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Afonso de Santa Cruz - O Que Vi Por Lá
Afonso de Santa Cruz - O Que Vi Por Lá
O QUE VI POR LÁ
(Diário de Viagens)
2' edição
- 19 79 -
Lugares:
http://alexandriacatolica.blogspot.com.br
Capa: Irmã Artúris
Direitos Reservados
Edições Rosário
Caixa Postal 3175
80.000 Curitiba P
- R
Br a s i l
2• edição
-1 9 7 9 -
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De Lá pró Cá ...
O Autor
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1. O Santo em farrapos
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do à Cidade Eterna, principalmente da Alemanha e
Estados Unidos, onde o nível de vida é muito su
perior . Acresce que, em todas as viagens pela Ale
manha, vi apenas um mendigo, sentado numa das
ruas de Munique, o qual talvez nem fosse alemão.
De sorte que um alemão ou americano logo se co
move, vendo a insistência chorosa dum mendigo. (A
língua italiana, tida como a mais bela do mundo,
presta-se admiravelmente, para exprimir as nuan
ces mais íntimas do afeto humano) .
Outra manhã, vi várias dezenas de peregrinos
alemães saindo da Pensão dos Padres Palotinos de
Roma, e cada qual depositava na mão do mendigo,
sentado à escada da igreja próxima, uma moeda de
50 ou 100 liras italianas. A atitude do mendigo era
como se isto fosse a coisa mais natural do mundo.
No entanto, recebeu em poucos instantes mais do
que um operário, após muitas horas de trabalho.
E quantos não fazem deste truque fácil o seu
rendoso ganha-pão e até mesmo a profissão de vi
da! Por esta ocasião, andavam mais de trinta mil
desocupados pelas ruas de Roma, havendo uma ver
dadeira exploração de mendicância. Famílias intei
ras, pai, mãe, filhos e filhas menores espalhavam
se pela cidade, principalmente às portas das igrejas,
pedindo esmolas, para de noite, reunirem-se em ca
sa e fazerem o balanço do dia!
Nos primeiros tempos, em Roma, dando a um
mendigo, na parada do õnibus, o dinheiro suficien-
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te para o bonde, um senhor me abordou, pergun
tando: "Você é estrangeiro?'' - "Sim, sou ! " - 11Vo
cê é gentil demais!" - Em forma delicada, este
senhor quis dizer que eu era "ingênuo" demais.
Ouvindo agora que nas proximidades da Basí
lica de São Pedro in Vincolis, na Via dei Serpenti,
na Igreja della Madonna dei Monti, jaz um mendigo,
morto em Roma, aos 16 de abril de 1783, um santo
em farrapos, canonizado pela própria Igreja, - é
para ficar mudo de espanto!
Primogênito, entre 15 irmãos, estudou Bento
Labre até os 16 anos para o Sacerdócio. Mas, su
bitamente, houve uma mudança no seu talento, a
ponto de parecer mentalmente atrasado. Pediu ad
missão entre os trapistas, cartuxos, cistercienses,
mas todos lha negaram. Deixou a sua pátria, a
França, para achar melhor sorte na Itália. Tam
bém lá as negativas foram as mesmas. Imprevista
mente, veiO-: lhe uma luz interna: "Já que a vida é
tão breve, por que não vou imitar a santo Aleixo,
que viveu durante 16 anos, como peregrino desco
nhecido, debaixo da escada da própria casa pater
nal!?" Ainda hoje se mostra, na Igreja de Santo
Aleixo, em Roma, a escada, sob a qual viveu o san
to peregrino.
Desde aquele momento de luz, Bento Labre te
ve uma paz imperturbável no intimo de sua alma.
Passava o dia rezando pelas igrejas, onde havia
adoração perpétua. O povo chamava-o simplesmen
te de "o pobre da Adoração perpétua", ou então,
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"o pobre do Coliseu", porque dormia algumas horas
da noite, sob um dos arcos, onde está gravada a
Estação da Via Crucis, em que Simão de Cireneu
ajuda a Jesus a carregar a Cruz. Durante a noite,
costumava visitar as sete grandes Basílicas de Ro
ma. Alimentava-se do3 restos de comida, que en
contrava pelas ruas e calçadas. Quando recebia di
nheiro, como esmola, parecia arder-lhe na mão co
mo ferro abrasado, e passava-o Jogo adiante a ou
tro, que julgava mais pobre ainda.
O povo comentava que "o pobre do Coliseu"
era de família nobre, e que perpetrara um crime
horrendo, e por isso vagueava pelas ruas de Roma,
rezando e fazendo penitência. O artista António
Cavallucci levou-o, um dia, consigo, para pintá-lo.
O rosto macerado, os olhos encovados e semi-cer
rados, os cabelos negros, espessos e densos, envol
viam-lhe a fisionomia numa doçura sobrenatural.
Embora canonizado pela própria Igreja, ainda hoje
alguns ascetas duvidam em pô-lo como modelo da
perfeição cristã, pois os seus cabelos eram um ni
nho fervilhante de piolhos. Um Santo com pio
lhos!? Inumano! Comparado com o santo "gentil
homem" Francisco de Sales, o corifeu da literatura
francesa do século XVII, que dirigia as damas de
salão para a vida de união com Deus - onde fica
o nosso Bento Labre, com os seus piolhos, os seus
andrajos, o seu silêncio de mendigo profissional!?
A resposta é a frase misteriosa do Evangelho:
"O Espirito sopra onde e como quer!" Os confes-
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sores sugeriam a Bento de entrar, como Irmão lei
go, numa Ordem Religiosa, mas o Santo não se de
moveu. Convencera-se de que podia servir a Deus,
como pobre mendigo e perpétuo peregrino, na Ci
dade Eterna, a exemplo de Santo Aleixo.
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2. Fariseus "lncônscios"
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tiveram a desgraça de cair nas garras dos lobos
sexuais, que sempre rondam pelas ruas e praças
noturnas das cidades.
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tranha parecia apoderar-se de cada um de nós. In
teressante! Anteontem prostitutas, ontem regenera
das, e hoje religiosas, com voto de pobreza, casti
dade e obediência, verdadeiras, genuínas e exclusi
vas esposas de Cristo, que seguem o Cordeiro, para
onde quer que for! Puras até os íntimos pensamen
tos. Comunhão diária. Cantata pessoal com Cristo,
que vive em suas almas, que é a sua própria vida.
Contraste "paradoxal". De verdadeiros animais para
almas puras e consagradas ao Deus invisivel. E a
força? ! E a raiz sempre nova e sempre velha das an
tigas paixões, do velho Adão, que nunca morre?
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desbotada, escorrendo sobre a cabeça. Mas que sor
risos e que alegria! Radiantes como o sol! Tudo
espontâneo, profundo e transbordante! Pareciam
náufragos, que, na segurança do porto, lembram
com galhardia as tempestades que passaram, por
que não há mais perigo de sossobrar. Fitavam-nos,
como se acabassem de baixar do céu, por alguns
instantes, a fim de entrevistarem seres curiosos,
que vieram do mundo.
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Suécia. Caiu no vício, regenerou-se e achou o ca
minho da verdadeira fé, converteu-se ao catolicis
mo e, como tinha um coração capaz de amar muito,
entregou-o, após todas as decepções da vida, ao úni
co Esposo de sua alma, digno de todo o seu amor.
Esta jovem Esposa de Cristo parecia desafiar a
todo o mundo, na sua alegria e felicidade que trans
bordava dos olhos.
E tudo isto!? Como se explica?! "Senhor,
sirvo-te há tantos anos! E estas da última hora,
da undécima hora, são mais felizes do que eu!"
Uma veneração profunda surgiu na alma de to
dos nós, um respeito, semelhante ao do próprio
Cristo, por estas almas humildes. "Quem se humi
lha, será exaltado ! " O Mestre da vida espiritual, S.
João da Cruz, que não contemporizava com as ma
nhas da natureza humana, escreveu nos seus "Avi
sos e Máximas": "Todas as visões, revelações e
dons celestes não valem o menor ato de humilda
de!" Estas Irmãs eram humildes, ao pé da letra,
e por isso felizes, e por isso inspiravam simpatia e
veneração!
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3. A boneca da Santa
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no estábulo". Sentindo algumas Liras, na palma da
mão, o "cicerone" inventou mais algumas barbari
dades históricas, das quais o poverello de Assis tal
vez nunca tomou conhecimento.
Todas estas recordações dissipam-se, como por
encanto, se relembro outra cena, também de relí
quias.
Foi em Lisieux, na França. Cidade de uns
trinta mil habitantes. Clima ameno, temperado,
É a cidade de S. Teresinha do Menino Jesus, a San
ta de Lisieux, a Santa dos nossos tempos. Além
do convento, onde ela passou os últimos anos de
sua vida, e a igreja conventual anexa, vimos a Ca
tedral de S. Pedro, onde ainda hoje se encontra o
Confessionário, em que fez a primeira confissão.
Lá se guarda a cadeira em que sentava, para ou
vir as pregações, nos domingos. Entrando pela
porta lateral, topamos com o aviso: "Por esta por
ta entrava a jovem Teresa Martin, nos domingos,
para assistir à santa Missa."
Na Igreja Conventual, estão conservadas as re
líquias do seu corpo, na urna preciosa, chamada
"urna do Brasil", por ser a nossa pátria o doador
desta urna, por ocasião da Beatificação de Santa
Teresinha. Do lado, está a sala com todas as re
líquias da Santa: o vestidinho de noiva da primeira
comunhão, seus trabalhos manuais, as sapatilhas
brancas, o hábito de trabalho, e até o cacho abun
dante, comprido, louro e ondulado de seus cabelos,
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de que se privou aos 15 anos, para consagrar-se ao
Esposo de sua alma, na Clausura perpétua do Car
melo.
A casa onde ela morava, é um dos pontos mais
pitorescos e atraentes da cidade. É a vila "Buisso
nets". Jardllls verdejantes, algumas árvores copa
das, e no meio, distinta e bem conservada, a casa
da família. No jardim está um grupo de estátuas de
mármore: o pai, sr. Martin, no seu fraque e sapatos
luzidios, barba escovinha, inclinando-se paternal
mente sobre a filha de seus quinze anos, que lhe
pede, com os olhos ardentes e o cacho de cabelos
escorrendo abundante sobre os ombros, a licença
de entrar no Carmelo. A mão pousando sobre os
ombros da "princesa", o pai parece dizer, num
misto de dor e fé sobrenatural, o seu generoso
'1sim".
Entrando pela casa, vêem-se ainda conservados
e intactos todos os móveis e objetos. Tem-se a im
pressão, de que a família foi a passeio, para den
tro de alguns dias voltar. A lareira esperando pe
la primeira acha de lenha. A cama feita e alisada,
com os rendilhados de seda branca. O berço da
santa lembra a infância saudosa. No centro a es
tátua, que sorriu à Teresinha, numa de suas doen
ças.
E de repente, os turistas olham fascinados pa
ra um ponto: sobre um dos móveis estão enfileira
dos, em série, os brinquedos da infância. No cen-
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tro, sobressai uma grande, bela, bem vestictinha bo
neca, com as faces rosadas, olhos azuis, boca en
treaberta, dizendo, de braços estendidos: "Mamãe!"
Um bilhete diz apenas, com brevidade lacônica: "A
Boneca da Santa!" Mas nesta breve inscrição está
condensado um tratado inteiro, sobre o aspecto hu
mano que devemos encontrar, na vida de todos os
santos canonizados pela Igreja.
Os santos não caíram das nuvens. Não nas
ceram santos, mas tais se fizeram à custa dos sa
crifícios mais heróicos. Foram homens como nós,
do mesmo barro de Adão, com as mesmas dificul
dades, quedas, decepções, esperanças, lutas e ideais.
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4. O melhor Professor
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mação jesuítica, para acalentar novamente a alma,
com o sabor das coisas celestiais e eternas.
O Instrutor ou Diretor deste Curso de Sacer
dotes Formados - éramos 28 pessoas, provindas de
10 nacionalidades diferentes - foi o P. Otto Pies,
S. J.. Este cargo exige grande experiência e pro
funda formação espiritual, a par dum ascendente
pessoal muíto elevado.
Quando soube que o Padre Pies esteve quatro
anos e meio detido no Campo de Concentração em
Dachau, nas proximidades de Munique, vítima dos
nazistas, todas as suas palavras revestiram-se de
grande autoridade. O Retiro Espiritual de trinta
dias seguidos, que nos deu, pareciam apenas oito
dias, tão profundos e substanciais que eram. Neste
mês de profundo recolhimento fez duas alusões à
sua prisão dos quatro anos e meio.
