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CAMPO GRANDE/MS
2020
DIRCE CRISTIANE CAMILOTTI
CAMPO GRANDE/MS
2020
Aos meus pais e ao meu esposo José, com amor e gratidão.
Este trabalho teve como objetivo desenvolver e analisar uma proposta de formação continuada
e permanente com ênfase no labor conjunto e no uso de artefatos tecnológicos digitais para o
ensino de Ciências, visando à emancipação coletiva de professores dos anos iniciais do Ensino
Fundamental. A pesquisa foi fundamentada na Teoria da Objetivação, uma teoria educacional que
considera o ensino e a aprendizagem como um processo de natureza social, histórico e cultural,
essencialmente dialético. Trata-se de uma pesquisa cuja base metodológica é o materialismo
dialético, na modalidade pesquisa-ação educacional, que busca a superação da racionalidade
técnica e propõe um modelo de professor intelectual crítico, que desenvolve a sua prática com
base em ações coletivas, voltadas para o interesse comum e regida pela ética
comunitá00ria em busca de uma emancipação coletiva. Os participantes são professores
de uma escola pública no Mato Grosso do Sul, Brasil. A pesquisa-formação foi realizada em três
etapas denominadas: diagnóstica, de labor conjunto e de emancipação coletiva. As três etapas
foram desenvolvidas de novembro de 2017 a novembro de 2019, com a participação de 11
professores. Os dados foram obtidos por meio de gravações dos encontros presenciais da
formação, entrevistas, questionários, produções dos participantes e caderno de campo da
pesquisadora. Foram organizados de forma a construir o percurso formativo e analisados a partir
de diferentes modos semióticos, identificados na interação dos professores durante as atividades
realizadas na formação, por meio de um dispositivo de análise adaptado. Os resultados da etapa
diagnóstica evidenciam que os professores têm um perfil de especialista técnico, com uma
prática pedagógica voltada para propostas tradicionais de ensino e com o uso de artefatos
tecnológicos baseados na busca e na transmissão de informação, no individualismo e com
ênfase no saber em detrimento da dimensão do ser. As análises da etapa de labor conjunto e de
emancipação coletiva evidenciam a superação do individualismo no contexto das atividades
formativas que propiciaram novos modos de produção de saber e novas subjetividades, o que
refletiu nas práticas pedagógicas dos professores, evidenciando: mudanças na visão que elas
tinham do saber, da aprendizagem, da avaliação e dos artefatos tecnológicos digitais; na
relação com os demais professores e alunos; uma postura crítica diante do sistema de ensino;
mudanças na forma de planejar e desenvolver as aulas de Ciências, considerando a dimensão
coletiva no planejamento de atividades de ensino e aprendizagem (AEA), que foram
desenvolvidas a partir do labor conjunto com seus alunos. Tais indícios indicam um processo
de mudança na consciência dos professores e sugerem a superação do perfil do professor
especialista técnico, que se encontra em processo de constituição de um professor intelectual
crítico, e que uma proposta formativa que discute o ensino de Ciências baseado nos
pressupostos da TO tem potencial para promover a emancipação coletiva de práticas
pedagógicas alienantes.
This study aimed to develop and analyze a proposal for continuous and permanent
professional development, emphasizing the collective labor and use of technological artifacts
for Science teaching, aiming for the collective emancipation of teachers in the initial years of
Elementary School. The research was grounded in the Objectification Theory, an educational
theory that considers teaching and learning a process of social, historical, and cultural nature,
essentially dialectical. The methodological basis for this research is the dialectical
materialism, in the educational action-research modality, which aims for the overcoming of
technical rationality and proposes the model of an intellectual and critic teacher, who develops
his practice based on collective actions focused on the common interest, and whose practice is
governed by community ethics in search of collective emancipation. The participants of this
study are teachers of a public school in the state of Mato Grosso do Sul, Brazil. The research-
action was done in three phases: diagnostic, collective labor, and collective emancipation.
These phases were developed from November 2017 to November 2019 with the participation
of 11 teachers. Data was collected by recordings of face-to-face development meetings,
interviews, questionnaires, participant’s production, and the researcher’s field notebook. The
data was organized in a way to build the formative route and analyzed from different semiotic
modes, which were identified in the interaction of teachers during the activities performed on
the development course, by means of an adapted analysis device. The results of the diagnostic
phase show that teachers have a technical-specialist profile, with a pedagogical practice
focused on traditional teaching approach and use of technological artifacts based on research
and transmission of information, on individualism and with an emphasis on knowledge rather
than the being’s dimension. The analysis of the collective labor and collective emancipation
phases show the overcoming of individualism, in the context of professional development
activities which provided new ways of producing knowledge and new subjectivities, which
reflected in the teachers’ pedagogical practice, showing changes in their perspective of
knowledge, learning, evaluation and technological artifacts; changes in the relationship with
fellow teachers and students; a more critical view of the teaching system; changes in planning
and development of Science classes, considering the collective dynamics in the planning of
teaching/learning activities which were developed in collaborative labor with their students.
This evidence indicates a process of change of conscience in teachers, and suggest the
overcoming of the previous technical-specialist profile, as they now find themselves in the
process of becoming intellectually critical teachers, and it shows that the process of a
professional development proposal that discusses Science teaching in the principles of
Objectification Theory has the potential of promoting collective emancipation of alienating
pedagogical practices.
Tabela 1 - Número de professores (Prof.) em cada disciplina nos anos iniciais do E.F (1º ao
5º) em 2018 e 2019. 75
Tabela 2 - Perfil inicial das professoras. 91
Tabela 3 - Lotação das professoras nos anos letivos de 2018 e 2019 e regime de trabalho. 234
LISTA DE SIGLAS
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 23
APRESENTAÇÃO DA PESQUISA ...................................................................................... 26
OBJETIVOS DA PESQUISA ................................................................................................ 29
1 APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO ....................................................................... 31
1.1 TEORIA DA OBJETIVAÇÃO (TO) .............................................................................. 31
1.1.1 Saber, conhecimento, ser, subjetividade e aprendizagem ........................................ 32
1.1.2 A alienação presente na prática pedagógica ............................................................ 39
1.1.3 Modelos de professor e prática docente emancipatória ........................................... 41
1.1.4 Formação de professores na perspectiva da Teoria da Objetivação ........................ 47
1.2 MÉTODO E METODOLOGIA DA PESQUISA-FORMAÇÃO ................................... 49
1.2.2 A formação continuada e permanente baseada na metodologia do labor conjunto . 55
1.2.3 As ações da pesquisa: coleta, sistematização e análise dos dados ........................... 59
1.2.4 Dispositivo de análise das interações: base teórica e etapas ................................... 61
1.3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ....................................................................................... 65
1.3.1 Análise dos trabalhos selecionados ......................................................................... 66
1.3.2 Principais resultados e proposta de pesquisa formação ........................................... 69
2. DESCRIÇÃO DA ESCOLA, DO PERCURSO FORMATIVO E DO PERFIL DAS
PROFESSORAS ..................................................................................................................... 71
2.1 DESCRIÇÃO DA ESCOLA E DO SEU CONTEXTO HISTÓRICO E CULTURAL .. 71
2.1.1 A escola: estrutura e organização............................................................................. 73
2.1.2 A escola: equipe pedagógica e formações continuadas .......................................... 74
2.2 AÇÕES INICIAIS E DEFINIÇÃO DOS PARTICIPANTES ......................................... 76
2.3 DESCRIÇÃO GERAL DO PERCURSO FORMATIVO............................................... 79
2.3.1 Etapa Diagnóstica .................................................................................................... 81
2.3.2 Etapa de labor conjunto ........................................................................................... 82
2.3.3 Etapa de emancipação coletiva ................................................................................ 86
2.4 AÇÕES DIAGNÓSTICAS E ANÁLISE DOS RESULTADOS .................................... 89
2.4.1 Planejamento das ações diagnósticas ...................................................................... 89
2.4.2 Análise dos resultados diagnósticos ........................................................................ 90
2.4.2.1 Primeira ação diagnóstica: levantamento do perfil das professoras ................. 91
2.4.2.2 Segunda ação diagnóstica: concepções sobre o ensino de Ciências............... 105
2.4.2.3 Terceira e quarta ação diagnóstica: uso do laptop educacional e do computador
.................................................................................................................................... 106
2.4.2.4 Síntese dos resultados e diretrizes para a etapa de labor conjunto ................. 111
3. ETAPA DE LABOR CONJUNTO: VISÃO GERAL E ANÁLISES DAS ATIVIDADES
DO MÓDULO 2 .................................................................................................................... 114
3.1 PLANEJAMENTO DAS TAREFAS E DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES:
UMA VISÃO GERAL........................................................................................................ 114
3.2 PLANEJAMENTO DA TAREFA DA ATIVIDADE AEA: ALIMENTAÇÃO
SAUDÁVEL E BALANÇO ENERGÉTICO ..................................................................... 116
3.3 ANÁLISE DA ATIVIDADE: ALIMENTAÇÃO SAUDÁVEL E BALANÇO
ENERGÉTICO. .................................................................................................................. 119
3.3.1 Síntese da análise do episódio relevante 1 e 8 da atividade 1 ............................... 119
3.3.2 Episódio relevante 2 da atividade 1 ....................................................................... 122
3.3.3 Episódio relevante 3 da atividade 1 ....................................................................... 125
3.3.4 Episódio relevante 5 da atividade 1 ....................................................................... 129
3.3.5 Episódio relevante 6 da atividade 1 ....................................................................... 133
3.3.6 Momento de socialização ...................................................................................... 136
3.3.7 Considerações sobre o desenvolvimento da atividade 1. ...................................... 140
3.4 PLANEJAMENTO DA ATIVIDADE AEA2: TEORIA DA OBJETIVAÇÃO ............ 141
3.5 ANÁLISE DA ATIVIDADE: TEORIA DA OBJETIVAÇÃO ..................................... 143
3.5.1 Episódio relevante 1 da atividade 2 ....................................................................... 143
3.5.2 Episódio relevante 2 da atividade 2 ....................................................................... 147
3.5.3 Reflexões no momento de socialização da atividade 2 ......................................... 151
3.5.4 Atividade EAE elaborada pelas professoras .......................................................... 153
3.5.5 Considerações sobre o desenvolvimento da atividade 2 ....................................... 157
4. ETAPA DE LABOR CONJUNTO: ANÁLISES DAS ATIVIDADES DOS MÓDULOS
3 E 4 ....................................................................................................................................... 160
4.1 PLANEJAMENTO DA ATIVIDADE AEA3: PLANEJAMENTO E
REELABORAÇÃO ............................................................................................................ 160
4.2 ANÁLISE DO LABOR CONJUNTO (ATIVIDADE) ................................................. 162
4.2.1 Episódio relevante 1 da atividade 3 ....................................................................... 162
4.2.2 Episódio relevante 2 da atividade 3 ....................................................................... 166
4.2.3 Episódio relevante 3 da atividade 3 ....................................................................... 169
4.2.4 Episódio relevante 4 da atividade 3 ....................................................................... 173
4.2.5 Análise da Atividade AEA reelaborada pelas professoras ..................................... 176
4.2.6 Considerações sobre o desenvolvimento da atividade 3 ....................................... 181
4.3 PLANEJAMENTO DA ATIVIDADE AEA4: CONCEITOS DE OBJETIVAÇÃO,
SUBJETIVAÇÃO E ALIENAÇÃO ................................................................................... 182
4.4 ANÁLISE DA ATIVIDADE: CONCEITOS DE OBJETIVAÇÃO, SUBJETIVAÇÃO E
ALIENAÇÃO ..................................................................................................................... 185
4.4.1 Episódio relevante 1 da atividade 4 ....................................................................... 185
4.4.2 Episódio relevante 2 da atividade 4 ....................................................................... 189
4.4.3 Reflexões críticas no contexto da atividade 4 ....................................................... 192
4.4.4 Considerações sobre o desenvolvimento da atividade 4 ....................................... 196
5. ETAPA DE LABOR CONJUNTO: ANÁLISE DA ATIVIDADE DO MÓDULO 5 E
FINALIZAÇÃO DA ETAPA ............................................................................................... 198
5.1 PLANEJAMENTO DA ATIVIDADE AEA5: AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
NA PERSPECTIVA DA TO ............................................................................................... 198
5.2 ANÁLISE DA ATIVIDADE: AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA
PERSPECTIVA DA TO ...................................................................................................... 200
5.2.1 Episódio relevante 1 da atividade 5 ....................................................................... 201
5.2.2 Episódio relevante 2 da atividade 5 ....................................................................... 203
5.2.3 Reflexões críticas no contexto da atividade 5 ....................................................... 206
5.2.4 Considerações sobre o desenvolvimento da atividade 5 ....................................... 209
5.3 FINALIZAÇÃO DA ETAPA DE TRABALHO CONJUNTO ..................................... 211
5.3.1 Instrumento diagnóstico avaliativo: resultados e diretrizes ................................... 211
5.3.2 As vozes das professoras: indícios de necessidades formativas ............................ 216
5.4 FATOS DO CONTEXTO EXTRA VERBAL: EVIDÊNCIAS DE APRENDIZAGEM E
EMANCIPAÇÃO COLETIVA ........................................................................................... 224
6. ETAPA DE EMANCIPAÇÃO COLETIVA: ANÁLISES E EVIDÊNCIAS DE UM
PROFESSOR INTELECTUAL CRÍTICO ........................................................................ 231
6.1 PLANEJAMENTO DAS AÇÕES DA ETAPA DE EMANCIPAÇÃO COLETIVA ... 231
6.2 ETAPA DE EMANCIPAÇÃO COLETIVA: ANÁLISE DOS RESULTADOS ........... 233
6.2.1 Reflexões críticas das professoras nas reuniões .................................................... 233
6.2.2 Planejamentos das atividades AEA ....................................................................... 243
6.2.3 Socialização final ................................................................................................... 250
6.2.4 Considerações gerais sobre a etapa de emancipação coletiva ............................... 261
6.3 RELATO DA PRODUÇÃO DE NOVAS SUBJETIVIDADES NA PERSPECTIVA DE
FORMADORA-PESQUISADORA ................................................................................... 262
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 266
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 272
APÊNDICES ......................................................................................................................... 284
APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido............................................. 285
APÊNDICE B – Roteiro de Entrevista Diagnóstica............................................................... 287
APÊNDICE C – Terceira ação diagnóstica: Uso do editor de texto....................................... 289
APÊNDICE D – Quarta ação diagnóstica: Uso do editor de apresentação. ........................... 290
APÊNDICE E - Exemplos hipotéticos de interações dos alunos em sala de aula e de
organização dos alunos para trabalhar em grupo analisados pelos professores na atividade
AEA 4 (Conceitos de objetivação, subjetivação e alienação). ............................................... 291
APÊNDICE F - Instrumento diagnóstico avaliativo. ............................................................. 293
APÊNDICE G - Opinário sobre a pesquisa-formação. .......................................................... 295
APÊNDICE H - Apresentação de slides utilizados na segunda reunião da etapa de
emancipação. .......................................................................................................................... 296
ANEXOS ............................................................................................................................... 297
ANEXO A – Carta de aceite da escola. .................................................................................. 298
ANEXO B - Registro das respostas da Atividade 1 “Alimentação saudável”. ...................... 299
ANEXO C - Registro das respostas da Atividade 2 “Teoria da Objetivação: conceitos básicos
e planejamento inicial de uma atividade de ciências”. ........................................................... 301
ANEXO D - Tarefa elaborada pelas professoras na Atividade 2 “Teoria da Objetivação:
conceitos básicos e planejamento inicial de uma atividade de ciências”. .............................. 302
ANEXO E - Registro das respostas da Atividade 3 “Planejamento de aula e reelaboração da
atividade na perspectiva da TO”. ............................................................................................ 303
ANEXO F – Registro da Atividade 4 “Conceitos de objetivação, subjetivação e alienação”
................................................................................................................................................ 305
ANEXO G – Registro da Atividade 5 “Avaliação na perspectiva da TO”. ............................ 306
ANEXO H – Planejamento da atividade de ensino e aprendizagem elaborada pelo Grupo A na
etapa de emancipação. ............................................................................................................ 308
ANEXO I – Planejamento da atividade de ensino e aprendizagem elaborada pelo Grupo B na
etapa de emancipação. ............................................................................................................ 309
ANEXO J – Relato da atividade de ensino e aprendizagem desenvolvida com os alunos na
etapa de emancipação. ............................................................................................................ 311
ANEXO K – Relato da atividade de ensino e aprendizagem desenvolvida com os alunos na
etapa de emancipação ............................................................................................................. 314
23
INTRODUÇÃO
ensino fundamental. A formação dos professores foi elaborada pelo Ministério da Educação
(MEC) e desenvolvida pelas Instituições de Ensino Superior (IES) locais, que, no caso de
Mato Grosso do Sul, foi a Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em parceria
com a SED/MS. Na ocasião, fui convidada a participar da equipe de formadores da UFMS.
