrumentos
cortantes de boa qualidade.
Essas inovações, resultado de processos de integração e diálogo entre as cidades, são parte
de condições históricas específicas, razão pela qual não é possível atestar o uso de tão
variados recursos em períodos mais antigos, como a Idade do Bronze, quando
o adobe era a
técnica mais recorrente nas construções.
O desenvolvimento das técnicas de construção dos templos concentrou bastante atenção nas
proporções. Tales de Mileto e Anaximandro de Mileto foram dois filósofos pré-socráticos do
século VI a.C. que propuseram modelos geométricos que expressavam suas
visões
cosmológicas e religiosas de mundo. Acredita-se que parte importante de suas reflexões se
ampara na influência egípcia, sobretudo em relação à arquitetura de pedra. O diálogo entre as
sociedades permitiu o compartilhamento
de procedimentos, habilidades e ferramentas.
O interesse pela medição da área, necessário no caso egípcio por razões tributárias, foi
incorporado pelos filósofos gregos, bem como o uso de técnicas de escala em desenho para
assegurar, no plano da construção, as propriedades e proporções previamente
planejadas. O
peristilo gradualmente se consolidou como uma das marcas mais visíveis dos templos.
EXEMPLO
A técnica de alocar blocos de pedra ásperos no local das construções para o posterior
acabamento, por exemplo, é uma prática egípcia que, por volta desse período, se tornou
bastante frequente no mundo grego.
PERISTILO
Em relação ao material utilizado nas construções, o uso de blocos de pedra foi se tornando
cada vez mais popular e ajudou a reforçar a monumentalidade dos edifícios.
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Imagem: Shutterstock.com
Rua arqueada medieval na cidade velha de Rodes, Grécia.
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Garantindo estabilidade, as pedras cortadas ajudaram a produzir uma aparência mais
regular e assegurar o respeito às proporções. O uso de pedras também esteve presente
nos conjuntos escultóricos dos frisos. No templo dedicado a Ártemis em Paros (490-480
a.C.), as paredes foram feitas com mármores locais bem-ajustados, diferentes de
diversos templos construídos com tijolos de barro. Os templos também ajudaram a
consolidar as formas arquitetônicas conhecidas como “ordens”.
ORDENS GREGAS
As discussões sobre as famosas “ordens” da arquitetura grega são muito influenciadas pelo
arquiteto romano Marcus Vitruvius Pollio. Em seu tratado De Architectura (séc. I a.C.), Vitrúvio
oferece não apenas informações,
mas também levanta algumas discussões sobre a arquitetura
helênica. Essa obra ganhou particular atenção no Renascimento, inclusive por seus aspectos
teóricos e pelo apreço às ideias de harmonia e proporção, mas também ficou
marcada pelo
entendimento oferecido acerca dos distintos sistemas arquitetônicos, identificados como
“ordens”. Trata-se, então, de um método classificatório que define práticas e estilos de
construção, explorando simultaneamente
seus aspectos estruturais e ornamentais.
Existe um consenso prático entre os especialistas de que todas as ordens derivam de duas
principais: a dórica e a jônica.
Apesar das variações, essas ordens eram caracterizadas por algumas regras que
asseguravam um padrão razoavelmente regular. Compunham-se de uma base a partir da qual
eram erguidas as colunas que, por sua vez, eram alocadas em
entablamentos constituídos
por três partes:
FRISO
Uma faixa horizontal que se sobressai na parede e que também arremata a parte superior da
obra.
Foto: Shutterstock.com
ORDEM DÓRICA
Na ordem dórica, a coluna não costumava ser acompanhada de base, sendo erigida
diretamente a partir do solo. Tais colunas eram adornadas com caneluras e terminavam com
uma espécie de anel no topo
(conhecido como equino – ver Figura 1), sobre o qual era
apensado um ábaco – ver Figura 1 -, quadrado que restringia o vão entre as colunas e provia
melhor sustentação à arquitrave. Esta, por sua vez, costumava
ser lisa e não se apoiava
diretamente na cornija. Também era frequente que um frontão se sobrepusesse a esse
conjunto. Trata-se de um grande triângulo de alvenaria, algumas vezes decorado com
conjuntos escultóricos
em alto-relevo que narravam alguma história mítica, associada tanto à
divindade local como aos heróis fundadores das cidades.
Foto: Shutterstock.com
ORDEM JÔNICA
Foto: Shutterstock.com
ORDEM CORÍNTIA
A chamada ordem coríntia, que os próprios gregos diziam ter se desenvolvido pela influência
jônica, é sobretudo caracterizada por seu capital ricamente esculpido em forma de flores e
folhagens. Vitrúvio creditou a Calímaco a construção do primeiro capitel
coríntio. Os detalhes
são notáveis e acredita-se que os finos entalhes tenham surgido do trabalho com metal para só
posteriormente serem aplicados ao mármore.
Foto: Shutterstock.com
ORDEM CARIÁTIDE
Em linhas gerais, a ordem dórica tende a ser vista como mais sóbria, geométrica e regular; a
ordem jônica é mais detalhista, fluida, leve e ornamentada.
CARIÁTIDES
Figuras femininas esculpidas que funcionam como coluna ou pilar de sustentação com
um entablamento na cabeça.
Por mais que haja o costume, por exemplo, de associar a criação do estilo dórico ao norte do
Peloponeso ou à pólis de Corinto, os avanços da arqueologia mostraram que tais inovações
foram muito menos localizadas. Além disso, há variações dentro da mesma
ordem: o modelo
jônico não era o mesmo nas Cíclades e/ou na parte oriental da Ásia Menor. Em outras
palavras, além da diversidade, as interações políticas e culturais foram responsáveis pela
criação de mais formas híbridas
do que exatamente puras.