Na primeira alusão, referiu-se ao grande Após
tolo São Paulo, que foi posto em algemas e leva
do a Roma, para ser processado. O Padre Otto Pies
foi um dia surpreso, em sua residência, perto de
Munique, por dois oficiais nazistas, que o algema
ram e levaram preso, sem ulterior explicação, ao
Campo de Concentração em Dachau. A princípio o
sacerdote sofreu, como é fácil de explicar, um cho
que nervoso, mas logo uma alegria interna, indi
zível, o invadiu, a ponto de sentir um orgulho san
to, por tornar-se, de alguma forma, semelhante ao
divino Sofredor Jesus. "Foi uma das alegrias mais
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puras que senti em toda a vida", rematou o sacer
dote.
Na outra alusão falou sobre o desânimo, que
pode invadir até os sacerdotes mais santos, quando
não vêem os êxitos imediatos de seus trabalhos e
suores. É o célebre "ponto morto", que de vez em
quando o carro de nossa vida deve passar, para fa
zer as diversas mudanças, na sua marcha ascensio
nal a Deus. Começou a ler, numa folha amarelecida
pelo tempo. Foi a mesma instrução, que fizera a
seus companheiros de prisão, em Dachau, para rea
nimá-los na confiança inabalável em Deus. Cerca de
700 sacerdotes de várias nacionalidades e até um
bispo francês foram jogados num barracão, e for
çados ao trabalho duro.
Cada manhã saíam eles, de macacão enumera
do, como criminosos, para voltar de noite, com os
membros doridos e o corpo alquebrado pelos maus
tratos dos fiscalizadores. A custo o sacerdote con
seguia reler estas folhas amarelecidas, que estavam
prenhes de sofrimentos e confiança em Deus. Ti
nha que escrevinhar de noite, após o trabalho for
çado, à luz duma vela de cebo, com a folha de pa
pel estirada sobre a táboa, que lhes servia de cama.
Parecia o Paulo de ants.mho, que escrevia, com as
mãos acorrentadas, as palavras de animação aos
cristãos de Corinto, Galácia, ll:feso, Tessalõnica, etc.
Foi impressionante aquela conferência! Acre
ditei sinceramente nas palavras aí escritas. Esta
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meditação não foi escrita ao bafejo da calefação ou
à luz fosforescente do quarto, mas sobre uma tá
bua tosca, num macacão de criminoso, e no meio
de gemidos e sofrimentos morais e físicos.
Quando, no fim do grande retiro de trinta dias,
fui a seu quarto com um colega, para agradecer
lhe a dedicação, surpreendemo-lo de pé, rezando
diante de um quadro e de uma vela acesa. Neste
quadro havia dezasseis rostos sorridentes e juve
nis. Jovens estudantes jestútas! O padre estava co
movido. Estes dezasseis rapazes fizeram, com ele,
pelo ano de 1951, uma peregrinação ao Santuário
de Santa Hedwiges em Andechs, e na volta, por
um trágico descuido, um trem rapidíssimo colheu
em cheio o caminhão, sobre os trilhos. Entre os
pouquíssimos sobreviventes, gravemente feridos,
estava o Padre Pies. Dias depois, dezasseis esqui
fes, com as jovens vidas colhidas em flor, enfilei
raram-se, lado a lado, para descerem ao último
descanso. Choque tremendo, do qual o sacerdote
nunca se refez completamente! Estas jovens vidas
teriam talvez feito o seu Retiro Grande.
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Mas a lição mais flagrante, que este mestre da
vida espiritual e apreciado escritor ascético nos
deu, foi bem no inicio do nosso Curso. Escreveu
ele, aliás, uma bela biografia sobre um rapaz cha
mado Karl Leisner, que interrompera os estudos
ao sacerdócio, por ser encarcerado no Campo de
Concentração de Dachau. Estando às portas da
morte, o bispo, um dos concentrados, ordenou-o
secretamente sacerdote, com os recursos rudimen
tares de que dispunham!
Bem no início do nosso Curso, surpreendeu
nos a notícia de que o Instrutor devia submeter-se
à operação de um olho, pois não via desimpedida
mente, como se um objeto opaco lhe interceptasse
a vista. O médico disse-lhe, com certa timidez: "Re
verendo, se não extrairmos o olho, estará em peri
go de morte todo o organismo ! " Sem refletir um
momento, o sacerdote rematou, com a caracteris
tica da lógica inaciana: "Então, que se tire!" Sur
preso por esta resposta, o médico, nem ele mesmo,
estava ainda preparado para a próxima ação, su
geriu-lhe que refletisse por um ou dois dias. O sa
cerdote retruca: "Não há que refletir. O fato é
este!" Não se duvidou mais. A operação se fez. A
tarde do dia seguinte, veio um aviso na tabela: "O
Padre Instrutor espera a visita da orientação men
sal!" Lá fomos um por um, numa hora mais pro
pícia, para apresentar-nos ao Diretor.
Quando entrei no seu quarto, lá estava ele, sen
tado, com o vazio do olho esquerdo encoberto com
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enormes esparadrapos e gazes brancas, enquanto o
olho direito sorria todo aberto e paternal a meu
encontro. Lá pensávamos consolar alguém, e nós
é que saíamos consolidados e confirmados. A con
versa corria tão simples e profunda, como se ele
estivesse no seu quarto em casa, dando como sem
pre as suas diretivas.
Ao despedir-me, disse ele, com a felicidade
dum pai, que pôde fazer algo por seus filhos: "Ofe
reci a operação e os sofrimentos por meus tercei
ranistas! Rezo todo o dia por eles!"
Foi uma lição profunda, inesquecível. Um mes
tre, que ensinou verdades com a palavra e o exem
plo. Que aluno não se sujeita a um tal professor,
que prova com o exemplo o que ensina pelas pa
lavras!
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5. A morte de Pio XII
Quando cheguei a Milão, última etapa antes de
chegar definitivamente a Roma, topei num dos jor
nais com este título enorme: "Pio XII moribun
do!" Notícia alarmante. Cheguei a Roma e o es
tado de Pio XII sempre em grave situação.
Subitamente, aparece nos jornais matutinos de
Roma: "Pio XII morto!" E . . não era verdade.
.
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Mas aconteceu, que a certa altura, um dos sa
cerdotes, percebendo o ar abafado do recinto, foi
por conta própria abrir a janela, para arejar o am
biente. Foi o que bastou. Pio XII morrera . . .
Desta maneira, Pio XII foi "assassinado" jor
nalisticamente. Era só ver o esforço gigantesco, de
como se recolhiam um por um os jornais ainda à
venda, nos diferentes pontos, para evitar uma des
moralização pública dos jornais de Roma. E os
que já foram despachados de trem, avião, para o
estrangeiro? E os avulsos já comprados, em Ro
ma, ficam para provar que o jornalista tem res
ponsabilidades mais graves, do que ele mesmo
suspeita, enquanto a pena foge pelo papel afora . . .
Mas no dia seguinte, os sinos de Roma bada
laram tristes, pausados: Pio XII realmente morre
ra! Um pesar de profunda nostalgia cobriu a Ci
dade Eterna, entristecendo o coração de todos os
romanos.
Espetáculo impressionante foi o cortejo fúne
bre, que transportou o corpo do Papa defunto de
Castel Gandolfo à Basílica Vaticana: o percurso de
longos quilômetros foi literalmente ocupado pelo
povo, que queria ver passar o Papa morto. Espon
taneamente veio-me à memória a frase: "Era de
fato a alma do Povo de Roma!"
Quem se lembra, de que Pio XII salvou a Ci
dade Eterna do bombardeio alemão, na última
Guerra, não deixa de reverenciar a Placa Comemo-
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rativa, na Via della Conciliazione, que o chama de
"SALVATOR URBIS" (Salvador da Cidade) .
N a outra manhã começou a grande afluência
de povo, para ver os restos mortais de Pio XII, na
Basílica de São Pedro. A organização é perfeita,
como sempre nas Cerimõnias do Vaticano. Guar
das palatinas, suiças, pontifícias, sempre gentis,
pacientes, repetindo o seu cantínuo, abafado, mas
decidido "avante", para que as filas intermináveis
continuassem girando, sem congestionarem diante
do catafalco.
Consegui, por detrás do cercado, um posto fi
xo, donde pudesse ver à vontade o grande Pio XII,
estirada livremente sobre o alto catafalco, nos seus
paramentos pontifícios, as sapatilhas brancas, as
mãos postas em prece sobre o peito e o rosário en
volvido entre os dedos. Via-se que consumiu todas
as forças físicas pelo bem da cristandade. Ema
grecido e alquebrado pelos anos, mas o nariz aqui
lino, fortemente arqueado, salientava-se ainda
mais, por falta dos óculos, e lhe dava um ar de
serenidade, mas também de retidão, ainda que
morto e imóvel, ele, que era tão ágil nos gestos,
quando era levado na sede gestatória pela Basílica
Vaticana, durante as grandes festividades e audi
éncias públicas, saudando a todos os turistas e pe
regrinos, que o ovacionavam freneticamente.
Não havia realmente nenhum problema de si
lêncio, na imensa Basílica, onde todos convergiam
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como para um ímã, ao encontro daquele morto,
que jazia silencioso, mas cheio de majestade, no
alto catafalco: todos sabiam que estavam desfilan
do diante dos restos mortais daquele, que haveria
de entrar decididamente, como grande figura, na
História Universal.
Uma senhora, do lado, espontaneamente me
ofereceu o seu pequeno binóculo. Consigo enqua
drar toda a figura, no foco, mas em especial o ros
to, aproximando-o de mim, a poucos passos: sere
no, intelectual, m�s morto. Não estende mais os
braços, com seus gestos vivos e abertos, sorrindo
para todos os visitantes, que o vinham ovacionar
em massas, na Basílica de São Pedro.
Estranho! Aquela cor esverdeada, dum verde
escuro, brilhante, que lhe cobre as faces, não é nor
mal. Logo sussurra-se do lado, que a embalsama
ção era dum tipo novo, e era a primeira experiên
cia. Focalizando melhor, percebi que o verde em
algumas partes apresentava fissuras, como dum
mosaico não bem ajustado. Os jornais encarrega
ram-se de ventilar este problema: eis o segundo
fracasso e falta de tato com o Papa defunto.
Domingo. Véspera dos solenes funerais. Estou
por acaso na Rádio Vaticana. Um telefonema pede
que se instalem alto-falantes na Praça de São Pe
dro, para acalmar o povo, que se impacienta e sal
ta os cercados, tornando impotentes os centenares
de polícias e guardas. Aquelas moles imensas com-
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primiam-se, numa avalanche pesada e compacta,
por cima dos portais de bronze, e se arrepiaram
de súbito, quando um sussurro de suspeita passou
pela Praça, afirmando que, era a última ocasião de
ver o Papa defunto, pois na manhã seguinte não
haveria maicl possibilidade. Foi a faísca do incên
dio. Ninguém queria perder esta última ocasião, e
quantos não vieram de longe, de outros países da
Europa, da América, do Extremo Oriente, para pre
senciarem este momento profundo e histórico!
Volto à Praça de São Pedro. As massas en
lram e saem, girando numa roda viva, num elo
único e cerrado. Um sacerdote, que já vive anos
cm Roma, pára no alto da escadaria e estende os
olhos por sobre a Praça, regorgitando de gente, e
suspira: "Tanta gente . . . nem mesmo no Ano San
to!"
Esta exclamação dá uma idéia de quanto uma
pessoa pode atrair os corações humanos, e quando
se trata do Papa, o próprio Cristo na Terra, a jus
tificação está no seu lugar.
Passando algumas semanas depois, nas vizi
nhanças do Vaticano, ouvia em cada quinze minu
tos o badalar do relógio da torre, no seu tom cho
roso, lento, melancólico e inconsolável. Parecia
lembrar, em cada quarto de hora, o Papa morto.
Parecia ter saudade daquela figura branca, que mo
rava lá em cima, no lado oposto, na segunda janela,
o a quem avisava fielmente os quinze minutos de
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cada hora do dia. Agora, não sabe mais para quem
bater, mas continua badalando fielmente . . . e ca
da vez que bate, no seu tom triste, melancólico e
choroso, uma saudade envolve a atmosfera, que se
espalha por toda a Cidade Eterna . . . pois morreu
Pio XII, o grande Papa, Pio Magno!
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6. A eleição de João XXIII
Quando o Cardeal Canali apareceu, na sacada
da Basílica de São Pedro, anunciando pelos altofa
lantes por sobre as multidões ansiosas a grande no-
tícia: "Magnum gaudium nuntio vobis . . . Habemus
Papam . . . Angelum Josephum Roncam . . . Johan-
nem XXIII!", e quando, meia hora depois, o novo
Papa aparecia no balcão da Basílica, lançando a
sua primeira bênção "Urbi et Orbi", - mesmo en
tão a saudade e nostalgia por Pio XII pareciam im
pregnar a atmosfera.