Esse foi um marco importante na minha formação profissional, permitindo-me vivenciar
metodologias para o uso das tecnologias educacionais digitais de cunho construcionista,
inserindo-me no campo da pesquisa educacional na área de ensino de Ciências com o uso de
tecnologias educacionais. Nessa ocasião, iniciei as minhas atividades de pesquisa com a
participação no Grupo Interdisciplinar de Pesquisa em Ensino de Ciências (GINPEC).
Aquele momento foi de intensa aprendizagem e de profundas mudanças na postura de
professora formadora e pesquisadora, sobretudo, porque meu mestrado foi na área de
Ecologia e Conservação. Após o término da formação do PROUCA, participei de pesquisas
como integrante do GINPEC. Os resultados dessas pesquisas evidenciaram que a formação
realizada não foi suficiente para provocar mudanças na prática pedagógica dos professores
participantes (GOBARA; CAMILOTTI, 2013; GOBARA et. al., 2014), entre os quais havia
professores de Ciências dos anos iniciais. Os professores usavam o laptop, mas não
conseguiam superar a prática tradicional baseada na transmissão de informação.
Os resultados dessas pesquisas confirmaram o que eu já observava empiricamente no
meu trabalho como formadora: as formações, no modelo em que estavam sendo ofertadas, não
eram suficientes para promover alterações na prática dos professores. Essas formações
chegavam à escola com o seu percurso já definido - o conteúdo e as atividades. Os professores
realizavam as ações formativas individualmente ou em grupo, geralmente dividindo o
trabalho. Esse fato inquietava-me e fazia-me refletir: Por que os professores não conseguiam
superar a prática tradicional baseada na transmissão de informação? Como deveria ser uma
formação continuada para o uso das tecnologias digitais que pudesse trazer mudanças na
prática pedagógica dos professores de Ciências?
Foi a partir desses problemas que, no período de 2014-2015, participei de um projeto
de pesquisa, financiado pela Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e
Tecnologia de Mato Grosso do Sul (FUNDECT). O objetivo do projeto foi desenvolver uma
pesquisa-formação para uso construcionista do laptop educacional no ensino investigativo de
Ciências (CARVALHO, 2013), com professoras da educação infantil e anos iniciais do Ensino
Fundamental (1° ao 5° ano) de uma escola pública do município de São Gabriel do Oeste. A
formação foi planejada a partir das necessidades das professoras, em um processo em que os
resultados das análises das ações formativas delineavam o percurso da formação. Os
25
APRESENTAÇÃO DA PESQUISA
professor em relação ao seu papel, que passa a trabalhar conjuntamente com o aluno e que
tem uma “missão histórica e cultural a cumprir” (MORETTI, et. al., 2015, p. 249), que se
relaciona com a dimensão ética do sujeito. No processo de formação continuada e permanente
que envolve o uso de artefatos tecnológicos digitais, a ênfase não é mais apenas no saber
científico, mas também na dimensão do ser, que se relaciona com a formação de novas
subjetividades numa perspectiva ética e coletiva. Outro desafio é a superação da visão de
centralidade do artefato tecnológico, que, nesta proposta, apenas faz parte das atividades
mediadoras, portanto, não é mais um instrumento de mediação como é considerado nas
abordagens individualistas.
A escolha da TO como referencial teórico e metodológico foi motivada pela hipótese
29
de que essa teoria contribui para provocar mudanças nas práticas pedagógicas dos professores,
por meio do encontro com saberes culturais e da produção de novas subjetividades no
contexto do labor conjunto. Tais mudanças poderão levar à superação e à emancipação das
práticas pedagógicas individualistas e alienantes ainda recorrentes na escola contemporânea.
Com o objetivo de explicitar o problema de investigação, foram feitas duas perguntas
de pesquisa: Como uma formação continuada e permanente desenvolvida por meio de uma
pesquisa-formação, baseada na TO, pode contribuir para o desenvolvimento de um professor
intelectual crítico e para a emancipação do professor para uso pedagógico dos artefatos
tecnológicos digitais, em particular o laptop educacional, no ensino de Ciências? Quais as
características necessárias a uma proposta de formação continuada e permanente para que os
professores cheguem a essa emancipação, por meio de processos de objetivação e
subjetivação?
OBJETIVOS DA PESQUISA
os seus resultados e análises estão descritos nesta tese, composta por seis capítulos.
O primeiro capítulo trata do aporte teórico-metodológico da pesquisa. Serão
apresentados os principais conceitos da Teoria da Objetivação (TO) e algumas ideias de
Contreras (2002) sobre a profissão docente. São descritos também o método e a metodologia
utilizada na formação e na pesquisa. É apresentada, ademais, uma síntese da revisão da
literatura e os seus resultados, a partir da qual serão caracterizadas as propostas de formação
continuada para professores dos anos iniciais para o ensino de Ciências com o uso de artefatos
tecnológicos digitais.
O segundo capítulo descreve a escola em que foi realizada a pesquisa e apresenta a
análise do percurso formativo e do contexto em que tais ações foram desenvolvidas. Serão
descritos, igualmente, o planejamento das ações diagnósticas da formação e analisados os
dados que permitiram descrever o perfil das participantes.
Do terceiro ao quinto capítulos, são apresentados os planejamentos das cinco
atividades de ensino aprendizagem (AEA) desenvolvidas na segunda etapa da formação
(etapa de labor conjunto) e analisadas as interações de um grupo de professoras durante a
realização dessas atividades. São também apresentadas e analisadas atividades AEA elaborada
pelas professoras e desenvolvidas com seus alunos. As análises dessas atividades foram
separadas em três capítulos devido à sua extensão.
Assim posto, no terceiro capítulo, é apresentado o planejamento detalhado das
atividades AEA que trataram de alimentação saudável e dos conceitos básicos da TO,
analisadas as interações de um grupo de professoras durante a realização dessas atividades e
uma atividade AEA elaborada pelas professoras. O quarto capítulo apresenta os planejamentos
das atividades AEA que tratam do planejamento de aula na perspectiva da TO e dos conceitos
de objetivação, subjetivação e alienação, bem como as análises das interações das professoras
durante sua realização. Será ainda analisado o planejamento reelaborado da atividade AEA
apresentada no capítulo três. O quinto capítulo apresenta o planejamento e a análise das
interações das professoras durante o desenvolvimento da atividade AEA que trata da avaliação
da aprendizagem na perspectiva da TO. Neste capítulo, serão apresentadas, ademais, as
análises de um instrumento avaliativo e do opinário respondidos pelos professores.
O sexto capítulo apresenta o planejamento da etapa final da pesquisa-formação (etapa
de emancipação coletiva), as análises das interações nos momentos presenciais dessa etapa e
dos planejamentos das atividades AEA realizadas pelos grupos de professores. Para finalizar,
será relatada a produção de novas subjetividades na perspectiva da formadora-pesquisadora.
31
1 APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO
objetos conceituais podem ser conhecidos. A partir dessas bases, os objetos conceituais não
são apenas conceitos científicos, pois são gerados historicamente pelo trabalho dos indivíduos
e expressam, além do conteúdo conceitual científico, aspectos racionais, estéticos e funcionais
da cultura (RADFORD, 2006).
A educação na TO é concebida “como um empreendimento político, social, histórico
e cultural voltado para a criação dialética de sujeitos reflexivos, éticos e críticos, que
ponderam novas forma de pensamento e ação” (RADFORD, 2017a, pg. 97). A partir dessa
concepção, a teoria não tem o objetivo apenas de interpretar problemas relacionados aos
processos de ensino e aprendizagem, mas também de oferecer meios de formar e transformar
os sujeitos em uma perspectiva transformadora.
Na TO, o saber histórico e cultural não é concebido como um objeto que é construído
ou transmitido, mas como uma possibilidade que emerge da atividade humana para
materializar-se ou expressar-se em conhecimento (RADFORD, 2017a). Essa teoria concebe a
ideia de que o saber é uma potencialidade presente na cultura e que traz possibilidades de
pensar, refletir e resolver problemas.
O saber é, então, um “sistema codificado de processos corpóreos, sensíveis e
materiais de ações e de reflexões, estabelecidos historicamente e culturalmente” (RADFORD,
2017a, p. 102). Esses processos (corpóreos, sensíveis e materiais) significam que as ações dos
indivíduos não acontecem somente na mente deles, mas são ações concretas que se
materializam pelos sentidos, por meio do corpo, pelos objetos físicos e artefatos culturais,
visto que esses indivíduos fazem parte de um mundo social e cultural e são influenciados por
ele. Nessa perspectiva, saber é uma forma codificada de pensar e fazer, que tem sido
codificado e refinado na história e na cultura humana e, por essa razão, não pode reduzir-se a
essa ou aquela sequência particular de ações coordenadas.
A evolução do saber não deve ser concebida como um fenômeno natural, mas
cultural, que se eleva do abstrato ao concreto (RADFORD, 2017a). Dessa maneira, o saber
considerado como o trabalho cristalizado, ou seja, como “forma de fazer, pensar e refletir
codificados culturalmente, o conhecimento é a atualização e materialização do saber”
(RADFORD, 2017a, p. 107). Ele não é imediato, mas mediado, pois, resulta da mediação de
uma atividade mediadora. O saber transforma-se em conhecimento por meio da atividade, ou
seja, é na realização da atividade que o saber materializa-se, é transformado em uma ação
33
A partir dessas ideias, pode-se dizer que a consciência forma-se na atividade prática e
determina nossas ações no mundo concreto. Sendo que a tomada de conciência, que ocorre
nos processos de objetivação e subjetivação, no contexto da atividade, é o que define a
aprendizagem, de acordo com a TO.
Assim sendo, a objetivação é definida como aqueles “processos sociais, coletivos, de
tornar-se progressivamente conscientes de uma cultura e de um sistema constituído de
34
pensamento e ação” (RADFORD, 2019, p. 04, tradução nossa). São “aqueles processos de
notar algo culturalmene significativo, algo que é revelado à consciência não passivamente,
mas por meio da atividade corporal, sensível, afetiva, emocional, artefatual e semiótica”
(RADFORD, 2020, p. 20, tradução nossa). Em outros termos, os processos de objetivação são
processos de tomada de consciência de formas de pensar e agir que foram construídos
culturalmente e historicamente e que resultam no encontro com o saber. Tal encontro deriva
na refração da subjetividade do saber na mente dos indivíduos, ou seja, no conceito
(RADFORD, 2019; 2020).
A subjetivação, relacionada com a formação do sujeito crítico, reflexivo e ético, é
definida como “os processos em que, coproduzindo-se contra o pano de fundo da cultura e da
história, professores e alunos entram em presença [...] vem ocupar um espaço no mundo
social e ser uma perspectiva nele” (RADFORD, 2019, p. 05, tradução nossa), posicionando-se
e afirmando-se (RADFORD, 2020). A subjetivação acontece em um movimento dialético
entre a cultura e o indivíduo, entidades em constante mudança, que estão continuamente
coproduzindo-se. Nesse movimento dialético, “nos afirmamos como projetos únicos de vida,
como subjetividades em curso” (RADFORD, 2017c, p. 147).
Na perspectiva da TO, a aprendizagem somente ocorre no contexto de uma atividade
mediadora, nos processos de objetivação e subjetivação, que propiciam simultâneo encontro
com o saber e a produção de novas subjetividades. Neste sentido, a intersubjetividade e a
aprendizagem estão intimamente relacionadas, sendo que a comunicação, os significados
compartilhados e a atenção conjunta têm papel fundamental.
Dessa forma, a atividade realizada em sala de aula é o processo que media a
materialização do saber, revelado à consciência dos sujeitos na forma de conhecimento, e a
produção de novas subjetividades (Figura 1) - (RADFORD, 2017b; 2020). O
desenvolvimento da atividade, com diferentes fases, proposta por Radford (2017b), pode
contribuir para o desenvolvimento de atividades formativas junto aos professores. Sobre a
atividade, Radford, apoiado nas ideias de Leontiev (2009), Marx (2004) e Hegel (2004),
enfatiza que:
(…) a atividade não deve ser vista como uma simples cooperação entre os
indivíduos para alcançar alguma coisa (o que é uma concepção funcionalista da
atividade), nem deve ser visto como um meio simples (que é uma concepção
pragmática da atividade). (…) é um sistema em movimento (…) uma fonte de vida;
um trabalho conjunto em que atuamos, pensamos e sentimos juntos (RADFORD,
2017c, p. 156, tradução nossa).
No que diz respeito à escola e ao papel do professor, Radford (2006; 2016a; 2017b;
2019) afirma que as salas de aulas e o professor têm o papel de possibilitar aos alunos a
aprender a ser-com-outros (viver em comunidade, com os outros, compreender outras
consciências). Neste sentido, a escola é o local em que ocorre o encontro do sujeito e do
objeto de conhecimento, por meio de processos sociais.
A partir dessa proposta, Radford discute a relação professor e aluno usando o termo
“togethering”, que ele traduz como “fazendo e trabalhando juntos, na mesma direção, ombro a
ombro” (RADFORD, 2017b, p. 138). Essa concepção supõe que professor e alunos atuam
como iguais, numa ideia de atividade conjunta e de natureza ética, que se baseia em uma
orientação genuína e não egoísta. O autor (RADFORD, 2012, 2017c) enfatiza a importância
da escola na transformação dos indivíduos e do mundo:
Sua importância está precisamente em seu poder para transformar o mundo e os
36
indivíduos que o habitam. É onde aqui que a educação encontra sua justificativa. Se
quando aprendemos algo, ainda somos os mesmos seres humanos, então nós
realmente não aprendemos nada. Nós ainda estamos sujeitos aos formulários da
produção capitalista predominante e suas formas individualistas de interação [...]
Aprender não é simplesmente adquirir um conhecimento, mas se tornar um sujeito
humano (RADFORD, 2017c, p. 141, tradução nossa).
