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Aula 1
Aula 1
Apresentação:
“A religião primitiva é diferente das formas mais elevadas do pensamento religioso, mas
não é irreligião. Ela pertence ao real e o exprime. Por detrás das aberrações contidas na
manifestação religiosa primitiva, esconde-se alguma necessidade humana, individual ou
coletiva. Assim, não há religião falsa, todas são verdadeiras a seu modo [...].
Por razões de método, deve-se tomar para estudo a religião primitiva: é preciso começar
pelo mais simples e, gradativamente, chegar ao mais complexo. Como todas as religiões
são comparáveis, há [...] elementos essenciais que lhe são comuns, não somente em seus
aspectos exteriores, mas nos mais profundos, permanentes e humanos: o conteúdo da
ideia de religião em geral”. Frase de Émile Durkheim , sociólogo francês, extraída do livro
“As formas elementares da Vida Religiosa”, lançado em 1912, em Paris.
Você já deve ter lido, em bons jornais, notícias sobre religião: festas católicas, santuários
religiosos, mobilizações políticas da bancada parlamentar evangélica, perseguições a
minorias religiosas no Brasil e em outros países etc.
Você parou para se perguntar o que todas essas notícias expressam? Podemos dizer que
esses exemplos divulgam a presença da religião como crença e como comportamento no
mundo atual.
Nesta aula, problemas você aprenderá mais sobre o caráter científico das Ciências da
Religião e os sobre os quais se debruça.
Objetivos:
Compreender as origens das Ciências da Religião.
Identificar o caráter acadêmico-científico das Ciências da Religião.
Analisar fatos e contextos básicos para as Ciências da Religião.
Premissa
As Ciências da Religião possuem suas origens em um século conturbado, violento,
cheio de mudanças sociais, econômicas, culturais, religiosas, políticas e morais.
Dois grandes pensadores desse século cunharam uma frase famosa: “Tudo o que
era sólido desmancha no ar, tudo o que era sagrado é profanado, e as pessoas são
finalmente forçadas a encarar friamente sua posição social e suas relações mútuas”.
(MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. Manifesto comunista. [s./l.])
Por isso você está convidado a conhecer escolas teóricas, autores e temas mais
fundamentais para não se perder na floresta dos estudos da religião.
Leitura
Você notará que os mitos contam histórias mágicas, nas quais a realidade não é
apresentada de forma racional e lógica, com cadeias causais. A realidade, podemos
dizer, é narrada pelo pensamento mítico-mágico como algo fantástico, incrível,
absurdo ou extraordinário. É uma forma de conhecimento do mundo baseada em
sensações, imagens hiperbólicas e na imagem do maravilhoso.
Notemos que esse pensamento mítico finca suas raízes em um longo período na
Grécia, talvez desde o século X a.C. (Antes da Era Comum, dez séculos antes do
nascimento de Cristo) até o século V d.C. (Depois da Era Comum).
Porque viveram em uma época anterior e Sócrates (469 a.C.-399 a.C.), um dos
maiores filósofos da história, nascido em Atenas, Grécia.
Sócrates não deixou nada escrito, mas seu discípulo, Platão (427 a.C. — 347 a.C.)
escreveu sobre seu mestre.
Saiba mais
Sócrates. Você sabia que a expressão “só sei que nada sei”, nunca foi dita
pelo filósofo de Atenas? Essa frase era uma inscrição no Templo de Delfos,
dedicado ao deus Apolo. Depois de visitar o Oráculo de Delfos, e ouvir uma
sacerdotisa (pitonisa), Sócrates adotou esse lema. O lema completo era:
“Conhece-te a ti mesmo e conhecerás todo o universo e os deuses, porque se o
que procuras não achares primeiro dentro de ti mesmo, não acharás em lugar
algum.” Mas não entenda esse lema como de busca interior, psicológica. Não
havia, naquela época, a ideia de subjetividade individual.
Quer saber mais? Leia o texto escrito por Platão, Apologia de Sócrates,
disponível em: http://www.revistaliteraria.com.br/ plataoapologia.pdf
<http://www.revistaliteraria.com.br/plataoapologia.pdf> , acesso em
05 fev. 2018. Esse texto é considerado um dos mais belos da Filosofia
ocidental.