Embora milhares de lenços brancos flutuas
sem ao encontro do novo Papa, na penumbra da
noite, com o marulhar crescente de "Viva il Pa
pa", misturado com o chiar dos imensos chafari·
zes, junto ao alto Obelisco, no centro da Praça de
São Pedro, - mesmo então Pio XII não morrera
de todo no pensamento dos fiéis.
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to, onde se lia a simples e lacónica inscrição: "PIUS
PP. XII".
Mas João XXIII é o novo Papa, eleito no Con
clave e ratificado pela vontade do Chefe invisível
da Igreja, Cristo. Não é o nobre patrício romano,
mas o filho dum camponês bergamasco. Foi isto,
que brotou espontaneamente, na sua primeira men
sagem radiofónica, a todo o Orbe Católico: a gra
tidão por seus pais, abnegados trabalhadores do
campo. A sua primeira mensagem foi uma decla
ração de fraternidade para com os pobres, sempre
caros a seu coração simples e paternal.
A imprensa, que até no Conclave quis anteci
par o Espírito Santo, fazendo míl e uma conjetu
ras sobre o novo Vigário de Cristo, falou da pos
sibilidade dum Papa de Transição. Sendo eleito o
Cardeal Roncam, que contava 78 anos de idade,
acharam ter feito uma profecia "jornalística".
Mas a pronta atividade do novo Papa forçou
o jornalismo a um estado continuo de alerta. Nin
guém sabia o que podia acontecer no dia seguinte.
Parecia uma força jovem, inexaurível. João XXIII
quebrou o complexo histórico da "prisão voluntá
ria do Papa no Vaticano", iniciado, há cem anos,
por Pio IX. Saía com freqüência, para visitar as
Igrejas, no tempo da Quaresma, e tomar parte na
procissão da penitência, junto com o povo. Visi
tava os encarcerados e doentes. Foi ao convento
dos camaldulenses de Frascati, sem avisar a nin-
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guém. E os jornalistas já não davam conta do re
cado: o Papa os vencia e os ocupava continuamen
te. O romano, que não esquece o humor, nem mes
mo em coisas santas e religiosas, aventou o adá
gio, de que o novo Papa já não era o Papa "dei
passaggio" (de passagem, transição) , mas "dei pas
seggio" (de passeio) .
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gária, Turquia, Grécia e França, e não as menos in
teressantes, como Patriarca de Veneza e agora
como Sumo Pontífice.
Como pastor experimentado de almas, Sua
Santidade fala todo à vontade e com unção, quan
do vê diante de si o auditório tipo "paroquial",
principalmente quando visita as igrejas de Roma,
onde os fiéis sempre o procuram, com grande aflu
ência. Falando, então, "ex abundantia cordis", po
de-se ouvir de vez em quando o seu sonoro "ecco",
que lhe serve de início para nova idéia, ou para o
calor da peroração. Este "ecco" contém um mundo
de vida, sentimentos de íntimo contacto com o in
terlocutor, e pode-se intercalar, em qualquer parte,
para sustentar o fio da comunicação.
Como cada Papa tem a sua idéia mãe, ou a sua
preocupação íntima, embora não descure nenhum
problema importante da Igreja, João XXIII dá a
entender de que o sonho de seu pontificado é de
lançar a pedra fundamental para a união entre as
igrejas separadas.
Seu interesse é geral. Reuniu, por exemplo,
todos os seminaristas de Roma, na igreja de Santo
Inácio, após o Sínodo Romano, para lhes garantir
de que lhe são caros ao coração, e que várias vezes
ao dia eleva preces especiais ao céu pelos semina
ristas vindos a Roma, a fim de que, voltando a
suas pátrias, sejam o fermento na salvação das
almas.
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Mas a União na grande Fanúlia de Deus, sobre
a terra, é o seu grande Ideal!
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No dia, em que o cristianismo for, imbuido do
esp!rito genuíno de Jesus, necessariamente todos
terão que agrupar-se sob a mesma bandeira, o es
tandarte da compreensão mútua e da caridade!
Porque a caridade, como diz São Paulo, não é di
vidida. Se não tivermos a verdadeira caridade, Deus
não pode estar no meio de nós, com a sua bênção;
pois onde está a caridade e o amor, diz a festa de
Pentecostes, aí está Deus. Ubi Caritas et Amor,
ibi Deus est!
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7. Corpos incorruptos
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Corpo realmente conservado, intacto, com a.
frescura de vida no rosto, e isto depois de anos e
anos, será que existe? Afirma-se que Pio X, ex
posto na Basílica de São Pedro, em Roma, está in
corrupto, no pleno sentido da palavra. Diz-se, que
quando o exumaram pela última vez, o seu corpo
era ainda flexível, e os médicos entusiasmados e
simultaneamente preocupados, pela frescura ainda
existente, queriam colaborar, embalsamando-o no
vamente. Mas, então, o rosto escureceu! Por isso,
agora, o rosto de Pio X está envolto, numa. más
cara doirada, e �s mãos apenas pelas luvas bran
cas.
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O Santo Irmão, Porteiro dos Capuchinhos, -
em Altõtting, no sul da Alemanha, onde está o gran
de Santuário da Virgem, o popular "Bruder Kon
rad von Parzheim" - falecido em 1894, com 86
anos de idade, está deitado, sob o altar da Igreja,
no seu burel rnarron bastante novo, o cordão bran
co, a barba abundante e ruiva escorrendo sobre o
peito, mas tudo é apenas cera, que envolve as relí
quias e ossos do humilde e simpático Porteiro que
durante 41 anos a fio, acudia a cada toque de si·
neta, para atender os peregrinos do Santuário.
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6 de agosto de 1959, às 5,30 da manhã, celebrei a
santa missa, no altar, onde jaz esta jovem Irmã de
Caridade, envolta no seu hábito azulado de vicen
tina, com o enorme chapelão branco engomado,
corno asa aberta de borboleta, não me contive em
observar de perto este rosto, ainda cheio de vida,
e tão formoso, como se fosse vivo. Fui Jogo per
guntar à Irmã, que distribtúa a medalha milagro
sa: "O corpo de Catarina Labouré está, de fato, in
corrupto, ou é só aparência?" A resposta veio pron
ta: "Incorrupto!" Fiquei pasmo. Esta jovem, com
o rosto ainda cheio de frescura, e numa serenida
de confiante em Deus, parece dormir, num sono
imperturbável, naquele altar lateral, onde uma es
tátua da Virgem indica, que foi lá que recebeu a
Medalha Milagrosa. (Ao lado está uma cadeira mtú
to velha e tosca, com o simples bilhete: "Aqui sen
tou-se a Virgem, quando apareceu à Catarina La
bouré!")
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8. O relógio da Morte
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um tiro de canhão: são doze horas! As Igrejas em
Roma começam a tocar, em coro uníssono, o Ange
lus. E todos os romanos dão uma espiadinha ao
relógio, para acertar a hora. A hora do meio dia
em Roma não passa despercebida a ninguém: é
também a hora do intenso tráfego, pelas ruas es
treitas da velha cidade. Unindo o assobio estriden
te e prolongado da sereia ao ronco monstruoso do
canhão, e ambos ao bimbalhar das centenas de
Igrejas em Roma, e tudo isto com o impaciente e
eterno buzinar de automóveis, que querem avan
çar, por haver um enforcamento do tráfego, chega
se à conclusão infalível: são de fato doze horas em
Roma!
Aliás, em Roma, é também célebre a hora exa
ta da meia-noite no fim do ano, o assim chamado
"Capo d'anno." Na iminência do novo ano, os ro
manos querem de fato começar uma vida nova, e
isto à meia-noite em ponto, e de tal maneira, que o
cristão mais cansado e mais profundamente ador
mecido, não deixa de se acordar; toca meia-noite,
e ai de quem anda lá embaixo, pelas ruas, porque
das janelas de todos os andares voam garrafas, va
sos de porcelana, copos, panelas velhas, trapos, ca
cos de vidro, sapatos velhos, enfim tudo o que é
fadado a perecer com o ano velho! Uma orques
tra de vidros tilintantes sobre o asfalto da rua!
Na outra manhã, voltam, como sempre e com
a mesma calma e o mesmo ritmo, os varredores de
rua, ajuntando, varrendo, amontoando e cantando,
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e logo mais encostam os carros da Limpeza Públi
ca, para levarem as coisas do velho ano. No bairro
popular do Transtévere, deve ter havido, pelas ruas,
uma camada de meio metro de altura, e os carros
da limpeza roncaram toda a manhã, para desimpe
direm o tráfego!
Tréveris, a cidade bisavó da Alemanha, a se
r,unda Roma de Constantino, possui também a sua
hora sagrada. Cada noite, às dez horas em ponto,
o sino da Igreja de São Gangolfo rompe festivo pe
los ares. Indagando pela causa, foi-me dito que era
uma tradição secular e sagrada. Em tempos idos,
costumava o sino de São Gangolfo anunciar, às dez
horas da noite, o fechamento dos portões da ci
dade. Ainda hoje impressionam os restos destes
muros paquidermes, que cintavam as cidades euro
péias, para defesa contra os assaltos noturnos. Não
há mais portões a ferrolhar, mas o sino continua
ununciando, às dez horas em ponto, a hora do re
colhimento, e o povo se deleita e sente a necessi
dade deste aviso, e mentalmente cada qual, princi
palmente os mais antigos, vão se recolhendo a suas
casas, e atrás deles fecham-se pesadamente os por
tões da cidade. Todos podem dormir tranqüilos:
" cidade está protegida, os inimigos não podem pe
netrar! Além disso o vigia da torre de São Gangol
fo continua, na mente dos cidadãos, com sua lan
lerna na mão, olhando de olho aceso para dentro
"" negra noite, e sacrificando o sono pela paz e
trnnqüilidade do povo.
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Talvez o relógio mais "turístico" da Alemanha
é o da Prefeitura, em Munique, em cuja torre está
instalada, há vários séculos, uma cena pitoresca,
que se desenrola, cada manhã às onze horas em
ponto. Todo o Largo da Prefeitura ferve de turis
tas de todas as cores do mundo, para presenciar
esta cena, no alto da torre. O relógio bate onze
horas e um jogo de sinos toca a Ave Maria, idilica
mente. A seguir abrem-se os portais e a cena avan
ça. Uma princesa, juntamente com o esposo, assiste
do balcão à batalha dos soldados, montados em gi
netes. Um por um vão caindo os soldados, até se
enfrentarem os dois rivais restantes, num duelo
mortal. Finalmente um deles baqueia sobre o seu
cavalo, com o corpo atravessado pela lança do
adversário. O herói faz uma vênia em honra da
princesa, e os personagens giram para dentro da
torre, fechando-se os portais, para novamente se
abrirem, no dia seguinte, ao toque pontual das onze
horas.
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ponto de surgirem cemitérios espec1a1s. Foi a
"negra morte", que passou pela Alemanha, ceifan·
do, no tique taque rítmico do relógio, inúmeras
vidas.
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9. O jardim florido de Roma
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mandatários das igrejas separadas e os principes de
povos pagãos.
Em Roma há tun ímã, que faz confundirem-se
todos os homens e raças e credos: é o "mistério
da unidade", em que não há judeu, nem grego, mas
todos são filhos do mesmo Deus. Até tun grupo de
russos pousou, um dia, defronte a montunental
Basilica de São Pedro.
Em todas as estações e dias do ano, há turis
tas em Roma, desde o Ano Bom até a noite de São
Silvestre. Mas nas grandes festas litúrgicas, há ver
dadeiras avalanches.
E os polícias de Roma? Gente boa e simpática!
Não parecem policia, mas antes tun adorno e en
feite de Roma. Há os policias de tráfego, de pé, no
meio dos cruzamentos, sobre um caixote, com o
capacete preto, as luvas brancas escorrendo até o
cotovelo, e o fardamento azul. . . dirigentes natos
de tuna grande orquestra! Um gesto ondulado para
a frente, convidando nova resma de carros para o
ataque; um ligeiro movimento de fugida, por detrás
das costas, permitindo ao Fiat 600 de seguir à es
querda; tun rápido crescendo da direita, que ace
lera aquele fílobus e as três camionetas; a mão
suspende-se para o alto, como fazendo parede, e
aquela fila estaca; e já a outra mão dá o compasso
de entrada para o novo setor da orquestra automo
bilística; de repente tun apito estrila, mais outro e
mais outro: aquele carro, lá no outro lado, avan
çou contra mão. Um olhar sério. Mas o carro é es-
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trangeiro, alemão. Um sorriso do polícia, e um sua
ve gesto de perdão, para continuar. E a orquestra
continua a tocar e roncar.