(problemas da tarefa); os alunos trabalham em pequenos grupos para realizar a tarefa; nos
pequenos grupos, o professor e os alunos discutem a realização da tarefa, o professor promove
reflexões, apresenta críticas e assegura que os alunos estão trabalhando em conjunto; ocorre a
socialização entre os grupos quando o professor promove uma discussão geral, os grupos
apresentam para os outros como chegaram à solução dos problemas; pode-se ainda colocar
dois grupos para trabalhar juntos, analisando as respostas dos problemas, apontando pontos
positivos e sugestões de melhorias. Nessa interação, os alunos posicionam-se como
indivíduos, no esforço para entender o outro, assumindo a responsabilidade junto ao grupo
perante as críticas. Conforme ilustrado na Figura 2, essas fases não são necessariamente
contínuas e sequenciais, pode-se voltar ao momento anterior ou repeti-lo de acordo com a
necessidade da classe/grupos.
Nesse contexto, a atividade didática proposta pela TO privilegia um evento criado para
uma busca comum cognitiva, emocional e étic, com o outro, para a solução de um problema.
A atividade (labor conjunto), por sua vez, deve possibilitar o encontro com o saber científico e
requer que professor e alunos envolvam-se como parceiros em ações e reflexões, agindo a
partir da ética comunitária.
O componente didático, ou atividade de ensino e aprendizagem (AEA), compreende o
objeto, o objetivo (a meta) e a tarefa da atividade (Figura 3). O objeto pode ser identificado
como o “projeto didático do professor” (RADFORD, 2017b, pg. 125). Para que esse projeto
seja concretizado, é necessário estabelecer objetivos (metas), que serão alcançadas por meio
da tarefa da atividade. A tarefa é constituída por uma série de ações e problemas relacionados
e com complexidade conceitual crescente. Nesta pesquisa, o termo meta, proposto por
Radford (2017b), será substituído por objetivo. Isso porque o significado da palavra meta, na
língua portuguesa, remete à ideia de algo quantificado.
38
foco na formação crítica de alunos e professores, com ênfase no seu contexto social e nas
práticas de emancipação.
1
Ideias advindas do Sistema Capitalista definido como sistema econômico e social caracterizado por relações
sociais de produção específicas, com a compra e venda da força de trabalho assalariado dos trabalhadores e os
meios de produção de propriedade privada (BOTTOMORE, 1988).
40
como a prática pedagógica do professor, ou seja, “[...] atividades alienantes produzem sujeitos
alienados” (RADFORD, 2017c, p. 149).
Neste sentido, o funcionamento da escola é movido pelo corporativismo e pela
eficiência (CALLAHAN, 1970), em que os alunos são reduzidos a proprietários privados, os
professores recebem um salário pelo seu trabalho e passam a adquirir objetos, enquanto os
alunos trabalham para adquirir conhecimento (LAVE; MCDERMOTT, 2002). Ao mesmo
tempo em que reproduz a sociedade capitalista, a escola, como instituição social, é o lugar
central para promover mudanças que transformem os indivíduos e a sociedade, por meio da
mudança no trabalho realizado por professores e alunos (RADFORD, 2016a).
Na perspectiva de luta contra a alienação trazida por Radford (2012), faz-se necessário
superar as formas individualistas de interação social por meio de um projeto ético,
comunitário, que oriente as formas de colaboração humana em sala de aula, a partir do labor
conjunto de professores e alunos. As atividades didáticas planejadas e desenvolvidas pelo
professor devem propiciar aos alunos uma experiência verdadeiramente democrática de novas
formas de produção de saberes, ou seja, proporcionar formas de ação e reflexão
verdadeiramente emancipatórias (GIROUX, 1986; RADFORD, 2016ª; 2020).
Antes de discutir o significado de emancipação na perspectiva da TO, apresentam-se as
ideias de Contreras (2002) sobre os modelos de professores aos quais são relacionadas os
diferentes tipos de autonomia. Esses modelos serão utilizados na descrição dos professores
participantes da pesquisa-formação, porém associados a uma ideia de emancipação, a partir
das discussões sobre a autonomia ilusória e a verdadeira emancipação (RADFORD, 2016a).
Em cada modelo de professor, há uma epistemologia que determina o seu papel e a sua
concepção de autonomia profissional em suas diferentes dimensões. Se, na atuação do
profissional especialista técnico, cuja característica do trabalho está baseada na racionalidade
técnica, o trabalho pedagógico consiste na aplicação de tratamentos instrumentais
previamente definidos; no modelo do profissional reflexivo, em que a ação está baseada na
perspectiva da racionalidade prática, a atuação docente é assentada na reflexão na prática
(BARBOSA, 2000; CONTRERAS, 2002). O conceito do profissional reflexivo discutido por
Contreras foi proposto por Schön (1992a), com base no conceito de reflexão-na-ação, no qual
a prática pedagógica e o desenvolvimento do conhecimento profissional baseiam-se na
pesquisa e experimentação na prática. Isso leva o professor a construir a sua forma pessoal de
conhecer e desenvolver-se por meio de um olhar retrospectivo da ação realizada (concepção
individualista), a fim de enfrentar as situações que não são resolvidas por meio da técnica
(SCHÖN, 1992a; 1992b). A crítica contra essa proposta de Schön dá-se pela redução da
reflexão ao espaço da técnica e do individualismo. Essa crítica não é exclusiva de Contreras.
Segundo Perez Gomez (2000), a reflexão deve ir além da proposta de Schön, propiciando a
percepção crítica de que a educação é uma construção social que atende a interesses políticos
e econômicos e que pode ser historicamente modificada.
O modelo do professor como intelectual crítico, que tem como referência a proposta
de Giroux (1998), caracteriza-se por uma prática profissional calcada na consciência crítica,
voltada para a emancipação individual e social, para os interesses coletivos, para a reflexão
sobre as distorções ideológicas e a transformação das condições institucionais e sociais de
ensino, com participação na ação transformadora. Esse modelo diferencia-se do modelo do
professor reflexivo, Assim, enquanto a compreensão dos fatores pelo professor reflexivo é
individual e as mudanças resultantes não alteram situações além da sala de aula, as ações do
professor intelectual crítico analisam e compreendem os fatos que determinam a prática
44
A partir dessa ideia, será utilizado o termo emancipação coletiva, associado ao modelo
de professor intelectual crítico para referir-se à emancipação dos professores das práticas
pedagógicas alienantes. A emancipação que somente pode ocorrer por meio do labor conjunto
no contexto de atividades baseadas na ética comunitária com vistas à formação de um
professor crítico, reflexivo e ético, consciente de sua capacidade de transformar a realidade na
qual está inserido.
As ideias de Paulo Freire corroboram com essa visão da conscientização como
condição para a emancipação do sujeito das condições que o oprimem e para a transformação
do contexto em que vive (FREIRE, 1979; 2010). Para ele, a prática educacional contribui para
essa conscientização e, como consequência, para a emancipação. Neste sentido, a educação é
feita por meio do diálogo em que professores e alunos desenvolverão uma consciência crítica
a partir de sua realidade e experiência para enfrentar os problemas cotidianos, visando à
transformação do contexto em que vivem (FREIRE, 1979, 2010).
Na Pedagogia Freireana, a perspectiva transformadora da educação tem como base a
ideia de que a educação que promove uma reflexão crítica baseia-se na tomada de consciência
do sujeito sobre sua realidade (FREIRE, 1979). Essa tomada de consciência (ou
conscientização) leva o sujeito a ter um olhar crítico sobre a sua realidade, conhecendo os
“mitos” (Freire (1979, p. 17) que garantem a manutenção da estrutura dominante. É nesse
processo de tomada de consciência que o sujeito desvela a sua realidade e posiciona-se
criticamente diante dela, tornando-se “presença no mundo” Freire (2004, p. 98), podendo
intervir e transformar a sua realidade, emancipando-se da condição de oprimido (FREIRE,
1979; 2010)
Dessa forma, é somente no contexto de uma formação que possibilita um espaço de
diálogo, ação e reflexão crítica que os professores poderão conscientizar-se da alienação
presente em suas práticas e emancipar-se delas. Tal conscientização somente poderá ocorrer
no contexto de uma prática coletiva, em que os professores formam-se e configuram-se como
46
sujeitos críticos. É por meio dessa prática coletiva, onde podem “desenvolver-se
subjetividades reflexivas, solidárias e responsáveis” (RADFORD, 2014, p. 136), que será
alcançada a emancipação coletiva pelos professores (junto com os professores), das suas
práticas pedagógicas alienantes.
Nesse contexto de formações de professores com finalidade emancipatória, o uso da
terminologia formação continuada vem sofrendo críticas de autores como Freire (2001), Gatti
(2009) e Castro e Amorim (2015), devido ao caráter tecnicista das formações associadas a
esse termo. Essa crítica fundamenta-se no fato de que esse tipo de formação privilegia a
técnica e o individualismo, por meio da realização de formações que trazem para a escola
cursos prontos e materiais instrucionais, com a pretensão de melhorar a qualidade da
educação (FREIRE, 2001, GATTI, 2009; CASTRO; AMORIM, 2015). Segundo Freire, essas
formações repousam sobre o autoritarismo e desrespeito à capacidade crítica e à prática do
professor:
Percebe-se como uma tal prática transpira autoritarismo. De um lado, nenhum
respeito à capacidade crítica dos professores, a seu conhecimento, à sua prática; de
outro, na arrogância com que meia dúzia de especialistas que se julgam iluminados
elabora ou produz o ‘pacote’ a ser docilmente seguido pelos professores que, para
fazê-lo, devem recorrer aos guias (FREIRE, 2001, p. 71).
Figura 4 - Aspectos a serem abordados em uma formação continuada e permanente baseada na TO.
Fonte: Elabora pelas autoras a partir dos trabalhos de Radford (2006; 2014; 2016; 2017; 2018).
O professor deve conhecer o currículo e discuti-lo de forma crítica a fim de que tome
consciência de que o currículo da escola atual está voltado para a satisfação do mercado de
trabalho, reduzindo os alunos a capital humano (RADFORD, 2016a). As orientações
conceituais da TO, relacionadas ao currículo, devem ser trabalhadas com base na discussão do
papel da educação contemporânea para a formação de sujeitos críticos e éticos e nas
concepções que a TO traz sobre aprendizagem e sobre do papel do professor e do aluno. Tais
discussões devem promover uma reflexão que leve a uma mudança na visão do professor
como detentor do conhecimento, assim como do aluno considerado como receptor,
encaminhando-as para uma visão de professor e alunos que trabalham juntos com o mesmo
objetivo. É importante também uma reflexão acerca da ética comunitária a partir de uma
concepção de uma ética em que não há centralidade no sujeito e que se volte para o bem
coletivo.
Deve ser considerada, no contexto formativo, a visão crítica do professor de si e dos
seus alunos como seres culturais que se desenvolvem na interação com a cultura (RADFORD,
2006; 2017a). Assim sendo, as discussões acerca do papel do professor devem estar
relacionadas a uma concepção histórica e cultural do aluno e à visão da democracia e da
cidadania a partir de uma perspectiva ética de solidariedade e de transformação social.
Os conceitos bases da TO devem ser trabalhados com os professores a fim de que
entendam a base conceitual da teoria, para que, a partir daí, possam planejar e desenvolver
atividades de acordo com as suas orientações metodológicas. Dessa forma, é relevante discutir
conceitos como saber, conhecimento, aprendizagem, atividade (labor conjunto), processos de
objetivação e subjetivação, ética comunitária e alienação. O planejamento e o
desenvolvimento de atividades AEA devem discutir as características e a estrutura da
atividade, bem como contemplar a dimensão do ser e do saber. Isso deve acontecer para que
os professores compreendam que trabalhar em conjunto não é apenas fazer grupos e que o
49
ensino e a aprendizagem são um único processo que ocorre na atividade quando alunos e
professores trabalham juntos. Assim, o planejamento do professor deve pensar em estratégias
para implementar o labor conjunto em sala de aula, a fim de assegurar que todos os alunos
exponham a sua opinião, ouçam e entendam os outros, critiquem e debatam em uma
experiência verdadeiramente democrática de cooperação e de vida coletiva, que a escola
tradicional não trabalha.
O método refere-se à base epistemológica que orienta a relação entre sujeito e objeto e
a lógica que garantirá a validade e a cientificidade da pesquisa. Ele também deve orientar a
escolha dos procedimentos da pesquisa e estar de acordo com o referencial teórico no qual a
pesquisa está embasada.
A forma de conceituar e classificar o método é diferente entre vários autores e, diante
disso, utilizam-se as ideias de Gamboa (2012) no que se refere a fundamentos que embasam a
lógica da construção do conhecimento no processo de investigação científica. Segundo esse
autor, na pesquisa educacional, os métodos utilizados podem ser agrupados em três vertentes:
empírico-analítica, fenomenológico-hermenêutica e crítico-dialética. O método empírico-
analítico centra-se na objetividade, na neutralidade e nos dados quantitativos, pois, conforme
Gamboa (2012), orientam as pesquisas que utilizam
[...] técnicas de registro e tratamento de informação marcadamente quantitativa. As
informações são recolhidas por meio de instrumentos estruturados (testes
padronizados, questionários estruturados, guias de observação etc.), permitindo o
tratamento estatístico e a apresentação dos resultados através de esquema
cartesianos, gráficos estatísticos ou quadros de correlações [...] (GAMBOA, 2012, p.
93-94).
base real de sua unificação na história. Na atividade prática e histórica dos homens verifica-se
a relação dialética entre o sujeito e o objeto e a interação entre homem e natureza”
(GAMBOA, 1998, p. 19). Neste sentido, Sousa Junior (2010) afirma que o homem é um ser
em construção, que transforma a natureza por meio de sua atividade prática, enquanto, em
sociedade, produz a si mesmo, transformando-se. Assim, o “[...] homem é, então, um ser
inacabado que se constrói justamente através das relações sociais: o homem é ser social que
produz a si em sociedade, transforma a si mesmo e ao mundo num processo [...] em que se faz
presente o caráter educativo da práxis humana” (SOUSA JUNIOR, 2010, p. 21).
No entanto, apesar de ser histórico e determinado socialmente, o homem tem a
capacidade de tomar consciência da sua condição histórica, quando pode “educar-se, por meio
das ações políticas e de libertar-se por meio da prática revolucionária” (GAMBOA, 2012, p.
161). Neste aspecto, o homem não é apenas um produto de sua existência e das condições
históricas, determinado pelas situações sociais, econômicas e políticas, mas é também um ser
transformador da natureza por meio do trabalho, construindo o seu ambiente social. Essa
perspectiva justifica o uso do método do materialismo histórico na educação com a intenção
de explicar as relações entre educação e sociedade, entre teoria e prática nas ações dos
professores, o que acaba por revelar as questões ideológicas que permeiam a prática docente e
a escola, bem como o controle das classes dominantes sobre ela (GAMBOA, 2012).
Com base no método marxista, uma visão histórico-cultural concebe que o homem é
um ser histórico que se constitui como sujeito por meio da cultura na qual está inserido. Dessa
forma, o método materialista histórico-dialético tem caráter material, pois o ser humano está
organizado em um mundo dialético, contraditório e em mudança, um mundo material e
histórico. É um método que essencialmente gera “núcleos de sentido a partir da noção de
contradição, que não opõe indivíduo-sociedade, mas prevê desvelar suas mediações
constitutivas” (ALVES, 2010, p. 11).