Recomendamos ainda um bom livro para saber mais, com linguagem acessível
e popular: GHIRALDELLI JR, Paulo. Sócrates. Pensador e educador. A filosofia
do conhece-te a ti mesmo. São Paulo: Cortez, 2015.
Convidamos você a olhar esta imagem, uma famosa pintura da Renascença Italiana,
“A Escola de Atenas” (Scuola di Atenas, no original).
A escola de Atenas – Fonte: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Escola_de_Atenas.jpg
Foi pintada por Raffaello Sanzio (1483-1520) e ilustra a Academia de Platão,
composta entre 1509-1510 a partir de uma encomenda do Papa Júlio II para
decorar um palácio no Vaticano.
Aristóteles segura a Ética (um dos seus livros), a palma da mão estende-se para
frente e para baixo, simbolizando o mundo sensível e as formas empíricas.
A nossa época é a época da crítica, à qual tudo tem que
(KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001, p. 5).
O contexto sócio-histórico-cultural
das Ciências da Religião
Sabemos que o século XIX é um século de guerras, invenções, epidemias, expansão
e descobertas científicas. Ao lermos um pouco da história, temos a impressão que o
tempo ficou mais acelerado, em especial no Ocidente. Entre as grandes mudanças
vividas, temos a Revolução Industrial e as dominações neocoloniais europeias.
O intercâmbio, pacífico ou guerreiro, entre povos, tribos e civilizações, ocorre há
milhares de anos. No século XIX constamos que houve formas específicas:
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Lembramos que esse século é marcado pelo grande sucesso das ciências naturais e
físicas. Temos, por exemplo, o grande impacto da teoria de Charles Darwin (1809-
1882), em seu livro, A origem das espécies, publicado em 1859, com muitas
descobertas sobre os mecanismos de evolução das espécies animais, inclusive a
humana.
O século XIX nos mostrou que, entre os animais e nós, não há uma distância tão
insuperável como muitos pensaram e defenderam. Tudo isso, enfatizamos, gerou
profunda mudança na maneira de reconhecer a realidade, o mundo, a vida, a
religião. Estamos falando, por exemplo, do positivismo e do evolucionismo.
Podemos entender que esses dois movimentos se tornaram, para além de uma
teoria das Ciências Naturais e da Filosofia, uma maneira de ver o mundo e os
homens.
acessíveis [...].
O século XIX nos mostrou que, entre os animais e nós, não há uma distância tão
insuperável comVocê notou que a palavra veio entre aspas? Para os povos
indígenas, por exemplo, a “religião” não é uma parte da realidade, pois ela está
integrada a tudo, sem estar separada do resto (da vida coletiva, da comunidade, do
ritual, do mito). Por isso, falamos em tradições ou cosmologias índias. A
definição de religião não é consensual entre os estudiosos.
Ao lermos esses estudos do ponto de vista das Ciências da Religião e com mais
atenção, veremos que tais livros, tidos como sacros, foram escritos ao longo de
séculos em diversos contextos e por diferentes autores, com vários tipos de
linguagem (poética, épica, trágica, sapiencial etc.).
Importa falar sobre a cientificidade das Ciências da Religião, isto é, sua autoridade
para investigar os fenômenos religiosos tendo como horizonte a busca da
neutralidade dos valores (neutralidade axiológica) e da objetividade relativa, como
assim se expressou Max Weber (1864-1920).
e objetividade relativa?
Atenção
Perceba que o uso da palavra religião no singular quer dizer que, a partir das
religiões concretamente existentes, é possível construir conceitos teóricos
que expressem modelos, padrões que ajudam a explicar e a compreender o
que vemos na prática. Em outras palavras, apesar de todas as variedades
empíricas das religiões, que devem ser consideradas em suas semelhanças e
diferenças, é possível construir um modelo teórico para interpretar e
entender as experiências religiosas vividas por tanta gente.
As Ciências da Religião não adotam uma postura elogiosa e confessional, isto é, não
procuram defender uma religião ou professar uma fé, ao contrário. A posição teórica
mais importante defende que um conhecimento científico da religião é mais
produtivo se mantivermos uma linha não normativa, isto é, que busque investigar a
religião em suas múltiplas dimensões, manifestações e contextos socioculturais sem
levar em conta julgamentos de valor ou quaisquer julgamentos sobre a validade
moral de sua existência. (USARSKI, 2013, p. 51)
Por exemplo, existem pelo Brasil, inúmeras igrejas chamadas igrejas cristãs
inclusivas porque aceitam a existência e o modo de ser da minoria LGBTI (Gays,
Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Intersexuais). As ciências da religião
fazem uma análise dessas igrejas sem julgá-las melhores ou piores do que outras
igrejas cristãs por conta do princípio da neutralidade axiológica e da objetividade
científica relativa.