E tudo vai bem. Quando chega a festa do Pa
pai Noel, os romanos depositam aos pés dos guar
das de tráfego inúmeros pacotes e presentes, para
mostrar a simpatia e pedir simpatia até o seguinte
Natal.
Quando há as grandes paradas e recepções de
Chefes de Estado, o cortejo policial estende-se por
vários quilómetros, havendo, em cada dez metros.
uma farda rija, imóvel, fazendo alas ao ilustre vi
sitante.
Caminhando pela rua, dobrando a esquina, pas
sando diante do cinema, entrando no parque, sain
do do museu, atravessando a praça, parando ante
o monumento, viajando de trem, observando as fre
qüentes greves de bancários, ferroviários, estudan·
tes, etc., ou quando há novenas e tríduos numa igre
ja. . . sempre vejo os polícias de Roma, um, dois on
três. Para vigiar?! Talvez sim, mas é antes o apos
tolado de sua presença! O policial romano não é
nocivo, (excetuando um ou outro caso, explorado
pelos jornais, por exemplo, de um vigia, que entrou
em conivência com um grupo de exploradores
sexuais ) , mas, em geral, é simpático, gentil, pacien
te e muito serviçal!
E os padres?! Incontáveis, numa incontável va
riedade. O Guia Turístico de Roma aconselha aos
visitantes uma chegada à Universidade Gregoriana,
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para observar a saída dos alunos, no fim das aulas.
Esta Universidade, fundada por Santo Inácio em
1555, e ampliada sob os auspícios de Gregório XIII
(por isso chamada Gregoriana!), é talvez a obra
mais representativa da ordem dos jesuítas. Santos,
Papas, ( entre os quais Pio XII), Cardeais, bispos,
fundadores de Ordens e Congregações Religiosas
buscaram ai a sua ciência e formação espiritual.
Dois mil e oitocentos sacerdotes e seminaris
tas de oitenta nacionalidades diferentes sentam-se,
lado a lado, nos bancos desta Universidade, estu
dando a fé revelada por Cristo, e concretizando a
universalidade da Igreja.
Há religiosos das mais diversas modalidades e
hábitos: aí está um trapista e um cisterciense, que
unem o branco e preto no seu hábito; logo mais
surge um Padre Branco, vestido de branco desde
o colarinho até as meias; o mercedário traz um
manto preto sobre o hábito branco, aparecendo-lhe
sobre o peito a cruz azul-encarnada; ai desce a es
cada um camiliano, no seu hábito preto, e a cruz
vermelha traçada sobre o peito, que indica a doa
ção total à cura dos doentes; e ai vem sorrindo a
barba simpática do capuchinho, com seu burel mar
ron escuro; o sacramentino distingue-se, pelo cibó-·
rio branco aplicado sobre a batina; e tantos outros
religiosos, como sejam: salvatorianos, palotinos, je
suítas, barnabitas, os do Verbo Divino, etc., não se
distinguem exteriormente por hábitos especiais.
E já começa a torre de babel das línguas, pelos
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amplos corredores: inglês, espanhol, francês, por
tuguês, alemão, italiano, holandês, flamengo, etc.
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melho dos alemães é tão popular em Roma, que até
o Prefeito da Cidade se interpôs ao Papa, pedindo
não se eliminasse esta cor tão tradicional entre os
seminaristas e o povo romano: pois haviam pensa
do os jovens alemães em abandonarem esta cor,
principalmente após a última guerra mundial, para
não "irritarem" os desafetos. A vontade do povo
romano venceu, e os pequenos, alemãezinhos ver
melhos, ainda hoje continuam seduzindo a todos os
turistas, expostos nas vitrines como objetos de re
cordação. O jardim florido de Roma não podia dis
pensar nenhuma cor!
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10. O jovem Davi de
Miguelângelo
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Quanto às estátuas, sobressaem, pela arte, os
dois rivais, Bemmi e Miguelângelo. Bernini, irre
quieto, realista. Miguelângelo, calmo, clássico. Co
movente é a Pietà de Migue!a.ngelo, na Basílica de
São Pedro, que sustenta sobre os joelhos o corpo
exangüe do Senhor Morto.
O monumental Moisés, na Basílica de São Pe
dro in Vincolis, que chispa raivento seus olhos de
fogo, e sacode irritado a sua barba interminável, na
sua marmórea indignação, parece menos uma está
tua fria, do que o próprio Moisés vivo, libertado
pelo artista da bruta matéria. O ligeiro talho, que
ainda hoje se vê sobre o joelho desnudo, é atribtúdo
a um leve golpe de Miguelãngelo, que, num arroubo
de entusiasmo, caiu na tentação de interpelar o gi
gante, gritando-lhe: "Fala, Moisés! "
N a Piazza d e São Bernardo, n o cruzamento de
quatro artérias, onde se encontram construídas três
igrejas sistematicamente, podemos encontrar um
outro Moisés gigantesco, sentado sobre a grande
Fontana deli' Acqua Feiice, que jorra borbulhante as
águas provenientes e canalizadas desde os montes
Albanos. Mas este Moisés é "monstruoso", e dizem
que o escultor Próspero de Bréscia, querendo com
petir com o Moisés de Miguelãngelo, morrera dE'
desgosto ou se suicidara, por causa das críticas pi
cantes de que era alvo, quanto a este colosso dis
forme.
Miguelãngelo é também autor do Cristo formo
�o. que está de pé, junto ao altar-mor, na igreja
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dos dominicanos de Santa Maria sopra Minerva, em
Roma, (sob este altar, conserva-se o corpo de San
ta Catarina de Sena ) : é um Cristo jovem, viril, so
berano, e seu pé, constantemente beijado pelo povo,
foi revestido duma folha de bronze. Igualmente fo
ram cingidos os seus rins, pois a estátua era antes
completamente nua, para não chocar os fiéis, ainda
mais dentro dum templo santo.
O competidor de Miguelângelo e seu verdadeiro
rival foi Bernini, de quem há uma estátua de Davi,
na Galeria Borghese, em Roma. Este jovem Davi
verga-se para frente, como para dar um impulso
certeiro à sua funda mortal, e um dos pés, que
avança, sustenta todo o peso irrequieto do corpo,
enquanto o outro está por suspender-se, com a bar
riga da perna retesada, e seus lábios prensados num
frêmito de indignação faiscam os olhos concentra
dos no invisível Golias. O turista aproxima-se com
respeito deste jovem eletrizado, que parece arque
jar de indignação. É o célebre Davi de Bernini!
Algum tempo mais tarde, pude ver o Davi de
Miguelângelo no Museu da Academia, em Florença.
Se Florença é a cidade da arte, deve orgulhar-se
por possuir entre seus monumentos a estátua de
Davi de Miguelângelo. Florença, às margens do rio
Arno, rivaliza na arte, com Roma, banhada pelo rio
Tibre!
Embora me tenha impressionado a grande Pra
ça, onde foi queimado vivo o dominicano Savona
rola a quem se procura reabilitar aos poucos, a
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ponto de passar das trevas da ignomínia para as lu
zes duma possível canonização; embora a Anunziata
de Fra Angélico e todo o convento, cujas celas ele
revestiu com os afrescos realmente "angélicos", me
tenham inspirado um sentimento de candura e de
voção; embora a casa de Dante, numa das ruas de
Florença, e a sua tumba monumental, na Igreja de
S. Cruz de Jerusalém, onde aliás jazem tantas ou
tras personalidades célebres, como por exemplo, o
próprio Miguelângelo, me tenham relembrado a cé
lebre exclamação da "Divina Comédia", que o divi
no autor coloca no frontispício do Inferno: "Las
ciate ogní speranza, voi chi intrate! " (Deixai toda a
esperança, vós que entrais! ) ; embora a lousa mar
mórea de Giovanni Papini, que fui procurar, lá no
alto do Piazzale de Miguelângelo, me tenha incuti
do um sólido respeito por sua pena enérgica e al
gum tanto rude; - mesmo então o jovem Davi de
Miguelângelo, calmo, sereno, cheio de vida e saúd&
ficou predominando na retina de minha memória.
Já o lugar em que foi colocado este moço, cheio
de linhas harmónicas, aperfeiçoa a impressão artis
tica!
É uma enorme cúpula, no fundo do corredor
do Museu da Academia, que isola a estátua do jo
vem, posta sobre um alto pedestal, como num tem
plo, para a qual convergem todas as linhas da
perspectiva.
O rosto altivo e sereno, os olhos puros e diáfa
nos perscrutando distâncias infinitas, um dos pés
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levemente avançado, a mão direita de caminho para
erguer-se ao alto, o corpo todo, esbelto, proporcio·
na!, robusto e cativante, dão ensejo de convidar este
jovem atleta a descer e a caminhar entre os seres
vivos, para ser ovacionado por eles. Que contraste,
embora artístico, entre o jovem Davl apaixonado de
Bemini e este Davi calmo e robusto de Miguel
ângelo!
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11. A Cripta das 4.000 caveiras
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jas estão quase todas concentradas no centro antigo
de Roma, e a maioria são monumentos históricos, e
por isso intangíveis.
Nestes dois anos, procurei dedicar, sistematica·
mente, algumas horas de cada semana, à visita das
igrejas, com as explicações detalhadas à mão.
Há um grupo de igrejas que levam o nome de
diversas nações, como, por exemplo, a Igreja de
Santo Antônio dos Portugueses, onde ecoou, em
tempos idos, a voz eloqüente de Vieira. Este templo
é um mimo da decoração barroca! Quando voltei à
rua, naquela manhã, topei com uma torre do lado,
que o meu Guia Turístico apelou simplesmente de
"torre della scimmia" (torre do macaco ) . Há sécu
los, conforme a história, um macaco travesso leva
ra, furtivamente, uma criança até o topo desta
torre. A família fez uma promessa à Virgem para
salvar o ente querido. Por isso, ainda hoje se vê,
no alto da torre, como voto à Virgem, uma lampa
rina a arder perenemente!
Outra igreja nacional é a de São Tiago dos Es
panhóis, que se orgulha em guardar, em suas pare
des estreitas, os dois Papas da fanúlia Borgia, Ca
lixto III e Alexandre VI.
Numa das ruas movimentadas, perto do Palácio
do Senado, está a Igreja de S. Luigi dei Francesi,
cuja pedra fundamental foi lançada pelo então fu
turo Papa Clemente VII, e cuja construção foi em
grande parte custeada pela Rainha da França, Ca
tarina de Mediei.
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A única Igreja latino-americana, em Roma, é a
recentíssima de Nossa Senhora de Guadalupe, dos
mexicanos, na periferia da cidade, cuja construção
moderna foi muito aplaudida pela diocese de Roma,
onde justamente nos bairros há o contraste violen
to da escassez de templos sagrados, e é esta uma
das preocupações angustiantes do Vicariato roma
no.
Mas a Igreja de São Joaquim, constnúda em
homenagem ao jubileu sacerdotal de Leão XIII,
possui para cada nação católica um altar especial.
Além das igrejas "nacionais", há também em
Roma algumas igrejas das diversas regiões da Itá
lia, que foram levantadas nos séculos passados
pelos diversos reinos e principados da Península
italiana. Aí está a Igreja de S. Giovanni dei Fioren·
tini, que o Papa Leão X construiu para os seus com
patrícios florentinos, chamando em concurso os
técnicos mais renomados de então, caindo finalmen
te a escolha sobre Sangallo, com a preterição de
Miguelângelo e do próprio Rafael.
Há uma plêiade de igrejas, em Roma, que for·
mam a célula mãe das diversas Ordens e Congrega
ções Religiosas.
A muito visitada Igreja do Gesu, cujas missas
vespertinas são de grande afluência popular, por
causa de seu tom litúrgico, conserva, num de seus
altares, o corpo de Santo Inácio de Loyola, o funda
dor da companhia de Jesus, e no outro, o braço de
São Francisco Xavier, o Apóstolo das índias. En-
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tre as igrejas de Roma, é esta a do Gesu urna das
mais faustosas pela grandiosidade das decorações e
riquezas de mármores, pinturas, bronzes e doura
mentos: Imponente é o altar magrúfico, onde jaz
o ex-oficial de Pamplona, Inácio de Loyola, com as
quatro colunas cobertas de lápis-azul e de bronze
dourado. A colossal estátua de Inácio, que origina
riamente era de prata pura, foi fundida pelo Papa
Pio VI, para que pudesse pagar a severa indenização
de guerra, imposta pelo vencedor Napoleão, no
Tratado Tolentino. Por cima do santo, dois anjos
marmóreos, em pleno vôo, sustentam o maior globo
maciço de lápis-azul, que se conhece no mundo.
