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INSTITUTO DE PSICANÁLISE SAÚDE E BEM ESTAR

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CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE

MÓDULO III

Sumário

DISCIPLINAS/UNIDADES

UNIDADE 1: FUNDAMENTOS DA TÉCNICA PSICANALÍTICA II 4

UNIDADE 2: SEXOLOGIA I 36

UNIDADE 3: SEXOLOGIA II 74

UNIDADE 4: PSICOTERAPIA I 101

UNIDADE 5: PSICOTERAPIA II 108

UNIDADE 6: CLÍNICA INFANTIL I 120


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DICAS PARA UM BOM APRENDIZADO DURANTE O CURSO

Organizem seus horários de estudos, procurando variar seu planejamento do programa,


alternando entre ler, escrever, resolver atividades. O ideal seria dedicar 2 (duas) horas
diárias ao seu estudo. Sabemos, porém,
Que em determinados dias à disponibilidade de tempo será pequena e, em outros,
será bem maior, havendo uma compensação natural;
Estabeleça um tempo de reserva, pois imprevistos podem ocorrer.
O planejamento só é racional se os períodos de estudos corresponderem ao seu ritmo
de vida e forem previstos pausas e tempo livre para descanso.
Melhore sua concentração através de um programa de treinamento pessoal,
observando os seguintes pontos:
· Estude uma coisa de cada vez;
· Separe as fases de trabalho das de descanso;
· Sempre que possível, estabeleça horário para estudar;
· Avalie suas capacidades e estabeleça metas possíveis de atingir.

Lembre-se que você não está sozinho, ou sozinha colocamos a sua disposição para
tirar suas dúvidas em relação aos conteúdos, atividades, e exercícios no decorrer do
curso.
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Unidade

FUNDAMENTOS DA TÉCNICA PSICANALÍTICA II 1


Índice

4. Técnica para analisar resistência


4.1 considerações preliminares
4.1.1 dinâmica da situação de tratamento
4.1.2 como é que o analista escuta
4.2 a identificação ou descoberta da resistência
4.3 confrontação: a demonstração de resistência
4.4 o esclarecimento da resistência
4.5 a interpretação da resistência
4.5.1 interpretando o motivo da resistência
4.5.2 interpretando a forma de resistência
4.6 problemas especiais ao analisar resistência
4.6.1 as resistências nas primeiras sessões
4.6.2 resistência à resistência
4.6.3 o segredo

5. Transferência
5.1 O que é e a sua importância para o processo terapêutico

6. As teorias topográficas e estrutural e a sua inter-relação com a transferência


6.1 A Teoria Topográfica
6.1.1 consciente
6.1.2 pré-consciente
6.1.3 inconsciente
6.2 A Teoria Estrutural
6.2.1 o Id
6.2.1.1 a transferência e o id; a compulsão à repetição
6.2.2 o Ego
6.2.3 o Superego
6.2.3.1 transferência e superego

7. As implicações da transferência na relação paciente-analista 8. A classificação


das reações transferênciais
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8.1 a transferência positiva
8.2 a transferência negativa

9. Neurose de transferência

10. Transferência e resistência

11. A contratransferência

12. Referências bibliográficas

4. TÉCNICA PARA ANALISAR RESISTÊNCIA

4.1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

A Psicanálise como técnica só começou a existir, quando as resistências foram


analisadas e não evitadas ou superadas por outros meios. Não se pode definir técnica
psicanalítica sem incluir o conceito da análise de resistência completo e sólido.

Não se deve entender a resistência apenas com oposição ao progresso de análise


embora seja esta a sua manifestação clínica mais óbvia e direta. O estudo das
resistências de um paciente irá lançar luz não só sobre muitas funções básicas do ego
como também sobre seus problemas ao se relacionar com objetos. Além disso, a análise
de resistência também explica a maneira pela qual as diversas funções do ego são
influenciadas intra-estruturalmente pelo id, superego e mundo externo. E ainda mais, as
resistências aos procedimentos terapêuticos reproduzem os conflitos neuróticos entre as
diferentes estruturas psíquicas. A relação oscilante entre as forças das resistências, por
um lado e o anseio de comunicar, por outro lado, pode ser notada com a maior nitidez
nas tentativas do paciente ao fazer a associação livre. Este é um dos motivos pelos quais
a associação livre é considerada o instrumento fundamental da comunicação no
procedimento psicanalítico.

4.1.1 DINÂMICA DA SITUAÇÃO DE TRATAMENTO

A situação de tratamento mobiliza tendências conflitantes dentro do pacientes. Antes de


tentarmos analisar as resistências do paciente, seria útil examinar o alinhamento das
forças dentro do paciente. “Começarei enumerando aquelas que são favoráveis ao
psicanalista, aos processos e procedimentos psicanalíticos” (Ralph Greenson).

1) A desgraça neurótica do paciente que o impede a trabalhar na análise por mais


doloroso que seja.

2) O ego racional consciente do paciente que não perde de vista os objetivos do longo
alcance e tem uma noção da base lógica da terapia.

3) O Id, o reprimido e seus derivados; todas aquelas forças dentro do paciente à procura
de descarga e com tendência para aparecer nas produções do paciente.
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4) A aliança de trabalho que capacita o paciente a cooperar com o psicanalista apesar
da coexistência de sentimentos transferenciais opostos.

5) A transferência positiva desinstintualizada que permite ao paciente supervalorizar a


competência do analista. Baseando-se nas poucas provas de que dispõe, o paciente
vai aceitar o analista como um especialista, ou entendido no assunto.

6) O superego racional que impele o paciente a cumprir seus deveres e compromissos.

7) Curiosidade e desejo de se conhecer que motivam o paciente para se explorar e se


revelar.

8) O desejo de progresso profissional e outros tipos de ambição.

9) Fatores irracionais, como sentimentos competitivos em relação a outros pacientes,


valorizar o próprio dinheiro, a necessidade de reparação e confissão, tudo isto
constituindo aliados inseguros e provisórios do psicanalista.

Todas as forças enumeradas acima, influenciam o paciente a trabalhar na situação


analítica. Elas variam em valor e eficiência e mudam no decorrer do tratamento.

As forças que, dentro do paciente, se opõem aos processos e procedimentos analíticos,


podem ser examinadas da seguinte maneira.

1. As manobras defensivas do ego inconsciente que fornecem os modelos para as


operações de resistência.

2. O medo da mudança e a busca de segurança que impele o ego infantil a se agarrar


aos padrões neuróticos familiares.

3. O superego irracional que exige sofrimento a fim de expiar uma culpa inconsciente.

4. A transferência hostil que motiva o paciente a derrotar o psicanalista.

5. A transferência romântica e sexual que leva à inveja e frustração e, finalmente, a uma


transferência hostil.

6. Impulsos sádicos e masoquistas que impulsionam o paciente a criar uma variedade


de prazeres dolorosos.

7. Impulsividade e tendências à atuação que impelem o paciente na direção de


gratificações rápidas e, ao mesmo tempo, lutando contra a compreensão interna.

8. Os ganhos secundários da doença neurótica que tentam o paciente a ficar preso à


sua neurose.

Estas são as forças que a situação analítica mobiliza no paciente. Quando se ouve um
paciente, convém trazer em mente esta divisão bem simplificada de forças.
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4.1.2 COMO É QUE O ANALISTA ESCUTA

O analista escuta com três objetivos em mente:

(1) traduzir as produções do paciente para seus antecedentes inconscientes. Os


pensamentos, fantasias, sentimentos, comportamento e impulsos do paciente têm
que ser pesquisados até os seus predecessores inconscientes.

(2) Os elementos inconscientes devem ser sintetizados em introvisões inteligíveis. Os


fragmentos da história passada e presente, conscientes e inconscientes, devem ser
relacionados entre si de maneira a dar uma idéia de continuidade e coerência à vida
do paciente.

(3) As introvisões obtidas devem poder ser comunicáveis ao paciente. À medida que se
escuta, é preciso verificar que material – daquilo tudo que veio à tona – será utilizado
construtivamente pelo paciente.

O analista escuta com atenção uniformemente flutuante. Não se faz uma tentativa
consciente para se lembrar. O analista vai se lembrar dos dados importantes se ele
presta atenção e se o paciente não está despertando as reações transferenciais do
próprio analista. A atenção não-seletiva, não-direcionada, irá governar nossas próprias
tendências especiais e irá permitir que o analista acompanhe a conduta do paciente.
Dessa atenção flutuante uniforme, o analista pode oscilar e fazer misturas com o que
veio de suas associações livre, empatia, intuição, introspecção, raciocínio solucionador,
conhecimento teórico etc.

4.2 A IDENTIFICAÇÃO OU DESCOBERTA DA RESISTÊNCIA

A primeira tarefa do analista é identificar ou descobrir a presença da resistência. O que


pode ser muito simples quando a resistência é óbvia. Torna-se mais difícil quando a
resistência é sutil, complexa, vaga ou egossintônica ao paciente. Nestas circunstâncias,
o paciente pode complicar nossa tarefa tentando encobrir o fato de que está fugindo de
alguma coisa.

4.3 CONFRONTAÇÃO: A DEMONSTRAÇÃO DE RESISTÊNCIA

Nosso dever é fazer o paciente compreender que ele está resistindo, por que está
resistindo, a que ele está resistindo e como está resistindo.

Demonstrar a resistência pode ser uma medida relativamente simples ou até mesmo
desnecessária se a é evidente para o paciente. Se não for esse o caso, se o paciente
não está cônscio da resistência, então é fundamental confrontar o paciente com o fato
de que há uma resistência presente antes de tentarmos qualquer outra coisa. A
capacidade do paciente em identificar uma resistência vai depender de duas coisas: O
estado de seu ego racional e a vivacidade da resistência. Um ego profundamente
racional vai tomar conhecimento até mesmo da resistência mais simples e um ego pouco
racional vai exigir uma evidencia arrasadora da resistência. Nossa tarefa consiste em
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avaliar, através da observação e da empatia, o estado do ego racional do paciente a fim
de determinar o grau de clareza que a evidência da resistência deve ter para que o
paciente possa reconhecê-la como tal. A confrontação do paciente só deve ser feita
quando existe uma possibilidade de que a confrontação vai ser significativa para ele e
somente quando ele não tiver sucesso em sua tentativa de negar ou minimizar a validade
dessa resistência. A demonstração prematura de uma resistência não é apenas uma
perda de tempo mas dispersa um material que poderia ser eficiente posteriormente. Por
mais clara que posa parecer a evidência da resistência, o fato decisivo é – será que esta
confrontação vai fazer sentido para o paciente?

Outra técnica para ajudar o paciente é identificar a presença de forças resistências que
consiste em apontar todas as evidências clínicas. Só se pode provar alguma coisa a um
ego racional – vamos ter que esperar até que apareça um ego racional ou até que a
evidência fique tão arrasadora que mesmo o ego racional mais fraco será obrigado a
tomar conhecimento da resistência.

4.4 O ESCLARECIMENTO DA RESISTÊNCIA

Vamos prosseguir com o procedimento para analisar uma resistência. Fazemos com que
o paciente se conscientize de que tem uma resistência. O que fazemos a seguir? Existem
três possibilidades que podemos agora observar: (1) Porque o paciente está evitando?
(2) O que o paciente está evitando? (3) Como o paciente está evitando? As duas
primeiras perguntas: por que o paciente está evitando podem, juntas, ser consideradas
como motivo para a resistência. A pergunta: Como o paciente está evitando, refere-se
ao modo de resistência. Em ambos os casos, a análise prosseguiria pelo esclarecimento
do assunto sendo examinado. Tentaríamos aumentar nosso enfoque no processo
psíquico que estamos procurando analisar. Com todo o cuidado, separaríamos e
isolaríamos o motivo ou modo especial de resistência que estamos procurando
investigar. Os detalhes importantes teriam que ser desenterrados e cuidadosamente
separados do assunto externo.

O paciente resistente está tentando bloquear alguma emoção dolorosa como ansiedade,
culpa, vergonha ou depressão, ou alguma combinação de disso tudo. Algumas vezes,
apesar da resistência, o afeto doloroso é óbvio porque o paciente se comporta de uma
forma que é característica desse afeto específico. Por exemplo, um paciente falando
hesitantemente ou usando jargões cobrindo o rosto com as mãos, virando seu rosto de
modo que ninguém pode ver qualquer porção do seu rosto, cobrindo sua área genital
com as mãos ou repentinamente, cruzando as pernas bem apertadas etc. Esconder um
comportamento indica vergonha. Tremores, transpiração, secura da língua e da boca,
tensão muscular, tiritar de frio ou rigidez podem ser sinais de medo. Num paciente que
vem falando num tom lento e tristonho, o queixo retesado, os suspiros, silêncio, o engolir
doloroso e os punhos cerrados, tudo isso pode indicar a luta contras as lágrimas e a
depressão.

Em todas estas circunstâncias, estamos procurando detectar as reações corpóreas e não


verbais que estão ocorrendo. Elas nos podem fornecer pistas sobre o afeto doloroso
especial com que o paciente está lutando. Se pensamos que podemos detectar o afeto
específico, podemos confrontar o paciente com: “Você parece estar embaraçado, ou com
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medo, ou amargurado, ou com medo de chorar”. Podemos dizer, “Você parece”, não
“Você está”. Por quê? Porque, antes de mais nada, poderíamos estar errados e, em
segundo lugar, queremos dar uma chance de fugir se precisar fazer isso. Mais tarde,
poderemos ficar mais afirmativo se estamos mais seguro de estar certo ou se sua fuga
do trabalho com as resistências se devem tornar o assunto de discussão.

Se não conseguimos detectar o afeto doloroso especial, então simplesmente


perguntaríamos: “Quais os sentimentos que você está tentando afastar? ou “O que você
está sentindo enquanto está deitado aí em silêncio”.

Temos que mencionar aqui alguns pontos técnicos importantes. Nossa linguagem deve
ser simples, clara, concreta e direta. Quando estamos procurando tocar no afeto especial
contra o qual o paciente poderia estar lutando, temos que ser o mais específico e exato
possível. Escolhemos a palavra que parece descrever o que está acontecendo dentro do
paciente, a palavra que reflete a situação do paciente no momento. Se o paciente parece
estar vivendo um afeto como se fosse uma criança, por exemplo, se o paciente parece
ansioso como uma criança, podemos dizer: “Você parece assustado”, porque essa é uma
palavra infantil. Jamais poderíamos dizer: “Você parece apreensivo”, porque isso não
serviria, essa é uma palavra adulta. Além disso, “assustado” é evocativo, desperta cenas
e associações ao passo que “apreensivo” é banal. Usaremos palavras como acanhado,
tímido ou envergonhado, se o paciente parece estar lutando com sentimentos de
vergonha do passado.

Além disso, poderemos calcular a intensidade do afeto com o maior cuidado possível. Se
o paciente está com muita raiva não dizemos: “Você parece aborrecido” mas diríamos:
“Você parece furioso”. Empregamos a palavra comum e vivaz para expressar a
quantidade e qualidade de afeto que, em nossa opinião, está acontecendo. Diremos
coisas como: Você parece irritado ou mordaz ou resmunguento ou rabugento ou inflexível
ou briguento ou furioso, para descrever diferentes espécies de hostilidades. Como são
diferentes as associações feitas com “resmunguento’ se comparados com as que
aparecem como “hostil”. Ao tentar esclarecer e descobrir o afeto doloroso e as
recordações associadas com aquele afeto específico, a palavra empregada deve estar
correta em relação ao tempo, qualidade, quantidade e entonação.

Assim como procuramos esclarecer o afeto que provoca a resistência, assim também
devemos procurar esclarecer o impulso causador do afeto se isso surgir na análise.

4.5 A INTERPRETAÇÃO DA RESISTÊNCIA

4.5.1 INTERPRETANDO O MOTIVO DA RESISTÊNCIA

Algumas vezes, não é necessário que o analista demonstre e esclareça a resistência


porque o paciente faz isso sozinho espontaneamente. Depois de demonstrada e
esclarecida a resistência, estamos prontos para interpretar os determinantes
inconscientes. Isso quer dizer que tentamos descobrir os impulsos instintuais, fantasias
ou recordações escondidas, responsáveis que são pela resistência. Ao analisar o motivo
para uma resistência, deveríamos procurar investigar o conteúdo que provocou o afeto
doloroso que deu origem a resistência.
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O paciente evita porque se quer livrar de algum sentimento doloroso. Mas qual conteúdo,
que material está despertando a emoção dolorosa? Mas, existem circunstâncias em que
não fica claro nem o porquê, nem a que, o paciente está resistindo. Um paciente pode
manter silêncio mais ou menos durante uma sessão inteira e não deixar escapar
nenhuma pista sobre o que está acontecendo nem pelas suas reações corpóreas nem
pelas expressões faciais. Isso raramente ocorre. O silêncio absoluto ou a ausência de
expressão corporal ou facial poderiam ser pistas para fantasias sobre morte, coma ou
sono profundo.

As resistências que ocorrem à análise são uma repetição dos fatos acontecidos
anteriormente na vida do paciente. As resistência não são um artifício da análise, não
são criações novas, mas repetições, edições novas de fatos passados.

Devemos insistir numa observação clínica importante: é que a fonte mais freqüente de
resistência é a situação transferencial. Quando todas as outras são iguais, obscuras ou
desconhecidas, deve procurar-se as reações transferenciais como a fonte de resistência.

4.5.2 INTERPRETANDO A FORMA DE RESISTÊNCIA

Algumas vezes ao tentar analisar uma resistência, o caminho mais promissor para a
investigação da resistência não é o afeto, o impulso, ou fato causativo. Pode ser que a
forma da resistência, o método ou o meio de transferência, ofereça o caminho mais
proveitoso para a investigação. Pode ser esse o caso se a forma de resistência se repete
muitas vezes e nesse caso, estamos, provavelmente, lidando com um traço de caráter.
Embora a análise da forma talvez nem sempre seja a primeira abordagem à análise da
resistência, os métodos típicos e habituais de resistência de acabam transformando no
assunto da análise porque este procedimento constitui o acesso para a análise das assim
chamadas defesas de caráter. Se a forma de resistência é bizarra e “descaracterizada”
para o paciente, ela é, geralmente, uma ação sintomática e, comumente, mas facilmente
acessível ao ego racional do paciente.

Depois que o paciente identificou o aspecto resistência do seu comportamento, nossa


tarefa seguinte é o esclarecimento. Agora saímos à procura de comportamento fora da
análise e então acompanhamos a história e o objetivo desta atividade. O que aconteceu
na vida do paciente para que escolhesse este tipo de resistência?

É importante, além disso, não fazer o jogo da resistência do paciente utilizando o mesmo
tipo de resistência que ele. Se o paciente está em silêncio, você deve estar atento para
que seu próprio silêncio não seja uma contra-resistência. Ou então se ele emprega uma
linguagem afetada, obscenidades ou jargões, você não deve acompanhar essa
resistência ou fazer o oposto. O importante é ser direto e pertinente sem ser rude, ser
provocar com brincadeiras e sem ficar censurando.

Finalmente, é importante compreender que por mais habilidosos e por mais corretos que
sejamos no trabalho com as resistências, elas tornam a voltar. É bom que nos lembremos
da observação de Freud: que a resistência vai estar presente a cada passo, em cada
aspecto, em cada sessão de análise até que a análise termine. A elaboração é
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necessária para que uma determinada resistência perca sua patogenia. A análise da
resistência não é um desvio da análise mais parte fundamental e necessária de toda a
análise.

4.6 PROBLEMAS ESPECIAIS AO ANALISAR RESISTÊNCIA

4.6.1 AS RESISTÊNCIAS NAS PRIMEIRAS SESSÕES

Deve dizer-se ao paciente que a resistência é uma atividade do paciente. É uma ação
que está praticando ou inconscientemente, ou pré-conscientemente ou conscientemente
(Fenichel).

No momento oportuno, deve dizer-se ao paciente que a percepção da resistência e a


análise da resistência constituem partes valiosas, importantes e necessários da
psicanálise. A resistência não é um erro, um defeito ou uma fraqueza do paciente. Não
se deve sentir merecedor de críticas ou rejeições por ter resistências.

Uma outra boa medida no início da análise é perguntar ao paciente como ele sentiu
enquanto descrevia algum fato durante a sessão. Isso faz com que ele se acostume a
trazer suas emoções e reações corpóreas para as suas associações. Podemos perguntar
o que estava imaginando enquanto se desenvolvia determinada atividade para que se
perceba da importância das suas fantasias.

4.6.2 RESISTÊNCIA À RESISTÊNCIA

Em geral, os pacientes vão esconder suas resistências por dois motivos principais: (1)
Têm vergonha ou medo de revelar um estado de resistência. Resistência quer dizer
defeito e vão levar à perda do amor ou à punição. (2) eles têm medo de mostrar uma
situação que está causando resistência – geralmente para evitar um material que acham
que poderiam provocar uma reação transferencial hostil. Existem pacientes que tem
medo de ficar com raiva. Em geral, tentam encobrir sua raiva com o sentimento oposto
– tentar agradar e submissão.

4.6.3 O SEGREDO

Nossa tarefa costumeira, em análise, é descobrir os segredos inconscientes do paciente;


o paciente não está cônscio das recordações que traz escondidos dentro de si; elas
também constituem um segredo para seu ego consciente. Embora possa ter resistência
pré-consciente e inconscientes às nossas investigações, o paciente, em geral, é
favorável ao trabalho analítico, pelo menos conscientemente. Mas, às vezes, realmente
acontece que um paciente vai tentar, conscientemente esconder determinado material
do analista. Na maioria dos casos esse retraimento deliberado e voluntário é passageiro
e, geralmente, o próprio paciente acaba superando esse retraimento – confessando,
então, seu segredo. Mas, existem pacientes que guardam um segredo por muito tempo
e não conseguem superar esta resistência consciente sem nossa ajuda.

Nosso comportamento básico é que não deve haver concessão alguma quanto aos
segredos: eles têm que ser analisados. Todavia, também é importante compreender que
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é um erro usar coerção, ameaças ou súplicas para fazer o paciente contar seu segredo.
É tão errado forçar os pacientes a entregar seus segredos como é errado permitir que
tenham segredos. A atitude analítica é que devemos tentar analisar segredos como o
faríamos com qualquer outro tipo de resistência. Somos tão inflexíveis quanto pacientes.

5. TRANSFERÊNCIA

“Em todo ser vivo, aquilo que designamos como partes constituintes forma um todo
inseparável, que só pode ser estudado em conjunto, pois a parte não permite reconhecer
o todo, nem conjunto deve ser reconhecido nas partes...” (Goethe).

5.1 O QUE É E A SUA IMPORTÂNCIA PARA O PROCESSO TERAPÊUTICO

Em 1912, Freud escreveu um ensaio sobre a Dinâmica da Transferência, que serviu de


base para a prática psicanalítica. A análise profunda da transferência tornou-se o
elemento central do processo terapêutico.

Laplanche e Pontalis dão-nos uma boa conceituação do termo na visão psicanalítica:


“Transferência é o processo pelo qual os desejos inconscientes se atualizam sobre
determinados objetos no quadro de um certo tipo de relação estabelecida com eles,
eminentemente, no quadro da relação analítica. Trata-se de uma repetição de protótipos
infantis, vivida com um sentimento de atualidade acentuado”. (. 514). Vocabulário de
Psicanálise.

A transferência foi primeiramente descrita por Freud e refere-se aos sentimentos e


comportamentos do paciente em relação ao analista, os quais são baseados em desejos
infantis do paciente para com os pais ou figuras parentais. Esses sentimentos são
inconscientes, mas revelam-se na neurose de transferência, na qual os pacientes lutam
por gratificar seus desejos infantis inconscientes através do analista.

Freud descobre muito cedo o que determinava a possibilidade ou não de uma análise.
Através de seu desconhecimento e conseqüentemente do fracasso de uma análise
(Dora em questão), começa seu percurso de conceitualizar esse elemento fundamental
– a transferência. Daí em diante, por mais surpreendente que pareça, esse será o
conceito que unirá os psicanalistas. Há por ele uma unanimidade não encontrada em
nenhum outro. O que indica se tratar de um elemento indiscutível na análise.

No Dicionário de Psicanálise organizado por Chemana, transferência é conceituada


como um vínculo afetivo intenso, que se instaura de forma automática e atual, entre o
paciente e o analista, comprovando que a organização do paciente é comandada por um
objeto. O estabelecimento desse vínculo afetivo intenso é automático, incontornável e
independente de todo contexto de realidade.

Laplanche e Pontalis afirmam que existe especial dificuldade em propor uma definição
de transferência porque a noção assumiu, para numerosos autores, uma extensão muito
grande, que chega ao ponto de designar o conjunto de fenômenos que constituem a
relação do paciente com o psicanalista e que, nesta medida, veicula, muito mais do que
qualquer outra noção, o conjunto das concepções de cada analista sobre o tratamento,
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o seu objetivo, a sua dinâmica, a sua tática, os seus objetivos, etc. E, assim, estão
implicados nela toda uma série de problemas que são objetos de debates clássicos.

Esclarecendo de forma concisa, Laplanche e Pontalis continuam nos trazendo


informações preciosas sobre a transferência na visão de Freud:

“Na origem, a transferência não passa para Freud, pelo menos no plano teórico, de um
caso particular de deslocamento do afeto de uma representação para outra. Se a
representação do analista é escolhida de forma privilegiada, é porque constitui uma
espécie de “resto diurno” sempre à disposição do sujeito, e também porque este tipo de
transferência favorece a resistência, pois a confissão do desejo recalcado se torna
especialmente difícil se tem de ser feita à pessoa visada por ele.” (Vocabulário de
Psicanálise, 516).

Na primeira exposição de conjunto que consagra a transferência (1912), Freud mostra


que ela está ligada a “protótipos”, a imagos (principalmente a imago do pai, mas também
a imago da mãe, do irmão, etc.). Freud descobre que é a relação do sujeito com as figuras
parentais que é revivida na transferência, principalmente com a ambivalência pulsional
que a caracteriza.

Citando a afirmação de Freud no “Epílogo”, Etchegoyen confirma que o tratamento


psicanalítico não cria a transferência, “mas a descobre, a torna possível, de igual modo
que a outros processos psíquicos ocultos”. Ele afirma que “a transferência existe fora e
dentro da análise, a única diferença é que nesta ela é detectada continuamente”. Sua
conclusão é a de Freud, que, para ele e para nós, são palavras duradouras: “A
transferência destinada a ser o máximo obstáculo para a Psicanálise, se converte em
seu auxiliar mais poderoso, quando se consegue detectar em cada caso e traduzi-lo para
o enfermo”. (1987; p. 54).

Em muitos momentos de seus trabalhos, Freud fala da transferência, sublinha sua função
de aliada do processo analítico e a define rigorosamente a partir de três parâmetros
citados por Etchegoyen: realidade e fantasia, consciente e inconsciente, presente e
passado. A vida emocional que o paciente não pode recordar, conclui, é revivenciada
na transferência e é ali onde deve ser resolvida. A transferência é uma peculiar relação
de objeto de raiz infantil, de natureza inconsciente (processo primário) e, portanto
irracional, que confunde o passado com o presente, o que lhe dá seu caráter de resposta
inadequada, desajustada, inapropriada.

Numa análise histórica da teoria da transferência, Daniel Lagache coloca em evidência


alguns pontos muito importantes:

1. A transferência é um fenômeno freqüente e até mesmo regular; toda e qualquer


reivindicação dirigida à pessoa do terapeuta é uma transferência e o paciente é pego
a cada nova ocasião.

2. Segundo os exemplos e as explicações que Freud nos fornece, o mecanismo da


transferência supõe:
a) No passado, o recalcamento de um desejo.
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b) No presente e na relação com o terapeuta, o despertar do mesmo afeto que,
originalmente, forçou o paciente a banir esse desejo clandestino.
O mecanismo da transferência é, portanto, uma “falsa conexão”, uma “aliança
desigual”.

3. Tecnicamente, a dificuldade só pode ser superada tornando, em primeiro lugar, o


paciente consciente do obstáculo.

4. Do ponto de vista terapêutico, Freud ficou inicialmente contrariado com este desvio,
até o momento em que percebeu que o novo sintoma devia ser tratado como o antigo.

Assim, nos Estudos sobre a histeria, Freud já possui uma idéia clara de transferência, de
sua gênese, de sua importância técnica e terapêutica.

Ao iniciar seus estudos sobre a transferência, Greenson afirma que os maiores


progressos na técnica psicanalítica vieram das importantes descobertas de Freud sobre
o duplo poder da transferência: “É um instrumento de valor insubstituível e é a fonte dos
maiores perigos”. (1981; p. 167). As reações transferenciais oferecem ao analista uma
oportunidade inestimável para investigar o passado inacessível e o inconsciente.

A sua compreensão da transferência é colocada como um tipo de relacionamento


especial com uma pessoa – uma forma característica de relacionamento objetal. Ele diz
que a característica principal é a vivência de sentimentos – em relação a uma pessoa –
que não está endereçada àquela pessoa e que, na verdade, está à outra.
Fundamentalmente, uma pessoa no presente é reativada como se fosse uma pessoa do
passado. “A transferência é uma repetição, uma nova edição de um relacionamento
objetal antigo” (Freud in Greenson, 1987, p. 168).

É um anacronismo, uma falha no tempo. Houve um deslocamento; impulsos, sentimentos


e defesas visando a uma pessoa no passado foram transportados para uma pessoa no
presente. É basicamente um fenômeno inconsciente e a pessoa que reage com
sentimentos transferenciais está quase que totalmente inconsciente dessa distorção.
(ibidem, p. 168).

Lagache cita, em A Transferência, que em O ego e os mecanismos de defesa, Anna


Freud dedica algumas páginas para tratar especificamente da transferência e nos dá
uma definição muito clássica.

Por transferência entendemos todos aqueles impulsos do paciente devidos à sua relação
com o analista. Esses impulsos não são uma criação objetiva no decurso da análise, mas
emanam de relações objetais remotas (de fato, arcaicos) e ressuscitam, sob a influência
do automatismo de repetição, no decorrer da análise. (1990, p. 56).

Para Lagache, a transferência é, no sentido mais estrito, “um deslocamento de afeto para
a pessoa do analista” (1990, p. 103).

Greenson afirma que as reações transferênciais são sempre inadequadas. Inadequadas


na qualidade, quantidade ou duração da reação. A pessoa pode reagir a mais, ou a
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menos, ou então pode ter-se uma reação estranha ao objeto transferencial. A reação
transferencial é incompatível no seu contexto atual, mas já foi, certa vez, uma reação
adequada a uma situação do passado. Assim como as reações transferenciais não se
ajustam a uma pessoa no presente do mesmo modo elas se encaixam muito bem para
alguém no passado. As reações transferenciais são, portanto, essencialmente,
repetições de um relacionamento objetal do passado.

Concluindo, Greenson afirma que os fenômenos transferenciais são, sempre, repetições


do passado; o paciente repete com seu analista aquilo que não pode e não vai lembrar.
Portanto, seu comportamento transferencial é especialmente conveniente para fazer
reconstruções do passado e, na verdade, esta característica da transferência e que lhe
dá importância singular.

6. AS TEORIAS TOPOGRÁFICAS E ESTRUTURAL


E a sua inter-relação com a transferência.

A divisão do psíquico em que o que é consciente e o que é inconsciente constitui a


premissa fundamental da psicanálise, e somente ela torna possível a esta compreender
os processos patológicos da vida mental, que são tão comuns quanto importantes, e
encontrar lugar para eles na estrutura da ciência.

Estas teorias constituem a base da Psicanálise e a compreensão do fenômeno da


transferência está intimamente relacionada a este conhecimento. A Psicanálise se
resume em estudar esses elementos e em como eles se relacionam.

6.1 A TEORIA TOPOGRÁFICA

A teoria topográfica é conhecida como “os três andares do psiquismo” (Silva, 1970, p.
42). Do ponto de vista tópico, a psique comportaria três sistemas: inconsciente,
préconsciente e consciente.

6.1.1 CONSCIENTE

Segundo Freud, o consciente é como uma espécie de órgão sensorial de atenção que
opera em íntima associação com o pré-consciente. O sistema consciente no modelo
topográfico se caracteriza como a parte da mente na qual as percepções que vêm do
mundo externo ou de dentro do corpo ou da mente são trazidos à consciência. A
consciência é vista como um fenômeno subjetivo, cujo conteúdo pode ser comunicado
apenas pelo meio da linguagem ou do comportamento.

Os fatos acontecem no consciente, são gravados no pré-consciente e recalcados no


inconsciente. A Teoria Topográfica serve para explicar melhor a neurose.

6.1.2 PRÉ-CONSCIENTE

É o nosso arquivo de memória. Aí estão memórias que resgatamos quando queremos.


Para William James, o pré-consciente corresponderia “as franjas da consciência”.
Poderia também ser comparado a um arquivo morto: nomes, idéias, fatos não utilizados
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no dia-a-dia “desvanecem-se no crepúsculo do pré-consciente”, de tal sorte que como
acontece com um arquivo morto, podem ou não ser localizados pelo consciente, quando
este decide evocá-los.

É interessante notar que, como fronteira que é, o pré-consciente mantém intercâmbio


também com o inconsciente, seja recebendo dele material que quer vir à luz do dia, seja
enviando à sua escuridão aquilo que recebeu do consciente.

O sistema pré-consciente compreende aqueles conteúdos mentais capazes de serem


trazidos à consciência quando focalizamos a atenção. Conceitualmente, o préconsciente
liga-se às regiões, tanto inconsciente quanto consciente da mente. O préconsciente
também mantém a barreira repressiva e censura desejos e vontades inaceitáveis.

6.1.3 INCONSCIENTE

O conceito de inconsciente como uma entidade mental já era conhecido antes das
publicações de Freud. Freud encarou o inconsciente de uma maneira mais dinâmica de
acordo com todo um sistema mental. Para Freud tudo entra em nossa mente pelo
inconsciente. É a camada mais profunda do psiquismo. É um conjunto de processos
dinâmicos, formado por desejos recalcados e pela libido. Para Jung, assim como para
Freud, o inconsciente precisa ser aflorado ao consciente, onde chega necessitando de
interpretação. O inconsciente seria o “fundo de toda a vida psíquica” e contém tudo que
é mantido fora da consciência por bloqueios internos. Para o inconsciente são jogadas
as experiências e lembranças associadas a fortes emoções que foram como que
expulsas da consciência.

O sistema inconsciente é o componente dinâmico. Em outras palavras, os conteúdos e


processos mentais do inconsciente são mantidos fora da atenção através da força da
censura ou repressão. O inconsciente está estreitamente relacionado com as pulsões
instintivas. O conteúdo do inconsciente é limitado aos desejos que buscam gratificação.
Os conteúdos do inconsciente podem tornar-se conscientes unicamente passando pelo
pré-consciente, onde os censores são subjugados, permitindo que os elementos
ingressem na consciência.

Para Freud, o inconsciente é o verdadeiro psiquismo, o psiquismo real.

Em seu livro A Cura Pelo Espírito, Stefan Zweig deu um exemplo extremamente claro de
que compreendeu o que Freud expressou:
“O inconsciente não é em absoluto o resíduo da alma, mas, pelo contrário, sua
matéria prima, da qual só uma porção mínima alcança a superfície iluminada da
consciência; mas a parte principal, chamada inconsciente, que não se manifesta,
nem por isso está morta ou privada de dinamismo. Dotada de vida e ação influi de
modo efetivo sobre os nossos pensamentos e sentimentos, representando o setor
mais plástico de nossa existência psíquica”.

Como para Freud o inconsciente é o verdadeiro psiquismo, Tallaferro fez uma exposição
bem mais profunda de todas as suas características. É, pois, importante considerar os
modos próprios que o inconsciente tem de atual, que constituem o processo primário:
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a) ausência de cronologia;
b) ausência de conceito de contradição;
c) linguagem simbólica;
d) igualdade de valores para a realidade interna e a externa, ou a supremacia da primeira;
e) predomínio do princípio do prazer.

Assim como o sistema inconsciente é regido pelo processo primário, segundo Tallaferro,
também o pré-consciente tem leis próprias que constituem o processo secundário, que
compreende:

a) a elaboração de uma sucessão cronológica nas representações;


b) a descoberta de uma correlação lógica;
c) o preenchimento de lacunas existentes entre idéias isoladas;
d) a introdução do fator causal, ou seja, a relação de coexistência e sucessão entre o
fenômeno: relação causa-efeito.

6.2 A TEORIA ESTRUTURAL

A Teoria Estrutural é o segundo aspecto sob o qual se pode considerar a psique. A Teoria
Estrutural foi a última teoria elaborada por Freud sobre a constituição da mente, da
personalidade do ser humano.

Três sistemas estariam aí integrados: o Id, o ego e o superego. O modelo estrutural do


aparelho psíquico é a pedra fundamental da psicologia do ego. As três províncias – id,
ego e superego – são diferenciadas por suas diferentes funções.

6.2.1 O ID

A denominação “id” foi introduzida na terminologia psicanalítica por Greg Groddeck, que
por sua vez a tomou de Nietzche, sendo legitimada por Freud em 1923 em seu livro O
Ego e o ID. Corresponderia aos instintos primitivos, atuando exclusivamente no
inconsciente. É a fonte dos dois grandes impulsos de onde derivam todos os outros: o
amor e o ódio, os impulsos eróticos e agressivos ou ainda da permanente batalha entre
eros e tanatos – aquele o instinto da vida, ente o da morte e da destruição. Todo processo
da vida está ligado à batalha que essas fontes primitivas de energia e de impulsos travam
entre si e com a própria pessoa. Do domínio, controle e direção que se obtenha sobre
elas dependerá o curso da nossa vida. Embora este assunto tenha sido profundamente
estudado na visão psicanalítica de Freud, não é um assunto novo, já tendo sido citado
na Bíblia, através do Apostolo Paulo, para ressaltar o eterno conflito interno do ser
humano: “O bem que quero, este não faço, o mal que não quero, este faço”.

Tal como o inconsciente, o id é ilógico, atemporal e regido pelo princípio do prazer – isto
é, o que move é a busca do prazer a qualquer preço. O que caracteriza o comportamento
de uma criança. Em verdade, o id se torna adulto, permanecendo infantil e primitivo ao
longo de toda a vida, sempre procurando manifestar e obter o que quer, independente
das proibições, conveniências, convenções e até do prejuízo que possa causar a pessoa
de que faz parte. O id é chamado à realidade pelo ego. O id é inalterável. É o homem
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como máquina. A nível de id o homem não mudou através dos tempos. Freud usou o
termo “id” para referir-se a um reservatório das pulsões instintuais desorganizadas.

6.2.1.1 A TRANSFERÊNCIA E O ID; A COMPULSÃO À REPETIÇÃO

Em A Transferência, Lagache lembra-nos que a questão da transferência é abordada por


diversas vezes em Além do princípio do prazer (Freud, 1920); a transferência, com a
neurose traumática e os jogos infantis, é um dos dados psicológicos em que se apóia
Freud para demonstrar a existência de um automatismo de repetição, o qual transcende
o princípio de prazer-desprazer. Ele afirma categoricamente que a compulsão à
repetição, na transferência, é independente do princípio de prazer:

Ao invés da repetição no jogo infantil, é evidente que a tendência que o leva a reproduzir
por meio da transferência, os acontecimentos do período infantil de sua vida é, sob todos
os aspectos, independente do princípio de prazer, transcende-o, por assim dizer. O
doente comporta-se nessa ocasião de maneira inteiramente infantil e mostranos assim
que os traços mnêmicos recalcados prendem-se às suas mais primitivas experiências
psíquicas, que não existem nele em estado ligado e são até, numa certa medida,
incompatíveis com os processos secundários. Essa mesma tendência para a repetição
ergue-se freqüentemente diante de nós como um obstáculo terapêutico quando
queremos, no fim do tratamento, obter do paciente que se desprenda por completo do
analista. (p. 34).

Pode-se dizer, portanto, afirma Lagache, que se os fenômenos de transferência figuram


no primeiro plano entre os dados que decidem Freud a postular a compulsão à repetição,
esta, por sua vez, repercute no modo pessimista como ele apresenta os fenômenos de
transferência; só é utilizada a repetição automática das pulsões recalcadas; é deixado
de lado o aspecto dinâmico e talvez criador da tensão que as envolve em novas
experiências e as impele para novos objetos. Ao mesmo tempo, as hipóteses tópicas, ao
formularem de uma nova maneira a opinião entre o ego e as pulsões recalcadas, levam
Freud a acentuar a conformidade da defesa do ego com o princípio de prazer e, por
conseguinte, e não conformidade do id. (p. 35).

6.2.2 O EGO

É constituído durante toda a vida. É uma emanação do id no confronto com a realidade.


Ego quer dizer exatamente o “eu”, ao passo que id é um termo latino associado ao
alemão “es” por Nietzche, querendo dizer “ele”. Freud quis assim enfatizar a existência,
dentro de cada um de nós, de duas forças distintas: nós mesmos, da qual tomamos
consciência e controlamos e um outro (ele), que foge a nosso controle e que na verdade
desconhecemos. Ao contrário do id, que é puramente impulso, instinto e querer, e
totalmente irresponsável, o ego é pleno de responsabilidade e preocupação com as
conseqüências de seus atos. O ego possui a tarefa de auto-preservação. No que diz
respeito a conhecimentos externos, desempenha esta tarefa tornando-se consciente dos
estímulos, armazenando experiências sobre eles (na memória), evitando estímulos
excessivamente fortes (através da fuga), lidando com estímulos moderados (através da
adaptação) e, finalmente, aprendendo a realizar mudanças convenientes no mundo
externo para seu próprio beneficio (através da atividade).
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Toda mudança é alteração do ego. O ego é o órgão executivo da psique e controla a


motilidade, percepção, contato com a realidade e, através dos mecanismos de defesa de
que dispõe, o adiamento e modulação da expressão dos impulsos. O principal papel do
ego é coordenar funções e impulsos internos, e fazer com que os mesmos possam
expressar-se no mundo exterior sem conflitos. Ele tem duas funções muito importantes,
que são o exame da realidade e o trabalho de síntese.

A psicanálise é, para Freud, “um instrumento que capacita o ego a conseguir uma
progressiva conquista do id”. (Freud, 1969, p. 61).

Para Freud, em O Ego, e o Id, “o ego representa o que pode ser chamado de razão e
senso comum, em contraste com o id, que contém as paixões”. E para maior clareza de
suas argumentações ele faz uso da analogia:

A importância funcional do ego se manifesta no fato de que, normalmente, o controle


sobre as abordagens à motilidade compete a ele. Assim, em sua relação com o id, ele é
como um cavaleiro que tem de manter controlada a força superior do cavalo, com a
diferença de que o cavaleiro tenta fazê-lo com a sua própria força, enquanto o ego utiliza
forças tomadas de empréstimo. A analogia pode ser levada um pouco além. Com
freqüência um cavaleiro, se não deseja ver-se separado do cavalo, é obrigado a conduzi-
lo aonde este que ir; da mesma maneira, o ego tem o hábito de transformar em ação a
vontade do id, como se fosse sua própria. (1969, p. 25).

6.2.3 O SUPEREGO

Pode ser entendido como nosso censor e crítico inconsciente, embora uma íntima parte
dele corresponda à censura consciente. Nele entra toda a nossa bagagem cultural. O
superego estabelece e mantém a consciência moral da pessoa com base em um sistema
complexo de ideais e valores internalizados a partir dos próprios pais.

Freud via o superego como o herdeiro do complexo de Édipo. No círculo do SER, o


superego é formado pela interseção do id e do ego. A formação do superego decorre
basicamente da incorporação, que fazemos à nossa bagagem psíquica, dos valores, das
normas e dos padrões de comportamento que nos são legados, principalmente por
nossos pais e primeiros mestres, secundariamente, pelo meio social em que estamos
inseridos.

A função do superego pode se resumir em: acusar e criticar o ego. É, pois, o principal
responsável pelo sentimento de culpa que todos nós sentimos, tanto em nível consciente
quanto inconsciente. O superego funciona bem somente em uma mente normal. Em
psicóticos ele não filtra ou filtra mais do que deveria, não funciona como cerceador, como
componente da personalidade.

Na criança muito nova existe, pois, a predominância do id. Um bebê recém-nascido,


segundo Freud, é puramente id. À medida que cresce, a criança começa a perceber que
existem barreiras e limites que impedem a consecução de seus desejos. Lentamente,
então, forma-se, desenvolve-se e fortalece-se o ego. Este age, pois, principalmente na
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área da consciência, embora atue também, em menor escala, sobre a porção do
inconsciente. Daí para frente começa a formar-se o superego.

Diz Fenichel1: “A agressividade do id, antes dirigida para os objetos, contribui para formar
o superego, e essa agressividade assim transformada acaba tomando o ego por objeto,
com uma intensidade variável, conforme o objeto”. (Fenichel in Tallaferro, 1996, p. 98)

Tallaferro, resumindo o estudo do superego, diz:

O superego representa todas as restrições morais e todos os impulsos para a perfeição.


É o instrumento psicológico do que se costuma chamar ‘as coisas superiores da vida’. O
conhecimento de suas existências e formas de atuação constitui uma grande ajuda para
a compreensão de diferentes sintomas, da conduta social do homem e de problemas
sociais agudos, como a delinqüência. (p. 99).
O superego luta por perfeição, o ego exige adequação à realidade e o id esforça-se para
obter prazer e evitar sofrimento, independentemente dos meios e das conseqüências.

Em relação as duas teorias, Tallaferro afirma: “O ego tem uma parte dentro do
consciente, mais atinge o pré-consciente e o inconsciente. O id, em compensação, está
totalmente situado no inconsciente e é regido pelas leis desse sistema”. Em suma, afirma
ele, são campos de limites imprecisos, nebulosos, que têm zonas fronteiriças comuns.

6.2.3.1 TRANSFERÊNCIA E SUPEREGO

Argumentando sobre este assunto, Lagache, em A Transferência cita uma consideração


de Freud sobre o assunto: “toda situação pode ser resumida nesta fórmula: o objeto
tomou o lugar do que era o ideal do ego” (p. 36). Se, por outro lado, o objeto é colocado
no lugar do ego, tem-se uma transformação parcial (do ego), segundo o modelo do objeto
desaparecido, ou seja, uma identificação; em todos os casos trata-se, de acordo com a
expressão de Ferenczi, de uma introjeção do objeto no ego.

Conclusão

As teorias topográfica e estrutural apresentam-se como um pano de fundo no cenário da


transferência e estão fundamentalmente interrelacionadas neste fenômeno.
Compreendendo a transferência como uma reedição de um protótipo infantil, os
elementos que o compõem estão recalcados no inconsciente e vêm à tona no processo
analítico com um forte acento de atualização. O paciente põe-se a repetir condutas cujos
fundamentos se encontram enraizados na sua infância, que por sua vez estão
armazenados no inconsciente.

Enquanto fenômeno do sistema inconsciente, Etchegoyen afirma que “a transferência


pertence à realidade psíquica, a fantasia e não à realidade dos fatos. Isso quer dizer que
os sentimentos, impulsos e desejos que aparecem no momento atual e em relação a

1
FENICHEL, O. Teoria psicoanalítica de las neurosis. Buenos Aures, Piadós, 1969.
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uma determinada pessoa (objeto) não podem ser explicados em termos dos aspectos
reais dessa relação e sim, ao contrário, se as referir ao passado”. (p. 54).

Silvestre afirma em A Transferência é Amor que se Dirige ao Saber:

A hipótese do inconsciente é necessária para explicar a transferência. Pode-se


até dizer que é num mesmo movimento que Freud, por uma parte, verificou em
seus pacientes os surgimentos de lembranças e de palavras ‘deslocadas’, a que
denominou suspensão de recalcamento, e por outra parte, a hipótese do
inconsciente se impõe. O inconsciente pode neste ponto ser definido como o lugar
onde são guardados em reserva as determinações do sujeito, e a transferência,
como o movimento, o processo pelo qual tais determinações são reveladas pela
palavra. (p. 95).

Ele ainda conclui suas considerações afirmando que “organizada como uma máquina de
produzir significantes inconscientes, a transferência pode portanto conceber-se de modo
muito simples. Não há mistério. Só complicações” (p. 96).

7. AS IMPLICAÇÕES DA TRANSFERÊNCIA NA RELAÇÃO PACIENTE-ANALISTA

Em sua definição dos fenômenos de transferência, Freud diz:

São reimpressões, cópias das moções e das fantasias que devem ser despertadas e
tornadas conscientes à medida dos progressos da análise; o que é característico da sua
espécie é a sua substituição pela pessoa do médico de uma pessoa anteriormente
conhecida. (Freud in Laplanche e Pontalis, p. 517).

O caráter inevitável e automático da transferência é acompanhado, no paciente, quando


da revivescência deste ou daquele afeto, por uma cegueira total. O paciente esquece
completamente de que a realidade da situação analítica não tem nada a ver com a
situação outrora vivenciada, que tinha suscitado esse afeto. É nesse ponto que a
intervenção do analista é decisiva, mesmo que às vezes se limite a um silêncio atento,
mas que, de uma ou de outra forma, demonstra que o analista compreendeu em que
lugar (pai, mãe, etc.) o paciente o coloca. Ademais, o analista sabe que nada mais faz
do que se prestar a esse papel. Tal distanciamento mantido pelo analista que o paciente
analise, a posteriori, essa transferência e, ao mesmo tempo, progrida.

Cada transferência deve ser tratada como qualquer sintoma, de forma a manter ou
restaurar uma relação terapêutica fundada numa cooperação confiante, em que Freud,
entre outros fatores, faz intervir a influência pessoal do médico sem a referir de modo
nenhum a transferência.

Greenson afirma que a transferência é em si uma repetição inadequada do passado. A


repetição pode ser uma cópia exata do passado, uma réplica, uma recordação ou pode
ser uma edição nova, uma versão modificada, uma representação distorcida do passado.
Se uma modificação do passado transpira no comportamento transferencial, então é, em
geral, em direção à satisfação do desejo. Muitas vezes, as fantasias da infância são
vivenciadas como se realmente tivessem acontecido. Os pacientes vão vivenciar
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sentimentos em relação ao analista, sentimentos esses que podem ser interpretados
como uma sedução sexual feita pelo pai, que, mais tarde, mostraram ser uma repetição
de um desejo que ocorrera originalmente como uma fantasia infantil. O analista é um
alvo ideal das reações transferenciais, mas todas as pessoas importantes na vida de um
indivíduo também o são.

Não resta dúvida que os afetos transferidos pelo analisando para o analista constituem
um enamoramento, contudo, é um enamoramento todo especial, porque não se
sedimenta em objetivos sexuais. É um alerta para o analista, visto que o sentimento pode
ser tomado como paixão verdadeira pelo paciente. É importante ressaltar que este amor
transferido não é amor legítimo.

Argumentando sobre esse amor, Gastão Pereira da Silva alerta que:

“ao analista, cabe prevenir-se contra uma possível transferência amorosa


recíproca... Em primeiro lugar, deverá suspeitar que tudo aquilo vem perturbar a
cura que se está esforçando por realizar e assim deve encarar a transferência
positiva como uma manifestação da resistência e, pensando assim, explicará a
participação do amor no curso da análise”. (Silva, 1970, p. 163).

Para muitos opositores da Psicanálise este é um ponto vulnerável. É para reafirmar suas
convicções, Gastão usa um exemplo de Freud citando: “é-nos fácil saber que um
psicanalista, em tais casos, opera como um químico num laboratório de explosivos. É
claro, portanto, que terá de observar a mesma prudência e o mesmo cuidado, a fim de
evitar o desastre”. (Ibidem p. 164)

Laplanche e Pontalis, dão-nos alguns esclarecimentos indispensáveis da transferência


do ponto de vista da sua função no tratamento:

A transferência é antes de tudo, da forma mais explicita, classificada por Freud entre os
principais “obstáculos” que se opõem à rememoração do material recalcado. Mas,
também desde o início, o seu aparecimento é assinalado como freqüente e mesmo
generalizado: ‘... podemos estar certos de que a encontraremos em qualquer análise
relativamente séria’. (1997; 518).

Por isso, neste momento do seu pensamento, afirmam Lapanche e Pontalis, Freud
constata que:

O mecanismo da transferência para a pessoa do analista se desencadeia no próprio


momento em que conteúdos recalcados particularmente importantes ameaçam se
revelar. Neste sentido, a transferência surge como forma de resistência, e ao mesmo
tempo assinala a proximidade do conflito inconsciente. Assim, Freud encontra desde a
origem o que constitui a própria contradição da transferência e o que motiva as
formulações muito divergentes que apresentou acerca da sua função; em certo sentido,
ela é, relativamente à rememoração verbalizada, “resistência de transferência”; em outra,
na medida em que constitui tanto para o sujeito como para o analista uma maneira
privilegiada de apreender “a quente” e “in statu nascendi” os elementos do conflito infantil,
ela é o terreno em que se representa, em sua atualidade irrecusável, a problemática
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singular do paciente, em que este se encontra confrontando com a existência, com a
permanência, com a força dos seus desejos e fantasias inconscientes.

E, para enfatizar a importância deste tema para a teoria psicanalítica, trazem uma das
mais brilhantes citações sobre o tema transferência:

É inegável que a tarefa de domar os fenômenos de transferência implica as maiores


dificuldades para o psicanalista; mas é preciso não esquecer que são justamente elas
que nos prestam o inestimável serviço de atualizar e manifestar as moções amorosas,
sepultadas e esquecidas. (Freud in Laplanche e Pontalis, p. 518).

E isto assume importância cada vez maior para Freud:

A transferência, tanto na sua forma positiva como negativa, entra a serviço da


resistência; mas nas mãos do médico torna-se o mais poderoso dos instrumentos
terapêuticos e desempenha um papel que não pode deixar de ser hipervalorizado
na dinâmica do processo de cura. (1992, p. 518).

Mas inversamente, deve notar-se o fato de que, mesmo quando Freud vai mais longe no
reconhecimento do caráter privilegiado da repetição na transferência – “o doente não
pode recordar-se de tudo o que nele está recalcado, nem talvez do essencial. Ele é antes
obrigado a repetir e recalcado, como vivência no presente” – isso não o impede de
enfatizar a seguir a necessidade de o analista “... limitar o mais possível o domínio desta
neurose de transferência, de levar o máximo de conteúdo possível para o caminho da
rememoração e de abandonar o mínimo possível à repetição”. (Freud in Laplanche e
Pontalis, p. 518).

De todas as vantagens que a transferência tem para a adequada relação entre analista
e paciente, há duas que merecem total atenção e cuidados, pois acenam para o analista
como uma tentação, e este alerta vêm de Freud:

Ademais, a relação de transferência traz consigo duas outras vantagens. Se o paciente


coloca o analista no lugar do pai (mãe), está também lhe concedendo o poder que o
superego exerce sobre o ego, visto que os pais foram, como sabemos, a origem de seu
próprio superego. O novo superego dispõe agora de uma oportunidade para uma espécie
de pós-educação do neurótico; ele pode corrigir erros pelos quais os pais foram
responsáveis ao educá-lo. A essa altura cabe uma advertência contra o mau uso dessa
nova influência. Por mais que o analista possa ficar tentado a transformar-se num
professor, modelo e ideal para outras pessoas, e criar homens a sua própria imagem,
não deve esquecer que essa não é a sua tarefa no relacionamento analítico, e

que, na verdade, será desleal a essa tarefa se permitir-se ser levado por suas inclinações.
Se o fizer, estará apenas repetindo um equívoco dos pais, que esmagaram a
independência do filho através de sua influência e estará simplesmente substituindo a
primitiva dependência do paciente por uma nova. Em todas as suas tentativas de
melhorar e educar o paciente, o analista deve respeitar a individualidade deste. A
influência que possa legitimamente permitir-se será determinada pelo grau de inibição
no desenvolvimento apresentado pelo paciente. Alguns neuróticos permaneceram tão
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infantis que, também na análise, só podem ser tratados como crianças. (Freud,
1940a:175).