CASAS
É o caso, por exemplo, da arquitetura doméstica. Há uma razão prática para certa
desatenção dos especialistas: como os templos foram erigidos com material durável, se
tornaram mais resistentes às ações do homem e
do tempo; as casas gregas, por sua vez,
foram construídas com materiais mais simples, menos resistentes. No entanto, não é uma
mera questão de análise de vestígios, já que também possuímos bom estoque de informação
sobre
os oikoi , mas uma questão de olhar: só mais recentemente os arquitetos, arqueólogos
e historiadores passaram a se interessar pela experiência da vida doméstica.
Ainda que os espaços públicos abrigassem as mais decisivas situações da vida social
(embates políticos, julgamentos criminais, festividades, práticas religiosas, jogos etc.), grande
parte dos gregos (sobretudo as mulheres) passava boa parte de seu tempo
no espaço privado.
A maioria das casas era construída com paredes de tijolos (adobe) assentadas sobre pedras,
que impediam que o barro absorvesse a água do solo. Era comum o uso de revestimentos de
gesso na parte posterior
da parede, também visando à impermeabilização.
SAIBA MAIS
Além de ser de baixo custo e ter material em abundância, o adobe não exigia muitos
instrumentos para a produção nem conhecimentos técnicos exigentes; mais que isso, tratava-
se de um excelente isolante térmico, que mantinha a temperatura interna mais amena
no verão
e ajudava a reter o calor no inverno, sobretudo com o auxílio de lareiras e braseiros.
Outra intervenção na paisagem extremamente popular na Grécia Antiga foi o teatro. Tanto nos
centros urbanos como nas regiões mais periféricas, os teatros eram importantes espaços de
sociabilidade, religiosidade e
discussões políticas. No caso ateniense do Período Clássico, o
Teatro de Dionísio abrigava importantes festivais no inverno e no verão. Especialmente no
verão, atraía centenas de estrangeiros que visitavam a cidade para
assistir à performance de
ditirambos, às peças de Aristófanes e a outros comediógrafos, mas sobretudo às tragédias
célebres de Ésquilo, Sófocles e Eurípides. Aliás, no mundo contemporâneo, muitos teatros da
Antiguidade seguem sendo utilizados
para seu propósito original.
SAIBA MAIS
Em julho de 2020, a peça Os persas , de Ésquilo, foi encenada pela primeira vez no Teatro de
Epidauro, um dos mais importantes da Antiguidade. Por força da pandemia do novo
coronavírus, a adaptação foi
transmitida ao vivo pela internet para o mundo inteiro.
Era bastante frequente que a estrutura do teatro interagisse com a topografia local. Entenda
melhor com explicação abaixo:
Foto: Shutterstock.com
CAVEA
A cavea (Espaço destinado aos espectadores.) era, geralmente, afundada em uma encosta
natural, o que diminuía os custos de construção
e aproveitava a o caráter íngreme das colinas
para definir as fileiras em que ficaria a audiência. Com sua forma hemisférica, a cavea
semirredonda garantia a propagação do som e se ajustava à orchestra .
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ORCHESTRA
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SKENE
Logo após a orchestra ficava o espaço conhecido como skene , formado por um edifício de
dois ou três pavimentos que funcionava como um camarim, a partir do qual os atores entravam
e saíam de
cena. Como eram frequentemente construídos em encostas, o público também
ficava diante de grandes vales e colinas. Acredita-se que a construção de skenes mais altas
pode ter funcionado como incentivo
para reter a atenção dos espectadores nas ações que
ocorriam na orchestra .
Em muitos casos, skenes de madeira eram desmontadas ao fim dos festivais teatrais. No
entanto, muitos teatros acabaram substituindo essa prática por edifícios perenes, feitos de
pedra. Credita-se ao tragediógrafo
Sófocles o uso de pinturas na skene (skenographia ) para
a composição do cenário de suas peças. Também é bem-documentado o uso de maquinários
que interagiam com as estruturas originais do teatro.
EXEMPLO
O ekkyklema , por exemplo, era um dispositivo móvel que permitia o deslocamento dos atores
no palco por meio de uma plataforma. Alguns atores, quando a necessidade cênica se
impunha, eram elevados com
guindastes. A versatilidade do espaço, portanto, estimulava
inovações cênicas.
É necessário insistir que o espaço teatral era um recinto sacralizado, de modo que tais
estruturas compunham um edifício religioso, e não um espaço rigorosamente utilitário. A
posição privilegiada que o sacerdote de Dionísio ocupava, por exemplo, no principal
teatro
ateniense, mostra o valor atribuído à religiosidade. A presença de altares nos teatros é outro
elemento que destaca a relação íntima entre a execução das peças e a ritualização do
espetáculo. Estudos recentes também
mostram que o espaço era utilizado para debates
públicos, sobretudo na Atenas democrática: a estrutura permitia, em última instância, que todos
pudessem ver e ser vistos, o que reforçava ideologicamente a questão da isonomia e da
isegoria, princípios extremamente valorizados nos discursos políticos atenienses.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
E) As estruturas metálicas usadas na cobertura dos telhados foi uma técnica onipresente ao
longo dos séculos.
B) Considera-se que o ponto em comum entre elas era a sobriedade, escassez de detalhes e
economia nas formas.
D) As ordens jônica e dórica representaram um estilo tão marcante que nenhum arquiteto
construiu edifícios que utilizassem elementos de ambas simultaneamente.
E) As ordens gregas não existem, são uma invenção posterior e que não se confirmam com
estudos específicos.
GABARITO
1. Em relação às técnicas e aos materiais usados nas construções dos edifícios gregos,
pode-se dizer que:
As ordens gregas são fruto das variações das próprias pólis que, ainda que tivessem relação
entre si, assumiam perspectivas específicas. Foram organizadas pelos romanos, característica
recorrente desse grupo, como destacado na afirmativa A.