Outra igreja popularíssima é a Chiesa Nuova,
dos oratorianos, onde jaz o seu fundador Felipe Ne
ry, chamado oficialmente o "Santo de Roma', em
bora fosse natural de Florença. ( Nessa igreja, o
então menino Eugênio Pacelli e futuro Pio XII
costumava ajudar a santa missa, pois morava em
suas vizinhanças! )
Uma das várias igrejas de adoração perpétua,
em Roma, é a dos Padres Sacramentinos, onde se
guarda piedosamente o coração do fundador, o
Beato Julião Eymard, o apóstolo da Eucaristia. A
Igreja da Madalena, a cuidado dos Padre Camilia
nos, conserva o corpo do fundador São Camilo de
Lellis, juntamente com o célebre crucifixo, que lhe
deve ter falado. (Além deste crucifixo, ao qual se
atribuem vozes humanas, vi em Assis o rude cru
cifixo, que falou, conforme a pia crença ao vene-
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rando Pai Francisco, e em Siena, talnbém na Itália,
mostra-se ainda hoje o crucifixo, que orientou, em
altas vozes, a conselheira dos Papas, Santa Catarina
de Sena). (Na Igreja de São Lourenço ln Dâmaso,
quer a tradição ver o crucifixo, que falara a Santa
Brígida ) .
Sem negar o valor histórico e artístico à s Igre
jas, confiadas aos franciscanos, dominicanos, sale
sianos, carmelitas, passionistas, etc., sobressaem
por sua importância universal, as sete grandes Ba
sílicas de Roma, que sugerem assunto inesgotável e
possuem títulos inalienáveis .
É a Basílica de São Pedro, com a glória de Ber
nini, ou com a Pietà de Miguelângelo, ou com as
proporções enormes, que à primeira vista não im
pressionam, mas que justamente por causa de seu
equilibrio impõem um fascínio crescente. É a Basí
lica de Santa Maria Maior, visível de todos os qua
drantes da cidade, por estar na elevação de uma
das sete colinas romanas. Pormenor interessante é
que todo o ouro puríssimo, que reveste o seu inter
no, proveio das então ainda colónias latino-ameri
canas. É a Basílica de Santa Cruz de Jerusalém,
com as preciosas relíquias da Cruz e dos instrumen
tos da Paixão. É a Basílica de São João do Latrão,
a igreja do bispo de Roma, intimamente ligada com
a história do grande Imperador Constantino. É São
Paulo, fora dos muros, é São Lourenço, etc. etc.
Há urna série de igrejas importantes e antigas,
em que se praticam as cerimónias das estações
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quaresmais. O Papa João XXIII reavivou a secular
tradição de o próprio bispo de Roma tomar parte
nestas procissões de penitência. Algumas destas
igrejas são, por exemplo, a de São Xisto, dos Qua
tro Santos Coroados, de São Clemente, de Santa
Anastácia, a basílica de São Cosme e Damião, etc.
etc.
Outra enumeração de igrejas consiste nos títu
los cardinalícios que levam. Os nossos cardeais bra
sileiros possuem como igreja titular, a de S. Boni
fácio e Aleixo (D. Jaime de Barros Câmara) , São
Pancrácio (D. Çarlos Vasconcelos Motta), S. An
gelo in Pescheria Paneperna(D. Augusto Álvaro da
Silva).
Há igrejas com o mesmo nome, mas com di
versas alusões, como, por exemplo, as de São Lou
renço: S. Lourenço fora dos muros, S. Lourenço in
Dâmaso, S. Lourenço in Lucina, S. Lourenço in Pa
neperna.
Dezenas e mais dezenas das igrejas levam o
título consagrado a Nossa Senhora.
Várias igrejas possuem o brilho da antigüida
de, como as de Santa Praxedes e Pudenciana, que
serviram nos primeiros tempos do cristianismo
para alojamento do apóstolo São Pedro. Vários pa
lácios de damas ricas deram origem a igrejas ve
neráveis, como a de Santa Cecília e Santa Sabina,
etc.
Outros preferem apreciar as igrejas, conforme
os estilos diferentes, barroco, renascentista, ronn-
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no, gótico, etc. Aliás, a única igreja medieval, de
estilo gótico, é a de Santa Maria sopra Minerva.
Muitos turistas selecionam as igrejas, confor
me as atrações artísticas, como a de Santa Maria
della Vittoria, onde está a célebre obra de Bernini,
que é a Santa Tereza de Avila. Esta grande mística
foi apanhada pelo gênio criador, justamente no seu
arroubo estático, em que um anjo sorridente lhe
atravessa o coração abrasado com uma flecha de
fogo. A Igreja de Santo André do Quirinal, (junto
ao palácio do Presidente da Itália), a pequena igre
ja, que conserva o corpo do jesuíta polonês, jovem
de dezoito anos, Santo Estanislau Kostka, é a obra
predileta de Bernini, e chamada por ele mesmo de
"menina dos olhos''. O artista comprazia-se em de
morar-se nela para rezar e elevar o seu espírito.
A Igreja de Santo Agostinho possui, além do corpo
de Santa Mônica (a mãe do gênio de Hipona), a
atração artística do célebre afresco de Isaías, que
Rafael executou, sob a encomenda dum rico pa
trício. Quando este senhor achou exorbitante a exi
gência de Rafael, acudiu a Miguelângelo, para con
seguir por meio dele alguma indulgência, pois jul
gava o afresco inferior ao preço estipulado. Com
sua visão arquitetónica, Miguelângelo limitou-se a
responder: "Só o joelho de Isaías vale mais do que
todo o pagamento exigido!"
Não poucas igrejas recordam templos pagãos,
da antiga Roma, como o Panteon, que hoje leva
simultaneamente o nome de Igreja de Santa Maria
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de todos os Mártires. Com o título desta Igreja do
Panteon começou a festa de Todos os Santos, na
Igreja Universal. A sala circular das termas do
Imperador Diocleciano é a atual Igreja arredon
dada de São Bernardo al!e Terme. O tepidário das
mesmas termas deste Imperador foi adaptado, por
Miguelângelo, para a atual Igreja de Santa Maria
dos Anjos, junto à grande Estação Central Ter
míni.
Outro método de localizar uma série de igre
jas, é conforme as célebres catacumbas anexas,
como sejam as de Santa Inês, Santa Prisca, S. Ne
reu e Aquileu, São Sebastião, etc.
Sinais característicos pertencem, por exemplo,
à igreja de Santo André del!a Val!e, que possui, de
pois da Basílica de São Pedro, a maior cúpula em
Roma, ou à Igreja de São Carlos, alcunhada "Car
linho", por ser pitoresca e elegante, cujas dimen
sões são exatall"..ente as mesmas, até na forma, de
um dos pilares da cúpula, na Basílica de São Pe
dro. No topo da escadaria de cento e vinte e qua
tro degraus, está a Igreja Ara Caeli, onde se reú
nem as autoridades civis de Roma, e diz a tradi
ção, que neste lugar Sibila indicou ao Imperador
Augusto a iminente vinda dum deus à terra. A exis
tência desta vetusta igreja recua, conforme alguns,
até o ano de 574 d. C.
Caiu-me em vista, que não poucas igrejas, tan
to antigas, como recentes, são célebres, justamente
por causa de suas criptas. As escavações debaixo
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da Igreja de São Pedro, que o próprio Pio XII
ucompanhava pessoalmente (quantas vezes não
desceu ele, de noite, à luz duma lâmpada elétrica,
e de 1nacacão, para observar o andamento das es
cavações, que procediam com escrupulosidades
milimétricas) , estas perfurações mostram a parte
antiga da Basílica Constantina.
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ra da Conceição, sob uma humilde !age, que traz
o pensamento realista da morte: "Hic iacet pulvis,
cinis et nlhil!" (Aqui jaz pó, cinza, e nada ! " ) . No
frontispício do templo está gravada a senha da fa
mília Barberini, que são "duas pequenas abelhas".
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Outros olhavam impassíveis para este cenário
Létrico. Muitos viam nisto uma atração a mais, nes
ta Roma prenhe de novidades e antigüidades con
trastantes.
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12. Os lírios de Roma e Nettuno
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de que a igreja jamais desabará. Asseguram tam
bém os borrominianos de que o obelisco de Berni
ni já caíra uma vez, e que por isso colocaram os
quatro gigantes para servir-lhe de espeque.
Entretanto, porém, na igreja, cujo interno é
em forma de cruz grega, e descendo à cripta, vi
mos que este porão imenso e escuro era o pros
tíbulo do imperador Domiciano. Neste subterrâ
neo, está uma estátua interessante de Inês, feita
por Alexandre Algardi, que não rivaliza nem com
os chafarizes de Bemini, nem com as fachadas de
Borromini, mas esta Inês de mármore alude ao
fato histórico aí sucedido.
Despida e exposta aos olhos lascivos do pú
blico romano, os cabelos da jovem mártir cresce
ram miraculosamente até os pés, cobrindo-lhe o
corpo todo. Com os olhos puros dirigidos para o
infinito, na sua pureza virginal, e os cabelos mar··
móreos entrançados até os pés, a jovem santa en
volve o ambiente escuro e úmido do porão, num
mistério de sobrenaturalidade e força divina. No
meio deste recinto, em cujas paredes ainda estão
debuxados alguns traços lascivos de pinturas an
tiqilissimas, parecem ecoar as gargalhadas impu
dicas dos soldados romanos, daqueles tempos san
guinárias. Naquela vez, a virgem pura e indefesa
confiava no braço forte Daquele, que é ciumento
pela honra daqueles, que se lhe consagraram.
Em Roma há várias igrejas, dedicadas a lírios
puros, como Cecília, Anastásia Constança, etc., que
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souberam tingir de sangue a sua integridade virgi
nal! E a pequena Inês é um lírio de frescura imar
cescível, que desde os primeiros séculos até os dias
de hoje não murchou, e em cada ano, no dia 21 de
janeiro, atrai centenas e mais centenas de almas
jovens, que lhe vem oscular os pés da estátua de
mármore e pedir a força de conservarem intacta a
pureza de seus corações!
Um lírio mais recente, de igual frescura imar
cescível, atingido também de sangue, aos doze anos,
é a pequena Maria Goretti.
Seguindo sessenta kms., para o sul de Roma,
topamos com a cidade turística de Anzio, célebre
por sua antigüidade. Dizem que lá se refugiou Co
riolano, em 490 a. c., e Anzio é tida como a pátria
dos Imperadores Calígula e Nero. Este último le
vantou grandes construções por cima do Mar Me
diterrâneo, ainda hoje apreciadas. O eloqüente Cí
cero teve lá uma de suas chácaras.
Seguindo mais três kms., ao longo do mar, en
contramos a cidade de Nettuno, onde se acha o
Santuário de Maria Goretti, construído pelos Pa
dres Passionistas, que assistiram à morte desta he
roína privilegiada. Os muros maciços deste templo
parecem avançar mar adentro, sustendo a fúria das
ondas. Enquanto celebrava a santa missa sobre o
corpo virgíneo desta santa, que jazia no seu vestido
branco e cabelos louros, na redoma de vidro, por
debaixo do altar, num silêncio cheio de generosi
dade e pureza, o meu recolhimento era às vezes in-
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terrompido pelo rugir soturno e explosivo dos va
galhões, contra a muralha do paredão. A volubili
dade traiçoeira das ondas não conseguem pertur
bar o descanso sereno desta heroína, que por nada
deste mundo sacrüicou a integridade de seu corpo
ao pecado da impureza.
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nunciar o generoso "perdôo-te", que pelo tempo fu
turo há de impressionar as novas gerações.
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cularam na alma a sensualidade e aquele ato vil e
desumano. Alexandre experimentou o quanto a fan
tasia pode inflamar-se perdidamente ao contacto de
imaginações indignas, a ponto de cometer uma
ação, que não se pode explicar a não ser por um
ato de loucura!
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era branco como a cor dos lírios. O tabernáculo
estava envolto por uma cortina de seda branca, o
altar juntamente com os degraus eram de mármore
branco, as paredes pareciam imaculadas com o re
vestimento de veludo branco, e lá na frente, sobre
o altar, sorria, branca e ilibada, uma bela imagem
da Virgem, e pouco abaixo brancos cordeiros abe
beravam-se na fonte inesgotável, que jorrava da
hóstia branca na Eucaristia. Jovens de ambos os
sexos reurúam-se, no silêncio desta branca capeli
nha, para prometerem ao Cordeiro Imaculado,
Cristo, virgindade perfeita até a hora solene do ca
samento. Quantas destas meninas não realizam o
heroísmo de Goretti, caminhando puras por entre
as seduções das cidades!
