O Fundamental da Avaliacéo
Clinica no Paciente Disfagico
Onivaldo Breton
Introdugdo
A avaliagao clinica do individuo adulto portador de disfagia orofaringea, sob
0 ponto de vista do otorrinolaringologista, exige que sejam obtidos informacées
e i templem seis grandes tépicos, que nortearao a in-
vestigacao. O primeiro tépico relaciona-se com a preocupacio de localizar
anatomicamente o problema; em outros termos, em ig
-o-distirbio. A segunda informagao a ser obtida diz respeito a natureza da doen-
a-disfagia, as doencas associadas ou concomitantes € ao estado
fisico decorrente. Uma terceira preocupagao diz respeito a aspiraca ingo-
traqueobrénquica. A quarta questao é relativa a disturbios psiquicos e emocionais,
primérios-e/ou secundarios-a-disfagia. O quinto topico busca saber sobre-o-es~
tado cognitivo do individuo, enquanto ‘o sexto diz respeito ao local onde vive
i i . Serdio feitos comentarios e observacées
sobre cada um dos tépicos, com o objetivo de mostrar a relevancia de cada um.
Fases da Disfagia
A primeira preocupacao é a de saber se a disfagia envolve a fase oral, faringea
ou esofagica. Pode-se ter cada fase isoladamente comprometida, mas também é4 Avaliacéo do Paciente Disfagico
freqiiente que as fases oral e faringea estejam afetadas e, no raro, inclusive a fase
esofagica. Deve-se procurar saber se a lesio é omi io-
inf as : = ean sees
oral-e faringea so ricas em sinais € sintomas, diferentemente do que ocorre na
disfagia esofagica.
Tendo em vista as intimas relagdes anatomofuncionais das fases oral e faringea
e da intima relacdo anatémica e funcional da hipofaringe e da laringe, nao haveré
dificuldade em fazer o diagnéstico topografico na maioria dos casos. Nas fases oral
e geralmente acometem os pacientes séo os seguintes:
* dificuldade de manipulacdo oral e propulsdo do bolo alimentar da boca para
0 es6fago;
* sensagao de parada do alimento na garganta;
* sensacaio de que restam residuos do alimento na garganta e que exigem
clareamento, através do pigarreio ¢ de degluticées multiplas para a sua re-
tirada;
* tosse antes, durante ou imediatamente apés a degluticao;
* sensacaio de engasgo ou afogamento;
+ alteragéo da voz imediatamente apés deglutir;
* falta de ar imediatamente apds ou durante a alimentacao;
* falsa rota ao deglutir, provocando sensacao de afogamento e tosse.
Estas queixas sugerem claramente o local ou locais: a boca, a faringe, a laringe.
O paciente aponta o pescoco na altura da faringe ou aponta a estase na altura
da cartilagem cricdide. A disfagia, na fase esofagica, nao apresenta esta grande
variedade de sinais e sintomas. Geralmente, a-disfagia na-fase esofagica leva o
lo. Deve-se alertar, en-
tretanto, que um ntimero nao desprezivel de individuos com disturbios eso-
fagicos aponta a regido cervical. Adverte-se também que hd casos de disfagia
orofaringea oligossintomaticos, em que a tinica queixa é a sensagao de parada
do alimento. Alteracdo neurolégica também pode-se iniciar com um minimo de
sinais e sintomas, nao havendo, portanto, toda aquela riqueza de queixas ou
de informagées previamente mencionadas.
Causas da Disfagia
A segund: relativa a etiologia, deve levar o especialista a verificar:
+ a doenga que provoca a disfagia diretamente: neuroldgica, otorrinola-
ringoldgica, gastroenterolégica, ou por drogas;
* as doencas sistémicas, e/ou concomitantes, tais como diabetes, cardio-
patia, hipertensdo arterial etc., que favorecem imediatamente ou
o dist9 Fundamental da Avaliacdo Clinica no Paciente Disfagico 5
+ o estado geral do paciente: desnutrica i a
T : utrico, desidratacao, doenga pulm:
levando a hipoxia etc.; : eo
+ 0.uso de sonda nasogastrica, nasoenteral, jejuno ou gastrostomia, traqueos-
tomia, traqueostomia com cAnula com ou sem cuff, ou ventilacao mecanica.