MÓDULO 2
Relacionar arte da arquitetura na Roma Antiga às estruturas de poder
Contudo, seria um equívoco sustentar que a arte e a arquitetura romanas foram simples
processos de emulação da arte e arquitetura gregas. Ainda que seja possível abordar esses
fenômenos de modo conjunto, agrupados sob o qualificativo “greco-romano”, a
influência grega
precisa ser relativizada a partir de pelos menos três pontos importantes:
Arraste para ler o conteúdo.
Α
Não há concepção de plágio na Antiguidade, fato que depõe contra a ideia de uma arte
nacional que serviria de medida para outras nações.
Parte significativa do que conhecemos dos gregos depende das reproduções e das narrativas
que os romanos fizeram a seu respeito, o que coloca em xeque a noção de originalidade
helênica.
Não há cultura que sobreviva sem contato com outras culturas e, no caso romano, apesar da
aproximação óbvia com a cultura grega, influências de várias outras sociedades são visíveis.
ARQUITETURA ROMANA
Em meados do século VIII a.C., os arqueólogos identificaram as primeiras ocupações da
cidade que era fundada à margem esquerda do rio Tibre. A planície do Lácio era pantanosa e
cercada por florestas. Era também um ponto estratégico para as rotas comerciais
do mar
Tirreno, pela ligação que fazia entre a Campânia, ao sul, e a Etrúria, ao norte. Nessa região
foram erigidas as cabanas do sítio original, feitas com materiais bem simples, demasiadamente
perecíveis para que deles
tenhamos apenas vagas notícias, mas também suficientemente
capazes de deixar os vestígios que confirmam sua existência.
As mudanças na cidade também envolvem a relação com o espaço, e a religiosidade não fica
de fora dessa equação. O espaço doméstico era marcado por uma profunda dimensão de
sacralidade. Não era apenas o domínio do pater familias ,
que exerceria seu poder de mando
como um sacerdócio; era também o espaço no qual os espíritos dos antepassados viviam.
A cidade, porém, não é um simples conglomerado de casas e essa concepção também foi
expressa pela via religiosa: os romanos entendiam que o que havia de sagrado em cada
domus era também compartilhado no espaço comum,
no espaço do fórum. A experiência de
formação das pólis gregas oferece mais do que uma analogia, mas um sintoma de práticas
mediterrâneas compartilhadas. Em outras palavras, o desenvolvimento das cidades foi
acompanhado
da noção de que há espaços comuns que pertencem a todos sem pertencer a
ninguém em particular.
Foto: Shutterstock.com
Ruínas do Fórum Romano , Itália.
O fórum era a expressão material da consciência de fazer parte de uma comunidade. Além dos
prédios administrativos, onde as instituições do governo foram construídas, era também o
centro jurídico, onde os negócios públicos e as discussões legais eram
realizados. Também era
o centro religioso da cidade: diversos rituais e festividades eram periodicamente realizados na
busca de uma relação harmoniosa com os deuses. O fórum foi o coração urbanístico e
arquitetônico de
Roma, ponto de ser referência a partir do qual compreendiam irradiar-se todos
os caminhos, visto como a origem da malha urbana.
VOCÊ SABIA
Antigas narrativas diziam que Rômulo, ao fundar a cidade, mandou escavar um poço na região
do Fórum. Os primeiros resultados das colheitas anuais eram lançados nele como sacrifício
coletivo. Já em II d.C., o imperador Sétimo Severo mandou erigir um monumento
que marcava
esse ponto central: o Umbilicus Urbis Romae , “umbigo da cidade de Roma”.
Ainda que seja um marco arquitetônico do início da República, sobretudo por ter sido dedicado
aos cônsules em 509 a.C., acredita-se que sua construção tenha começado em 580 a.C. sob a
iniciativa do último rei etrusco, que mobilizou seus artistas para
viabilizar a obra monumental.
Reforça essa hipótese a estrutura gigantesca que se erguia em uma plataforma de quase 55
metros e que tinha apenas seis colunas frontais ladeadas por escadarias íngremes e largas.
Diferentemente
dos templos gregos, os ornamentos inseridos no topo do telhado eram
símbolos da opulência do edifício. O mais admirado era a escultura de Júpiter em uma
carruagem, feita em terracota, situada no topo do frontão. De acordo
com testemunhos
literários, o original foi substituído por uma versão em bronze que data de 296 a.C.
É impossível ignorar a influência da arquitetura grega, sobretudo pela adoção das ordens
dórica e jônica, pelo uso de colunas, capitéis, estruturas em pedra e proporções. Também são
notáveis os esforços para manter algumas características tradicionalmente
latinas. É preciso
recordar que, ao final da República, Roma já dominava parte significativa do mundo conhecido.
Por essa razão, controlava inúmeras rotas comerciais que garantiam enorme afluxo de
produtos para a capital.
As construções se tornaram mais diversas e menos dependentes das
matérias-primas locais. Como não há forma sem conteúdo e conteúdo sem forma, é
compreensível que a diversificação das técnicas de construção e ornamentação
não tenha
resultado apenas das exigências locais, dos contatos culturais e da criatividade dos arquitetos,
mas também da oferta de condições materiais que a expansão do território garantiu.
Foto: Shutterstock.com
Estátua do Fauno na casa do Fauno nas ruínas de Pompeia, Nápoles, Itália.
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Foto: Shutterstock.com
Obviamente, esse tipo de domus era mais exceção do que regra. Ainda que Roma
tenha se tornado extremamente rica, a maioria da população era empobrecida e,
portanto, incapaz de adquirir e garantir a manutenção
de residências similares.