Para complementar, Daniel Lagache também deixa claro o papel do analista na questão
da transferência. Ele esclarece que em todos os escritos técnicos, demonstrar e
recomendar a receptividade do analista foi uma preocupação constante de Freud. Ele
evoca a famosa comparação do espelho de Freud, citada nos Conselhos aos médicos
de 1912: “O médico deveria ser impenetrável ao paciente e, como um espelho, só refletir
o que lhe é mostrado” (1990; 21). Continua assinalando que é por isso que ele condena
a ambição terapêutica, a reciprocidade das confidências, a ação educadora. Recomenda
a análise didática e a auto-análise como controle da contratransferência. Para ele, a regra
da atenção flutuante é simétrica à regra de associação livre, e o analista “deve fazer do
seu inconsciente um órgão receptor no que se refere ao inconsciente do paciente que
emerge”.

Do mesmo modo o receptor converte em ondas sonoras as vibrações elétricas induzidas


pelas ondas sonoras, também o inconsciente do médico é capaz de reconstruir o
inconsciente do paciente, que dirigiu suas associações, de acordo com as comunicações
que dele derivam. (Lagache, 1990, p. 22).

Freud recomenda ainda ao psicanalista a frieza emocional do cirurgião, que só tem que
se preocupar com a tarefa de operar bem; o analista deveria inspirar-se na máxima de
um antigo cirurgião: “Je le pansai, Dieu lê guérit”. (Eu lhe fiz os curativos, Deus o curou”.
(Freud in Lagache, p. 22).

8. A CLASSIFICAÇÃO DAS REAÇÕES TRANSFERÊNCIAIS

Ao falar da transferência, Freud distingue a transferência positiva e a transferência


negativa. Foi levado a fazer esta distinção, quando constatou que a transferência poderia
se tornar a mais forte resistência oposta ao tratamento e quando se perguntou o porquê.
Essa distinção se deve, segundo Freud, à necessidade de tratar diferentemente esses
dois tipos de transferência.

Servimos ao paciente em diversas funções, com autoridade e substituto dos pais, como
professor e educador, e fizemos o melhor por ele se, como analistas, elevamos os
processos mentais de seu ego a um nível normal, transformando o que se tornou
inconsciente e reprimido em material pré-consciente, e assim devolvemo-lo, mais uma
vez, à posse de seu ego. Do lado do paciente, alguns fatores racionais trabalham em
nosso favor, tais como a necessidade de restabelecimento, que tem seu motivo nos
sofrimentos dele, e o interesse intelectual que possamos ter-lhe despertado pelas teorias
e revelações da Psicanálise; de muito maior força, porém, é a transferência positiva com
que ele nos recebe. Lutando contra nós, por outro lado, estão a transferência negativa,
a resistência do ego devida à repressão (isto é, seu desprazer por ter de abrir-se ao
árduo trabalho que lhe é imposto), o sentimento de culpa que surge de sua relação com
o superego e a necessidade de estar doente devida a mudanças profundas na economia
de seus instintos [do paciente]. (Freud, 1940a:181- 2).
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A transferência positiva se compõe de sentimentos conscientes amigáveis e ternos, e
outros, cujos prolongamentos são encontrados no inconsciente e que, constantemente,
parecem ter um fundamento erótico. Ao contrário, a transferência negativa se refere à
agressividade em relação ao analista, à desconfiança etc. Freud traz-nos
esclarecimentos sobre este assunto:

A transferência sobre a pessoa do analista não representa o papel de uma resistência, a


não ser quando se tratar de uma transferência negativa, ou então de uma transferência
positiva composta de elementos eróticos recalcados. (A dinâmica da transferência,
1912).

Por outro lado, a transferência positiva, em virtude da confiança do paciente, permite que
o paciente fale mais facilmente sobre as coisas difíceis de serem abordadas em outro
contexto. Contudo, é evidente que toda transferência é constituída, simultaneamente, de
elementos positivos e negativos.

Diz-se que a transferência é positiva, negativa ou ambivalente segundo os afetos e


atitudes transferidos pertençam à classe do amor, do ódio e da ambivalência.

Mas, é importante informar o que Greenson registrou sobre este assunto:

Embora Freud tenha reconhecido muito cedo que todos os fenômenos transferencias são
ambivalentes por natureza, o rótulo de transferência positiva e negativa continuaram a
ser suas formas favoritas de nomenclatura. Apesar de todas as ambigüidades e erros
que este tipo de classificação acarreta, continuou sendo a designação mais freqüente
utilizada entre os psicanalistas praticantes. (1981; 248).

8.1 A TRANSFERÊNCIA POSITIVA

Há uma transferência positiva quando o paciente sente pelo seu analista sentimentos
tais como: amor, apego, confiança, amorosidade, preocupação, dedicação, admiração,
desvario, paixão, desejo, o gostar, ternura ou respeito. As formas de amor não-sexuais,
não-românticas e moderadas fazem parte da aliança de trabalho.

Outra forma importante de transferência positiva ocorre quando o paciente se apaixona


pelo analista. Este é um fato comum nas análises, porque nossos pacientes tiveram
experiências dolorosas nesse campo em suas vidas passadas. É um sentimento
reprimido e emerge como amor transferencial no decorrer da análise. Greenson afirma
que Freud foi inquestionavelmente claro nos conselhos que deu sobre a paixão do
paciente pelo analista:

O analista não se pode permitir nem mesmo as gratificações eróticas mais


inocentes e parciais. Qualquer gratificação desse tipo torna o amor da paciente
relativamente impossível de ser analisado. Isso não quer dizer que se deva
comportar de maneira insensível e empedernida. Deve ser-se respeitoso e
cuidadoso com a paciente em sua dor e mesmo assim continuar em sua tarefa de
analisar. (1981; 250).
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Talvez em nenhum outro momento seja tão absolutamente necessária a atitude analítica
de firmeza, compaixão e humanidade controlada.

Freud certa vez definiu a psicanálise como todo tipo de investigação que leve em
consideração a “transferência” e a “resistência” e, com efeito, ao menos na clínica, nada
é possível sem transferência e, menos ainda, sem transferência positiva.

Enquanto é positiva, ela nos serve admiravelmente. Altera toda a situação analítica;
empurra para o lado o objetivo racional que tem o paciente para ficar sadio e livre de
seus achaques. Em lugar disso, surge o objetivo de agradar o analista e de conquistar o
seu aplauso e amor. Este passa a ser a verdadeira força motivadora da colaboração do
paciente; e seu ego fraco torna-se forte; sob essa influência realiza coisas que,
ordinariamente, estariam além de suas forças; desiste dos sintomas e aparenta ter-se
restabelecido – simplesmente por amor ao analista. Este pode modestamente admitir
para si próprio que se dispôs a uma empresa difícil sem suspeitar sequer dos
extraordinários poderes que estariam sob seu comando. (Freud, 1940a:175).

Evidentemente, este amor pelo analista é só meia verdade, mas é a metade da verdade
que deve vir primeiro (a transferência negativa e as resistências devem ser, no mínimo,
concomitantes, ou, o que é o ideal. Devem secundar a transferência positiva). Deve,
portanto, a transferência positiva, ser o carro chefe do processo analítico.

8.2 A TRANSFERÊNCIA NEGATIVA

O termo “transferência negativa”, segundo Greenson, é empregado para designar


sentimentos transferenciais que se baseiam no ódio em qualquer de suas diferentes
modalidades, seus antecedentes e seus derivativos. A transferência negativa pode ser
expressa como ódio, ira, hostilidade, desconfiança, desdém, aversão, censura,
ressentimento, amargura, inveja, desgosto, desprezo, aborrecimento etc. Está sempre
presente na análise, embora seja, em geral, muito mais difícil de ser descoberta do que
as manifestações da transferência positiva. Não são só os pacientes que se defendem
da percepção do ódio transferencial, mas o próprio psicanalista é capaz,
inconscientemente, de compartilhar dessa resistência.

Greenson afirma que o “aparecimento das reações transferenciais negativas transitórias


logo no início da análise traz mais problemas do que o amor transferencial passageiro
também no princípio”, e esclarece-nos mais sobre o assunto:

A hostilidade e a ira ao iniciar-se a análise, antes de estabelecida uma aliança de trabalho


segura, faz com que o paciente tente atuar e interromper a análise... Mas, uma vez
estabelecida uma aliança de trabalho, a emergência da transferência negativa pode ser
um sinal importante de progresso. O reviver da hostilidade e ódio pelas figuras da infância
primitiva, na transferência, é uma fase muito produtiva do trabalho analítico, contanto que
esteja presente uma boa aliança de trabalho... A ausência de transferência negativa, ou
seu aparecimento apenas em reações esporádicas e passageiras, é indício de uma
análise incompleta. (1981, p, 261).
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Portanto, a análise do ódio transferencial é tão importante quanto a do amor
transferencial.

9. NEUROSE DE TRANSFERÊNCIA

O termo “neurose de transferência” tem dois sentidos, um nosográfico e um técnico,


segundo afirma Lagache, em A Transferência.

“No sentido nosográfico, é a neurose na qual a transferência psicanalítica é possível


(histeria, neurose obsessiva) por oposição à neurose narcísica, na qual a transferência
psicanalítica é impossível ou, pelo menos, difícil (melancolia, esquizofrenia).
No sentido técnico, é a neurose terapêutica que, num tratamento psicoterapêutico,
substitui a neurose clínica; de um modo geral, o termo só é aplicado ao tratamento
psicanalítico e corresponde ao processo no qual os sintomas da neurose clínica são
transpostos para a relação do analisando com o psicanalista; mencionou-se igualmente
a “neurose de transferência” ao falar da hipnose, da catarse”. (p. 104, 105).

Lapache e Pontalis esclarece que é em Recordar, Repetir, Perlaborar que Freud introduz
a noção de neurose de transferência relacionada com a idéia de que o paciente repete
na transferência os seus conflitos infantis.

Desde que o paciente consinta em respeitar as condições de existência do tratamento,


conseguimos regularmente conferir a todos os sintomas da doença um novo significado
transferencial, substituir a sua neurose comum por uma neurose de transferência de que
pode ser curado pelo trabalho terapêutico. (Freud in Laplanche e Pontalis, p. 309).

Laplanche e Pontalis continuam argumentando que segundo esta passagem:

parece que a diferença entre as reações de transferência e a neurose de transferência


propriamente dita pode ser compreendida do seguinte modo: na neurose de
transferência, todo o comportamento patológico do paciente vem se recentrar na sua
reação com o analista. Poderíamos dizer que, por um lado, a neurose de transferência
coordena as reações de transferência a princípio difusas e, por outro lado, ela permite
que o conjunto dos sintomas e comportamentos patológicos do paciente assumam uma
nova função referindo-se à situação analítica. (1997; p. 309)

Afirmam, ainda, que para Freud, a instauração da neurose de transferência é um


elemento positivo na dinâmica do tratamento: “O novo estado assumiu todas as
características da doença, mas representa uma doença artificial por todos os lados
acessível às nossas influências”.

Nesta perspectiva, concluem afirmando que:

Podemos ter por modelo ideal do tratamento a seguinte seqüência: a neurose clínica
transforma-se em neurose de transferência, cuja elucidação leva à descoberta da
neurose infantil. (1997; p. 310).
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Reafirmando, a Neurose de Transferência é o processo pelo qual os sintomas da neurose
são transpostos para a relação do paciente com o analista. É a substituição de uma
neurose comum por uma que pode ser curada pelo trabalho terapêutico, por se tornar
acessível às nossas influências.

Diz-se que na neurose de transferência o analista deixa de ser testemunha e passa a ser
ator, por se envolver na situação.

É uma neurose que há que ser controlada quanto à sua expansão, esforçando-se,
entretanto o analista, em levar o máximo de rememoração ao quadro com o fim de
reduzir ao mínimo a repetição. Na prática, o analista acopla a Neurose de Transferência
a regra de abstinência, que visa impedir que o paciente, no tratamento, encontre o
mínimo de satisfações substitutivas para os seus sintomas.
O analista nunca atende às solicitações do paciente que visem preencher os papéis
que pretende impor ao analista.
Recomenda-se a regra de abstinência especificamente ante comportamento repetitivos
que dificultem à rememoração e a elaboração.
Na Neurose de Transferência, o analista se abstém de ceder, manifestar afeição,
desaprovação ou opinião. Considero antes que trata de alguém sob a ação do id, mas
que não decidiu como e se deve satisfazer ou não os impulsos atuantes.

Freud usou o termo “Neurose de Transferência” de duas maneiras diferentes. Por um


lado, ele usou o termo para designar um grupo de neuroses caracterizado pela aptidão
do paciente em criar e manter uma série de reações transferências relativamente
coerente, multiforme e acessível. Freud também usou este termo para transcrever uma
ocorrência usual nas reações transferenciais de um paciente em tratamento psicalalítico.
(Freud, 1905c, 1914c, 1916-1917, Cap XXVIII).

Ferenczi compreende claramente que a tendência a transferir é um traço fundamental da


neurose, ou como ele diz, “que a neurose é esta paixão pela transferência: o paciente
foge de seus complexos e, em total submissão ao princípio do prazer, distorce a realidade
conforme seus desejos”. (Ferenczi in Etchegoyen, 1978, p. 55).

Segundo Etchegoyen, Freud concebe a neurose de transferência como um efeito


especial do início do tratamento psicanalítico em que cessa a produção de novos
sintomas e surgem em substituição a eles outros novos que convergem para o analista
e seu ambiente.

No decorrer de uma análise, pode notar-se que os interesses do paciente se vão


concentrando cada vez mais na pessoa do analista. Freud salientou como a compulsão
à repetição no paciente neurótico se torna não só inofensiva, mas útil, aceitando-se essa
compulsão à repetição na transferência:

“como um pátio de recreio que só é permitido expandir com liberdade quase total
e onde se espera que nos seja mostrado tudo aquilo que está escondido na mente
do paciente sob a forma de instintos patogênicos”. (Freud, 1914c, p. 154).

Se a situação transferencial é manejada adequadamente:


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... nós, normalmente, conseguimos dar um significado transferencial novo a todos


os sintomas da doença e substituir sua neurose habitual por uma “neurose de
transferência”, da qual o paciente pode ser curado através do trabalho
terapêutico”. (Freud, 1914c, p. 154).

A neurose transferencial assume todos os aspectos da doença do paciente, mas é uma


doença artificial e é acessível à nossa intervenção em todos os pontos. É uma nova
edição de uma doença antiga.

Nas primeiras fases do tratamento psicanalítico, geralmente observamos reações


transitórias esporádicas, que Glover denominou de reações transferenciais “flutuantes”
(1955, p. 37). Se essas reações transferenciais iniciais forem adequadamente manejadas
o paciente vai desenvolver reações transfereciais mais prolongadas. Clinicamente,
podemos notar o desenvolvimento da neurose de transferência pelo aumento de
intensidade e duração da preocupação do paciente pela pessoa do analista e pelos
processos e procedimentos analíticos. O analista e a análise se tornam a principal
preocupação da vida do paciente. Além dos sintomas do paciente e das exigências
instintuais girarem em torno do analista, também todos os conflitos neuróticos antigos
são remobilizados e concentrados na situação analítica. Esse interesse será sentido pelo
paciente como uma variedade e mistura de amor e ódio assim como defesas contra estas
emoções. Se predominarem as defesas, algum tipo de ansiedade ou culpa aparecerá em
primeiro plano. Estas reações podem ser intensas, explosivas, sutis ou crônicas. De
qualquer forma, assim que se formou a neurose de transferência, tais constelações de
sentimentos são onipresentes.

Na neurose de transferência, portanto, como já foi afirmado, o paciente repete com o


analista suas neuroses passadas. Com um manejo e interpretação adequados, temos a
esperança de ajudar o paciente a reviver e finalmente recordar ou reconstruir sua
neurose infantil. O conceito da neurose de transferência inclui mais coisas além da
neurose infantil porque o paciente também vai reviver as edições posteriores, assim
como as variações da sua neurose infantil.

10. TRANSFERÊNCIA E RESISTÊNCIA

A transferência e a resistência estão ligadas entre si de muitas maneiras. A expressão,


“resistência transferencial” é geralmente empregada na literatura psicanalítica como uma
expressão abreviada para o relacionamento complexo e estreito entre os fenômenos
transferenciais e as funções da resistência.

Segundo Freud os fenômenos transferenciais são as fontes das maiores resistências


assim como o instrumento mais poderoso para a terapia psicanalítica. As reações
transferenciais são uma repetição do passado, uma revivência sem memória. Neste
sentido, todos os fenômenos transferenciais tem um valor resistencial. Por outro lado, as
reações ao analista fornecem as vias de acesso mais importantes ao passado
inacessível ao paciente.
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Determinadas variedades de reações transferenciais criam resistências porque contém
impulsos expressivos e libidinais que são assustadores e dolorosos. As reações
transferenciais hostis e sexuais tendem, de maneira especial, a ser a fonte de resistência
importante. É muito comum aparecer juntos os componentes agressivos e eróticos. Por
exemplo, uma paciente começa a ter desejos sexuais pelo seu analista e fica, então,
furiosa pela não reciprocidade do analista, o que é sentido por ela como uma rejeição.
Ou então o paciente é incapaz de trabalhar na situação analítica devido ao temor da
humilhação de ter que expor fantasias primitivas ou infantis.

As resistências mais difíceis de ser superadas são as chamadas reações de


“transferências de caráter”. Em situações desse tipo, os traços gerais de caráter e
atitudes, que tem uma função defensiva, serão demonstrados não só ao analista, mas
às pessoas da vida quotidiana. Tais traços estão de tal forma enraizados na estrutura de
caráter do paciente e, além disso, estão enraizados de forma tão primorosa, que se
tornam difíceis de ser analisados.

A transferência e a resistência estão ligadas entre si de muitas maneiras. O termo


resistência transferencial explica muito bem este fato clínico. Em geral, os fenômenos
transferenciais são uma resistência à recordação apesar de, indiretamente
encaminharse nessa direção. As reações transferenciais podem fazer com que um
paciente fique incapacitado de trabalhar analiticamente devido à natureza da reação.
Algumas reações transferenciais podem ser utilizadas como resistência à elevação de
outras reações transferenciais. A análise das reações transferenciais é o “pão de cada
dia”, o trabalho constante da terapia psicanalítica. Gasta-se mais tempo na análise das
resistências transferenciais do que em qualquer outro aspecto do trabalho terapêutico.

11. A CONTRATRANSFERÊNCIA

“Aquele que, em qualquer tempo, nunca perdeu a razão, demonstra não dispor de
nenhuma para perder”. Nestroy, escritor.

Um outro elemento indissociável da transferência, da qual é uma espécie de


acompanhamento obrigatório, é o que chamamos de contratransferência do analista para
com seu paciente. Ela consiste, no analista, em determinar quais afetos seu paciente
suscita nele e em saber o que levar em conta, em sua maneira de interpretar a
transferência de seu paciente. Mais uma vez, isso pressupõe que o analista seja capaz
de analisar aquilo que constitui a contratransferência, para que esta não interfira no
funcionamento da análise do paciente, mas que, no entanto, permita que o analista se
situe convenientemente em relação ao desenvolvimento do tratamento.

Para Laplanche e Pontalis, a contratransferência consiste no “conjunto das reações


inconscientes do analista à pessoa do analisando e, mais particularmente, à
transferência deste” (1997; p. 102).

Segundo Etchegoyen, Freud descreve a contratransferência como a resposta emocional


do analista aos estímulos que provém do paciente, como resultado da influência do
analisado sobre os sentimentos inconscientes do analista, considerando-a como um
obstáculo ao tratamento.
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Apesar de que a presença da contratransferência como um fator importante do processo


analítico esteve sempre presente na mente dos analistas, é inegável que só a partir da
metade do século a contratransferência se organiza em um corpo de doutrina completo.

Em A Transferência, Daniel Lagache esclarece sobre o amor de transferência citando os


escritos técnicos de Freud. As Observações sobre o amor de transferência (1915)
ventilam os mesmos problemas e apresentam as mesmas soluções, afirma ele. Freud
define-o em termos muito simples: “... uma mulher ou uma jovem mostra, através de
alusões transparentes ou de uma confissão aberta, que se apaixonou, como qualquer
mortal, pelo médico que a analisa”. Tal sentimento pode ser classificado como
transferência positiva se permanecer em nível moderado; converte-se em resistência se
ficar excessivamente intenso ou cair na hostilidade. O amor de transferência é uma
armadilha para o analista, reafirma Lagache.

O amor de transferência é uma repetição, mas todo amor é uma repetição; não
existe amor que não reproduza protótipos infantis; o elemento infantil dá ao amor
de transferência o seu caráter compulsivo, que toca as raias do patológico; é mais
repetitivo, menos ajustado que o amor normal, mas sua eficácia não permite
distinguir um do outro. (p. 25).

Confirma seu ponto de vista Freud: “Deste ponto de vista, o amor de transferência não
cede a nenhum outro amor; tem-se a impressão de que, por esse meio, seria possível
realizar não importa o que”. (p. 25).

A passagem em que Freud resume o seu pensamento é importante:

Não temos nenhum direito de discutir a autenticidade do amor que aparece no decorrer
do tratamento psicanalítico. Por mais anormal que possa parecer, essa qualidade é
suficientemente explicada se nos lembrarmos de que o estado amoroso é também mais
anormal do que os fenômenos mentais ordinários. O amor de transferência caracteriza-
se, porém, por certos traços que lhe asseguram uma posição especial. Em primeiro lugar,
é provocado pela situação psicanalítica, em segundo lugar, é consideravelmente
intensificado pela resistência que domina a situação; e, em terceiro lugar, é deficiente,
em alto grau, em face da realidade, menos sensível, menos preocupado com as
conseqüências, mas cego em sua avaliação da pessoa amada do que consentimos em
admitir no amor normal. Não deveríamos esquecer, entretanto, que são precisamente
esses desvios e, relação à norma que constituem o elemento essencial do estado
amoroso. (Freud in Lagache; p. 26).

Laplanche e Pontalis argumentam que são raríssimas as passagens em que Freud alude
àquilo que chamou de contratransferência. Vê nela o resultado da “influência do doente
sobre os sentimentos inconscientes do médico” e sublinha que “nenhum analista vai além
do que os seus próprios complexos e resistências internas lhes permitem”, o que tem
como corolário a necessidade de o analista se submeter a uma análise pessoal.

Freud formula, portanto, em termos extremamente claros, afirma Lagache, que a situação
analítica intervém, de certo modo, na gênese do amor de transferência, o que não
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significa, em absoluto, a pessoa do analista: “Ele deve reconhecer que o estado amoroso
do paciente é induzido pela situação analítica e não tem que ser imputado aos atrativos
de sua pessoa”. Tecnicamente, ele não deve recusar, nem consentir com nada. Freud
sublinha os inconvenientes de uma atitude repressiva:

“Pressionar a paciente para que suprima, abandone e sublime as exigências de seus


instintos, a partir do instante em que ela confessou seu amor de transferência, não seria
uma maneira analítica de tratá-la, mas sim uma maneira absurda. Seria como invocar
um espírito infernal por meio de um poderoso encantamento e depois despedilo sem lhe
fazer qualquer pergunta. Ter-se-ia feito surgir na consciência as pulsões recalcadas para,
no terror, devolvê-las uma vez ao inconsciente pelo recalcamento. Não devemos ter
ilusões quanto ao êxito de semelhante procedimento. Ao nível das paixões, uma
linguagem elevada realiza muito pouco, todos nós o sabemos. A paciente sofrerá apenas
humilhação e não deixará de se vingar”. (Freud in Lagache; p. 27).

O analista tampouco pode pretender sublimar o amor de transferência. A única solução


é interpretar aplicando a regra de abstinência:

Já mostrei que a técnica psicanalítica exige que o analista recuse à paciente que
deseja amor a satisfação a que ela aspira. O tratamento deve ser conduzido num
estado de abstinência; não quero dizer apenas abstinência corporal, nem mesmo
privação de qualquer coisa desejada, pois isso talvez não fosse tolerável para
nenhum doente. Mas gostaria de formular como princípio fundamental que se
deve proceder de modo que o desejo e a expectativa do paciente subsistam,
sirvam de forças atuantes para o trabalho e as mudanças a realizar, e que se deve
ter cuidado para não propiciar a essa fonte de energia uma satisfação substitutiva.
Aliás, só se poderia oferecer à paciente equivalentes, visto que enquanto os
recalcamentos não forem abolidos, a sua condição torna-a incapaz de uma
verdadeira satisfação. (ibidem; p. 27).

Tais são as condições em que o analista pode interpretar proveitosamente a


transferência; a paciente sente-se suficientemente segura para exprimir todas as suas
condições para amar, todas as fantasias de seus desejos sexuais; todos os detalhes
individuais de sua maneira de amar vêm à luz; ela própria abre o caminho para as raízes
infantis de seu amor. A regra de abstinência é completar à regra de que o analista não
deve extrair do amor de transferência nenhuma vantagem pessoal, continua Lagache
citando Freud:

Não importa a que ponto ele preze o amor, deve prezar muito mais ainda a
oportunidade de ajudar a sua paciente num momento decisivo de sua existência.
Ela tem que aprender dele como superar o princípio do prazer, como renunciar a
uma satisfação ao alcance de sua mão que não é sancionada pelo mundo em que
ela vive, em proveito de uma satisfação longínqua e talvez incerta, a qual, porém,
é social e psicologicamente irrepreensível.

Fazendo uma leitura dos trabalhos de Ida Macalpine sobre a transferência, Lagache cita
uma de suas conclusões sobre este assunto que vale a pena registrar:
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O papel do analista consiste em resistir à adaptação por regressão. O analisando
vivencia o passado e observa o presente; inversamente, o analista deve experimentar o
presente e observar o passado; experimentar o passado em vez de observá-lo é uma
contratransferência. (p. 88).

Conclusão:

Podemos ratificar a precisa afirmação de Etchegoyen, quando diz que “a teoria da


transferência é uma das maiores contribuições de Freud à ciência e é também o pilar do
trabalho psicanalítico”. (1987; 51).

Etchegoyen traz também uma importante orientação:

Como analistas, não devemos pensar com certeza que tudo é transferência, mas
descobrir a porção de transferência que há em todo o ato mental. Nem tudo é
transferência, porém, em tudo há transferência – o que não é o mesmo. (1987; 55).

Como já vimos, a transferência são sentimentos experimentados pelo paciente em


relação ao analista, que não tem a ver com coisas objetivas. O significado para o paciente
das atitudes do analista tem sempre a capacidade de levá-lo a se reportar aos
sentimentos de suas situações traumáticas.

Esses sentimentos transferenciais são sempre normais. Se não houver essa


transferência não se procura ajuda. Ela surge quando a pessoa escolhe o analista.

Quando o paciente se apaixona pelo analista, está surgindo ali alguma coisa não
resolvida que se repete. E quando é o inverso que acontece, é o que já vimos como
contratransferência. Pode ficar a tendência de dar prosseguimento a relação
extraterapia. Se isto acontecer, o analista vai repetir com o paciente sua neurose, o que
está reprimido e isto interfere completamente no tratamento. Há um impasse terapêutico
e paralisa o processo. É importante o analista compreender o que ele está representando
naquela situação.

Três perguntas importantes: Por que ele está me dizendo isso? O que ele quer dizer
quando me diz isso? Quem sou eu nisso que ele está me dizendo?

É interessante registrar a conclusão de Freud em A Dinâmica da Transferência:

“Tal como acontece aos sonhos, o paciente encara os produtos do despertar de seus
impulsos inconscientes como contemporâneos e reais; procura colocar suas paixões em
ação sem levar em conta a situação real. O médico tenta compeli-lo a ajustar esses
impulsos emocionais ao nexo do tratamento e da história de sua vida, a submetê-los à
consideração intelectual e a compreendê-los à luz de seu valor psíquico. Esta luta entre
o médico e o paciente, entre o intelecto e a vida instintual, entre a compreensão e a
procura da ação, é travada, quase exclusivamente, nos fenômenos da transferência. É
nesse campo que a vitória tem de ser conquistada – vitória cuja expressão é a cura
permanente da neurose. Não se discute que controlar os fenômenos da transferência
representa para o psicanalista as maiores dificuldades; mas não se deve esquecer que
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são precisamente eles que nos prestam o inestimável serviço de tornar imediatos e
manifestos os impulsos eróticos ocultos e esquecidos do paciente. Pois, quando tudo
está dito e feito, é impossível destruir alguém ‘in obsentia ou in effigie’”. (A Dinâmica da
Transferência – Obras CD Room).

O papel do analista é ajudar o paciente a adquirir um verdadeiro insight sobre as


distorções da transferência e, através do insight, aumentar a sua capacidade para
relacionamentos gratificantes, com base em expectativas maduras e realistas, em vez
de em fantasias irracionais derivadas de sua infância.

Geralmente, quando os pacientes terminam uma análise a versão do passado muda.


Essa é a importância da transferência – não é uma coisa relatada, é algo vivido.

A transferência é, pois, uma ferramenta indispensável para o analista. Quando há


transferência é possível evoluir a análise. Ela é a força mais poderosa no processo de
tratamento, como afirmação de Freud, já citado:

É inegável que a tarefa de domar os fenômenos de transferência implica as maiores


dificuldades para o psicanalista; mas é preciso não esquecer que são justamente elas
que nos prestam o inestimável serviço de atualizar e manifestar as moções amorosas,
sepultadas e esquecidas. (Freud in Laplanche e Pontalis, p. 518).

12. REFERÊNCIAS

1. ALMEIDA, Wilson Castello. Defesas do Ego. 1. ed. São Paulo: Ágora, 1996.

2. BRENNER, Charles. Noções Básicas de Psicanálise. 5. ed. Rio de Janeiro: Imago,


1987.
3. FENICHEL, Otto. Teoria Psicanalítica das Neuroses. São Paulo: Ateneu, 1981.

4. GREENSON, Ralph. A Técnica e a Prática da Psicanálise. Rio de Janeiro: Imago,


1981.

5. SANDLER, Joseph, DARE, Chistopher, HOLDER, Alex. O Paciente e o Analista. 2.


ed. Rio de Janeiro: Imago, 1986.

6. LAPLANCHE & PONTALIS. Vocabulário de Psicanálise. 2. ed. São Paulo: Martins


Fontes, 1991.

7. TALLAFERRO, Alberto. Curso Básico de Psicanálise. 2. Ed. São Paulo: Martins


Fontes, 1996.

8. FREUD, Sigmund. Edição Eletrônica Brasileira das Obras Psicológicas


Completas. CD-ROM. Edição Standard Brasileira.

9. SILVA, Gastão Pereira. Para Compreender Freud. 2. ed. Belo Horizonte: Itatiaia,
1970.
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_________________________________________________________________________

10. CHEMANA, Roland. Dicionário de Psicanálise. Porto Alegre: Artes Médicas Sul,
1995.

11. ETCHEGOYEN, R. Horácio. Fundamentos da Técnica Psicanalítica. Porto Alegre:


Artes Médicas, 1987.

12. LAGACHE. Daniel. A Transferência. 1. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1990.

13. MENNINGER. K. A. A B C da Psiquiatria. (S.I.: s.n., 19-).

14. FREUD, Sigmund. O Ego e o Id. Rio de Janeiro: Imago,1997.

15. ZWEIG, Stefan. A Cura pelo Espírito. (S.I.; s.n., 19-).

16. BETTELHEIM, Bruno. Freud e a Alma Humana. 12. Ed. São Paulo: Cultrix, 1998.

17. SILVESTRE, D. Michel. A Transferência é o Amor que se Dirige ao Saber. In O


Campo Freudiano, São Paulo: Jorge Zahar, 1987.

18. NÚMERO, Transferência, fantasma, direção da cura. Rio de Janeiro: Letra


Freudiano, Ano XII, nº 14, 1993.

19. LUCA, Renata. Uma Adolescente e a Transferência: Ressignificação de uma


posição infantil. Rio de Janeiro: Congresso Escola Lacaniana, 1999.

20. FIGUEIRA, Sérvulo Augusto. O Contexto Social da Psicanálise. Rio de Janeiro: F.


Alves, 1981.

21. FREUD Sigmund, L’Invention De La Psychanalyse: filme documentário. 55 min., em


duas partes. Roteiro de Elisabeth Roudinesco e Elisabeth Kapnist. Setor Psicanálise
& Cinema do Conselho Científico da SBPRJ. Estréia mundial em nov. 97 na televisão
francesa.

EXERCÍCIO PARA FIXAÇÃO DA MATÉRIA / UNIDADE.

FUNDAMENTOS DA TÉCNICA PSICANALÍTICA II

4. Defina o que é Projeção?

5. Defina o que é Introjeção?

6. Defina o que é Identificação?


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_________________________________________________________________________
7. Defina o que é Transferência?

8. Defina o que é Contratransferência? Como se apresentam?

Unidade

SEXOLOGIA I 2
Índice
HISTÓRIA E SÓCIO-ANTROPOLOGIA DA SEXUALIDADE

ANATOMIA E FISIOLOGIA SEXUAL HUMANA


ANATOMIA DOS ÓRGÃOS GENITAIS
AS FASES DA RESPOSTA SEXUAL HUMANA

TRANSTORNOS (DISFUNÇÕES) SEXUAIS


TRANSTORNOS DO DESEJO SEXUAL
TRANSTORNOS DA EXCITAÇÃO SEXUAL
TRANSTORNOS DO ORGASMO
TRANSTORNOS DE DOR SEXUAL
AS PARAFILIAS
Exibicionismo
Fetichismo
Frotteurismo
Pedofilia
Sadismo e Masoquismo Sexuais
Voyeurismo
Fetichismo Transvéstico
Necrofilia
Zoofilia
Urofilia
Coprofilia e Clismafilia
Parcialismo
Escatologia Telefônica
Masturbação

IDENTIDADE DE GÊNERO E ORIENTAÇÃO SEXUAL


ORIENTAÇÃO SEXUAL: “HETERO”, “HOMO” OU “BI”?
TRANSTORNOS DE IDENTIDADE DE GÊNERO

A VISÃO DE FREUD SOBRE A SEXUALIDADE


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RESUMO DOS “TRÊS ENSAIOS SOBRE A TEORIA DA SEXUALIDADE”
Fatores Que Perturbam O Desenvolvimento
Constituição E Hereditariedade
Elaboração Ulterior
Recalcamento
Sublimação
Experiências Acidentais
Precocidade
Fatores Temporais
Adesividade
Fixação

LISTA DOS ESCRITOS DE FREUD QUE VERSAM PREDOMINANTEMENTE OU EM


GRANDE PARTE SOBRE A SEXUALIDADE

INTRODUÇÃO

O estudo da sexualidade, para o psicanalista, é questão fundamental em vários aspectos.


Em primeiro lugar está a importância dada por Freud para a sexualidade, como origem
não só de todas as neuroses, como também de praticamente todo o comportamento
humano. Além disso, na prática psicanalítica, embora no início do tratamento raramente
venham à tona as queixas diretamente relacionadas à sexualidade, invariavelmente
estas aparecerão no decorrer do processo analítico, desde que haja um bom rapport, e
uma disposição do terapeuta no sentido de abordar com naturalidade tais questões.

Infelizmente, porém a sexualidade está envolta por uma enorme gama de preconceitos
e distorções, por razões históricas, sociais e culturais diversas, e os profissionais da área
de saúde, incluindo os psiquiatras, psicólogos e psicanalistas, não estão imunes a todas
estas influências. O melhor exemplo disso é o próprio Freud que, com sua decisiva
influência na formação e transformação dos conceitos psicológicos da Humanidade, por
vezes contribuiu para a disseminação de conceitos absolutamente errôneos, que até hoje
têm seus adeptos, como por exemplo, o conceito de que existem dois tipos de orgasmo
feminino, o vaginal e o clitoridiano, sento este último um orgasmo “imaturo”, e, portanto,
indesejável...
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Neste módulo, portanto, procuraremos mostrar os principais conceitos, atualizados
segundo os conhecimentos atuais, a respeito da sexualidade, segundo uma abordagem
multidisciplinar, abrangendo aspectos históricos, sociais, antropológicos, biológicos e
psicológicos, além de conceituar os transtornos da sexualidade, como classificados
atualmente pela Organização Mundial de Saúde e pela Associação Americana de
Psiquiatria. Abordaremos também algumas questões relativas à identidade de gênero e
à orientação sexual, sem no entanto ter a pretensão de esgotar um assunto tão vasto e
abrangente, tão corriqueiro e ao mesmo tempo tão misterioso e, de certo modo,
desconhecido.

HISTÓRIA E SÓCIO-ANTROPOLOGIA DA SEXUALIDADE

Se fôssemos falar da história do sexo, teríamos de começar falando dos primeiros seres
a se reproduzirem de maneira sexuada, ou seja, com indivíduos distintos trocando
material genético, para que a reprodução pudesse envolver uma maior variabilidade
destes mesmos genes. Ou ainda, dos primeiros seres que passaram a ter indivíduos
morfologicamente (e fisiologicamente também) distintos, iniciando os conceitos de
masculino e feminino.

No entanto, estamos falando de sexualidade, que abrange não apenas os aspectos


biológicos, mas também os muitos aspectos culturais, sociais e psicológicos, que não
podem ser dissociados do estudo da sexualidade. A história da Sexualidade, então,
passa a restringir-se à história da humanidade, desde o surgimento do homem primitivo,
num complexo evoluir de conceitos e preconceitos, conhecimentos e mitos, conquistas
e repressões, dominações e libertações.
Em vez de detalharmos aqui cada passo desta jornada, deixemos que a Professora
Mabel Cavalcanti, pioneira da Sexologia no Brasil, nos conte esta história de modo mais
poético, em artigo publicado no número inaugural da Revista Brasileira de Sexualidade
Humana.

SEXUALIDADE HUMANA: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA

Parece ter sido Goethe quem afirmou que “a história de uma ciência é a própria ciência”.
De acordo com esta concepção, quando se traça a perspectiva histórica da sexualidade
humana estamos, de alguma forma, investigando a conduta sexual do homem sob o
aspecto científico.

Como não é possível sintetizar tantos séculos em tão pouco tempo, vamos dar mais
ênfase à sexualidade do homem pré-histórico e a de certos povos antigos.
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É interessante observar que, neste passeio, se tem a oportunidade de esclarecer muitas
das perguntas atuais sobre sexualidade, porque elas já foram, de alguma forma,
respondidas ou questionadas por nossos antepassados.

Não é fácil traçar hoje um roteiro da vida do homem pré-histórico, e só podemos, de


alguma forma, realizá-lo através dos restos arqueológicos e dos estudos etnográficos.
Os dados arqueológicos nos dão idéia da tecnologia e dos costumes daqueles povos, e
através dos recursos etnográficos podemos fazer a comparação dos artefatos
encontrados nas jazidas pré-históricas com aqueles que ainda hoje são usados por
grupos primitivos que habitam nosso planeta.

Nos primeiros tempos da humanidade, as diretrizes do comportamento do homem eram


ditadas por deuses e demônios. Era o que se chama de etapa mágico-religiosa. Religião
e magia sempre foram irmãs gêmeas. Pela religião o homem reverencia o sobrenatural
ou tudo aquilo que ele desconhece; pela magia ele tenta manipular esse desconhecido.

Esta visão antropossociológica da história da humanidade nos permite entender muito


mais a sexualidade humana do que se olhássemos apenas a simples evolução biológica
do homem como indivíduo.

Estudando as modificações sócio-culturais através dos séculos, é possível perceber


como o homem conseguiu suprir seus desejos básicos, notadamente os da fome e os do
sexo. Estes estudos têm também a grande vantagem de nos mostrar que existem
numerosas variações de cultura nas diversas sociedades, e que, em cada um destes
grupos, a conduta e as preferências sexuais variavam de um indivíduo para outro.

É nos ciclos culturais sucessivos que podemos situar e descobrir a gênese dos
comportamentos sexuais de hoje. A sexualidade que vivemos nada mais é do que aquilo
que a humanidade fez dela, ou o que foi obrigada a fazer, face às contingências
ambientais.

Para melhor nos situarmos, vamos, de modo sintético, tentar enfocar a sexualidade sob
os aspectos da reprodução, prazer e amor ao longo dos séculos.

No que diz respeito à reprodução, embora o tema esteja envolto por muita nebulosidade,
tudo faz crer que nas fases mais antigas o homem não associava o sexo com a gravidez.
A gestação era considerada como sendo um acontecimento mágico, um presente dos
deuses, tanto quanto a fertilidade da terra. Talvez tenha sido por esta razão que, nas
tribos que iniciavam a atividade agrícola, a função da semeadura era realizada pelas
mulheres.

Sabemos que, ainda hoje, entre certos povos primitivos, como os nativos da Austrália, a
idéia do sexo/reprodução não está bem elaborada. Entre os Aruntas, por exemplo, existe
a crença de que os espíritos infantis habitam determinados totens e que, sob certas
condições, eles podem penetrar no corpo das mulheres. Mais interessante ainda é a idéia
dos antigos habitantes da Nova Guiné que acreditavam haver uma total independência
entre o ato sexual e a gravidez. Eles afirmavam que as mulheres gestavam, primeiro, no
coração, com amor, e só depois o feto se deslocava para o útero. O lirismo desta
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concepção nos dá também a dimensão e o valor referido à mulher nestas culturas
primitivas.

Em contrapartida, o homem, nos estágios mais primitivos de nossa evolução, buscava a


mulher apenas para acalmar suas tensões sexuais. Nesta procura, a violência
geralmente era a tônica e a posição do coito era a mesma dos outros primatas, numa
flagrante identificação com o reino animal. Não é de admirar, portanto, que nesta época
a valorização das nádegas, como atrativo erótico, fosse máxima.

Quando se tem a possibilidade de observar as estatuetas das Vênus pré-históricas,


vemos a nítida preocupação em ressaltar as ancas, as nádegas, os seios e o ventre. Há
descaso pela cabeça, pelo rosto e até pelos ombros. Isto se pode observar claramente
com a Vênus de Lespugne, entre outras. De todas, porém, a mais obesa é a chamada
Vênus de Willendorf, encontrada na Áustria. A monstruosidade de suas formas supera
todos os padrões surrealistas modernos, mas como o conceito de beleza é muito relativo,
talvez ela tenha sido uma espécie de protótipo paleolítico da Garota de Ipanema.

Há quem afirme que a acentuação das formas, notadamente a dos seios, tem relação
com o culto à fertilidade. Parece, no entanto, que foi a preocupação erótica que inspirou
estes artistas pré-históricos, tanto na confecção das estatuetas quanto das pinturas
rupestres que são encontradas no interior das cavernas. Aliás, muitas delas fariam inveja
aos mais capacitados pintores de banheiro da atualidade.

Um fato que corrobora a inspiração erótica de nossos antepassados mais distantes é a


própria característica da vida econômica dessas populações primitivas. Vivendo da caça,
da pesca e da colheita de frutos, eles eram obrigados a se deslocar com freqüência de
uma região para outra. É claro que estes indivíduos não estavam muito preocupados em
exaltar a maternidade, uma vez que uma prole numerosa certamente dificultaria as
constantes caminhadas de sua vida nômade.

Há também dados antropológicos, muito convincentes, que demonstram que, nesta


época o infanticídio era prática comum de controle populacional. É preciso entender que
o homem era um mero depredador da natureza e qualquer ameaça de superpopulação
acarretava um perigo para a tribo. Não havia, portanto, porque exaltar a maternidade e
a procriação. Esta exaltação ocorreu sete milhões de anos mais tarde, quando começou
a chamada revolução agrícola, com o homem se fixando na terra e dela procurando tirar
o seu sustento.
É preciso esclarecer que a revolução agrícola, ou seja, a modificação da condição
nômade para sedentária, não se deu simultaneamente em todas as tribos. Algumas
permaneceram no estágio da caça, mas outras foram se estabelecer nos vales, à beira
dos rios, para viver da terra como lavradores.

A atividade de pastoreio ainda, de uma certa forma, implicava em deslocamentos em


busca de pastos melhores, mas as tribos, à medida que domesticavam o gado (eqüinos
e caprinos) já se fixavam em uma determinada região. A agricultura, no entanto, foi que
determinou a necessidade de criar vínculos muito mais estreitos com a terra. O agricultor
é basicamente um sedentário, agarrado ao solo, tão preso a ele como as raízes das
plantas que cultiva.
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Ao assumir o papel de lavrador, a prole passou a ser considerada uma coisa muito
importante. O homem passou a se preocupar tanto com a fertilidade do solo quanto com
a fecundidade de suas mulheres. Filhos, sobretudo os do sexo masculino, eram
importantes para a defesa do território e o cultivo da terra.

Datam desta época os chamados cultos à fecundidade, e a mulher, tanto quanto a terra,
passou a ser venerada por sua capacidade procriativa. Deusas da fertilidade
proliferaram; cada tribo inventava suas próprias divindades, dando-lhes sabedoria e
onipotência, para depois curvarem-se diante da própria criação, adorando-a. E não
ficavam somente nisto. Para ampliar os domínios de sua crença, conquistavam outras
tribos, subjugando-as e impondo-lhes seus credos e divindades. Nesta etapa da vida pré-
histórica, a religião universalizava a cultura.

Nos ritos, onde abundavam oferendas, danças e cânticos, os sacrifícios tinham um lugar
proeminente. Como a morte está muito vinculada à perda de sangue, o valor do sangue
fica associado à vida, daí os sacrifícios com imolação de animais e pessoas, com o
sangue correndo abundantemente pelos altares. Provavelmente seja esta a origem mais
distante dos mitos sobre a menstruação. A mulher menstruada “perdia vida”, algo mágico
e inexplicável, daí o temor e os tabus ligados ao catamênio. Toda uma concepção mítica
se formava em torno deste fato nuclear. A menstruação era algo que eles não sabiam
explicar, passando então a ser evitada, as pessoas fugindo dela, como coisa perigosa e
impura. Em nossos dias o tabu da impureza ainda vigora entre os judeus ortodoxos,
sendo muito encontrado, de forma atenuada ou dissimulada, em toda a civilização
ocidental.

A importância do sangue na religião e na magia é tão grande que, entre os primitivos


habitantes da Austrália, no ritual da puberdade masculina, um ato sangrento (um
pequeno corte perto do escroto) concedia aos rapazes o mesmo direito que era dado às
raparigas púberes.

Mas, o fato é que o homem ainda não era visto como elemento fundamental no processo
reprodutivo. A reprodução era prerrogativa exclusiva da mulher, e praticamente todos os
deuses eram do sexo feminino.

Com o passar dos tempos, pouco a pouco, crescia a consciência do papel do homem na
reprodução. Basta observar que entre os Buka, tribo primitiva das Ilhas Salomão, embora
desconhecessem o poder criador do sêmem, eles acreditavam que era essencial, para
a mulher ficar grávida, que o homem introduzisse o pênis dentro da vagina. Era como se
o pênis, exercendo seus movimentos, aprovasse a gravidez.

Tannahill refere que foi a observação do cruzamento de animais a do tempo de duração


de gravidez, a partir do coito, que fez com que o homem começasse a perceber seu
enorme potencial reprodutor. Afinal; se um só carneiro podia fecundar mais de cinqüenta
ovelhas, o que não poderia fazer um só homem. Começa ai as sementes do sexismo
machista.
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Na organização da vida religiosa, ao lado das deusas da fertilidade, começam a aparecer
deuses masculinos. Culto à vulva e culto ao pênis. Mas este equilíbrio foi muito
passageiro. O esquema primitivo não tardou a se inverter. O falo passou a ser o símbolo
da força, da fertilidade, o talismã contra a esterilidade.

Nos ritos de criação o pênis aparece, de forma clara ou simbólica, representado por peixe
ou serpente, mas sempre com um papel preponderante. A serpente, provavelmente por
sua forma, foi amplamente venerada como um símbolo fálico. Nos tempos gregos era
comum se encontrar serpentes vivas, junto às sacerdotisas nuas. Tornou-se famoso, no
Oráculo de Delfos, o culto a Píton, a serpente sagrada. Nas escavações da Babilônia,
Índia, China, Sudão, Palestina, França, Córsega, México e Argentina foram encontrados
vestígios deste culto.

Conta-se que na Alexandria havia uma procissão com um falo gigantesco, de cerca de
120 braças de comprimento. Monumentos de pedra com falos de 1,80 a 3,0 metros de
altura são frequentemente encontrados na Ilha de Córsega. Contudo, de todas as
representações lícitas, as mais notáveis são as duas estátuas de enormes pênis, com 60
metros de altura cada uma delas, que montavam guarda no templo de Vênus, em
Herápolis. Embaixo delas era bem visível a inscrição: “Consagrei estes falos a Hera,
minha sogra”. A razão desta homenagem ainda hoje está para ser esclarecida..., mas o
fato é que as pessoas iam para o alto destes pênis orar, fazer abstinências e sacrifícios.

A deificação do falo pode ser exemplificada com a veneração a Príapo, o qual mantinha
um enorme pênis ereto. Príapo, na mitologia grega, simbolizava a fartura e a fertilidade,
daí o porque agricultores e pastores lhe emprestavam tão grande apreço.

Entre os romanos era comum os amuletos em forma de pênis e até um pênis alado era
colocado no pórtico das residências, encimado pela inscrição: “Hic habitat felicitas” (Aqui
mora a felicidade).

O culto fálico não é só observado entre os gregos e romanos. Vemos sua presença nos
hindus, nos japoneses e até em algumas tribos de negros africanos. Na própria França,
conta-se que perto da vila de Gueret se cultuava São Greluchon. O santo era
representado pela imagem de um frade com pênis ereto, escondido sob a túnica
eclesiástica.

Ainda hoje sofremos a influência destas crenças. Uma delas é a linguagem fálica das
mãos, onde o dedo médio em riste representa o pênis, enquanto o indicador e o anular
dobrados fazem as vezes de testículos. A “figa”, que se representa colocando-se o
polegar entre os dedos médio e indicador, é outra simbolização peniana. Para alguns
povos ela é mais do que isto, é um convite à cópula. Em certas regiões rurais da Europa
fazer figa é um tremendo insulto, em outras, é uma forma discreta de “cantada”. No Brasil
a figa assume uma conotação mística e protetora, dando sorte a quem a usa,
defendendo-o contra todos os males.
É interessante observar que não é só o aspecto qualitativo que marca o culto fálico
através da história. É também importante as dimensões do pênis, e esta preocupação
quantitativa chega a ser de tal forma que se julga o homem pelo tamanho do pênis que
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possui. Quanto maior o pênis mais macho era o indivíduo. De alguma forma, este mito
chegou até nossos dias, infernizando as pessoas que possuem pênis pequenos.

Uma etapa mais avançada sobre as idéias do sexo/reprodução é aquela em que se


atenua a importância fálica e se passa a considerar a mulher mais do que um simples
receptáculo para o desenvolvimento fetal. Ela ganha o status de colaboradora no
processo da criação.

É interessante observar como esta colaboração se efetua.

Como sempre, há uma tendência de confluírem mitos distintos. Entre os Wogeos da Nova
Guiné, é da mistura do sangue menstrual com o esperma que nascem os filhos.
Numerosas crendices proliferam nesta mesma linha. Até mesmo o grande Aristóteles (De
Geracionem Animalibus) afirma que a mulher contribui para a gestação com o sangue
menstrual. Para Hipócrates e Galeno a contribuição são as secreções da vagina.

Os costumes variam de povo para povo, mas sempre se encontra a idéia do sexo ligada
à função reprodutora.

Entre os índios Bororós há uma crença que as crianças são geradas em múltiplas
cópulas, com vários homens. Deste modo, é desejável a relação sexual com parceiros
diferentes. Em contrapartida, os índios Man, da Guatemala, afirmam que a mulher que
cópula duas ou três vezes com o marido e não engravida é adúltera. Isto porque, para
eles, ter relação com mais de um homem impede a concepção.

Mais fantástica ainda é a idéia dos índios Kubeo que proíbem o coito da mulher durante
a gravidez. Dizem que se a mulher continuar a copular, pode acumular tal número de
fetos no abdômen que terminará por explodir.

Embora seja encantador estudar as relações entre sexualidade e reprodução, é preciso


valorizar as etapas em que o homem primitivo passou a olhar o sexo em um sentido mais
de prazer do que de procriação.

Quando na evolução biológica o homem assumiu a posição ereta e, sobretudo, quando


se difundiu a cópula face a face, os conceitos de beleza começaram a ser modificados.
A atração das nádegas passou a ser substituída pela beleza do rosto, dando origem ao
aprimoramento dos cosméticos, destinados ao embelezamento facial.

Paralelamente, os seios foram também hipervalorizados como regiões eróticas. Os


povos foram deixando de ser “bumbundófilos” e passaram a ser “mamófilos”. É claro que
esta fixação nem sempre obedece a uma necessária ordem de aprimoramento

específico. No Brasil, por exemplo, as nádegas são muito mais admiradas do que os
seios.

A idéia do sexo ligado ao prazer é bem definida pelos gregos. Eles chamavam de Eros
ao amor carnal, bastante diverso do amor puro, espiritualizado, e que intitulavam de
Ágape. Ambos eram distintos de Filos, que indicava afeição e amizade.
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É próprio do pensamento grego, estabelecer no homem, uma natureza dicotômica. O ser


humano é definido como sendo “animal racional”. Racional porque é dotado de razão e
de valores espirituais; animal porque é possuidor de um corpo que está cheio de
necessidades físicas para sua manutenção. É neste sentido que se deve entender a
conceituação de Eros e Ágape. Eros é biologia pura, falta-lhe a humanização que
caracteriza a “pessoa humana”. Ele é a afinidade de corpos e, como tal, encerra
sensualidade a sexualidade.

Seu imperativo é egoístico. “Eu quero” é a tônica. Há todo um compromisso de prazer a


de posse, mas não há necessariamente nenhum vínculo de permanência. Por esta razão,
Eros deseja a variação constante em sua eterna busca pelo prazer.

O espírito dual dos gregos aplicava-se à constituição da família, sendo possível distinguir
muito claramente o papel das “esposas” a das “heteras”. As esposas eram para o
governo da casa, para procriar e criar filhos, mas não para a satisfação sexual. Nestas
condições, não era de admirar que elas procurassem nos relacionamentos
homossexuais, ou com o emprego dos dildos (pênis feitos artificialmente e compartilhado
geralmente por muitas damas), o prazer que lhe era negado pelo esposo.

O sexo/prazer era destinado às heteras. Algumas delas foram famosas na Antiguidade:


Tais, a bela amante de Alexandre Magno; Aspásia, a inteligente companheira de Péricles;
para não falar em Frinéia, Filomena, Rodopis, Glicera e tantas outras que subjugaram,
pelo prazer, homens que dominaram impérios e escreveram a história de nossa
civilização ocidental.