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13. Um mês sob o bafo
da morte
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dias e alguns com vontade louca de serem grandes,
mas todos como estrelinhas mmúsculas em con
fronto do gigantesco russo e americano, que luzem
como sóis, nesta sinfonia de amostras e exposições.
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os recém-desastrados na balbúrdia estonteante das
ruas .
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Unção dos enfermos para um canceroso do fí
gado. Sofre muito. Um calor ardente se evapora do
corpo já carcomido. A cor dum amarelo cadavé
rico espalha-se pelo rosto. A jovem esposa manda
suspender a unção dos enfermos. O filho de doze
anos deve comparecer, para ter um exemplo, no
pai, que morre. A mãe lhe diz: "Reza, meu filho!
Olha para o pai, e vê como ele morre conforma
do!" Embora chorando, esta mãe era o tipo da mãe
macabéia!
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desagradável. O filho de vinte anos pede-me trans
mitir ao pai moribundo o seu perdão: anos e anos
não falava mais com ele. A amante visita-o, des
norteada. A verdadeira esposa surge também, ofe
recendo o seu perdão, para facilitar-lhe uma boa
morte. Finalmente recebo autorização para entrar.
Apresento-me como jovem sacerdote do Além-mar.
Ofereço meu auxilio. Digo-lhe que seria uma ale
gria para mim, poder ajudá-lo e garantir-lhe a eter
nidade feliz. A situação é grave, imutável. A morte
já estendeu as asas sobre o seu corpo. O moribun
do aperta-me a mão quente e abrazada. Lágrimas
escorrem-lhe pelo rosto afogueado. Pelo sacramen
to da confissão liberto-o de todos os pecados. Um
"obrigado" rouquenho e comovente sobe ciciante
a meus ouvidos. A sua morte foi invejável: enfren
tou a eternidade, com a consciência tranqüila.
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sado. Na despedida, apertou-me a mão com tal
veemência, como se estivesse em perigo iminente.
Tomou duma moeda de cinco marcos: "Reze ama
nhã a missa em minha intenção! " As quatro e meia
da manhã fui chamado. O homem falecera, na
maior paz, sem o genro, que o guardava, dar-se
conta do sucedido. Celebrei a missa, que o próprio
defunto para si encomendara.
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mais movimentar esta máquina de carne e ossos e
nervos. Levamos a condenação à morte, dentro de
nós, não como um decreto assinado por Deus, mas
a condenação é todo germe da doença, que se ma·
nifesta no organismo. Para voltar à expressão mais
antiga e a mais acertada, somos "mortais".
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14. O Segredo das montanhas
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nas dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio. Na
montanha do deserto, onde Jesus foi tentado pelo
demônio, após o seu jejum de quarenta dias, en
contramos o recolhimento da penitência. No mon
te das Bem-aventuranças, junto ao Mar de Genesa
ré, onde Jesus deu a sua plataforma espiritual, en
contramos a solidão do ensinamento. No monte
das Oliveiras, onde Cristo suou sangue, na previsão
tétrica da morte, achamos o recolhimento da comr
paixão. E no monte Tabor, na Galiléia, onde Cris
to se transfigurou perante os três apóstolos, ou no
monte da Ascensão, encontramos o recolhimento
da glória.
Em duas horas de ônibus, para o sul de Roma,
chegamos ao famoso Monte Subiaco, onde está a
caverna abaulada de São Bento, o Fundador da Or
dem beneditina, que lá viveu por três anos, numa
solidão completa. O imponente claustro, levantado
perpendicularmente sobre o abismo, e encrostado
na reentrância da montanha rochosa, aparece de
longe pairando sobre o imenso vale, em cujos fun
dos borbulha um riacho irrequieto. Descendo por
escadas internas, circulares, úmidas e escuras, to
pamos com a caverna, onde Bento, de pés descal
ços, envolto no seu burel de eremita, sentado sobre
a rocha nua, está saboreando, na sua fisionomia de
mármore branco, as comunicações que lhe pro
vêem do alto em funil, por cuja claridade alguns
amigos vinham, de vez em quando, passar-lhe, sus
pensa numa corda, a cesta de pão e água. Do lado
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de fora da caverna, ainda hoje cresce um espinhei
ro silvestre, que lembra o fato de Bento ter-se arro
jado nu e despido para dentro dos espinhos agudos,
a fim de purificar os seus pensamentos, numa das
grandes tentações contra a pureza. Decisões pro
fundas foram tomadas nesta caverna tão silencio
sa do Monte Subiaco. Os turistas olham com res
peito para estes paredões imensos, para esta ca
verna semi-escura e o rosal silvestre. As monta
nhas austeras e pedregosas dos Apeninos, que vol
teiam ao redor, foram testemunhas de como o en
tão, jovem patrício romano Bento, tomou a deci
são de voltar-se integralmente para o Eterno!
Quem souber o que representa a Ordem Benediti
na na Civilização Européia e nas grandes façanhas
da Igreja, deve ver, nesta montanha rija dos Ape
ninos, o dedo de Deus: aqui está o berço espiritual
de uma grande família, que desafia os séculos.
Bento abandonou a sua caverna de Subiaco,
porque muitos o procuravam. Achou um monte
mais inacessível. E assim podemos visitar hoje a
sua tumba, no célebre Monte Cassino, aquela aba
dia milenar, tão tristemente bombardeada na últi
ma guerra mundial. Estiveram os alemães aloja
dos nesta vetusta abadia, como numa fortaleza
inexpugnável. Os aviões americanos despejaram as
suas bombas, arrasando até o chão esta relíquia
histórica! Ironia da guerra: nenhum soldado ale
mão foi com isso atingido! Abandonaram o seu
castelo provisório, antes da invasão.
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O colosso da montanha, em forma de cone,
mostra em seu topo a nova construção, reluzente
e amarela, com o mesmo formato, o mesmo ta
manho e a mesma estrutura da antiga abadia.
Quando aí passamos, em dezembro de 1959, os ar
tistas revestiam ainda as paredes, teto e colunas da
Igreja, com os broquéis de ouro reluzente. Um ar
de riqueza sobrenatural resplandescia neste ouro
abundante da Igreja. Sob o altar repousam os res
tos mortais de Bento: embora o templo fosse arra
sado, as bombas respeitaram os ossos do grande
herói.
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troçadas: mas o Monte Cassino voltou a ser habita
do pelos monges beneditinos, que prosseguem a
salmodiar, nestas alturas quase inacessíveis, os hi
nos ao Eterno, que se compraz em habitar junto
às almas recolhidas, longe do bulício do mundo.
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daria vê-se toda a Paris, deitada a nossos pés.
Lembrei-me de Moisés, que andou em contacto ínti
mo com o Deus dos mandamentos, no topo do Sinai.
No cume desta montanha, está exposto dia e noite
o Santíssimo Sacramento. Na encosta desta mesma
montanha campeia o vicio da luxúria, onde os ho
mens dançam ao redor do deus da carne, ao passo
que no tempo de Moisés dançavam ao redor dum
bezerro ·de ouro.
Naquele domingo de manhã, do dia 5 de agosto
de 1959, a Basílica da Reparação estava repleta, e
a síneta tocava à Consagração da santa Missa. Um
respeito profundo de adoração envolvia esta mole
piedosa de peregrinos. Uma satisfação cristã inva
diu-me a alma: "Onde abunda o pecado, superabun
da a oração e a fé em Deus!" As montanhas forçam
para o céu, para as alturas puras e diáfanas do
Alto. As montanhas são reservadas para Deus.
Possuem o seu segredo!
Outra montanha, embora em ascensão leve e
constante, é Assis, o berço da ordem franciscana.
Olhando lá de cima, pela janela do quarto, é agra
dável ver a amena e extensa planície da úmbria,
que vai longe até topar nos Apeninos distantes.
Nesta suave montanha, Deus fez-se ouvir no bafejo
quente da natureza. O Poverello de Assis foi o seu
trovador jovial, cantando hinos de júbilo ao irmão
sol, e de modo especial à maninha água, tão pura,
cristalina e imaculada! Na cripta da Basílica, jaz
em sua tumba semi-escura o heróico Francisco de
Assis!
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As montanhas da Suíça possuem também o seu
segredo. Tomei o trem na cidade dos lagos, Lucer
na, e subi às alturas rígidas de Einsiedeln, onde
está o santuário nacional de Nossa Senhora. Na
volta, parei numa localidade despretenciosa, a fim
de escalar a montanha, onde o Pai da Pátria suíça,
São Nicolau de Flue, passou os últimos anos de sua
vida, na solidão erenútica. Nos Alpes suíços, eter
namente cobertos de branca neve, onde as monta
nhas roçam as nuvens do céu, o homem sente-se
pequeno, e o coração é invadido por um ar ríspido
e glacial. Nicolau de Flue não foi sacerdote, nem
religioso, deixou esposa e filhos para retirar-se no
aconchego da montanha, a uma choça, ainda hoje
conservada. Uma pedra servia-lhe de travesseiro
Um banco tosco era-lhe o leito. Pelas frestas asso
biava o vento glacial do inverno. Nesta montanha
de neve, um homem levou o seu heroísmo até as
últimas conseqüências. Certa vez um incêndio rom·
peu na baixada, pelo século XIV. Eis que lá nas
alturas aparece, consumido pelos jejuns e vigílias,
o eremita, de mãos levantadas ao céu, como outro
Moisés, e a sua prece apaga miraculosamente o
incêndio. A estátua de banze, austera e ascética,
indica o lugar onde seus pés pousaram.
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sobrepunham wnas as outras, e o sol que iluminava
tudo com o calor ameno de seus raios, enquanto a
atmosfera continuava rígida e glacial, incutia-me
wn sacro respeito para com o silêncio da natureza!
As duas lebres:
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N O cume ao monte oposto aescoori uma arma
ção de madeira. O vigário limitou-se a responder
sumariamente à minha curiosidade: "Torre de ca
çadores de lebres! " Duas figuras deslizavam para
a direita, na crista do monte. A minha segunda per
gunta, veio outra resposta sumária: "Caçadores dê
lebres! "
Descemos a encosta. Paramos n a planície. Bati
o pé nos tocos de cimento armado. Veio-me o im
pulso de mais uma pergunta. Em respeito às cãs do
venerando sacerdote, retive a curiosidade. Dei outro
pontapé num destes tocos maciços, e fui seguindo
o pároco. Mal passamos o córrego, estrondeou um
tiro, que antes parecia de canhão, do que de sim
ples fuzil. O primeiro impulso era pensar sumaria
mente nos "caçadores de lebres", mas o vigário
suspirou, como que sentado na cadeira elétrica:
"Estamos na zona russa, presos, fim para nós, im
possível voltar, perdidos! "
Os dois "caçadores d e lebres" vinham de fuzil
em riste, ao nosso encontro. E lá estava eu, ban
cando a "lebre brasileira" em terras germânicas, de
mãos ao alto, suspenso entre o céu e a terra, longe
da pátria distante!
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atravessamos a fronteira, a terra de ninguém, aque
la faixa misteriosa, que rasga a Alemanha pelo
meio, de norte a sul, tão fofinha, pois é duas vezes
ao dia revolvida pelo arado, a fim de registrar me
lindrosamente qualquer pisada, ainda que seja dum
passarinho trêfego, a fim de se verificar, se é de
um pesinho ocidental ou oriental!
Suprimindo, até com certa violência, tantas re
cordações, que remoinham impacientes na memó
ria, para se desafogarem no papel e mostrarem o
que contém esta palavrinha tão lacônica "cortina de
ferro", limito-me a salientar esta impressão, que
ficou gravada na mente desde o primeiro até o úl
timo instante nesta zona oriental da Alemanha:
"não havia responsabilidade sobre o que se afirma
va por parte daquelas autoridades, que se reveza
vam numa ascensão crescente!"
Interrogatórios prolongados sucediam-se. Fo
mos espoliados de todos os objetos. Também o meu
rosário foi perscrutado anatomicamente. Um moço
de dezoito anos, que se dizia católico, perguntou
me curiosamente: "Que é isso?" Respondi-lhe: "E
o rosário!" E no entanto dizia-se de profissão
católica.
Ao cair da tarde, entre flocos de neve, que
polvilhavam a atmosfera, fomos levados, num ca
minhão, até a cidade de Halberstadt, aonde chega
mos noite entrada. Outros interrogatórios, outras
promessas, outras evasivas, prorrogações, dificul
dades, muitas boas vontades, muitas complicações
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alheias à própria vontade, muitas desconfianças en
volvidas em gentilezas aparentes, e, finalmente, ou
tra arrancada de automóvel, está claro, com o fuzil
sempre engatilhado acompanhando. Chegamos à
fronteira, mas agora na parte norte, em Marien
born, na distância de trezentos kms. Seríamos de
volvidos gentilmente à zona ocidental. Foi pelas
nove horas da noite, quando chegou o momento de
transpor aquele abismo temido por milhões de ale
mães, e que no entanto é apenas uma faixazinha de
terra, tão inocente como qualquer outra, tão fértil
e tão igual, como todas as demais da Alemanha.