VOCÊ SABIA
O episódio mais conhecido ocorreu em julho de 64 d.C., quando um grande incêndio afetou
diversas zonas da cidade de Roma. O fogo se alastrou com enorme velocidade e durou seis
dias, segundo relatos. As causas são desconhecidas. É possível que tenha começado
porque
algum morador fez uso de fogo no interior de seu apartamento para se aquecer ou preparar
uma refeição. Alega-se também que o imperador da época, Nero, teria ordenado esse incêndio
para desapropriar as
regiões e construir um complexo palaciano. A despeito da causa real,
esse grande incêndio estimulou a promulgação de leis que criavam protocolos mais rígidos
para as construções.
ARQUITETURA DO ESPETÁCULO
Ainda que os templos tenham sido a forma dominante na paisagem, a arquitetura romana
tornou-se célebre pelos edifícios destinados aos espetáculos.
O circo (circus ), por exemplo, prioritariamente destinado a corridas de bigas, podia abrigar
eventos de caça, procissões e outras atividades religiosas. Seu formato lembra a letra “U”,
ainda que as laterais
fossem mais compridas do que a analogia sugere. Acomodavam, em
média, corridas de até doze carros. As dimensões também eram bastante variáveis.
Foto: Shutterstock.com
Interior do Circus Maximus, estádio de corrida de bigas , Roma, Itália.
Destaca-se nesse estilo o chamado Circus Maximus , localizado no coração de Roma, entre
os montes Aventino e Palatino. Com cerca de 621m de comprimento e 118m de largura, podia
acomodar aproximadamente 150 mil pessoas.
O início de sua construção é atribuído ao rei
etrusco Lúcio Tarquínio Prisco, e durante vários séculos o espaço sofreu intervenções,
sobretudo restauros por incêndios ocorridos em I a.C. A estrutura de pedra só foi construída
durante o governo de Trajano (98 a 117 d.C.).
Os teatros romanos, ainda que influenciados pela experiência grega, foram construídos com
técnicas e materiais bem distintos. As estruturas, erigidas com madeira ou pedra, dependendo
da região e da fonte de financiamento, diferenciam-se bastante da inspiração
helênica,
sobretudo por força dos avanços técnicos.
Os romanos já não dependiam da topografia das encostas para produzir a arquibancada: era
mais frequente o uso de estruturas bem-assentadas no solo, com vigas profundas, para
garantir apoio seguro aos lugares destinados ao público. O teatro assumia quase
sempre uma
forma semicircular, lembrando a letra “D”; a orchestra , diferentemente da circular dos teatros
gregos, acompanhava a forma semicircular. Os prédios altos (scenae )
também eram
presentes e cumpriam função semelhante à dos teatros gregos.
Os anfiteatros eram arenas ovais quase totalmente cercadas por assentos. O anfiteatro
permanente mais antigo conhecido fica em Pompeia. De acordo com uma inscrição no edifício,
Quinctius Valgus e Marcus Porcius patrocinaram a obra com recursos próprios
e com a devida
anuência dos magistrados locais. Localizado na parte oeste da cidade, media 135m x 105m
externamente.
Contudo, como é notório, o anfiteatro mais famoso e influente de Roma, símbolo da cidade até
os dias atuais, é o Anfiteatro Flaviano, o famoso Coliseu. O edifício monumental contava com
quatro andares que avançavam por 52m de altura, apoiados em uma estrutura
de concreto
que, por sua vez, assentava-se em fundações com cerca de 12m de profundidade.
Não menos surpreendente foi o tempo utilizado para a construção dessa obra: as primeiras
pedras foram colocadas no ano de 68 a.C. e sua inauguração ocorreu por volta de 79 a.C. O
local escolhido foi o lago artificial criado por Nero na região afetada
pelo grande incêndio de 64
a.C. Essa decisão, amparada na controvérsia do incêndio, provavelmente buscava oferecer
uma resposta à impopularidade de Nero e garantir prestígio político para o imperador
Vespasiano, fundador
da
dinastia Flaviana, que então assumia o poder.
A política não estava presente apenas na oferta de tais espaços. O Coliseu, em particular, se
tornou o símbolo da famosa “política de pão e circo” (panis et circensis ), tão discutida e objeto
de intermináveis controvérsias.
VOCÊ SABIA
Por falar em animais, você sabia que a maioria deles não fazia parte da fauna italiana? A
documentação literária menciona que esses espetáculos ocorriam na parte da manhã e que
elefantes, leões, leopardos e até tigres eram colocados na arena para enfrentar
gladiadores.
Trazê-los de outras regiões era um método de reforçar o poder imperial e mandava uma
mensagem – que Roma era tão grande que se estendia até onde viviam animais exóticos.
Ainda que pouco provável, a documentação também menciona as chamadas naumaquias,
combates que simulavam algum enfrentamento naval célebre de gregos e/ou romanos.
MONUMENTALIDADE ROMANA
O Circus Maximus e o Coliseu são símbolos do vibrante investimento que os romanos fizeram
em sua paisagem. Em especial, estão inseridos em um processo mais amplo de urbanização
da cidade que, em período relativamente
curto do ponto de vista histórico, produziu
transformações que geram espanto e curiosidade intelectual. Como vimos, a cidade fundada
no século VIII a.C., com seus primeiros assentamentos bem simples, gradualmente se
converteu
em centro do mundo (urbi et orbi ), a ponto de se referirem ao Mediterrâneo como
mare nostrum , nosso mar, já que todas as praias desse mar estavam sob domínio romano.
Essas transformações, ainda que em menor
medida, também se mostraram presentes nas
províncias, sobretudo nos esforços de assegurar instrumentos adequados de administração e
manutenção do poder imperial.
O início dessa malha viária se deu por volta de 300 a.C., mas os primeiros esforços seriam
provavelmente incapazes de projetar as dimensões que atingiriam. A mais famosa de Roma é
também a mais antiga. A Via Ápia, construída em 312 a.C., que ligava Roma
à cidade de
Cápua, ficou conhecida pela repressão que o então general Marco Licínio Crasso imputou a
um grupo de gladiadores revoltosos liderados pelo trácio Espártaco. Crasso capturou cerca de
6 mil revoltosos e os crucificou
ao longo de toda a Via Ápia.