A diferença entre Eros e Ágape é tão significativa que um mesmo indivíduo pode possuir
dois amores, cada um deles com um objeto diferente. Amar sexualmente uma parceira
e espiritualmente outra.

Renascendo das ruínas da civilização greco-romana, o cristianismo continuou a admitir


que o sexo fazia parte do componente animal do homem. Durante muitos séculos a Igreja
considerou o amor sexual como um amor inferior, apenas admitido com a finalidade de
procriação. É que o código da moral cristã estava baseado na noção de “natureza”,
considerando-se que um ato é bom quando está de acordo com os propósitos da
natureza e ruim quando não está dentro destes propósitos. Assim, fome e sexo se
equilibram em valores de permanência: a fome preserva o indivíduo; o sexo preserva a
espécie. Ainda hoje este conceito persiste nas alas mais conservadoras, considerando-
se que o verdadeiro amor que enobrece o homem é o amor espiritual, uma espécie de
amor superior, assexuado, digno da condição racional do homem. É interessante como
se estabelece assim um paradoxo: o amor sexual, inferior, gerando o amor espiritual,
superior. Isto porque sem sexo não haverá indivíduo e sem indivíduo não haverá amor
humano espiritual.

É interessante observar que, do ponto de vista moral, estas duas concepções prevalecem
alternando-se através dos tempos: ora indulgente e tolerante, ora repressiva e tirânica.
Usando o pecado e a vergonha como forma de controle, a moral do comportamento
sexual vai regendo os povos ao longo de suas existências.
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É preciso que nos libertemos do dualismo grego e passemos a observar o amor sexual
não como uma forma superior ou inferior ao amor espiritual. Na própria natureza do
homem o “racional” e o “animal” estão intimamente unidos, assim também devem estar
o amor sexual e o amor espiritual. Mesmo porque, se quisermos fazer uma avaliação
correta entre o que é “normal” e “anormal” no comportamento humano, devemos admitir
que o conceito de normalidade nem sempre está atrelado ao da natureza biológica.
“Normais” são também as pautas de conduta adotadas pela coletividade e não apenas
aqueles comportamentos que procuram satisfazer as necessidades puramente
biológicas da natureza.

Sem desejar subestimar as variáveis organísmicas, é necessário acrescentar à natureza


humana os componentes culturais. Dentro desta ótica, é possível entender como
variações: a felação, a cunilíngua, a masturbação, a contracepção que, naturalmente,
repugnam os moralistas ortodoxos que, presos ao conceito restrito da “natureza”,
consideram tais atos como anti-naturais.

De tudo isto resta-nos uma grande lição. Sexo simplesmente como forma de prazer ou
simplesmente como forma de reprodução dá uma idéia incompleta da sexualidade e não
satisfaz o homem. Ele é as duas coisas e mais ainda, ele é acima de tudo uma forma de
comunicação.

Eric Berne afirma que “a humanidade deu um grande salto ao separar os prazeres do
sexo de seu propósito biológico meramente reprodutivo”. O homem é a única forma de
vida deste planeta capaz de fazer semelhante arranjo. Arranjos que poderão leva-lo a
um patamar mais sólido. Quebrando as barreiras do seu isolamento psicofísico, o homem
pode se prolongar em sua parceira como uma forma mística de comunhão primordial.
Este sentido místico se observa nas religiões orientais.

Sexo é comunicação amorosa e, como se trata de uma atividade a dois, faz-se


necessário uma retroalimentação de informações, o que amplia ainda mais a estimulação
erótica. Sexo é diversão, prazer, êxtase. É a soma total de Eros e Ágape. Vivendo a
plenitude da sexualidade, dando e recebendo amor, é que seremos capazes de planejar
a reprodução da sexualidade, dando e recebendo amor, é que seremos capazes de
planejar a reprodução num clima de respeito e de decisões mútuas.

Só assim o exercício do comportamento sexual alcançará sua forma mais criativa, mais
prazerosa, mais íntima e mais perfeita de comunicação humana.

“Homem Cobra Mulher Polvo”

É da natureza biológica, cromossômica do homem e da mulher ter comportamentos


distintos. Os hormônios são fundamentais neste processo, pois agem impelido o homem
pela testosterona a procurar fêmeas e espalhar seus genes pelo mundo. A mulher para
atrair o macho precisa ter quadris largos que agasalhem bem a gravidez. Mas a natureza
deu ao ser humano o instinto de autopreservação, e primeiro ele satisfaz as próprias
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necessidades e desejos para depois perpetuar a espécie. Sexo primeiro,
paternidade/maternidade depois.

As diferenças são percebidas em diversos âmbitos, bio-psico-sócio-econômico-


culturalespiritual. Na personalidade, não apenas entre os gêneros masculino e feminino,
mas na identidade e papel de gênero, e na orientação sexual.

Apesar de todo determinismo cromossômico, a vida sexual dos seres humanos tem uma
diferença fundamental das outras espécies: o “Como Somos” que nos dá a racionalidade,
a inteligência, a criatividade e motivações únicas que transformam o simples ritual
biológico do instinto sexual numa história de amor, única, verdadeira, espiritualizada,
cultural. O Amor se constrói nas diferenças.

“O afeto nosso de cada dia”

Isto só ocorre porque possuímos um conjunto de sentimentos que chamamos de


Comportamento Emocional, que é a forma de dar e receber afeto.

“A Afetividade é um conjunto de fenômenos psíquicos que se manifestam sob forma de


emoções, paixões e sentimentos acompanhados sempre da impressão da dor, ou prazer,
de satisfação ou insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou de tristeza”.

O Afeto nosso de cada dia que devemos considerar sob a mais simples forma de atenção,
podendo ser positiva ou negativa. Afeto positivo que possibilita ao outro um contínuo
crescimento, mobilizando fatores essenciais na construção da auto-estima.

Edina Bom Sucesso aponta para alguns pontos que considera importante para a
construção da auto-estima: auto aceitação – admitir nossos limites e reconhecer os dos
outros; respeito – expressar adequadamente as emoções, saber escutar, guardar sigilo,
desculpar-se, etc.; apoiar as iniciativas – conduta assertiva, autodisciplina;
relacionamento de amizade; além de elogios verdadeiros.

“Com-Vivemos” em sociedade rodeados de pessoas dos mais diversos tipos e


comportamentos, às vezes tão diferentes dos nossos que poderiam dificultar nossa
convivência, no entanto se fossemos exatamente iguais as coisas não seriam mais
fáceis.

Aposto que você tem aquele casal de amigos, que você não entende como ainda estão
juntos, pois brigam o tempo todo.
- Você pegou o controle remoto? Eu disse que não era pra tirá-lo do lugar!
- Viu, eu não falei que o caminho estava errado! Se você tivesse ido por onde eu
avisei....

Todos nós, até podemos viver sem a relação sexual, mas ninguém sobrevive sem afeto.
Para tanto algumas atitudes nos favorecem e ao parceiro também, contribuindo para que
a convivência seja o mais coerente possível.
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O amor, o diálogo, o elogio, o toque corporal, a comunhão, a assertividade, a
espiritualidade, as fantasias, a cumplicidade e o erotismo são pontos chaves no
desenrolar de um relacionamento sadio e promissor. Muitas das dificuldades entre os
casais em seus relacionamentos e até na cama estão intimamente atribuídas a um
destes aspectos, senão a todos.

O Erotismo

Estudos demonstram que existe uma diferença na visão masculina e feminina do


erotismo:

COMPORTAMENTO ERÓTICO
Visão masculina Visão feminina
Centraliza o exercício da sexualidade na Deseja ser considerada, admirada e
ereção acariciada como todo.
Visão parcial Visão total
Interesse instantâneo desaparece após a Desejo contínuo permanece após o
ejaculação orgasmo
Prazer inicia com a visão do próprio membro Afeto, emoção, ternura, sinceridade,
ereto doçura estimula o erotismo
Maior estímulo visão Maior estímulo toques e odores
Evidencia mais a genitalidade Sexualidade é evidência prioritária
Orgasmo é orgasmo Orgasmo é avaliado em relação ao antes
e depois
Orgasmo é quantitativo Orgasmo é qualitativo

Estas posições ambíguas geram, muitas vezes inseguranças. Esse desencontro se faz
justamente em detrimento das desinformações e dificuldades de diálogo entre os sexos.
O importante é captar as virtudes do masculino e do feminino, sem se importar se é
homem ou mulher, agregando qualidades e habilidades, utilizando de todo afeto positivo.

ANATOMIA E FISIOLOGIA SEXUAL HUMANA

O Psicanalista não tem que necessariamente conhecer em detalhes a anatomia sexual.


Cabe ao médico diagnosticar e tratar problemas relacionados a distúrbios anatômicos,
biológicos, dos órgãos envolvidos com a sexualidade. Faremos aqui apenas uma revisão
rápida da anatomia dos órgãos genitais, para que possamos compreender a sua
fisiologia e os distúrbios que podem ocorrer na função sexual.

As Fases da Resposta Sexual Humana

O estudo do funcionamento sexual humano, do ponto de vista fisiológico, só foi iniciado


de modo científico a partir de 1954, com os estudos de William Masters e Virgínia
Johnson, cujos resultados foram publicados pela primeira vez em 1966, no livro “A
Resposta Sexual Humana”. Até então, só se tinha estudado o sexo do ponto de vista da
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reprodução, deixando a sexualidade para os estudos sociológicos e psicológicos. Sem a
base biológica, muitas das teorias e conceitos psicológicos e sociológicos acabaram
exagerando em suas interpretações, perdendo grande parte de sua validade. Basta ter
os conceitos de Freud acerca da sexualidade feminina, hoje considerados inválidos e,
em alguns pontos, absurdos.

Masters e Johnson dividiram a resposta sexual em quatro fases, conhecidas como o


modelo EPOR da resposta sexual. São estas: a Excitação, o Plateau, o Orgasmo e a
Resolução. Tais fases estariam presentes tanto no homem quanto na mulher, embora
algumas diferenças tivessem sido detectadas. Basicamente, o homem teria uma fase de
excitação geralmente mais rápida, e uma fase de resolução onde há um período
refratário, logo após o orgasmo, em que a excitação seria impossível. Já na mulher, a
excitação poderia seguir padrões variáveis, desde uma fase rápida, como a do homem,
seguindo-se o plateau, até uma excitação mais lenta, que atingiria o orgasmo sem passar
pelo plateau. Também o período refratário estaria ausente, possibilitando à mulher os
orgasmos múltiplos.
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Helen Singer Kaplan, no decorrer da década de 1970, modifica esta divisão, diminuindo
a importância da existência ou não da fase de plateau, e desconsiderando a fase de
resolução, por considerar clinicamente insignificantes estas fases. Inicialmente
abordando a resposta sexual como bifásica, ou seja, compreendendo excitação (o que
englobaria as fases E e P de Masters e Johnson) e orgasmo (fase O de Masters e
Johnson), Kaplan logo percebeu que uma outra etapa é de fundamental importância no
ciclo da resposta sexual: a fase do desejo! Depois de alguns anos trabalhando com
terapia sexual, Kaplan percebeu que as técnicas de terapia breve,
cognitivocomportamentais, que eram utilizadas com todos os pacientes, funcionavam
muito bem em problemas como anorgasmia, vaginismo, disfunção erétil e ejaculação
prematura, porém quando havia uma diminuição do desejo sexual, a terapia tendia ao
fracasso. Em 1979, com o livro “Disorders of Sexual Desire” (Transtornos do Desejo
Sexual), Kaplan estabelece o modelo trifásico da resposta sexual, mais apropriado como
base para o diagnóstico e o tratamento dos transtornos sexuais.

Deste modo, podemos hoje esquematizar desta forma a resposta sexual humana:

Estímulo Desejo

Excitação

Orgasmo

Cada uma destas fases tem a sua própria fisiologia, cuja descrição foge ao escopo desta
aula. É suficiente dizer que envolve mecanismos psicológicos, neurológicos e vasculares,
sendo estes últimos os responsáveis pelos fenômenos observáveis da excitação, ou seja,
a ereção, no homem, e a lubrificação vaginal, na mulher. No entanto, qualquer tentativa
de simplificação daria uma falsa impressão da verdadeira complexidade da
neurofisiologia da resposta sexual.

É importante ressaltar, entretanto, um único ponto que é motivo de controvérsias, e


também críticas à Psicanálise. Trata-se da questão do orgasmo feminino, que foi
considerado por Freud como podendo ser originado por dois tipos de estímulos: o vaginal
e o clitoridiano. Mais ainda, Freud afirmou ser o orgasmo vaginal o único “correto”,
considerando “imaturo” o orgasmo clitoridiano. Fisiologicamente, não existe diferença
entre o orgasmo resultante do estímulo direto do clitóris e aquele decorrente do coito,
uma vez que os movimentos coitais estimulam, através da tração dos pequenos lábios,
pelo menos de forma indireta o clitóris. Mais ainda, uma certa porcentagem das mulheres
não têm orgasmos apenas pela penetração, sendo necessária a estimulação direta do
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clitóris, seja pelo parceiro, seja por si mesma, não sendo consideradas “anormais” por
isso.

A partir da divisão da resposta sexual em fases, podemos classificar mais


adequadamente os diversos problemas que podem ocorrer com a mesma, no intuito de
orientarmo-nos para o tratamento mais adequado de cada transtorno. Mas não basta
apenas classificá-los segundo a fase da resposta comprometida. Para uma boa chance
de sucesso terapêutico, devemos pesquisar as possíveis causas dos transtornos
apresentados.

Entre as causas de transtornos sexuais, observamos desde causas orgânicas,


interferindo nos diversos níveis da resposta sexual, até causas psicológicas profundas,
envolvendo transtornos cujas raízes encontram-se em fases remotas da história psíquica
do indivíduo, passando por causas psíquicas menos profundas, seja individuais, seja do
casal, e até por questões sócio-culturais e circunstanciais.

Cabe ao psicanalista atuar em conjunto com os outros profissionais (sexólogo, médico),


atuando principalmente nas causas psíquicas profundas, mas também auxiliando na
abordagem das causas psíquicas mais imediatas, sendo essencial uma postura aberta
e não preconceituosa em relação à sexualidade.

TRANSTORNOS (DISFUNÇÕES) SEXUAIS

De acordo com o modelo de Kaplan, os transtornos sexuais foram classificados em


transtornos do desejo, da excitação e do orgasmo. Não se encaixam nestas três
categorias os transtornos caracterizados por dor à relação sexual (vaginismo e
dispareunia), e foram colocadas à parte, na classificação, as disfunções causadas por
condições médicas (orgânicas), e as induzidas por substâncias químicas (tanto
substâncias ilegais quanto medicações utilizadas para fins terapêuticos). Também estão
classificadas separadamente as parafilias, também denominadas desvios sexuais, que
foram estudadas por Freud de modo ainda preconceituoso, embora menos agressivo
que a abordagem vista até então, dando-lhes inclusive a alcunha de perversões.

Transtornos do Desejo Sexual

Inicialmente desconsideradas, devido à visão de Masters e Johnson, que considerava a


resposta sexual apenas desde a fase de excitação, as queixas de diminuição de desejo
sexual estão, atualmente, entre as mais freqüentes no atendimento sexológico. Nas
últimas duas décadas, um número significativo de pesquisas abordou o tema do desejo
sexual, principalmente pela constatação de que algumas situações orgânicas podem
afetar negativamente o desejo, como produção alterada de hormônios e efeitos colaterais
de medicações.

Os transtornos do desejo estão subdivididos em três categorias: desejo sexual hipoativo,


aversão sexual e desejo sexual hiperativo. No entanto, ao considerarmos um casal,
existe uma possibilidade de existir uma inadequação quanto ao desejo, sem que haja um
verdadeiro transtorno, uma vez que o desejo sexual considerado como “normal” tem uma
grande variação. Como exemplo, um casal onde um dos parceiros gostaria de ter uma
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freqüência de relações sexuais de uma vez por semana e o outro preferiria tê-las duas
vezes ao dia, pode ter problemas importantes no relacionamento, sendo considerado um
casal inadequado, embora ambos estejam dentro da faixa considerada “normalidade”.

Pode parecer estranha a inclusão de uma categoria para desejo sexual hiperativo, mas
esta é justificada pela ocorrência de casos onde existe uma falta de controle sobre os
impulsos sexuais, com comportamento sexual impulsivo, freqüência alta de relações ou
atividade masturbatória (várias vezes ao dia), chegando a comprometer o funcionamento
profissional ou social, prejudicando os relacionamentos pessoais, e levando a sofrimento
pessoal. Os indivíduos com desejo sexual hiperativo podem ser considerados como
pessoas com “compulsão pelo sexo”, lembrando o transtorno obsessivo-compulsivo,
porém, com características nitidamente diversas deste. As classificações oficiais do
DSM-IV e do CID 10 ainda não aceitaram a inclusão desta categoria, porém KAPLAN
(1995) afirma categoricamente a necessidade de seu diagnóstico.

Do outro lado do “contínuo” do desejo sexual estão as aversões sexuais. Estas são
caracterizadas por aversão extrema e evitação, persistentes ou recorrentes, a todo (ou
quase todo) contato sexual genital com um parceiro, causando sofrimento ou dificuldades
interpessoais importantes. As aversões podem ser “primárias”, ou seja, existirem por toda
a vida, ou adquiridas, ou seja, iniciadas após um evento ou situação traumática. Também
podem ser generalizadas, independentes do parceiro, ou situacionais, dependendo de
um parceiro ou de uma situação específicos.

Já o desejo sexual hipoativo pode ser de leve a grave, caracterizando-se por fantasias e
desejo sexuais persistentes ou recorrentemente deficientes (ou ausentes), devendo ser
levados em conta para sua caracterização fatores como idade e o contexto da vida
pessoal do cliente. É importante para a sua caracterização que o distúrbio cause
sofrimento ou dificuldades interpessoais marcantes, e também, assim como as aversões,
pode ser “primário” ou “adquirido”, “generalizado” ou “situacional”.

O desejo sexual tem uma regulação neurológica complexa, dependendo de múltiplos


fatores, inclusive alguns ainda ignorados pela ciência. No entanto, podemos dividir os
fatores que o influenciam em dois grupos: os “incitantes” sexuais, e os “supressores”
sexuais. Dentro destes dois grupos, podemos citar fatores fisiológicos, como a
testosterona, a estimulação tátil, e possíveis substâncias afrodisíacas, como incitantes
do desejo, e a prolactina, medicamentos com efeitos colaterais sexuais, e a depressão,
como supressores do desejo, e fatores psicológicos, como um parceiro atraente, a
estimulação erótica, as fantasias, e o amor, como incitantes do desejo, e um parceiro
pouco atraente, os pensamentos “negativos”, as “anti-fantasias”, o “stress”, e as emoções
negativas, como supressores do desejo.

Atuando sobre estes fatores, seja nos fisiológicos – modificando medicações e corrigindo
distúrbios endócrinos, por exemplo – seja nos psicológicos – estimulando as fantasias e
o uso de material erótico, e resolvendo os conflitos e emoções negativas situacionais,
por exemplo -, podemos auxiliar o cliente a aumentar seu desejo sexual, com resultados
pelo menos parcialmente satisfatórios na maioria dos clientes. Em uma porcentagem
significativa de pessoas, no entanto, somente uma psicoterapia mais profunda, capaz de
modificar os fatores mais remotos da disfunção do desejo, como conflitos edipianos,
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experiências eróticas da infância, e injunções negativas de pais, professores e
sacerdotes, pode realmente transformar sua vida sexual.

Aqui entra a ação do psicanalista, que deve trabalhar em conjunto com o terapeuta
sexual, para que os resultados do tratamento sejam maximizados. É fundamental o
conhecimento, por parte do psicanalista, dos fatores mais “imediatos” que podem
influenciar o desejo, e que irão ser abordados pela terapia sexual, para que não se incorra
no erro de procurar apenas as raízes mais profundas de um problema, deixando que os
“galhos e folhas podres” impeçam o restabelecimento da sexualidade saudável.

Modelo Psicossomático de Controle Duplo da Motivação Sexual Humana


Helen Singer Kaplan

Sexuais Sexuais

Incitadores Supressores
Supressores Fisiológicos:
Incitadores Fisiológicos: 1 – Distúrbios Hormonais
1 – Testosterona Centros 2 – Drogas com Efeitos
2 – Estimulação Física Genital Colaterais Sexuais
3 - Afrodisíacos Reguladores 3 - Depressão
Sexuais
Hipotalâmicos
Incitadores Psicológicos: E Límbicos
1 – Parceiro Atraente Inibidores Psicológicos:
2 – Estimulação Erótica 1 – Parceiro Não Atraente
3 – Fantasias 2 – Pensamentos Negativos
4 – Amor 3 – Anti-fantasias
5 – Galanteio 4 – Emoções Negativas
+ - 5 – “Stress” e Raiva

Desejo Sexual Evitação Sexual

Experiência
Subjetiva de
Desejo
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Transtornos da Excitação Sexual

Os transtornos da excitação sexual englobam a disfunção erétil, no homem e alterações


da lubrificação vaginal, na mulher.

A introdução no mercado, em 1998, do Sildenafil (viagra), levou a uma “revolução” no


tratamento da disfunção erétil, que é considerado um “divisor de águas” na Sexologia
moderna. Inicialmente temido pelos terapeutas sexuais como um possível “esvaziador”
de suas clínicas, o Viagra mostrou-se não um inimigo, mas um grande aliado dos
terapeutas. Uma vez que as causas da disfunção erétil, desde as mais superficiais até
as mais profundas, não são modificadas com o uso da medicação, o simples uso da
mesma não resolve os conflitos interpessoais, nem restaura o bem estar sexual, nem do
homem, muito menos da mulher. Assim, a terapia da disfunção erétil continua incluindo
diversas técnicas cognitivas e comportamentais, além de, em alguns casos, necessitar
de um tratamento mais profundo, como a psicanálise.

O diagnóstico da disfunção erétil deve levar em conta não apenas as causas


psicológicas, mas também as causas orgânicas, entre as quais se destacam
principalmente o diabetes mellitus e a hipertensão arterial, em especial relacionada aos
efeitos colaterais das medicações anti-hipertensivas. Uso de drogas, em especial o
álcool, podem estar envolvidos na gênese da dificuldade de ereção.

Mas o principal gerador de disfunção erétil é a ansiedade antecipatória. Num mecanismo


do tipo “bola de neve”, o indivíduo que “falha” uma vez, “assombrado” pelo mito do
“homem infalível”, por temores relativos à homossexualidade, e tantos outros conceitos
distorcidos pela nossa cultura sexual, passa a “observar-se” de modo excessivo durante
a relação sexual, e o “stress” gerado por essa “cobrança” de perfeição acaba por dificultar
ainda mais a ereção.

Já entre as mulheres, além das causas orgânicas, a dificuldade de excitação sexual está
mais relacionada a causas mais profundas, incluindo os mitos sexuais, e também a
causas relacionadas ao relacionamento do casal, também chamadas de causas diádicas.
Os transtornos da excitação sexual nas mulheres são muito difíceis de se diagnosticar,
uma vez que o desejo sexual costuma estar mais comumente comprometido, o que afeta
secundariamente a excitação, sendo raro encontrarem-se mulheres com desejo sexual
intacto, e dificuldade à excitação, que não seja de causa orgânica.

Transtornos do Orgasmo

Os transtornos do orgasmo incluem a anorgasmia, que é a dificuldade ou impossibilidade


de atingir o orgasmo, e a ejaculação precoce, que é a dificuldade ou impossibilidade de
o homem retardar a ejaculação por tempo suficiente para manter uma relação sexual
satisfatória. A anorgasmia masculina é chamada de ejaculação retardada, e muitas
vezes, tem a conotação de dificuldade para ejacular apenas durante o coito, não
existindo tal dificuldade à masturbação.
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Os transtornos do orgasmo, de modo geral, têm geralmente causas mais superficiais,
mesmo quando são “primários”, ou seja, quando o indivíduo nunca experimentou um
orgasmo, ou nunca conseguiu um controle ejaculatório adequado. Assim, o tratamento
cognitivo-comportamental, com técnicas específicas bem estabelecidas, tem na maioria
dos casos um resultado excelente, sendo rara a necessidade de terapia psicanalítica.

Cabe lembrar que a anorgasmia feminina está muito ligada a mitos e preconceitos, sento
comum a queixa de “anorgasmia” por mulheres que atingem normalmente o orgasmo,
porém apenas quando estimulam seu clitóris, considerando-se inadequadas em função
de conceitos ultrapassados. Outras vezes, a “anorgasmia” está relacionada
especificamente à ausência de orgasmos com um parceiro específico, sendo uma
conseqüência de transtornos do desejo, muito mais que um problema do orgasmo “em
si”.

Transtorno de Dor Sexual

Em uma categoria à parte estão os transtornos sexuais que se caracterizam por dor ao
coito, independentemente do ciclo de resposta sexual. Estes englobam o vaginismo e as
dispareunias.

A dispareunia é a dor ao coito, seja na mulher, seja no homem. Na grande maioria dos
casos está relacionada a algum problema orgânico, porém, em especial nas mulheres,
existe sempre um componente psicológico envolvido, sendo possível a dor
exclusivamente psicogênica, resultado da combinação de contratura excessiva da
musculatura vaginal e da lubrificação insuficiente, fruto da dificuldade de excitação.
Algumas vezes, o desejo sexual está hipoativo, ou mesmo trata-se de uma aversão
sexual, seja estes percebidos conscientemente ou não. Já entre os homens a
dispareunia tem quase que exclusivamente causa orgânica.

Já o vaginismo é um reflexo de defesa da musculatura do assoalho pélvico, levando a


um espasmo dos músculos perineais, que impedem a penetração vaginal,
impossibilitando ou dificultando ao extremo o coito, e até o exame ginecológico. A maioria
das mulheres vagínicas tem desejo, excitação e orgasmo normais, muitas vezes
praticando prazerosamente atividades sexuais não-coitais, mas não conseguindo
consumar a penetração vaginal.

Embora as causas do vaginismo sejam quase sempre exclusivamente psicológicas,


levando a uma espécie de “fobia da penetração”, raramente o tratamento visa atingir tais
causas, exceto no sentido de um reforço cognitivo. A terapêutica sexual do vaginismo
inclui basicamente métodos comportamentais, incluindo relaxamento muscular
progressivo e dessensibilização sistemática. Os resultados, com esta forma breve de
terapia, varia de 72 a 99% de sucesso, não sento, portanto, recomendada a psicanálise
para tais casos. Apenas quando concomitante a outros transtornos, de causas profundas,
encaminham-se as pacientes vagínicas para psicoterapia de longo prazo.

AS PARAFILIAS
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As parafilias, definidas como “transtornos sexuais caracterizados por fantasias sexuais
especializadas e intensas necessidades e práticas que, em geral, são de natureza
repetitiva e angustiam a pessoa”. (KAPLAN, SADOCK & GREBB, 1997) No DSM-IV, os
critérios para diagnósticos de uma parafilia sempre incluem um período de pelo menos
seis meses de evolução, e a ocorrência de “sofrimento clinicamente significativo ou
comprometimento no funcionamento ocupacional ou em outras áreas importantes da vida
do indivíduo”, como conseqüência da mesma. Deste modo, são excluídas do diagnóstico
de parafilia as práticas que se restringem ao relacionamento sexual, de um ou mais
indivíduos, enquanto isto não atrapalhe as outras áreas de sua vida, nem causem
sofrimento (para si ou para outrem).

Antes consideradas como “perversões”, práticas como a masturbação, relações sexuais


incluindo mais de duas pessoas, e até mesmo fantasias sexuais, são hoje consideradas
absolutamente normais, desde que não causem sofrimento, nem invadam outras áreas
da vida dos indivíduos. Ainda se considera como “anormal” qualquer prática que seja
“exclusiva”, ou seja, que seja a única forma de expressão da sexualidade, limitando
assim a capacidade do indivíduo de se relacionar de maneira saudável.

A questão da orientação sexual, em especial a homossexualidade, abordada mais


adiante, era antes considerada como uma parafilia. Hoje não se admite chamar os
homossexuais de parafílicos, tendo o diagnóstico de homossexualidade sido retirado das
classificações internacionais de doenças desde a década de 1970.

Exibicionismo

No exibicionismo, existe o impulso ou desejo de expor os genitais a uma pessoa estranha


ou desprevenida. A pessoa se excita por antecipação da exposição, e masturba-se até
o orgasmo durante ou após o evento. Praticamente todos os casos são de homens
expondo-se a mulheres, e a observação da reação da “vítima”, de medo, surpresa,
aversão, levando à “afirmação da masculinidade”, o que remete ao Complexo de
Castração.

Fetichismo

O fetichismo consiste em uma concentração do foco sexual em objetos intimamente


relacionados com o corpo humano, como sapatos, calcinhas, meias, luvas, etc. A
atividade sexual pode ser dirigida ao próprio objeto (por exemplo, masturbação dentro
de um sapato), ou este ser incorporado ao ato sexual, como na exigência de utilização
de meias com ligas, por exemplo. Também é quase exclusivamente masculino, sendo
considerado por Freud como decorrente também do Complexo de Castração, estando o
fetiche associado, simbolicamente, com o fato.

Frotteurismo

Este termo designa a prática de “roçar” o pênis contra as nádegas ou qualquer parte do
corpo de uma mulher completamente vestida, geralmente em locais de grande
aglomeração de pessoas, principalmente ônibus e trens lotados. Para sua
caracterização, tal ato deve ser realizado sem consentimento da vítima, podendo, em
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alguns momentos, caracterizar-se também pelo uso das mãos para acariciar uma vítima
incauta.

Pedofilia

Pedofilia é o impulso ou excitação sexual recorrente e intenso por crianças de até 13


anos de idade. Para ser caracterizado como pedófilo, o indivíduo deve ter pelo menos 16
anos de idade, e ser, no mínimo, 5 anos mais velho do que a vítima. São excluídas deste
diagnóstico as pessoas no final da adolescência que têm um relacionamento sexual
contínuo com um “pré-adolescente” de 12 anos ou 13 anos de idade.

A grande maioria dos casos envolve carícias genitais ou sexo oral, sendo pouco
freqüente a penetração genital ou anal, exceto nos casos de incesto. A maioria das
vítimas que chegam a ser tocadas (+/- 60%) são meninos, enquanto que 99% dos casos
onde não há toque (como no exibicionismo), a vítima é menina. É importante notar que
50% dos pedófilos consomem álcool em excesso por ocasião do incidente, e 95% são
heterossexuais.

Sadismo e Masoquismo Sexuais

O sadismo e o masoquismo estão intimamente associados, não apenas por sua


complementaridade, como também pela presença de fantasias sádicas em 30% dos
masoquistas. Sadismo refere-se a fantasias, impulsos ou comportamentos sexuais que
envolvem atos reais (ou seja, não simulados) nos quais o sofrimento psicológico ou físico
do outro é sexualmente excitante. Já o masoquismo caracteriza-se por fantasias,
impulsos ou comportamentos sexuais envolvendo atos reais (não simulados) de ser
humilhado, espancado, atado, ou de outra forma submetido a sofrimento físico ou
psicológico, o que é sexualmente excitante para o indivíduo.

Para caracterizarmos o sadismo ou o masoquismo clinicamente, é necessário que tais


fantasias, impulsos ou comportamentos causem sofrimento significativo ou
comprometam o funcionamento social, profissional, ou outras áreas importantes da vida
do indivíduo. Assim, muitos casais que incorporam práticas sado-masoquistas em suas
vidas sexuais, desde que não causem sofrimento ou comprometimento funcional, não
são considerados parafílicos, embora tais práticas possam parecer chocantes para
muitos.

Contrariamente à impressão comum, o masoquismo é mais freqüente em homens do


que em mulheres, sendo atribuído por Freud a fantasias destrutivas do indivíduo,
voltadas contra si mesmo, num mecanismo de introjeção. Muitas vezes, no entanto, a
análise mostra que as experiências da infância levaram o indivíduo a acreditar que a dor
é um requisito para o prazer sexual, às vezes através de mensagens contraditórias
simultâneas de prazer e desprazer.

Já o sadismo é considerado pela Psicanálise como uma defesa contra o temor de


castração, como se os sádicos fizessem aos outros aquilo que temem que lhes aconteça
(ou, no caso das mulheres, que acreditam ter acontecido). Por outro lado, o pouco
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compreendido “instinto de destruição”, ou “pulsão de morte”, está geralmente nas raízes
desta distorção do prazer sexual.

Voyeurismo

Voyeurismo refere-se a fantasias ou atos que envolvem a busca ou observação de


pessoas nuas, despindo-se ou em atividade sexual. Evidentemente tais fantasias ou atos
são considerados normais, desde que não causem sofrimento significativo, nem
comprometam o funcionamento social ou profissional, ou as relações interpessoais do
indivíduo. Mais comum entre os homens, o voyeurismo inicia-se geralmente na infância
ou adolescência, e envolvem a observação sem que as pessoas observadas o saibam,
mas geralmente a excitação depende de algum risco de ser descoberto.

Fetichismo Transvéstico

Trata-se de fantasias, impulsos ou comportamentos sexuais em homens heterossexuais,


que envolvem o uso de roupas femininas. Iniciando-se tipicamente na infância ou início
da adolescência, pode evoluir, com o passar dos anos, para o desejo de vestir-se e viver
permanentemente como mulheres, quando então é classificado como fetichismo
transvéstico com disforia quanto ao gênero.

Nem todo homem com fetichismo transvéstico se encaixa na subcultura dos “travestis”,
existindo aqueles que só utilizam roupas femininas em situações solitárias, que levam a
sentimentos de culpa e depressão. Também existem homens sexualmente sadios, que
têm fantasias transvésticas dentro de um contexto saudável e positivo, mas muitas vezes
sendo inibidos por suas parceiras neste aspecto de sua sexualidade, por conta de mitos
e preconceitos envolvendo o homossexualismo.

Necrofilia

É a obsessão por obter satisfação sexual de cadáveres. Na maioria dos casos, os corpos
são encontrados em necrotérios, mas alguns necrofílicos violam sepulturas para obter os
corpos que desejam. Em alguns casos, o indivíduo comete primeiro um assassinato, para
depois ter relações sexuais com o cadáver, mostrando o caráter psicopático deste
desvio.

Não é incomum que um necrofílico se case, e exija que sua parceira faça “banhos de
assento” gelados, antes de iniciar uma relação sexual, ou que ordene à mesma que
mantenhas-se completamente imóvel durante todo o ato sexual.

Zoofilia

A inclusão de animais – que podem ser treinados para tanto – nos atos sexuais é
relativamente comum, embora seja rara como parafilia organizada e persistente. Muitas
vezes, especialmente em regiões mais isoladas, onde o contato sexual é coibido por
convenções religiosas e sociais rígidas, as relações com animais são freqüentes entre
os mais jovens. Situações de isolamento pessoal, forçado ou circunstancial, podem
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também levar a práticas zoofilicas, sem que necessariamente esteja presente um
“desvio” sexual.

Urofilia

É o prazer sexual associado com o desejo de urinar sobre o parceiro, ou de receber sobre
si a urina deste. Pode estar associada com técnicas masturbatórias envolvendo a
inserção de objetos estranhos na uretra, tanto em homens quanto em mulheres.

Coprofilia e Clismafilia

Coprofilia é o parzer sexual associado ao desejo de defecar sobre o parceiro, de receber


as fezes deste sobre o próprio corpo, ou de comer fezes (chamado de coprofagia). Já a
clismafilia é o uso de enemas (lavagens intestinais) como parte da estimulação sexual.
Teoricamente, ambas estariam ligadas à fixação do estágio anal do desenvolvimento
psicossexual.

Parcialismo

No parcialismo, o indivíduo focaliza-se em uma parte específica do corpo, excluindo


todas as demais. Normalmente o contato oral com os genitais é associado à fase de
excitação sexual, mas quando um indivíduo utiliza essas atividades como única fonte de
prazer sexual e não consegue ou se recusa a praticar o coito, pode-se caracterizar uma
parafilia.

O contato oral com os genitais femininos externos é chamado de cunilingus. Já o contato


oral com o pênis é denominado felação, enquanto que o contato oral com o ânus tem o
nome de anilingus.

Escatologia Telefônica

Caracterizada por telefonemas obscenos, a escatologia telefônica envolve tensão e


antecipação que começam em antecipação ao ato, uma “vítima” (em geral mulher) que
de nada suspeita, e a exposição verbal das fantasias e preocupações sexuais, ou a
indução da “vítima” a falar de sua atividade sexual, sendo a conversa acompanhada de
masturbação, podendo ser completada após a interrupção da ligação.

Variações da escatologia telefônica são cada vez mais comuns, em serviços telefônicos
especializados, ou pela Internet, que propicia desde “salas de bate-papo” até o uso de
correio eletrônico, com mensagens de texto, imagens e vídeos explícitos. A utilização
compulsiva destes serviços é que caracteriza uma parafilia, sendo considerado, quando
não compulsivo, um meio saudável de expressão da sexualidade, desde que não inflija
sofrimento.

Masturbação
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A masturbação é comum em todos os estágios da vida, desde a infância até a “terceira
idade” (ou até mesmo a recentemente batizada “quarta idade”), sendo considerada uma
atividade auto-erótica normal e saudável. No entanto, por diversos motivos, entre os
quais os dogmas religiosos, a masturbação foi considerada como patológica, e
causadora dos mais diversos males, desde a acne até a “neurastenia”, que era
considerada por Freud como decorrente de “masturbação excessiva”. Ainda hoje
encontramos pessoas evitando a masturbação, sentindo-se culpadas quando a praticam,
e até desenvolvendo neuroses graves relacionadas aos “fantasmas” ligados ao auto-
erotismo.

Quando a masturbação é o único tipo de atividade sexual, realizada, quando é praticada


com uma freqüência tal que prejudique outros aspectos da vida do indivíduo, ou quando
é constantemente preferida ao contato sexual com um parceiro, pode se tratar de uma
“anormalidade”, da mesma maneira que as fantasias e outras práticas descritas acima.
Mas a maior parte destas, quando praticadas de maneira prazerosamente saudável, não
dão motivos para serem condenadas, sendo inclusive excelentes meios para estimular
relacionamentos desgastados e “esfriados” sexualmente.

IDENTIDADE DE GÊNERO E ORIENTAÇÃO SEXUAL

Enquanto o “sexo biológico”, masculino ou feminino, tem uma determinação


anatomofisiológica bem definida, quando falamos em “gênero”, estamos abrangendo
aspectos muito mais amplos do que somente a biologia e a hereditariedade. O conceito
de identidade de gênero envolve questões biológicas, culturais, históricas, psicológicas,
e até mesmo espirituais. Afinal, o que é “ser homem” e o que é “ser mulher”?

Desde o nascimento, ou até antes dele (com os recursos tecnológicos que nos
possibilitam saber o sexo do feto alguns meses antes do parto), nos são impostos vários
elementos que irão fazer parte de nossa noção de gênero, e de nossa identidade como
homens ou mulheres. Desde o nome escolhido, passando pelas cores das roupas do
bebê, pelos brinquedos que nos são dados, pela educação que recebemos, pelas
diferentes atitudes de pais, professores, parentes, sacerdotes, tudo contribui para formar
em cada um de nós uma noção pessoal de gênero, e do que é ser homem ou mulher.

Infelizmente, muitos mitos e preconceitos estão incluídos e arraigados nessa noção,


sendo muito difícil percebermos o que são as diferenças reais, e o que são diferenças
artificialmente impostas, socialmente, culturalmente, historicamente. Desde o século
passado, através inicialmente da luta das feministas pela igualdade, e depois pelos
movimentos “GLS”, o mundo ocidental vem lentamente tentando desfazer alguns desses
mitos e preconceitos, gerando desconforto, inicialmente, por estar atingindo estruturas
solidificadas por milênios, mas gradualmente levando a um reconhecimento da
necessidade de mudanças, até mesmo para os homens, que começam agora a perceber
que o estereótipo do “macho” está cada vez menos adequado ao mundo e à sociedade
atuais.

Hoje vivemos uma fase de transição, com uma profusão de livros, debates, discussões
acaloradas, conselhos em revistas e jornais, enfim, todo um “burburinho”, que saudável
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enquanto “meio de cultura” para a formação de uma nova consciência sobre a
sexualidade, consciência que ainda não tem forma nem tamanho definidos, mas que dá
sinais de ser mais abrangente, tolerando mais as diferenças, enquanto existe maior
respeito pelo “espaço” do outro.

Orientação sexual: “Hetero”, “Homo” ou “Bi”?

Diferente da identidade de gênero, que é a noção que o indivíduo tem de si, se homem
ou mulher, e o que significa isso, a orientação sexual refere-se à preferência em relação
à atração sexual. Assim, chamamos de homossexual a pessoa que tem
preferencialmente atração sexual por pessoas do mesmo sexo, enquanto que aqueles
cuja atração sexual se dá preferencialmente pelas pessoas do outro sexo são
denominados heterossexuais. Bissexual seria uma pessoa que tem atração sexual por
ambos os sexos.

Embora Freud não considerasse a homossexualidade como doença mental, ele dizia que
era “uma variação das funções sexuais, produzida por um certo comprometimento do
desenvolvimento sexual”, colocando-a junto de outros transtornos da personalidade ao
tentar justificar a homossexualidade como resultante de forte fixação da mãe, falta de
cuidados paternos efetivos, inibição do desenvolvimento masculino pelos pais, fixação
ou regressão no estágio narcisista do desenvolvimento, ou fracasso na competição com
irmãos e irmãs, no caso dos homossexuais masculinos, ou da falta de resolução da inveja
do pênis e conflitos edipianos não resolvidos, para explicar a homossexualidade
feminina.

Muitas outras hipóteses foram formuladas sobre a origem da orientação homossexual,


desde explicações psicodinâmicas até alterações biológicas e hereditárias, mas até hoje
ainda se debate muito esta questão, sem uma conclusão definitiva. A única diretriz
universalmente aceita é a descaracterização da homossexualidade como patologia,
sendo considerada como transtorno apenas a homossexualidade ego-distônica, ou seja,
a situação em que a atração sexual pelo mesmo sexo não é aceita pelo próprio indivíduo,
levando-o a sofrimento significativo.

Uma criação que resume bem a situação da homossexualidade é a frase de David


Hawkins (citado por Kaplan, Sadock e Grebb, 1997): “A presença de homossexualidade
não parece ser uma questão de escolha; sua expressão é uma questão de escolha”.

Talvez a conclusão mais provável para o futuro seja que a sexualidade é extremamente
abrangente, não se limitando necessariamente à atração sexual por indivíduos do outro
sexo, mas envolvendo a capacidade de relacionamento com ambos os sexos, numa
troca de afeto e prazer que pode ser orientada positivamente, independentemente do
sexo do outro, como também deve ocorrer em relação à cor da pele, origem geográfica,
religião, etc. Assim o “sexo do futuro” tenderia para o bissexualismo, ou melhor, para o
universalismo sexual.

Transtornos de Identidade de Gênero


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Classificados à parte das disfunções sexuais estão os transtornos de identidade de
gênero. Estes são caracterizados por sentimentos persistentes de desconforto com o
próprio sexo biológico, ou com o papel de gênero do próprio sexo.

Vale a pena diferenciar essas duas expressões: Identidade de gênero é um estado


psicológico que reflete o senso íntimo de si mesmo como homem ou mulher. Entre outras
palavras, refere-se a como a pessoa se sente, se homem ou mulher, “por dentro”. Já o
papel de gênero refere-se ao padrão comportamental externo, que reflete o senso interno
da pessoa quanto à sua identidade de gênero. Resumindo, identidade de gênero é como
a pessoa se sente, homem ou mulher, e papel de gênero é como ela se apresenta aos
outros, como masculino ou feminino. Não se deve confundir estes conceitos com os de
sexo, que é rigidamente limitado às características anatômicas e funcionais (biológicas),
ou de orientação sexual, que é a tendência de resposta erótica da pessoa, levando em
consideração a escolha objetal, a atração sexual, e a própria vida de fantasias do
indivíduo.

No transtorno de identidade de gênero, existe uma angústia persistente e intensa acerca


do sexo atribuído, e um desejo ou insistência para ser do outro sexo. Os indivíduos
sentem-se literalmente como “aprisionados num corpo do sexo oposto”, referindo não
sentirem aquele corpo como seu. Muitas vezes, crêem ter “nascido com o sexo errado”,
não conseguindo sentir-se à vontade com o próprio corpo, a despeito de tentativas de
tratamento.

A opção terapêutica de escolha é a cirurgia para troca de sexo, que requer, no entanto,
um diagnóstico preciso, uma vez que tal cirurgia, se realizada em um indivíduo
homossexual, por exemplo, que não tenha o transtorno de identidade de gênero, levaria
a um desconforto permanente e irreversível.

A VISÃO DE FREUD SOBRE A SEXUALIDADE

A lista de escritos de Freud sobre a sexualidade é extensa, mesmo se selecionarmos


apenas aqueles que lidam mais diretamente com o assunto (ver abaixo). Para termos
uma idéia, ainda que parcial, de seus pontos de vista, vejamos o resumo que ele mesmo
faz de seus “Três Ensaios...”, sendo fortemente recomendada a leitura da íntegra dos
mesmos (Volume VII das “Obras Completas”).

Resumo dos “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade”

É chegado o momento de ensaiarmos um resumo. Partimos das aberrações da pulsão


sexual com respeito a seu objeto e seu alvo, e deparamos com a questão de saber se
elas provêm de uma disposição inata ou são adquiridas como resultado das influências
da vida. A resposta a essa pergunta nos veio da compreensão, mediante a investigação
psicanalítica, das condições da pulsão sexual nos psiconeuróticos, um grupo humano
numeroso que não fica longe dos sadios. Assim, descobrimos que, nessas pessoas, a
inclinação para todas as perversões é demonstrável da qualidade de forças
inconscientes e se denuncia como formadora de sintomas, e podemos dizer que a
neurose é como que o negativo das perversões. Diante da ampla disseminação das
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tendências perversas, agora reconhecidas, fomos impelidos ao ponto de vista de que a
disposição para as perversões é a disposição originária universal da pulsão sexual
humana, e de que a partir dela, em conseqüência de modificações orgânicas e inibições
psíquicas no decorrer da maturação, desenvolve-se o comportamento sexual normal.
Alimentamos a esperança de poder apontar na infância essa disposição originária; entre
as forças que restringem a orientação da pulsão sexual destacamos a vergonha, o asco,
a compaixão e as construções sociais da moral e da autoridade. Assim, tivemos de ver
em cada aberração fixa da vida sexual normal um fragmento de inibição do
desenvolvimento e infantilismo. Embora tenha sido necessário situar em primeiro plano
a importância das variações da disposição originária, tivemos de supor entre elas e as
influências da vida uma relação de cooperação, e não de antagonismo. Por outro lado,
já que a disposição originária é necessariamente complexa, pareceunos que a própria
pulsão sexual seria algo composto de diversos fatores e que, nas perversões, como que
se desfaria em seus componentes. Com isso, as perversões se revelaram, de um lado,
como inibições do desenvolvimento normal, e de outro, como dissociações dele. Essas
duas concepções foram reunidas na hipótese de que a pulsão sexual do adulto nasce
mediante a conjugação de diversas moções da vida infantil numa unidade, numa
aspiração com um alvo único.

Juntamos a isso o esclarecimento da preponderância das inclinações perversas nos


psiconeuróticos, na medida em que a reconhecemos como o enchimento colateral de
canais secundários em função do bloqueio do leito principal (da corrente sexual) pelo
“recalcamento”, e passamos então ao exame da vida sexual na infância. Pareceu-nos
lamentável que se negasse a existência da pulsão sexual na infância e que as
manifestações sexuais não raro observadas nas crianças fossem descritas como
acontecimentos que fogem à regra. Pareceu-nos, ao contrário, que a criança traz consigo
ao mundo germes de atividade sexual e que, já ao se alimentar, goza de uma satisfação
sexual que então busca reiteradamente proporcionar-se através da conhecida atividade
de “chuchar”. Todavia, a atividade sexual da criança não se desenvolve no mesmo passo
que as demais funções, mas sim, após um breve período de florescência entre os dois e
os cinco anos, entra no chamado período de latência. Neste, a produção de excitação
sexual de modo algum é suspensa, mas continua e oferece uma provisão de energia que
é empregada, em sua maior parte, para outras finalidades que não as sexuais, ou seja,
de um lado, para contribuir com os componentes sexuais para os sentimentos sociais, e
de outro (através do relacionamento e da formação reativa), para construir as barreiras
posteriores contra a sexualidade. Assim se construiriam na infância, à custa de grande
parte das moções sexuais perversas e com a ajuda da educação, as forças destinadas
a manter a pulsão sexual em certos rumos. Outra parte das moções sexuais infantis
escapa a esses empregos e consegue expressar-se como atividade sexual. Pudemos
então verificar que a excitação sexual da criança provém de uma multiplicidade de fontes.
A satisfação surge, acima de tudo, mediante a excitação sensorial apropriada das
chamadas zonas erógenas, e provavelmente pode funcionar como tal qualquer ponto da
pele e qualquer órgão dos sentidos – provavelmente qualquer órgão -, embora existam
certas zonas erógenas destacadas cuja excitação estaria assegurada, desde o começo,
por certos dispositivos orgânicos. Além disso, a excitação sexual parece surgir como um
subproduto, por assim dizer, de um grande número de processos que ocorrem no
organismo, tão logo eles alcançam certa intensidade, e muito especialmente, de todas
as comoções mais fortes, ainda que de natureza penosa. As excitações de todas essas
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fontes ainda não estão conjugadas, cada qual seguindo separadamente seu alvo, que é
meramente a obtenção de certo prazer. Na infância, portanto, a pulsão sexual não está
centrada e é, a princípio, desprovida de objeto, ou seja, auto-erótica.

Ainda durante a infância começa a fazer-se notar a zona erógena da genitália, seja
porque, como qualquer outra zona erógena, ela produz satisfação mediante a
estimulação sensorial apropriada, seja porque, de um modo não inteiramente inteligível,
havendo uma satisfação proveniente de outras fontes, produz-se ao mesmo tempo uma
excitação sexual que mantém uma relação particular com a zona genital. Temos de
admitir com pesar que não se chegou a um esclarecimento suficiente das relações entre
a satisfação sexual e a excitação sexual, como também entre a atividade da zona genital
e a das demais fontes da sexualidade.

Pelo estudo dos distúrbios neuróticos, observamos que é possível identificar na vida
sexual infantil, desde seus primórdios, os rudimentos de uma organização dos
componentes sexuais da pulsão. Numa primeira fase, muito precoce, o erotismo oral fica
em primeiro plano; uma segunda dessas organizações “pré-genitais” caracteriza-se pela
predominância do sadismo e do erotismo anal; somente numa terceira fase
(desenvolvida na criança apenas até a primazia do falo) é que a vida sexual passa a ser
determinada pela contribuição das zonas genitais propriamente ditas.

Tivemos então de registrar, como uma de nossas mais surpreendentes descobertas, que
essa eflorescência precoce da vida sexual infantil (dos dois aos cinco anos) também
acarreta uma escolha objetal, com toda a riqueza das realizações anímicas que isso
implica, de modo que a fase correspondente e ligada a ela, apesar da falta de síntese
entre os componentes pulsionais isolados e da incerteza do alvo sexual, deve ser
apreciada como uma importante precursora da posterior organização sexual definitiva.

A instauração bitemporal do desenvolvimento sexual nos seres humanos, ou seja, sua


interrupção pelo período de latência, pareceu-nos digna de uma atenção especial. Ela
se afigura como uma das condições da aptidão do homem para o desenvolvimento de
uma cultura superior, mas também de sua tendência à neurose. Ao que saibamos, nada
de análogo é demonstrável entre os parentes animais do homem. A origem dessa
peculiaridade humana deveria ser buscada na proto-história da espécie.

Não pudemos dizer que medida de atividade sexual na infância poderia ainda ser descrita
como normal, como não perniciosa, para o desenvolvimento ulterior. O caráter dessas
manifestações sexuais revelou-se predominantemente masturbatório. A experiência
permitiu-nos ainda comprovar que as influências externas da sedução podem provocar
rompimentos prematuros da latência e até a supressão dela, e que, nesse aspecto, a
pulsão sexual da criança comprova ser, de fato, perverso-polimorfa; comprovamos ainda
que tal atividade sexual prematura prejudica a educabilidade da criança.

Apesar das lacunas em nossos conhecimentos da vida sexual infantil, foi-nos então
preciso fazer uma tentativa de estudar as transformações sobrevindas com a chegada
da puberdade. Destacamos duas delas como decisivas: a subordinação de todas as
outras fontes de excitação sexual ao primado das zonas genitais e o processo do
encontro do objeto. Ambos já estão prefigurados na vida infantil. A primeira consumase
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pelo mecanismo de exploração do pré-prazer: os atos sexuais outrora autônomos,
ligados ao prazer e à excitação, convertem-se em atos preparatórios do novo alvo sexual
(a descarga dos produtos sexuais), cuja consecução acompanhada de enorme prazer,
põe termo à excitação sexual. Nesse aspecto, havíamos levado em conta a diferenciação
dos seres sexuados em masculino e feminino e descobrimos que, no tornar-se mulher,
faz-se necessário um novo recalcamento, que suprime parte da masculinidade infantil e
prepara a mulher para a troca da zona genital dominante. Por fim, descobrimos que a
escolha objetal é guiada pelos indícios infantis, renovados na puberdade, da inclinação
sexual da criança pelos pais e por outras pessoas que cuidam dela, e que, desviada
dessas pessoas pela barreira do incesto erigida nesse meio-tempo, orienta-se para
outras que se assemelhem a elas. Cabe ainda acrescentar, por último, que durante o
período de transição da puberdade os processos de desenvolvimento somático e
psíquico prosseguem por algum tempo sem ligação entre si, até que a irrupção de uma
intensa moção anímica de amor, levando à inervação dos genitais, produz a unidade da
função amorosa exigida pela normalidade.

Fatores que Perturbam o Desenvolvimento

Cada passo nesse longo percurso de desenvolvimento pode transformar-se num ponto
de fixação, cada ponto de articulação nessa complexa montagem pode ensejar a
dissociação da pulsão sexual, como já discutimos em diversos exemplos. Resta-nos
ainda fornecer um panorama dos diversos fatores internos e externos que perturbam o
desenvolvimento, e indicar o lugar do mecanismo afetado pela perturbação proveniente
deles. É claro que, os fatores mencionados numa mesma série podem não ter o mesmo
valor, e devemos estar preparados para encontrar dificuldades na devida avaliação de
cada um deles.