Considerando o referencial teórico e metodológico adotado, o método que orienta esta
pesquisa-formação aproxima-se da tendência crítico-dialética e pode ser caracterizado como
materialista histórico-dialético. É um método que concebe os fenômenos investigados como
dialéticos e interpreta-os a partir da teoria materialista, aplicando-os aos fenômenos
investigados na interação social no contexto da formação de professores, que é proposta. Tal
aproximação é também justificada pelos princípios ontológico, epistemológico, ético e
educativo do referencial teórico adotado, uma vez que, segundo Limas e Albornoz (2017, p.
54), a Teoria da Objetivação:
se refere a uma nova concepção de saber (como movimento, pura possibilidade).
52
Esses princípios foram discutidos com mais detalhes na seção 1.1 que trata do
referencial teórico da pesquisa. Nas próximas subseções, serão discutidos os pressupostos da
pesquisa-formação e a metodologia utilizada na pesquisa.
Com base nas ideias de Tripp, a “participação não é o único determinante do tipo de
projeto de pesquisa-ação que se está executando: existe uma dialética entre escolha do tópico
e participação, variações que dão origem a diferentes modalidades de pesquisa-ação” (TRIPP,
2005, p. 456). Vosgerou salienta que a sua proposta metodológica utiliza a modalidade de
pesquisa-ação-formação (CHARLIER et. al., 2002), que visa à aproximação entre dois polos,
a pesquisa e a formação, por meio de um projeto de formação integrador. Segundo Charlier,
Daele e Deschryver:
[...] este tipo de pesquisa [é] caracterizada por um projeto de ação em grupo, onde no
encaminhamento de pesquisa são associados professores em formação e seus
formadores. A originalidade desta modalidade está na complementaridade dos
encaminhamentos postos em prática simultaneamente. A pesquisa ajuda a regular a
formação e ela mesma a suporta (CHARLIER et. al., 2002, p. 350).
(RADFORD, 2020). Nessa proposta, será utilizado o termo pesquisa-formação, que será
entendida como uma ação desenvolvida com os participantes e não pelos participantes. Assim
posto, os professores darão o rumo da organização da formação, delineando as ações
formativas, no entanto, não haverá a participação na condição de pesquisadores.
a 5), sendo desenvolvida uma atividade por módulo, exceto no módulo 2, em que foram duas
atividades. Essa etapa teve como proposta desenvolver ações formativas baseadas na Teoria
da Objetivação no contexto escolar, a partir das necessidades dos participantes observadas na
primeira etapa e durante os encontros dos grupos. Foi utilizado um ambiente virtual de ensino
e aprendizagem (AVEA) Moodle, para postagem dos textos estudados nas atividades e das
produções dos grupos (registros das respostas das tarefas das atividades e planejamentos). Ao
final dessa etapa, foi aplicado um instrumento avaliativo diagnóstico e um opinário a fim de
obter informações para subsidiar o planejamento da terceira etapa da formação. A descrição
desse instrumento e opinário, com as suas assertivas e como subsidiaram a pesquisa, encontra-
se no capítulo 5, em que são discutidos seus resultados.
Etapa de emancipação coletiva: essa etapa foi desenvolvida nos meses de abril a
novembro/2019, com observações e acompanhamentos da prática pedagógica dos professores,
em reuniões para discutir a prática pedagógica, para planejamentos coletivos de aulas e
registros realizados pelos professores das aulas desenvolvidas com seus alunos. O objetivo
dessa etapa foi verificar se houve mudança na prática pedagógica por meio de ações que
caracterizam um professor intelectual crítico, bem como a emancipação coletiva dos
professores. As discussões e o planejamento coletivo realizados nessas reuniões tiverem como
objetivo planejar atividades AEA para os professores desenvolverem com os alunos.
Objetivaram também aprofundar as discussões e as reflexões sobre o uso de atividades
baseadas no labor conjunto e na ética comunitária no ensino de Ciências, com uso de artefatos
tecnológicos digitais disponíveis na escola, como computadores do laboratório de informática
e laptop educacional.
As ações da formação foram realizadas em uma relação de cooperação entre
pesquisadora e participantes da pesquisa, em atendimento às necessidades observadas. Nessa
perspectiva, a metodologia inicial da pesquisa-formação indicou o percurso por onde ela
caminha, mas foi somente durante o seu desenvolvimento que se pode ter uma descrição mais
detalhada desse percurso. Dessa forma, os resultados da análise dos dados da etapa
diagnóstica nortearam o planejamento das atividades do módulo 2 da formação da etapa de
labor conjunto. As atividades dos módulos 3 a 5 foram planejadas a partir de uma leitura
preliminar das produções dos professores (registro das respostas-tarefas das atividades,
planejamentos) e das anotações sobre a interação dos professores durante o desenvolvimento
da atividade, registradas no caderno de campo da pesquisadora. Assim sendo, os resultados de
uma atividade determinam o planejamento da atividade seguinte.
57
meio dos seguintes componentes didáticos: o objeto, o objetivo (meta) e a tarefa da atividade
(RADFORD, 2017b; 2020) e planejadas de acordo com as necessidades dos professores.
Conforme já se referiu, o objeto pode ser identificado como o projeto didático do formador.
Para que esse projeto se concretizasse foi necessário estabelecer objetivos, que foram
alcançadas por meio da tarefa da atividade. As tarefas foram organizadas por meio de ações e
questões-problema relacionadas e apresentadas de forma sequencial aos professores, com
complexidade conceitual crescente.
Essas atividades foram desenvolvidas em diferentes fases que propiciaram
apresentação da atividade para os professores; o trabalho em grupos para elaboração das
respostas das questões-problema com a colaboração da professora formadora; a socialização e
discussão com todos os grupos para o compartilhamento de ideias, soluções, desafios,
apresentação e generalização das produções.
As atividades (labor conjunto) não puderam ser determinadas antecipadamente, pois,
mesmo que relacionadas com o projeto da formação, o seu desenvolvimento dependeu das
relações entre professores e formadora, das relações deles com o saber, do seu labor conjunto,
ou seja, como se envolveram na atividade.
A seguir, é apresentada uma síntese das ações da pesquisa-formação que foram
desenvolvidas na escola nas três etapas propostas:
- Reunião com a representante da Secretaria de Educação e equipe gestora da escola (diretor e
coordenadores pedagógicos).
- Visitas à escola com a finalidade de conhecer a sua organização, equipe, o seu
funcionamento e a sua infraestrutura.
- Apresentação da proposta para todos os professores da escola com vistas a definir o grupo
participante da formação.
- Entrevista diagnóstica semiestruturada para obtenção do perfil dos participantes e do grupo.
- Ações diagnósticas com uso do laptop educacional e computador a fim de complementar os
dados da entrevista diagnóstica. Os objetivos e detalhamento dessas ações, bem como da
entrevista, estão detalhados na descrição do percurso formativo, no capítulo 2.
- Atividades (labor conjunto) de acordo com os pressupostos da TO com questões-problemas
que requereram:
a) Estudos de textos científicos sobre a TO e a metodologia do labor conjunto.
b) Discussões e reflexões coletivas sobre a prática pedagógica dos participantes, sobre o
planejamento de atividades e uso de artefatos tecnológicos digitais, como laptop educacional e
59
diretas das interações dos grupos durante as atividades, nos planejamentos coletivos e
produções dos professores. Esses momentos presenciais foram gravados em áudio e vídeo.
e) Caderno de campo utilizado pela pesquisadora a fim de registrar o que ocorreu nos
encontros presenciais para anotar detalhes relacionados ao andamento da pesquisa (datas,
horários, mudanças de cronogramas), ao comportamento dos participantes relacionados às
dimensões éticas (colaboração, responsabilidade, solidariedade, por exemplo), às dúvidas e às
necessidades dos participantes, assim como as impressões da pesquisadora.
Após a coleta, os dados foram organizados em pastas de acordo com estrutura
ilustrada na Figura 6 e armazenados no computador e em dispositivos de armazenamento
externo. Junto com o projeto da pesquisa foi elaborado o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (Apêndice A), que foi assinado pelos participantes, conforme aprovação do
Comitê de Ética da UFMS (parecer nº 2.857.091).
Foi feita a organização e a análise dos dados de forma a construir e descrever o
percurso da formação e oferecer subsídios para análise da formação realizada. A sua análise e
interpretação foi feita à luz do referencial teórico descrito na seção 1.1 deste capítulo.
A análise das interações durante a(s) atividade(s) foi realizada por meio de um
dispositivo de análise adaptado, tendo como ponto de partida as ideias de Radford (2015),
Veneu (2012) e Piccinini e Martins (2004), descritas na próxima subseção. A unidade de
análise foi a atividade, caracterizada em uma dialética no sentido materialista (RADFORD,
2015). Neste sentido, a atividade vai além de apenas realizar ações conjuntas, ela é concebida
como um sistema que satisfaz as necessidades coletivas, a partir de uma divisão específica de
trabalho, reproduzindo a sociedade como um todo.
A definição da atividade como unidade metodológica de análise justifica-se na ideia de
que, por meio da atividade mediadora, ocorre a aprendizagem, ou seja, o encontro com o
saber e a produção de novas subjetividades por meio dos processos de objetivação e
subjetivação que resultam em uma mudança na consciência do sujeito (consciência
individual) – (RADFORD, 2015; 2019). Considerando que a consciência individual é uma
particularidade da experiência social (VYGOTSKY, 1979) e que a atividade é responsável
pelo surgimento e pelo desenvolvimento dela (LEONTIEV, 2009), a aprendizagem nas
atividades formativas investigadas no âmbito da TO não considera o professor uma entidade
isolada, mas como uma “entidade histórico cultural” em transformação (RADFORD, 2018,
p.23, tradução nossa) e como “indivíduos-em-atividade” (RADFORD, 2015, p. 563, tradução
nossa).
Dessa forma, é apenas por meio da análise da atividade que os processos de
objetivação e subjetivação, que ocorrem na formação continuada e permanente de professores,
podem ser interpretados. Assim sendo, é apenas olhando para a atividade que se entende como
os professores encontram-se com novas formas culturais de pensamento, ação e cooperação e,
consequentemente, como desenvolvem formas de pensar e agir que caracterizam um professor
intelectual crítico.
Figura 8 - Quadro utilizado para organização dos enunciados dos episódios relevantes e das informações
relacionadas a eles.
c) Descrição do contexto extra verbal: a descrição foi realizada a partir das dimensões do
contexto comum em que foram desenvolvidas as atividades e do contexto individual dos
participantes. Na descrição do contexto extra verbal comum, foram considerados o contexto
da escola e de realização das atividades, incluindo o laboratório de informática, também
chamado de sala de tecnologias educacionais (STE), bem como os eventos externos que
influenciaram a formação. Os elementos que compõem o contexto extra verbal individual
serão descritos no capítulo 2, que analisa o perfil dos professores. Nas análises, as
informações do contexto extra verbal comum e individual serão articuladas com as
discussões, quando necessário.
d) Análise do enunciado: Após a organização dos enunciados dos episódios relevantes no
quadro (Figura 8), os enunciados foram analisados, articulando o contexto extra verbal e os
conceitos da TO, a fim de identificar indícios dos processos de objetivação e subjetivação nas
atividades formativas, relacionando-os com o desenvolvimento do perfil de um professor
intelectual crítico e da emancipação coletiva.
Na próxima seção, será apresentada uma síntese da revisão bibliográfica das
pesquisas que tratam da formação de continuada de professores de Ciências nos anos iniciais
e que envolvem artefatos tecnológicos digitais.
Foi realizada uma revisão bibliográfica teórica e empírica (FLICK, 2013) das
pesquisas empreendidas na área de formação de professores que tratam da formação
continuada de professores de Ciências nos anos iniciais e que envolvem artefatos tecnológicos
digitais. Os objetivos dessa revisão foram analisar algumas características das propostas de
formações inseridas nessas pesquisas e reconhecer os métodos e os referenciais teóricos-
metodológicos utilizados. Parte dessa revisão bibliográfica, encontra-se publicada no artigo
“Estado do Conhecimento da Formação Continuada de Professores dos Anos Iniciais para o
ensino de Ciências com uso de Artefatos Tecnológicos Digitais” (CAMILOTTI; GOBARA,
2019a). Na sequência, será apresentada uma síntese das análises publicadas no artigo.
O levantamento de informações que compõem a revisão bibliográfica publicada por
Camilotti e Gobara (2019a), compreende uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória
(SEVERINO, 2007). Essa pesquisa utilizou quatro bases de dados: banco de teses e
dissertações da CAPES (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior),
portal de periódicos da CAPES, atas do Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em
66
Este capítulo traz a descrição da escola em que foi realizada a pesquisa. Na sequência,
será apresentada a descrição do percurso formativo por meio das ações que antecederam o
início da formação na escola e as etapas realizadas, traçando o panorama do contexto extra
verbal comum em que tais ações foram desenvolvidas. Serão apresentados, ademais, o
planejamento das ações diagnósticas e a análise dos dados que permitiram descrever o perfil
das participantes, bem como os seus contextos extra verbais individuais.
educacionais que a escola recebeu por meio do PROUCA e pela proximidade da escola com o
município de Campo Grande.
Segundo dados do Projeto Político Pedagógico (SED/MS, 2018), a escola foi criada
em 1980 por meio do empenho da comunidade em busca de um estabelecimento de ensino
que atendesse as famílias dos moradores: do Indubrasil, das chácaras e das fazendas do
entorno. A região do Indubrasil, onde está situada a escola, tem 968 moradores e um déficit
educacional de 4,5% da população entre seis e 14 anos de idade (IBGE, 2018). A renda média
da população é de 0,5 a dois salários-mínimos (IBGE, 2018), caracterizando as famílias dos
alunos como famílias de baixa renda.
A região dispõe de pouca estrutura para acesso à informação e lazer das crianças,
jovens e adolescentes, sendo a escola um dos poucos locais que oferece tal estrutura e acesso
(SED/MS, 2018). Essas informações indicam a importância da escola para os moradores
locais, sendo um espaço não somente de aprendizagem de saberes científicos de diferentes
áreas de conhecimentos, mas também um local de acesso à informação, encontro e lazer.
73
Fonte: Acervo das autoras. Registro feito em 27/02/2018 (a) e 08/04/2019 (b).
de equipamentos pela escola. Nesse cenário, em 2011, foram recebidos 307 laptops
educacionais (Figura 11a) pela escola, sendo que 127 estão em funcionamento. Os
computadores portáteis (Figura 11b) foram adquiridos pela SED/MS com recursos do governo
federal por meio do Regime Especial de Aquisição de Computadores para Uso Educacional
(RECOMPE), no âmbito do PROUCA, em 2014 (BRASIL, 2010).
A escola conta com duas coordenadoras pedagógicas, sendo uma para os anos iniciais
do Ensino Fundamental e uma para os anos finais e Ensino Médio, além de 31 professores.
Em 2018, havia uma professora na função de PROGETEC (Professora Gerenciadora de
Tecnologias e Recursos Midiáticos), função substituída, em 2019, por um Técnico de Suporte
em Tecnologia (TST) – (MATO GROSSO DO SUL, 2019a). A PROGETEC tinha a função de
dar suporte técnico e pedagógico para uso dos artefatos tecnológicos digitais, sob orientação
do Núcleo de Tecnologias Regional (NTE-Regional) da CRE-2. O TST tem apenas a função
de oferecer apoio técnico para a utilização desses artefatos. Efeitos dessa mudança serão
discutidos no capítulo 6.