A existéncia de vias alternativas para alimentagao e respiracao deve ser ava-
liada quanto asua necessidade, caso 0 procedimento tenha sido tomado por pro-
fissionais nao experimentados ho trato do individuo disfagico. E possivel que
uma sonda nasogastrica possa ser retirada apés uma avaliacao e reabilitacao,
que uma traqueostomia possa ser fechada apés avaliacdio da via respiratéria e da
degluticéo, 0 mesmo podendo ser dito quanto'a uma gastrostomia. As doencas
vi gd i ; Oo
4 queda da resisténcia imunol6gica, gerando um circulo
so, em particular, uma doenga sistémica pode ser a causadora da disfagia, nao
havendo necessariamente uma causa especifica'’. Ainda sobre doengas, a.insufi-
disfagia, entre outras causas, pela falha no controle, pelo sistema nervoso cen-
tral, da fina coordenagao degluticao-respiracéo™. i é
ca ia, ia = far ail ais’, Eis uma situ-
acio clinica em que ocorre o efeito “cascata”: dificuldade ventilatéria, disfagia,
risco de aspiracdo, desnutrigio e desidratacao, tanto pela doenca quanto pela
disfagia, baixa imunidade, aspiragao, broncopneumonia.
Broncopneumonia Aspirativa
O que foi mencionado ha pouco introduz a terceira questao, que requer atengao
e diz respeito & aspiracao e, conseqiientemente, a broncopneumonia aspirativa.
iante de uma suspeita de disfagia orofaringea, h4 sempre.a preocupagao: 0 pa-_
10, silel
piracao significa aumento de morbidade e de mortalidade e internacao hospita-
lar com elevados custos, principalmente se o paciente for idoso™. A avaliagao pre-
coce quanto aos fatores de risco de aspiracao é, portanto, fundamental.
Alteragdes Nao-organicas
O quatro tépico € o referente as alteragdes emocionais e aos distiirbios psiquicos, pri-
miarios e/ou secundarios relacionados a disfagia. Isto quer dizer que uma altera-
ao nao-organica pode gerar um quadro disfagico e que uma doenga orgdnica acom-
panhada de disfagia pode provocar reacées psiquicas e emocionais que agravam
a disfagia ou prejudicam a recuperacao, espontanea ou promovida por medidas
reabilitativas. A disfagia de fundo ndo-orgdnico, denominada psicogénica, é uma
realidade*, Doencas psicossomiticas, alids, séo altamente prevalentes no Brasil’.6 Avaliagdo do Paciente Disfagico
Alteragdes Cognitivas
A quinta preocupacao apontada é relativa ao estado mental, cognitivo e cul-
tural do individuo disfagico, que pode repercutir sobre sua capacidade de com-
preensio. E importante que sejam seguidas as recomendacées sobre a alimen-
tagio, de colaboracio, de iniciativas e de liberdade de agdo em atividades da vida
didria®*"%, A alteracao do estado cognitivo é devida a causas diversas: deméncia
de qualquer natureza, lesdes do sistema nervoso central, agao de drogas sobre
este, doencas mentais, entre outras. Esta informag&o mostrar-se-4 de maxima
importancia no momento em que os profissionais tiverem de lidar com as difi-
culdades na realizagao da avaliacdo diagnéstica e na deciséo sobre as medidas
terapéuticas a serem tomadas, que irao depender da compreensao e da colabo-
ragao do paciente"”.
Importancia do Cuidador
Por fim, a sexta preocupacdo tem a ver com o cuidador e com o ambiente ou
local onde ocorre a atencao ao doente. O cuidador é figura importante, e a sua
adesio as orientacdes sobre como preparar alimentos e como ministra-los ao pa-
ciente, sua disposicao, seu tempo e sua relacao afetiva com o paciente so
aspectos importantes que devem ser do conhecimento dos profissionais. Cuida-
dos inadequados na técnica alimentar e falta de adesaio da enfermagem as reco-
mendagées da equipe que cuida do paciente disfagico so sérios problemas®.
Sabe-se que idosos cuidados por familiares so mais bem alimentados e tém
menos quadros aspirativos®. Em idosos institucionalizados, disfagicos ou nao,
ocorrem mais quadros aspirativos e mais ébitos por pneumonia, principalmen-
te se forem dependentes, acamados*. Depender de um cuidador significa estar
exposto a maior morbidade e mortalidade'’. Portanto, a equipe que cuida do
disfagico deve saber quais as condigdes familiares ou institucionais para dispensar
os cuidados necessdrios. A questao das disponibilidades financeiras da familia
também deve ser levantada. Dificuldades relativas tanto aos cuidados quanto aos
recursos financeiros podem, eventualmente, levar a equipe a mudangas de con-
duta terapéutica para oferecer maior seguranca ao paciente, por exemplo, quanto
a sua via de alimentagao.
Importancia da Equipe Multidisciplinar
O que pode ser uma outra questiio genérica diz respeito 4 equipe de profis-
sionais desejavel no atendimento do paciente disfagico'®. Nao é irrelevante.
dificil avaliar, diagnosticar e tratar com eficdcia um disf4gico sem equipe mul-
tidisciplinar. A experiéncia mostra que a colaboragao do neurologista e do assis-
tente social e a presenca permanente do otorrinolaringologista, do fonoau-
didlogo, do gastroenterologista, do nutricionista, do psiquiatra e do dentista,