Constituição e Hereditariedade

Em primeiro lugar, cabe mencionar aqui a diversidade inata da constituição sexual, em


que provavelmente recai o peso principal, mas que, como é compreensível, só pode ser
deduzida de suas manifestações posteriores e, mesmo assim, nem sempre com grande
certeza. Concebemos essa diversidade como uma preponderância desta ou daquela das
múltiplas fontes de excitação sexual, e cremos que tal diferença entre as disposições
deve expressar-se de alguma maneira no resultado final, mesmo que este se mantenha
dentro das fronteiras da normalidade. Sem dúvida é concebível que haja também
variações na disposição originária que levem necessariamente, e sem a ajuda de outros
fatores, à configuração de uma vida sexual anormal. Poder-se-ia descrevelos como
“degenerativos” e considera-los como a expressão de uma deterioração hereditária.
Nesse contexto, tenho um fato notável a relatar. Em mais da metade dos casos de
histeria, neurose obsessiva etc. que tive em tratamento psicoterapêutico, pude
demonstrar com certeza que o pai sofrera de sífilis antes do casamento, quer se tratasse
de tabes ou paralisia progressiva, quer a doença luética fosse indicada de algum outro
modo pela anamnese. Quero observar expressamente que as crianças posteriormente
neuróticas não traziam em si nenhum sinal físico de sífilis hereditária, de modo que
justamente sua constituição sexual anormal é que devia ser considerada como a última
ramificação de sua herança sifilítica. Embora eu esteja longe de afirmar que a
descendência de pais sifilíticos é a condição etiológica invariável ou imprescindível da
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constituição neuropática, não creio que a coincidência por mim observada seja acidental
ou sem importância.

As condições hereditárias dos perversos positivos são menos conhecidas, pois eles
sabem furtar-se à investigação. Ainda assim, há boas razoes para supor que o que é
válido para as neuroses também o seja para as perversões. E que não raro se encontram
numa mesma família a perversão e a psiconeurose, distribuídas de tal modo entre os
dois sexos que os membros masculinos, ou um deles, são perversos positivos, enquanto
os membros femininos, em consonância com a tendência de seu sexo ao recalcamento,
são perversos negativos, ou seja, histéricos – uma boa prova das relações essenciais
por nós descobertas entre os dois distúrbios.

Elaboração Ulterior

Por outro lado, não se pode defender o ponto de vista de que a conformação da vida
sexual ficaria inequivocadamente determinada com a instauração dos diversos
componentes da constituição sexual. Ao contrário, o processo de determinação
prossegue e surgem outras possibilidades, conforme as vicissitudes por que passam as
correntes tributárias das sexualidades provenientes das diversas fontes. Obviamente, é
essa elaboração ulterior que decide em termos definitivos, enquanto o que se poderia
descrever como uma constituição idêntica pode levar a três desfechos diferentes.

Quando todas as disposições se mantêm em sua proporção relativa, considerada


anormal, e são reforçadas com o amadurecimento, o desfecho só pode ser uma vida
sexual perversa. A análise dessas disposições constitucionais anormais ainda não foi
devidamente empreendida, mas já conhecemos casos facilmente explicáveis mediante
tais hipóteses. Os autores opinam, por exemplo, que toda uma série de perversões por
fixação teria como precondição necessária uma debilidade inata da pulsão sexual.
Expressa nessa forma, tal colocação me parece insustentável, mas ela passa a fazer
sentido quando se pensa numa debilidade constitucional de determinado fator da pulsão
sexual, qual seja, a zona genital, zona esta que assume posteriormente a função de
conjugar num todo cada uma das atividades sexuais isoladas, tendo por alvo a
reprodução. Quando a zona genital é fraca, essa conjugação exigida na puberdade está
fadada a fracassar, e o mais forte dentre os demais componentes da sexualidade impõe
sua prática como uma perversão.

Recalcamento

Produz-se um desfecho diferente quando, no curso do desenvolvimento, alguns


componentes que tinham força excessiva na disposição passam pelo processo de
recalcamento, sobre o qual devemos insistir em que não é equivalente a uma supressão.
Nesse caso, as excitações correspondentes continuam a ser produzidas como antes,
mas são impedidas por um obstáculo psíquico de atingir seu alvo e empurradas para
muitos outros caminhos, até que se consigam expressar como sintomas. O resultado
pode aproximar-se de uma vida sexual normal – restrita, na maioria das vezes –, mas
complementada pela doença psiconeurótica. São justamente esses os casos que se
tornaram familiares para nós através da investigação psicanalítica dos neuróticos. A vida
sexual dessas pessoas começa como a dos perversos, e toda uma parte de sua infância
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é ocupada por uma atividade sexual perversa, que ocasionalmente se estende para além
da maturidade. Produz-se então, por causas internas – em geral antes da puberdade,
mas uma vez por outra até mesmo depois dela –, uma reversão devida ao recalcamento,
e a partir daí a neurose toma o lugar da perversão, sem que se extingam os antigos
impulsos. Isso faz lembrar o provérbio “Junge Hure, alte Betschwester”, só que, nesse
caso, a juventude foi curta demais. Essa substituição da perversão pela neurose na vida
de uma mesma pessoa, assim como a já mencionada distribuição de perversão e da
neurose entre os diferentes membros de uma mesma família, é coerente com a
concepção de que a neurose é o negativo da perversão.

Sublimação

O terceiro desfecho da disposição constitucional anormal é possibilitado pelo processo


de “sublimação”, no qual as excitações hiperintensas provenientes das diversas fontes
da sexualidade, encontram escoamento e emprego em outros campos, de modo que de
uma disposição em si perigosa resulta um aumento nada insignificante da eficiência
psíquica. Ai encontramos uma das fontes da atividade artística, e, conforme tal
sublimação seja mais ou menos completa, a análise caracterológica de pessoas
altamente dotadas, sobretudo as de disposição artística, revela uma mescla, em
diferentes proporções, de eficiência, perversão e neurose. Uma subvariedade da
sublimação talvez seja a supressão por formação reativa, que, como descobrimos,
começa no período de latência da criança e, nos casos favoráveis, prossegue por toda a
vida. Aquilo que chamamos “caráter” de um homem constrói-se, numa boa medida, a
partir do material das excitações sexuais, e se compõe de pulsões fixadas desde a
infância, de outras obtidas por sublimação, e de construções destinadas ao refreamento
eficaz de moções perversas reconhecidas como inutilizáveis. Por conseguinte, a
disposição sexual universalmente perversa da infância pode ser considerada como a
fonte de uma série de nossas virtudes, na medida em que, através da formação reativa,
impulsiona a criação delas.

Experiências Acidentais

Comparadas às descargas sexuais, às ondas de recalcamento e às sublimações (sendo


inteiramente desconhecidas para nós as condições internas destes dois últimos
processos), todas as outras influências parecem bem menos importantes. Quem incluir
os recalcamentos e sublimações na disposição constitucional e encará-los como
manifestações vitais desta, poderá afirmar, justificadamente, que a conformação final da
vida sexual resulta, acima de tudo, da constituição inata. Mas ninguém com algum
discernimento contestará o fato de que, em tal cooperação de fatores, há também espaço
para as influências modificadoras do que foi acidentalmente vivenciado na infância e
depois. Não é fácil avaliar a eficácia dos fatores constitucionais e acidentais em sua
relação recíproca. Na teoria, sempre se tende a superestimar os primeiros; a prática
terapêutica destaca a importância dos últimos. Mas em nenhum caso se deve esquecer
que existe entre ambos uma relação de cooperação, e não de exclusão. O fator
constitucional tem de aguardar experiências que o ponham em vigor, o acidental precisa
apoiar-se na constituição para ter efeito. Na maioria dos casos, pode-se imaginar o que
se tem chamado de “série complementar”, na qual as intensidades decrescentes de um
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fator são compensadas pelas intensidades crescentes de outro, mas não há razão
alguma para negar a existência de casos extremos nos dois limites da série.

Harmoniza-se ainda melhor com a investigação psicanalítica dar um lugar de destaque,


entre os fatores acidentais, às experiências da primeira infância. A série etiológica única
decompõe-se então em duas, que podem ser chamadas de disposicional e definitiva. Na
primeira, a constituição e as vivências acidentais da infância interagem da mesma
maneira que na segunda, a disposição e as vivências traumáticas posteriores. Todos os
fatores nocivos ao desenvolvimento sexual externam seu efeito promovendo uma
regressão, um retorno a uma fase anterior do desenvolvimento.

Prossigamos agora em nossa tarefa de enumerar os fatores que verificamos serem


influentes no desenvolvimento sexual, quer representem forças eficazes ou meras
manifestações delas.

Precocidade

Um desses fatores é a precocidade sexual espontânea, demonstrável com certeza pelo


menos na etiologia das neuroses, muito embora, tal como outros fatores, não seja por si
só uma causa suficiente. Manifesta-se na interrupção, encurtamento ou encerramento
do período infantil de latência, e converte-se em causa de perturbações por ocasionar
manifestações sexuais que, pelo estado incompleto das inibições sexuais, de um lado, e
por ainda não estar desenvolvido o sistema genital, de outro, só podem trazer em si o
caráter de perversões. Essas tendências à perversão podem então permanecer como
tais ou, instaurado o recalcamento, transformar-se em forças propulsoras de sintomas
neuróticos. De qualquer modo, a precocidade sexual dificulta o desejável domínio
posterior da pulsão sexual pelas instâncias anímicas superiores, e aumenta o caráter
compulsivo que, à parte isso, os substitutos [Vertretungen] psíquicos da pulsão
reivindicam para si. A precocidade sexual amiúde corre paralela ao desenvolvimento
intelectual prematuro, e como tal é encontrada na história infantil dos indivíduos mais
eminentes e capazes; em tais condições, não parece tornar-se tão patogênica como
quando surge isoladamente.

Fatores Temporais

Da mesma forma, exigem consideração outros fatores que, ao lado da precocidade,


podem ser reunidos sob a designação de “temporais”. A ordem em que são ativadas as
diversas moções pulsionais, bem como o lapso de tempo em que podem manifestar-se
antes de sucumbir a influência de uma nova moção pulsional emergente, ou a algum
recalcamento típico, parecem filogeneticamente determinados. Todavia, tanto nessa
seqüência temporal quanto nessa duração parece haver variações que devem exercer
uma influência dominante no resultado final. Não é indiferente que uma dada corrente
emirja antes ou depois de sua corrente contraída, pois o efeito de um recalcamento não
pode ser desfeito: cada desvio temporal na montagem dos componentes produz
invariavelmente uma alteração no resultado. Por outro lado, as moções pulsionais que
emergem com intensidade especial têm, com freqüência, um decurso
assombrantemente rápido, como, por exemplo, o vínculo heterossexual dos que depois
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se tornam homossexuais manifestos. Não há justificativa para o medo de que as
tendências estabelecidas com mais violência na infância dominem permanentemente o
caráter adulto; é igualmente esperável que elas venham a desaparecer, cedendo lugar a
seu oposto. (“Gestrenge Herren regieren nicht lange”)

Não estamos sequer em condições de fornecer indícios das causas dessas complicações
temporais dos processos de desenvolvimento. Abre-se aqui o panorama de uma densa
falange de problemas biológicos, e talvez também históricos, dos quais nem ao menos
nos aproximamos o bastante para travar batalha com eles.

Adesividade

A importância de todas as manifestações sexuais precoces é aumentada por um fator


psíquico de origem desconhecida, que por ora decerto só pode ser apresentado como
uma hipótese psicológica provisória. Refiro-me à elevada adesividade [Haftbarkeit] ou
fixabilidade dessas impressões da vida sexual, que é preciso admitir, para a
complementação dos fatos, nas pessoas que depois se tornarão neuróticas ou
perversas, já que as mesmas manifestações sexuais prematuras em outras pessoas não
conseguem gravar-se de maneira tão profunda, a ponto de produzirem uma repetição
convulsiva e poderem prescrever por toda a vida os caminhos da pulsão sexual. Parte
da explicação dessa adesividade talvez resida num outro fator psíquico que não
podemos negligenciar na causação das neuroses, a saber, a preponderância que cabe
na vida anímica aos traços mnêmicos, em comparação com as impressões recentes.
Esse fator é obviamente dependente da formação intelectual e aumenta conforme a
elevação da cultura pessoal. Em contraste com isso, o selvagem tem sido caracterizado
como “das unglückselige Kind des Augenblickes”. Em decorrência da relação inversa
entre a cultura e o livre desenvolvimento da sexualidade, cujas conseqüências podem
ser seguidas muito de perto na conformação de nossa vida, a importância do rumo
tomado pela vida sexual da criança para a vida posterior é muito pequena nos níveis
cultural ou social mais baixos e muito grande nos mais elevados.

Fixação

O terreno preparado pelos fatores psíquicos que acabamos de mencionar é favorável


aos estímulos acidentalmente vivenciados da sexualidade infantil. Estes últimos
(sobretudo a sedução por outras crianças ou por adultos) fornecem o material que, com
a ajuda dos primeiros, pode fixar-se como um distúrbio permanente. Boa parte dos
desvios da vida sexual normal posteriormente observados tanto nos neuróticos quanto
nos perversos é estabelecida, desde o começo, pelas impressões do período infantil,
supostamente desprovido de sexualidade. De sua causação participam a complacência
constitucional, a precocidade, a característica da adesividade elevada e a estimulação
fortuita da pulsão sexual por influências estranhas.

Todavia, a conclusão insatisfatória que emerge dessas investigações das perturbações


da vida sexual provém de não sabermos, sobre os processos biológicos que constituem
a essência da sexualidade, o bastante para formar, com base em nossos conhecimentos
isolados, uma teoria suficiente para compreendermos tanto o normal quanto o patológico.
LISTA DOS ESCRITOS DE FREUD QUE VERSAM PREDOMINANTEMENTE
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OU EM GRANDE PARTE SOBRE A SEXUALIDADE

(do apêndice do Volume VII das “Obras Completas” de Freud)

É claro que as referências à sexualidade são encontradas na grande maioria dos escritos
de Freud. A lista que se segue compreende aqueles que versam mais diretamente sobre
o assunto. A data indicada no início de cada item corresponde ao ano de publicação, e
o número romano entre parêntese, ao volume das “Obras Completas” em que se
encontra.

1898 (III) – “A Sexualidade na Etiologia das Neuroses”.


1905 (VII) – Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade.
1906 (VII) – “Minhas Teses sobre o Papel da Sexualidade na Etiologia das Neuroses”.
1907 (IX) – “O Esclarecimento Sexual da Criança”.
1908 (IX) – “Caráter e Erotismo Anal”.
1908 (IX) – “Sobre as Teorias Sexuais das Crianças”.
1908 (IX) – “Moral Sexual ‘Civilizada’ e Doença Nervosa Moderna”.
1910 (XI) – Cinco Lições de Psicanálise, Conferência IV.
1910 (XI) – Leonardo Da Vinci e Uma Lembrança de Sua Infância, Capítulo III.
1910 (XI) – “Um Tipo Especial de Escolha de Objeto Feita Pelos Homens
(Contribuições à Psicologia do Amor 1)”.
1912 (XII) – “Contribuições para um Debate sobre a Masturbação”.
1913 (XII) – “A Disposição à Neurose Obsessiva – Uma Contribuição ao Problema da
Escolha da Neurose”.
1913 (XIII) – “O Interesse Científico da Psicanálise”, Parte II (C).
1913 (XII) – Prefácio a Scatologic Rites of All Nations, de Bourke.
1914 (XIV) – “Sobre o Narcisismo: Introdução”.
1916-17 (XV) – Conferências Introdutórias sobre Psicanálise, Conferências XX, XXI, XXII
e XXVI.
1917 (XVII) – “As Transformações do Instinto Exemplificadas no Erotismo Anal”.
1918 (XI) – “O Tabu da Virgindade”.
1919 (XVII) – “Uma Criança é Espancada”.
1920 (XVIII) – “A Psicogênese de um Caso de Homossexualismo Numa Mulher”.
1922 (XVIII) – “Alguns Mecanismos Neuróticos no Ciúme, na Paranóia e no
Homossexualismo”, Seção C.
1923 (XVIII) – Dois Verbetes de Enciclopédia: (2) “A Teoria da Libido”.
1923 (XIX) – “A Organização Genital Infantil”.
1924 (XIX) – “O Problema Econômico do Masoquismo”.
1924 (XIX) – “A Dissolução do Complexo de Édipo”.
1925 (XIX) – “Algumas Conseqüências Psíquicas da Diferença Anatômica entre os
Sexos”.
1927 (XXI) – “Fetichismo”.
1931 (XXI) – “Tipos Libidinais”.
1931 (XXI) – “Sexualidade Feminina”.
1933 (XXII) – Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise, Conferências XXXII e
XXXIII.
1940 (XXIII) – [1938] Um Esboço de Psicanálise, Capítulos III e VII. 1940
(XXIII) – [1938] “A Divisão do Ego no Processo de Defesa”.
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REFERÊNCIAS

CAVALCANTI, R. e CAVALCANTI, M. Tratamento Clínico das Inadequações


Sexuais. 2ª. ed. São Paulo, Roca, 1997.

CARVALHO, Marco Antonio Martins de. O Afeto Nosso de Cada Dia. 2ª. ed. Belo
Horizonte: do Autor, 2001.

FOUCAULT, M. História da Sexualidade I: A Vontade de Saber. 14ª. ed. Rio de Janeiro:


Graal, 2001.

FOUCAULT, M. História da Sexualidade II: O Uso dos Prazeres. 9ª. ed. Rio de Janeiro:
Graal, 2001.

FOUCAULT, M. História da Sexualidade III: O Cuidado de Si. 6ª. ed. Rio de Janeiro:
Graal, 1999.

KAPLAN, H.S., SADOCK, B.J. e GREBB, J.A. Compêndio de Psiquiatria – Ciências do


Comportamento e Psiquiatria Clínica. 7ª. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

KAPLAN, H.S. The New Sex Therapy. Active Treatment of Sexual Dysfunctions. New
York: Brunner/Mazel, 1974.

KAPLAN, H.S. Disorders of Sexual Desire and Other New Concepts in Sex Therapy. New
York: Simon and Schuster, 1979.

KAPLAN, H.S. The Evaluation of Sexual Disorders: Psychological and Medical Aspects.
New York: Brunner/Mazel, 1983.

KAPLAN, H.S. The Illustrated Manual of Sex Therapy. 2a. ed. Levittown: Brunner/Mazel,
1987.

KAPLAN, H.S. The Sexual Desire Disorders: Dysfunctional Regulation of Sexual


Motivation. Bristol: Brunner/Mazel, 1995.

LEIBLUM, S.R. e ROSEN, R.C. (eds.) Principles and Practice of Sex Therapy. 3a. ed.
New York: The Guilford Press, 2000.

LOPES, G. et al. Patologia e Terapia Sexual. Rio de Janeiro: MEDSI, 1994.

PARKER, R.G. Corpos, Prazeres e Paixões. A Cultura Sexual no Brasil Contemporâneo.


São Paulo: Best Seller, 1991.

TIBA, Içami. Homem-Cobra, Mulher-Polvo. Entenda as diferenças e seja muito mais feliz.
São Paulo: Ed. Gente, 2004.
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SUPLICY, M. Conversando Sobre Sexo. São Paulo: Círculo do Livro, 1983

NINGUÉM MAIS NAMORA AS DEUSAS


Arnaldo Jabor A política está tão repulsiva que vou falar de sexo.
Outro dia a Adriane Galisteu deu uma entrevista dizendo que os homens não querem
namorar as mulheres que são símbolos sexuais. É isso mesmo. Quem ousa namorar a
Feiticeira ou a Tiazinha?

As mulheres não são mais para amar, nem comer. São para “ver”.

Que nos prometem elas, com suas formas perfeitas por anabolizantes e silicones?

Prometem-nos um prazer impossível, um orgasmo metafísico, para o qual os homens


não estão preparados.

As mulheres dançam frenéticas na TV, com bundas cada vez mais malhadas, com seios
imensos, girando em cima de garrafas, enquanto os pênis-espectadores se sentem
apavorados e murchos diante de tanta gostosura. Os machos estão com medo das
“mulheres-liquidificador”.

Essas fêmeas pós-industriais foram fabricadas pelo desejo dos homens ou, pelo desejo
que eles gostariam de ter ou, melhor ainda, pelo poder fálico que as mulheres pensam
que os homens possuem.

O modelo da mulher de hoje, que nossas filhas almejam ser, é a prostituta


transcendental, a mulher-robô, a “Valentina”, a “barbarela”, a máquina-de-prazer sem
alma, turbinas de amor com um hiperatômico tesão.

Antigamente, a prostituta era dócil e te servia. O homem pagava para ela “não existir”.

Hoje, a cortesã moderna “existe” demais. Diante delas, todos se arriscam a brochar,
apesar de deseja-las como nunca.

Brochura que advém diante destas deusas não é por moral ou culpa; é por
impossibilidade técnica.

Quem se atreve a cair nas engrenagens destes “liquidificadores”?

Que parceiros estão sendo criados para estas pós-mulheres?

Não os há. Os “malhados”, os “turbinados” geralmente são bofes-gay, filhos do mesmo


narcisismo de mercado que as criou. Ou, então, reprodutores como o Szafir, para o Robô-
Xuxa.

A atual “revolução da vulgaridade”, regada a pagode, parece “libertar” as mulheres. Ilusão


à toa.
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A “libertação da mulher” numa sociedade escravista como a nossa deu nisso: super
objetos.

Pensando-se livres, mas aprisionados numa exterioridade corporal que apenas esconde
pobres meninas famintas de amor e dinheiro. São escravas aparentemente alforriadas
numa grande senzala sem grades.

Mas, diante delas, o homem normal tem medo. Elas são areia demais para qualquer
caminhão. Por outro lado, o sistema que as criou enfraquece os homens que trabalham
mais e ganham menos, têm medo de perder o emprego, vivem nervosos e fragilizados
com seus pintinhos trêmulos, cadentes, a meia-bomba, ejaculando precocemente,
puxando sacos, lambendo botas, engolindo sapos, sem o antigo charme
“jamesbondiano” dos anos 60.

No sexo neoliberal, o homem brasileiro perdeu o machismo orgulhoso do tempo das


mulheres-objeto artesanais.

A mulher pós-industrial o assusta. Não há mais o grande “conquistador”. Temos apenas


os “fazendeiros de bundas” como o Huck, enquanto a maioria virou uma multidão de
voyeurs, babando por deusas impossíveis.

Ah, que saudade dos tempos das bundinhas e peitinhos, “normais” e sempre
disponíveis...

TRABALHO PARA FIXAÇÃO DA MATÉRIA / UNIDADE

1. Fazer um comentário sobre o texto acima, no mínimo de duas páginas.


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Unidade

SEXOLOGIA II 3
A SEXUALIDADE INFANTIL E A PSICANÁLISE.

Na experiência e na teoria psicanalíticas, “sexualidade” não designa apenas as


atividades e o prazer que dependem do funcionamento do aparelho genital, mas toda
uma série de excitações e de atividades presentes desde a infância que proporcionam
um prazer irredutível à satisfação de uma necessidade fisiológica fundamental
(respiração, fome, função de excreção, etc.), e que se encontram a título de componentes
na chamada forma normal do amor sexual.

A psicanálise confere, como sabemos, grande importância à sexualidade no


desenvolvimento e na vida psíquica do ser humano. Mas não poderemos compreender
esta tese sem avaliarmos, ao mesmo tempo, a transformação por que passou a noção
de sexualidade. Não pretendemos aqui determinar qual a função da sexualidade na
apreensão psicanalítica do homem, mas apenas precisar, quanto à sua extensão e
compreensão, o uso que os psicanalistas fazem do conceito da sexualidade. Se
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partirmos da visão comum que define a sexualidade como instinto, isto é, como um
comportamento pré-formado, característico da espécie, como um objeto (parceiro do
sexo oposto) e uma meta (união dos órgãos genitais no coito) relativamente fixos,
perceberá que ela só muito imperfeitamente explica fatos fornecidos tantos pela
observação direta como pela análise.

Em extensão a existência e a freqüência das perversões sexuais, cujo inventario fora


realizado por alguns psicopatologistas do fim do século XIX (Krafft-Ebing, Havelock Ellis),
mostraram que existe grande variedade quanto à escolha de objeto sexual e quanto ao
modo de atividade utilizado para obter a satisfação.
Freud estabelece que existem numerosas transições entre a sexualidade perversa e a
chamada sexualidade normal: aparecimento de perversões temporárias quando a
satisfação habitual se torna impossível, presença – sob a forma de atividades que
preparam e acompanham o coito (prazer preliminar) – de comportamentos encontrados
nas perversões, seja como substitutos, seja como condição indispensável da satisfação.
A psicanálise das neuroses mostra que os sintomas constituem realizações de desejos
sexuais que se efetuam sob forma deslocada, modificada por compromissos com a
defesa, etc. Por outro lado, são freqüentemente desejos sexuais perversos que
encontramos por detrás deste ou daquele sintoma. Para Freud, é sobretudo a existência
de uma sexualidade infantil, que atua desde o princípio da vida, que vem ampliar o campo
daquilo que os psicanalistas chamam sexual. Ao falarmos de sexualidade infantil, não
pretendemos reconhecer apenas a existência de excitações ou de necessidades genitais
precoces, mas também de atividades aparentadas com as atividades perversas do
adulto, na medida em que põem em jogo zonas corporais (zonas erógenas) que não são
apenas a zonas genitais, e na medida em que buscam um prazer (sucção do polegar,
por exemplo). Neste sentido, os psicanalistas falam de sexualidade oral, anal, etc. Em
compreensão esta maior extensão do campo da sexualidade levou necessariamente
Freud a procurar determinar os critérios daquilo que seria especificamente sexual nestas
diversas atividades. Uma vez estabelecido que o sexual não é redutível ao genital (assim
como o psiquismo não o é ao consciente), o que autoriza o psicanalista a atribuir caráter
sexual a processos onde o

genital está ausente? A questão se coloca essencialmente em relação à sexualidade


infantil, porque no caso das perversões do adulto a excitação genital está geralmente
presente.
O problema é francamente abordado por Freud, especialmente nos capítulos XX e XXI
das Conferências Introdutórias sobre Psicanálise –1915-17, onde coloca para si mesmo
a seguinte objeção: “Por que haveis de teimar em já chamar sexualidade a estas
manifestações da infância que sois os primeiros a considerar indetermináveis e a partir
das quais o sexual vai mais tarde constituir-se? Por que não dizer simplesmente,
contentando-vos apenas com a descrição fisiológica, que já no lactente são observadas
atividades”, como a sucção e a retenção dos excrementos, que nos mostram que a
criança visa prazer de órgão. Embora deixando a questão em aberto, Freud responde
apresentando o argumento clínico segundo o qual a análise dos sintomas no adulto nos
conduz a estas atividades infantis geradoras de prazer, e isto por intermédio de um
material incontestavelmente sexual. Postular que as próprias atividades infantis são
sexuais supõe uma operação suplementar: para Freud, aquilo que se encontra no fim de
um desenvolvimento que podemos reconstituir passo a passo devia encontrar-se, pelo
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menos em germe, desde o início. No entanto, ele reconhece por fim que “...não estamos
ainda de posse de um sinal universalmente reconhecido e que permita afirmar com
certeza a natureza sexual de um processo”. Freud declara muitas vezes que tal critério
deveria ser descoberto na ordem bioquímica. Em psicanálise, tudo o que se pode
postular é dada pela clínica, a qual, porém, nos mostra a sua evolução e transformações.

Vemos que a reflexão freudiana parece tropeçar numa dupla aporia referente, por um
lado, à essência da sexualidade (em que a última palavra é deixada a uma hipotética
definição bioquímica) e, por outro, à sua gênese, pois Freud contenta-se em postular que
a sexualidade existe virtualmente desde o início. É no que se refere à sexualidade infantil
que esta dificuldade é mais patente; é aqui também que podemos encontrar indicações
quanto à solução.
Já ao nível da descrição quase fisiológica do comportamento sexual infantil, Freud
mostrou que a pulsão sexual se destaca a partir do funcionamento dos grandes
aparelhos que garantem a conservação do organismo. Num primeiro tempo, só
poderíamos referenciá-la como um a mais de prazer fornecido à margem da realização
da função (prazer sentido com a sucção, além do saciar da fome). É num segundo tempo
que este prazer marginal será procurado por si mesmo, para além de qualquer
necessidade de alimentação, para além de qualquer prazer funcional, sem objeto exterior
e de forma puramente local ao nível de uma zona erógena. Apoio, zona erógena, auto-
erotismo são para Freud as três características, estreitamente ligadas entre si, que
definem a sexualidade infantil. Vemos que, quando Freud procura determinar o momento
de emergência da pulsão sexual, esta surge quase como uma perversão do instinto, em
que se perdem o objeto específico e a finalidade orgânica.
Numa perspectiva temporal bastante diversa, Freud insistiu muitas vezes na noção de a
posteriori; novas experiências vão conferir a experiências precoces, relativamente
indeterminadas, uma significação que elas não possuíam na origem. Poderemos dizer,
em último caso, que as experiências infantis, a da sucção por exemplo, começam
nãosexuais e que o seu caráter sexual só lhes é atribuído secundariamente, depois que
aparece a atividade genital? Essa conclusão parece infirmar, na medida em que sublinha
a importância do que há de retroativo na constituição da sexualidade, o que dizíamos
acima da emergência desta, e a “fortiori” a perspectiva genética segundo a qual o sexual
já está implicitamente presente desde a origem do desenvolvimento psicobiológico.

Essa é justamente uma das principais dificuldades da teoria freudiana na sexualidade;


esta, na medida em que não é um dispositivo inteiramente montado, mas se estabelece
ao longo de uma história individual que muda de aparelhos e de objetivos, não pode ser
entendida exclusivamente no plano de uma gênese biológica, mas, inversamente, os
fatos estabelecem que a sexualidade infantil não é uma ilusão retroativa. Na nossa
opinião, a solução para esta dificuldade poderia ser procurada na noção de fantasias
originárias (ou protofantasias), que de certa maneira vem equilibrar a de a “posteriori”.
Sabe-se que Freud designa assim, apelando para a “explicação filogenética”, certas
fantasias (cena originária, castração, sedução) que podemos encontrar em cada sujeito
e que informam a sexualidade humana. Esta, portanto, não seria explicável apenas pela
maturação endógena da pulsão: constituir-se-ia no seio de estruturas intersubjetivas que
preexistem à sua emergência no indivíduo. A fantasia de “cena originária” pode, no seu
conteúdo, nas significações corporais que nela estão presentes, referir-se
preferencialmente a determinada fase libidinal (sádicoanal), mas, na sua própria
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estrutura (representação e solução do enigma da concepção), não se explica, para
Freud, pela simples conjunção de indícios fornecidos pela observação; constitui a
variante de um “esquema” que “já está lá” para o sujeito. A outro nível estrutural,
poderíamos dizer o mesmo do complexo de Édipo, definido como regendo a relação
triangular entre a criança e os pais. Ora, é significativo que os psicanalistas que mais se
dedicaram a descrever o jogo fantasístico imanente à sexualidade infantil (escola
kleiniana) nele tenham visto em ação, muito precocemente, a estrutura edipiana. A
reserva de Freud quanto a uma concepção puramente genética e endógena da
sexualidade verifica-se igualmente no papel que continuou a atribuir à sedução, uma vez
reconhecida a existência de uma sexualidade infantil. Simultaneamente ligada, pelo
menos nas origens, a necessidades tradicionalmente designadas como instintos, e
independente deles, simultaneamente endógena, na medida em que conhece uma linha
de desenvolvimento e passa por diversas etapas, e exógena, na medida em que irrompe
no sujeito a partir do mundo adulto (pois o sujeito tem que se situar de saída no universo
fantasístico dos pais e recebe deles, de forma mais ou menos velada, incitamentos
sexuais), a sexualidade infantil é difícil de aprender ainda pelo fato de não ser suscetível
nem de uma explicação redutora que faria dela um funcionamento fisiológico, nem de
uma interpretação “pelo alto”, qu pretendesse que Freud descreve sob o nome de
sexualidade infantil os avatares da relação de amor. Quando Freud a encontra em
psicanálise é sempre sob a forma de desejo: este, ao contrário do amor, está em estreita
dependência de um suporte corporal determinado e, ao contrário da necessidade, faz
depender a satisfação de condições fantasísticas que determinam estritamente a escolha
de objeto e a articulação da atividade.

OS TRANSTORNOS DE SEXUALIDADE.

Uma pessoa que tem transtornos da sexualidade, não completou o processo evolutivo
normal até o ajustamento adulto saudável. A permanência da ameaça infantil
inconsciente de castração pelo pai ou de separação da mãe oferece um campo aberto
para o desenvolvimento desses transtornos.
A tentativa de se associar fatores orgânicos ao comportamento sexual sempre acaba
caindo em generalizações que tornam a hipótese falha. Níveis hormonais anormais,
sinais neurológicos leves ou subclínicos, anormalidades cromossômicas e alterações
inespecíficas no eletroencefalograma parecem ocorrer em alguns casos. Na realidade, a
diferenciação entre a sexualidade normal e anormal é muito tênue e sujeita a diversas
influências. O comportamento sexual e as fantasias individuais são muito íntimos e só
raramente chegam ao conhecimento médico. Ainda estamos distantes de detectar
fatores psicológicos ou orgânicos claros para afirmar serem eles os responsáveis por
qualquer comportamento específico.
Apesar do consenso de que os transtornos de identidade sexual e de preferência sexual
não sejam raros e suas definições facilmente operacionalizadas, são poucos os trabalhos
epidemiológicos. Talvez porque o diagnóstico não seja realizado, já que os examinadores
freqüentemente não questionam os pacientes sobre suas intimidades sexuais ou porque
na maioria dos casos os sintomas são ego-sintônicos e os pacientes não os apresentam
como queixa ou, ainda, porque são muitas vezes omitidos deliberadamente.
Mais de 50% dos transtornos de preferência sexuais se iniciam antes dos 18 anos de
idade. No caso dos transtornos de identidade sexual, parece que raramente se iniciam
depois dos 21 anos de idade, sendo muitas vezes relatados em crianças de três a cinco
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anos de idade. A pedofilia é o transtorno de preferência sexual mais comum.
Aproximadamente 15% de todas as crianças já foram molestadas antes de atingir 18
anos. A violência à crianças é sempre considerada com a maior seriedade, e os casos
descobertos chegam sempre a público.
Os casos de sadomasoquismo são sempre sub-representados porque só chegam às
estatísticas os casos graves com conseqüências legais ou policiais. Entre os pacientes
com transtorno de preferência sexual que procuram tratamento, quase 50% apresentam
pedofilia, 25% queixam-se de exibicionismo e 12% de voyeurismo.

A 10ª edição da Classificação dos Transtornos Mentais (CID10) da Organização


Mundial de Saúde (OMS) divide os transtornos sexuais em três grupos:

DISFUNÇÃO SEXUAL NÃO CAUSADA POR TRANSTORNO OU DOENÇA


ORGÂNICA (F52).

A resposta sexual é tão intrínseca da personalidade que se torna impossível avaliar a


importância relativa dos fatores psicológicos e orgânicos. Alguns tipos de disfunção
(perda do interesse sexual, por exemplo) acometem homens e mulheres, embora as
mulheres, mais freqüentes relatem falta de prazer ou interesse.

FALTA OU PERDA DE DESEJO SEXUAL.

É o problema principal e não o secundário em relação a outras dificuldades, tais como


falha da ereção ou dispareunia. Embora não impossibilitando o prazer, torna a iniciativa
da atividade mais difícil. É um transtorno sexual hipoativo que se expressa com frigidez.
A disfunção do desejo pode ser: Total: quando nunca, em
momento algum, sentem prazer no coito. Não são portadoras de libido. Parcial:
quando apenas algumas poucas vezes apresentam desejo sexual. Normalmente tais
mulheres dificilmente atingem o orgasmo.
Circunstancial: neste caso, a disfunção de desejo está ligada a determinadas
circunstâncias, a momentos, que podem ser ocasionado, pelo objeto sexual (um parceiro
inadequado sexualmente), pelo local (ninho de amor inadequado), trauma ligado ao ato
sexual (violência sexual, etc.), etc., permanecendo enquanto existir o problema.

AVERSÃO SEXUAL E AUSÊNCIA DE PRAZER SEXUAL.


A possibilidade de relação sexual provoca fortes sentimentos negativos, suficientes para
que a relação seja evitada, ou para que as respostas sexuais ocorram normalmente. O
orgasmo pode ser alcançado, mas há uma falta de prazer apropriado, ao que se
denomina anedonia sexual.

FALTA DE RESPOSTA GENITAL.

No homem é caracterizada pela disfunção na ereção no ato sexual, ocorrendo quando a


ereção surge normalmente em certas situações como a masturbação ou com uma
parceira diferente ou durante o sono; muito provavelmente, o fator fundamental é
psicológico. Em mulheres, o problema mais freqüente é o ressecamento ou falha de
lubrificação vaginal , sendo que os fatores importantes podem ser psicogênicos ou
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infecções ou deficiências de estrogênio (freqüentemente na
menopausa).

DISFUNÇÃO ORGÁSTICA.

No orgasmo não ocorre ou se faz de modo muito retardado. Isso pode ser situacional
(ocorre sobretudo com determinados parceiros) ou é invariável quando fatores de
natureza física não podem ser excluídos. É mais comum em mulheres do que em
homens. As disfunções orgásticas ou anorgasmias são classificadas em: Primária:
quando a mulher nunca experimentou o orgasmo. Secundária: neste caso, a mulher
tornou-se anorgástica, após ter experimentado o orgasmo.
Anorgasmia total: trata-se da popularmente conhecida frigidez, que é a incapacidade de
a mulher atingir o orgasmo em qualquer situação
ou momento. Anorgasmia parcial: denomina-se anorgasmia parcial a dificuldade
que a mulher tem em atingir o orgasmo, ou seja, é lenta em
sua resposta orgástica. Anorgasmia circunstancial: é o caso em que a mulher
tem dificuldade de atingir o orgasmo em determinadas circunstâncias, à semelhança da
disfunção de desejo circunstancial, já citada. Podemos ainda, aqui acrescentar: o
sentimento de culpa, onde muitas mulheres, por nutrirem tal sentimento ligado ao sexo,
têm seus pensamentos desviados do ato; narcisismo, quando a mulher é bela vive se
admirando, tão concentrada em sua beleza que não consegue se concentrar no ato
sexual, antes está preocupada em não desarrumar o cabelo,
quebrar a unha, etc.
EJACULAÇÃO PRECOCE.

Refere-se à incapacidade de controlar a ejaculação para que ambos os parceiros possam


ter orgasmo. Em muitos casos, a ejaculação pode ocorrer antes mesmo do que em
homens. Esta impossibilidade só se observa geralmente no caso do coito, podendo
ejacular normalmente pelo processo masturbatório. Podem ser das seguintes origens:
Orgânica: diabetes, doença neurológica que interfira na sensibilidade do pênis, doenças
que causem baixa de androgênio, etc.
Psicológica: ocorre na maioria dos casos, sendo : a fixação à auto-ereção, associada à
masturbação na puberdade; fixação à fase fálica, associada à micção, gerando um medo
inconsciente de punição por ejacular; um mau relacionamento conjugal; aversão
inconsciente a ser pai, etc.

VAGINISMO NÃO-ORGÂNICO.

Surge quando há espasmos dos músculos que circundam a vagina, causando oclusão
da abertura vaginal. A penetração torna-se difícil e dolorosa ou mesmo impossível, no
vaginismo patogênico.

DISPAREUNIA NÃO-ORGÂNICA.
Refere-se a dor durante a relação sexual, ocorrendo tanto em mulheres como em
homens. Essa categoria só deve ser usada quando não há outra disfunção sexual (como
vaginismo ou ressecamento vaginal).

IMPULSO SEXUAL EXCESSIVO.


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Não costuma ser queixa de pacientes, embora possa ocorrer em mulheres e homens,
sobretudo na adolescência e início da idade adulta. No homem é chamada satiríase, e
na mulher, ninfomania.Quando o impulso sexual é secundário a um transtorno primário
deve ser codificado.

TRANSTORNOS DE IDENTIDADE SEXUAL

São relativamente raros, eles chamam a atenção devido às suas características


surpreendentes, bizarras e muitas vezes inadequadas.

TRANSEXUALISMO.

É o desejo de viver e ser aceito como um membro do sexo oposto. Usualmente


acompanha-se por uma sensação de desconforto ou impropriedade de seu próprio sexo
anatômico. Muitas vezes, os pacientes recorrem a tratamentos hormonais e cirurgias
com o objetivo de tornar o corpo congruente com o sexo preferido.

TRANSVESTISMO DE DUPLO PAPEL.

Caracteriza-se pelo uso de roupas do sexo oposto durante um breve período para
desfrutar a experiência temporária de ser o sexo oposto. Não há desejo de mudança de
sexo ou busca de cirurgias ou hormônios.

TRANSTORNO DE IDENTIDADE SEXUAL NA INFÂNCIA.


É o desejo persistente e invasivo da criança de ser do sexo oposto. Acompanha-se de
intensa rejeição pelo comportamento, atributos e/ou vestimentas do sexo original. Em
geral, começa nos anos pré-escolares. Ocorre mais em meninos do que em meninas.
Aproximadamente 70% desses indivíduos, quando adultos, mantêm orientação
homossexual.

TRANSTORNOS DE PREFERÊNCIA SEXUAIS

Têm em comum algumas características: são fantasias sexuais persistentes, repetitivas


ou intrusivas; são, muitas vezes, ego-sintônicas, mas reconhecidas como pouco usuais;
a excitação sexual e o orgasmo são inteiramente dependentes destas fantasias; há uma
grande importância da fantasia na vida do paciente; nos casos graves há outros
diagnósticos psiquiátricos associados, como transtorno de personalidade “borderline” ou
psicoses.

FETICHISMO.
È a presença de dependência de alguns objetos inanimados, em geral artigos de
vestuário e calçados, como estímulo para excitação e satisfação sexuais. O fetichismo
só deve ser diagnosticado quando é a fonte mais importante ou única de excitação
sexual.

TRANSVESTISMO FETICHISTA.
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É o uso de roupas do sexo oposto para obter excitação sexual. O transvestismo fetichista
se distingue do transvestismo transexual por sua associação à excitação sexual, com
forte desejo de tirar a roupa assim que o orgasmo acontece.

EXIBICIONISMO.
É uma tendência recorrente ou persistente de expor a genitália a estranhos ou a pessoas
em lugares públicos, sem convite ou pretensão de um contato mais íntimo. Há excitação
quando da exposição, e o ato é comumente seguido de masturbação.

VOYEURISMO.
É o comportamento recorrente ou persistente de olhar pessoas envolvidas em
comportamentos sexuais ou íntimos, tais como despir-se, sem que a pessoa observada
tome conhecimento. Isso leva à excitação e masturbação.

PEDOFILIA.
É a preferência sexual por crianças, usualmente em idade pré-puberal ou no início da
puberdade. A pedofilia, apesar de sua freqüência elevada, raramente é identificada em
mulheres. Freud classificou a pedofilia como sendo a perversão dos indivíduos “fracos e
impotentes”. Estes sentem-se atraídos por crianças por serem mais fracas e mais fáceis
de conquistar quando outros objetos lhe são excluídos pela angústia.

SADOMASOQUISMO.
É a preferência por atividade sexual que envolva servidão ou a inflição de dor ou
humilhação. Caso o indivíduo prefira ser objeto de tal estimulação, chamamos de
masoquismo; se é executor, chamamos de sadismo. Muitos indivíduos apresentam as
duas caraterísticas.

TRANSTORNOS MÚLTIPLOS; E OUTROS TRANSTORNOS:

A) NECROFILIA: é uma desordem sexual caracterizada pela necessidade de ato sexual


com cadáveres. Está ligada a um distúrbio mental normalmente hereditário. Tem uma
relação bem clara com o complexo de castração, onde a equação pode ser definida da
seguinte maneira, “transar com quem já morreu, não me traz o risco de ser castrado.”.
Os desajustes desta ordem têm um componente neurótico mas também profundamente
psicótico, onde em momentos de angústia há dissociação da realidade e o instinto impele
profundamente para a necessidade de satisfação sexual com um corpo morto, que não
lhe possa reagir.

B) ZOOFILIA: também conhecida como bestialidade, consiste na relação sexual com


animais. É um distúrbio sexual encontrado principalmente em pessoas pervertidas com
características de rudez, insensibilidade e grosseria, normalmente mais presente no
campo, entre lavradores. Devido a transtornos neuróticos, tal pessoa vive um bloqueio
afetivo para com o amor a um parceiro humano, onde a idéia presente em nível
consciente expressa a crença errada de que o animal é mais adequado que o semelhante
em termos sexuais.
C) INCESTO: caracteriza pela prática sexual entre pessoas unidas por vínculo familiar.
É normalmente resultante da mudança de objeto no período de desenvolvimento
edipiano, onde ocorre um deslocamento parental, fazendo com que a libido seja
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direcionada somente a certo membro da família, tendo mais freqüência o caso entre
irmãos, entre pais e filhos, e parentes próximos.

D) GERONTOFILIA: caracteriza-se pela preferência sexual por pessoas de idade


avançada. Boa parte destes pervertidos, foi criada por pessoas ou mesmos pais idosos
desde o nascimento, passando pelas fases do desenvolvimento psicossexual na
companhia destes, e pelo fato de sofreram alguma interferência, desenvolvendo a
regressão a um ponto onde houve a fixação da sua sexualidade.

TRATAMENTO.

Em geral, os transtornos de sexualidade estão associados a um prognóstico


desfavorável. Entretanto, alguns fatores podem melhorar o prognóstico, como a
motivação para a mudança. Entre os fatores que pioram o prognóstico incluímos: idade
de início precoce, freqüência elevada dos atos, ausência de culpa ou vergonha e o uso
associado de drogas.

A motivação do indivíduo em buscar tratamento é o fator determinante para a obtenção


de resultados favoráveis. O tratamento dos transtornos sexuais deve levar em
consideração todos os fatores biológicos, psicológicos e sociais envolvidos na
sexualidade. Sabemos que muitos desses transtornos têm raiz em problemas médicos
subjacentes e que devem ser tratados. Muito freqüentemente são fatores
medicamentosos, tanto de ordem médica como psiquiátrica.
É importante acentuar que mesmo na prática da masturbação, que permite o prazer do
indivíduo com o próprio corpo, faz parte do impulso sexual ser voltado dominantemente
para a relação com outra pessoa de modo real ou imaginário. Esse aspecto dá à vida
sexual caráter peculiar. Na vida dos casais com ligação duradoura, a satisfação sexual
é fator preponderante de harmonia. A relação sexual bem-sucedida (prazerosa) dá aos
parceiros um sentimento de gratidão mútua que ajuda a suportar os desgastes naturais
da vida cotidiana. A insatisfação exacerba os pequenos antagonismos. É importante, por
isso mesmo, estimular a boa relação entre os parceiros. Isso exige um diálogo franco
sobre todos os aspectos da sexualidade. O fato de ser adulto não indica que as pessoas
estão em condições de viver o sexo com liberdade. Pesa ainda sobre o sexo uma atitude
preconceituosa que impede que os parceiros possam dialogar livremente sobre desejos,
preferências e limites. A base desse diálogo deve ser o reconhecimento de que não
existe o amante ideal. A vida sexual é uma conquista permanente que vai permitindo um
conhecimento maior entre os parceiros.

Os homens ainda têm dificuldades em aceitar a iniciativa das mulheres. Isso se deve ao
fato de nem sempre se achar dispostos para o relacionamento sexual. As mulheres, que
não têm impedimentos de natureza fisiológica, por vezes forçam uma disposição que
psicologicamente não tem. Esses aspectos não são conversados entre os parceiros
como deveriam. Numerosos homens ainda se julgam insuficientes por se avaliarem
portadores de pênis pequeno. Na quase totalidades dos casos são atribuídas ao tamanho
do pênis outras insuficiências não anatômicas.
O homem é condenado à autenticidade sexual e não consegue muitos orgasmos
seguidos. As mulheres têm maior liberdade anatômica e fisiológica; são capazes de
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orgasmos múltiplos e podem manter relação sexual fingindo um desejo inexistente. Só a
aceitação dos limites permite o diálogo franco e aberto.

A vida sexual é um aprendizado em que cada parceiro precisa escutar o desejo do outro.
Isso não é fácil. Desvios como a pedofilia, o fetichismo, a necrofilia, os estupros mostram
a dificuldade de respeitar o parceiro e a tendência freqüente de anulá-lo. É importante
ter presente os limites de ordem biológica. Numerosas doenças de natureza médica
estão envolvidas na disfunção da ereção.

Doenças cardiovasculares, como o aneurisma da aorta e a insuficiência cardíaca;


distúrbios urológicos, como o mal de Peyronie, hidrocele ou varicocele; genéticos, como
a síndrome de Klinefelter; distúrbios endócrinos, como os diabetes mellitus. Quando
essas e outras condições médicas estão envolvidas, cumpre trata-las para evitar os
efeitos sobre a ereção e ejaculação.

Efeitos colaterais de várias substâncias, como os antidepressivos tricíclicos (imipramina,


clomipramina, etc.), o carbonato de lítio e as anfetaminas, também podem dificultar a
ereção, a ejaculação e o orgasmo. Outras drogas usadas de modo abusivo, tais como
álcool, cocaína, heroína, podem comprometer a ereção e a ejaculação. Antidepressivos,
como imipramina, clomipramina, nortriptilina, fluoxetina e sertralina, podem contribuir
para a inibição do orgasmo feminino. Quando o sintoma aparece simultaneamente com
essas medicações, importa avaliar a relação de custo e benefício das mesmas. Apesar
de difícil, o tratamento deve ser sempre multidisciplinar, com acompanhamento médico
(psiquiatra, ginecologista ou endocrinologista), psicólogos de diferentes orientações e
assistentes sociais.

Há relatos de tratamentos dos transtornos sexuais com métodos psicanalíticos,


comportamentais e outras técnicas diretivas. É sempre difícil acompanhar esses casos.
O que sabemos é que nenhuma dessas técnicas consegue ser eficiente em todos eles.
Isso deve levar a uma atitude humilde de abertura para outros tipos de investigação. A
psicanálise e as psicoterapias de orientação psicanalítica são a abordagem mais comum
desses problemas, apesar da escassez de estudos controlados. Ajudam o paciente a
entender a dinâmica psicológica dos eventos e tentar reformula-las. A terapia
comportamental deve ser utilizada para corrigir padrões específicos de desajustamento
sexual. Estímulos aversivos desagradáveis são pareados com os impulsos, que então
tendem a diminuir. Técnicas cognitivas (autoconscientização, autoavaliação e auto-
reafirmação) e de dessensibilização sistemática também podem ser utilizadas. O uso de
medicação fica restrito a sintomas ou síndromes ansiosas ou depressivas associadas. A
medicação deve ser utilizada por tempo limitado e em indicações muito precisas, apenas
como um coadjuvante às psicoterapias.

UM BREVE HISTÓRICO SOBRE A SEXUALIDADE E FASES PSICOSSEXUAIS.

Até o final do século passado havia a noção de que o sexo era um instinto que despertava
com a puberdade e tinha como objetivo a reprodução. O sexo era entendido em termos
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da sexualidade genital do adulto. A sexualidade infantil era negada ou considerada como
anomalia.
No início do século, as postulações revolucionárias de Freud situam a sexualidade na
infância e no inconsciente, ampliando o conceito do termo “sexual”, que deixa de ser
sinônimo de “genital”. Essa visão ampliada foi exposta em 1905 nos “Três ensaios sobre
a teoria da sexualidade”. O termo “sexual”, aparece ligado a um conjunto de atividades
não restritas aos órgãos genitais, que começa na infância e não na puberdade, e cuja
finalidade é o prazer e não apenas a reprodução. Essas postulações de Freud suscitaram
naturalmente numerosas discussões que foram permitindo uma visão nova sobre a
sexualidade humana, que começou a ser vista com menos preconceito.
O conceito de normalidade sexual tende a ser considerado como tudo o que é praticado
por adultos legalmente capazes, com o consentimento dos parceiros e que não implique
lesão física de nenhum dos participantes. A excitação caracteriza-se essencialmente
pela ereção do homem e a lubrificação vaginal na mulher, que se verifica a partir de
atividades ou pensamentos estimulantes. O platô, é o estágio de grande excitação e
tensão sexual que precede imediatamente o orgasmo. A ereção é completada por
vasocongestão do corpo cavernoso do pênis, que aumenta de tamanho e de diâmetro.
Nas mulheres há ereção dos mamilos e do clitóris. Essas transformações são
acompanhadas de sensação de prazer. O orgasmo é a ejaculação com contrações do
cordão espermático, das vesículas seminais, da próstata e da uretra no homem, e
contrações vaginais e uterinas na mulher. A fase de resolução é a involução gradativa
da ereção, com a volta ao tamanho habitual do pênis e do clitóris em razão da perda da
vasocongestão; sensação de relaxamento e bem-estar dos parceiros. Durante essa fase,
os homens ficam refratários a novos orgasmos por período que aumenta com a idade.
As mulheres são capazes de outros orgasmos, logo em seguida. Freud (1905/1972)
reconstruiu, a partir dos tratamentos de seus pacientes, das observações diretas
realizadas por pediatras e por ele próprio e as descrições publicadas de quadros
psicopatológicos e de povos primitivos, as diversas fases pelas quais passaria o
indivíduo, desde seu nascimento; elaborou a teoria da progressão da libido, do estágio
oral para o anal e para o genital com a conseqüente reorganização seqüencial do impulso
e da natureza do Id. Erikson (1976) estabeleceu que o indivíduo passa da confiança para
a autonomia e para a atividade, através da reorganização seqüencial do Ego e das
estruturas de caráter. Spitz (1979) referiu-se aos princípios organizadores que levam a
sucessivas restruturações dos precursores do Ego. Mahler (1993) concluiu que o
indivíduo vai do autismo normal para a simbiose normal e para a separação-individuação,
noção que depois abandonou face à observação empírica contraditória; haveria
restruturação do Ego e do Id, mas nos termos da experiência e do eu-e-outro do bebê.
Klein (1974) descreve as posições esquizo-paranóide e depressiva, que levam à
restruturação da experiência de eu e outro. Stern (1992) pensa que sua abordagem se
aproxima mais às duas últimas, já que a preocupação central é com a experiência de eu-
e-outro do bebê, diferindo, entretanto, quanto ao que se considera ser a natureza dessa
experiência: a ordem de seqüência do desenvolvimento do senso de self, livre dos
obstáculos e das confusões trazidas pelas questões do desenvolvimento do Ego ou do
Id. Todas as teorias psicanalíticas compartilham outra premissa: o desenvolvimento
progride de um estágio para o seguinte, sendo cada estágio não apenas uma fase
específica para o desenvolvimento do Ego ou do Id, mas também específica para certas
questões protoclínicas. As fases do desenvolvimento se referem a um tipo específico de
questão clínica que se verá desenvolvendo patologias em etapas posteriores da vida
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(Stern, 1992). Dois autores citados por Stern (1992), Peterfreund e Klein, criticam este
ponto, afirmando que se trata de uma teoria do desenvolvimento que, além de ser
retrospectiva, ou seja, descreve por uma reconstrução do passado a partir de estruturas
mais evoluídas, traduz-se pela morfologia da patologia.

FASES DO DESENVOLVIMENTO SEXUAL (FASES PSICOSSEXUAIS).