Do número total de professores, 14 foram professores dos anos iniciais em 2018 e são
professores em 2019 (Tabela 1). As turmas dos anos iniciais do E.F têm um professor regente
para Língua Portuguesa, Matemática, História e Geografia, um de Ciências, um de Educação
Física, um de Arte e um de TVT (Terra Vida e Trabalho - específico para escolas rurais)
(Tabela 1). O professor de Educação Física tem formação específica na área. O professor de
TVT tem formação específica em Ciências Biológicas. As turmas do 1° e 2° anos contam
também com professores de apoio para auxiliar o professor regente e os alunos com
deficiências.
Tabela 1 - Número de professores (Prof.) em cada disciplina nos anos iniciais do E.F (1º ao 5º) em 2018 e 2019.
Prof. Prof. de Prof. de Prof. de Prof. de
Total de Prof.
Disciplinas Regente Ciências Ed. Física Arte Apoio
2018 2019 2018 2019 2018 2019 2018 2019 2018 2019 2018 2019
Língua
Portuguesa
Matemática 08 08 - - - - - -
História
Geografia
03 03 14 14
Ciências - - 01 01 - - - -
Educação
- - - - 01 01 - -
Física
Arte - - - - - - 01 01
TVT - - - - - - - -
Fonte: Elaborada pelas autoras a partir de dados coletados durante visita à escola e informações disponíveis no
SGDE.
2016, nos meses de setembro e outubro de 2017, foram desenvolvidas as seguintes ações que
antecederam o início da pesquisa-formação na escola: reunião com a equipe da CRE-2/SED,
para autorização do desenvolvimento da formação na escola; reunião com a equipe gestora da
escola e com professores, em momentos separados, para a apresentação da proposta de
pesquisa-formação.
O projeto de pesquisa-formação foi apresentado para Coordenadora de Projetos
Educacionais da CRE-2/SED/MS, no dia 19 de setembro de 2017. Deixou-se claro que, por
tratar-se de uma pesquisa-formação, a metodologia proposta para uso pedagógico do laptop
poderia ser alterada de acordo com os resultados analisados, a fim de atender as necessidades
dos professores. A proposta inicial foi de uma formação semipresencial, baseada na ideia do
uso do laptop em atividades investigativas de cunho construcionista (VALENTE, 2005).
A proposta foi aprovada de imediato, mas com as seguintes condições: estabelecer uma
parceria da Secretaria de Educação com a universidade; os encontros presenciais não
poderiam ser realizados nos horários de aula ou nos dias de formação da Secretaria de
Educação e poderiam ser usados os horários de planejamento dos professores para a
formação, desde que não houvesse atrasos na realização do planejamento, de acordo com
cronograma estabelecido pela SED/MS.
Após ser firmada a parceria com a SED/MS, por meio da CRE-2, foi feito contato com
a escola e realizada uma reunião para apresentação da proposta no dia 20 de outubro de 2017.
O Diretor, as duas coordenadoras pedagógicas e a PROGETEC participaram da reunião. Foi
esclarecido que estava sendo feito um convite para a participação na formação, assim como
seria feito para os professores, que poderia ser aceito ou não. A escolha da pesquisadora por
essa escola deu-se pelos motivos descritos na seção anterior, no entanto, a intenção não era
impor a proposta e a participação à escola.
A equipe aceitou o convite sob o argumento que não recebia formações específicas
para o ensino de Ciências e que os laptops educacionais estavam ociosos, sendo que, naquele
contexto, a proposta atendia as necessidades da escola. Entretanto, foi solicitado que o convite
fosse estendido a todos os professores. Foram, neste caso, esclarecidas as condições impostas
pela CRE-2/SED para o desenvolvimento da pesquisa-formação, solicitada a carta de aceite
da escola (Anexo A) e agendada uma reunião para apresentação da proposta para os
professores.
O fato de a coordenadora da CRE-2 firmar parceria com a UFMS sem consultar a
escola sobre a possibilidade de participar da formação e de o diretor manifestar interesse na
formação para resolver o problema dos laptops ociosos evidencia a hierarquia existente na
78
escola. Ressalta também a racionalidade técnica presente nas práticas formativas, em que o
professor não participa do planejamento ou da tomada de decisões, apenas executa ações que
especialistas desenvolvem. Segundo Echalar (2015), esse modelo de formação instrumental
tem como princípios a fragmentação e a hierarquização e traz indícios da adaptação dos
indivíduos aos interesses da economia neoliberal e da alienação característica desse tipo de
formação.
A reunião com os professores foi realizada no dia 11 de novembro de 2017, em um
sábado letivo, em que os professores realizavam ações pedagógicas na escola, teve duração de
1h40min e a participação de 28 professores. De maneira geral, os professores mostraram
interesse na proposta e curiosidade sobre a forma como seria desenvolvida, pois esperavam
uma formação já com os conteúdos e as atividades definidas. A fala de um professor, que não
participou da formação e que será identificado como P0, evidencia esse fato:
[...] mas vocês não têm a ementa do curso para saber o que vamos discutir? Acho
importante saber o número de atividades, encontros, as ferramentas que vamos usar.
Parece que a formação fica muito solta, sem rumo. (P0).
Quadro 4 - Informações gerais sobre as ações desenvolvidas nas três etapas da formação.
(EP)/ N° de
Etapa/objetivo Período
Visitas Prof.
1. Diagnóstica: traçar o perfil dos participantes e 03 visitas
novembro/2017 13
verificar os saberes relacionados ao uso do laptop EP1
educacional e as concepções sobre o ensino de EP2
março e abril/2018 13
Ciências. EP3
2. Labor conjunto: realizar ações formativas EP4
maio e junho/2018 11
baseadas no labor conjunto, para explorar os EP5
principais conceitos da TO, que fundamentam o EP6
processo de ensino e aprendizagem e os saberes agosto e setembro/2018 EP7 11
para uso dos artefatos tecnológicos digitais, com 04 visitas
base na ética comunitária. outubro/2018 EP8 11
80
EP9
EP10
novembro/2018 EP11 11
EP12
dezembro/2018 02 visitas 11
3. Emancipação coletiva: realizar reuniões para abril/2019 1ª Reunião 10
acompanhamentos da prática dos professores e de junho/2019 2ª Reunião 10
atividades de ensino aprendizagem (AEA) Reuniões com
planejadas para as aulas de Ciências a fim de agosto e setembro/2019 10
os grupos
verificar indícios de mudanças na prática
Socialização
pedagógica e o desenvolvimento da autonomia novembro/2019 10
coletiva emancipatória. final
Fonte: Organizado pelas autoras.
Figura 13 - Dinâmica da construção do percurso formativo em que os resultados da pesquisa (R) determinam o
planejamento das tarefas das atividades AEA dos módulos (M) da formação.
Explorar o editor de Verificar os saberes dos professores sobre o uso do editor de apresentação e
apresentação. as concepções sobre alfabetização científica.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Figura 14 - Síntese do planejamento das atividades AEA da etapa de labor conjunto, realizada a partir dos
resultados (R) observados na análise inicial das atividades (labor conjunto).
Quadro 8 - Ações desenvolvidas nos encontros presenciais (EP) da etapa de labor conjunto em cada módulo (M).
Etapa de labor conjunto
M EP/Data Ações desenvolvidas
- Apresentação do módulo 2 (dois) “Ensino de Ciências baseado no trabalho
conjunto”.
- Discussão sobre os motivos que levaram a usar a TO na formação.
EP4
2 - Apresentação da tarefa da Atividade AEA 1 “Alimentação saudável”.
11/05/2018
- Realização da Atividade 1.
- Orientações para estudos à distância: reflexões sobre o vídeo: conversa com Luis
Radford.
- Discussão sobre a metodologia da atividade baseada no trabalho conjunto na perspectiva
da TO, com base nas reflexões sobre o vídeo: conversa com Luis Radford, realizadas a
distância.
- Apresentação da tarefa da Atividade AEA 2 “Teoria da objetivação: conceitos básicos e
EP5
2 planejamento inicial de uma atividade de Ciências”.
08/06/2018
- Realização da Atividade 2.
- Orientações para realização da ação 3 da atividade 2 a distância: elaboração de uma
atividade baseada no trabalho conjunto, a partir da metodologia da atividade da TO, para
trabalhar um conteúdo de Ciências.
- Encaminhamento de devolutivas com sugestões de ajustes referentes à atividade AEA
elaborada pelos grupos de professores (ação 3 da atividade 2).
- Apresentação do módulo 3 “Planejamento de aula e de atividade na perspectiva da
EP6
3 TO”.
17/08/2018
- Apresentação da tarefa da Atividade AEA 3 “Planejamento de aula e reelaboração de
atividade na perspectiva da Teoria da Objetivação (TO).”
- Início da realização da Atividade 3.
EP7 - Continuação da realização da Atividade 3.
3
25/08/2018 - Orientações para realização da ação 4 da atividade 3 à distância: os grupos reuniram-se
85
Os registros dessas reflexões indicaram o interesses dos professores pela proposta da TO,
conforme fala da PA: “ele (Radford) fala que a teoria forma indivíduos críticos e também nas
relações com os outros, no respeito, é bem diferente das teorias que a gente viu, que fala só do
conteúdo”.
Esse interesse foi reforçado por eles no momento presencial em que aceitaram
participar da proposta de uma formação baseada na TO e de uma metodologia para o ensino
de Ciências fundamentada no trabalho conjunto. Dessa forma, a TO foi apresentada para o
grupo de professores como uma teoria que traz uma visão do ensino de Ciências que
compreende a dimensão do saber e do ser, baseado na superação do individualismo e com
ênfase em ações regidas por uma ética voltada para o compromisso, a responsabilidade e o
respeito com os colegas.
No final do módulo 2, os professores manifestaram a insatisfação em realizar
atividades à distância, argumentando que conseguiam organizar o tempo para os momentos
presenciais com mais facilidade do que para os estudos individuais à distância. Foi explicado
que a não realização de atividades à distância resultaria no aumento da carga horária
presencial. As professoras formadoras fizeram a seguinte proposta: o AVEA seria utilizado
para postagem dos registros das tarefas das atividades presenciais e para a postagem dos
textos a serem lidos; e que as atividades à distância seriam realizadas quando fossem
imprescindíveis.
Após a finalização do módulo 5, as professoras responderam um opinário sobre a
formação e um instrumento diagnóstico avaliativo, a fim de verificar a opinião delas em
relação à formação desenvolvida, ao processo de objetivação (encontro com os saberes
culturais) e ao processo de subjetivação (produção de novas subjetividades).
Durante as reuniões de dezembro de 2018, as professoras dos anos iniciais relataram
estar angustiadas com informações de que haveria reestruturação na SED/MS, o que poderia
afetar a contratação de professores, representando uma ameaça à permanência na escola e a
possibilidade de desemprego. Esse foi um fato do contexto extra verbal da formação.
Quadro 9 - Ações desenvolvidas nos encontros presenciais (EP) da etapa de emancipação coletiva.
Etapa de emancipação coletiva
EP/Data Ações desenvolvidas
- Discussão sobre a prática pedagógica dos professores no 1º bimestre/2019:
atividades AEA desenvolvidas e uso dos recursos tecnológicos digitais.
1ª Reunião
- Reflexão sobre fatos do contexto extra verbal que mudaram a estrutura da escola.
22/04/2019
- Relato das sugestões para a formação em 2019 a partir das necessidades formativas
dos professores.
2ª Reunião - Retomada de conceitos básicos da TO.
21/06/2019 - Orientações para reorganização dos grupos de trabalho dos professores.
Reuniões individuais - Planejamento coletivo de uma atividade AEA: definição do objeto e objetivos
com grupos: 19 e (metas).
31/08/2019; - Orientações para apresentação do relato da atividade AEA desenvolvida com os
18/10/2019 alunos.
Socialização Final - Socialização das atividades desenvolvidas com os alunos: apresentação para os
09/11/2019 colegas e discussão das apresentações expondo suas opiniões e sugestões.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
88
Figura 16 - Ações realizadas nas três etapas da formação e os principais eventos do contexto extra verbal.
A etapa diagnóstica teve o objetivo de traçar o perfil das professoras, de acordo com
os modelos de professores apresentados por Contreras (2002), conforme foi discutido no
capítulo 1. Foi também objetivo dessa etapa levantar os saberes relacionados ao uso dos
artefatos tecnológicos digitais (laptop educacional e computador), as concepções sobre o
ensino de Ciências e sobre a alfabetização científica. Foram realizadas quatro ações
diagnósticas: entrevista, um questionamento sobre o ensino de Ciências, o uso do editor de
texto e o uso do editor de apresentação.
A terceira ação “Uso do editor de texto” foi planejada para os professores produzirem e
formatarem um pequeno texto sobre a importância de ensinar Ciências com base na leitura do
artigo “Ensino de Ciências nos anos iniciais do ensino fundamental: possibilidades e desafios
em Canoas-RS” (SOARES et. al., 2013). Eles deveriam formatar o texto, de acordo com as
orientações do Apêndice C, e converter em pdf. Deveriam também escolher uma imagem da
internet, inserir no texto e propor uma atividade didática que levasse os alunos a entender a
importância dos saberes científicos para eles.
Na quarta ação, “Uso do editor de apresentação” (Apêndice D), a intenção foi que os
professores elaborassem três slides no computador do laboratório de informática (LI), em que
deveria ser produzido um texto, com base na leitura do mesmo artigo utilizado na ação 3,
sobre a importância da alfabetização científica dos alunos. Nos slides, as professoras
deveriam formatar fonte, inserir um vídeo, a letra da galeria Fontwork, um plano de fundo,
uma figura e uma animação no texto.
dados diagnósticos foi publicada em dois artigos (CAMILOTTI; GOBARA, 2018; 2019),
portanto, apresentaremos apenas uma síntese dessas análises.
As oito professoras participantes da pesquisa atuam nas séries iniciais do E.F., sete são
formadas em Pedagogia, as quais foram denominadas PA, PB, PC, PE, PF' e PG. Somente
uma professora, que foi chamada de PD, tem graduação em Educação Física. Quatro delas
têm especialização. Elas têm de 27 a 57 anos de idade, quatro a 23 anos de carreira docente e
com, no máximo, sete anos de uso do computador junto aos alunos (Tabela 2).
As professoras PA, PB, PD, PF' ministram aulas em duas escolas (Rede Estadual e
Municipal), enquanto as demais trabalham somente na escola em que foi realizada a pesquisa.
No entanto, eventualmente as professoras que trabalham somente meio período (20h)
ministram aulas particulares ou atuam como professoras substitutas. As professoras PA, PB e
PF' ministram também aulas de Ciências na Rede Municipal de Ensino, no município de
Terenos, em que o professor regente ministra aulas de todas as disciplinas, pois não segue a
mesma legislação da Rede Estadual de Ensino. A professora PC é professora de Ciências na
escola em que a pesquisa foi realizada. As professoras PG e PH são professoras de apoio e
acompanham as aulas das professoras regentes e da professora de Ciências, trabalhando
especificamente com alunos com necessidades especiais que foram matriculados nas salas
regulares.
4° ano (apoio)
Pedagogia/
PG 57 Sala de 23 08
Ed. Especial 01 Convocada/40h
recursos
Pedagogia/ 1° ano (apoio)
PH 42 16 07 01 Convocada/40h
Ed. Especial 6° ano (apoio)
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quadro 10 - Informações sobre a satisfação com o sistema de ensino e as mudanças necessárias (S: sim; N: não).