O abismo invisível:
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na escuridão da noite. Vislumbramos no outro lado
as luzes do ocidente. Quis continuar a marcha, ao
encontro da liberdade luminosa, quando um "halt"
mais ameno, do que o da manhã, me retém. Es
tranho a atitude do guarda. "Podemos ir até a me
tade da faixa, e nenhum passo mais! " sorri-me o
moço enleado. "Sai tiroteio?" pergunto. "Sai" é a
resposta. Esperamos. No outro lado, começam a
locomover-se duas sombras. Defrontando-se conos
co, estes dois indivíduos, fardados a rigor, batem
os tacos numa continência metálica. Os tacos orien
tais também estalam germanicamente. O lado
oriental e o ocidental estendem a mão, um silêncio
de mudez sepulcral. "Devolvidos" diz sumariamente
a voz do oriente. Nisto faisca o seu foco, dentro das
trevas, iluminando um bilhete, que indica a minha
autenticidade.
Por desgraça ou felicidade, não tivera nenhum
documento comigo, pois a intenção, naquela famo
sa manhã, era de dar um passeio de apenas meia
hora. Assim fabricaram este documento, na base
das respostas, que ia dando nos extensos interro
gatórios, da manhã até a noite. Com que ardor não
repetia eu, a cada passo, o nome de minha terrinha
natal: Santa Cruz do Sul. Agora, diz este bilhete
"russo" com toda a segurança histórica, de que eu
era cidadão da Alemanha e não do Brasil. Trago
este bilhete comigo, a fim de ser comprovante da
"meticulosidade" interrogatória, com que se proce
de na zona russa.
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A mão oriental e ocidental estendem-se nova
mente, nas trevas da noite, num silêncio de sepul
cro; tacos orientais e ocidentais, mas todos alemães,
ecoam num ritmo impecável, e começamos a atra
vessar o resto do abismo, que nada mais é do que
um pedaço da fabl:a de cimento armado, que liga
Berlim diretamente a Hanover: foi esta a primeira
estrada federal constnúda e inaugurada por Hitler,
que é tão larga a ponto de na última guerra mun
dial os aviões decolarem e aterrissarem comoda
mente em sua pista.
O mistério:
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surpresa e emoção dos doentes, que durante o dia
todo rezavam por minha volta. Foi um recorde
nunca visto. Pois os que passavam, por descuido,
à zona russa, eram devolvidos geralmente, somente
após semanas de interrogatórios, e não raras vezes
com alguma cicatriz na nuca ou no peito, como um
dos velhos do hospital me mostrou, com as lágri
mas nos olhos.
No jornal de Goslar saiu um artigo com este
título significativo: "Um Prato de Sopa". Alude ao
seguinte fato: Durante o primeiro interrogatório,
logo após a nossa prisão, alguns oficiais conversa
vam comigo, perguntando coisas sobre o Brasil. No
meio da conversa um deles se afastou e voltou,
acompanhado do seu superior. Ambos me convidam
para almoçar. Neguei decididamente, porque o meu
confrade alemão foi excluído, embora tenha duas
vezes externado o seu desejo de almoçar. Quando
disse, que haveria de escrever todos os fatos para
os jornais do Brasil, um deles logo chispou: "Sobre
que vai escrever?" Respondi laconicamente: "So
bre tudo! " Foi o que bastou. Toda a encenação
envolveu-se em tom amistoso. Embora persistisse
em não aceitar comida, ficaram um tanto enleados.
Em consciência não pude aceitar, já que ao pároco
foi negado o almoço.
Foi isto que o articulista aproveitou no seu
"Prato de Sopa", dizendo que os orientais tratavam
a um indivíduo do outro continente com maior gen
tileza do que ao próprio irmão, separado apenas
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pela distância de wn quilómetro. "E este sacerdote
de além-mar, rematou o articulista, mostrou maior
coleguismo, do que os próprios vizinhos e irmãos
do mesmo sangue!"
Os verdadeiros abismos:
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Naquele dia memorável, em que vi tanta rea
lidade negativa e tanta mentira e covardia moral,
encontrei também corações nobres, dos quais até
hoje guardo simpática recordação.
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16. As homenagens a uma
Senhora
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te ao colo. De olhos abertos, cheios de doçura e
amor, a Virgem olha para as mães romanas, que
dia por dia se ajoelham a seus pés, pedindo um
parto abençoado. Todas as futuras mães de Roma
sabem, que é lá que podem encontrar uma bênção
especial para a sua grande missão!
Ainda em Roma, a suntuosa Igreja do Gesu,
perto da monumental Piazza Venezia, inclui uma
capelinha lateral, semi-escura, onde de manhã até
a noite, devotos fiéis se ajoelham, rezando o rosá
rio. É a Madonna della Strada, cuja devoção remon
ta aos tempos de Santo Inácio, que no século XVI
incutiu no povo romano esta devoção à Virgem da
Estrada. A pequena imagem a óleo, é tida como
milagrosa, e não deixa partir desconsolado a quem
se prostrar a seus pés.
Na veneranda Basílica de Santa Maria Maior,
o povo romano cerca com entusiasmo a miraculosa
imagem de Nossa Senhora Salvação do Povo Ro
mano, à qual o Papa Pio XII veio agradecer, com
imensa mole de fiéis, a salvação contra o bombar
deio ameaçado pelos soldados nazistas, na última
Guerra Mundial.
Nas montanhas da Stúça, eternamente borde
jadas de neve, encontramos o Santuário de Nossa
Senhora de Einsiedeln. A imponente Basílica esten
de seus dois braços de colunatas, num amor uni
versal, a exemplo da colunata de Bernini, na Piazza
de São Pedro, em Roma. Os filhos de São Bento
atendem, da manhã até a noite, os numerosos pe-
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regrinos, que afluem de todas as partes do mundo,
cumprindo promessas e procurando a paz da alma,
no Sacramento da Penitência. O rosto bronzeado
da estatueta, recamado de ouro e sedas, indica aos
peregrinos a riqueza de amor de seu coração ma
ternal.
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Sentir, vivencialmente, esta verdade fundamental,
é uma grande graça, talvez um milagre!
Em Fátima, de Portugal, encontramos a região
do sossego e recolhimento. As montanhas silen
ciosas, ao derredor, com os primitivos moinhos de
vento, em seu topo, esperando algumas baforadas
para se moverem, envolvem estas paragens duma
atmosfera de paz e tranqüilidade. É o santuário
da oração, onde os mascates são proibidos de im
pingir, aos turistas incautos, objetos religiosos, com
preços exorbitantes. As lojas ficam lá fora, na pe
riferia, antes de se entrar no terreno reservado ao
Santuário. A cada passo, uma placa despretenciosa
avisa cristãmente: "O lugar, que pisas, é santo!
Reza! " Lúcia, a única das três pastorinhas, que
ainda vive, continua a rezar o seu rosário, atrás
das grades do Carmelo, em Coimbra. A sua alegria
consiste em saber, que milhares de peregrinos acor
rem ao pé da azinheira, para rezar, enquanto ela
fica no esquecimento. Passarinhos portugueses,
trêfegos, saltitam por entre a ramagem da azinhei
ra, e o turista mais atento descobre escondido lá
dentro um pequeno sino, que de vez em quando
anuncia a hora da Ave Maria . . .
Viajando de Nápoles em direção do Monte Ve
súvio, encontramos a seus pés o suntuoso santuário
de Nossa Senhora de Pompéia. A cidade morta,
que é Pompéia, mostra-nos ainda hoje toda a sua
carcassa. Naquela vez, o vulcão cuspiu uma imun
dície sobre a cidade, a ponto de ficar soterrada e
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asfixiada sob as cinzas. No museu vimos aquele
fac-simile do cão, que se estorcia nos paroxismos
da dor. Aquela senhora deitada de bruços indica
também a angústia por que deve passar um ser,
quando morre asfixiado. Libertada das cinzas, com
meticulosidade cientifica, a cidade ainda hoje mos
tra as suas ruas, os seus quarteirões, teatros, pala
cetes, chafarizes, foruns e lupanares.
Entrando na Basílica do Rosário de Pompéia,
notamos um fervilhar devoto do povo cristão. Re
vestido de ouro brilhante, o seu interno indica mui
ta riqueza. O Vesúvio apagou-se, enterrando a ca
beça entre as nuvens, enquanto o Santuário maria
no de Pompéia, aí do lado, continua a acender os
corações no fogo do verdadeiro amor.
Viajando sobre o dorso ondulado do pai Reno,
que já presenciou os combates dos antigos roma
nos, e foi diversas vezes tingido pelo sangue de
guerras e revoluções, nos séculos passados, topa
mos, às suas margens, com o famoso Santuário
mariano de Bornhofen. Falanges diárias compri
mem-se pelas portas deste velho templo da Virgem.
De automóvel, ônibus, trem, a pé, ou de vapores
todo engalanados achegam-se os peregrinos deste
santuário. No meio dos vinhedos, nas encostas, e
entre os vetustos castelos, nos cumes, aparece estP
santuário da Virgem, como a pérola do Reno. Os
rios de graças, que jorram desta minúscula estatue
ta da Virgem, são muito mais fecundas do que as
águas deste rio multis-secular.
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Na Vestfália, da Alemanha, nas proximidades
da cidade de Münster, surge o santuário da penitên
cia de Telgte. É Nossa Senhora das Dores, todos
os dias assediada por devotos peregrinos, que a pro
curam consolar. Um dos consoladores fiéis foi o
célebre Cardeal de Münster, Klemens von Galen,
alcunhado pelo povo de Leão de Münster, por ter
sido um inimigo declarado e corajoso do Nazismo
de Hitler. Esta cidade, corajosamente católica,
orientada por este bispo intrépido, guarda até hoje
a honra de Hitler jamais ter entrado em suas por
tas, por temer um estrondoso fracasso político. A
localidade de Telgte imprimiu nos seus arredores
um espírito tão genuino de penitência, que esta re
gião nórdica da Alemanha é conhecida como um
baluarte do catolicismo, e é de lá que sempre par
tiam e partem generosos grupos de missionários
para todas as partes do mundo.
Kevelaer é talvez o Santuário mariano mais
movimentado da Alemanha, atraindo inúmeros pe
regrinos da Holanda, por estar junto às suas fron
teiras. A imagem pequena e desbotada da grandeza
de uns dez centímetros é um imã de forças incal
culáveis. Do seu lado ergueu-se uma grande Casa
de Retiros, onde sacerdotes e leigos se reabastecem
de forças espirituais, alargando os seus horizontes
da vida, eternidade adentro.
No sul da Alemanha, na Baviera, visitamos o
simpático Santuário mariano de Alti:itting. Como
sempre, também aqui a imagem da Virgem é mi-
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núscula e despretenciosa. O grande asceta do Car
melo, São José da Cruz tem razão, quando afirma
que Deus escolhe justamente os instrumentos mais
obscuros, para conquistar as almas. Não são as
estátuas mais belas, coloridas e bem formadas, que
mais graças alcançam, mas é a fé mais pura e o
amor mais sincero à Virgem, que as merece. Os
ex-votos desta capelinha circular, no meio da Praça,
em Altõtting, são dum número extraordinário, a
ponto de revestirem todas as paredes internas. Ao
longo destas paredes, encontra-se um ex-voto, que
é talvez o mais querido da Virgem.
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já no declinar da vida, este garboso militar excla
mou num desafio santo: "Nunca me embebedei,
nunca fui Imoral e nunca perdi uma batalha! "
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17. O berço dos Heróis
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do pelo próprio São João da Cruz, confessor e dire
tor espiritual da Santa nústica. Arrisquei o pedido,
por entre a roda, e uma voz quase celeste anuiu,
quando soube que eu era do Brasil.
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Loyola, caído com a perna estraçalhada, num dos
ataques franceses ao forte de Pamplona. Inácio de
Loyola, fundador da ordem dos jesuítas, é um filho
genuíno da terra basca: seriedade e destemor mes
clam-se com a solenidade e reverência. É o santo
do amor reverencial para com Deus! Amar a Deus,
com respeito! O amor indica aproximação, e o res
peito guarda a devida distância. É o santo da terra
basca, onde as regiões reúnem o contraste do aus
tero e do atraente!