Por isso é importante que você preste atenção no que escreve Frank Usarski (2013,
p. 51):
A Ciência da Religião não instrumentaliza seus objetivos em
prol de uma apologia a uma determinada crença privilegiada
pelo pesquisador.
Em outras palavras, a postura das Ciências da Religião é a da “indiferença” diante
do objeto do seu estudo. (USARSKI, 2013) Essa postura é uma técnica de
observação e estudotécnica de observação e estudo e que você pode traduzir
como distanciar-se das crenças e das militâncias pessoais para observar, com
mais amplitude e por outros ângulos de vista, o objeto, no caso, a religião.
Para que você tenha um exemplo concreto, nas religiões cristãs, as ideias religiosas
giram em torno de noções como pecado/salvação e Deus/Diabo, o que não ocorre
em religiões como as de influência africana (candomblé, tambor-de-mina, batuque)
e as orientais (hinduísmo, budismo).
Atividade
A atividade consiste em refletir sobre três perguntas:
Internacionalização (1945-1989)
Pluralização (1990-atual)
Para que saiba alguns elementos fundadores, os primeiros passos das Ciências da
Religião foram estes:
Nesse longo processo de nascimento, não podemos deixar de citar dois estudiosos
importantes:
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São, respectivamente:
Visite os sites dessas associações. Saiba mais sobre textos, eventos, congressos,
artigos, revistas acadêmicas e outros assuntos das Ciências da Religião.
Saiba mais
Você sabia já houve uma reunião mundial sobre religiões? Foi em setembro de
1893 com o Parlamento Mundial das Religiões, em Chicago (EUA).
Centenas de estudiosos, pesquisadores e membros de diversas religiões vindos
do mundo inteiro se reuniram para conversar sobre paz, tolerância e
espiritualidade.
Atividade
1 - “Mais que saber identificar a natureza das contribuições substantivas dos
primeiros filósofos é fundamental perceber a guinada de atitude que
representam. A proliferação de óticas que deixam de ser endossadas
acriticamente, por força da tradição ou da ‘imposição religiosa’, é o que mais
merece ser destacado entre as propriedades que definem a filosoficidade.”.
(OLIVA, Alberto; GUERREIRO, Mario. Pré-socráticos: a invenção da filosofia.
Campinas: Papirus, 2000. p. 24.).
Relato 2 – Do Livro do Gênesis (Bíblia cristã) (900 a.C. Oriente Médio): “No
princípio, criou Deus os céus e a Terra. E a Terra era sem forma e vazia; e
havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a
face das águas. E disse Deus: Haja luz; e houve luz. E viu Deus que era boa a
luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas. E Deus chamou à luz Dia; e
às trevas chamou Noite. [...] E fez Deus as feras da Terra conforme a sua
espécie, e o gado conforme a sua espécie, e cada coisa que se arrasta sobre a
Terra conforme a sua espécie e viu Deus que era bom. E disse Deus: Façamos
o homem à nossa imagem... Então Deus criou o homem à sua imagem”.
(Bíblia, Livro do Gênesis, cap. 1, v. 1- 9 e 25-27).
Notas
David Hume1
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Immanuel Kant
2 - Immanuel Kant (1724 - 1804). Nascido em Königsberg, antiga Prússia, este filósofo
é considerado o fundador da “Filosofia Crítica”. Principais obras: História universal da
natureza e teoria do céu (1755); Observação sobre o sentimento do belo e do sublime
(1764); Crítica da razão pura (1781); O que é o Iluminismo? (1784); Fundamentação da
metafísica dos costumes (1785); Crítica da razão prática (1788); Crítica do julgamento
(1790); A religião nos limites da simples razão (1793); A paz perpétua (1795); A
metafísica dos costumes (1797).
Referências
FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo (orgs.). As Cências das Religiões. 8. ed. São Paulo:
Paulinas, 2016.
PASSOS, João D.; USARSKI, Frank (Orgs.). Compêndio de Ciência da Religião. São
Paulo: Paulinas: Paulus, 2013.
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