SAIBA MAIS
Calcula-se que 372 grandes estradas foram construídas pelos romanos, totalizando cerca de
400 mil quilômetros, dos quais 80 mil eram calçados com rochas de basalto, e boa parte ainda
se encontra em uso. Os chamados miliários (miliarium )
eram pontos de referência apensados
ao longo das estradas em intervalos médios de 1.500 metros. Eram colunas de base retangular
que indicavam o número da milha em questão. O Miliarium Aureum , construído
por Augusto,
representava o marco zero de todas as estradas.
Não menos emblemáticos foram os aquedutos. A cidade de Roma, por exemplo, era
abastecida por onze aquedutos na época final do império, com longitude total de 426km,
fornecendo 200 mil litros diários de água. Eles
também eram fundamentais para o fornecimento
de energia hidráulica, necessária para o funcionamento de moinhos e serrarias.
Foto: Shutterstock.com
Arco de Druso, um antigo arco em Roma , Itália.
A maioria dos canais era subterrânea e garantia o fluxo de água por meio da gravidade e com
ligeiras inclinações. Diversas pontes foram construídas para lidar com a topografia. Esses
sistemas de aqueduto também incluíam tanques de sedimentação, diminuindo
a quantidade de
impurezas na água. O fluxo era regulado por comportas, e o escoamento levava a fossas e à
própria rede de esgotos.
A monumentalidade das obras não é isolada das demais construções que, tomadas em seu
conjunto, reforçam a excepcionalidade romana.
SAIBA MAIS
As maquetes produzidas e expostas pelo Museu della Cività Romana são esclarecedoras para
visualizarmos o crescimento da urbs .
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. A RESPEITO DO FÓRUM ROMANO, PODE-SE DIZER QUE:
B) Sua criação resultou de uma iniciativa dos plebeus, que já não admitiam ver seus problemas
resolvidos pelos patrícios e desejavam um espaço público para discuti-los.
C) Foi resultado de uma decisão democrática e coletiva, planejada com vistas a destinar os
tributos à construção de obras monumentais que exibissem o poder político dos patrícios.
D) Sua criação foi uma iniciativa dos reis etruscos que desejavam aprofundar os laços
comunitários dos povos latinos que estavam sob seu governo.
E) É um espaço marcado por profunda religiosidade que resultou das demandas por espaços
públicos que pertencessem a todos sem pertencer a ninguém em particular.
A) As estradas foram construídas por cidadãos livres e ricos que estavam envolvidos no projeto
de melhorar o acesso da plebe à capital do império.
B) A construção das estradas era uma estratégia de governo para angariar votos para os
senadores.
GABARITO
2. O ditado Todos os caminhos levam à Roma possui lastro em sua famosa rede de
estradas. Em relação a elas, assinale a única alternativa correta.
MÓDULO 3
Mesopotâmia .
ATENÇÃO
Como se deduz, a data de 3.600 a.C. possui um caráter arbitrário, pois o desenvolvimento das
cidades não foi um fato momentâneo, precisamente situável na cronologia, mas resultado de
um processo gradual que, por volta dessa época, atingiu características
que historiadores e
arqueólogos julgaram claras para estabelecer esse marco.
COMENTÁRIO
Muitos vestígios chegaram a nós dada a baixa umidade da região e também porque a ausência
prática de madeira estimulou construções com materiais menos degradáveis, sobretudo tijolos
de argila. No entanto, e a despeito de dificuldades ou favorecimentos
ecológicos, os povos
sumérios e acádios produziram intervenções no ambiente com recursos e inventividade que
merecem atenção. Ainda que o patrimônio material tenha sido afetado ao longo do tempo,
restando de muitos edifícios
apenas a planta baixa, o corpus é amplo e rico.
TIJOLOS
ROCHAS
TIJOLOS
O material básico utilizado nas construções era a argila, tanto na fabricação de tijolos como
na função de argamassa.
ROCHAS
O uso de rochas era mais incomum, mas presente. Eram obtidas tanto pela coleta de
pedras (As mais frequentes eram basalto, calcário e arenito.) soltas como pela extração de
blocos. As pedras foram utilizadas na construção
de paredes independentes ou de contenções,
plataformas e detalhes arquitetônicos, como colunas, escadas e soleiras de portas.
ETAPA 03
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Tradicionalmente, os analistas dão maior ênfase aos templos e palácios, sobretudo pela
influência das autoridades que os comandavam, pela disponibilidade de vestígios e pelo
caráter monumental da arquitetura. Porém, os espaços domésticos passaram a ser
reconhecidos não apenas por serem os núcleos da vida cotidiana, mas da unidade
socioeconômica básica, valorizando não só as formas de construção como também os
artefatos que a compunham e o modo com que interagiam e se
integravam à paisagem.
CASA
Seria difícil estabelecer um modelo de casa na Mesopotâmia. Sabe-se que as casas com pátio
(tarbaṣu , em acadiano) eram o tipo predominante. Ao norte da Babilônia, casas menores
eram mais frequentes do que na Baixa
Mesopotâmia.
Na cidade de Ur, duas áreas de casas foram encontradas bem-preservadas. Em uma delas, foi
possível conhecer o nome do proprietário, um comerciante chamado Ea-nasir. Essa casa de
dois pavimentos foi construída com tijolos cozidos e tinha um pátio central
que se comunicava
com todos os cômodos. Em uma sala longa e estreita foi incluída uma escada que conduzia ao
segundo andar. Em todas as cinco salas foram encontradas tumbas no subsolo. A espessura
da parede era bastante
significativa e alguns autores acreditam que o proprietário buscava
expressar prosperidade e opulência com isso.