Freud foi o primeiro a nos fornecer um quadro claro da grande importância que tem, para
nossa vida e desenvolvimento psíquicos e sexuais, a relação com outras pessoas. A
primeira delas é naturalmente, a relação da criança com os pais, relação esta que, a
princípio, na maior parte dos casos se restringe principalmente à mãe ou à sua substituta.
Um pouco mais tarde surge a relação com os irmãos, ou outros companheiros próximos,
e o pai.
Freud assinalou que as pessoas às quais a criança se apega em seus primeiros anos
ocupam uma posição central em sua vida psíquica que é singular no que concerne a sua
influência. Isto é exato, quer o apego da criança a essas pessoas seja por laços de amor,
de ódio, ou ambos, sendo o último caso o mais comum.
Nos estágios iniciais da vida, a criança não percebe os objetos como tais e só
gradativamente, ao longo dos primeiros meses de seu desenvolvimento, aprende a
distinguir sua própria pessoa dos objetos. Também entre os objetos mais importantes da
infância, se incluem as várias partes do próprio corpo da criança, isto é, seus dedos,
artelhos e boca. Todos eles são importantes como fonte de gratificação, razão pela qual
admitimos que sejam altamente catexizados pela libido. Para sermos mais precisos,
deveríamos dizer que os representantes psíquicos dessas partes do corpo da criança
são altamente catexizados, já que não mais acreditamos, que a libido seja como um
hormônio que se pode transmitir a qualquer parte do corpo e lá se fixar.

A este estado de libido autodirigida Freud (1914) denominou de narcisismo, segundo a


lenda grega do jovem Narciso, que se enamorou de si mesmo.
Os primeiro objetos da criança são chamados de objetos parciais. Com isto significamos,
por exemplo, que só depois de muito tempo a mãe existe para a criança como um objeto
total. Antes disso, seu seio, ou a mamadeira, sua mão, seu rosto, etc., consistiam, cada
um, objetos separados na vida mental da criança, e pode bem ser que mesmo aspectos
diferentes do que fisicamente constitui um único objeto seja também, para a
criança, objetos distintos, e não unidos ou
relacionados.
Só se desenvolve uma relação de objeto contínua na última parte do primeiro ano de
vida. Uma das características importantes dessas primeiras relações de objeto é seu alto
grau do que chamamos ambivalência. Quer dizer, sentimentos de amor podem alternar
em igual intensidade com sentimentos de ódio, segundo as circunstâncias. As primeiras
fases das relações de objeto são comumente designadas como relações de objeto pré-
genitais, ou, às vezes, mais especificamente como relações de objeto anais ou orais. O
emprego habitual da palavra “pré-genital” neste sentido é incorreto. O termo apropriado
seria “pré-fálico”. De qualquer modo, na literatura psicanalítica, as relações de objeto da
criança denomina-se comumente, conforme a zona erógena que, no momento, esteja
desempenhando o papel mais importante na vida libidinal da criança.
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As características da sexualidade infantil, polimorfa e perversa, Freud bem as descreveu
em “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade”. A sexualidade infantil difere da do
adulto em diversos aspectos. A diferença que mais impressiona situa-se no fato da maior
excitação não se localizar, necessariamente, nos genitais, mas no fato de que os
genitais, a bem dizer, desempenham a parte de “primus inter pares” entre muitas zonas
erógenas. Também diferem os objetivos: não levam, necessariamente, ao contato
sexual, mas alonga-se em atividades que vêm a desempenhar papel, futuramente, no
pré-prazer. A sexualidade infantil pode ser ato-erótica, ou seja, tomar para objeto o
próprio corpo ou partes deste. Os componentes que se dirigem para os objetos portam
traços arcaicos (objetivos de incorporação, ambivalência). Quando um instinto parcial é
bloqueado, reforçam-se, correspondentemente, instintos parciais “colaterais”.
A criança pequena é uma criatura instintiva, cheia de impulsos sexual perversos
polimorfo, cheio de uma sexualidade total ainda indiferenciada, a qual contém num só
todos os instintos parciais. Freud sugeriu que se distinguissem dois tipos de excitação :
uma que é evocada por estímulos externos, preceptivos, descontínuos; outra que resulta
de estímulos instintivos contínuos, dentro do organismo. A assertiva deve, contudo, ser
considerada com mais pormenores. Toda a percepção, todos os estímulos sensoriais,
quer se originem fora, quer se originem dentro do organismo, têm “caráter provocativo”,
isto é, provocam certo impulso à ação.
O papel excepcional que o deslocamento da energia dá aos instintos sexuais foi o ponto
de que Freud partiu na sua primeira classificação dos instintos, pelo fato de haver notado
que os neuróticos se sentiam mal porque reprimiam certas experiências e porque estas
experiências sempre representavam desejos sexuais. As forças que combatiam os
desejos sexuais eram a angustia, os sentimentos de culpa, ou idéias éticos e estéticos
da personalidade; forças estas contra-sexuais que se podiam sumarizar como “instintos
do ego”, vestem servirem a auto-conservação.
Existe a formação de um conflito estrutural onde o ego rejeita, certas exigências do id; e,
com base no conceito de ser o ego uma camada superficial diferenciada do id, já não se
pode sustentar a esperança de que o ego abrigue, inatamente, outros instintos que não
estejam presentes no id. Ainda que as energias instintivas sejam tratadas no ego de
modo diverso do que o são no id, há de admitir-se que o ego deriva a sua energia do id,
não contendo, primariamente, outros tipos de instintos.
Embora as fases estejam distintamente descritas, é um engano imaginar que elas
ocorram absolutamente isoladas, pois elas podem se sobrepor, ocorrerem paralelamente
ou coincidir, assim como jamais serão completadas superadas, sendo observado na fase
adulta, comportamento que comprova a existência das fases da sexualidade infantil, o
que na maioria dos casos ocorre nas neuroses.
Pode-se dividir a sexualidade pré-adulta, de modo geral, em três períodos principais: o
período infantil, o período de latência e a puberdade. Hoje em dia se conhece muito bem
o começo e o fim do período infantil, ao passo que aquilo situado no meio ainda requer
muita pesquisa; possivelmente neste período intermediário, ocorrem variações
acidentais mais importantes que as que se dão nas fases inicial e terminal.

PERÍODO PRÉ-GENITAL, PRÉ-FÁLICO OU INFANTIL.

Freud denomina de pré-genitais devido às zonas genitais ainda não atingiram seu papel
predominante. Ao nascer o ser humano traz impulsos inconscientes em busca do prazer.
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Os impulsos naturais (id), são manifestações de uma tenência inata, cuja causa é a libido
ou energia sexual.

FASE ORAL.

É o estado oral (mas corretamente intestinal) de organização da libido. A criança na fase


fetal já desenvolve o instinto da sucção. O bebê, logo após seu nascimento, acha prazer
na sucção do seio materno e no vazio que sente quando retira a boca do seio. Seu gozo
é inconsciente, agarrando-se ao seio materno com satisfação, olhando para os olhos da
mãe durante este momento, tendo o fator alimentar se estabelecido como desejo
secundário. A criança chupa tudo o que encontra, os dedos, lápis, só pelo prazer da
sucção. Freud mostrou que quando a sucção produz prazer, é combinada a fricção de
certas partes do corpo, como a orelha, umbigo ou os genitais externos, sendo estes atos
caracterizado como o movimento precursor que leva a criança a praticar a masturbação.
O fenômeno auto-erótico de chupar o polegar, mostra o prazer que se obtém do seio ou
da mamadeira não se baseia só na gratificação da fome, mas também na estimulação
da mucosa oral erógena; se não fosse assim, o infante retiraria, desapontado o polegar,
visto este não produzir leite. Aí, a excitação sexual apoiou-se, originalmente, na
necessidade de alimento; tal qual, a excitação sexual primeira também se apoiou noutras
funções fisiológicas, na respiração e sensações cutâneas, nas sensações de defecar e
urinar.

Muitos fenômenos provenientes desta fase são retidos no adulto como o beijo e muitos
costumes alimentares. A “introjeção oral” é, do mesmo passo o executivo da
“identificação primária”. As idéias de que se come um objeto ou de que por ele se é
comido vêm a ser os modos pelos quais se pensa, inconscientemente, em qualquer
reunião objetal. A comunhão mágica que consiste em “transformar-se na mesma
substância”, ou comendo o mesmo alimento, ou misturando os sangues respectivos, bem
como a crença mágica de que nos tornamos semelhantes ao objeto que comemos
baseiam-se no mesmo fato.

Algumas manifestações de neuroses orais são :beber e comer em excesso, problemas


da linguagem e fala, agressão com palavras (correspondendo ao morder), xingamentos,
gozações, escrúpulos exagerados para não “incomodar”, desejo inconsciente de se
instalar e desalojar todas as pessoas, incapacidade de aceitar favores e receber
presentes. O afã de saber, o estudo de idiomas, o cantar, a oratória, a declamação, são
exemplos de sublimação das tendências orais.

FASE ANAL.

A análise das neuroses obsessivas permitiu a Freud inserir entre os períodos oral e fálico
outro nível organizacional da libido, a saber, o nível sádico-anal. Embora o prazer anal
se ache presente desde o início da vida, é no segundo ano que a zona erógenaanal
parece tornar-se o executivo principal de toda excitação, a qual, então onde quer que se
origine, tende a descarregar-se pela defecação. É a fase em que a libido se concentra
na região anal, que se torna uma área carregada de emoção agradável, sendo que em
primeiro lugar está a satisfação física do “vazio” que sentimos após a saída das fezes, o
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esvaziar o intestino e em seguida na satisfação mental que a criança sente na execução
desta função para os seus pais. Essa região compreende a junção da pela e a membrana
mucosa anu-retal. As junções de pele e mucosas do corpo são sensíveis e ao receberem
suave estimulação, produzem sentimentos de prazer. O objetivo primário do erotismo
anal, certamente, é o gozo de sensações prazerosas na excreção. A estimulação da
mucosa retal pode aumentar com a retenção anal exemplificam bem as combinações de
prazer erógeno e a segurança contra a ansiedade. O medo da excreção originalmente
prazerosa leva à retenção e à descoberta do prazer que esta última produz. A
possibilidade de realizar estimulação mais intensa da mucosa (além de sensação mais
intensa pelo aumento da tensão de retenção) é responsável pelo prazer tensional, que é
maior no erotismo anal do que em qualquer outro. Aqueles que, nas suas satisfações,
procuram prolongar o pré-prazer e estender o prazer final são sempre, latentemente,
eróticos anais.
A recusa de uma criança em defecar, é um modo de desafiar a autoridade parental e
reafirmar que as fezes “são delas”, tendo um prazer adicional na sensação em manter o
reto cheio. Elas consideram que as fezes são parte integrante de si mesma, com as quais
presenteia os pais e os adultos que a envolvem, sendo muito precioso pois é dado de
dentro do seu próprio corpo, do seu ser.
O manuseio das fezes pela criança é proveniente desta fase, sendo reprovadas pelos
pais como algo nojento, sujo. Apesar deste valor (indesejado) que é transmitido pelos
pais para as crianças no seu consciente, para o inconsciente irá uma mensagem de
repressão devido ao valor atribuído as fezes pela criança. Onde ocorreu a fixação anal
(neurose anal) , mesmo que as próprias fezes não possam ser acumuladas
indefinidamente, o indivíduo acumulará o que de valor puder adquirir, entesourando, sem
contudo atingir o seu uso apropriado. Vejamos alguns casos de neurose anal: o caso do
avaro que junta dinheiro, o colecionador que compra quadros valiosos, e não os exibe, e
nem mesmo os olha; dos indivíduos obsessivos, que insistem longo tempo e
improdutivamente em tarefas não completadas; pontualidade exagerada; tendência ao
uso de roupa íntima suja; sede de poder; prazer na descarga de uma linguagem chula.

As crianças que foram obrigadas a defecar por meio de ordens, quando adultas
apresentam acentuada tendência a terem seus problemas solucionados por outras e
tendem a realização de várias atividades simultaneamente, que se manifesta numa
obsessão à leitura durante a defecação. A origem e o caráter da conexão que existe
entre impulsos anais e sádicos, a que se alude na expressão usada para designar o nível
de organização (sadismo anal), são análogas à oralidade e sadismo: em parte, deve-se
a influências frustradoras e, em parte, ao caráter dos objetivos de incorporação.
Acresçam-se, contudo, dois fatores: em primeiro lugar, o fato de a eliminação ser,
objetivamente, tão “destrutiva” quanto a incorporação; o objeto do primeiro ato sádico-
anal são as próprias fezes, cuja expulsão se percebe como uma espécie de ato sádico;
posteriormente, as pessoas são tratada como já o foram as fezes; em segundo lugar, o
fator de “poder social” que se envolve no controle dos esfíncteres; exercitando-se no
asseio, a criança encontra oportunidade efetiva para exprimir oposição contra os adultos.
Razões fisiológicas existem para a conexão de erotismo anal, de um lado, e do outro
lado, ambivalência e bissexualidade. O erotismo anal faz que a criança trate um objeto,
a saber, as fezes, de maneira contraditória: expele a matéria para fora do corpo e a retém
como se fosse um objeto amado; aí está a raiz fisiológica da “ambivalência anal”. Por
outro lado ainda, o reto é órgão oco excretório; órgão excretório que é, pode expelir
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ativamente alguma coisa; órgão oco, pode ser estimulado por um corpo estranho que
penetre. As tendências masculinas derivam da primeira faculdade; as tendências
femininas, da segunda; temos aí a raiz fisiológica da conexão existente entre erotismo
anal e a “bissexualidade”. Quando a criança tem uma educação de higiene pessoal
prematura, o indivíduo posteriormente quando adulto poderá ter um comportamento
hostil e rebelde. Porém em seu aspecto formal apresenta-se asseado, obediente, passivo
e medroso. Quando a criança tem uma educação de higiene tardia, o indivíduo tenderá
a ser desasseado, desleixado e irresponsável. Quando tem uma educação no momento
adequado, o indivíduo terá inconscientemente um sentido normal do poder, e
conscientemente uma atitude adequada diante da sujeira e da limpeza.
Como sublimação das tendências da fase anal, ou seja, os desvio das pulsões para fins
aceitos pela cultura, temos as atividades de artes-plásticas, que são transformações mais
ostensivas do prazer infantil de brincar com as fezes.

EROTISMO URETRAL

O aparecimento do erotismo uretral infantil liga-se tão intimamente ao erotismo genital


infantil que muito não se pode dizer a seu respeito antes de discutir a genitalidade infantil.
É freqüente, todavia aparecer em estádios ulteriores como opoente pré-genital da
sexualidade infantil genuína. A criança erótico-uretral percebe, necessariamente, a
diferença entre os sexos com referência à micção; e, pois, é comum o erotismo uretral
apresentar-se combinado ao “complexo de castração”. Se bem que, certamente, o
objetivo primário do erotismo uretral seja o prazer da micção, há também um prazer
secundário de retenção uretral, análogo ao prazer de retenção anal, como há conflitos
desenvolvendo-se a este respeito. É o que se vê mais freqüentemente nas meninas,
provavelmente por motivos anatômicos. Seja como for, não parece que se justifique a
idéia suscitada por Ferenczi no sentido de fazer o prazer da retenção sinônimo de prazer
anal e o prazer excretório sinônimo de prazer uretral.
Os objetivos originais do erotismo uretral são auto-eróticos, tal qual o são os de erotismo
anal; posteriormente, também o erotismo uretral pode voltar-se para os objetos, o
aparelho uretral transformando-se, então, em executivo de fantasias sexualmente
excitantes relacionadas com o ato de urinar em objetos, de ser urinado por objetos; ou
de fantasias em que menos se mostra a conexão com a micção. É freqüente a criança
molhar ativamente a calça ou a cama, por prazer auto-erótico. Mais adiante, pode
desenvolver-se a enurese como sintoma neurótico involuntário, cuja natureza é a de
equivalente inconsciente da masturbação. De modo geral, o prazer de urinar tem caráter
duplo: em ambos os sexos, podem ter significação fálica e até sádica, a micção
equivalendo a penetração ativa, com fantasias de lesar ou destruir; ou se sente como
“deixar escorrer”, como entrega passiva e desistência do controle.

O objetivo do fluxo passivo pode condensar-se com outros objetivos passivos nos
meninos; por exemplo, ser acariciado no pênis, ou ser estimulado na raiz deste ou no
períneo (na próstata). A parte fálica ativa do erotismo uretral nos meninos não tarda a
ser substituída pela genitalidade normal, mas pode ocorrer que objetivos eróticouretrais
conflitem com a genitalidade, condensados, muitas vezes, com objetivos anais; é certo
que, às vezes, o erotismo uretral masculino se associa a fantasias, a bem dizer, sádicas,
conforme se vê na análise de casos de ejaculação precoce severa. Muitas vezes a idéia
de “deixar escorrer” desloca-se, da urina para as lágrimas. Nas mulheres, ocorrem
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dificuldades erótico-uretrais ulteriores, exprimindo, com a maior freqüência, conflitos que
giram em redor da “inveja do pênis”. Existe uma conexão entre o erotismo uretral e o
sentimento de vergonha.

FASE FÁLICA.
Ao concluir-se a sexualidade infantil, está realizada na concentração genital de toda
excitação sexual; o interesse pelos genitais e pela masturbação alcança significação
dominante; chega a aparecer uma espécie de orgasmo genital. Foi esta fase que Freud
chamou organização genital infantil, ou fase fálica. É a fase precursora da forma final
assumida pela vida sexual e que muito se assemelha a ela, que se dá por volta do quarto
ano de vida. Nesta fase a criança descobre o prazer na região genital, seja pelo contato
do vento, ou da mão de quem realiza sua higiene, ainda que inconsciente. Assim, os
garotos passam a pegar com mais freqüência no o pênis e as garotas no clitóris, daí o
termo “fálico”.

O ego da criança de três ou quatro anos é mais experiente, mais desenvolvido, mais
integrado e, conseqüentemente, diferente sob muitos aspectos, do ego da criança de um
ou dois anos. Essas diferenças se evidenciam no aspecto do funcionamento do ego, isto
é , nas características das relações de objeto da criança que se relacionam ao ego.
Nessa idade a criança já não mais possui relações parciais de objeto, se seu
desenvolvimento foi normal. Assim, por exemplo, as diversas partes do corpo da mãe,
seus diferentes humores, e seus papéis contraditórios de mãe “boa” que satisfaz os
desejos da criança e de mãe “má” que os frustra, são todos reconhecidos pela criança
dessa idade como compondo um objeto único chamado mãe.
Não existem libidos orais, libido anal e libido genital específicas; existe apenas uma libido,
a qual se desloca de uma zona erógenas para outra. Nos casos, porém, em que se
desenvolveram certas fixações, operam forças que resistem a deslocamento desta
ordem, de modo que, por exemplo, as fixações pré-genitais dos neuróticos obstam a
concentração genital progressiva da excitação durante o ato sexual. O prazer se encontra
basicamente nessas regiões, onde permanecerá, embora haja na garota um
deslocamento, diríamos parciais, para a vagina e na puberdade para o clitóris-vaginal.
Nenhuma catexia libidinal forte seja jamais completamente abandonada. É possível, que
grande parte da libido flua para outros objetos, porém, pelo menos certa quantidade
permanece ligada ao objeto de origem.
É nesta fase que desperta nas crianças de ambos os sexos o desejo de ver os genitais
umas das outras, bem como mostrar os seus, incluindo neste ato de curiosidade e
exibicionismo outras partes do corpo e também outras funções corporais. A
“masturbação”, ou seja, a estimulação dos genitais próprios para obtenção do prazer
sexual é normal na infância; nas condições culturais atuais, também é normal na
adolescência e até na idade adulta como substituto quando não se dispõe de objeto
sexual. Se um indivíduo cujas atividades sexuais são bloqueadas por circunstâncias
exteriores se recusa a usar deste expediente, a análise sempre revela medo inconsciente
ou sentimento de culpa na raiz da inibição.

Os pacientes que não se masturbaram na adolescência também revelam haverem sido


seus desejos sexuais esmagados em alto grau pelo medo e por sentimentos de culpa,
casos em que o prognóstico é mau, resultando, em gera, de repressão especialmente
profunda da masturbação infantil.
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A micção é também um componente da sexualidade infantil, denominado de erotismo


uretral. O garoto então é despertado em divertir-se no dimensionamento do jato de urina,
onde se encontra a raiz com a preocupação futura com a força, com a competição, com
o poder, com o desejo de ser maior, mais poderoso e mais importante.
O fato de os adultos ameaçarem ou brincarem de castração com tanta facilidade e
animação constitui, certamente, expressão dos seus próprios complexos de castração,
porque amedrontar os outros é meio ótimo de acalmar os próprios temores, donde resulta
que os complexos de castração vão passando de geração em geração. Não sabemos de
que forma eles se formaram originalmente, mas é certo que o respectivo
desenvolvimento tem história muito remota.

Uma pessoa neurótica de origem fálica, é ambiciosa e tem prazer à velocidade (forma do
prazer da penetração).

A ANGÚSTIA DE CASTRAÇÃO NOS MENINOS.

O medo de alguma coisa acontecer a este órgão sensível e prezado chama-se angústia
de castração; medo a que se atribui papel tão significativo no desenvolvimento total do
menino e que representa resultado, não causa desta valoração narcisística elevada. É
só a alta catexia narcisística do pênis neste período que explica a eficácia da angústia
de castração; aos seus precursores nas angústias orais, e anal pela perda do seio ou
das fezes, falta à força dinâmica que caracteriza a angústia de castração fálica.
A angústia de castração no menino do período fálico pode comparar-se ao medo de ser
comido do período oral, ou ao medo de ser despojado do conteúdo corporal do período
anal; é o medo retaliatório do período fálico, que representa o clímax dos temores
fantásticos de lesão corporal.

Em última análise, pode-se rastrear a idéia de castração no antigo reflexo biológico da


autotomia; menos profunda, porém mais certamente, baseia-se ela na idéia retaliatória
arcaica de talião: o próprio órgão que pecou tem de ser punido. Vê-se, entretanto, que o
ambiente das crianças lhes reforça idéias fantásticas de punição, muitos adultos ainda
ameaçando o menino de “cortar-lhe isto” quando o surpreendem masturbandose. Em
geral, a ameaça é menos direta, mas há outros castigos que se sugerem, a sério ou
brincando, e a criança interpreta-os como ameaças de castração. Todavia, mesmo as
experiências que, objetivamente, não contêm qualquer ameaça podem ser falsamente
interpretadas neste sentido pelo menino que tenha a consciência culpada; por exemplo,
a experiência de que existem realmente criaturas sem pênis: a observação dos genitais
femininos. Há vezes em que uma observação desta ordem empresta caráter sério a uma
ameaça anterior a que não se dera maior atenção; noutros casos, a realização da fase
fálica basta, só ela, para ativar ameaças passadas que não haviam feito impressão
excessivamente intensa durante os períodos prégenitais.
Também varia a natureza do perigo que se acredita esteja ameaçando o pênis. Há quem
pense estar o pênis ameaçado por um inimigo masculino, ou seja, por um instrumento
penetrante, pontudo; ou por um inimigo masculino, ou seja, por um instrumento
penetrante, pontudo; ou por um inimigo feminino, isto é, instrumento que
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envolve, isso conforme se apresente o pai ou a mãe como a pessoa que mais ameaça;
ou conforme as fantasias especiais que tem o menino no tocante ao contato sexual.
Meninos ou pessoas com uma neurose com medo de castração podem desenvolver
fantasias de que o pênis lhe voasse do corpo, micróbios devorando o pênis, sonhos com
calvície, cortar cabelos, extração ou queda de dentes, decapitação. O medo preventivo
da castração pode ser representado em um sonho como uma lagartixa (perde o rabo e
cresce novamente) ou quando um símbolo peniano aparece mutilado. Há indivíduos com
fixações orais que temem lhes seja o pênis arrancado a mordidas, de onde resultam
idéias confuso compostas de elemento tanto orais quanto genitais. Existem homens que
têm medo obsessivo consciente de terem o pênis pequeno demais, cujo resultado foi
alguma observação impressionante, na infância, do tamanho do pênis de outrem, quando
o deles era realmente pequeno.
Nos meninos, a “feminilidade” nem sempre significa: “Acho que já estou castrado”, mas,
pelo contrário, uma evolução para a feminilidade (que representa desvio do uso ativo do
pênis) muitas vezes se tenta como tranqüilização contra castração futura possível: “Se
proceder como se já não tivesse pênis, não o cortarão”; ou até: “Se não há meio algum
de evitar a castração, prefiro praticá-la ativamente na previsão a pode acontecer; e, pelo
menos terei a vantagem de ficar nas boas graças de quem me ameaça...”.
A intensidade da “angústia da castração” à valorização intensa do órgão durante a fase
fálica; valoração esta que faz o menino decidir (quando enfrenta a questão: ou renuncio
às minhas funções genitais, ou arrisco o meu pênis) em benefício da desistência da
função. Um adulto perguntará: “Para que serve um órgão, quando me proíbem de usalo?”
No período fálico, contudo os fatores narcisísticos contrabalançam os sexuais, de modo
que a posse do pênis vem a ser o objetivo principal.
Problemas desta ordem resultam de outra característica do estádio oral. Segundo Freud,
o menino desta idade ainda não toma posse de um pênis como questão de determinação
sexual; diferencia não em função de homem e mulher, mas em função de portador de
pênis e castrado. Quando obrigado a aceitar a existência de pessoas sem pênis, fica
presumindo que elas um dia, tiveram o órgão, mas o perderam. Os analistas, que têm
confirmado os achados desta ordem, cogitam que este modo de pensar talvez resulte de
repressão anterior. Talvez que o menino tenha razão mais primária de temer os genitais
femininos do que o medo da castração (angústias orais de uma vagina dentada [Otto
Fenichel-72], significando temor retaliatório de impulsos sádicos-orais); daí tentar negar-
lhes a existência. Recebi um e-mail de um colaborador questionando sobre o “mito da
vagina dentada”, que corrobora com o relatado acima (impulsos sádicos-orais) . O
interessante é que ele relata que há um ano e meio ou dois, vem sonhando que “todos”
os dentes da sua boca caíram, não havia a sensação de dor e que de fato era até
agradável senti-los soltos dentro da sua boca (sonho que pode representar a angústia
de castração). Entretanto para um diagnóstico preciso seria necessária a realização de
uma análise, que eu recomendo. A idéia de que as meninas tiveram um pênis, mas de
que este lhes foi cortado representaria tentativa no sentido desta negação. Certo é que
vem, ao mesmo tempo, a angústia: “Isto pode acontecer também comigo”, com a
vantagem, porém, de que se nega a existência primária dos temidos genitais femininos.
Não se tem a impressão, contudo, de que os meninos se consolem, de qualquer modo,
por saber que certas criaturas tiveram o pênis cortado; pelo contrário, esta idéia afigura-
se muito assustadora. De mais a mais, parece natural que o menino presuma, enquanto
não lhe ensinam o contrário, que todas as pessoas sejam construídas tal qual ele o é, de
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modo que esta presunção não se baseia, necessariamente, no medo; mas, sim, a idéia
de que a presunção é incorreta é que cria o medo.

A INVEJA DO PÊNIS NAS MENINAS.

O clitóris nas meninas, é a parte do aparelho genital que se apresenta mais rica em
sensações e que atrai e descarrega toda excitação sexual; é o ponto central de práticas
masturbatórias tanto quanto de interesse psíquico. Em segundo lugar, significa que
também a menina classifica as pessoas em “fálicas” e “castradas”; ou seja, a menina
tipicamente reage à noção de que existem criaturas com pênis tanto com a atividade
“Gostaria de ter isto” quanto com a idéia “Já tive isto, mas perdi”.
Mulheres portadoras de forte inveja do pênis têm revelado, à análise, haver sofrido “fuga
da feminilidade”, desenvolvendo certo medo da própria feminilidade e, portanto,
construído inveja reativa do pênis.

A análise de neuróticas obsessivas mostra, a princípio, uma quantidade de impulsos


anais e sádicos reprimidos; mais tarde, descobre-se que, em níveis mais profundos,
existem desejos genitais inconscientes, os quais foram rejeitados por uma regressão a
desejos sádicos-anais. Daí não dizermos que a índole reativa dos desejos sádicosanais
contradiz a existência de um período sádico-anal original no desenvolvimento libidinal da
criança, mas que os desejos reativos seguiram vias regressivas. A menina tem o
sentimento de que a posse do pênis traz vantagens erógenas diretas no que diz respeito
à masturbação e à micção. A posse de um pênis, aos olhos da menina, faz o possuidor
mais independente e menos sujeito a frustrações; sentimento talvez resultante da
concentração de todos os sentimentos sexuais no clitóris, durante esta fase, o clitóris
sendo “inferior” em comparação com o pênis.

PERÍODO INTERMEDIÁRIO.

É o período onde a sexualidade infantil atinge o seu ponto culminante, seguida de seu
declínio.

FASE EDIPIANA.
É o estágio que vai por volta do 3º-4º ano até o 6º-7º ano de vida. É também, o mais
importante no desenvolvimento da personalidade. É nele que a criança desenvolve um
grande interesse pelo genitor do sexo oposto e conseqüentemente, um forte sentimento
de rivalidade em relação ao genitor do mesmo sexo, com o desejo de deslocar
este. Durante este tempo, a criança aprende que seus desejos sexuais são proibidos,
apresentando sentimentos de amor e ódio em relação ao genitor do mesmo sexo. Isso
leva a sentimentos de ansiedade e de culpa, bem como de medo, de punição pelo crime.
Freud cedo descobriu em suas pacientes manifestações metódicas inconscientes de
fantasias de incesto com o genitor do sexo oposto, aliadas ao ciúme e à raiva homicida
contra o genitor do mesmo sexo, a que denominou de Complexo de Édipo, por analogia
com a lenda clássica grega do inocente príncipe de Tebas, a quem o oráculo predisse
que assassinaria o seu pai e casaria com sua mãe. Abandonado por seu pai numa
encosta, para morrer de frio e inanição, foi encontrado e educado por forasteiros;
retomando, sem nada saber, cumpre a profecia. Matando o rei, liberta o reino da
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opressão de uma criatura selvagem e terrível, casando a seguir com a rainha, que era a
sua mãe. Por remorso pelo crime, apesar das evidências mostrarem não ter ele
responsabilidade pessoal, arrancou seus próprios olhos e, uma vez mais, vagueia, cego
e exilado, através do mundo. Além de reconhecer que o complexo edipiano é universal,
nossos conhecimentos sobre os desejos edipianos expandiram-se durante as duas
primeiras décadas deste século, abrangendo o que, a princípio, era conhecido como
desejos edipianos inversos ou negativos, isto é, fantasias de incesto com o genitor do
mesmo sexo e desejos homicidas contra o do sexo oposto. Por sua vez, essa
constelação de fantasias e emoções foi, a princípio, considerada excepcional; verificou-
se que, ao contrário, era geral. Quando estava redigindo e copilando esta pesquisa
através de fragmentos de livros e outros trabalhos, resolvi cortar o meu cabelo e de 2
dos meus 3 filhos. A cabeleireira se queixou comigo que a filha dela estava chorando
quando ela saia de casa para trabalhar todos os dias. Ela achava estranha esta atitude,
pois desde os 3 anos ela não chorava, e agora com 7 estava tendo estas “crises”. Ela
estava determinada a levá-la em um psicólogo. Eu expliquei que estava estudando este
assunto e provavelmente ela estava na fase edipiana e buscava uma aproximação dela
por algum problema com o pai. Neste momento ela me revelou que era separada e não
tinha ninguém do sexo masculino próximo que ela pudesse se relacionar.

Essa é, pois, da maneira mais sumária, a explanação completa do que compreendemos


por complexo edipiano. É uma atitude dupla em relação aos dois genitores; de um lado,
o desejo de eliminar o pai odiado de forma ciumenta e até de lhe tomar o lugar em uma
relação sensual com a mãe; de outro lado, o desejo de eliminar a mãe, também odiada
com ciúmes, e de lhe tomar o lugar junto ao pai. O fato isolado mais importante a se ter
em mente a respeito do complexo edipiano é a força e a intensidade dos sentimentos
envolvidos. É um verdadeiro caso de amor. Para muitas pessoas é o caso mais ardoroso
de toda sua vida, mas é de qualquer modo tão ardoroso quanto qualquer outro que o
indivíduo possa vir a experimentar. A intensidade da tempestade de paixões de amor e
ódio (ambigüidade), de desejo e ciúme, de fúria e medo que ruge dentro da criança (veja
o caso Hans de Freud).

A FORMAÇÃO DO SUPEREGO.

O superego corresponde, de modo geral, ao que comumente chamamos de consciência


e compreende as funções morais da personalidade, as quais incluem: -A aprovação ou
desaprovações de ações e desejos baseados na retidão.
-A auto-observação crítica.
-A autopunição
-A exigência de reparação ou arrependimento por haver agido mal
-Auto-elogio ou auto-estima como recompensa por pensamentos e ações virtuosas ou
recomendáveis.
Existem desejos inconscientes em cada indivíduo, que ele conscientemente repudia e
nega, pois existem muitas exigências morais e proibições mais numerosas e rigorosas
em cada um de nós . Logo, as funções do superego atuam no inconsciente.
A intensidade do medo de castração torna-se tão intensa e intolerável, que a criança é
obrigada a render-se ante um rival muito poderoso e a desistir dos seus desejos em
relação ao genitor do sexo oposto, pelo que reprime os seus sentimentos sexuais. Ao
renunciar aos sentimentos agressivos em relação ao genitor do mesmo sexo e sexuais
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em relação ao do sexo oposto, a criança indentifica-se com partes de cada genitor,
tornando-as partes de si mesma, partes essas, que vão formar o Superego da criança.
Com Superego, tem-se que é o que a criança internaliza, tomando de cada genitor, desde
que seja classificado como valor moral e como ideal. Uma porção do Superego será à
parte que estabelece o que seja certo ou errado. A outra parte, que é o chamado Ego-
ideal, é composta pelas características elevadas que todos devem portar, para se
tornarem dignos dos elogios e da aprovação geral. O Superego é, principalmente uma
parte inconsciente da psique.
As exigências e proibições morais de pais, amas, governantas e professores que podem
atuar como substitutos dos pais, começam muito cedo a influenciar a vida mental da
criança. Sua influência torna-se certamente evidente ao fim do primeiro ano de vida. As
exigências morais desse período mais remoto são até simples, se as julgarmos de acordo
com nossos padrões adultos.

Entre as mais importantes incluem-se as que se relacionam aos hábitos de higiene.


Ferenczi referiu-se a esses precursores do superego como “moralidade do esfíncter”. Na
fase pré-edipiana, entretanto, a criança trata as exigências morais que se lhe fazem como
parte do seu ambiente. Se a mãe, ou algum outro árbitro moral, está presente e a criança
deseja agrada-la, evitará a transgressão. Se estiver sozinha, ou zangada com a mãe, ela
a desagradará ou procederá como bem entender, sendo apenas dominada pelo medo
da punição.

No decorrer da própria fase edipiana, as coisas começam a mudar a esse respeito e, por
volta dos cinco ou seis anos, a moralidade passa a ser uma questão íntima. É aí, que a
criança começa a sentir pela primeira vez que os padrões morais e a exigência de que o
mau procedimento deve ser punido, suscitar o arrependimento e corrigido, vêm de dentro
de si própria e não de outra pessoa a quem deve obedecer. Aos nove ou dez anos de
idade, esse processo de internalização se torna bastante estável para ser absolutamente
permanente, mesmo que de maneira normal, ainda esteja sujeito a ampliações e
modificações durante toda a adolescência e, talvez, até certo ponto, na idade
adulta. À medida que abandona e reprime ou de qualquer forma repudia os desejos
incestuosos e homicidas que constituem o complexo edipiano, as relações da criança
com os objetos desses desejos incestuosos e homicidas que constituem o complexo
edipiano, as relações da criança com os objetos desses desejos transformam-se, em
grande parte, em identificações com os mesmos. Em vez de amar e odiar os pais, que
segundo crê, se oporiam a esses desejos e os puniriam, ela se torna igual a eles no
repúdio a seus desejos. Assim o núcleo original das proibições do superego é constituído
pela exigência de que o indivíduo repudie os desejos incestuosos e hostis que
compunham o seu complexo edipiano.Além disso, essa exigência persiste pela vida
afora, de forma inconsciente, é claro, como a essência do superego. O superego,
consiste originalmente nas imagens internalizadas dos aspectos morais dos pais na fase
fálica ou edipiana.O ego é capaz de participar do poder dos pais ao se identificar com
eles, mas, à custa, porém, de uma submissão aos mesmos, mais ou menos
permanentemente. Freud (1923) fez duas outras observações referentes à formação
dessas identificações. A primeira consiste em que a criança suporta as proibições dos
pais, em grande parte, como ordens ou admoestações verbais. A segunda observação
foi que, em grande parte, as imagens dos pais introjetadas para formar o superego são
as dos superegos dos pais. Os pais ao educar os filhos, tendem a discipliná-los tal qual
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o foram por seus próprios pais durante a infância. Suas exigências morais, particulares,
adquiridas na infância, eles as aplicam aos filhos, cujos superegos, em conseqüência,
refletem ou se assemelham aos superegos dos pais. Esta característica tem uma
conseqüência social importante, como Freud (1923) salientou. Acarreta a perpetuação
do código moral de uma sociedade e é, em parte, responsável pelo conservadorismo e
pela relutância em mudar demonstradas pelas estruturas sociais. As catexias
instintivas são afastadas de seus objetos originais, sua procura constante de outro objeto
original leva à formação de uma identificação com o objeto original dentro do próprio ego,
a que, então, se unem as catexias. Assim, o que era catexia do objeto passa a ser catexia
narcísica. No caso que agora nos interessa, naturalmente, as identificações que assim
se formam dentro do ego compreendem a parte determinada do ego que chamamos de
superego. Assim, do ponto de vista do id, o superego é o substituto e o herdeiro das
relações de objeto edipianas. É por esta razão que Freud o descreveu como tendo suas
raízes profundas no id. Os impulsos incestuosos ou homicidas da criança com os pais
são reprimidos e continuam a viver no id como desejos reprimidos, ainda dirigidos para
os objetos originais, porém impedidos de se expressar abertamente em atos ou
pensamentos e fantasias conscientes. No entanto, esses desejos edipianos reprimidos,
com suas catexias, não contribuem para a formação de superego. A intensidade dos
próprios impulsos hostis da criança para com seus pais, durante a fase edipiana, é um
dos fatores principais para determinar a severidade do superego, e não o grau de
hostilidade ou de severidade dos pais em relação à criança, e podemos explicar isto da
seguinte maneira. Quando os objetos edipianos são abandonados e substituídos por
identificações do superego, a energia do impulso, que anteriormente catexizava esses
objetos, fica, pelo menos em parte, à disposição da porção do ego recentemente
estabelecida, e que chamamos de superego. Assim, a energia agressiva à disposição do
superego deriva da energia agressiva das catexias de objeto edipianas, e as duas são
pelo menos proporcionais, senão iguais em quantidade. Isto é quanto maior a quantidade
de energia agressiva das catexias de objeto edipianas, maior a quantidade da mesma
que ficará subseqüentemente à disposição do superego. Como conseqüência , a criança
pequena, cujas fantasias edipianas foram violentas, e destrutivas, terá tendência a sentir
maior sentimento de culpa que outra cujas fantasias tenham sido menos destrutivas.

Uma das maneiras de formular os conflitos do período edipiano consiste em afirmar que
os impulsos do id associados aos objetos daquele período, isto é, os pais, fazem crer à
criança que a estão expondo ao perigo de uma lesão corporal. No caso do menino, o
medo será de perder o pênis, no caso da menina será qualquer coisa análoga ao medo
da lesão genital, ou uma sensação intensamente desagradável de mortificação devida à
falta do pênis, ou ambos. Em qualquer caso, há, de um lado, um conflito entre as
exigências das catexias de objeto, e, de outro, das autocatexias ou catexias narcísicas.
Por ser ilustrativo registraremos que o problema se decide em favor das catexias
narcísicas. As catexias de objeto, perigosas, são reprimidas ou abandonadas, ou são
dominadas ou repudiadas por outros meios, enquanto as catexias narcísicas são
mantidas essencialmente intactas. O componente narcísico da vida instintiva da criança
é normalmente mais forte que a parte que se refere às relações de objeto, embora estas
sejam muito mais fáceis de observar e conseqüentemente mais propícias a ocupar nossa
atenção.
Na formação do superego são estabelecidas modificações, acréscimos e alterações que
resulta de uma identificação com um objeto de ambiente da criança ou do adulto, com o
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aspecto moral desse objeto. Essas identificações são especialmente comuns na pré-
puberdade e na adolescência e modelam o superego do indivíduo, visando à aceitação
dos padrões morais e ideais dos grupos sociais dos quais é membro. Podem até mesmo
ocorrer modificações no superego durante a vida adulta, como acontece, por exemplo,
em conseqüência de uma conversão religiosa. Entretanto, o núcleo original do superego
que se formou durante a fase edipiana continuará a ser sempre a parte mais firme e
efetiva. Por conseguinte, as proibições contra o incesto e o parricídio são as partes da
moralidade da maioria das pessoas mais completamente internalizadas, ou ,
inversamente, as que serão menos provavelmente transgredidas. Outras proibições do
superego são mais passíveis de transgressão, desde que haja uma oportunidade
particularmente favorável, ou uma tentação especialmente forte. O Superego surge em
conseqüência da introjeção das proibições e exortações paternas na fase edipiana e,
pelo resto da vida, sua essência inconsciente continua sendo a proibição dos desejos
sexuais e agressivos do complexo edipiano, apesar dos numerosos acréscimos e
alterações que sofre mais tarde, na infância, na adolescência e mesmo na idade adulta.

A RESOLUÇÃO DO CONFLITO EDIPIANO.

Tanto na resolução do conflito edipiano quanto na formação do Superego, no menino,


dá-se algo como se fora o seguinte quadro: não há como eu ter a minha mãe só para
mim, mas eu posso fazer com que uma parte dela (no caso os ideais, as inclinações, os
critérios de julgamento) se torne parte de mim; assim sendo, eu a possuirei de um modo
seguro. Do meu pai, a quem amo e odeio (e por isso mesmo temo), não posso me livrar,
mas para que ele não mais me venha castrar, eu vou me tornar como ele (adotando
partes dos seus princípios morais e valores) e aí então ele gostará de mim e não será
mais perigoso para mim.

Nas meninas, a atração pelo pai é também denominada de edipiana para nós freudianos
(os junguianos dizem Complexo de Electra). A resolução da situação é muito mais
complexa para a menina do que para o menino, pois este, a despeito de ter de desistir
de sua ligação com a mãe, normalmente, quando maduro, vem a contrair uma ligação
com uma mãe substituta, a esposa. Já a menina, que começa ligada à mãe, sente-se
atraída pelo pai na fase edipiana, odeia a mãe, que ter o pai só para si, mas acaba por
desistir, compensando-se com o propósito de vir a ter um homem seu. Mas acontece que
uma mulher sadia, não é capaz, como o homem, de encontrar substituição para a ligação
infantil, pelo que é levada a compensar-se se propondo ela mesma a vir a ter um filho,
tornar-se mãe e assim realizar uma satisfatória relação mãe-filho.

CASO O CONFLITO EDIPIANO NÃO SEJA SATISFATORIAMENTE RESOLVIDO O


QUE PODE OCORRER:

A excessiva identificação com o genitor do sexo oposto pode estar associada ao


desenvolvimento de características de inversão sexual no menino, ou mesmo nas
meninas.
O medo do genitor do sexo oposto, pode prejudicar a capacidade individual em lidar com
pessoas deste sexo em fase ulterior da vida. Um estágio edipiano parcialmente
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solucionado pode resultar num superego mal formado ou mesmo deficiente, o qual pode
vir a ser determinante de alterações sociopáticas do caráter e das neuroses.

CAUSAS DE UMA SOLUÇÃO NÃO-SATISFATÓRIA DO ESTÁGIO EDIPIANO.


Acesso ao período edipiano com conflitos na fase oral, ou anal, ou fálica, que são do
período pré-edipiano, trazendo para período novo, alguém sem energia suficiente para
enfrentar as novas circunstâncias.

A ausência de um dos genitores (sem, também, haver um substituto à altura), devido a


divórcio ou qualquer outro tipo de separação. Severa psicopatologia da parte de um dos
genitores, dos tipos, por exemplo, ser um deles excessivamente sedutor, ou cruel, ou
ameaçador, ou daqueles que vivem a rejeitar, ou inconsistente, ou inseguro, ou em
constantes transformações, ou frio etc. Severos defeitos no Superego, como um pai
efeminado, poderão vir a ser determinantes de uma confusa identificação com tal genitor
o que pode resultar numa formação superegóica instável, inconsistente e nãorazoável.
Ao fim do período Edipiano, instala-se o princípio do que Freud chamou de fase genital,
em que o interesse primário passa a ser a experiência genital, isto é, a tendência em vir
a unir os órgãos genitais com o sexo oposto: é a atração direcionada à outra pessoa, um
redirecionamento objetal, que significa a ultrapassagem da fase auto-erótica, como até
então o era na última fase, fálica.

FASE DE LATÊNCIA.

Esta é a fase que vai dos 6-12 até os 11-14 anos ou a puberdade. A característica desta
fase é a repressão das fantasias e das atividades sexuais, onde os desejos e impulsos
sexuais são recalcados no inconsciente. As mães costumam relatar que a partir dos 7
anos, as crianças, especialmente os meninos, ficam mais mansinhas. Na verdade o que
ocorre é que as crianças, acessam um período de quiescência sexual. Aqui surgem as
forças anímicas, que posteriormente surgirão como entraves à pulsão sexual, estreitando
seu curso semelhante a um dique (o asco, o sentimento de vergonha, as exigências dos
ideais estéticos e morais). Embora a educação tenha muita a ver com a construção
desses diques, tal desenvolvimento é organicamente condicionado e fixado pela
hereditariedade, podendo produzir-se, no momento oportuno, independente da ajuda da
educação. Esta fica inteiramente dentro do âmbito que lhe compete, ao limitar-se a seguir
o que foi organicamente prefixado e imprimi-lo de maneira um pouco mais polida e
profunda.
Na descrição clássica original de Freud, as manifestações sexuais são quiescentes neste
período; em particular, há uma profunda repressão da masturbação, que permanece a
grande tentação e problema da idade. Foi a preocupação com a masturbação e outras
manifestações libidinais diretas que levou os antigos analistas a negligenciarem este
período embora um fator adicional fosse a virtual ausência de crianças como pacientes.

O período de latência proporciona à criança o equipamento, em termos de


desenvolvimento do ego, que a prepare para o encontro com o incremento de impulsos
da puberdade. Conseqüentemente, ela é capaz de desviar a energia instintiva para
estruturas psíquicas diferenciadas e para atividades psicossociais, em vez de ter de
experimenta-la unicamente como um aumento da tensão sexual e agressiva, a que
podemos denominar sublimação. A primeira parte da latência começa dos 7 aos 8 anos
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aproximadamente. É caracterizada, segundo observações de Freud, pela passagem do
complexo de Édipo e a formação do superego. Aqui há um primeiro caso de amor com
uma criança da mesma idade ou próxima. É bastante intenso enquanto dura, depois é
abandonado, após um intervalo bastante curto. A consolidação do superego e o
fortalecimento dos mecanismos do ego continuam sendo interesses primordiais. A
segunda parte da latência vai dos 8 ao 11-14 anos. Caracteriza-se pela busca de colegas
e a formação de grupos, tanto para meninos quanto para meninas, e por consideráveis
mudanças endocrinológicas.

FASE DE MATURAÇÃO PSICOSSEXUAL OU PUBERDADE.

Este período vai dos 12-15 até os 18 anos. Começa de forma súbita uma atividade
endocrinológica intensa no organismo, que vai resultar numa exacerbação da libido. É a
partir daí que o indivíduo retoma, de forma muita acelerada, as fases do desenvolvimento
sexual, já que vem de sair da quiescência que caracteriza o Período de Latência que, na
realidade, foi uma interrupção do desenvolvimento sexual intenso experimentado durante
os estágios pré-edipiano e edipiano. Observa-se nesta fase uma tendência para uma
reedição dos impulsos orais, anais e fálicos e um misto de interesse sexual e de conflitos
com os pais, como na fase edipiana.

Do ponto de vista sexual, é a época mais importante da vida humana, entre o nascimento
e a morte, é justamente a da maturação sexual, sendo seu momento marcante pela
primeira eliminação de células germinativas: primeira polução entre os garotos, e
primeira ovulação ligada à menarca, entre as garotas. O que se dá, justamente na
puberdade.

A puberdade é uma revolução fisiológica, psíquica e sexual, que se processa de dentro


par fora do organismo. O que vemos aparecer, de repente, como sexualidade
psicológica, não é mais que a manifestação exterior duma atividade maior das glândulas
nos recessos mais íntimos do ser. Os mesmos hormônios sexuais que formam o tipo
sexual conduzem o corpo, a alma e o sexo do estado infantil à maturidade e desta a
velhice, efetuando, dessa maneira, a lenta evolução e involução do organismo. A
puberdade é caracterizada por certos efeitos fisiológicos gerais: crescimento rápido do
corpo e fortificação, principalmente, do esqueleto; aparição de pelos, sobretudo nas
axilas e na região pubiana; e, de um modo geral, modificação da fisiologia e dos hábitos.
Durante a puberdade, o crescimento das garotas se dá mais rápido, que o dos garotos,
ao contrário do que se verifica nos períodos precedente e subseqüente. As jovens de 15
anos são, em geral, maiores e mais pesadas que os rapazes da mesma idade. Em
compensação, seu crescimento pára aos 20 anos, enquanto nos jovens continua até os
23. Paralelamente ao desenvolvimento das diferenças de caracteres sexuais,
provocadas sobre a constituição física e pelo instinto sexual e pela vida psíquica, a
personalidade psicofísica sofre, durante a puberdade, modificações muito importantes.
A consciência do Eu, aumentada ou exagerada, contrasta estranhamente com a
diminuição da resistência física.
As modificações gerais, devidas à puberdade, constam desse conjunto indefinível que
constitui a beleza, que é a estética feminina. Ao nascer, tudo é desproporção e fealdade.
A cabeça é enorme e desproporcionada no que se refere às outras partes do corpo
procuram harmonizar-se, estabelecendo as proporções físicas humanas. A pele da
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mulher, na puberdade, é fina. Pode ter, no momento das regras, uma coloração
ligeiramente azulada, sobretudo nas morenas, mais notável em volta dos olhos, onde
forma um círculo negro escuro.Alguns meses antes das primeiras regras, o púbis se
cobre de pelos, cuja coloração pode ser diferente da do cabelo. Depois do púbis, as
axilas se cobrem por sua vez de pelos; na maioria das ocasiões, já apareceram as regras
quando se manifesta o sistema capilar nessas regiões. Todas as glândulas da pele:
glândulas sebáceas, glândulas sudoríparas, etc., se desenvolvem no momento de chegar
a puberdade, produzindo, as primeiras, uma secreção sebácea, e o odor genital.
Conhecemos o papel que este odor desempenha nos animais, ocasionando a procura
dos sexos, isto é, o prazer sexual. A época da transformação da criança em adolescente,
varia segundo as latitudes.
Pede-se admitir nesse caso, a influência do sol sobre o processo sexual. Nas regiões
polares, a puberdade não se manifesta antes dos 18 anos de idade. Durante a noite
polar, que dura seis meses, as mulheres da Lapônia e da Groelândia não menstruam. Já
nas regiões quentes da África, a puberdade, muitas vezes, tem início aos 8 e aos 10
anos de idade. Não só as condições climáticas, mas as condições particulares de vida e
a própria alimentação, bem como o meio social (informações absorvidas), podem
precipitar ou retardar a puberdade. As primeiras poluções e menstruações manifestam-
se em geral, entre os 12 e 14 anos de idade. Todavia, o limite é muito largo para ambos
os sexos e, dessa forma, não se deve considerar um fenômeno patológico a primeira
eliminação de células germinativas, aos 17 anos. Pode-se denominar precoces os
fenômenos de puberdade antes dos 10 anos, e retardados os que iniciam depois dos 18.

Polução (Emissão involuntária de esperma).

O esperma é um líquido opalino-grisáceo, semitransparente, que contém o produto das


glândulas seminais, isto é o espermatozóide. A composição deste alcalóide consta de
matéria albuminóide, que não contém as relações da albumina nem da fibrina, mas o
esperma-tinas. Esta é solúvel em água, sem que o calor a coagule. O esperma
dessecado, quando em contato com a água, incha novamente. Processo utilizado para
reconhecimento médico legal das manchas encontradas em lençóis, visto que, por esse
processo, pode-se efetuar, no líquido obtido, o exame dos espermatozóides, único meio,
no momento, de esclarecer sua natureza. Por esfriamento podem ser encontrados no
esperma pequenos cristais em forma de prismas, formados sucessivamente pro cristais
de fosfato de magnésio, fosfato de cal e de albumina.

Menstruação ou regras.

É o sangue que as mulheres perdem, a partir da puberdade, que se dá a cada mês lunar,
isto é, de vinte e oito em vinte e oito dias, com maior ou menor abundância, podendo
chegar a trinta dias. Entre os antigos hebreus, as mulheres eram, por lei, consideradas
impuras durante o período menstrual, e tudo que por elas fosse tocado, também. Assim,
elas praticamente ficavam isoladas do grupo por um período de sete dias, retornando a
sua vida normal, após um cerimonial de purificação. Dado estas práticas, ainda hoje
temos pessoas que semelhantemente agem, onde o contato sexual é proibido. Por
outro lado, muitas mulheres se excitam com o odor do sangue, achando o coito nesse
período muito prazeroso. Outras há que se sentem mais a vontade, no ato, visto que o
risco de uma gravidez indesejada é afastado nessa época.
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Atualmente a maioria das mulheres atravessa seus ciclos menstruais de forma quase
imperceptível; realizam suas atividades normalmente. Apenas uma pequena
percentagem, devido à dismenorréia, mastodinia ou cólicas menstruais, não consegue
realizar seus afazeres cotidianos. Porém, por volta do décimo quarto dia do ciclo
menstrual, contado do início da menstruação, é impossível passar despercebido. É o
momento em que a mulher está com sua máxima carga hormonal, e o desejo sexual está
no ar, sentindo intenso desejo de fazer amor, e, na maioria das vezes, não sabe como
comunicar ao parceiro. Então sente-se irritada, mal-humorada, sem saber precisar a
causa. Na ausência de um parceiro fixo, é comum a jovem adolescente relacionar-se
sexualmente com um amigo ou conhecido. E nesse período que a jovem, mesmo
desejando conservar-se virgem, perde a virgindade. É também aí que ocorre a gravidez
indesejada.

FASE ADOLESCÊNCIA FINAL E ADULTO JOVEM.

Neste período, a partir dos 16-18 anos e pelo resto da vida, podem ser observados os
chamados pontos de fixação, que são correspondentes às fases não-solucionada, ou
pelo mesmos não satisfatoriamente solucionada, que determinam a existência de uma
indivíduo adulto, que passa um quadro de imaturidade em algumas áreas do seu caráter,
de sua identificação sexual, de seu equilíbrio afetivo, suas tendências a regredir ante o
stress, sua incapacidade de formar um relacionamento estável, suas eleições sexuais e
pelas evidentes indicações de eclosão de um comportamento neurótico.