Sistema de ensino Mudanças necessárias
Prof. Rede Prática
Escola Rede Estadual Escola
Estadual Pedagógica
Menos
S: Liberdade e Metodologia,
N: Afastada do burocracia no
apoio para o com melhor uso
professor e da planejamento
trabalho Melhor dos recursos
PA realidade da sala. (formulários) e
pedagógico. infraestrutura. tecnológicos,
Referencial curricular mais tempo
N: Infraestrutura que melhorem a
muito extenso. para trabalhar
precária (internet). aprendizagem.
o conteúdo.
Mais tempo Metodologia que
para o melhore a
N: Quantidade de N: Muitas ações e
PB Não. professor aprendizagem
trabalho. pouco tempo.
realizar as dos alunos com
ações. uso do laptop.
Metodologia que
S: Apoio para o use mais os
N: Muito conteúdo Mais tempo
trabalho recursos
PC para trabalhar. Não. para trabalhar
pedagógico. tecnológicos
o conteúdo.
para melhorar a
aprendizagem.
Metodologia que
melhore a
aprendizagem
N: Alunos com dos alunos, que
S: Flexibilidade para Metodologia
dificuldades de eles possam
trabalhar o conteúdo que melhore a
PD aprendizagem não - participar mais
dentro do currículo da aprendizagem.
recebem atenção na resolução das
SED.
especial. atividades, com
uso do
computador e
laptop.
S: Liberdade e N: Referencial Repensar o
Ações para que
apoio para o curricular extenso. referencial Metodologia que
a família
trabalho Burocracia e curricular de melhore a
PE participe mais
pedagógico. problemas no sistema acordo com o aprendizagem
da vida escolar
N: As famílias não de planejamento tempo de aula dos alunos, que
dos alunos.
participam da vida online. e o sistema de use mais
94
Metodologia que
N: Desvalorização do Melhor melhore a
N: Infraestrutura e Igualdade de
professor. infraestrutura e aprendizagem
PG falta de material direitos entre
material dos alunos e o
didático. os professores.
didático. uso de
tecnologias
digitais.
Metodologias
que usem as
S: Apoio para o tecnologias e
Cronograma
trabalho N: Excesso de ações estejam voltadas
de ações
pedagógico. da SED para as
PH - considerando
N: Sobrecarregada (planejamento online, necessidades e
o tempo que o
pelas ações projetos). interesses dos
professor tem.
pedagógicas. alunos e que
melhore a
aprendizagem.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Por outro lado, a insatisfação das professoras PA, PB, PG e PH está na infraestrutura
precária (internet lenta e computadores/laptops antigos), na quantidade excessiva de trabalho
e na falta de materiais didáticos, exceto os livros didáticos (Quadro 10). A professora PD
demostrou preocupação com a falta de um trabalho específico para os alunos com
dificuldades de aprendizagem. Já a professora PE citou a baixa participação dos familiares na
vida escolar dos alunos, o que transfere e responsabiliza esse compromisso na função do
professor. Por fim, as professoras apontaram como mudanças necessárias os aspectos
relacionados com as suas insatisfações (Quadro 10). As demais professoras (PC e PF')
disseram estar satisfeitas e, portanto, não apontaram necessidades de melhorias/mudanças na
escola.
As manifestações dos professores evidenciam que há um grupo de professoras (PA,
PD, PE, PG) que não se sente satisfeito com as condições impostas de trabalho e apontaram
mudanças necessárias. Há um outro grupo de professoras que demonstrou insatisfação (PB e
PH), mas não indicou melhorias, parecendo estar conformado com a situação. Há também o
grupo (PC e PF') em que as professoras não mencionaram os problemas apontados pelas
demais, manifestando uma aceitação das condições que a escola impõe.
Embora o segundo grupo demonstre uma insatisfação, as professoras não apontaram
95
5
Conforme o Sistema de Planejamento Online da SED/MS, periodicamente, os professores da Rede de Ensino
Estadual de Mato Grosso do Sul realizam e enviam seus planejamentos de aulas para análise pelos
coordenadores pedagógicos e arquivamento.
97
iriam entender melhor o conteúdo e aí aprendendo mais” (PA) e “Eu sei que posso melhorar
minha prática com uma metodologia diferente, uma que use menos lousa e caderno e mais
tecnologias digitais para que os alunos aprendam mais” (PC).
Somente as professoras PD e PH relacionaram o uso de tecnologias a uma metodologia em
que os alunos possam participar mais na resolução das atividades (PD) e que esteja voltada
para as necessidades e interesses deles (PH) - (Quadro 10). Exceto por essas duas professoras
(PD e PH), as respostas das demais sugerem a concepção que elas têm das tecnologias digitais
como mediadoras do conhecimento, que é amplamente divulgada nas formações continuadas,
baseadas no construcionismo. A visão das professoras PD e PH aproximam-se mais da ideia
da Teoria da Objetivação, considerando que os artefatos tecnológicos digitais são parte de
uma atividade mediadora (RADFORD, 2017a). Nessa compreensão, não é o uso desses
artefatos em si que resultará na aprendizagem, mas o seu uso no contexto de uma atividade
baseada na colaboração de alunos e professor pautada na solidariedade, respeito e cuidado.
Embora a maioria das professoras apresente uma concepção de metodologia voltada
para o uso de tecnologias com vistas à melhoria da aprendizagem, o fato de sentirem
necessidades de mudança na prática pedagógica favoreceu a aceitação de uma formação
diferenciada daquela que elas estavam habituadas, baseada na TO. Quando questionadas sobre
o que elas entendiam sobre aprendizagem, as professoras associaram-na apenas à
aprendizagem de conteúdos, ou seja, de acordo com a TO, apenas aos processos de
objetivação.
Ao serem questionadas se gostavam da profissão que exercem, as professoras PA, PB,
PE, PG e PH responderam afirmativamente e disseram que ficam satisfeitas quando o aluno
aprende o que elas ensinam. Conforme suas exposições verbais, observa-se que elas referem-
se, novamente, à aprendizagem apenas dos conteúdos: “gosto de ser professora pela satisfação
de ver o aluno aprendendo os conteúdos, que são importantes para ele, como a dengue,
vacinas, reciclagem” (PA); “[...] muito bom ver eles aprendendo o que ensino, evoluindo, indo
bem nas provas” (PE); “É uma alegria ver que os alunos estão aprendendo, principalmente na
alfabetização, ver eles lendo e escrevendo é muito bom” (PB).
Já as professoras PC, PD e PF' disseram que, também, gostam da profissão por
reconhecerem o seu papel na formação do aluno como sujeito, conforme os seus depoimentos:
“Sei que somos importantes na vida deles, não só para aprender, mas na formação deles como
pessoas” (PC); “[...] porque não é só aprender, tem que formar pessoas de bem” (PD);
“possibilitar que meu aluno aprenda e também estar ali e aprender com eles. E também
conviver com eles, fazer algo por eles, aqueles que têm mais dificuldades de aprender e se
98
relacionar” (PF').
Observa-se nesses depoimentos uma preocupação com a dimensão do sujeito, além do
ensino de saberes científicos. Essas manifestações sugerem que a concepção de educação
dessas professoras (PC, PD e P) aproxima-se das ideias da TO sobre a aprendizagem,
concebida não somente como o encontro com o saber, mas também a transformação do ser
(RADFORD, 2019; 2020). Porém, as demais professoras evidenciaram uma concepção de
educação voltada para a disseminação de conteúdos e centralizada no professor, característica
de um modelo tradicional de ensino (RADFORD, 2016a), cujo perfil é de um professor
especialista técnico CONTRERAS, 2002). A proposição de uma formação continuada e
permanente que considera as dimensões do saber e do sujeito pode levá-las à superação dessa
visão tradicional de educação (CAMILOTTI; GOBARA, 2018).
Antes de iniciar os questionamentos referentes ao ensino de Ciências com uso de
tecnologias educacionais digitais foi esclarecido para as professoras que se estava
considerando o ensino de saberes científicos da área de Ciências, conforme consta no Projeto
Político Pedagógico da Escola (SED/MS, 2018).
Ao serem questionadas sobre como realizam o planejamento das aulas que envolvem
saberes científicos, as professoras disseram que planejam as aulas buscando, na internet,
conteúdos (textos e vídeos), exercícios e jogos online a fim de complementar o conteúdo do
livro didático ou que é enviado pela SED no contexto dos projetos. Elas registram o
planejamento no Sistema de Planejamento online da SED e esclarecerm as dúvidas com a
Coordenadora e PROGETEC, quando necessário. Elas não mencionaram planejamentos em
conjunto com os outros professores que ministram aulas para a mesma turma ou mesmo ano
ou mesma matéria, como, por exemplo, Ciências.
Quando questionadas sobre porque não realizam o planejamento junto com as outras
professoras, elas disseram que não têm essa prática devido à falta de tempo. Segundo elas, os
prazos para inserir o planejamento no Sistema de Planejamento online exigem rapidez na
elaboração de atividades e no seu registro. Conforme exemplificado pelas falas das
professoras PE e PD: “(…) na verdade, a gente e a coordenação não pensa muito nisso, acaba
mesmo cada um fazendo o seu PL, tudo tem que ser rápido por causa do cronograma da SED”
(PE); “(…) assim, tudo funciona com prazo, para fazer junto (o planejamento) tem que se
reunir, discutir, e a gente acaba não fazendo porque não daria tempo mesmo” (PD). Essas
manifestações mostram, novamente, uma visão de planejamento característica de um
professor especialista técnico (CONTRERAS, 2002) e uma evidente preocupação em cumprir
os prazos estabelecidos pela Secretaria de Educação. Além disso, destacam o individualismo
99
As tecnologias empregadas por elas com os alunos são: computadores do LI, laptops
educacionais, projetor multimídia e celulares de alunos e professores. Todas disseram que
também usam o notebook pessoal, na escola e em casa para fazer o planejamento das aulas e
100
professoras disseram ter dificuldades para usá-los, atribuindo tal fato ao desconhecimento de
programas, além do editor de texto, editor de slides e navegadores da internet (PB, PC, PF',
PG e PH). Outras dificuldades são o número reduzido de computadores por aluno no LI (a
média aproximadamente de cinco alunos por computador; PD), a falta de um bom sinal de
internet (PE) e o desconhecimento de uma metodologia que possa usar com outros recursos,
além do vídeo (PA) - (Quadro 12).
Quadro 12 - Ações pedagógicas sem uso dos artefatos tecnológicos, dificuldades no uso dos artefatos e
importância para a aprendizagem dos alunos.
Ações pedagógicas: sem uso Uso do computador e laptop:
Prof. de artefatos tecnológicos Importância para a
digitais Dificuldades
aprendizagem dos alunos.
Perguntas sobre o tema antes
Metodologia para usar
de iniciar o conteúdo, leituras Aulas diferenciadas que permitem
PA outros recursos, além do
de textos e exercícios de mais uso de imagens.
vídeo.
interpretação.
Uso dos programas e
O vídeo e as imagens facilitam
Leitura de textos curtos e aplicativos: usa apenas o
PB que os alunos visualizem o
exercícios de interpretação. editor de texto de
conteúdo.
apresentação e internet.
Uso dos programas e O uso da internet permite contato
Leituras de textos e resolução aplicativos: usa apenas o com conteúdos que os livros não
PC
de exercícios. editor de texto de têm.
apresentação e internet. Os alunos gostam de usar.
Leituras de textos e resolução Permite ilustrar o conteúdo por
PD Poucos computadores no LI.
de exercícios. meio de imagens e vídeos.
Leituras de textos e resolução Os alunos gostam e participam
PE Falta de internet.
de exercícios. mais das aulas.
Leituras de textos, resolução de
exercícios, pesquisa de Consegue usar somente o Os alunos gostam de usar o
PF' informações em livros, recortes editor de texto e câmera do computador e participam mais das
de imagem e aulas práticas (de laptop. aulas.
campo e experimentos).
As tecnologias podem ajudar os
Usa apenas o editor de texto
PG - alunos a suprir as suas
e internet.
necessidades.
Usa apenas do editor de As tecnologias podem ajudar os
PH - texto, de apresentação e alunos a suprir as suas
internet. necessidades.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quando perguntadas sobre a quem recorrer nas dificuldades para utilizar tais artefatos,
todas citaram a PROGETEC, somente a PE disse que buscou a ajuda dos alunos. As
professoras também disseram que não buscam a ajuda de outros professores, o que, segundo a
PG, ocorre porque “nem sempre os colegas têm paciência para ajudar e, também, cada um tem
suas coisas para fazer” (PG). A fala da PG, novamente, evidencia o individualismo presente na
prática das professoras e uma visão do professor relacionada a um modelo tradicional de
educação (RADFORD, 2016a).
digitais para a aprendizagem dos alunos, todas as professoras afirmaram que elas são
importantes. Segundo elas, porque, em geral, essas tecnologias complementam o que é
trabalhado na sala de aula (imagens para ilustrar textos e busca de informações que não estão
no livro didático), além do fato de os alunos gostarem de usar o computador e a internet
(Quadro 12). Isso pode ser observado na fala da professora PC, quando ela afirma: “[...] eles
(os alunos) têm facilidade de usar e gostam de usar. Também usando a internet podemos
acessar conteúdos que não teríamos acesso sem ela, nos livros, por exemplo, e também usar
imagens e vídeos para ilustrar os textos” (PC). Essas professoras, em função de suas
dificuldades, utilizam esses artefatos como meio para acessar as informações, principalmente
via internet, o que sugere uma visão limitada dos artefatos tecnológicos digitais. Esses
artefatos culturais, quando utilizados associados a uma metodologia de ensino baseada no
trabalho conjunto (RADFORD, 2017a), podem contribuir para melhorar a aprendizagem dos
alunos (CAMILOTTI; GOBARA, 2018).
Quando questionadas sobre as ações pedagógicas que realizam nas aulas sem o uso de
tecnologias educacionais (artefatos tecnológicos digitais), todas as professoras relataram que
essas ações baseiam-se em leituras de textos e exercícios de interpretação (Quadro 12). A
professora PA disse que também faz perguntas sobre o tema antes de iniciar o conteúdo. A
professora PF' afirmou que, além de propor que os alunos procurem informações em livros e
recortes de imagens em revistas e livros didáticos antigos, realiza aulas práticas (de campo e
experimentos), para “[...] mostrar o que eles viram nas pesquisas e nos livros” (PF'), nas aulas
de Geografia e nas aulas de Ciências que ministra na Rede Municipal de Ensino. De acordo
com Oliveira (2010), essa prática é caracterizada como uma ação de ensino tradicional, pois
ela tem como objetivo verificar as informações presentes nos livros e/ou internet. Tal prática
enfatiza a transmissão de informações e o individualismo presente na escola contemporânea
(RADFORD, 2016a), porque não privilegia a investigação dos fenômenos.
As professoras de apoio PG e PH não realizam ações diferenciadas com os alunos
especiais que elas atendem, apenas acompanham e executam o planejamento das professoras
regentes.