VOCÊ SABIA
Curiosamente, nessa casa foi encontrado o registro escrito mais antigo de uma reclamação,
feita contra o próprio Ea-nasir.
A noção de casa não se restringia às paredes que delimitavam o espaço doméstico. Os povos
mesopotâmicos muitas vezes descreveram construções maiores, como templos e palácios,
com grandes famílias. Diversos estudos mostram que regiões como Diyala, Ur e
Nippur,
distritos residenciais, eram compostas de casas grandes, amuralhadas e bem-equipadas, e
uma maioria de casas pequenas e pouco mobiliadas que se situavam próximas a elas, quase
sempre com paredes compartilhadas.
Cômodos especializados (cozinhas, banheiros,
santuários domésticos etc.) eram exceções, incluindo espaços para sepultamento de ricos
túmulos. Arqueólogos oportunamente observaram que, graças às características da
construção,
essas casas eram bem maleáveis e com bastante frequência paredes eram
derrubadas ou erguidas para ampliar uma residência ou reduzi-la, por força de novas
configurações familiares ou por dificuldades financeiras que obrigavam
o proprietário a alugar
ou sublocar algum cômodo.
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Trata-se de um modelo circular feito de argila que teria sido produzido entre 2900 e 2460
a.C. Foi encontrado em contexto privado e tinha fins religiosos: era um objeto votivo
relacionado ao culto de ancestrais e que poderia também servir a fins apotropaicos.
Os
arqueólogos relataram que esse objeto foi cuidadosamente alocado em uma superfície
rodeada de tijolos e acompanhado de vários outros objetos de cerâmica. Não menos
curioso é o fato de que seu formato não possuía equivalente
com as edificações da
cidade de Mari na época, em geral construídas em forma retangular ou quadrangular.
Mesmo que tais modelos tivessem finalidade religiosa, podem ter sido usados como referência
e estudo de edifícios que pretendiam construir. Essa hipótese não é desprezível, sobretudo
porque a fragilidade das construções foi objeto de atenção dos governantes
antigos, com
destaque para
Hamurabi. Contudo, ainda que seja arriscado caracterizar esses artefatos como
maquetes, não há como ignorar que são
excelentes documentos para compreender as
experiências domésticas dos mesopotâmicos. Afinal, eram a expressão de uma concepção de
moradia que só poderia estar vinculada à experiência real, inclusive do ponto de vista da
matéria-prima.
HAMURABI
COMENTÁRIO
Sobre o Hamurabi, no parágrafo 229 de seu famoso códice legal, tomamos conhecimento de
que pedreiros que edificassem casas sem a devida fortificação poderiam ser condenados à
morte caso o prédio tombasse e matasse o contratante.
PALÁCIO
O palácio não era apenas uma residência, mas também o lugar de atividades de cunho
administrativo, burocrático, industrial e cerimonial. Por aglutinar tantas dimensões importantes
para a vida em sociedade, deveriam ser bem maiores do que as casas regulares.
Além desse
aspecto prático, a monumentalização desses edifícios ocorreu porque os reis gozavam de
recursos de que a maioria não dispunha e buscavam exibi-los publicamente para legitimar seu
poder.
PÁTIO
DECORAÇÃO
PÁTIO
DECORAÇÃO
A decoração interna também era rica. As paredes eram adornadas com pinturas contendo
cenas cerimoniais; entre os assírios, relevos esculpidos representavam atividades de guerra e
caça.
Um dos maiores palácios conhecidos, com cerca de trezentos cômodos, foi identificado em
Mari e pertencia ao governador Zinri-Lim, coetâneo de Hamurabi (séc. XVIII a.C.).
SALA DO TRONO
ESPAÇO DE ABRIGO
PRIVACIDADE NOS CÔMODOS
PORTÃO DE ENTRADA E SEGURANÇA
CONSTRUÇÃO EM ARGILA
SALA DO TRONO
A sala do trono continha uma escada em espiral que conduzia ao telhado para observações
astronômicas e cerimônias específicas, e um caminho de pedras para guiar as rodas de um
braseiro portátil que garantia conforto no inverno.
ESPAÇO DE ABRIGO
Além da família que governava, o espaço abrigava também os funcionários mais próximos,
como guardas reais, militares, escribas e demais responsáveis pela manutenção diária do
espaço.
CONSTRUÇÃO EM ARGILA
As escavações também revelaram cerca de 25 mil tabletes de argila, que demonstram não
apenas a importância de Mari no contexto da Mesopotâmia, mas também a atividade
administrativa que o prédio sediava.
Outro exemplo bastante estudado é o palácio de Assurnasirpal II (883-859 a.C.), um dos reis
mais conhecidos da história mesopotâmica, por sua política de expansão territorial e pelo
desenvolvimento de importantes
centros de poder.
Seu projeto arquitetônico mais destacado foi a construção de uma nova capital na província de
Kalhu, localizada à margem leste de um antigo leito do rio Tigres. Em seu quinto ano de
governo, abandonou a região de Assur e migrou para Kalhu, onde fez investimentos
dos quais
se destacam uma muralha de aproximadamente 7,5km de circunferência, templos e o referido
palácio. A área do palácio mede 200m no eixo norte-sul e 120m de leste a oeste.
Várias entradas garantiam acesso ao palácio, que foi ricamente adornado com colossos de
touro e leões com rostos humanos.
MATERIAIS
Registros sugerem o uso de madeiras exóticas, tijolos vitrificados e bronze na sua construção.
A arqueologia não pôde confirmar outras informações presentes na documentação literária,
mas os vestígios conhecidos são bastante impressionantes. Um muro de
contenção feito com
grandes blocos de calcário, com aproximadamente 10m de altura e 6,5m de largura, era uma
das marcas desse edifício. Atualmente, os restos do palácio ainda cobrem uma área de quase
25.000m2.