SEXUALIDADE DO IDOSO.
O processo do envelhecimento é irreversível e contínuo, seus sintomas são
desenvolvimento e declínio. Tais processos encontram-se ligados ao longo da vida,
tendo em vista que constantemente estão se formando novas células, enquanto outras

são destruídas, algumas são de curta duração, como as que formam as camadas mais
externas da epiderme. Como o envelhecimento é uma realidade, o importante é se
preparar para um envelhecimento com qualidade, ou seja, com saúde mental, física e
emocional e conseqüentemente uma vida sexual saudável. Quanto a sexualidade, o que
mais observamos, é um despreparo psicológico, influenciado pela cultura, cheia de
tabus. Se na adolescência temos muitos preconceitos, imagine na chamada terceira
idade. Não se admite ver uma pessoa idosa namorando, e, na maioria dos casos, os
próprios idosos não aceitam tal idéia. Quantos são, que mesmo aos quarenta se
expressam: “eu já estou velho para isso”. Isto é um absurdo, pois está provado que o ser
humano, tanto o homem quanto a mulher, pode ter uma vida sexual ativa até o fim de
suas vidas.

Unidade

PSICOTERAPIA I 4
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INTRODUÇÃO À PSICOTERAPIA

A psicoterapia é um valioso recurso para lidar com as dificuldades da existência em


todas as formas que o sofrimento humano pode assumir como crises pessoais, conflitos
conjugais e familiares, transtornos psicopatológicas, distúrbios psicossomáticos, crises
existenciais e problemas nas transições entre as fases da vida, etc.
A psicoterapia é também um espaço favorável ao crescimento pessoal, um
lugar/tempo/modo privilegiado de criar intimidade consigo mesmo, de estabelecer
diálogos construtivos e abrir novos canais de comunicação, de transformar padrões
estereotipados de funcionamento, restabelecendo o processo formativo e criativo de
cada um.
A Psicoterapia oferece uma oportunidade de compreender e mudar os padrões de
vinculo e relação interpessoal. Os problemas vinculares são fonte de incontáveis
sofrimentos e muitas doenças.
A Psicoterapia ocupa hoje um lugar fundamental na área da saúde, por trazer uma visão
integrada do homem, considerando as dimensões psíquica, orgânica e social agindo
conjuntamente na produção da existência humana, assim de seus problemas.

Em alguns casos, a Psicoterapia cumpre também uma função de educação para a vida,
oferecendo um espaço privilegiado de reflexão, com instrumentos e conhecimentos que
podem ajudar na orientação e condução da vida. Esta função torna-se fundamental em
situações de desestruturação e crise, quando a pessoa se pode se sentir inapta para
lidar com as dificuldades em sua vida.

OS PRAZOS VARIAM COM OS OBJETIVOS


A psicoterapia é um espaço especial de atenção às dificuldades da vida e aos caminhos
internos para solucioná-los. Todos os últimos avanços na área da Psicologia e
Psicoterapia têm permitido alcançar resultados cada vez maiores e mais significativos.

No geral, os prazos de tratamento são relativos aos objetivos almejados. Há vários


desenvolvimentos recentes em psicoterapias breves, que são focadas em objetivos mais
específicos.
Atualmente é possível atingir resultados significativos em períodos de 3 meses a 12
meses e há muitos processos terapêuticos profundos que se encerram satisfatoriamente
em prazos inferiores a 3 anos.
Há casos que demandam um trabalho terapêutico mais demorado, geralmente com
problemática psicopatológica mais severa, envolvendo traumas precoces,
desorganização psicológica, problemas vinculares sérios, etc. Estes trabalhos podem
demandar anos de trabalho árduo, compensados por ajudas significativas que o trabalho
psicológico pode propiciar.

Algumas pessoas encontram na terapia um lugar fundamental de acompanhamento de


seu processo de vida, onde são trabalhadas transformações mais profundas ao longo
de vários anos. São situações em que o processo terapêutico não tem um prazo
definido e segue em comum acordo entre o profissional e o cliente.
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Apesar de poder parecer, à primeira vista, um tratamento oneroso em termos de tempo
e dinheiro, a psicoterapia tem se mostrado, na realidade, um modo econômico de
tratamento. Pesquisas indicam, por exemplo, que a psicoterapia diminui, por exemplo,
os índices de consumo de medicamentos e de internações hospitalares(1). A
psicoterapia tem se mostrado um tratamento economicamente compensador por
prevenir e tratar problemas psicológicos que, quando não tratados adequadamente,
trazem enormes prejuízos financeiros para as pessoas e até mesmo para o país (2).
A s pessoas obtêm resultados bem significativos com a ajuda psicológica, compensando
totalmente os investimentos realizados. Os tratamentos psicológicos demonstram uma
grande potência de transformação das vidas.

AS VÁRIAS APLICAÇÕES DA PSICOTERAPIA


A psicoterapia é um processo que permite transformações profundas da personalidade,
com resultados evidentes em diversas situações como:

• tratamento de vários transtornos psicológicos como pânico, fobias, depressão,


anorexia, bulimia, frigidez, impotência, etc.
• resolução de conflitos pessoais, interpessoais, conjugais, familiares, profissionais
etc.

• elaboração de crises existenciais, transições difíceis (luto, crises profissionais, etc)


e mudanças de fases de vida (puberdade, adolescência, vida adulta, menopausa,
envelhecimento, etc.)

• desenvolvimento da capacidade de auto-gerenciamento, da capacidade de lidar


com os efeitos do estresse, dialogando com os sentimentos e os desafios e
problemas que a vida apresenta.
• aquisição de auto-conhecimento, aprendizado, reflexão e descoberta de novos
modos pessoais de conduzir a própria vida .

• fortalecimento psicológico para lidar com todos os tipos de doenças.

• amadurecimento pessoal.
Não é possível hoje se falar em "doenças orgânicas" sem uma consideração pela
dimensão psicológica e emocional. É evidente a natureza psicossomática da existência
humana.
Cada ser humano - psicossomático por natureza - vive uma história de interações,
encontros e acontecimentos em que as doenças, quer se manifestem mais no corpo ou
na "mente", resultam dos desequilíbrios existenciais e de soluções inadequadas de vida.
Os aspectos psicológicos participam na formação de muitas doenças e tem um papel
fundamental na recuperação e na capacidade de lidar com situações tidas como
irreversíveis. A psicoterapia oferece recursos importantes para uma compreensão mais
ampla do processo de adoecimento assim como estratégias para uma vida mais íntegra.
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AS ABORDAGESN E TIPOS DE PSICOTERAPIA
Há diversas escolas teóricas na Psicologia, como por exemplo,
psicanálise, fenomenológico-existencial, cognitivo-comportamental etc, com vários
ramos e derivações.
A diversidade decorre tanto da complexidade do tema como da origem da Psicologia a
partir de diferentes tradições epistemológicas oriundas de correntes diversas da Filosofia
e da Medicina.
No geral, as teorias psicológicas apresentam quatro elementos básicos: (1) uma teoria
sobre o que é a mente humana e como ela funciona, (2) uma teoria do desenvolvimento
psicológico, (3) uma teoria psicopatológica e (4) uma teoria do processo terapêutico. As
teorias permitem tanto uma compreensão do humano como o desenvolvimento da
Psicoterapia, a aplicação prática do conhecimento psicológico para transformação da
vida humana e superação do sofrimento.
Há alguns tipos de psicoterapia, conforme as necessidades e a configuração dos
problemas, sendo o s principais:
• Psicoterapia Individual para crianças, adolescentes, adultos e idosos.

• Psicoterapia de Grupo

• Psicoterapia de Casal

• Psicoterapia de Família

• Psicoterapia Institucional
• Atendimento em situações de Emergência e Crise
O VÍNCULO NA PSICOTERAPIA
O ser humano nasce, cresce e vive em ambientes vinculares. Destes ambientes
emocionais depende seu bem estar e suas realizações na vida. Os problemas vinculares
- da primeira infância à terceira idade - afetam profundamente a capacidade que as
pessoas têm de amar, trabalhar e viver. A psicoterapia é um espaço para se esclarecer
e transformar estas dificuldades vinculares. E este processo ocorre através de uma
relação saudável com um profissional eticamente comprometido e tecnicamente
qualificado.
A base de uma boa terapia está na relação terapêutica. A boa terapia se desenrola num
enquadre clínico com um vínculo que favorece este processo. Aí está um dos segredos
desta arte: criar um ambiente que permita a revelação dos mundos internos e favoreça
o desenvolvimento do processo singular de cada um. Neste clima é possível que o ser
mais oculto e amedrontado se mostre, seja ouvido, transforme-se, que o processo
formativo possa prosseguir formando vida.

POR QUE A PSICOTERAPIA FUNCIONA ?


As pesquisas têm demonstrado uma grande eficácia da psicoterapia (3). Mesmo as
recentes tecnologias de mapeamento cerebral têm permitido demonstrar como o
tratamento psicológico age transformando o funcionamento cerebral. A eficácia do
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tratamento psicológico, que já era conhecida há muitos anos, tem sido corroborado
recentemente pelos novos conhecimentos das neurociências (4,5,6).

Pela complexidade do tema existem centenas de livros e pesquisas explorando e


explicando porque a psicoterapia funciona. Mesmo assim, como simples exercício de
compreensão, vamos listar alguns motivos para explicar a efetividade da psicoterapia,
dos mais simples aos mais complexos.

No início da lista, como num continuum , temos aqueles motivos que são comuns a outras
relações de ajuda, mesmo não profissionais, como uma conversa íntima com um amigo,
uma conversa sobre um problema pessoal com um professor, um médico, etc.
Avançando na lista vamos chegando aos motivos que são próprios da psicoterapia, até
aqueles que lhe são exclusivos - possíveis pelo cuidadoso treinamento teórico e técnico
adquirido pelo psicólogo em sua trajetória de formação profissional.
Eis o continuum com alguns motivos pelos quais a psicoterapia funciona:
1 Ao dividir um problema você passa a ter "meio" problema. Compartilhar ajuda a aliviar
a carga emocional e o sofrimento
2 Os vínculos de ajuda têm um poder curativo. É mais fácil superar muitas dores
através de uma relação autêntica de respeito mútuo do que sozinho. A relação
terapêutica é uma relação de ajuda, de compreensão e apoio.
3 A psicoterapia faz você parar para refletir sobre a própria vida. Parar, observar e
refletir permite muitas mudanças de orientação, sentido, rumo e aprofundamento da
experiência de vida.
4 O psicólogo clínico (psicoterapeuta) é um outro, com o olhar e a perspectiva de um
outro, o que lhe ajudará ver a sua vida de um modo diferente, lhe fazer perguntas
diferentes, ajudá-lo a perceber as coisas de um ângulo que você não tinha visto antes e
nem suspeitava ser possível.
5 O psicoterapeuta conhece teorias psicológicas que ajudam na compreensão do que
ocorre com você, auxiliam a identificar o que pode estar errado em sua vida, a direção
que você está seguindo e as mudanças de rumo necessárias. A partir de seu
conhecimento, o psicólogo pode apontar o que olhar, como olhar e o que fazer com o
que se descobre, para que estas descobertas possam ser construtivas em sua vida.
6 O psicoterapeuta conhece métodos de investigação que tornam possível descobrir
aspectos da sua personalidade que seriam inacessíveis a uma observação não treinada.
Há um amplo espectro de técnicas de investigação psicológica que permitem esclarecer
problemas de modo extremamente eficaz.
7 O psicoterapeuta domina técnicas terapêuticas que ajudam a realizar mudanças
profundas na existência.
8 O psicoterapeuta está preparado para compreender você a partir do vínculo que você
estabelece com ele, das respostas emocionais que você suscita nele. Em seu
treinamento ele afinou a si mesmo como instrumento de trabalho para reconhecer
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pequenas nuances do que você mostra na relação com ele (e consequentemente com
os outros) e assim poder compreender seus modos de vinculação e suas dificuldades
em relacionamentos.

9 O psicoterapeuta é capaz de oferecer uma presença autêntica no vínculo com você.


Esta relação funciona como catalisador de processos de mudança necessários em sua
vida, incluindo a superação dos efeitos de traumas de relacionamentos anteriores.

10 O psicoterapeuta passou por todos estes passos anteriores, tendo estado em todos
os papéis, como cliente, como profissional e como observador, o que o habilita a "sentir-
se em casa" em situações difíceis, poder caminhar por terrenos inóspitos, cheios de
sofrimento e problemas emocionais e saber ajudar seu cliente a encontrar um caminho
de melhora.
Certamente esta lista poderia ser estendida, mas pretendemos apenas dar uma idéia ao
público leigo do trabalho da Psicologia Clínica numa linguagem diferente daquela do
universo teórico, técnico e científico habitual na Psicologia.

UM CAMINHO DE MUDANÇA
O processo terapêutico é como atravessar um túnel. Neste túnel você vai rever muitas
cenas da historia da sua vida de um ângulo completamente novo, fazendo conexões
inusitadas entre os eventos e percebendo a potência do passado para moldar quem você
é hoje e a potência do presente para construir novas possibilidades de vida.

Na travessia deste túnel você vai aprender a reconhecer os seus padrões de


comportamento que levam você a se comportar de modo parecido em situações
diferentes, inclusive "repetindo os mesmos erros". Você vai aprender a reconhecer o
"como" do seu comportamento, como você age, como se relaciona, como pensa, como
sente e vai aprender caminhos para poder influenciar e transformar estes padrões.
Esta é uma travessia acompanhada, acompanhada de alguém que pode ajudar você a
se compreender. Alguém que pode te ajudar a transformar o seu jeito de ser, a mudar e
a se conhecer profundamente. É uma travessia que pode mudar completamente a sua
vida.

Psicologia Formativa de Stanley Keleman

A relação entre anatomia e subjetividade é um tema básico da Psicologia Formativa de


Stanley Keleman. Este autor estuda as formas somáticas, que são as constantes
transformações morfológicas e anatômicas do corpo que se produzem ao longo da
existência acompanhado pelas transformações psicológicas. Na concepção kelemaniana
a vida é um processo constante de construção de formas somáticas, desde o processo
embriológico na formação do ser humano até o final da vida. Essas transformações não
são guiadas apenas por um programa já dado geneticamente, mas as formas somáticas
refletem a própria produção da existência, com todos os seus acontecimentos, encontros
e relacionamentos.
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"O estudo da forma humana revela sua história genética e emocional. A forma reflete a
natureza dos desafios individuais e como eles afetam o organismo humano....a postura
ereta é acompanhada de uma história emocional de vínculos parentais e separações,
proximidade e distanciamento, aceitação e rejeição. Uma pessoa pode incorporar a
densidade compacta que reflete desafio ou um peito murcho que expressa vergonha. A
anatomia humana é, assim, mais do que uma configuração bioquímica; é uma morfologia
emocional. Formas anatômicas produzem um conjunto correspondente de sentimentos
humanos". (Keleman, 1992 p.72)

Keleman deixa de lado os modelos clássicos do aparelho psíquico e parte em busca da


experiência encarnada, o corpo sendo criado e criando existência, sendo produzido e se
produzindo e o psiquismo como uma parte deste processo somático-existencial.

Na visão kelemaniana, o psiquismo é uma função do corpo, o corpo sente, o corpo pensa,
o corpo imagina, o corpo sonha. Nesta concepção, a anatomia e o psiquismo estão
absolutamente enredados. Keleman propõe uma anatomia emocional, cognitiva,
existencial. O psiquismo está estruturado a partir da organização morfológica do corpo
todo e não apenas restrito ao cérebro ou a algum espírito imaterial.
Os estados subjetivos - sentimentos, pensamentos, estados de consciência - são estados
do corpo. Como diz Keleman: "todas as sensações, todas as emoções, todos os
pensamentos são, de fato, padrões organizados de movimento".(Keleman, 1995, p
17).
O corpo cria imagens e símbolos de si e do mundo e assim se torna capaz de dialogar
consigo mesmo e com os outros. Estas imagens são geradas no córtex cerebral a partir
de um diálogo das diferentes camadas somáticas.
O diálogo do corpo consigo mesmo permite ativar um processo de auto-gerenciamento,
onde é possível identificar, compreender e modular as formas somáticas, dialogando com
os efeitos somáticos das experiências vividas, num modo de participar ativamente da
construção da própria existência.
Keleman propõe a Metodologia dos Cinco Passos, processo onde pretende-se
influenciar as atitudes, comportamentos e estados internos através da ação modulatória
sobre a organização das formas somáticas. Este trabalho está focado na identificação
do "como" um determinado comportamento é organizado somaticamente.

Ajuda-se o cliente primeiro a identificar o que ele faz, qual a imagem da situação (passo
1), depois a identificar como ele faz isto através de suas organizações somáticas,
intensificando volitivamente com a ajuda da musculatura estriada, discriminando os
afetos, estados cognitivos e esboços motores de ação organizados (passo 2). Depois
começa-se a desintensificar e desorganizar as formas previamente intensificadas (passo
3) e a observar e receber de volta os efeitos desta desorganização - imagens,
sentimentos, lembranças, etc. (passo 4). A partir daí podese reconhecer as formas que
emergem como diferenciações sobre as formas anteriores (passo 5) ou então retorna-se
aos padrões anteriores.
Através deste método de trabalho, atuando diretamente sobre as formas somáticas -
organizadoras da experiência subjetiva - procura-se reorganizar comportamentos,
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atitudes e modos de ser e ensinar uma participação volitiva do sujeito em seu processo
de vida, pelo aprendizado das regras da produção somática de existência.

A clínica formativa realiza uma cartografia das formas somáticas de uma pessoa para
compreender e atuar sobre:
• Os efeitos dos acontecimentos no sujeito.
• Os modos habituais de lidar com estes efeitos e a cristalização somática da
história de vida em formas estereotipadas, em modos fixos de lidar com as
situações, em atitudes padrões.

• O estabelecimento de um autodiálogo construtivo, de uma participação volitiva


para o restabelecimento do processo formativo.
A partir do reconhecimento de como a pessoa está organizando somaticamente a sua
experiência, ela poderá aprender a desorganizar e reorganizar estes modos. Fazer mais
e fazer menos constituem um caminho para desorganizar padrões de ação
estereotipados, abrindo a possibilidade para a emergência de sensações, sentimentos e
novos padrões de ação. A pessoa pode então investir volitivamente neste
processo, reconhecendo padrões, desorganizando formas e investindo em formas
somáticas emergentes, na intenção de criar e estabilizar novos padrões de ação.
No processo clínico formativo, assim como no trabalho diário de cada um consigo
mesmo, opera-se um manejo constante com as formas somáticas utilizando-se a
Metodologia dos Cinco Passos.
Cada configuração de forma somática está relacionada a diferentes experiências
subjetivas. O pensamento formativo oferece uma importante ferramenta para podermos
participar ativamente deste processo, dialogando com os efeitos das experiências em
nossos corpos, influindo em nossos comportamentos, aprendendo a navegar no devir.

Bibliografia
Scarpato, A (2005). Introdução à Psicologia Formativa de Stanley Keleman, Revista
Psicologia Brasil, ano 3 n 27, p 30-31. Disponível
em: http://www.psicoterapia.psc.br/scarpato/t_intro.html
1- Gabbard, G O; Lazar, S G; Hornberger J; Spiegel D. (1997). Economic Impact of
Psychotherapy: A Review. The American Journal of Psychiatry, vol 154:2 p147-155
2 - Hanns, L A (2004) Regulamentação em Debate. Psicologia: Ciência e Profissão -
Diálogos, ano 1, vol 1, p 6-13

3 Gabbard, A. (2001) Empirical Evidence and Psychotherapy: A Growing Scientific


Base. The American Journal of Psychiatry, Volume 158(1), 1-3)

4 Siegel, Daniel (2001) The Developing Mind: How Relationships and the Brain Interact
to Shape Who We Are,New York, The Guilford Press
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5 Cozolino, Louis (2002) The Neuroscience of Psychotherapy: Building and Rebuilding
the Human Brain, New York, W W Norton

6 Cozolino, Louis (2006) The Neuroscience of Human Relationships: Attachment and the
Developing Social Brain, New York, W W Norton

• Keleman, Stanley. Anatomia Emocional, Summus, São Paulo, 1992


• Keleman, S. Corporificando a Experiência, Summus, São Paulo, 1995 •

Keleman, S. Amor e Vínculos, Summus, São Paulo, 1996

Unidade

PSICOTERAPIA II 5
Psicoterapia se refere a diversas técnicas empregadas em Psicologia para o tratamento
de transtornos e problemas psíquicos.

Características do atendimento
O atendimento pode ser realizado através de diferentes métodos, sendo características
comuns o emprego da comunicação verbal e não-verbal e a atenção à relação entre
cliente-paciente e psicoterapeuta.
Estas formas de atendimento são atualmente utilizadas no tratamento de dificuldades
emocionais, problemas de relacionamento e transtornos mentais como pânico,
ansiedade, anorexia e depressão.
As sessões podem ser realizadas individualmente (psicoterapia individual), em grupos
(psicoterapia de grupo), com casais (psicoterapia de casal) e em família (psicoterapia
familiar).

Linhas de psicoterapia
Há várias linhas de psicoterapia dentre as quais estão:
• Parapsicoterapia,

• Psicanálise,

• Terapia cognitivo-comportamental,

• Abordagem Centrada na Pessoa,

• Behaviorismo,
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• Gestaltoterapia,

• Psicodrama,

• Psicoterapia analítica,

• Daseinsanalyse,

• Psicoterapia Familiar

• Psicoterapia Corporal

• Psicoterapia Positiva

• Logoterapia

Transferência Somática:
A dinâmica formativa do vínculo terapêutico

Na terapia nos movemos entre sensações, emoções, posturas, palavras, imagens, etc.
Neste campo compomos cartografias junto com o cliente, tentativas de dar voz aos
afetos, dar novas formas ao mundo, falar dos temores secretos, dos desejos, das dores
profundas, de explorar caminhos.
Criamos na terapia um espaço de intimidade, intimidade não no sentido de contato com
o conhecido, familiar, mas um espaço singular de abertura protegida pelo vínculo,
onde podemos deixar vir o desconhecido em nós, o estranho, o novo.
O vínculo propicia um ambiente favorável para enfrentar as muitas adversidades, para
suportar níveis altos de angústia e falta de sentido. O vínculo é um dos elementos básicos
do processo terapêutico.
O vínculo terapêutico é também um campo de experimentação de modos novos de
vinculação, de diferenciações em relação aos padrões conhecidos e de confrontação
com os modos habituais.

Cartografar o território clínico nos permite encontrar algumas coordenadas para navegar
com mais segurança em direção a processos mais consistentes de vida. A função deste
texto é explorar este território a partir da influência do pensamento formativo de Stanley
Keleman. Problematizar alguns aspectos da dinâmica somática do vínculo terapêutico,
notadamente a instrumentalização das formas somáticas do terapeuta como recurso
clínico.
IDENTIFICAÇÃO, COMPLEMENTARIDADE E ALTERIDADE
Podemos observar quatro modos de percepção dos afetos da relação terapêutica que
indicam os diferentes lugares ocupados pelos membros neste espaço dinâmico.

Vamos falar mais especificamente destes lugares a partir da perspectiva do terapeuta.


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1 - Eu sou o outro:
Os sentimentos do cliente podem ser percebidos pelo terapeuta em si mesmo, num
fenômeno de identificação.

Uma forma de compreender o cliente é saber se colocar em seu lugar. Sair de nossa
posição de outro e compartilhar o olhar, ir junto. Buscar sentir o que o cliente sente,
pensar o que ele pensa, desejar e temer como ele. Assim, antes que ele fale algo, você
já sentiu, numa identificação de formas somáticas e experiências. Sentir o que o cliente
sente nos permitir compartilhar a sua dor e compreender o seu mundo. Muitas vezes já
estamos nesta sintonia e só então nos percebemos nela a partir da dinâmica vincular.
Em outros momentos podemos imitar o cliente, buscando nos aproximar de sua vivência,
repetindo voluntariamente posturas e formas somáticas, num modo ativo e rico de
colocar-se em seu lugar e compreender o seu mundo.
O cliente pode também fazer o terapeuta se sentir como ele. Assim, por exemplo, um
cliente está falando de situações onde se sentiu sem espaço, invadido, e ao mesmo
tempo fala ininterruptamente, não deixando muito espaço para o terapeuta intervir,
limitando o espaço do terapeuta na sessão. O cliente faz, de algum modo, com que o
terapeuta se sinta sem espaço na sessão, invadido, como ele se sente.
2 - Eu para o outro:
O terapeuta pode ocupar um lugar de complementaridade aos afetos do cliente,
ocupando um lugar em sua dinâmica (do cliente).

Podemos perceber o modo do cliente em relação a nós e observar a nossa tendência de


resposta de complementar o seu funcionamento.
Esta é uma experiência de complementaridade, matriz de aspectos importantes da
dinâmica transferencial e que será mais desenvolvido adiante no texto.

3 - O outro para mim:


O terapeuta pode perceber o que a situação despertou em si de conteúdos pessoais (do
terapeuta), com o cliente ocupando um lugar na dinâmica do terapeuta.

O cliente pode ser o nosso outro. Podemos nos perceber paralisados, por exemplo, e
explorando isto vemos o cliente ocupando um lugar em nosso teatro de dores pessoais.
Explorando as nossas reações, nossos esboços de respostas frente a ele, podemos
aprender sobre nós mesmos. E podemos compreender o cliente a partir da nossa dor, o
que pode nos permitir estar com ele de um outro modo. É a contraparte da
complementaridade, agora a partir do processo formativo do terapeuta.
4 - Eu e o outro:
O cliente é vivido como o outro, dois mundos diferentes.

Percebendo o cliente “de fora” podemos apreender este “outro singular” por observações,
descrições, um olhar mais diferenciado sobre a pessoa à nossa frente. Na experiência
da alteridade nos aproximamos do limite de apreensão do que é um definitivamente
outro. Neste momento podem surgir experiências de estranhamento, susto, distância,
respeito e o início de um diálogo sujeito a sujeito, não mais sujeito - objeto.
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Há assim um trânsito onde o terapeuta pode se sentir sendo o próprio cliente, sentir-se
e ser o outro do cliente na relação, sentir que o cliente seja o outro de si ou ainda viver a
experiência da alteridade.
O vínculo terapêutico ocorre dentro de um continuum que vai da identificação à
alteridade.

Transitamos entre estes diferentes lugares na terapia: sentir junto, ocupar lugares
complementares, diferenciar-se destes lugares, viver a alteridade. Qualquer uma destas
posições esclarece elementos importantes do vínculo terapêutico. A sua discriminação e
operacionalização é um dos recursos preciosos da terapia.
Em cada um destes modos de relação estamos envolvidos e organizados somaticamente
de um modo diferente, o que implica em níveis diferentes de vínculo e diferentes
qualidades de presença.

O CORPO A CORPO DO VÍNCULO


A relação terapêutica é uma interação corpo a corpo. No sentido de que o cliente
organiza um corpo frente ao terapeuta e este por sua vez responde com outro corpo.
As posturas, tensões e modulações das formas somáticas explicitam a distribuição da
excitação emocional nos corpos que estão em relação naquele momento, naquele campo
de afetos. Há um diálogo somático anterior ao diálogo verbal.

Um corpo ativa algo em outro corpo, um corpo convoca o outro corpo a interagir de um
determinado modo, e este por sua vez responde a partir da sua realidade somática, das
suas camadas somáticas mais ativas, seu repertório de formas, suas experiências.
Os corpos dialogam numa linguagem que lhes é própria, uma linguagem de formas
somáticas, camadas embriológicas, tônus de tecidos, toda uma fisicalidade básica e
constitutiva da vida afetiva.

Numa determinada situação, por exemplo, o terapeuta pode sentir seu corpo se
arredondando, seus braços se ampliando como se fossem pegar o cliente no colo, e
observa neste momento que o cliente está organizado numa forma somática onde se faz
pequeno, evocando no terapeuta esta forma cuidadora. Em outra situação, por exemplo,
o terapeuta sente seu corpo contraído, diminuído, inseguro e percebe que esta sensação
advém de uma atitude do cliente, que está com seu corpo inflado e com olhar e atitude
de intimidação.

As formas somáticas e a excitação emocional do terapeuta explicitam o seu lugar no


campo da relação, os modos de relação daquele cliente com o mundo e daquele
terapeuta com aquele cliente.

Esta experiência se torna bastante acessível quando o terapeuta experimenta o recurso


de posturar volitivamente os efeitos do encontro sobre si, dando mais nitidez às
afetações e às atitudes organizadas no vínculo.
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Com este recurso é possível acompanhar o diálogo infraverbal das formas somáticas,
ajudando a explicitar os afetos, a dinâmica, a criar um mapa do território que permite
voltar a ele, orientar-se e influenciar os processos.

Assim, trazemos para o plano visível, consciente, o que se passa num plano de
sensações, afetos, fluxos e nuances. Neste campo, o terapeuta usa seu próprio corpo
como referencial de orientação em relação ao que ocorre na terapia e na relação com o
cliente. O corpo do terapeuta pode ser visto como um dos palcos onde se
desenvolve a sessão.
Daí a importância fundamental de uma boa discriminação do próprio corpo - sensações,
propriocepções, afetos - para o terapeuta navegar bem no universo da sessão.
O terapeuta é um intérprete de si mesmo, dos efeitos daquele encontro em sua
subjetividade corporificada.
Quanto maior a capacidade do terapeuta em se permitir ser perpassado por fluxos
afetivos na relação terapêutica, maiores as possibilidades de desdobramentos do
universo existencial dos clientes na terapia.
Há uma certa dança, um diálogo de corpos durante a sessão terapêutica e podemos
pensar como podemos acompanhar esta dança, aprender esta linguagem dançante,
interativa e formativa e poder instrumentalizar esta dimensão do vínculo como um
recurso para a clínica.

TRANSFERÊNCIA, PASSADO E FUTURO


Transferência e contratransferência são fenômenos do vínculo que fazem um grande
sentido a partir do diálogo das formas somáticas.
A transferência é uma experiência de complementaridade na relação terapêutica. É um
fenômeno de vinculação onde o modo de ser de alguém chama o co-participante a
ocupar um lugar complementar numa certa dinâmica.
Há um campo emocional criando os lugares a partir do encontro.
Assim, por exemplo, um cliente pode evocar um pai no terapeuta. Os comportamentos,
modo de falar e se mover do cliente evocam no corpo do terapeuta um modo paternal. O
terapeuta começa a se perceber com sentimentos e esboços motores de atitudes
paternais.

Por um lado, isto poderia dizer do passado daquele cliente, da reativação de sua relação
com o seu pai. A transferência, neste sentido, poderia ser pensada como uma
transposição de processos relacionais passados, uma transferência de tempo e lugar
dos personagens de um drama.
Porém, mais do que isto, a transferência contém a história presentificada, ela é a
reativação recorrente de modos e formas somáticas que se construíram a partir da
relação com um pai.
Mais do que chamar o pai, o que se ativa é a memória somática de um modo de
existência, ou seja, uma forma somática.
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Esta forma somática, este modo de existência, se criou a partir das experiências com um
pai, determinando um modo de ser com uma certa configuração somática. No vínculo
com o terapeuta aparece a história que se presentifica nas formas somáticas.

O que se repete é uma dinâmica vincular, um modo de existência, um repertório


determinado de formas somáticas, muitas vezes fixados e paralisados pelas experiência
que a pessoa não pôde assimilar em sua vida. Estas formas somáticas cristalizadas
interrompem o processo formativo e levam uma pessoa a responder às situações
diversas com um repertório limitado de comportamentos, com modos reiterantes de
sentir, pensar, perceber e agir.
A repetição destes modos somático-existenciais na terapia, por outro lado, abre a
possibilidade de confronto, consciência e diferenciações dentro do processo de vida.
Permite a desorganização de comportamentos limitantes e a emergência de novas
formas somáticas a partir do vínculo terapêutico. Uma oportunidade de sair de um
labirinto armado no passado, que paralisa o andamento do futuro.
AS VERTENTES DE FUTURO
O vínculo contém também uma função formativa, de gestação de novos territórios
existenciais.
Um cliente, por exemplo, suscita no terapeuta coisas próximas do lugar de um irmão mais
velho, mais formado, que possa ajudá-lo a entrar na vida adulta com mais recursos.

Cabe ao terapeuta poder ocupar este lugar neste campo de gestação de um modo de
existência, permitindo a passagem de um momento ao outro do processo formativo do
cliente, assim como cabe, ir desocupando este lugar em outro momento, quando este
modo já não favorece mais o processo do cliente.

No vínculo terapêutico o terapeuta vai ocupar diferentes lugares para o cliente, de acordo
com o que esteja em evidência no processo formativo do cliente naquele momento.
A partir da percepção dos afetos, atitudes e lugares da relação, o terapeuta pode
reconhecer os tipos de vínculo que o cliente estabelece, o que ele formativamente está
precisando.

O vínculo tem assim uma função formativa, de ajudar na desconstrução de formas


desatualizadas e na construção de formas corporais contemporâneas.
No processo vincular há uma necessidade daquele lugar do outro, daquele
funcionamento do outro para que o processo do cliente possa ser gestado e maturar.
Acompanhar ao longo da terapia o processo vincular fornece uma referência importante
das várias fases do processo terapêutico e do processo de vida do cliente.
O vínculo terapêutico é um laboratório onde novas formas podem emergir, diferenciações
dos padrões habituais de comportamento, um lugar de experimentação e maturação
vincular.
O vínculo, portanto, pode tanto apresentar uma reedição de uma dinâmica relacional
cristalizada quanto criar uma dinâmica necessária naquele momento da vida da pessoa.
O vínculo é assim tanto uma derivação do passado quanto uma vertente de futuro.
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Este processo é movido pelo impulso formativo, a força de criação de novas formas em
direção à atualização do passado e à composição do futuro.
O CAMPO GESTATIVO VINCULAR
Trabalhando com o cliente, podemos ir aprendendo sobre o seu funcionamento, seu
modo de ser habitual e o quanto isto restringe a sua vida. Observamos suas modalidades
de relacionamento com o mundo, seu lugar na teia de relações pessoais, seus modos de
dar e receber, mandar e obedecer, pedir e tomar, agir e esperar, etc. Podemos ajudar a
esclarecer estes modos e estar juntos para ampliar os seus limites e criar novos
caminhos de vida.

É necessário discriminar as sutilezas do vínculo, as variações que permitem identificar


que um cliente está buscando aceitação, outro orientação, outro confronto e outro ainda,
testando confiança. A cada momento do vínculo há questões diferentes sendo
maturadas.
O terapeuta ocupa um lugar no mundo do cliente e este ocupa um lugar no mundo do
terapeuta. Há um encontro do processo formativo do cliente com o processo formativo
do terapeuta, criando um processo formativo daquele vínculo, numa inter-relação
naquele espaço clínico.
Um elemento singular do espaço terapêutico é que o terapeuta está lá para favorecer o
processo formativo do cliente, para instrumentalizar o vínculo como recurso de
compreensão e intervenção na terapia.

A RESPOSTA TERAPÊUTICA
Muitas vezes um cliente não percebe os tipos de vínculo que estabelece e que
contribuem, por exemplo, para que várias coisas em sua vida acabem dando errado.

Por exemplo, uma cliente veio para primeira entrevista contando histórias de rejeição, de
não ser aceita pela família, de ser abandonada pelos amigos, etc. Ao longo da entrevista,
ela foi provocando uma sensação muito ruim ao terapeuta, fazendo com que este
sentisse vontade de mandá-la embora. Aquela pessoa estava repetindo com o terapeuta,
já na primeira entrevista, uma dinâmica que ela repetiu muitas vezes em sua vida e da
qual não conseguiu se diferenciar. Ela estava levando o terapeuta a querer rejeitá-la
também. Caso o terapeuta fosse apenas re-agir ao seu sentimento, a teria mandado
embora, dando qualquer desculpa de que não poderia atendê-la e repetindo o que
acontecia no cotidiano daquela mulher. Ela sairia do consultório com as suas crenças
confirmadas, seu sofrimento aumentado, seu comportamento reeditado.
Porém o terapeuta não está na situação numa posição ingênua, apenas interagindo com
o cliente, mas numa posição de observação e explicitação do que está acontecendo,
atento aos fenômenos em si próprio e no cliente, neste campo que vai se formando.

Percebendo em seu corpo as tendências à ação, porém retardando a re-ação


automática, o terapeuta pode discriminar o que o move e o que sente e assim esclarecer
o funcionamento daquele cliente: em que posição o coloca, se coloca, que afetos
circulam, etc.
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O que caracteriza a resposta terapêutica é a capacidade do terapeuta em conter a sua
reação, discriminar o que sente e eventualmente apontar para o cliente a sua atitude.
Devolver para o cliente a percepção sobre a dinâmica do vínculo, como no caso desta
mulher, abriria uma porta para ela perceber seus modos frente ao mundo, iniciar
diferenciações frente ao seu próprio funcionamento, trazendo de volta para si o que ela
só via projetado nos outros, etc.

Quando um cliente pode discriminar como vê o terapeuta, que lugar este está ocupando
naquele momento para o cliente, ele está abrindo um espaço para aprofundar a auto-
percepção e dialogar com suas formas, percepções e afetos.
O auto-diálogo é um dos elementos centrais do processo terapêutico formativo, onde a
pessoa vai se tornando capaz de identificar as próprias formas somáticas e suas relações
com a sua experiência subjetiva. A partir daí ela pode aprender modos de interagir
consigo mesma e influenciar os seus processos internos, trabalhando com as próprias
formas, dando início a um processo de participação ativa na construção de sua
existência.

COMUNICAÇÃO DE CAMPO
Algumas vezes na terapia corre-se o risco do cliente ser atravessado por um excesso de
excitação e insights que não são produtivos porque ultrapassam a capacidade
elaborativa da pessoa naquele momento.
Por exemplo, em certa sessão em que caminhavam em terreno novo na terapia, o
terapeuta sentiu uma certa pressão que forçava as suas costas contra a sua poltrona, na
altura do diafragma. Acentuando voluntariamente esta pressão, percebeu organizando-
se nele uma forma somática de contenção que enrijecia as suas costas e lhe dizia algo
como: “pare aí, não vá mais, deixe ele elaborar o que já tem, vá devagar.” Enfim, estava
sendo dito ao terapeuta o limite da capacidade de assimilação daquele cliente naquela
sessão, o que pôde ser confirmado ao devolver ao cliente algumas observações sobre
como estava vivendo aquele momento.
Este é um exemplo de comunicação de campo, onde o terapeuta e o cliente trocam
mensagens não verbais que atingem um ao outro em sua corporeidade e se afetam
mutuamente.
Em muitos momentos na terapia não é possível falar em “minhas sensações”, mas
apenas de “sensações em mim”. Os afetos, sensações e modulações da forma são
elementos do campo, do entre, e só é possível entendê-los a partir daquele campo
formativo e seus processos.
O campo da relação terapêutica é extremamente rico de afetos e sentidos, de elementos
visíveis e invisíveis. A relação terapêutica é atravessada por afetos de diversas ordens,
o que faz do espaço terapêutico, o espaço do sentir por natureza. O acolhimento do sentir
é uma das marcas maiores deste espaço, onde podemos receber em nós mesmos as
sensações e sentimentos mais obscuros, sutis, indiretos e aceitar a vida em nós e em
relação a nós.
Espaço do sentir ilimitado mas do agir cuidadoso. Esta singularidade permite uma grande
exploração de muitas vertentes do existir lideradas por um compromisso ético de ajuda.
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Os afetos e sensações vividos pelo terapeuta na sessão podem ser grandes orientadores
sobre a dinâmica do cliente. Assim, se um terapeuta está se sentindo desconfortável na
sessão, ausente, com sono, etc., deve perceber o que aquela reação diz daquele cliente
naquele momento da sessão e de sua terapia, ao invés de logo pensar que a questão é
sua, pessoal do terapeuta, que não dormiu direito, comeu algo que não lhe fez bem, etc.
Não que estes fatos não participem da sessão, determinando em parte a qualidade de
presença do terapeuta, mas focar logo sobre estes eventos externos à sessão pode
desviar o terapeuta de algo muito importante que está se desenrolando naquele
momento.

Numa determinada sessão, por exemplo, um cliente falava de sua inquietação pelo
"momento agitado" que vivia em seu trabalho. Seu modo de falar, no entanto, não
expressava muito de agitação, aliás, era de um tom mais contido do que agitado. Ao
longo da sessão, o terapeuta foi sentindo um certo cansaço. Para o terapeuta, este
cansaço começou a representar idéias como: “estou cansado de ter atendido muito ao
longo deste dia, estou trabalhando muito, etc.”. O terapeuta estava vendo neste cansaço
algo em si próprio e isto o deixava mais distante do cliente, um pouco ausente da sessão
e tomado pelo “seu” cansaço. Até que o terapeuta ponderou se este cansaço também
teria algo a ver com aquele cliente. Ao sugerir ao cliente algo relacionado a cansaço, este
começou a falar de desânimo, e veio à tona uma situação de depressão que já tinha
alguns anos e que não tinha surgido ainda naquele início de terapia. Essa depressão
mascarada mostrou-se depois como uma das questões centrais da terapia daquele
cliente. Assim, mesmo sensações do terapeuta que podem parecer simples, como uma
cansaço, precisam ser observadas em suas possíveis relações com o estado do cliente
e do vínculo deste com o terapeuta.

AS FORMAS SOMÁTICAS SÃO TERRITÓRIOS EXISTENCIAIS


Podemos apreender a dinâmica da sessão estando atentos aos efeitos em nosso corpo
daquilo que está ocorrendo.

Segundo Nina Bull, toda ação é precedida por uma pré-organização motora preparatória.
Esta pré-organização, que Keleman denomina de forma somática, permite os arranjos
somáticos necessários para a construção de todo comportamento.

As formas somáticas organizam a presença, a resposta às afetações e as ações


subsequentes. Por exemplo, quando o terapeuta tem a forma de seu corpo se
arredondando frente a presença do cliente, organizando em seu corpo uma atitude
acolhedora, esta forma estaria preparando um comportamento de acolhimento, com suas
respectivas falas, gestos, sentimentos, assim como determinando a sua percepção sobre
aquele cliente.

Porém, se o terapeuta retarda esta reação automática de acolhimento, observando em


seu corpo os estados produzidos pela forma, pode discriminar as atitudes organizadas,
os afetos presentes e compreender a dinâmica do vínculo, antes de agir e falar. Assim
ele desautomatiza o processo para operacionalizá-lo terapeuticamente.
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As formas somáticas ocorrem antes da percepção consciente, pois primeiro
respondemos internamente e então nos damos conta destes efeitos se processando em
nós.

Quando uma forma somática não se realiza imediatamente em ação, possibilita a


emergência da auto-percepção mais discriminada. Daí a importância de se inibir e
retardar voluntariamente a ação para clarear os afetos e os sentidos da experiência.
As formas somáticas são organizações motoras que criam os "modos de lidar" com os
acontecimentos, são territórios existenciais organizados somaticamente. As formas
somáticas são a própria construção dos territórios existenciais.
Algumas formas somáticas vão se estabilizando com o passar do tempo, criando alguns
padrões motores que expressam os "modos de ser" mais característicos de cada um.
Estas "formas duradouras" também nascem, fenecem e se transformam para dar conta
de experiências em diferentes fases de vida.

Os territórios existenciais tem linhas de tempo próprias, no sentido de que há formas


mais duradouras e formas mais efêmeras. As formas somáticas se complexificam e se
diferenciam a partir dos desafios dos encontros.

Certas formas somáticas podem se paralisar e perpetuar pela experiência do excessivo.


As experiências excessivas ultrapassam a capacidade "de lidar" de um território
existencial e levam à cristalização de formas somáticas, criando modos mais
estereotipados de comportamento, produzindo estagnações no processo formativo de
criação contínua de formas somáticas.
Estes estados de paralisia são os estados recorrentes na clínica em busca de recuperar
o processo formativo de diferenciação, desterritorialização e reterritorialização contínuos
e necessários.
O olhar para o processo formativo explicita quais formas somáticas estão se criando
neste momento da vida do cliente, quais formas não dão mais conta dos acontecimentos,
que conflitos de formas e estratégias de vida estão presentes e quais experiências
excessivas paralisaram o processo de vida e estão impedindo a criação de novas formas
e respostas frente às novas situações.
DESAFIOS FORMATIVOS AO TERAPEUTA
Cada terapeuta vive a situação de atendimento a partir de sua realidade formativa, do
seu repertório de formas somáticas, dos seus modos de lidar com as situações e
vínculos. Um terapeuta vai sempre encontrar alguns modos mais característicos do seu
jeito de estar com seus clientes, sempre haverá aquelas atitudes mais "naturais" para
aquele terapeuta, a partir de seu corpo, suas formas e sua história.
Cartografar seus modos de clinicar, suas posturas corporais que se repetem nas
sessões, pode ser um recurso valioso para um terapeuta acompanhar e poder influir em
seus corpos de terapeuta.
Na relação com o cliente, o terapeuta também cresce. O terapeuta é solicitado a se deixar
ser afetado pelo cliente, para poder levá-lo por caminhos novos, ajudá-lo a crescer, a
aceitar novas afetações e buscar novas experiências.
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Lidar com estas experiências do cliente traz também desafios à forma do terapeuta. Ele
precisa caminhar para que o cliente caminhe. Por isto alguns processos terapêuticos
paralisam num ponto em que o terapeuta também paralisou.

O corpo do terapeuta se coloca na terapia com suas preferências, seus modos


dominantes, seus limites de tolerância, seu momento formativo.
Assim um terapeuta de algum modo também escolhe seus clientes. Isto vai poder
explicar por exemplo, porque um terapeuta em diferentes momentos de sua clínica se dá
conta que tem um número X de clientes com uma mesma temática tal e alguns anos
depois, por exemplo, tem um número Y de clientes com outra temática predominante.
Estas são temáticas do processo pessoal do terapeuta, vividas e elaboradas no processo
clínico com os seus clientes. O terapeuta também chama clientes com tal e tal perfil. São
estes clientes que são mandados pelo "acaso". Entre outras questões envolvidas, são
estes clientes que ficam a partir das entrevistas iniciais. A terapia é um desafio também
ao processo formativo do terapeuta.

CONCLUSÃO
Atender em psicoterapia é encontrar um modo de estar ao lado do cliente, buscar uma
compreensão de seu universo, esclarecer o seu mundo, as suas dificuldades, reconhecer
com ele os modos habituais, as estratégias conhecidas, cartografar o processo formativo,
o que não dá mais conta dos acontecimentos, o que está em vias de surgir, as transições
em andamento e ajudá-lo a buscar novos modos de viver, criando novas experiências,
gerenciando formas, matrizes de novos comportamentos.
As formas somáticas são relacionais. A forma de cada um vai construindo o outro e neste
processo vai surgindo um diálogo de formas somáticas. Trabalhamos discriminando e
atuando sobre estes processos.
Toda forma somática é vincular, toda forma somática pressupõe um outro complementar.
Sendo assim, querendo ou não, percebendo ou não, o terapeuta é sempre chamado
a uma presença somática em relação às formas do cliente.
Atentar para os efeitos da presença somática do cliente em seu corpo, permite ao
terapeuta, entre outras coisas:

- Reconhecer o sentido da experiência interna do cliente pelo efeito deste na


organização somática do terapeuta.

- Reconhecer o tipo de vínculo que está se estabelecendo naquele momento do


processo terapêutico e o sentido formativo deste vínculo.

O terapeuta aprende a conter os afetos da relação para devolver de forma mais


organizada para o cliente.
Este é um processo de instrumentalização da relação terapêutica.

A relação terapêutica é uma interação de afetação contínua, onde cliente e terapeuta


estão se afetando mutuamente. O terapeuta pode reconhecer os efeitos deste campo de
afetação em seu corpo e assim cartografar os processos em andamento e
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operacionalizar o que percebe dentro do processo formativo e clínico no espaço
privilegiado da terapia.
A terapia é uma incubadora de processos formativos.

BIBLIOGRAFIA.
Artigo publicado pela Revista Hermes do
Instituto Sedes Sapientiae, São Paulo, número 6, 2001, p 107-123. Artur
Thiago Scarpato.

• Bull, Nina, The Attitude Theory of Emotion, Johnson Corp., New York, 1968
• Keleman, Stanley. Anatomia Emocional, Summus, São Paulo, 1992
• Keleman, S. Corporificando a Experiência, Summus, São Paulo, 1995
• Keleman, S. Amor e Vínculos, Summus, São Paulo, 1996 (p. 123)
• (pág 123)Keleman, S. Mito e Corpo, Summus, São Paulo, 2001

• Rolnik, Suely, Cartografia Sentimental, Estação Liberdade, São Paulo, 1989


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Unidade

CLÍNICA INFANTIL I 6
Psicanálise Infantil I

• Histórico

Até o século XVII, as crianças eram criadas pela amas de leite, e por volta dos sete anos
de idade, já eram consideradas adultas. Essa visão começa a mudar a partir dos
filósofos, médicos e educadores. Os psicólogos começaram a estudar os processos
mentais das crianças de uma forma diferenciada dos adultos.

No final do século XVII, segundo Jonh Locke, a criança era vista como uma tabula rasa,
totalmente passiva ao ambiente, ia se construindo e se desenvolvendo através.

Segundo a visão de Jacques Rousseau, a criança não é passiva ao ambiente, esta já


teria conceitos morais inatos, na busca de uma maior adaptação. Através da curiosidade,
a criança vai buscar o que quer em termos de modelos, a função do adulto aqui, seria a
de orientá-la. Estabelece a necessidade da relação mãe x bebê, através da necessidade,
por exemplo, da amamentação. Preocupação com os índices de mortalidade infantil.

Darwin publicou um livro que influenciou a teoria de Freud no aspecto evolucionista, a


partir disso, os cientistas começaram a sistematizar seus estudos.

Freud (1905 - século XX) escreve os “Três Ensaios da Sexualidade Infantil”, mesmo
tendo seu trabalho voltado para adultos, dava importância as primeiras fases da vida de
seus pacientes. Dá subsídios para outras pessoas pensarem o trabalho com crianças,
embora não tenha desenvolvido uma técnica (caso Hans). Deixou porém, grandes
contribuições com seu pensamento entre elas estão:

Vai falar do brincar, em seu texto: “Além do Princípio do Prazer”, quando fala no jogo do
forte da criança por meio da imitação. Mostra a importância do brincar na elaboração dos
conflitos, concebe a atividade lúdica como uma forma de elaboração.

Outra postulação importante: a relação parental como base para a relação do futuro
adulto.

No jogo do forte da criança por meio da imitação, vai se colocar no papel ativo ou se
experenciar de forma passiva. Possibilidade de simbolização da relação com a mãe, a
fim de elaborar a separação desta.

Pulsão de vida e pulsão de morte, a criança na relação com a mãe experimenta: pulsão
de morte, na ausência da mãe e a pulsão de vida, na medida em que esta propicia a
sobrevivência, ambas caminham juntas.
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• Complexo de Édipo – outro conceito de grande importância para a psicoterapia


infantil. A angústia do nascimento; primeira separação da mãe, primeiro contato
externo, mesmo que não se tenha acesso, essas marcas ficam no sujeito.

Depois de Freud, começou a se tentar uma técnica específica para se tratar crianças.

• Hug Hellnuth (França) – trabalhava no hospital e recebeu uma criança muda, que
não tinha nenhuma justificativa orgânica. Começou a trabalhar com desenhos e a
interpretar psicanaliticamente, a partir de então, a criança começou a falar.

• Madeleine Rampert (Suíça) – desenvolveu um trabalho com marionetes,


geralmente, usava figuras que se relacionavam com as crianças, ou seja, que tinham
participação na vida da criança: o pai, a mãe, as tias, os avós...
• Anna Freud – para ela o analista tem um papel de educador, a criança precisava
perceber a aprovação dos pais e reprovação do terapeuta dentro de um caráter
pedagógico. A criança, segundo ela não transfere, por estar vivendo todas as
experiências com os pais. Trabalha com sonhos e desenhos, não valoriza o brincar,
a brincadeira é apenas uma forma estática.

• Melaine Klein (Escola Inglesa) – apresenta divergências em termos teóricos. Toda


a sua técnica é criada em cima do brincar, sendo esta a única forma de expressão
do conflito. Trabalha com agressividade.

• Freud – para Freud, o sujeito é resultado na defesa contra a pulsão, enquanto para
a Melaine Klein, o conflito é originado na agressividade da criança, gerando a
dissociação da parte boa e má, que leva ao conflito. Associa a agressividade à pulsão
de morte (como algo agressivo, destrutivo). Distorção da pulsão de morte de Freud.

• Donald Winnicott: Médico, Pediatra, Psicanalista – inúmeros escritos; trabalha


com objeto transicional, foi aluno e supervisionando de Melanie Klein.

• Arminda Aberastury (Argentina): trabalhava com “Psicanálise da Criança” –


seguidora de Melanie Klein.

• Virgínia Axline: Ludoterapia; Terapia não diretiva – impulso para o crescimento;


brincar livremente. Infância: Processo evolutivo através da socialização, Infância. Do
nascimento até relativa independência. Término da infância: Depende de cada
criança, da família, dos aspectos físicos, do ambiente social, cultural, econômico, etc.
Infância: Processo evolutivo.

• Piaget – operações intelectuais;

• Spitz – relações Mãe x Filho


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As adaptações que foram feitas para o atendimento de crianças começaram pela técnica:
desenhos, comunicação pré-verbal e com isso, precisava modificar também o
consultório, a fim de facilitar o trabalho com crianças.

Toda a estrutura montada no consultório deve ser capaz de fazer com que a criança
perceba o que ela vai fazer ali, sem que necessite ser dito, o terapeuta deve se abster
em dar limites neste sentido, para que a criança trabalhe.

Por exemplo: forrar o divã para que a criança possa pular, usar móveis pequenos, para
que tenha acesso aos materiais e caso tenha tapetes, forrá-lo.

• Pulsão

Freud tem muito a nos dizer quando o assunto é a formação dos sujeitos, por isso mesmo
não tendo direcionado sua teoria para o tratamento com crianças pode-se entender o
funcionamento geral do psiquismo humano. Uma das contribuições importantes refere-
se à distinção de instinto e pulsão (trieb – termo alemão). Segundo ele, no animal
podemos observar o instinto, uma vez que este é a resposta a um estímulo determinado,
baseado numa necessidade fisiológica e que leva a um fim também determinado, onde
encontra satisfação. Refere-se a um comportamento animal fixado pela hereditariedade,
característico da espécie.

Exemplo: fome – buscar comida – satisfação.

A pulsão é a tradução, a representação do que aparece no corpo como necessidade, só


que neste lugar temos desejo. Não precisa de estímulo, uma vez em que é uma pressão
interna e constante. Podemos pensá-la como uma carga energética em movimento, que
advém do próprio organismo, sem necessitar de um estímulo externo para que o
desperte e da qual não podemos fugir. Sendo assim, podemos conceber a pulsão como
o limite entre o físico (soma) e o psíquico (mente), a fronteira entre o que ele teria sido –
animal, instinto, necessidade e o que ele se torna – humano, pulsão, desejo, realização.

Em suma: a pulsão não precisa de estímulo, não tem resposta determinada e a resposta
não vai levar a um fim e sim, ao reinício.