Sobre como avaliam a sua aprendizagem na formação inicial e continuada para o uso
tecnologias educacionais no ensino de Ciências, as professoras afirmaram que a formação
inicial não ofereceu subsídios para uso desses recursos, nem tampouco base conceitual para o
ensino de Ciências. Elas responderam que não se sentem preparadas para trabalhar os
conceitos científicos com os alunos, exceto a PA que, ao ser questionada sobre a sua
preparação, explicou “[...] foi na prática, em sala de aula, estudando o conteúdo” (PA). Elas
103
afirmaram também que nunca participaram de formações continuadas com foco no ensino de
Ciências e com ênfase ainda no uso de tecnologias educacionais digitais. A professora PC
disse que havia participado de apenas uma formação com metodologias que incluíam o uso
dessas tecnologias, mas a proposta não diferia da prática adotada por ela (GOBARA;
CAMILOTTI, 2018).
Quando indagadas sobre a participação de formações continuadas para uso pedagógico
das tecnologias educacionais digitais e sobre as suas contribuições em suas práticas
pedagógicas, as professoras disseram que participam semestralmente de formações ofertadas
pela Secretaria de Educação. Segundo elas, essas formações contribuíram para uso de alguns
recursos tecnológicos, levando-as a inseri-los em suas práticas pedagógicas, porém não
contribuíram para mudanças no que se refere às metodologias de ensino e aprendizagem que
utilizam (CAMILOTTI; GOBARA, 2018). Conforme evidencia-se em seus depoimentos: “Eu
aprendi mesmo a usar alguns programas, mas não mudei muito as atividades que faço com
eles (os alunos), mudei assim, eu uso mais os recursos” (PB); “Aprendo com as formações,
mas a usar os recursos, por exemplo, aprendemos a usar o formulário eletrônico do Google,
mas assim, mudança para uma metodologia inovadora, algo muito novo, não muito” (PD).
Elas atribuem a pouca contribuição dessas formações a problemas como a falta de um
horário específico e curta duração para realizá-las, ao excesso de teoria e às propostas
metodológicas que não atendem as suas necessidades, (Quadro 13), como pode ser
exemplificado na fala da professora PF':
Elas (as formações continuadas) contribuíram para aprender a mexer com o
computador, os recursos tecnológicos né, mas não ajudam a gente planejar com eles,
fazer uma atividade diferente. Assim, até traz, mas é muito longe da realidade da
nossa sala de aula, então, quando vem a parte da metodologia é muito difícil
trabalhar. Vem muito falando do construtivismo, mas é difícil levar lá, para os meus
alunos, acho que até por insegurança minha e como é muito rápido, a gente não tem
o tempo para conseguir ter segurança. E eu vejo isso nas meninas aqui também,
ninguém consegue. Então, não posso dizer que não aprendemos, aprendemos mais a
parte dos recursos (PF').
Ao responderem sobre as mudanças que elas acham necessárias nas formações das
quais participaram, todas as professoras apontaram a necessidade de formações com maior
tempo de duração, tempo específico para realizar as ações formativas no horário de trabalho e
ações formativas que atendam às suas reais necessidades de aprendizagem (Quadro 13).
104
Quadro 13 - Problemas e mudanças necessárias nas formações continuadas na visão das professoras.
Problemas Mudanças necessárias
- Auxílio no uso dos recursos (saberes - Formações mais longas, que respeitem o tempo de
relacionados aos artefatos tecnológicos). aprendizagem.
- Pouco tempo de formação. - Ações formativas que atendam às necessidades dos
- Muito conteúdo. professores.
- Metodologias não ajudam na mudança da - Metodologia que os professores consigam usar na
prática pedagógica. prática (PF', PD)
- Não há tempo específico para realizar as ações - Tempo específico para a formação continuada (formação
formativas. em serviço).
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quadro 14 - Saberes sobre a importância do ensino de Ciências e da alfabetização científica, sobre o uso dos
artefatos tecnológicos e uso pedagógico do editor de texto.
Concepções sobre: Saberes sobre o uso das
Proposta de uso
ferramentas do Editor
Ensino de pedagógico do editor de
ID Alfabetização Digital de Texto (ET) e Editor
Ciências texto
de Apresentação (EA)
Traz aos alunos
conhecimentos para
Por que a palavra garantir o entendimento
Ciência está ligada das necessidades ET: Formatou a fonte, Imagem relacionada ao
ao nosso viver, em humanas como saúde, inseriu ensino de Ciências (duas
imagem e
crianças com livro e globo
PA tudo trabalhamos questões ambientais e converteu em pdf.
e falamos sobre sociais. terrestre) para que o aluno
EA: Somente não inseriu
ela. interpretasse e escrevesse
animação na letra.
palavras relacionadas.
Formar um aluno
crítico.
Alguns elementos dos textos, apresentados no Quadro 14, evidenciam essa mudança na
concepção dessas professoras, quando elas mencionam que o ensino de Ciências é importante
para: “formação do aluno crítico” (PB); “uma análise crítica dos problemas do seu entorno”
(PC); “discutir criticamente os problemas ambientais” (PD) e “Formar indivíduos críticos [...]
tendo consciência do seu papel na sociedade” (PH). As alterações nas concepções dessas
professoras parecem estar relacionadas às ideias apresentadas no texto de que: “a nossa
responsabilidade (dos professores) maior em ensinar Ciências é procurar fazer com que
nossos alunos e alunas se transformem, com o ensino que fazemos, em homens e mulheres
mais críticos” Chassot (2006, p. 36). Ademais, associam-se à a ideia de que “(…) ensinar
Ciências no mundo atual deve constituir uma das prioridades para todas escolas, que devem
investir na edificação de uma população consciente e crítica diante das escolhas e decisões a
serem tomadas” (BIZZO, 2009, p. 16).
Sobre a importância da alfabetização científica, a análise dos slides elaborados na
quarta ação demonstrou que as professoras associam a alfabetização científica: à garantia de
conhecimentos para compreender o mundo e os seus problemas (PA, PC, PE, PF'); à formação
de cidadãos participativos e críticos, conscientes de seus direitos e deveres (PC, PD); ao
estímulo para o aluno posicionar-se diante de problemas ambientais e sociais (PG) e ao
entendimento crítico das tarefas cotidianas (PH). Essas ideias estão vinculadas a uma
concepção de que a alfabetização científica tem importância para a formação do cidadão
crítico, capaz de entender e atuar no contexto em que vive, participando das decisões no
contexto social, de acordo com as ideias defendidas por Cachapuz et. al. (2004).
As concepções das professoras estão relacionadas com a afirmação de que o principal
papel da alfabetização científica é “fornecer os assuntos para melhor compreensão e
entendimento do mundo” (Soares et. al. 2013, p. 52), presente no artigo que elas estudaram.
Essa relação confirma que as professoras inseriram elementos do texto estudado em seu
discurso sobre a importância da alfabetização científica. No entanto, quando essas concepções
são comparadas com as concepções delas sobre a importância do ensino de Ciências (Quadro
14), observam-se duas situações. Na primeira, as concepções das professoras PC, PD e PH
são coerentes e relacionam-se, visto que o ensino de Ciências baseado na formação de um
sujeito crítico levaria à alfabetização científica, no sentido apresentado no texto. Na segunda
situação, há uma incoerência nas concepções das professoras PA, PE, PF' e PG sobre a
alfabetização científica, uma vez que a concepção de um ensino de Ciências voltado para
entendimento de situações cotidianas, com ênfase nos conceitos científicos, não teria como
consequência a alfabetização científica com a formação de sujeitos críticos. Essa segunda
109
Em síntese, a análise do perfil das professoras, com base nos modelos de professores
descritos por Contreras (2002), indica que elas têm um perfil de especialista técnico com uma
prática pedagógica voltada para propostas tradicionais de ensino com uso de artefatos
tecnológicos calcados na busca e transmissão de informação e no individualismo. As
professoras PA, PD, PE e PG apresentam, em seu discurso, elementos de um profissional
reflexivo, o que é contraditório quando são analisadas as suas práticas pedagógicas. Tal fato
reflete a contradição existente na educação originada pela coexistência, numa perspectiva
dialética e conflituosa, de uma tendência reprodutora do sistema na prática e a tendência
transformadora.
O perfil esperado de um professor é o de um intelectual crítico com uma prática
voltada para a emancipação e coletividade (CONTRERAS, 2002). Essa ideia aproxima-se do
projeto educacional da TO (RADFORD, 2015) e indica a necessidade da formação de grupos
para realizar o trabalho comum nas atividades formativas com base na ajuda mútua,
cooperação e coletividade.
As atividades diagnósticas evidenciaram que, de maneira geral, as professoras têm
concepções sobre a importância do ensino de Ciências com ênfase na aprendizagem de
conteúdo. Ademais, elas concebem a alfabetização científica com destaque para a formação
de sujeitos críticos numa perspectiva individualista, o que não condiz com a sua prática
pedagógica. Tal fato também é ressaltado nas propostas de uso pedagógico do editor de texto
que indica uma prática tradicional, baseada no individualismo e na transmissão de
informações, característicos de uma prática alienante.
As formações continuadas que elas participaram são formações fechadas e assentadas
na racionalidade técnica, já que não incluem metodologias diferenciadas para elas e enfatizam
os saberes culturais relacionados ao uso dos artefatos tecnológicos. Esse tipo de formação não
propicia um ambiente de reflexão crítica que possa levar ao desenvolvimento de um modelo
de professor intelectual crítico.
É importante ressaltar que a alienação observada na prática pedagógica das professoras
112
é resultado das condições objetivas do trabalho docente. Tais práticas resultam das condições
materiais e concretas como, por exemplo, a infraestrutura da escola, a formação docente
baseada no racionalismo técnico e as condições de trabalho às quais as professoras estão
submetidas. Assim, a prática pedagógica é alienada porque é determinada pelas condições
objetivas do trabalho docente, que reflete as formas alienantes de produção da sociedade
capitalista (RADFORD, 2016a). Nesse sentido, a alienação não se dá pela prática docente,
mas porque o professor é um produto do sistema no qual está inserido.
As professoras reconhecem a necessidade de uma mudança metodológica na sua
prática, dando abertura para a realização de uma formação continuada e permanente baseada
no labor conjunto como definido pela TO.
De maneira geral, os resultados da etapa diagnóstica apontaram as seguintes diretrizes
para a próxima etapa - etapa de labor conjunto - da pesquisa-formação:
- Planejar atividades AEA formativas baseadas no labor conjunto de professores e formadora,
que tenha como objeto novas formas de produção de saber e de novas subjetividades.
- Propiciar que formadora e professores envolvam-se como parceiros em ações conjuntas,
reflexões críticas e éticas.
- Trazer à discussão as questões políticas e ideológicas que permeiam a profissão docente a
fim de conscientizar as participantes da alienação (RADFORD, 2017c), para repensar as
formas de produção do conhecimento e visualizar as novas formas de cooperação humana na
escola.
- Considerar as necessidades e os interesses dos professores para o planejamento das
atividades AEA formativas, a fim de que o percurso formativo seja definido pelos resultados
preliminares da pesquisa-formação, em um trabalho conjunto com intenções comuns.
- Contemplar, no planejamento das atividades AEA formativas, os saberes relacionados à TO
e ao uso dos artefatos tecnológicos digitais.
- Promover, no contexto das atividades formativas, a reflexão crítica dos professores sobre:
a) a natureza tecnocrata da educação com a finalidade de promover a sua emancipação das
práticas pedagógicas calcadas na promoção do sucesso acadêmico e realização individual;
b) a sua função de professor a fim de adotar uma visão crítica sobre o professor especialista
técnico, vigente no currículo tecnocrata, e a importância de seu papel social na formação de
sujeitos críticos e reflexivos que realizam as suas ações, mostrando solidariedade e
compreensão em relação aos outros.
c) a visão do estudante como capital humano para superá-la e oportunizar aos alunos a
vivência de uma experiência não tradicional de educação.
113
Neste capítulo, será apresentada uma síntese das cinco atividades de ensino
aprendizagem (AEA) realizadas durante a segunda etapa da formação (etapa de labor
conjunto) e os resultados das leituras preliminares que nortearam o planejamento das tarefas
dessas atividades. Será também apresentado o planejamento detalhado das atividades AEA1 e
AEA2 e a análise das interações das professoras durante a sua realização.
A etapa de labor conjunto foi desenvolvida por meio de cinco atividades AEA,
baseadas na metodologia proposta pela Teoria da Objetivação, divididas em quatro módulos
(módulos 2 a 5), conforme descrito no capítulo 2. As tarefas das atividades AEA do módulo 2
foram planejadas a partir dos resultados da etapa diagnóstica. As tarefas das atividades AEA
dos demais módulos foram planejadas tomando, como ponto de partida, a leitura preliminar
das produções das professoras durante as respectivas atividades, bem como as anotações do
caderno de campo da pesquisadora durante os encontros presenciais. Essa leitura preliminar
permitiu selecionar resultados que nortearam e indicaram as necessidades formativas, que
foram a base para o planejamento das tarefas das atividades AEA.
Os Quadros 15 a 18 trazem o objeto dessas atividades AEA e uma síntese dos
resultados da leitura preliminar dos dados. Os planejamentos dessas atividades AEA e os
resultados detalhados e aprofundados serão apresentados ao longo da análise das interações
dos grupos de professores em cada atividade.
Quadro 15 - Síntese dos resultados norteadores: objeto das atividades AEA do módulo 2.
Módulo 2 (M2): Ensino de Ciências baseado no trabalho conjunto.
Resultados da etapa diagnóstica: Necessidades formativas para o M2:
- O perfil dos professores está de - Usar a TO para propor uma metodologia de ensino de Ciências
acordo com o modelo de professor com adoção de artefatos tecnológicos digitais para desenvolver o
especialista técnico. trabalho conjunto, assentado na ética comunitária, com os
- A prática pedagógica no ensino de professores em formação.
Ciências com uso dos artefatos - Propiciar a vivência de uma atividade AEA baseada no trabalho
tecnológicos digitais é baseada na conjunto para os professores.
transmissão de informações e no - Discutir os principais conceitos da TO, com base nas concepções
individualismo, podendo ser dos professores, levando-os a refletir criticamente sobre a sua
caracterizada como uma prática prática pedagógica.
alienante. - Elaborar atividades AEA que tenham como referência o trabalho
115
objetivação e subjetivação.
Quadro 19 - Objeto da atividade AEA1 (alimentação saudável) com foco nos processos de objetivação e
subjetivação.
Foco nos processos de objetivação Foco nos processos de subjetivação
- Encontrar-se com os saberes sobre: - Produzir novas subjetividades por meio do
- Alimentação saudável e balanço energético. trabalho conjunto.
Objeto
- O uso editor de texto do laptop e de - Refletir criticamente sobre a importância da
simuladores Phet. alimentação saudável para a saúde coletiva.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
A seguir, são analisadas as interações das professoras do Grupo 1 (PA, PB, PC e PD),
durante o desenvolvimento dessa atividade, por meio dos diferentes modos semióticos a fim
de identificar processos de objetivação e subjetivação. Para a análise, foi utilizado o
dispositivo de análise adaptado, descrito no capítulo 1. Considerando que a unidade de análise
é a atividade, são examinados os episódios relevantes selecionados durante a realização da
tarefa proposta.