Deixando o centro moderno de Lisboa, e subin
do a parte antiga na direção do Castelo de São Jor
ge, encontramos o berço de Santo Antõnio, a gló
ria dos portugueses. Na cripta da igreja, a tradi
ção guarda o recanto, em que este jovial filho de
São Francisco veio ao mundo. Santo Antõnio de
Pádua (porque morreu em Pádua, na Itália) , ou
Santo Antõnio de Lisboa (porque nasceu na capi
tal de Portugal ) , é um santo atraentemente jovial,
caridoso, integralmente franciscano. Lisboa, verda
deira cidade-sorriso, a capital do jardim plantado 1!
beira-mar, a cidade que se debruça amorosa sobre
o vasto Rio Tejo, é um mimo da natureza. Ao turis
ta de hoje ela deixa para sempre uma agradável re
cordação, com o leve desejo de vê-la e revê-la mais
vezes. Um quê de leveza e simpatia jovial paira so
bre esta cidade, abraçada pelo beijo úmido do Te
jo, e refrescada pelos ventos do Atlântico: aqui nas·
ceu o simpático Santo Antõnio!
Certa manhã, pus-me em demanda de outro lu-
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gar, onde também nasceu um herói da Igreja. Atra
vessei o Reno, às margens milenárias de Coblença,
onde o rio Mosela se une às suas águas. Escalei,
por duas horas, a pé, a montanha oposta, até che
gar ao lugarejo chamado Weitersburgo. Seguindo
as vielas tortuosas, topei com uma casa, tosca e an
tiga, cuja ossatura de tijolo foi vítima das intem
péries do tempo. "Aquí nasceu Pedro Friedhofen,
Fundador da Congregação dos Irmãos da Miseri
córdia de Nossa Senhora Auxiliadora!" Interessou
me a história deste herói. É um fundador de ordem
religiosa bem diferente dos demais. A sua Congre
gação dedica.se aos hospitais e doentes, e já se es
palhou por todo o mundo, inclusive pelo Brasil:
Maringá (Paraná) e Porto Alegre. Weitersburgo
ainda hoje é uma aldeia despretenciosa da Alema
nha, retraída do buliço turístico e industrial das
grandes veias comerciais da Renânia.
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desamparados e até mesmo loucos. É o herói da
caridade, da caridade escondida, tão escondida, co
mo foi escondida a sua profissão, e como foi escon
dida a aldeia, nas proximidades do Reno, onde nas
ceu . . .
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18. A Cidade que é uma "flor"
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ca o lugar do batismo de Jesus. Bordado de verde·
jantes árvores, escorre ele numa brisa refrigerante.
Belém! A gruta do nascimento, na cripta da
Basílica da Natividade, enche a alma do cristão de
imensa tristeza. Os anjos do Natal não cantam mais
o "Glória a Deus nas alturas e paz aos homens
de boa vontade". Um soldado muçulmano é guarda
de honra junto à estrela do nascimento, para evitar
intrigas entre os próprios cristãos. Todos querem
possuir, com exclusividade, este lugar tão sacro, e
é justamente aqui que mais devia brilhar o amor
entre irmãos.
A Basílica do Santo Sepulcro, que inclui o lu
gar do Calvário, passou, no correr da história, a
mãos alheias. Para abrir cada vez o portal da en
trada, os católicos devem pagar imposto às autori
dades árabes.
Monte das Oliveiras: impressionante a Hora
Santa. Cristãos de todos os países e de todas as lín
guas. Todos vieram, catolicamente, consolar o Mes
tre, no mesmo lugar, em que suou sangue. A pedra
esbranquiçada brota da terra, diante do altar, den
tro da Basílica das Nações, num silêncio de dor e
tristeza.
Via Sacra única no gênero: os diferentes gru
pos de peregrinos iam carregando a sua cruz de ma
deira, a exemplo de Cristo, e seguindo o mesmo
trajeto, que ele seguiu. Muçulmanos, puxando pelo
cabresto burricos, carregados de bugigangas, cor
tavam displicentemente a procisão dos peregrinos.
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Ao longo das estreitas vielas aglomeravam-se os
curiosos de todos os feitos. Queriam ver como os
cristãos do Ocidente homenageavam o seu "crucifi
cado".
Jerusalém, dividida em duas partes. O setor
antigo pertence à Jordânia, e a parte nova, moder
russima cabe a Israel. Há uma só passagem entre
estes dois países hostilizados, no centro da Jerusa
lém: é a Porta de Mandelbaum. A terra de nin
guém, que separa estas duas partes, jaz num aban·
dono de terreno baldio. Anos atrás um turista do
Nebrasca (USA) entrou nesta faixa de ninguém, pa
ra apanhar uma flor, e caiu morto por uma bala.
De ambos os lados há uma cortina de "balas".
O Monte Sion, lugar estratégico, passou a per
tencer a Israel, desde o armistício de 1948. Lá se
venera o túmulo de Davi, o Cenáculo, o lugar do
Pentecostes e da Dormição da Virgem. A torre da
igreja da Dormição está crivada de balas inimigas,
por se achar no ponto fronteiriço, e dentro do seu
campanário movimentam-se cabeças de soldados
hebreus, com os fuzis engatilhados.
Israel é impressionante. Um povo que trabalha
e realiza milagres. Transformaram os desertos em
paragens verdejantes de fecundos laranjais. Quem
não conhece na Europa as célebrees laranjas de Te!
Aviv, a capital comercial de Israel?!
O Monte Tabor, isolado no meio da planície
ondulante do Esdrelon, é o rei da zona, e arranca
de todo o turista, que lhe sobe as curvas sobrepos-
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tas, a exclamação de Pedro: "Como é bom estar
aqui!''
Naim: uma aldeia de poucas casas, mas toda
a criançada veio ao nosso encontro, sorrindo esfar
rapados e pedindo encarecidamente "Bakschisch"'
(esmola) .
Subimos o maciço galileu, e o ar tornava-se
leve, diáfano e refrescante. Subitamente vimos a
nossos pés uma cidadezinha escorrendo pelo vale e
subindo na outra encosta, num emaranhado de ca
sas sobrepostas. "Nazaré", exclamou o Padre North,
S. J., Diretor experimentado da excursão.
Um sentimento de emoção invadiu-me a alma.
Sempre quis ver esta cidade da Virgem. É o ponto
da terra, onde se desenrolou o fato mais importan
te da história humana. Naquela gruta, Já na encos
ta, morava uma donzela pura, casta e linda. Certo
dia, um mensageiro celeste entrou-lhe pela porta;
inclinando-se em profunda reverência: "AVE, cheia
de graça . . . "
A notícia mais alviçare!ra, que jamais ecoou
sobre o nosso planeta, foi ouvida aí: Deus viria à
terra, tornando-se homem . . .
Deus, o eterno Deus, que lançou num simples
ato de vontade, os astros pelo espaço, escolheu a
sua Mãe, nesta gruta esconsa e humilde. Nesta gru
ta, abraçaram-se o céu e a terra. Aí achou o seu
ponto de contacto, a enorme ponte, que foi lançada
entre o céu e a terra. Esta ponte é Cristo, verda-
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deiro Deus e verdadeiro Homem. Verdadeiro Ho
mem, para tomar sobre si a nossa culpa. Verda
deiro Deus, para dar um valor infinito à sua Satis
fação.
Aí pulsou o coração da Virgem mais bela e
pura, que jamais houve na terra. O próprio Deus,
ciumento como é, enamorou-se dela e a escolheu
exclusivamente, para a sua MAE!
Nazaré é chamada, etimologicamente, de "pé
rola" ou "flor". Ela é a "flor" da Galiléia, mas a
"flor" de Nazaré é "MARIA", que nos trouxe o Sal
vador do Mundo.
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19. Matéria - Espírito
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Em Lisboa avança por cima das ondas do Tejo
uma proa gigantesca, encimada pelo her6ico Dom
Infante Henrique, o Navegador, e seus desbravado
res. Aqui . . . ele entrou na galera, para conquistar
e descobrir novos mundos. Onde é este aqui? Ci
mento, ondas e o barranco do rio, nada mais. Onde
está o espírito empreendedor do Infante?!
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Nas proximidades de Nettuno, entrei na casa
dos Goretti, e vi o pequeno cercado, no centro da
sala onde se lê: "Aqui Maria Goretti foi assassinada
pelo impuro Alexandre Serenelli!" Que vejo!? O ve
lho assoalho atijolado, todo gasto . . . mas de Go
retti nada! Não consigo apalpar o heroísmo desta
menina, por entre a matéria, que piso!
Em Azpeitia, na Espanha, dois quilômetros dis
tante do castelo de Loyola, descubro a custo, na
penumbra da Igreja paroquial, um velho batistério
de pedra. Este batistérío, ainda hoje, recebe as
águas, que escorrem sobre cabecinhas inocentes.
Certa vez, a cabecinha de Ifiigo de Loyola foi esten
dida sobre este batistério. Procuro o espírito do gi
gante Inácio, por entre a escura concavidade do
batistério, mas nada vejo, nada encontro. Matéria
bruta e nada mais!
Na Terra Santa, vejo o Lago de Genesaré. Aqui
Jesus produziu a pesca milagrosa. Às suas margens,
preparou um belo guisado aos apóstolos. Com a voz
cheia de solenidade disse, um dia, às ondas enca
peladas: "Acalmai-vos!" Meus olhos estendem-se
gananciosos por sobre a imensa superfície das
águas . . . onde está Jesus? Onde está aquela força,
que um dia se fez sentir sobre esta mole imensa e
volúvel das águas?! Matéria! Espírito
O heroísmo, a santidade, a graça santificante,
não se apalpa, vive-se!
Vejo várias filas de automóveis, diante do si
nal fechado, numa das ruas mais movimentadas de
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Munique, na Alemanha. Em cada acelerador estão
dois olhos acesos, esperando o sinal verde. Ho
mens visíveis: matéria! Dentro de cada qual há
um mundo de espiritualidade. Aquele da direita,
todo bem trajado, cabelos luzidios de glostora, está
em pecado mortal. Ninguém o vê. Seu vizinho,
igualmente trajado a rigor, está em graça santifi
cante. Ninguém o vê. Ambos matéria. Mas um
deles, em cada qui!ômetro que avança, atrai o ódio
de Deus sobre si. O outro, em cada pulsação do
seu coração, é objeto do amor de Deus, porque pos
sui em si a mesma vida divina, que flui do seio da
Santíssima Trindade, por meio do divino Filho, à
terra, e agora é canalizada pelo sacramento do ba
tismo (ou renovada pelo Sacramento da Penitên
cia) a cada cristão. Se ele quiser conservar, todos
os dias, esta vida divina borbulhando dentro de si,
deverá sobrepor-se a todas as escaramuças e tenta
ções, que o hão de surpreender. Deverá ser um he
rói do espírito, até no íntimo dos pensamentos, que
ninguém vê!
É este o novo reino, que Cristo trouxe à terra.
O Reino Espiritual! "O meu reino não é deste mun
do" "O Reino de Deus está dentro de vós!"
O Reino dos músculos e das bombas atômicas
perecerá: porque é matéria. O reino da carne apo
drecerá: porque é matéria!
O Reino do Espírito é que vivifica tudo, confor
me a expressão vivencial de São Paulo. Vivifica tudo
o que tocar.
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Esta lição ensinaram-me todos os museus, to
das as recordações históricas, e todas as relíquias
dos santos e heróis . . .
Matéria . . . Espírito! . . .
INDICE
1. O Santo em farrapos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
2. Fariseus "incônscios. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
3. A boneca da santa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
4. O melhor professor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
5. A morte de Pio XII . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
6. A eleição de João XXIII . . . . . . . . . . . . . . 33
7. Corpos incorruptos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
8. O relógio da morte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
9. O jardim florido de Roma . . . . . . . . . . . . 48
10. O jovem Davi de Miguelângelo . . . . . . . . . 54
11. A cripta das 4.000 caveiras . . . . . . . . . . . . 59
12. O lírio de Roma e Nettuno . . . . . . . . . . . . 70
13. Um mês sob o bafo da morte . . . . . . . . . . 77
14. O segredo das montanhas . . . . . . . . . . . . 84
15. Minha prisão na cortina de ferro . . . ... 92
16. As homenagens a uma Senhora . . . . . . . 101
17. O berço dos heróis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109
18. Cidade que é uma "flor" . ...... . ...... 114
19. Matéria - espírito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 19
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rns R A s Do A u T o.R
1. BIOGRAFIAS
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24. Irmá Hevocata.
25. A Dama dos Três Corações - 2' ed.
26. O Gigante do Oriente.
2. DIARIOS
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4. COLEÇÃO: "RETIRO"
5. TRADUÇÕES
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Pessoas:
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