Exemplo: A 1ª mamada, a criança vai buscar sempre este prazer perdido, não se satisfaz
nunca, apenas se realiza.

Enquanto que a pulsão tem origem somática e vai buscar a satisfação (busca de um
prazer), o instinto, seria a saciação de uma necessidade fisiológica.

Para Freud, o prazer está associado ao sexual (sentido amplo) e não ao genital. A criança
começa nesta busca de objetos para a satisfação da pulsão muito cedo, o nome dado ao
investimento nos objetos é denominado de libidinal. É o que Freud vai chamar de fase
perversa polimorfa, ou seja, a criança inicialmente retira prazer do próprio corpo,
enquanto nos adultos, observa-se à prioridade as determinadas zonas do corpo, embora
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ainda conserve algo desta fase, retirando prazer também de outras áreas. Podemos
afirmar que o corpo da criança é todo erótico, neste sentido.

• Inauguração da Pulsão

O bebê humano é o único animal que necessita de um outro para sobreviver, alguém que
invista nele e lhe dê afeto. É o outro (mãe ou quem exerce está função) que vai apontá-
lo como ser humano, independente do tipo de afeto vai dizer quem ele é.

Na verdade, todos somos tomados pela pulsão. Antes de o bebê existir, já está ligado ao
outro, ou seja, é objeto do outro, que vai “utilizá-lo” de acordo com suas necessidades
pulsionais. Porém, o bebê necessita do investimento de alguém para a satisfação das
suas necessidades, vai sofrer então a ação do outro, e é num órgão – a boca, que o outro
vai passar a princípio o seu desejo; dado leite, mais alguma coisa: no olhar, no afeto, etc.
E este outro, por sua vez vai passar a pulsão à diante, com isso, o sujeito sofre uma
ruptura e por estar submetido ao outro vai conhecer o desprazer.

Neste momento, inaugura-se a pulsão, instala-se a falta, marcada a princípio no corpo e


depois, no psiquismo.

• Essa pulsão de ter filhos como realização do desejo, já existe antes mesmo da
concepção. A criança só vem ao mundo porque falta algo no outro, ou seja, aquilo
que é desejado não é natural, natural é aquilo que nos falta. Então, podemos pensar
quando uma criança nos chega ao consultório a que demanda dos pais ela está
respondendo.

INFLUÊNCIAS PRÉ-NATAIS NO DESENVOLVIMENTO

1.1 Influências pré e perinatais no desenvolvimento

É de fundamental importância para o psicanalista ter noções de como ocorre o processo


de fecundação e crescimento da criança no útero materno porque muitos problemas do
comportamento, deformidades físicas e distúrbios de personalidade têm origem nesta
fase. Não faremos uma revisão completa destes aspectos, pois inúmeros autores já a
fizeram, quer de forma breve, quer de forma exaustiva. Citaremos alguns deles apenas
a título introdutório, pois a própria crendice popular tem mostrado ao longo da história
que os mistérios da vida intra-uterina e as formas pelas quais o ambiente pode influenciar
esses processos despertam o interesse de todos.

Antes do advento da embriologia, acreditava-se que qualquer evento influenciando a mãe


durante a gravidez afetaria o feto, como, por exemplo, se uma futura mãe fosse
assustada por um cão, a criança poderia desenvolver uma fobia por este animal; se
desejasse algum tipo de alimento e não o obtivesse, a criança poderia ter aspecto deste
alimento; que não se pode recusar qualquer tipo de alimento oferecido por uma gestante,
etc. Estas crenças derivavam de uma suposta conexão neural entre o sistema nervoso
da mãe e o do filho e da transmissão direta de emoções, desejos, angústias, etc., o que
obviamente não tem sentido devido às grandes diferenças de maturidade do sistema
nervoso central de um adulto (mãe) e daquele que ainda está se formando no feto.
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Atualmente, sabe-se que grande número de substâncias passam através da placenta da


mãe para o feto. Alterações na fisiologia da mãe produzem mudanças no feto embora
isto ocorra por um mecanismo muito mais complexo do que fazem supor as crendices
populares. Estudos neste sentido começaram com a constatação de que deformidades
nas crianças deviam-se a vírus (como o da rubéola ou da sífilis); venenos, radiações,
substâncias químicas (como drogas ou antibióticos) e ausência ou excesso de vitaminas
levavam à cegueira, má-formação craniana, ausência de membros, debilidade mental,
desordens do sistema nervosos central e outras deformidades grosseiras.

Do ponto de vista emocional, Sontag (1941) sugeriu que substâncias químicas que
aparecem no sangue materno durante o stress emocional se transmitem ao feto, gerando
neste efeitos adversos. Por exemplo, constatou que os movimentos fetais aumentam por
várias horas e assim crianças nascidas de mães com stress emocional prolongado
poderiam apresentar alto nível de atividade após o nascimento.

Em outro capítulo ter-se-á uma visão mais atualizada e mais complexa das influências
dos estados emocionais da mãe durante a gestação.

Lembraremos no momento outros tipos de fator:

1) Idade da mãe. Algumas deformidades ocorrem com mais freqüência em mães muito
jovens (menos de 20 anos – aparelho reprodutor ainda em formação) ou mais idosos
(mais de 35 anos). Exemplo: Mongolismo.

2) Drogas. Quando ingeridas no estágio de formação podem provocar deformações


físicas e mentais diferentes, conforme a quantidade ingerida e a etapa da gravidez.
Como por exemplo, podemos citas as anfetaminas, os sedativos, cocaína, etc. Na
década de 60 muitas gestantes, em vários países do mundo, ingeriram uma droga –
Talidomida (sedativo) – no início da gestação e seus bebês nasceram com vários tipos
de deformação.

Atualmente, existem estudos mostrando que o próprio cigarro e as bebidas alcoólicas


não devem ser utilizados em excesso durante a gestação sob risco de provocarem
anormalidades, embora menores. As próprias drogas anestésicas utilizadas durante o
processo de parto estão sendo questionadas no sentido de provocarem uma certa
letargia, uma menor capacidade de resposta aos estímulos.

3) Radiações. Raio X em excesso podem provocar deformações no cérebro. Quanto às


radiações atômicas, é bastante conhecido o fato de que, além da destruição causada
pelas bombas atômicas em Hiroshima durante a 2ª Guerra Mundial, as crianças
nascidas de mulheres que se encontravam gestantes naquela ocasião apresentaram
vários tipos de anomalia.

4) Doenças infecciosas. Sífilis, rubéola e caxumba podem produzir abortos (fetos de má-
formação, eliminados espontaneamente pelo organismo) ou anormalidades físicas
(cegueira, surdez, deformidades nos membros) ou mentais.
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5) Fator Rh. Quando houver incompatibilidade entre os tipos sanguíneos da mãe e do


feto, podem ocorrer abortos, natimortos, morte logo após o nascimento, ou mesmo
paralisias parciais ou deficiências mentais. Felizmente estes problemas já são
bastante conhecidos na clínica médica, facilitando medidas profiláticas. Existem,
entretanto, outras incompatibilidades sangüíneas (como o caso: mãe O e feto B) que
podem produzir substâncias tóxicas no organismo (no caso, altas taxas de bilirrubina)
e que estão ainda em fase inicial de estudos.

6) Dieta. Está atualmente comprovado que uma dieta pobre predispõe a maiores
complicações durante a gestação e o parto, prematuridades, maior vulnerabilidade do
bebê a certas doenças e mesmo atraso no desenvolvimento físico e mental. Daí a
prioridade que o governo brasileiro vem dando ao atendimento materno, infantil.
Embora ainda precário, esse atendimento ou está desaconselhando as chamadas
gestações de alto risco, ou, quando ocorrem, procurando oferecer atendimento
médico e complementação alimentar.

Tão grave é este problema na nossa população carente que o próprio jornal O Estado de
São Paulo, numa série de reportagens publicadas no final do ano de 1980, mostra que
uma alta porcentagem das crianças de determinadas regiões da Grande São Paulo
apresenta déficit tanto no crescimento físico quanto no intelectual, havendo uma média
de 2 anos de retardamento no seu desenvolvimento. Esta defasagem é atribuída à má
qualidade de vida e principalmente à alimentação inadequada e insuficiente da gestante,
do bebê e da criança pré-escolar. Como solução para minorar ou pelos menos impedir
que esta situação se agrave, sugere-se a orientação para um planejamento familiar mais
adequado, bem como uma melhoria nas condições de alimentação e saúde no início da
vida. Diga-se de passagem que, além das deficiências nutritivas, estas crianças vivem
num ambiente sem estimulação adequada para o desenvolvimento intelectual.
Pesquisas realizadas na Inglaterra mostraram que crianças, filhas de pais carentes e de
Q.I. rebaixado, quando submetidas à estimulação adequada instituições nas quais
passavam parte do tempo, tiveram desenvolvimento superior àquelas de um grupo de
controle sem manipulação. Além do período que as crianças passavam na instituição, o
programa previa atendimento e orientação às mães no sentido de autovalorização,
melhoria em suas condições de trabalho e de relacionamento com as crianças.
Completando ainda a experiência, as moças adolescentes desta comunidade eram
treinadas no cuidado com bebês e crianças préescolares no sentido profilático, isto é,
para quando fossem mães.

Muitas instituições comunitárias e religiosas têm prestado algum tipo de assistência a


mães e famílias carentes em nosso meio, embora não contem, geralmente, com os
mesmos recursos que tinham estes pesquisadores ingleses.

Por esta breve exposição de alguns dos muitos fatores que podem predispor a diversos
tipos de distúrbios durante a gestação, conclui-se pela importância da orientação médica
durante a gestação ou mesmo do aconselhamento genético quando um dos membros
do casal é portador de qualquer característica que possa afetar negativamente o feto; ou
ainda quando, embora pai e mãe sejam sadios, possa existir algum tipo de
incompatibilidade capaz de prejudicar o feto. O conselheiro geneticista faz um estudo do
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casal e orienta no sentido da desejabilidade ou não da procriação. Embora recente, no
Brasil este tipo de atividade existe nos grandes centros urbanos, ligados geralmente a
escolas superiores de medicina e genética.

Além dos fatores já enumerados que prejudicam o feto de forma grosseira, existem outros
que, embora de maneira mais sutil, prejudicam o desenvolvimento e o bem-estar
psicológico (e social, em última análise) tanto da mãe quanto do bebê. Quero me referir
ao processo de parto tal qual vem sendo comumente realizado em nossa sociedade.

Vejamos como ocorre. Durante a gravidez da mulher, ávida de atenções especiais que a
ajudem a ajustar-se ao novo papel de mãe, recebe assistência obstétrica de forma
mecânica e impessoal. É recebida por um médico atarefado que a examina e receita
vitaminas ou outros medicamentos necessários. Suas emoções, medos, ansiedades,
alegrias e expectativas não são considerados.

O parto é realizado num ambiente hospitalar que, se traz benefícios à saúde pela sua
assepsia, pode produzir efeitos emocionais danosos, os quais podemos denominar
“esterilização emocional”. Analisemos a situação pari passu. A mulher parturiente,
sofrendo as dores das contrações e as angústias de um momento desconhecido e
crucial, é recebida fria e rotineiramente por pessoas estranhas. É conduzida de uma sala
para outra, sem participar de qualquer decisão, tomada em nome de princípios
obstétricos que não lhe são transmitidos.

A indução do parto por drogas e o rompimento artificial das membranas feito por
conveniência (para acelerar o processo) produzem aumento das contrações uterinas (e
portanto das dores da mãe) e menor fluxo sanguíneo para o cérebro do bebê, o que pode
causar anormalidades neurológicas, cardíacas, disfunção cerebral mínima, etc., além da
necessidade de se administrar analgésicos e sedativos para aliviar as dores maternas.
Estas drogas concentram-se na circulação fetal e no sistema nervoso central, o que pode
levar a comportamento menos responsivo após o nascimento, menor sucção, problemas
de respiração e disfunção cerebral mínima. Este estado da criança e a sonolência da
mãe após o parto (decorrente das drogas) levam a alterações nas respostas maternas
e, dependendo do par mãe-criança do grau e da duração, podem levar a conseqüências
mais duradouras e imprevisíveis.

A posição da mulher deitada e amarrada torna o parto menos confortável, impede a mãe
de participar no sentido de procurar a posição mais confortável; interfere e inibe o
comportamento materno natural, o que pode também influenciar no estabelecimento da
interação com seu bebê.

O corte que se faz na mulher durante o parto causa desconforto durante a amamentação,
afeta o relacionamento sexual (e portanto conjugal) após o parto, dificultando ao casal a
elaboração da nova situação familiar.

Vejamos agora o que ocorre ao bebê. Os cuidados pós-parto são executados de maneira
mecânica, rapidamente, num ambiente tumultuado e de muita luz. As luzes fortes sobre
os olhos do bebê podem prejudicar o comportamento de olhar mútuo que ocorre entre a
mãe e a criança durante a amamentação.
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O parto cesariano, realizado incontáveis vezes sem indicação obstétrica, com anestesia
geral, pode levar a sentimento de incerteza em relação ao bebê (será mesmo seu filho?),
sentimento de falha como mulher, além das dores e da separação subseqüente.

A etiologia, a partir de estudos com animais e posteriormente da observação de bebês


humanos, constatou que os primeiros dias e semanas após o nascimento constituem um
período fundamental para o estabelecimento de uma ligação afetiva sadia entre a mãe e
o seu bebê. As primeiras horas e dias se constituiriam no denominado período de
reconhecimento, quando os dois membros da díade estariam explorando um ao outro,
conhecendo-se. Daí a importância fundamental de um parto num ambiente de maior
afetividade e de um contato contínuo com o bebê nas primeiras horas. Caberia ao
pessoal hospitalar um auxílio no sentido de ajudar a cuidar do bebê, pois que, ainda
dentro dos princípios etnológicos, qualquer mãe, (humana ou animal - está apta a cuidar
de seu filho desde que possa dar livre vazão às suas emoções). É como se as mulheres
fossem programadas geneticamente para cuidar de seus filhos e estes nascessem com
aspecto e comportamentos capazes de eliciar nelas o chamado comportamento materno.
Assim, numa posição naturalista, basta que mãe e filho sejam deixados juntos, num
ambiente adequado para que desenvolvam o attachment ou ligação afetiva. Inclusive, há
quem ache que, quando o pai ou outras pessoas da família assistem ao parto, além de
oferecerem segurança emocional para a mãe, estariam se ligando afetivamente ao bebê.

Quanto ao bebê, constatou-se que crianças nascidas em casa e cuidadas, desde o início,
pelas próprias mães, estabelecem um biorritmo próprio em poucos dias. Ao contrário,
nas enfermarias demoram dez dias, além de apresentarem maior dificuldade de
alimentação e mais choro.

Conclui-se, portanto, que este período pós-parto é muito delicado tanto para a mãe
quanto para o bebê, podendo determinar a qualidade da ligação afetiva que se irá
estabelecer entre os membros da díade criança-mãe.

O tratamento mecânico dispensado à mulher, que exige dela passividade, ausência de


informações e pouco contato com o bebê, pode gerar sentimentos de culpa e frustrações
que, quando prolongados, provocam depressão pós-parto, cujos reflexos podem durar
muitos anos. Ela pode sentir-se privada de suas funções femininas, coagida e
manipulada, embora do ponto de vista obstétrico o parto tenha sido um sucesso.

Sugere-se então que a assistência dada à gestante, à parturiente e à nutriz seja feita de
maneira mais calorosa, mais humana, que inclua a participação do mario e dos outros
filhos (quando houver), no sentido de promover uma interação familiar sadia.

DESENVOLVIMENTO EMOCIONAL E SOCIAL NA PRIMEIRA INFÂNCIA

2.1 Desenvolvimento físico na infância

O conhecimento, em profundidade, do desenvolvimento físico na infância, não é tão


importante para o psicanalista. Este deverá, entretanto, ter noções básicas do tamanho,
peso, capacidades sensoriais e motoras de cada faixa etária. Isto porque obviamente o
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comportamento será sempre decorrente das capacidades desenvolvidas pelo
organismo, principalmente nos primeiros anos de vida, quando a criança não terá ainda
pensamento conceitual, mas será dotada de uma inteligência sensorial-motora. Assim,
na infância inicial (0-18 meses) o próprio desenvolvimento intelectual estará diretamente
ligado à maturação do sistema nervoso central, à capacidade de receber e apreender
impressões sensoriais, de executar movimentos, etc.

Nesse sentido, podemos afirmar que o desenvolvimento físico é altamente dependente


da maturação, embora possa ser influenciado positiva ou negativamente por fatores
ambientais.

Por maturação queremos nos referir às forças biológicas geneticamente programadas


que direcionam o crescimento em tamanho, a emergência e o controle de movimentos,
a integração das impressões sensoriais, a possibilidade de sentar, andar, controlar os
esfíncteres, segurar um lápis, executar corretamente os movimentos da escrita, falar,
andar de bicicleta, etc., e que aparecem na mesma seqüência para todos os indivíduos
da espécie.

Houve durante muitos anos uma controvérsia na psicologia a respeito de


comportamentos inatos ou aprendidos, da atuação predominante da hereditariedade ou
do meio ambiente na determinação de comportamentos emergentes na infância e
mesmo na idade adulta. Esta discussão se mostrou estéril, persistindo hoje um ponto de
vista interacionista, ou seja, tanto hereditariedade como meio direcionam o
desenvolvimento. Vejamos um exemplo. O desenvolvimento físico é fortemente
dependente do código genético. A criança ao nascer traz uma tendência para ser alta ou
baixa, gorda ou magra. Estas potencialidades serão atualizadas ou não em função do
tipo de alimentação oferecido à criança, da prática de exercícios físicos e de esportes,
da ocorrência ou não de certas doenças, etc. Mas, se o ambiente for favorável, a criança
com tendência para alta estatura irá desenvolvê-la.

Já no caso de outras capacidades, como por exemplo, a linguagem, o processo é mais


complicado. A linguagem depende também da maturação biológica, pois não há
processo de estimulação ambiental que faça um bebê de 6 meses falar. Mas se uma
criança tiver maturação biológica e não receber estimulação ambiental (cognitiva, afetiva
e social), poderá apresentar retardamento na aquisição da linguagem ou vários tipos de
perturbação, como gagueiras, dislalias, etc.

Assim sendo, é preciso ficar claro que o desenvolvimento físico e motor na primeira
infância é altamente dependente da maturação biológica, mas é também suscetível à
atuação ambiental. Lembramos também que exporemos apenas alguns dados
fundamentais a respeito destes aspectos do desenvolvimento, pois uma descrição mais
detalhada foge aos objetivos deste trabalho e pode ser encontrada na bibliografia
pertinente.

O bebê que tem sido, tradicionalmente, visto como sujeito passivo, dependente,
apresenta já ao nascer diversas características físicas e comportamentais que
direcionam a atividade de outras pessoas. A sua aparência e fragilidade têm o poder de
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elicidar nos adultos comportamentos que o protegem. Assim sendo, as posições mais
recentes dentro da Psicologia do Desenvolvimento têm considerado o bebê como sujeito
ativo desde o nascimento. A chegada de um bebê vai exigir uma adaptação em termos
emocionais e comportamentais de todos os elementos da família e esta adaptação
ocorrerá em função de características de personalidade dos adultos ou de outras
crianças da família, mas também daquelas já presentes no bebê. Sabe-se que certas
características como maior ou menor nível de atividade (dimensão da personalidade
denominada temperamento por alguns autores), ritmo de sono, alimentação, etc., estão
presentes logo após o nascimento apresentando variações individuais.

Exemplificando, alguns bebês dormem muito e choram pouco (o que é bastante


freqüente nas meninas), enquanto outros dormem menos e choram mais
(principalmente os meninos).
Obviamente será mais fácil para uma mãe, notadamente a primípara, adaptar-se uma
criança tranqüila. Aquele bebê que chora muito, solicita excessivamente a presença da
mãe, impedindo-a de dormir, realizar trabalhos domésticos ou outras atividades; pode,
em alguns casos, levar a mãe (e o pai) à exaustão, resultando daí, um sentimento
consciente ou inconsciente de rejeição – e culpa (Bell,1974). Ora, já vimos que as
primeiras semanas de vida são fundamentais no estabelecimento da ligação afetiva mãe-
criança. Se a criança é particularmente difícil (como no caso de um excesso de choro e
de solicitação) este vinculo poderá ter aspectos negativos. É importante considerar que
a qualidade do vínculo mãe-criança não depende apenas de características de
personalidade da mãe, mas também daquelas trazidas pelo bebê já ao nascer, e da
interação destes fatos. Explicando melhor podemos verificar que determinadas
características de uma criança se tornam difíceis para uma mulher, mas não o são para
outra, como por exemplo o sexo da criança. Parece comprovado que os bebês
masculinos, embora mais desejados pelos pais antes do nascimento, são geralmente
mais ativos e mais exigentes do que os bebês femininos (geralmente mais dóceis). Mas,
nem todas as mulheres experimentam dificuldades para cuidar de seus bebês
masculinos, e parece, inclusive, segundo dados experimentais (Moss, 1967), que estes
são mais beijados e acariciados por suas mães do que os bebês femininos.

Esta questão da interação mãe-criança é sem dúvida bastante complexa e será tratada
mais detalhadamente nos demais capítulos. Queremos lembrar apenas que no caso de
crianças que apresentam deformidades físicas ou mentais já nos primeiros meses de
vida, o estabelecimento do vínculo mãe-criança torna-se particularmente difícil para mãe.
(Isto será facilmente entendido se considerarmos todas as fantasias presentes durante
a gestação e o parto).

Concluindo, lembramos mais uma vez que todos as aspectos do desenvolvimento são
interligados e interdependentes e que a divisão por aspectos (físico, emocional, social,
intelectual) é meramente didática.

2.1.1. Equipamento Inicial

Existem grandes variações no tamanho e no peso dos bebês, bem como no seu ritmo de
crescimento. Pesam ao nascer, em média, entre 3 kg e 3500 kg, e têm aproximadamente,
50 cm de altura, sendo os bebês masculinos ligeiramente maiores e mais pesados do
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que os femininos. Os recém-nascidos de mães carentes do ponto de vista nutritivo
podem apresentar pesos mais baixos.

O crescimento em altura e peso é rápido e intenso (desde que haja uma alimentação
adequada), podendo atingir ao final do 1º ano de vida 70 cm de comprimento e 9 kg de
peso. Ocorrem, nesta fase, grandes modificações nas proporções do corpo (a cabeça do
recém-nascido tem ¼ do tamanho total do corpo, enquanto no adulto esta proporção é
de1/10; suas pernas são curtas em relação ao tamanho do tronco e por isso se
desenvolvem mais rapidamente), na estrutura neural e muscular.

Ao nascer, a criança é dotada praticamente de todos os sentidos e “está biologicamente


pronta para experimentar a maioria das sensações básicas de sua espécie” (Mussen e
col., 1977). Pode ver (embora obviamente não identifique qualquer objeto, distingue luz
e sombra, acompanha os movimentos de uma luz, etc.), ouvir (é freqüente a utilização
pelas mães de cantigas de ninar ou mesmo de música para acalmar os bebês), cheirar,
tem sensibilidade à dor (onde ocorrem grandes diferenças individuais), ao tato e às
mudanças de posição. Quanto ao gosto, se não estiver presente no momento do
nascimento, irá se desenvolver logo após (observamos reações de desagrado quando
administramos um medicamento de sabor desagradável a criança de poucos dias).

Quanto ao comportamento, a criança será capaz de chorar em qualquer situação de


desconforto, tossir, espirrar, vomitar, sugar, virar para o lado quando sua face for
estimulada. Apresentará inúmeros comportamentos reflexos que dão início da
adequação do desenvolvimento de seu sistema nervoso central. Alguns destes reflexos
têm valor de sobrevivência (como é o caso do reflexo de sucção) e irão permanecer no
repertório comportamental do bebê (transformando-se eventualmente em esquemas
sensoriais motores). Outros reflexos que podem ser citados: preensão – consiste em
fechar a mão quando nela colocamos qualquer objeto (o dedo, por exemplo); andar –
segurando o bebê na posição ereta ele dará alguns passos; nadar. Estes dois últimos
desaparecem enquanto comportamento reflexo respectivamente com 8 semanas e 6
meses de idade, voltando a aparecer mais tarde como comportamento voluntário.

Outro reflexo interessante e que deve desaparecer em torno de 3 meses de idade é o


reflexo de Moro, que consiste numa resposta de abrir os braços, esticar dedos e pernas
em resposta a um som intenso ou a qualquer estímulo repentino e forte. E o de Babinski,
que consiste em curvatura do artelho maior para cima e os menores se estendem
abertos, quando a sola do pé é estimulada.

2.1.2. Necessidades Básicas

Sono. Embora existam discussões teóricas a respeito da necessidade de sono da


criança, sabe-se que suas finalidades básicas consistem em regular o corpo, manter o
equilíbrio na constituição química e preservar as energias do organismo para as
atividades subseqüentes.
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No 1º mês de vida o bebê dorme aproximadamente 80% do tempo, em sonecas curtas e
irregulares; no final do 1º ano dormirá 50% do tempo, isto é, a noite toda e uma ou duas
sonecas curtas durante o dia. É óbvio que esta evolução será lenta e gradual.

Quanto aos padrões de sono, as crianças apresentarão, desde a mais tenra idade,
diferenças individuais em função de seu nível de atividade, drogas anestésicas
administradas à mãe durante o parto e sexo (lembramos que os bebês femininos
usualmente dormem mais tempo que os bebês masculinos).

Eliminação. A eliminação das fezes e da urina será, no início da vida, totalmente reflexa
e involuntária. Nos primeiro dias evacuará após toda mamada e ao redor da 8ª semana
deverá evacuar 2 vezes ao dia.

O tipo de alimentação oferecido ao bebê irá influenciar sua eliminação e também as


reações da mãe. Quando o bebê recebe aleitamento natural terá uma digestão mais
completa com movimentos intestinais suaves e suas fezes não apresentarão odor
desagradável. Já no caso da alimentação artificial, as fezes apresentam odor
desagradável e todo o processo de troca de fraldas e higiene da criança torna-se penoso
para a mãe.

Um problema geralmente associado à eliminação é a presença de cólicas intestinais.


Spitz, após seus estudos de observação de bebês e suas mães, sugeriu que aquelas
crianças que apresentavam muitas cólicas eram filhas de mães ansiosas, que sentiam
dificuldades no desempenho de suas tarefas maternais. Outros estudos, entretanto,
sugerem que a presença ou ausência de cólicas se deve a uma disposição
temperamental da criança, ou seja, a seu nível de atividade. Assim sendo, uma criança
que apresenta elevado grau de cólicas no início da vida, possivelmente será hiperativa
mais tarde. Neste sentido a interpretação é inversa àquela dada por Spitz. Isto é, não
seria a ansiedade da mãe a responsável pelas cólicas do bebê. Mas sim o alto nível de
atividade deste (do qual as cólicas seriam uma manifestação) é que provoca a ansiedade
da mãe, exigindo maior contato no sentido de cuidados, e menos no de interação social.

Fome e sede. Estas necessidades são fundamentais do ponto de vista psicológico,


porque implicam relacionamento social e emocional (que será descrito no capítulo
referente à fase oral). Manifestam-se através de choro e de movimentos violentos de
todo o corpo. Nas primeiras semanas, a criança ingere pequena quantidade de alimento
(que se restringe basicamente ao leite) e, portanto, precisa ser alimentada a intervalos
curtos (geralmente a cada 3 horas, ocorrendo variações individuais na freqüência e
quantidade da alimentação). Até a década de 40 aproximadamente, as mães
costumavam amamentar seus filhos sempre que chorassem e que este choro fosse
interpretado como fome. Após o advento e o desenvolvimento do behaviorismo, os
princípios de instalação e controle de comportamento foram divulgados para os pediatras
e o grande público (em revistas femininas, por exemplo) e as mães passaram a ser
orientadas no sentido de manter um horário rígido de amamentação (por exemplo, a cada
quatro horas).

Atualmente considera-se que, se o bebê tiver uma mãe que capta seus sinais e responde
adequadamente a eles, a mãe saberá quando seu filho precisa ser alimentado. Este, por
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sua vez, em poucos dias desenvolverá naturalmente um ritmo adequado de alimentação.
Não há, portanto, necessidade de se estabelecer rigidamente um horário de
amamentação e tampouco de a mãe estar sempre à disposição de seu filho. Isto porque,
quando a mãe sente que deve estar sempre agindo em função do bebê, sem realizar
qualquer outro tipo de atividade, poderá sentirse frustrada como pessoa e desenvolver
uma hostilidade consciente ou inconsciente em função da excessiva exigência do bebê.

Em torno de 30 dias de idade, a criança se torna capaz de ingerir maior quantidade de


leite em cada refeição, passando a necessitá-lo aproximadamente 5 ou 6 vezes por dia
apenas. A partir desta época, os pediatras costumam sugerir o início da administração
de suco de frutas, e, em torno de 4 meses, o início da alimentação sólida (sopas, papas
de frutas, etc.).

Parece estar comprovado que, quando a criança é alimentada naturalmente, não há


necessidade de qualquer outro tipo de alimento até a idade aproximada de 6 meses.

2.1.3. Desenvolvimento Psicomotor

O desenvolvimento motor é o resultado da maturação de certos tecidos nervosos,


aumento em tamanho e complexidade do sistema nervoso central, crescimento dos
ossos e músculos. São, portanto, comportamentos não-aprendidos que surgem
espontaneamente, desde que a criança tenha condições adequadas para exercitar-se.
Queremos com isto dizer que, apenas em casos de extrema privação (ou de algum tipo
de distúrbio ou doença), estes comportamentos não se desenvolverão. Crianças criadas
em caixotes ou quartos escuros (por mais incrível que pareça, têm-se várias notícias a
este respeito) ou em creches de péssima qualidade, onde as crianças são mantidas
sempre em seus berços, sem qualquer estimulação, não desenvolverão o
comportamento de sentar, andar, etc., na época adequada.

Coste (1978) relaciona entre as principais funções psicomotoras as seguintes:


desenvolvimento da estruturação do esquema corporal (mostrando a evolução da
apreensão da imagem do corpo no espelho e a exploração e reconhecimento do próprio
corpo): evolução da preensão e da coordenação óculo-manual (evolução da fixação
ocular; preensão e olhar); desenvolvimento da função tônica e da postura em pé; reflexos
arcaicos além da estruturação espaço-temporal (tempo, espaço, distância e ritmo).

Seria importante realçar que esses aspectos de desenvolvimento físico não ocorrem
mecanicamente apenas. São vivenciados pela criança (e pela família) e formam a base
da noção do eu corporal. Sim, porque obviamente um indivíduo, uma personalidade,
existe a partir de um determinado corpo (embora algumas abordagens ainda enfatizem,
disfarçadamente o dualismo mente-corpo) e o que acontece neste corpo é apreendido
pelo sujeito (através de algum mecanismo intelectual) e tem repercussões emocionais.
Queremos nos referir ao conhecimento que a criança vai tendo de seu próprio corpo, à
formação de sua imagem corporal e aos sentimentos que são despertados por esta ou
aquela característica. Como exemplo podemos lembrar a valorização que a beleza física
tem em nossa sociedade. Possivelmente uma pessoa bonita terá um fato a mais no
sentido de desenvolver uma auto-imagem positiva do que uma pessoa desprovida desta
beleza. Certas profissões dependem fundamentalmente da qualidade da aparência.
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Outro exemplo que poderíamos lembrar é o do adolescente cheio de espinhas, com
excesso de peso, etc., que terá dificuldades em se tornar popular em seu grupo de
amigos.

Assim sendo, ao estudar o desenvolvimento de um bebê, devemos estar atentos também


aos aspectos intelectuais, emocionais e sociais.

Sabemos que uma das funções básicas do desenvolvimento na primeira infância é o


conhecimento do próprio corpo, e a colocação deste corpo entre os demais objetos e
pessoas do ambiente circundante. À medida que o bebê se auto-explora (olhando para
suas mãos, executando vários tipos de movimentos, etc.) estará formando um esquema
de si próprio que podemos designar como eu corporal. Esta noção de eu corporal irá
incluir também os afetos positivos e negativos que o bebê terá a respeito de si mesmo,
e, como este auto-conceito inicial irá depender fundamentalmente da reação das
pessoas do ambiente (principalmente a mãe), vemos que de fato a separação do estudo
do desenvolvimento humano em aspectos é meramente didática.

2.2. Organização Afetiva Inicial: Fase Oral e Amamentação

2.2.1. A Fase Oral

2.2.1.1. A Descoberta da Afetividade Oral

As descobertas da psicanálise seguiram um caminho inverso ao processo de evolução.


Partindo do estudo das neuroses, notadamente da histeria, Freud descobre que há, em
todo neurótico, perturbações da genialidade. Isto o levou a concluir que há um padrão de
sexualidade adulto ou, melhor dizendo, genital, que constitui a base da organização
afetiva normal. É deste padrão de sexualidade, desta evolução da libido para uma
genialidade plena que o homem saudável se define como aquele que é capaz de “amar
e trabalhar”. Amar num sentido amplo tanto envolve os prazeres das atividades sexuais
quanto os da constituição familiar, procriação e preparo ou formação dos descendentes
que virão a sucedê-lo.

Trabalhar implica nos derivativos sublimados da sexualidade. De um lado, produzir, seja


bens ou cultura, é eternizar sua permanência no mundo, tal qual o faz na constituição da
geração seguinte. Cada empresa que se desenvolve, cada produto que é concluído, cada
técnica desenvolvida, cada colheita obtida simbolicamente correspondem a um produto
seu, que permanece, que o serve, que serve ao grupo e que serve à preservação da
vida. De outro lado, o trabalho representa a mobilização dos processos secundários do
Ego, é dar ferramental e suporte para que as sublimações se realizem. É permitir que a
sexualidade primitiva evolua não só para a sexualidade genital, mas face à plasticidade
da libido, evolua, para satisfazer-se em relações produtivas e adequadas à sobrevivência
do grupo humano.

Estes padrões eram perturbados nos neuróticos e, progressivamente, Freud passa a


observar que a sexualidade não partia do nada para brotar espontaneamente no adulto.
Freud descobre que na infância as fantasias sexuais já se manifestavam. Era uma
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sexualidade fantasiada que se organizava em torno do grupo familiar. A configuração do
triângulo edípico propiciava a organização de base para a sexualidade adulta. Os
quadros histéricos traziam como pano de fundo uma vivência inadequada deste período
de sexualidade infantil, posteriormente denominado de fase fálica. Assim, a partir de um
trabalho clínico, primeiro ficam identificados os padrões da genitalidade adulta, e depois
uma fase infantil, que é básica para sua organização. Entre os dois se estabelece um
período onde a sexualidade é contida, ou melhor, reprimida, denominado período de
latência.

Com a continuidade destes tratamentos e com a tentativa de compreender e tratar


quadros mais graves – ou seja, a neurose obsessiva, a paranóia, a melancolia e a própria
esquizofrenia - foram sendo descobertos traços de que já havia uma organização afetivo-
sexual infantil anterior à sexualidade centrada nos genitais. Verifica-se que o conjunto de
instintos voltados para o prazer, que chamamos de libido, tinha em cada etapa evolutiva
da vida uma correlação com as estruturas biológicas que formavam o centro do processo
maturacional no momento. Assim são descritos traços de organização psíquicos
correspondentes aos segundo e terceiro anos de vida, período típico do domínio
muscular voluntário, do andar, do falar, das primeiras produções pessoais, que na
fantasia infantil se acham profundamente associados com os primeiros produtos que ela
pode expulsar ou reter em seu corpo, ou seja, as fezes e a urina. Associados aos
fracassos nestas aquisições, a psicanálise descobre a organização de núcleo
patogênicos que mais tarde poderão desencadear a neurose obsessiva e a paranóia.

Os traços afetivos da organização infantil mais precoce, referentes ao desenvolvimento


do primeiro ano de vida, foram os que apresentaram maior dificuldade de serem
discriminados e compreendidos. Em primeiro lugar, por situarem-se no período mais
primitivo da vida, sendo portanto mais difíceis de serem rememorados. Em segundo
lugar, porque este período corresponde a um período pré-verbal da existência, havendo
portanto a necessidade de uma evolução na teoria dos símbolos para a sua
compreensão. Em terceiro lugar, porque nos é difícil, como adultos, senão por um grande
esforço de introspecção e imaginação, compreender o sentido das emoções infantis. E
finalmente porque, embora estes traços estejam presentes nos adultos, só com o
desenvolvimento das técnicas ludoterápicas, notadamente o trabalho de Melanie Klein,
com a psicoterapia de crianças pequenas, que se pode estar mais próximo da
organização afetiva inicial. A organização afetiva do primeiro ano de vida, período
denominado pela psicanálise de fase oral, terá sua organização básica proposta por
Freud. Karl Abrahan se deterá em seu exame, discriminando melhor seus mecanismos
e modalidades de relação. Melanie Klein, notabilizada como analista de crianças, dará o
grande modelo teórico de compreensão deste período.

2.2.1.2. A Organização da Libido

O reflexo de sucção é inato, sendo desencadeado pela colocação do mamilo ou outro


objeto na boca da criança. Um toque realizado com o dedo, no rosto da criança, fará com
que esta se volte para tentar sugar o objeto que a está tocando. Os toques em outras
regiões do corpo com freqüência provocarão o mesmo reflexo. De uma maneira geral,
podemos deduzir que, biologicamente, o impulso destinado à alimentação é um fator
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central da organização infantil inicial. E é exatamente ao nível dos reflexos alimentares
que a busca de adaptação ao mundo e a procura de prazer são profundamente
correlacionados.

Outros grupos reflexos coexistem neste momento. Dentro dos reflexos posturais vemos
que a criança já possui estrutura automatizada para andar. Um recém-nascido, seguro
pelas mãos e conduzido de pé para a frente, apresentará a coordenação alternada e
reflexo do movimento de pernas. Há um núcleo reflexo, posteriormente dominado pela
organização voluntária, sobre o qual se estruturará o andar. O reflexo tônico-
cervicalassimétrico do recém-nascido, que o deixa na clássica posição de esgrimista, ou
seja, tortinho, com uma perna encolhida e uma mão diante do rosto, servirá de suporte
para as correlações mão-boca e conhecimento da mão, dados fundamentais para as
praxias iniciais.

Mas este grupo de reflexos não tem a conotação de prazer apresentado pelos
alimentares. O mesmo se pode dizer dos reflexos defensivos. Por exemplo, diante de um
ruído forte o bebê se encolhe rapidamente e em seguida atira as pernas e braços para
fora. Não é difícil ver a correlação com nossos processos defensivos físicos onde, num
primeiro momento, nos protegemos e, num segundo, tentamos expulsar a fonte da
agressão. Esta postura defensiva fica ainda mais clara quando picamos a planta dos pés
de um bebê com uma agulha. Reflexivamente ele retira o pé. Mas, se este pé estiver
seguro, ele encolhe a outra perna e em seguida a estica na direção do pé magoado.
Parece-nos claro que todos os grupos reflexos estão ligados ao progressivo processo de
construção do real, notavelmente estudado e descrito pelo grupo de Piaget. Mas o
vínculo do prazer, suporte para o desenvolvimento da afetividade, é neste momento uma
correlação oral. É em cima do prazer inicial, da satisfação tida com a amamentação, que
se aprenderá a amar e que se aprenderá a desenvolver os vínculos de amor em seguida
dissociados da exigência biológica básica da alimentação. Freud organiza a descrição
das fases de evolução da libido em seu Três Ensaios para uma Teoria Sexual (1903).
Neles, o termo fase oral ainda não aparece, mas Freud já descreve vários aspectos da
afetividade oral, estruturados sobre a amamentação. Dá como suporte as descrições
efetuadas pelo pediatra Lindner, onde os vínculos de prazer ligados à amamentação são
excepcionalmente bem descritos. Quase que apenas lhe falta uma síntese teórica para
se antecipar a Freud. Mostra Lindner como todo envolvimento, a expressão de prazer e
êxtase durante o processo de amamentação são similares às manifestações orgásticas
do adulto.

Vimos observando até agora que, tanto ao nível dos reflexos quanto ao nível dos vínculos
de prazer externamente percebidos, a organização oral é o elemento central da
motivação infantil inicial. Quando utilizamos o termo motivação, temos claro que estamos
criando a impressão de uma dicotomia no ser humano, dicotomia que teria, diante das
situações de vida, de um lado a capacidade cognitiva de elaborar e resolver problemas
e, de outro, o impulso que dá a energia para que a situação de vida seja enfrentada. Não
cremos pessoalmente nesta dicotomia humana, mas ao nível dos atuais conhecimentos
da psicologia, Piaget (e seguidores) emerge como o teórico da construção do real,
portanto da evolução da cognição humana; e Freud e seguidores são os responsáveis
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pela descrição evolutiva normal e patológica da afetividade. Nesta dimensão afetiva, o
vínculo oral é claramente percebido como ponto central do vínculo humano de prazer.

A evolução da libido é, portanto, o tema central do desenvolvimento para a psicanálise.


A fase oral é então definida como a etapa de desenvolvimento onde a libido está
organizada sob o primado da zona erógena oral, dando como modalidade de relação a
incorporação. Isto significa que o centro da organização afetiva está determinado por
processos introjetivos. Mamar e sentir prazer é sentir que o leite é bom, que o seio é
bom, que a mãe é boa e que o mundo é bom. A sua sensação de que está bem é correlata
à de ter colocado dentro de si objetos do mundo externo que são bons. O seio e a mãe
podem ser sentidos como bons porque foram incorporados. A incorporação é a
modalidade primitiva da introjeção, portanto dependente de referenciais concretos. Por
isso, a maternagem é fundamental para que a criança se sinta adequada, amando e
sendo amada. O vínculo básico da maternagem é a amamentação. Erik Erikson diz que
neste momento a criança ama com a boca e a mãe ama com o seio.

2.2.1.3. As Etapas Orais

Karl Abrahan, psicanalista do grupo freudiano, aprofunda-se nas idéias iniciais de Freud
sobre a fase oral e nela discrimina duas etapas básicas de desenvolvimento da libido. A
primeira é chamada de fase oral de sucção, e corresponde a um período de relações
afetivas pré-ambivalentes, que cobrem basicamente o primeiro semestre de vida; ou,
num correlato biológico, vai do nascimento ao período inicial da dentição. O segundo
semestre do primeiro ano corresponderá à etapa oral sádico-canibal, iniciada a partir da
dentição, onde as fantasias agressivas serão correlacionadas com percepção do objeto
inteiro, ou seja, com o surgimento da ambivalência (a mesma mãe é boa e má), e com a
dentição, ou seja, a percepção do primeiro momento de agressão ou destrutividade real
da criança.

A Etapa Oral de Sucção

A criança funciona basicamente incorporando o universo que a rodeia. Não o discrimina


coerentemente, e o mundo de suas vivências é o mundo interno das fantasias. Não há
vínculos com objetos externos inteiros. Eles são apreendidos de forma parcial e
organizados pela realidade interna. O que é apreendido é sentido como parte integrante
do eu. O mundo é buscado para ser incorporado, reduzindo-se a algo “digerido”,
indissociado dos sentimentos bons ou maus que a relação desperta.

A relação incorporativa estabelecida é a base da introjeção. O seio, a mãe, as relações


boas que deles emanam passam a fazer parte do mundo interno da criança. Ela sente
que as coisas que recebe em seu interior são boas, e sente-se boa. Como o que importa
é a realidade interna, este sentimento de amor ou de bom é utilizado para permear as
primeiras percepções do mundo externo, ou seja, os objetos percebidos são sentidos
como bons. Simplificando, o processo fica assim: incorporo e me sinto bom, projeto para
ver o mundo “externo”, porque este só é percebido através da minha realidade psíquica;
e, portanto, por me sentir bom posso ver a minha mãe boa; como eu a vejo
especularmente, ligo-me a ela. Este processo, que chamamos de identificação projetiva,
constitui a base da configuração dos vínculos de amor, da configuração inicial da
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identidade e do reasseguramento dos sentimentos positivos que permitirão a progressiva
evolução da libido através das várias fases.

Embora a genitalidade domine a organização afetiva adulta, podemos perceber que


vários traços orais são mantidos, permeando os relacionamentos afetivos dos adultos. O
beijo é ainda o símbolo central do engajamento amoroso. Expressamos nele o traço do
vínculo afetivo original mais forte que foi desenvolvido. O beijo não fecunda, não é
elemento biológico necessário para a perpetuação da espécie. É, sim, vínculo do
engajamento amoroso, constitutivo da organização afetiva familiar humana. Chamar a
mulher amada de “docinho” ou o homem de “pão” são verbalizações denotadoras dos
traços orais que permanecem na genitalidade. Isto é igualmente válido para a expressão
“comer alguém” como indicadora do relacionamento sexual. Homens mandam bombons
para as namoradas. Mulheres prendem os homens “pelo estômago”; o traço oral persiste.

Ao nível masculino, o prazer obtido com o seio é mantido, expandindo-se para o prazer
de se relacionar com o corpo e os genitais femininos. A mulher se estrutura como objeto
desejado e fonte de prazer. Ao nível feminino, sentir que as coisas que recebe em seu
interior são boas prepara-a para a sua futura genitalidade receptiva. Receber o homem
em seu interior será sentido como fonte de prazer e gratificação.

A gratificação oral inicial também pode ter sido sentida como insatisfatória ou insuficiente.
Isto criará permanentemente a expectativa de que receber o mundo externo, ou se
relacionar com ele, será fonte de angústia ou de sofrimentos. Discutiremos algumas
destas modalidades quando tratarmos da amamentação. Interessa-nos agora, a mais
grave delas: a esquizofrenia. Temos examinado que o mundo externo só pode ser
progressivamente conhecido e amado a partir dos vínculos de maternagem. A criança
pode nascer tão frágil, tão sensível à angústia ou, como dizemos analiticamente, com
predominância do instinto de morte sobre a vida, que quaisquer oscilações de
maternagem repercutirão como processos destrutivos, fazendo-a regredir e isolar-se em
seu mundo interno de fantasias. Também a criança com uma propensão normal ao
desenvolvimento sadio pode sofrer uma maternagem tão desestruturadora e agressiva,
que não seja capaz de vínculos significativos com a mãe, e portanto, com os demais
objetos do mundo externo.

Nesses casos ocorre um isolamento. Não ocorre o desenvolvimento de vínculos, e a


realidade externa passa a ser rejeitada. Todo prazer, ou melhor, toda segurança, só pode
existir dentro do mundo interno de fantasias. O externo não forma um todo coerente, as
discriminações são fragmentárias e parciais. As apreensões parciais são modeladas e
integradas em uma realidade interna, de fantasias, que é sentida como a única realidade.
Os processos mentais são os do inconsciente. O Ego não se fortalece, o processo
secundário não se estabiliza. O desejo, o temor, as fantasias organizam-se como a
realidade do pensamento. A configuração da identidade não se pode formar.

Este não é um fenômeno do “tudo ou nada”. Em maior ou menor grau, todas as pessoas
sofreram frustrações orais que as marcaram de maneira mais ou menos profunda.
Estatisticamente o pico da incidência dos surtos esquizofrênicos está situado no período
final da adolescência. Isto significa que o indivíduo tem uma certa capacidade para
resistir aos picos mais críticos das angústias iniciais e para continuar seu processo de
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desenvolvimento, que pode até aparentar-se normal para a percepção externa e leiga.
Mas um ponto de fixação foi criado, ou seja, grande parte da energia da libido foi
imobilizada neste momento. Os desejos não satisfeitos conservam-se sempre, como
uma energia presa que não pode ser elaborada. A repressão que se forma, para não
permitir a emergência dos desejos ou da destrutividade que é sentida junto com eles,
imobiliza outro tanto de energia. Com isto, ficam também presas a este ponto as fantasias
deste momento e as modalidades de relação com o mundo que o caracterizam, e, mais
particularmente, das defesas que foram mobilizadas contra a angústia.

Embora o desenvolvimento aparentemente prossiga, o indivíduo se torna frágil. Parte da


sua energia vital está imobilizada, e seu desenvolvimento prosseguirá sendo estruturado
pela energia restante. O Ego será mais frágil e não terá tanta força para enfrentar as
futuras crises. Assim, não é que a estrutura narcisista da criança permaneça linearmente.
Melanie Klein mostra inclusive que o pensamento infantil é psicótico, mas neste momento
isto representa uma etapa adequada do desenvolvimento infantil. É exatamente o que
Freud chama de narcisismo secundário que irá configurar a doença. Freud utiliza um
correlato biológico para exemplificar o processo. A ameba é uma massa fechada. Emite
pseudopoder, para contactuar e incorporar os objetos externos, que são trazidos para
dentro dela. Mas enquanto a ameba vai permanentemente fazendo suas incorporações
por este contato, o psicótico recolhe para dentro de si as apreensões externas, recolhe
suas possibilidades de novas ligações, e o mundo externo perde o sentido.

A Etapa Oral-canibal

Este segundo período oral é introduzido na obra de Freud por Karl Abrahan. Se antes a
criança apenas incorporava, e suas modalidades agressivas existiam apenas no plano
da fantasia, agora, com a vinda dos dentes, a agressividade será concretizada. Os
dentes surgem rasgando as gengivas, provocando dor, febre e angústia. A oposição do
primeiro dente com as gengivas fere.

O dedo é levado à boca e mordido, e sensação de morder e ser mordido traz a percepção
de que concretamente se pode destruir. Os alimentos são mordidos e triturados para
serem ingeridos. O seio da mãe se retrai com a mordida, e concretizase a fantasia de
que a agressividade destruiu o seio, a mãe, o objeto de amor.

O processo é em si adaptativo, como qualquer procedimento humano característico. Não


o fosse, e o padrão se teria extinto, ou a própria adaptação da espécie estaria em perigo.
É necessária certa dose de agressividade para entrar no mundo, atacá-lo em suas
oposições e moldá-lo às necessidades do organismo. A agressividade faz parte do
desenvolvimento do processo secundário. Mira y Lopez utiliza em seu modelo de teoria
da personalidade, suporte teórico de seu Psicodiagnóstico Mio-Kinético (PMK), o termo
combatividade para definir a adequada elaboração da agressividade nas relações com o
mundo.

As fantasias destrutivas podem, porém, predominar. Isto ocorre sempre que a angústia
predomina sobre o amor, que a dor predomina sobre o prazer. A relação com o mundo
passa a ser sentida como uma relação onde tudo o que se consegue é atacado e
destruído. A amamentação perdida é o seio que foi incorporado e destruído. A mãe pode
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ser perdida ou pela destruição ou por ser protegida do contato destruidor. Nada satisfaz
porque, se incorporado, foi destruído e não serve mais. Muitos adultos vivem dentro
desta modalidade. Discutiremos os traços desta modalidade de incorporação com
destruição quando tratarmos do desmame. Agora nos prenderemos à organização da
dimensão mais grave desta modalidade, ou seja, a melancolia.

A melancolia está estruturada dentro da modalidade de incorporação com destruição. A


dimensão de destruir apresenta, ao nível da fantasia, uma modalidade dupla. De um lado,
o sentimento de que somos maus e destruidores, ambivalente ao sentimento sempre
existente de que somos bons. Isto na prática aparecerá como um sentimento simultâneo
de destruição e de culpa porque, paralelo ao ódio, existe o amor pelo objeto destruído.
Logo, o objeto de relação será ambivalentemente estruturado como um objeto mau e
bom ao mesmo tempo. Como estamos dentro de uma modalidade oral, portanto
introjetiva, isto significa que, quando o objeto ambivalente é atacado, ou seja, na crise de
ódio ou de destrutividade, o objeto é cindido e seu aspecto mau é introjetado. Por
exemplo, a mãe é externamente preservada e idealizada como tendo apenas
características boas, e a mãe má é introjetada. Normalmente o que introjetamos é sentido
como nosso, ou seja, a introjeção é seguida pela identificação. Isto explica a estrutura
autodestrutiva do melancólico. Ataca permanentemente o objeto mau que foi introjetado
e com o qual se identifica. A estrutura superegóica é rígida e os ataques autopunitivos e
a autodepreciação acusatória constituem, portanto, uma compensação pela
destrutividade. O sentimento de compensação gera prazer, e, portanto, o melancólico
goza sua autodestruição. O modelo é similar às procissões medievais de
autoflagelamento, onde a dor é prazerosa, porque redime a maldade e o pecado. A
onipotência, como característica primitiva, estará presente. Já que não pode ser o maior
objeto de amor, será um monstro de destrutividade.

O melancólico grave, em seus delírios, sente-se responsável por toda maldade do


mundo.

Abrahan mostra que para a emergência da melancolia são necessários vários fatores,
cada um dos quais podendo isoladamente pertencer a qualquer estrutura patológica. São
eles:

(1) Um fator constitucional. A maior ou menos força dos instintos de vida, ou seja, uma
predisposição inata para o desenvolvimento, poderá em maior ou menor grau
enfrentar ou sucumbir às frustrações durante o desenvolvimento dos vínculos.

(2) Uma fixação da libido no nível oral. A organização oral exacerbada fixará uma
modalidade onde toda troca é oral. Encontramos estes traços nos prazeres anormais
no ato de comer, nas manipulações da boca e maxilares que acompanham as tarefas
difíceis, ou seja, é necessário um prazer oral diante de cada dificuldade.

(3) Uma grave lesão ao narcisismo infantil, provocada por sucessivos desapontamentos
amorosos. Aqui a fragilidade constitucional e a fixação oral somam-se às frustrações
reais ou fantasiadas. Um desmame inadequado, a vinda de um irmão, os
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afastamentos da mãe, as internações. A frustração exacerbará as modalidades
defensivas orais.

(4) A ocorrência do primeiro desapontamento amoroso antes que os desejos edipianos


tenham sido superados. Dentro da evolução da libido, a criança evolui para a
configuração do triângulo edípico. Neste momento, as frustrações provocarão uma
regressão dos vínculos edípicos à modalidade oral-canibalesca, ou seja, os
processos de cisão, introjeção e identificação recairão maciçamente sobre os objetos
fundamentais de amor: a mãe e o pai.

(5) A repetição do desapontamento primário na vida ulterior. É o que temos indicado


sempre como o fator desencadeante. O desapontamento amoroso, o fracasso
financeiro e os acidentes farão com que a regressão seja estabelecida, permitindo a
emergência do surto melancólico. Uma angústia atual que não pode ser suportada,
desencadeará a regressão.

A angústia do melancólico não pode ser indefinidamente suportada. Os processos


onipotentes ligados à autodepreciação e autodestruição são periodicamente revertidos
para a modalidade onidepressão. A identificação com o objeto destruído é negada e
surgem apenas as dimensões de amor, felicidade e poder. Ao ciclo destas oscilações
alternadas de melancolia e mania damos o nome de psicose maníaco-depressiva.