DECORAÇÃO
As paredes eram decoradas com relevos e esculturas. Havia também um pátio interno menor,
alinhado com três grandes cômodos de paredes revestidas de pedra onde foram esculpidas
essas imagens. Os arqueólogos britânicos do século XIX extraíram parte desses
relevos e
levaram para seu país de origem. Atualmente, encontram-se expostos no British Museum, em
Londres.
TEMPLOS
Arraste para ler o conteúdo.
Entre os sumérios, valorizava-se uma base retangular com acesso pelas escadas.
II
III
Talvez seja uma tarefa impossível, ignorar todos esses fatores que povoam nosso imaginário
quando nos dedicamos a pensar a história do Antigo Egito. Provavelmente, não seja nem
mesmo recomendável, já que a história das sociedades é, também, a história
dos usos e das
recepções da cultura dos povos do passado.
ATENÇÃO
No entanto, é preciso lembrar que as experiências históricas dos egípcios não se resumem (ou
se confundem!) com toda essas narrativas que prescrevem uma forma de vida exótica,
luxuosa, opulenta, mágica e supersticiosa.
COMENTÁRIO
A arquitetura funerária tinha uma função principalmente política e, portanto, também era
destinada às necessidades de uma pequena parcela de vivos. A opulência cumpria a função de
produzir distinção social, reforçar as hierarquias e assegurar privilégios.
Ainda que
eventualmente alguma pessoa das camadas menos abastadas tenha gozado de enterros
pomposos por algum casuísmo, o que há de certeza é que a arquitetura funerária pode até ser
destinada aos mortos, mas só àqueles
que foram ricos e poderosos em vida.
No entanto, a compreensão que os egípcios tinham da morte era em nada parecida com a
nossa. Como explicou Cardoso (1982, p. 103-104), até o terceiro milênio antes de Cristo,
acreditava-se que a sobrevivência à morte era privilégio dos reis, que teriam
uma forma
duplicada de si, um “princípio do sustento” que os egípcios designavam ka . A mumificação
dos cadáveres é tributária da crença de que era preciso manter o corpo íntegro para
garantir a
vida eterna; a arquitetura funerária, nesse caso, garantiria as condições para o usufruto dessa
vida. As pirâmides são o principal símbolo dessa mentalidade que foi impressa na arquitetura.
MASTABAS
Esses edifícios, do ponto de vista prático, ofereciam proteção contra ladrões de túmulo e
animais necrófagos, mas a suntuosidade é tributária da exibição pública do poder do morto
(sempre faraós ou altos funcionários) e, como vimos, da necessidade religiosa
de assegurar a
preservação do corpo. A estrutura acima do solo contava com um pequeno altar para que
familiares e sacerdotes levassem comida e outras oferendas para o morto. Em seu interior, as
câmaras mortuárias eram cavadas
na rocha e forradas com madeira. Estátuas dos falecidos
também foram encontradas pelos arqueólogos.
Ainda que as mastabas não tenham a fama das pirâmides, é notável que essa forma inicial
tenha enorme influência nos desenvolvimentos ulteriores. Ainda no Reino Antigo – considerado
“O tempo das pirâmides” –, uma estrutura bastante conhecida foi erigida.
Além de garantir
abrigo ao corpo morto do faraó Djoser (III Dinastia), assegurou a fama de Imhotep como o
primeiro arquiteto da história.
Apesar de não ter nascido em família nobre, Imhotep tornou-se vizir do faraó, e é conhecido
não apenas pela construção da primeira pirâmide de que temos notícia, mas também por seus
conhecimentos médicos. Após séculos de sua morte, durante o Reino Novo,
foi deificado na
cidade de Mênfis. Acreditava-se que a arte de construir com pedras tenha sido uma invenção
sua.
PIRÂMIDE DE DJOSER
A Pirâmide de Djoser tem sua forma escalonada porque é composta de seis mastabas
sobrepostas, de dimensões decrescentes, de baixo para cima. Na época de sua construção,
alcançava 62m de altura com uma base de 109m x 125m e era revestida de pedra de calcário
branca polida.
A Pirâmide de Quéops, atribuída ao arquiteto Hemiunu e construída por volta de 2550 a.C.,
segue muito atentamente essas preocupações e dá indicativos de como o planejamento era
bem mais rigoroso do que podemos descobrir por meio dos indícios. O nivelamento
do solo
apresenta um erro de apenas 18mm. A base quadrangular de 230m de lado possui um erro de
apenas 25cm. Não menos curioso, os lados estão orientados para cada um dos pontos
cardiais, já que os egípcios acreditavam
que as estrelas do norte representavam os deuses no
outro mundo.
VOCÊ SABIA
O monumento, dedicado ao faraó que a denomina, é a única maravilha do mundo antigo que
sobreviveu e que se exibe aos turistas que a visitam na necrópole de Gizé, com seus
imponentes 146,5m de altura. A massa da pirâmide é de aproximadamente 6 milhões
de
toneladas e seu volume interno é de cerca de dois milhões e meio de metros cúbicos.
A documentação antiga sugere que a obra teria levado vinte anos para ser concluída. Se esse
prazo é correto, também é correto afirmar que foram necessárias a instalação de 800 toneladas
de pedra por dia, ou doze blocos por hora, dia e noite, sem intervalo.
Não menos curiosa é a perícia dos construtores, que asseguraram uma abertura média das
juntas de apenas 0,5mm de largura. O material não era necessariamente abundante na região.
O calcário foi extraído do rio Nilo, bem como 500 mil toneladas de argila
usadas como
argamassa, mas as pedras de granito, que pesam entre 25 e 80 toneladas, vieram de Assuã,
no sul do Egito, a 950km da atual capital Cairo, e 800km distante do local da construção. A
logística, portanto, também
impressiona, sobretudo porque a única forma viável de transportar
esse material era através de embarcações que atravessassem o Nilo.