2.2.2 Amamentação

As implicações da amamentação como vínculo central da maternagem já foi discutida


em vários níveis teórico-evolutivos. Tentaremos agora examinar alguns aspectos
práticos da atuação materna e suas conseqüências no desenvolvimento infantil. Em
primeiro lugar, é importante ter claro que estamos tratando de uma modalidade oral, ou
seja, as fantasias ligadas à amamentação são o núcleo da maternagem, mas não a
própria maternagem. Estas fantasias são organizadoras do mundo interno da criança e
correlacionam-se apenas fragmentariamente com a realidade externa e objetiva. Se o
desenvolvimento fosse diretamente correlacionado ao processo externo objetivo, a
criança seria tão mais ajustada quanto maior fosse a quantidade de leite produzida e a
duração do aleitamento. Isto não é verdade. O relacionamento com a mãe é
primordialmente qualitativo. Não importa apenas dar o seio. O que importa é como o seio
é dado, como as solicitações paralelas da criança são atendidas, ou seja, não se está
apenas incorporando o leite da mãe, mas também sua voz, seus embalos, suas carícias.
O bebê discrimina mais a mãe pelo cheiro e pela voz, do que pelo olhar, visto que o rosto
humano só será discriminado no 4º mês.

As carícias da mãe não só proporcionam intensa sensação de prazer, como vão


progressivamente dando à criança a configuração de seu próprio corpo; portanto, vão
auxiliando a configuração do esquema corporal. O eu da criança começa a configurar
limites, ou seja, a ter existência própria pelo contorno que lhe é dado pelo corpo materno.

As crianças criadas em instituições, apesar de todos os cuidados alimentares, higiênicos


e médicos, andam tardiamente, falam tardiamente, possuem um esquema corporal
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prejudicado, têm dificuldades de estabelecer ligações significativas e como fonte de
satisfação usam freqüentemente condutas auto-eróticas, portanto regredidas. Por
exemplo, os balanceios e as ritualizações rítmicas de movimentos. O leite e o asseio não
são em si suficientes para o desenvolvimento sadio. Mamar deve ser acompanhado de
um ritual prazeroso de conhecimento de uma figura amada e permanente. O mesmo é
válido para os cuidados higiênicos e os jogos. Por isto fracassam tanto os programas
institucionais onde voluntárias esporádicas vão brincar com as crianças.

Estamos frizando que, ao nível da figura materna, o ponto fundamental é a presença de


uma mulher que seja figura estável, que seja capaz de dar amor e que seja, ao nível
qualitativo, capaz de compreender e atender as solicitações básicas feitas pela criança.
Não utilizamos o termo mãe, mas sim figura materna, porque este é o elemento
fundamental para a criança. Não importa se a mãe é verdadeira ou não ao nível biológico.
Importa, sim, que seja uma figura capaz de criar laços estáveis de amor e de confiança
na relação estabelecida com o bebê. Alguns padrões básicos de relacionamento, como
os estabelecidos com a mãe, com o pai e com o triângulo edípico, são estruturas inatas
da criança, que para serem desenvolvidas requerem basicamente a existência de uma
mulher e de um homem adequados e estáveis.

Da mesma forma, não é dado único partir-se de que o seio real seja indispensável para
o desenvolvimento psicológico sadio. A maternagem é um processo global de
envolvimento mãe-filho. Caso a mãe não possua leite, ou mesmo em caso de filho
adotivo, é o relacionamento amoroso e corporal como totalidade que alimentará os
processos introjetivos da criança. Portanto, mesmo não havendo leite no seio, a mãe
será adequada se puder amar e se puder repetir todo o ritual existente na amamentação
real. Tomar o filho ao colo nu é dar-lhe um contato pele a pele prazeroso e configurador.
Falar com ele, embalá-lo, acariciá-lo, tudo lhe dará não só a própria configuração, mas
também o ajudará a organizar e amar o objeto primordial de toda a sua evolução afetiva:
sua mãe.

Com freqüência, a ausência de aleitamento materno está correlacionada a problemas


emocionais no desenvolvimento. Julgamos que não é especificamente a falta do leite do
seio que provoca estes problemas, mas exatamente por existirem, ao nível da mãe,
distúrbios emocionais sérios, cujos sintomas implicam na rejeição do filho, é que, por
somatização, o leite desaparece. Mesmo ao nível da sabedoria popular conhecemos a
expressão indicadora de que “o leite secou” em conseqüência de susto ou frustração
violenta. As angústias inconscientes poderão bloquear a formação do leite. Sabemos
também que na origem do aleitamento há influências hormonais (pró-lactina) e de
estimulação local. Por exemplo, em algumas tribos são as mulheres idosas que
amamentam todas as crianças. A constante estimulação local mantém a fluxo de leite
quase que indefinido. Também na Idade Média, as damas de leite eram escolhidas entre
moças solteiras e sem filhos. Como amamentar não era uma função nobre, tão logo
chegava a hora de nascer um sangue azul, as donzelas punham os irmãos menores (e
os namorados) a prover estimulação local. O leite jorrava, ela e sua família eram levadas
para o castelo, resolvendo-se a sobrevivência da família.

Queremos com isto mostrar que o prazer que a mulher tem de dar o seio e a estimulação
resultante das amamentações regulares constituem a base da manutenção do leite. Ora,
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as mulheres que evitam dar o seio, que retiram ao primeiro intervalo da criança, que
desnecessariamente ficam buscando alimentação complementar que espace a
amamentação, são mulheres que em geral têm este desempenho como sintoma de uma
rejeição inconsciente da criança. Estamos ressalvando, é lógico, os casos onde a miséria
e o trabalho materno impedem o processo. É portanto julgamento precipitado atribuir os
problemas psicológicos evolutivos à carência de aleitamento materno. Pensamos que o
que falhou não foi o leite, mas a mãe no sentido pleno da palavra. Podemos voltar às
instituições, onde o suporte da mamadeira é o travesseiro, onde a enfermeira não se
relaciona com uma criança, mas com vinte ou trinta traseiros a serem lavados. A criança
não evolui, não porque o aleitamento seja artificial, mas sim porque inexiste a mulher
permanente que ama e que se engaja na relação com o filho.

Em seu processo de desenvolvimento, a criança apresenta uma seqüência definida na


evolução de seu mundo psicológico, ou seja, o momento de interrupção da amamentação
concretizará diferentes posturas no relacionamento com o mundo. Posturas estas que,
embora iniciadas nestes momentos, tenderão a se expandir para todo desenvolvimento
futuro, ou seja, todas as modalidades de relações futuras poderão estar permeadas por
este processo. Teremos, então, quatro momentos diferenciais na interrupção da
amamentação:

a) interrupção correta;
b) interrupção precoce;
c) interrupção no surgimento da dentição;
d) amamentação anormalmente prolongada.

a) Interrupção Correta

É senso comum, tanto para a pediatria quanto para a psicologia, que a amamentação
deve perdurar até o sexto mês. O desmame deve começar por volta do terceiro mês,
quando é iniciada a introdução de sucos e papinhas. Progressivamente as refeições
infantis o vão substituindo, até que ao final do sexto mês o seio pode ser deixado.

O seio, primeiro objeto de amor e ponto de partida para o desenvolvimento das relações
objetais, não pode ser perdido, antes que outros objetos possam amados e valorizados
para servirem de suporte a esta perda fundamental. Por volta do terceiro mês a criança
já está estabelecendo relações com a mãe. Para Melanie Klein, situa-se entre o terceiro
e quarto mês a passagem da posição esquizo-paranóide para a posição depressiva, ou
seja, as apreensões cindidas passam a ceder lugar à apreensão de objetos inteiros. O
relacionamento prazeroso, ainda que dependente do seio, já pode ser efetuado com a
mãe como um todo. O pai passa a ser percebido constituindo nova fonte de
relacionamento prazeroso. Os alimentos que são progressivamente introduzidos também
dão prazer. Os brinquedos começam a existir como fonte de prazer, embora, neste
momento, só existam quando dentro do campo perceptual da criança. O objeto
permanente, ou seja, a capacidade de manter na memória os objetos que saem do
campo visual só estará estabelecido aos oito meses.
Mas, mesmo assim, os brinquedos e os jogos corporais são fontes de prazer.
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Podemos perceber então que o seio só pode ser perdido quando existirem outras fontes
de satisfação e ligações afetivas que compensem a perda. O desmame progressivo
permitirá que os novos vínculos sejam progressivamente estabelecidos, à medida que o
vinculo inicial com o seio for sendo reduzido. A criança sentirá a perda. O desmame é,
provavelmente, a maior frustração de nosso desenvolvimento afetivo. Se perdido, porém,
o seio, restam mãe e pai amorosos e adequados; se perdido o leite, ganha-se a
possibilidade de todos os outros alimentos; se perdido o prazer de sugar, ganha-se o de
morder, o de jogar; a frustração é assimilada porque os ganhos são maiores do que a
perda.

b) Interrupção Precoce

Quando a amamentação é interrompida antes que surjam outros vínculos de prazer que
permitam suportar a frustração, o sentimento que fica é um sentimento de carência, uma
sensação de que é preciso comer, é preciso incorporar e de que o que é recebido não
basta. Para preencher esta falta, é preciso sempre buscar relações onde as pessoas ou
objetos sejam um eterno vertedouro de prazer e alimento. Quando este sentimento se
acentua, e isto poderá ocorrer tanto por uma fragilidade constitucional da criança, quanto
porque a maternagem como um todo não é sentida como satisfatória, teremos o
desenvolvimento de uma postura oral captadora.

O tipo oral captador permanece na eterna expectativa de poder apenas se amamentar


em todas as relações que estabelece. O caçador de dotes ou genrocrata é um exemplo
social típico. Não pode estabelecer vínculos afetivo-genitais com as mulheres, ou melhor,
sequer as pode perceber direito. Só pode vê-las como fonte de riqueza, de segurança
econômica e social, de prazer culinário. O cáften é seu desdobramento psicopático.
Também funcionam assim as mulheres que avaliam seus homens pelos carros, jóias e
propriedades das quais poderá usufruir. Os glutões, os beberrões, os toxicômanos
participam também da postura de uma eterna tentativa de satisfação oral. Cumpre
salientar que como regra geral são todos sexualmente frios. Não desenvolvem a
modalidade genital.

c) Interrupção no Surgimento da Dentição

O surgimento da dentição marca o aparecimento da concretização da agressividade e da


destrutividade. Já discutimos anteriormente estes aspectos. Ao nível da amamentação,
é um risco, para a evolução psicológica da criança, que o desmame seja interrompido
em conseqüência das mordidas. Ao nível do pensamento infantil, o processo é sentido
como se a criança, ao tentar se relacionar com o objeto de prazer, o tenha destruído e
perdido. A criança gosta de mamar, e neste momento gosta também de morder. Ao
morder a mãe retira o seio. Sucedem-se mordidas e interrupções, até que o seio é
definitivamente retirado. Fica o sentimento de que o objeto de prazer foi usado e
destruído.

A fixação desta modalidade de incorporação com destruição poderá produzir tipos sociais
eternamente insatisfeitos com suas conquistas. Uma vez conquistado um objetivo, é
como se este houvesse sido destruído e tivesse deixado de existir como fonte de prazer.
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Os eternos primeiranistas de faculdade são em nosso meio social um exemplo, que é
abandonada após o primeiro ano; sucedem-se entradas igualmente insatisfatórias em
dois ou três cursos diferentes até que por pressão da vida acaba-se por permanecer em
algum, mas sem tê-lo definido realmente como sua fonte de prazer profissional. Aquilo
que foi conquistado é imediatamente desvalorizado.

As mulheres são deslumbrantes e idealizadas até a primeira noite. Efetuada a conquista,


elas não mais merecem valor e as energias são voltadas para outra conquista. O carro
dos sonhos vira poço de defeitos tão logo seja adquirido. É preciso buscar outro modelo,
porque só permanece bom e idealizado enquanto não destruído pela posse.

Paralelamente, esta postura de devorar e destruir tudo que é amado e conquistado pode
conduzir ao isolamento. Há uma espécie de temor difuso (porque a fantasia e a
modalidade de relação são inconscientes) de se destruir os objetos amados. E os objetos
de amor mais significativos não podem, portanto, ser trazidos para a destruição. O amor
verdadeiro não será declarado, para que o parceiro e o amor sejam preservados.

d) Amamentação Anormalmente Prolongada

A amamentação só poderá se estender se a criança refrear seu impulso para morder.


Não há mamilo que resista ao corte dos primeiros dentes. Mas quais as conseqüências
de se bloquear o aparecimento da agressão? Em primeiro lugar, a agressividade oral
não surge gratuitamente. Todo processo de competição na luta pela vida implica numa
atuação agressiva. É preciso que o boi seja abatido para que tenhamos a carne, temos
que derrubar a floresta para cultivar a terra. Quando lutamos por uma vaga num emprego
ou numa universidade, conquistá-la significa derrotar os que não a conseguiram. A
agressividade é o elemento fundamental da combatividade, ou seja, a capacidade do
ego de exercer o processo secundário, de efetuar conquistas para que o desejo possa
ser realizado implica a participação de um impulso agressivo.

Sabemos também que o desenvolvimento humano possui períodos críticos, como o


processo de “estampagem” nos animais. Um curió que não tenha ouvido regularmente o
canto da espécie durante o período de início de seu canto, jamais o aprenderá
adequadamente. Passado o momento de uma aquisição, ela não poderá ser
adequadamente estabelecida em um período posterior. E este é o momento de
organização da agressividade real, é o momento de morder para se alimentar. Vedando-
se sua manifestação, corre-se o risco de se extinguir o impulso para competir e combater,
de se configurar uma estrutura de relação onde, mesmo havendo competência, falta a
capacidade da conquista. Com freqüência, todos nós conhecemos tipos assim. É bom
profissional, mas não consegue emprego. É excepcional nos treinos esportivos, mas
fracassa durante as competições. Sua vida será um eterno desperdício de talento,
porque jamais lutará pelo lugar que sente que merece. Acomoda-se e passivamente
mantém o que já possui. Lutar é sempre sentido como um risco de perder o que já tem.

2.2.3. Conclusão
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Vimos que a amamentação é um elemento central da maternagem. Que organiza a
evolução afetiva normal, mas que pode ser perturbada pela inadequação afetiva da mãe,
pela maior fragilidade constitucional da criança e por fatores acidentais. Como núcleo da
maternagem, as distorções na amamentação são sintomas de que há problemas
emocionais ao nível da criança ou da mãe. O processo de desmame deve ser progressivo
e situado entre a percepção da mãe (e outros objetos de amor) e o início da dentição.
Distorções no processo podem concretizar fantasias infantis de carência ou de
destrutividade, provocando modelos de relação distorcidos, que poderão perdurar por
toda a vida.

2.3 Interação Mãe-filho: Modelo Bidirecional de Efeitos

Clara Regina Rappaport

A hiperatividade, segundo Laufer e colaboradores, pode ser caracterizada por choro


excessivo, marcantes distúrbios digestivos (freqüentemente referidos como cólicas) e de
sono (dificuldade em adormecer, períodos curtos de sono), comportamento queixoso.
Para a criança nestas condições, uma quantidade normal de cuidados maternos pode
ser inadequada. Ou, como dizem esses autores, parece paradoxal que “uma mãe
aparentemente normal e adequada, que criou, anteriormente, filhos saudáveis e alegres,
agora, inexplicavelmente, a despeito de seus esforços, tenham uma criança tensa,
cronicamente triste e exigente”. (p. 465).

Segundo esses mesmos autores, “algumas mães têm um sentimento inconsciente, às


vezes consciente, sobre sua adequação como mulheres, esposas e mães. Uma criança
com esse tipo de comportamento (isto é, a hiperatividade) parece oferecer a elas a prova
concreta de sua inadequação. Isso gera na mãe intensas tensões e maiores esforços
para moldar a criança a padrões mais aceitáveis”. (p. 465-466).

Para essas crianças, a mãe é usualmente malsucedida e a hostilidade inconsciente em


relação à criança tende a se desenvolver, e esta, por sua vez, responde de maneira a
causar distúrbios emocionais secundários.

Elas constituem um tipo de criança que não inclui em nenhum esquema familial. O padrão
peculiar de respostas dessas crianças é explosivo e impulsivo, além do fato de ser
particularmente intolerável a muitos pais, que acham difícil aceitar em seus filhos
comportamentos impulsivos.

2.3.1. Evidências Empíricas dos Efeitos da Interação Mãe-filho

Há algum tempo os psicólogos se preocupam com a interação mãe-filho (I-M-F) nos


primeiros meses e anos de vida como determinante fundamental de certas
características de personalidade, mais ou menos permanentes, que se manifestam no
processo de desenvolvimento da criança.

Tão grande seria a influência destas primeiras experiências, que a ausência materna
motivada por morte, abandono, guerra, hospitalização (da própria mãe ou da criança)
levaria, sem dúvida, a distúrbios graves no processo de desenvolvimento da
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personalidade, conforme mostram os estudos detalhados de Freud e Burlingham (1949),
feitos com crianças separadas dos pais e colocadas nos abrigos antiaéreos em Londres,
durante a 2ª Guerra Mundial.

Os distúrbios ocorriam em todos os aspectos da vida da criança em que o componente


afetivo é o “motor do desenvolvimento”. Entre esses aspectos, Anna Freud cita a
aprendizagem da linguagem e da noção de propriedade nos primeiros dois anos de vida.

Spitz (1945) chama a atenção para os atrasos de desenvolvimento que ocorrem em


crianças institucionalizadas, atrasos estes que o autor atribui à ausência de contado,
ausência de afetividade, ausência, enfim, da figura materna.

Baseado em pesquisas com crianças adotadas após um período prolongado de


institucionalização (em torno de 30 meses) na infância inicial, Goldfarb (1945) afirma que
este período, no qual as crianças recebem menos afeto e menos estimulação do que as
crianças criadas no lar, é profundamente pernicioso para seu desenvolvimento
psicológico.

Existe, ainda segundo Goldfarb, evidência da persistência deste efeito nocivo, mesmo
após a colocação destas crianças em lares adotivos selecionados, com supervisão de
pessoal especializado e em alguns casos até com tratamento psiquiátrico.

A experiência inicial com alto grau de privação (afetiva, social e de estimulação


intelectual) na criança institucionalizada resulta, aparentemente, numa fixação quase
constitucional nos níveis mais primitivos de comportamento conceitual e emocional;
ausência de desenvolvimento na organização emocional, relacionamento social e na
habilidade intelectual. Ocorre ainda uma passividade generalizada na personalidade, tão
forte que impede a criança de se beneficiar com novos tipos de estímulos fornecidos pelo
ambiente, incluindo os de relacionamento humano, e assim as reações emocionais e
intelectuais iniciais se mantêm durante toda a infância e mesmo na adolescência.

Estudos deste tipo despertaram nos psicólogos, das mais diversas formações teóricas,
o interesse e a necessidade de pesquisar, de observar e identificar quais os fatores
presentes neste relacionamento mãe-filho, que determinam o subseqüente
desenvolvimento de características de personalidade, ou, mais especificamente, do
repertório de comportamento da criança.

Deu-se uma grande ênfase à influência que a personalidade da mãe exerce na da


criança, uma vez que esta é ainda pouco estruturada.

Podemos citar nesta linha, que Cadwell e Hersher (1964) chamam de modelo teórico
monádico (isto é, unidirecional) de I-M-F, o estudo longitudinal conduzido no Fells
Institute (Badwin, Kalhorn e Breeze, 1945), que enfatiza a influência dos pais, seu nível
sócio-cultural, local de residência (cidade, campo), idade, práticas de crianças adotadas,
como determinantes de algumas características de personalidade da criança.

Na literatura especializada, Freud (1962) é considerado o introdutor do tema na


Psicologia, pois teria mostrado como os padrões de conduta dos pais concorrem para a
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formação de ansiedades e neuroses. Mais recentemente, outros representantes da linha
psicanalítica podem ser citados. De um lado Erikson (1972) ressaltou a importância do
tipo de atmosfera emocional criada pelos pais, no lar, desde a mais tenra idade, como
fundamental para o desenvolvimento de uma personalidade saudável, bem estruturada.
De outro, Melanie Klein (1973) salientou o tipo de relacionamento criança-seio que, no
decorrer do primeiro ano de vida, lentamente se transforma na relação mais complexa,
criança-mãe, como a base para um desenvolvimento saudável ou patológico da
personalidade.

Psicólogos da linha da aprendizagem social, por exemplo, Mussen, Conger e Kagan


(1974), também atribuem importância ao tipo de atmosfera oferecida pelos pais como
determinante, nos filhos, de uma personalidade adaptada à sociedade, ou, por outro lado,
não adaptada, com a presença de ansiedades, dificuldades de relacionamento, etc.

As afirmações de Mussen, Conger e Kagan baseiam-se em trabalhos anteriores,


principalmente no modelo circunplexo de comportamento materno proposto por Schaefer
em 1959. Este autor, considerando que a experiência global da criança é o fator
realmente importante no desenvolvimento da personalidade, realizou duas pesquisas no
sentido de classificar o comportamento das mães em relação a seus filhos do ponto de
vista emocional e social.

Na primeira pesquisa registrou, através do método de observação direta, o


comportamento de 56 mães em interação com seus filhos de 1 mês a 3 anos de idade e,
na segunda, realizou entrevistas domiciliares com 34 mães de crianças cujas idades
variavam de 9 a 14 anos.

Os resultados da primeira pesquisa, que foram confirmados pela segunda, levaram


Schaefer a propor duas dimensões bipolares de comportamento materno, quais sejam:
autonomia x controle e amor x hostilidade.

A primeira dimensão seria representada por autonomia num dos extremos e ansiedade
materna, intromissão preocupação com a saúde, exigência para realização, excessivo
contato, promoção de dependência e envolvimento emocional, no outro. O extremo
positivo da segunda dimensão seria avaliação positiva da criança, igualitarismo e
expressão de afeto; e o negativo seria ignorar, punir, usar de rigidez e do medo para
controlar a irritabilidade.

Mussen, Conger e Kagan mantêm a designação de autonomia x controle para primeira


dimensão, mas preferem usar aceitação x rejeição para a segunda, caracterizando os
pais que aceitam a criança como aqueles que, criando uma atmosfera democrática, de
respeito à personalidade da criança, e em que predominam práticas disciplinares de
explicação e reforço, tendem a promover o desenvolvimento de uma criança segura, com
bom ajustamento, etc. Já os pais situados no outro extremo da escala, os rejeitadores,
ou seja, hostis em relação à criança, que fazem grande uso de punição física, tendem a
promover o desenvolvimento de uma criança ansiosa, insegura e com dificuldade da
adaptação social.
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Nesta mesma linha de investigação de comportamentos molares, embora reconhecendo
que “as crianças vêm ao mundo com fortes predisposições genéticas” e que “as crianças
interagem com seus pais e não são simplesmente as vítimas inocentes dos adultos”,
Munsinger, já em 1971, mostrou como diferentes práticas disciplinares adotadas pelos
pais levam a diferentes tipos de personalidade emergente nas crianças.

Baseado também no trabalho de Schaefer, considera como dimensões fundamentais


destas práticas as dicotomias:

Amor (mãe afetiva, aprovadora, compreensiva, que aceita a criança, usa exemplos e
explicações na disciplina, dá respostas positivas aos comportamentos de dependência)
x hostilidade (mãe rejeitadora, fria, desaprovadora, autocentralizada, usa punição física
e reforço negativo) e controle (muitas restrições, rigidez) x autonomia (promoção de
independência).

Segundo esse autor, várias combinações dessas categorias resultam em traços


específicos de personalidade na criança. Assim, quando os pais usam amor e controle
“produzem” uma criança submissa, dependente, polida, obediente, que é vista e não
ouvida e que tem pouca criatividade. Quando usam hostilidade e controle levam ao
desenvolvimento de um comportamento neurótico, dificuldade de adaptação social, auto-
agressão, baixo nível de heteroagressividade, pobre autoconceito e sentimentos de
culpa.

Os do grupo autonomia-amor tendem a produzir “a criança ideal”: boa adaptação social,


criativa, agressividade adequada, independente, simpática.

Já uma atitude de hostilidade-autonomia desenvolve comportamento delinqüente: alta


agressividade, pouco respeito pela autoridade, ausência de controles internos, ausência
de culpa.

Na área do desenvolvimento cognitivo, Tulkin e Kagan (1972) consideram que, embora


os psicólogos estejam levando a sério a idéia de que as experiências da infância podem
influenciar o desenvolvimento, as relações funcionais especificas entre as experiências
iniciais e os estilos cognitivos permanecem desconhecidas.

Examinando as experiências específicas de crianças pertencentes a diferentes classes


sociais, verificaram que mães de classe média se envolvem mais sem interações verbais
com seus filhos e provêm maior variedade de estimulação. Verificaram ainda que as
diferenças de comportamento materno encontradas situam-se mais na área de
interações verbais e estimulação cognitiva, havendo diferenças mínimas nos aspectos
afetivos da interação.

Também Campbell (1973) refere-se a vários estudos recentes que focalizaram as


relações entre tipos de interação pais-criança e características cognitivas particulares da
criança. De forma geral, os resultados indicam que intromissão dos pais impede o
desenvolvimento da habilidade espacial (Bing, 1963), do controle da atenção (Bee, 1967)
e de um estilo cognitivo independente do campo (Dyk e Witkin, 1965).
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Quando estudou I-M-F numa situação de resolução de problema, Bing descobriu que
mães de crianças com alto nível de capacidade verbal eram mais diretivas do que mães
de crianças cujo nível da habilidade espacial era mais elevado.

Usando procedimento similar, Bee verificou que pais de crianças dispersivas ofereciam
mais direção e estruturação do que pais de crianças não dispersivas.

Dik e Winkin verificaram que crianças menos diferenciadas em vários aspectos do


funcionamento cognitivo, quais sejam controle de impulso e capacidade para
experiências articuladas, são filhos de mães menos diferenciadas nestes mesmos
aspectos.

Em suma, esse modelo monádico, que Bell chama de unidirecional, dá ênfase à maneira
como os adultos agem sobre a criança, não considerando a possibilidade de que a
influência seja recíproca. Nesse trabalho, Bell critica as teorias que enfatizam apenas o
papel dos pais no processo de socialização da criança, pois este tipo de abordagem
unidirecional de efeitos corre o risco de não reconhecer diferenças no comportamento
dos pais devidas a características congênitas da criança (diferenças de comportamento
entre grupos de pais foram atribuídas aos efeitos exercidos sobre eles por uma limitação
na habilidade de lidar com o ambiente associada com desordens congênitas da criança
afetada).

O processo de interação pais-criança é complexo e depende de inúmeras variáveis. A


esse propósito nos parece pertinente lembrar que, já em 1959, Peterson e colaboradores
chamaram a atenção para o fato de que o comportamento infantil é condicionado pela
interação de múltiplos fatores e para a dificuldade conseqüente de defini-los, mensurá-
los e estabelecer o grau de influência de um ou outro.

Se por um lado, o comportamento infantil pode ser atribuído a múltiplas causas, o mesmo
pode ser dito do comportamento dos pais. Estes, sujeitos a vivências e tensões oriundas
de várias fontes, irão atuar sobre seus filhos, em função das características diferenciais
de cada um deles e das circunstâncias especiais que estejam vivenciando.

• Caso Hans

A partir deste texto, ficou claro para os psicanalistas, a compreensão da linguagem


préverbal (fantasias, jogos, brincadeiras), como eles fariam este trabalho.

Hans tinha cinco anos, quando começou a apresentar a zoofobia, no caso, o medo dos
cavalos, este é o sintoma da Hans. Só que o método de Freud foi modificado, pois o pai
de Hans era paciente dele. Na verdade, funcionava mais como uma supervisão, uma vez
que Freud só entrou em contato com o menino apenas uma vez. Depois desta entrevista,
Hans apresentou melhoras. Tem um momento em que ele começa a produzir mais por
saber que seu pai levaria os conteúdos para Freud.

• Histórico:
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Até a referida idade, Hans era uma criança alegre, não tinha passado por nenhuma
vivência traumática que pudesse ter gerado o sintoma. Quando tinha cerca de 3/5 anos
quando começa a fazer perguntas, sobre a “coisinha de fazer pipi”, pergunta à mãe se
as mulheres também tinham e ela lhe responde que sim. Ou seja, ela não fala da
diferença sexual e reprime a atividade masturbatória (ameaça cortar o pipi dele ou atar
as mãos).

Logo depois, a mãe do Hans engravida e ao perguntá-la sobre a barriga, ela lhe conta a
história da cegonha.

Antes de se instalar o sintoma, ocorre alterações de humor, crises depressivas, oscilação


emocional, ansiedade, insônia. Estes são sinais da instalação de um sintoma, tanto que
depois, seus familiares começam a ficar alertados.

O Hans apresenta os sintomas na rua, achando que não veria a mãe em casa. E depois,
mesmo saindo com a mãe, tem uma nova crise. Um dia, após ter saído com o pai, vê um
cavalo caindo no chão e esperneando. A partir daí, começa a fobia dele. Já não quer sair
de casa, pois tem medo de cavalos.

Em outra situação, num campo, ele estava com uma amiguinha, o pai diz para ela para
não colocar a mão na boca do cavalo, pois este pode morder. Paralelamente a isso, o
Hans adoece, tem uma gripe forte (somatiza) e tira as amídalas.

Freud não trabalha esta questão da cirurgia. No entanto, esta para Hans, cortar as
amídalas, seria uma ameaça de castração. Poderia então, na cabeça dele, cortar
também o seu pipi. Foi para ele, uma vivencia de castração.

Muitas coisas que hoje se perguntaria ao pai do Hans, não foi investigado, naquela
época, por Freud e que teria ajudado na compreensão do caso. Aberastury vai falar disso.

Quando Hans chegou a Freud, ele estava na fase fálica, não foi investigadas a fase oral
nem a gravidez da mãe, somente a fase anal, pela queixa que o pai do Hans trazia de
constipação do filho, devido a um controle severo da mãe. Percebe-se que ele resistia
bastante a submeter-se ao controle esfincteriano.

• Interpretação de Freud – sobre o cavalo:

Hans desenha o cavalo com uma sombra preta e óculos, sendo que o pai de Hans tinha
bigodes e usava óculos. De certo modo, o cavalo para ele representava a figura do pai
(triângulo edípico, que o afastaria da relação inicial com a mãe). O medo de o cavalo
morder está associado à prática da masturbação, a ameaça de castração. Por outro lado,
Hans estava muito ligado a mãe e a sua fobia progrediu tanto, que já não dormia no
quarto, com medo do cavalo entrar lá.

Freud conclui que o medo do objeto fóbico, a saber, o cavalo, é um deslocamento do


medo do pai, na fantasia de ser castrado por este. No deslocamento, nomeia-se um
objeto em prol daquele objeto que não pode ser denominado como fóbico (pai).
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• A cirurgia da amídala

Está referida à castração e ele, em sua fantasia, desloca a sua visão do médico, a
imagem de um cavalo branco. Quando ele se masturbava; a mãe lhe dizia que ia castrá-
lo ou atar-lhe as mãos e o pai da amiguinha, por sua vez diz que o cavalo morde as
mãos. Então, o morder do cavalo está associado à masturbação.

• Identificação ao Pai

É mostrada através da sua identificação ao cavalo, quando diz que este esperneava, pois
costumava reagir deste modo quando não queria ir ao peniquinho. Ou quando desenhava
o cavalo com uma mancha, que fazia lembrar um bigode. Neste desenho, Freud chama
Hans e dá uma interpretação: da fobia do cavalo ser derivado do seu amor pela mãe.
Bem como do seu medo e amor por seu pai. Hans a partir daí, vai fazer uma elaboração
destes temas. A criança apesar de não conseguir verbalizar, entende o que se diz para
ela.

• Gravidez da mãe

Freud percebe que as crianças são capazes de perceber a gravidez da mãe, o próprio
Hans começou a apresentar os sintomas, no começo da gravidez dela. Isso foi uma
surpresa para ele. Uma vez que todas as brincadeiras dele têm a ver com carregar e
descarregar (gravidez).

Na brincadeira, Hans também comunica aos pais, além de elaborar, a gravidez da mãe.
Mostra que ele já está vivendo a situação, mesmo que os pais tenham tentado esconder.

Quando a mãe entra em trabalho de parto, os ruídos da mãe são percebidos como uma
tosse, porém quando ele entra no quarto, vê uma bacia com sangue e a mãe deitada na
cama. Essas mensagens contraditórias contribuem para o nascimento da neurose. A sua
concepção da cegonha não condizia com o que ele via.

Hans diz que o pipi da sua mãe tinha sangrado e que o dele não. Depois percebe que
sua irmã também não tem, ou seja, reforça a hipótese da mãe que todos possuem um
pênis, e que sua irmã foi castrada (ameaça). Nesta época, Freud nem havia pensado na
questão da transferência.

• Anna Freud

Nasceu em 1895, no ano em que nasceu a Psicanálise. Bleuer, seu amigo e médico,
concluiu como Freud, que as pessoas falavam, trazendo as lembranças que originavam
o sintoma. Inicialmente, utilizavam a hipnose, com essa função.
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Freud, segundo Bleuer, ficou um pouco decepcionado, de ter nascido uma menina. Esta
por sua vez, tinha interesse intelectual, que era considerado pela época como uma
característica masculina.

Anna Freud foi uma mulher com características diferentes das mulheres de sua época,
desenvolveu um afeto maior com o pai, cuidou dele até sua morte.

Fez análise com Freud, pois a sociedade vienense só permitia analistas que fizesse
análise com pessoas da sociedade. Começou atendendo adultos, Dorothy tinha quatro
filhos, que ela também atende e depois, amigos destas crianças.

Traça um paralelo com os adultos e as crianças em terapia. Sua primeira colocação foi
a de que, para trabalhar com crianças é necessária uma preparação, que ela chama de:

• 1º Passo: Treinamento ou Esquentamento.

Quando a criança desenvolve um sintoma, ela não tem essa compreensão do que está
acontecendo, de que o sintoma está atrelado ao momento atual. Ou seja, as pessoas a
sua volta começam a perceber a diferença no humor, por exemplo, perturbar a aula toda,
não ficar parada, etc. Ela pode até achar engraçado, pois não tem consciência do que
está acontecendo, como vê os adultos.

O primeiro passo seria mostrar a criança por que ela está em tratamento, ou seja,
conscientizá-la de que se os pais procuraram um tratamento, é por algum motivo. O
tratamento deve levá-la a um insight a respeito da própria doença.

Anna possui uma postura bastante pedagógica, o que se faz é bem semelhante, mas
não no sentido de uma preparação. O tratamento leva as crianças a compreenderem
que, se elas vão ali é para tratarem suas próprias questões.

• 2º Passo: Aliança.

A aliança se faz no sentido de que o analista e a criança vão tentar resolver o problema,
que ela saiba qual é o papel do analista e o que eles vão fazer.

O primeiro momento do insight é que a criança vai poder decidir ou não pelo tratamento,
através do conhecimento maior do que se trata a terapia. Por isso, a criança deve
explorar o ambiente, que deve ser propício. A partir disso, faz-se uma aliança com ela,
deixando claro, de que nem sempre vão acontecer coisas agradáveis ali, mas que são
necessárias para que ela se cure.
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• 3º passo: Falar da importância da cura.

Mostrar para a criança que ela pode ter uma expectativa positiva do tratamento.

Existem sintomas que não incomodam tanto a criança e mais os pais, como por exemplo,
tirar notas baixas, ser agitada na escola, etc. Ela também pode ter um ganho com esses
sintomas, pois percebe que incomoda aos outros, principalmente os pais, chama atenção
deles para si. E outros sintomas que realmente os incomoda, como terror noturno, fobias,
encoprese noturna, principalmente se for uma criança maior, por volta dos seus sete
anos de idade.

Quando não tem um sofrimento da criança, Anna Freud, considera importante que a
criança perceba o sofrimento que ela está impondo aos outros, as conseqüências do seu
sintoma. Bem como, a conseqüência do tratamento, o que se busca com ele.

• Papel do Analista

Segundo a autora, o papel do analista seria o de induzir a criança uma confiança,


espontaneidade. Isso implica, muitas vezes, em fazer alianças mesmo contra os pais,
como em alguns casos. O analista ficaria com o controle da situação e atuaria como o
superego da criança. Vai falar que, quanto melhor a relação com os pais pior a ligação
com o analista e vice-versa.

No final, vai trabalhar os pais concomitantemente.

Em outras palavras, o superego da criança está em formação e se dá na relação com os


pais. Quando estes possuem valores desestruturados ou repressores, agressivos, o
mecanismo seria o de fazer uma aliança com a criança contra os pais. Por exemplo, se
os pais não deixam a criança se sujar, a analista vai induzi-la a fazê-lo. O que resultaria
num afastamento dos pais e, conseqüentemente, o analista passaria a ter maior
influência sobre a criança.

Essa aliança é fator complicador ao tratamento, pois os pais acabam tirando a criança
do tratamento. Na realidade, a aliança visa fazer o vínculo maior com a criança e diminuir
a influência dos pais da mesma. A função do analista seria a de influenciar a
reestruturação da criança.

Para Anna Freud, ceder aos caprichos da criança é considerado útil para o tratamento.
Fala em analista útil, ou seja, que faz coisas que a criança demanda, tornando-se útil
para ela, por ceder aos seus caprichos. Uma vez que o vínculo está estabelecido, é que
o analista vai colocando, aos poucos os limites, pedir para que ela faça suas próprias
coisas. Aqui começa o que vai denominar de processo analítico.

Resumindo, a função do analista seria a de fazer com que a criança se entregue, que
não resista ao tratamento, que traga sonhos, etc. Em fim, que ela invista o máximo no
tratamento.
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• Associação Livre/Transferência.

Considera que a criança não tem como associar livremente, mas que ela possa ser
dirigida a isso. Não acredita no vínculo transferencial, uma vez que para ela, a criança
ainda está muito ligada nas suas primeiras relações de amor, que são seus pais, ou quem
cuida dela.

Apesar disto, Anna Freud acha que o analista deve possuir métodos para que a criança
fale e com que possa se estabelecer uma relação, ainda que não de transferência.

• Métodos
• 1º método: Interpretação dos Sonhos.

Este seria, segundo ela o principal método para se trabalhar, o analista deve mostrar
interesse na interpretação dos sonhos, mostrar a sua importância. Os sonhos infantis
são mais fáceis de serem interpretados do que o dos adultos, pois possuem menos
censura. E a criança acha divertido falar dos sonhos e daquilo que está pensando ou
vivendo. Muitas vezes, nem precisa ter uma estrutura intelectual muito desenvolvida para
que a criança possa fazer este trabalho.

• 2º método: Devaneios ou sonhos diurnos.

Os adultos têm mais vergonha em falar das fantasias, devaneios (imaginam que tem o
controle sob ela e tem vergonha por isso). A criança não tem vergonha da sua fantasia,
não tem tanta censura.

• Fala de três tipos de devaneios:

1. Baseados em acontecimentos recentes.


2. Devaneios em série.
3. Mudanças de situações e personalidades, mas conservam o tema, por exemplo,
bom/mal, mocinho/bandido...

• 3ª método: Desenho

Este é fundamental para a sua comunicação para fazer a criança falar. Anna Freud não
interpreta o desenho, antes a sua preocupação é com o tema trazido, o que a criança diz
a respeito do desenho, o que ela está comunicando.

Os desenhos nem sempre vão estar presentes na terapia, já os sonhos sim, portanto,
estes só podem ser interpretados esporadicamente.
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• A análise e a Educação

Essa é a principal diferença entre a análise da criança e do adulto, pois a análise da


criança vai ter uma abordagem pedagógica, sendo que o analista vai ocupar o lugar de
educador na análise. Os motivos pelos quais, Anna Freud defende esse tipo de
abordagem seriam:

Imaturidade do Ego.
Superego em estruturação.

O adulto em análise consegue dar uma direção aos impulsos conflitivos do Id, do Ego e
do Superego. Já a criança não está ainda estruturada, a neurose infantil é uma ocorrência
interna, mais existe uma influência externa muito grande para que ela se instale. As
mesmas pessoas que cuidam dela são as que a influenciam a ponto de fazer com que a
doença se instale, ela ainda está internalizando os modelos dos pais. Enquanto no
adulto, já passou por este processo, sendo que a neurose é basicamente interna.

A neurose na criança se dá muito em criança função do meio externo, uma resposta à


demanda dos pais e é lugar de objeto amado que o analista vai tentar reverter esse
processo.

O analista para Anna Freud tem que se colocar no lugar do Ego ideal dos pais e ainda,
ter uma autoridade maior que a deles. Diz que esta postura do analista pode gerar
problemas, mas se eles aprenderem algo com a doença da criança, vão permitir o
trabalho. Senão, pode haver uma rivalidade entre os pais e o analista. Por este motivo,
é muito importante que o analista crie um vínculo de confiança também com os pais.

• Vantagens de se trabalhar com crianças

1. Em relação ao ambiente: no caso do adulto, não se tem um acesso ao ambiente, só


se for no caso de psicose. No trabalho com crianças, o psicanalista pode ir a escola,
chamar o pai, a mãe, a babá... Pode falar com o professor, se achar necessário.
Esses acessos não são proibidos e ainda há a possibilidade de dar orientações aos
pais, etc.

2. É um processo mais rápido: como a criança tem poucos anos de vida, precisará fazer
um percurso menor do que o adulto, este tem mais o que reconstruir da sua história.
A criança, de um modo geral, está mais propensa a investir, transformar, enquanto
que o adulto está mais arraigado aos seus mecanismos de defesas.

3. Atenuação do Superego: é mais fácil no trabalho com crianças, de desmontar as


repressões, por não estar completamente estruturado, no adulto é mais difícil. Ao se
trabalhar a criança, as suas relações também tendem a mudar. A criança aqui é vista
como um agente transformador.

• Melanie Klein
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Interessou-se por psicanálise na época da 1ª Guerra, principalmente em psicanálise com


crianças. Foi para Berlim e desenvolveu sua teoria com Anna Freud. Sua teoria
apresentou uma série de divergências com a psicanálise e houve até uma tentativa de
expulsá-la da Sociedade Britânica de Psicanálise.

Freud impediu o conflito entre ela e sua filha, Anna, evitando o rastreamento da
psicanálise. No entanto, não houve uma aproximação direta de Melanie Klein com Freud.
Conseguiu divulgar bastante a sua teoria, que deu a origem a chamada Escola Inglesa
(Psicologia do Ego).

O importante da teoria kleiniana é baseado, principalmente nestas divergências, são elas:


Divergência: Angústia Principal. Essa angústia seria o motor para o desenvolvimento
psicológico da criança. Gerada por pulsões agressivas e sádicas que a criança traz
desde o momento que nasce. Estas pulsões seriam regidas pelas pulsões de morte,
enquanto que, as pulsões libidinais seriam regidas pelas pulsões de vida.

Como a criança tem estas pulsões como motor, faz uma relação com a mãe, parcial, a
princípio. Vai se relacionar com a mãe através do seio, não biológico, mas fantasmático,
criado, percebido pelas fantasias. Fala de pessoas corporais, sendo este corpo, porém,
sempre fantasmático, ou seja, criado nas fantasia projetas neste.

A criança tende a projetar as pulsões agressivas no seio da mãe, independentemente do


que foi oferecido a ela (aqui difere de Winnicott). Defende-se, projetando as suas pulsões
agressivas, embora na verdade, a ameaça é do seu próprio mundo interno. Logo, esse
seio vai se tornar ameaçador para ela, precisando se defender dessa ameaça, vai
produzir mecanismos de defesa, são eles:

1. Splilling – divisão - dissociação: transforma o seio em dois, dissocia em seio bom e


seio mau. Este é constituído a partir das pulsões agressivas e as pulsões libidinais. O
que é passado de positivo pelo seio bom é introjetado como experiências boas, como
amor, conforto, etc.

2. Conceito de conflito: para Freud é o impasse entre o desejo inconsciente e a defesa,


enquanto para Melanie Klein, seria a relação de amor e ódio, para com os objetos
internos. A luta para ela é dos objetos internos e não externos como defende Freud.

3. Fases do Desenvolvimento: Freud coloca como uma questão evolutiva, biológica.


Melanie Klein afasta totalmente essa idéia, para ela essas fases se sobrepõe, não
coloca as pulsões como prioritárias nas fases orais, anais, fálica e latência, como
defende Freud. Antes substitui as fases do desenvolvimento pelo que vai chamar de
posições, são elas:

1. Posição Esquiso-paranóide: É a posição das crianças ao nascer até os 3 meses de


idade. Nesta fase, as crianças fazem uma dissociação, divisão do objeto em dois:
seio bom e seio mau, por exemplo, nas brincadeiras, na clínica, dissocia o mocinho
do bandido, o bem do mau. Esse mecanismo vai estar sempre em ação e é
necessário nesta fase, mas não poderá ficar na dissociação para o resto da vida,
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pois tal processo, caracterizaria a patologia. Ocorre o mecanismo da projeção e da
introjeção, onde vai projetar os impulsos agressivos e introjetar os objetos maus,
causando angústia.

2. Posição Depressiva (a partir dos 3 meses): Quando o desenvolvimento da criança


vai avançando, ela passa a ter a capacidade de integrar esses objetos parciais para
percebê-los como objetos totais. Quando entra na posição dispersiva, começa a
perceber a mãe como objeto bom e mau. Vai ter nesta posição, a angústia
dispersiva, por que vai sentir a ausência do objeto, que não é só dela e que em
determinados momentos vai se afastar.

A perda do objeto é sentida como ameaça e culpa, a angústia dispersiva se dá pela


projeção da agressividade, a criança se sente culpada, por achar que pode destruir esse
objeto de amor, a levando então, ao sentimento de angústia. Com mais ou menos 3
meses, a criança começa a se separar da mãe, passa a controlar seus impulsos
agressivos (fantasias de destruição). E com isso vai formar o Superego, este para a
autora vem antes do complexo de Édipo, diferentemente, de Freud.

• Superego – para Melanie Klein, é um movimento interno, que parte do psiquismo do


indivíduo e não algo que vem da cultura, da lei, como defende Freud. Essa culpa vai
gerar o superego sádico ou aterrorizante, bem como o superego benevolente. Esse
superego precoce surge no primeiro ano de vida, enquanto que para Freud se forma
no período fálico.

Dois aspectos do Superego:

• Superego sádico – quando o bebê projeta os impulsos agressivos e a culpa, que faz
com que a criança os controle. Vai implicar em um superego, só que a criança também
tem objetos bons que ela introjeta, o que equivale ao superego benevolente.
• Superego benevolente – quando introjeta objetos bons, pulsões libidinais,
sentimentos de amor.

Quanto maior a culpa, maior a agressividade, mais sádico o superego.

Outro aspecto importante na posição depressiva é o luto. A criança começa a lidar com
a perda do objeto, que era sentida a princípio, como uma ameaça. No luto vai elaborar a
perda, buscando substitutos, já a melancolia, a perda é total, a perda do objeto é a perda
do eu.

A criança vive inicialmente o luto, tentando elaborar a ausência do objeto, esperando


sem tanta angústia que o objeto volte, neste momento, ela já pode elaborar o luto de
alguma forma.

Na posição depressiva, a criança usa uma defesa maníaca para não sofrer a perda, ela
se sente impotente e despreza o objeto para não senti-la.

• Complexo de Édipo Precoce


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Acontece também na posição depressiva, porém a formação do superego vem antes. O
bebê já percebe a diferença sexual, através da fantasia, através da relação dos pais, das
sensações clitoriais da menina e no pênis do menino. Para ela é como se os dois fossem
um só, uma figura combinada – mãe com pênis do pai. Como se no interior da mãe
tivesse o corpo do pai.

A criança tem um desejo inconsciente de penetrar no corpo da mãe e se encontra ainda


em adultos que tem a fantasia de querer penetrar tudo na vida dos outros. Essas
fantasias criam um ciúme destrutivo, faz com que tente uma separação desse corpo
combinado.

A menina vai ter acesso ao pênis do pai e o menino também. Faz uma identificação com
o corpo materno que contém o corpo do pai. O ciúme gera culpa, que a leva a controlar
os impulsos destrutivos, a fim de preservar os objetos amados. Esta é a resolução do
Complexo de Édipo para Melanie Klein.

Outro aspecto que se observa é a reparação, que a criança vai tentar destruir e depois
reparar. Ela tentar reparar por que já tem o ego estruturado e para manter os objetos de
amor.

Crítica: um pai que não seja presente, a criança não vai combinar as figuras e o ciúme
vai ser mais fraco. Para que ela fantasie, alguma coisa tem que acontecer de fato, não
somente de origem interna, mas também no meio.

• Teoria da Inveja

Melanie Klein vai falar da inveja primária ou inata ou endógena, na idealização do objeto.
Os impulsos agressivos são projetados no objeto amado, essa reação agressiva ao
objeto provedor é explicada pela teoria da inveja uma vez que é algo fora do controle, é
inato e interno.

Quando a criança está fazendo a dissociação, ela idealiza, esta por sua vez se acentua
e a faz projetar os impulsos agressivos pela idealização do bom. Vai acentuar a inveja
que deforma o objeto, introjetando mais o objeto mal. A criança, com isso, vai se sentir
ameaçada e vai necessitar de um controle muito grande, vai se tornar um adulto que
destrói tudo o que vê de bom. O que na verdade pode comprometer é o não
reconhecimento dos aspectos negativos dentro de si.

A inveja, segundo Melanie Klein, vai aparecer associada com o ciúme e da voracidade
em relação ao que o outro quer dar.

Ciúme: Implica numa tríade. Um objeto que alguém acha que o outro vai tirá-lo. Algumas
vezes, a pessoa diz que está sentindo ciúmes, porém o sentimento de base é a inveja.

Exemplo: relação amorosa, o namorado diz que foi ela que quis provocar ciúmes, que
ela que fez acontecer, etc.
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Voracidade: tem a ver com a inveja, vai tentar encobri-la. Quando um quer esvaziar o
outro dos seus aspectos bons, pois na sua fantasia, esse outro vai deixar de ter esses
aspectos bons que ele não tem.

• A inveja pode provocar:

A permanência da dissociação por muito tempo, por exemplo, o adulto que inveja o outro,
o vorácico: que suga o outro pela inveja que tem, o que dá tudo, impedindo o crescimento
do outro;

Fuga da mãe para outras pessoas;


Desvalorização do objeto;
O objeto externo criado pelo bebê é introjetado.

Procurar despertar inveja em outras pessoas. Daí, não precisa se deparar com a própria
inveja. Sufocar sentimentos de inveja junto com o sentimento de amor – indiferença
(formar vínculo através da indiferença). É melhor não gostar tanto do outro para não
correr o risco de sofrer, ser destruído na relação. Acting Out – atuação. Está na ação o
tempo todo sem se dar conta, quando vê, já fez.

REFERÊNCIAS

DOLTO, Françoise. Seminário de Psicanálise de Crianças. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed.


Guanabara, 1985.

DUARTE, Inúbia e Castro. A prática da psicoterapia infantil. Artes Médicas. POA,


1993.

ABERASTURY, Arminda. Psicanálise da criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1982.

COPPOLILLO, Henri. A prática de psicoterapia infatil. Porto Alegre: Artes Médicas,


1989. Psicoterapia psicodinâmica de crianças. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

SANDLER, Joseph. Técnica da psicanálise infantil. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

OAKLANDER, Violet. Descobrindo crianças. São Paulo: Summus, 1980.

RIZZI, Leonor. As atividades lúdicas na educação da criança. Ed. Ática.

FREUD, Sigmund. Introdução ao narcisismo. Edição Standard das Obras Completas


Psicológicas de Sigmund Freud, Rio de Janeiro: Imago, 1987 v. XIV. Além do princípio
do prazer. In ESB. 1920. v. XVII Caso clínico e análise. In ESB. v. X.
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QUESTIONÁRIO PARA FIXAÇÃO DA MATÉRIA / UNIDADE

1. Como psicanalista, quais são as técnicas aconselháveis no trato com crianças?


Explique cada uma.

2. Após estudar a linha de trabalho de cada terapeuta citado na apostila, faça a


diferença/ou pontos principais no trabalho desenvolvido por cada um em forma de
resenha. (Gentileza não fazer copia da apostila, use-a como referencial).

3. “Depois de algum tempo, você aprende a diferença entre dar a mão e acorrentar uma
alma. E você aprende que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre
significa segurança. E começa a aprender que beijos não são contratos e que
presentes não são promessas. E começa a aceitar suas derrotas com a cabeça
erguida e os olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma
criança. E aprende a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do
amanha é incerto demais para os planos; e o futuro tem costume de cair em meio ao
vão.

Depois de algum tempo você aprende que o sol queima se ficar exposto a ele por muito
tempo. E aprende que não importa o quanto você se importe, algumas pessoas
simplesmente não se importam. E aceita que não importa quão boa seja uma pessoa,
ela vai feri-lo de vez em quando e você precisa perdoá-la por isso. Aprende que falar
pode aliviar dores emocionais. Descobre que se levam anos para construir confiança
e apenas segundos para destruí-la, e que você pode fazer coisas em um instante, das
quais se arrependerá pelo resto da vida.

Aprende que as verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias.


E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida. E que
bons amigos são a família que os permitiram escolher. Aprende que não temos de
mudar de amigos, se compreendermos que os amigos mudam. Percebe que o seu
melhor amigo e você podem fazem qualquer coisa, ou nada, e terem bons momentos
juntos. Descobre que as pessoas com quem você mais se importa na vida são
tomadas de você muito depressa. Por isso sempre devemos deixar as pessoas que
amamos com palavras amorosas, pode ser a última vez que as vejamos.
Aprende que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, mas nós somos
responsáveis por nós mesmos. Começa a aprender que não se deve comparar com
os outros, mas com o melhor que podemos ser. Descobre que se leva muito tempo
para se tornar a pessoa que se quer ser, e que o tempo é curto. Aprende que não
importa aonde já chegou, mas onde está indo, mas se você não sabe onde está indo,
qualquer lugar serve. Aprende que ou você controla os seus atos ou eles o controlarão;
e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter
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personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre
existe dois lados. Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário
fazer, enfrentando as conseqüências. Aprende que paciência requer muita prática.
Descobre que algumas vezes a pessoa que você espera que o chute, quando você vai
cair, é uma das poucas que a ajuda a levantar. Aprende que maturidade tem mais
haver com os tipos de experiências que se teve e o que você aprendeu com elas, que
com quantos aniversários você já celebrou. Aprende que há mais de seus pais em você
do que você supunha. Aprende que nunca se deve dizer a uma criança que seus
sonhos são bobagens, poucas coisas são tão humilhantes que seria uma tragédia se
ela acreditasse nisso. Aprende que quando está com raiva você tem o direito de estar
com raiva, mas isso não lhe dá o direito de ser cruel. Descobre que só porque alguém
não o ama do jeito que você quer que ame, isso não significa que esse alguém não o
ame com tudo o que pode, pois existe pessoas que nos amam, mas, simplesmente não
sabem como demonstrar ou viver isso. Aprende que nem sempre é suficiente ser
perdoado por alguém, algumas vezes você tem que aprender a perdoar a si mesmo.
aprende que não importa em quantos pedaços o seu coração foi partido, o mundo não
pára para que você o conserte. Aprende que o tempo não é algo que possa voltar
atrás. Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, em vez de esperar que alguém
lhe traga flores.

E você aprende que realmente pode suportar, que realmente é forte, e que pode ir
muito mais longe, depois de pensar que não se pode mais. E que realmente a vida
tem valor e que você tem valor diante da vida.”
Shakespeare
Sem data para ser eterno

A partir do texto acima, faça uma análise psicanalítica em forma de resenha


(mínimo de duas laudas).

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