Foto: Shutterstock.com
Templos de culto
Foto: Shutterstock.com
Templos mortuários
Suas características arquitetônicas são bem próximas, exceto pela localização, já que os
templos mortuários tendiam a ficar nas cercanias do sepultamento do faraó, pelo menos até o
Reino Médio. No limite, ambos cumprem funções de culto, sobretudo porque
os faraós eram
reis divinizados; contudo, os templos dedicados aos deuses parecem ter concentrado funções
administrativas menos presentes nos templos mortuários, com ênfase no Reino Médio.
Arraste para ler o conteúdo.
As construções mais antigas foram feitas de tijolos cozidos e, por razões diversas, não
sobreviveram ao tempo.
II
Muitos templos foram construídos a partir das estruturas de templos anteriores, localizados no
mesmo lugar, produzindo diversas camadas de construção que interditam um conhecimento
mais acurado dos edifícios que precederam os sobreviventes. Destaca-se
também que, após o
período faraônico, muitos templos foram convertidos em igrejas ou fortificações. Outros foram
soterrados para a construção de cidades.
Do ponto de vista histórico, as mudanças foram notáveis: no fim do quarto milênio, eram
santuários discretos em nada parecidos com as grandes estruturas que marcaram a paisagem
a partir do Reino Novo. Grandes propriedades de terra pertenciam aos templos
que, portanto,
também cumpriam uma função econômica.
TEMPLO DE HATSHEPSUT
Sua construção é atribuída ao arquiteto real Senenmut. Há três terraços em camadas que
chegam a quase 30m de altura, conectados por rampas que, na Antiguidade, eram cercadas
por plantas estrangeiras. Colunas protodóricas, decerto um modelo que foi tomado
como
referência pelos gregos antigos, foram erigidas para abrigar o altar. O principal eixo do templo
está alinhado com o nascimento do sol no solstício de inverno. A entrada de luz solar foi objeto
de preocupação dos arquitetos,
que garantiam sua penetração na parte traseira do altar. Essa
exposição não era importante apenas do ponto de vista material, para evitar os efeitos
acumulados da umidade, mas sobretudo pelo aspecto cósmico que orientou
fortemente as
concepções egípcias, expressas também na forma com que praticavam sua arquitetura.
COMENTÁRIO
O egiptólogo Jan Assman designou como “drama cósmico” a visão de mundo dos egípcios,
que não encaravam a realidade de um ângulo basicamente espacial e material (ASSMANN,
2000, p. 73). Em que pese o possível exagero dessa afirmação, a relação com o culto
solar
deixou marcas bastante curiosas na arquitetura.
COMPLEXO DE ABU-SIMBEL
As pesquisas sobre a arquitetura doméstica no Egito têm avançado nos últimos anos, bem
como a análise de outras formas e estruturas de assentamento; no entanto, o fascínio
provocado por esses edifícios e as descobertas arqueológicas frequentes concentram
a
atenção dos analistas nos grandes monumentos.
A) Foram construídas exclusivamente com rochas e metais, razão pela se tornaram tão
resistentes ao tempo e às ações humanas.
B) Tinham por finalidade abrigar o corpo do faraó das intempéries, constituindo-se assim em
um edifício com características absolutamente funcionais e sem qualquer valor político ou
religioso.
C) Desenvolveram-se a partir das mastabas, edificações com base ampla, mas sem as
superfícies triangulares que acabaram por se consolidar.
B) Observou-se que as populações locais não precisaram da agricultura (e, portanto, da gestão
das águas dos rios) para se organizar em cidades.
C) Como o Tigres e Eufrates são rios temporários, com secas regulares ao longo do ano, não
havia necessidade de organizar suas águas, tampouco dependência delas para viver em
cidade.
D) Pesquisas recentes mostraram que a gestão das águas dos rios ocorreu inicialmente de
forma comunitária, sendo o Estado e a cidade um desenvolvimento posterior.
E) A administração das cheias dos rios mesopotâmicos foi feita inicialmente por governantes
egípcios, que exportaram a expertise que adquiriram com a gestão do rio Nilo.
GABARITO
A noção de continuidade da vida é algo muito intenso para os egípcios e as relações de poder
e a arquitetura voltada para a eternidade eram marcadamente mortuárias e, por isso, passam a
ser os principais símbolos de poder arquitetônico.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Você percorreu um longo trajeto neste tema e, ao final, é importante perceber qual o seu foco.
Entender a dinâmica da forma da arquitetura, sua manifestação como arte reconhecida, não
retira sua característica de dialogar com a sociedade e estabelecer
soluções.
Além disso, você deve ter notado que ela dialoga com o contexto, com as demandas sociais,
com a disponibilidade de materiais, as técnicas, os conflitos, a disponibilidade de mão de obra
e as relações de poder.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Carolina. O clássico como problema. Poiésis, v. 8, n. 11, p. 11-24, 2007.
ASSMANN, Jan. The search for god in ancient Egypt. Ithaca: Cornell University Press, 2000.
GOMBRICH, E. H. La historia del arte. Colonia del Valle, México: Editorial Diana, 1995.
OSBORNE, R. Archaic and classical Greek art. Oxford: Oxford University Press, 1998.
EXPLORE+
Navegue pelo site Melammu Project e tenha acesso gratuito a uma série de materiais
que ajudam a entender a arte e arquitetura na Mesopotâmia.
Veja mais detalhes sobre o conceito de clássico no artigo O Clássico como problema ,
de Carolina Araújo, publicado na Revista Poiésis, da Universidade Federal Fluminense
(UFF).
Conheça mais sobre a erupção do Vesúvio e sua importância para conhecer a arte e
arquitetura de Roma a partir do documentário Os últimos dias de Pompeia (BBC, 2003).
CONTEUDISTA
Alexandre Moraes
CURRÍCULO LATTES