Neste sentido, apresenta-se uma síntese dessas análises, assim como se traz a análise
na íntegra de mais quatro episódios relevantes (EP2, EP3, EP5 e EP6), considerando os
episódios que apresentam resultados mais significados para a pesquisa e que se acham
relacionados ao objeto da atividade AEA. No texto, a referência aos episódios foi feita pelo
número deles, seguido por uma barra e o número da atividade a qual pertence. A referência ao
enunciado foi feita pelo número deles, seguido de um ponto e o número do episódio relevante.
percebendo a dúvida, elaborou uma definição para o termo, fazendo uma comparação com a
questão da vacinação da febre amarela, dizendo que: “[...] a febre amarela, por exemplo, se as
pessoas não se vacina, pega a doença e passa para o outro é algo que afeta o coletivo, porque
ela não se vacinou [...] (CAMILOTTI; GOBARA, 2020, p. 236). De forma brusca, a PA
discordou dessa definição e estabeleceu-se uma tensão entre as professoras devido à
divergência de opiniões sobre o termo “saúde coletiva” e sobre como ele deveria ser
empregado no contexto da atividade. Essa tensão faz parte do processo de subjetivação e da
produção de novas subjetividades, sendo algo natural que constitui parte da manifestação do
ser (RADFORD, 2018).
A professora PB chamou a formadora (PF), após ter percebido o conflito entre as
colegas, e buscou uma solução. A PF passou então a interagir com as professoras explicando
que elas deveriam decidir a forma de chegar à resposta da questão-problema juntas, buscando
um consenso ou não, desde que respeitassem as opiniões contrárias. Ela lembrou às
professoras que haveria o momento de socialização com os outros grupos para discutirem a
resposta (CAMILOTTI; GOBARA, 2020).
Após a interação com a PF, a tensão dissipou-se e pode ser observado um momento
de mudança na forma de agir das professoras, indicando a ocorrência de um processo de
subjetivação (RADFORD, 2017c; 2018). As professoras PA e PD chegaram ao consenso de
usar as duas definições sobre saúde coletiva na resposta da questão-problema, conforme
transcrito a seguir:
Quando todos do grupo estão se alimentando de maneira adequada, terá mais saúde,
e disposição para fazer suas atividades, sendo mais produtivo com o trabalho e para
a coletividade. Isso previne doenças como obesidade, problemas no coração,
hipertensão, gerando menos gastos com medicação. A economia pode ser convertida
em ações do governo para toda a comunidade. Por exemplo: uma pessoa que tem
uma alimentação saudável, tem menos risco de ter problemas de saúde, será mais
produtiva para ela e para a sociedade e necessitará menos da saúde pública
(hospitais, postos de saúde) - (resposta da questão-problema 7; Grupo A; Anexo B).
alunos.
Quadro 21 - Transcrição dos enunciados 1.2 a 6.2 do episódio relevante 2 (ER2) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.2 Eu entendo por alimentação saudável o consumo de alimentos que forneçam todas as
PC
vitaminas e sais minerais que o corpo precisa.
2.2 Mas também vai depender da pessoa, por exemplo (risos), eu que vivo sempre de regime,
PB
para mim é saudável não comer alimentos calóricos, massas, ai.... os doces.
3.2 PD É….
4.2 PA Também quem tem um problema de saúde e não pode consumir certos alimentos...
5.2
PD
A definição inicial dada pela PC, no enunciado 1.2 (Quadro 21), sugere uma visão
simplista da definição de alimentação saudável, não a associando a conceitos importantes
relacionados à temática, como diferentes grupos alimentares e balanço energético. As
professoras PB e PA mencionaram, de forma implícita, na exposição verbal dos enunciados
3.2 e 4.2 (Quadro 21), a importância da alimentação para o fornecimento de energia. No
entanto, essas ideias não estão articuladas ao conceito de balanço energético relacionado à
alimentação saudável.
O movimento feito pela PD no enunciado gestual 5.2 (Quadro 21) indicou que ela não
concordou com a fala da PC (enunciado 1.2), demonstrando dúvida. Essa evidência foi
reforçada no enunciado gestual 9.2 e no enunciado verbal 8.2 (Quadro 22), quando a PD
tentou articular os conceitos de alimentação saudável e equilíbrio energético. É provável que
ela já tenha tido contato com a definição de balanço energético, visto que ela tem formação
específica em Educação Física, porém não consegue aplicá-lo em um novo contexto.
123
Quadro 22 - Transcrição dos enunciados 7.2 a 14.2 do episódio relevante 2 (ER2) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
7.2 PB Aí quem tem intolerância a lactose, o leite não é saudável para ele.
8.2 É... mas também tem que ter um equilíbrio, não pode cortar todos os carboidratos PB,
PD
senão passa mal, não tem energia. Eu quero definir isso, entendeu?
10.2 PA É isso.
É, eu escrevo isso, alimentação saudável é uma alimentação que forma nutrientes
11.2 PC
necessários para o organismo.
Fornece. Tem que pôr também que é uma alimentação que dá a energia para o
12.2 PA
desenvolvimento das atividades diárias. Anota aí.
13.2 PC Que é o que a PD disse. É PD?
14.2 PD É.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
deveriam realizar uma pesquisa na internet, usando o buscador Google, sobre os conceitos de
grupos alimentares, balanço energético e a definição de alimentação saudável, segundo a
OMS (Organização Mundial da Saúde). Os resultados da pesquisa deveriam ser interpretados
e relacionados para formular uma nova definição do grupo sobre alimentação saudável. Essa
questão-problema 2 teve o propósito de confrontar o saber atual dos professores sobre
alimentação saudável, registrado na resposta da questão-problema 1, com o saber científico.
Quadro 23 - Transcrição dos enunciados 1.3 a 13.3 do episódio relevante 3 (ER3) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
A gente fala tanto disso e quando pega para ler, estudar, igual agora, vê coisas que nem
1.3 PA
pensou. A OMS considera “o significado cultural dos alimentos”. Viram isso?
2.3 PC É no texto da OMS, né? Não acho.
3.3 PB Aqui!
4.3 PB
6.3 PD Tem que refazer nossa resposta. Muito legal. Tem que pensar nisso também...
7.3 PB O significado social e cultura dos alimentos, PD?
8.3 PD Isso, tem que colocar na nossa resposta.
Mas é isso, os meninos da fazenda, não adianta trabalhar com eles e falar dos alimentos
9.3 PA
que eles não têm.
É PA! Mas a gente não trabalha isso com eles. Não como sendo a definição de alimentação
10.3 PD
saudável.
11.3 PD A PD une a ponta dos dedos
12.3 PA na mão e leva em direção a
PA. A PA levanta a mão e a
deixa na mesma posição por
8s. A PB, que olhava para a
13.3 PB PC, volta-se para a PD e PA,
olhando seriamente para
elas.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Quadro 24 - Transcrição dos enunciados 14.3 a 28.3 do episódio relevante 3 (ER3) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
E a gente colocou que oferece nutrientes necessários, mas vocês viram? A alimentação se
14.3 PA
dá em função do consumo de alimentos e não de nutrientes.
15.3 PB Então, estava errado a definição de antes e o que pensamos lá na tarefa.
É. Mas a professora disse que era com base no que sabemos e que não estaria errado. Ela
16.3 PC
fez igual uma avaliação diagnóstica na tarefa 17 para ver o que sabemos.
Ele fala que os nutrientes são importantes, mas os alimentos “não podem ser resumidos a
17.3 PB
veículos deste”.
Porque a gente sempre pensa nisso. Foi o que pensei quando falou em alimentação
18.3 PA
saudável, nutrientes e calorias.
19.3 PD Hãaa.
20.3 PB O quê?
A gente fala isso para os alunos. Alguém já trabalhou essa questão do valor cultural, da
21.3 PD
fonte de prazer dos alimentos? Eu não. Gente!
22.3 PB Agora que a gente vê, né? As falhas.
23.3 PA A gente não trabalha isso mesmo.
7
Na ocasião da formação iniciada em novembro de 2017, a estrutura da atividade era composta por objeto, meta
e tarefas, entretanto, as novas orientações da TO consideram que a atividade é constituída por uma única tarefa.
127
A gente até trabalha projetos com receitas regionais, mas nem pensa em usar quando
24.3 PC
trabalha alimentação saudável.
E daria par trabalhar tudo junto, grupos alimentares, esse significado social e cultural do
25.3 PA
alimento, o balanço energético. Tudo.
A PA aproxima as
mãos, e faz
movimentos para
PA frente e para trás por
três vezes. Em cada
26.3
movimento, ela muda
as mãos de lugar,
sequencialmente, da
direita para a
esquerda.
27.3 PC Com os menores dá para trabalhar até as cores, cheiros, sabores.
28.3 PD E aí tudo dentro do tema.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
A professora PC, que até aquele momento estava fazendo anotações no laptop e
parecia não interagir com as colegas, discordou das colegas associando a questão-problema 1
a uma avaliação diagnóstica (enunciado 16.3; Quadro 24). Essa exposição verbal da
professora PC indica uma tentativa de justificar que elas não estão erradas, direcionando a sua
atenção apenas para o objetivo da primeira questão-problema da tarefa e não para uma
reflexão acerca de sua prática pedagógica.
As falas dos enunciados 17.3 a 23.3 (Quadro 24) evidenciam uma reflexão das
professoras acerca das suas práticas. Elas apontam falhas no que diz respeito à forma como
trabalham com os alunos o tema alimentação saudável, porém ainda não mencionaram o
motivo que as leva a trabalhar dessa maneira. O enunciado 24.3 (Quadro 23) evidencia que a
PC, mesmo sem interagir verbalmente, estava atenta ao que as outras professoras disseram,
iniciando também uma reflexão sobre a sua prática pedagógica.
Nos enunciados 24.3 a 28.3 (Quadro 24), as professoras acrescentaram às suas
discussões sobre as falhas que detectaram na forma de trabalhar o tema alimentação saudável
com os alunos, maneiras de abordar o tema de forma mais completa com base no saber
científico, com o qual tiveram contato durante a pesquisa realizada para responder a questão-
problema 2. Tais discussões evidenciam que às reflexões iniciais foram acrescidos elementos
que indicam, ainda no campo teórico, novas maneiras de ação e reflexão.
Observa-se, nas interações registradas até o momento nesse episódio relevante, que o
processo de encontro com o saber científico e a mudança de consciência que resulta na
reflexão crítica, no contexto da formação docente, é um processo gradual, que envolve
também a produção de novas subjetividades pelas professoras. De acordo com Radford
(2017a), o saber é posto em movimento pela atividade, que permite a sua materialização em
128
conhecimento, que, por sua vez, gera um novo saber que poderá ser posto novamente em
movimento. Esse processo resulta em um movimento que pode gerar sempre saberes culturais
mais elaborados. O mesmo acontece com o ser que está constantemente produzindo novas
subjetividades, por meio dos processos de subjetivação, sendo sempre um ser inacabado, em
construção (RADFORD, 2017c).
Após essa interação para responder a questão-problema 2, as professoras elaboraram
conjuntamente uma nova definição de alimentação saudável, inserindo conceitos importantes
relacionados ao tema, conforme pode ser observado:
Uma alimentação saudável deve ser baseada em práticas alimentares assumindo a
significação social e cultural dos alimentos como fundamento básico conceitual. A
alimentação se dá em função do consumo de alimentos (e não de nutrientes). Os
alimentos têm gosto, cor, forma, aroma e textura e todos estes componentes
precisam ser considerados na abordagem nutricional. Os nutrientes são importantes
contudo, os alimentos não podem ser resumidos a veículos destes. Os alimentos
trazem significações culturais, comportamentais e afetivas singulares que jamais
podem ser desprezadas. O alimento como fonte de prazer também é uma abordagem
necessária para promoção da saúde (resposta da questão-problema 2; Grupo A;
Anexo B).
Essa elaboração é feita quando elas trabalham conjuntamente pelo mesmo objetivo.
Foi durante esse trabalho que elas encontraram-se com o saber científico constituído
historicamente, refletindo sobre as suas práticas pedagógicas e discutindo uma nova forma de
agir com relação à forma como abordam o tema alimentação saudável em sala de aula. No
labor conjunto, elas também passaram a ouvir e acolher a opinião das colegas, ou seja, a
produzir novas subjetividades. Na vivência desse tipo de atividade, elas são, segundo Radford
(2017c), incentivadas a expressar abertamente atitudes de solidariedade e consciência crítica.
É no contexto do labor conjunto que as professoras são estimuladas a superar o
individualismo e a racionalidade técnica (CONTRERAS, 2002), bem como caminhar rumo à
emancipação das práticas alienantes comuns na escola atual (RADFORD, 2016a) fazendo-o
em direção a uma prática reflexiva e crítica, característica de um professor intelectual crítico
(CONTRERAS, 2002; GIROUX, 1997)
Na sequência, as professoras responderam a questão-problema 3 e 4. Elas acessaram o
simulador “Comer e exercitar-se”, que foi disponibilizado por meio do endereço eletrônico do
site e também em pendrive na versão offline, exploraram a lista de alimentos disponível no
simulador. A seguir, elaboraram uma lista de alimentos saudáveis e outra de alimentos não
saudáveis com os seus valores calóricos. A lista foi organizada pela PC em uma tabela (Figura
19), no editor de texto do laptop.
129
Figura 19 - Tabela com alimentos saudáveis e não saudáveis elaborada pelas professoras.
Quadro 25 - Transcrição dos enunciados 1.5 a 10.5 do episódio relevante 5 (ER5) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.5 PB Foi muito diferente do que a gente pensou na tabela. Ele fica desnutrido.
2.5 PA No começo, emagrece e, depois, acaba morrendo.
3.5 PD Agora tem que explicar isso, estou pensando.
Isso que é mais difícil. Se disser só que não é alimentação saudável não vai justificar, mas
4.5 PB
o que tem na lista são só coisas saudáveis.
Mas eu acho que é assim ó: o alimento dá menos energia que ele precisa, ele emagrece,
5.5 PC
mas não é saudável, porque não tem os nutrientes que ele precisa, aí começa a faltar...
6.5 PA Nem os nutrientes.
7.5 PC É. E aí vai e vai e ele já usou tudo o que tinha de gordura e acaba morrendo.
PC PC faz um movimento circular
com mão de cima para baixo
8.5
ao dizer “e aí, vai, vai”.
PD contrai a testa e olha
9.5 PD fixamente para o computador,
apoiando o rosto na mão.
A PB contrai a testa e olha
10.5 PB
fixamente para a PD, coçando
o rosto.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Após observar o resultado da simulação com a lista de alimentos saudáveis que elas
elaboraram, as professoras compararam os resultados da simulação e a resposta que haviam
formulado anteriormente nas questões-problema 3 e 4 (Anexo B). Elas identificaram uma
diferença para o resultado previsto e o resultado da simulação, porém não sabiam ainda
explicá-la (enunciados 1.5 a 4.5; Quadro 25).
Na sequência, a PC começou a interagir e iniciou a formulação de uma explicação
para a diferença observada, utilizando gestos e movimentos (enunciados 8.5 a 10.5; Quadro
25). As outras professoras estavam atentas às explicações da PC, porém pareciam ter dúvidas
sobre o que ela disse, sobretudo a PD e PB (enunciados 8.5 a 10.5; Quadro 25).
Quadro 26 - Transcrição dos enunciados 11.5 a 20.5 do episódio relevante 5 (ER5) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Ah! Lembrei, era isso que eu queria dizer lá, quando definimos alimentação saudável. No
11.5 PD
começo.
12.5 PD A PD leva a mão à cabeça e
13.5 PB bate levante com os dedos
na testa.
A PB leva a mão à boca e
morde o dedo.
14.5
A PA observou fixamente a
PD comprimindo os lábios.
Aí a pessoa já fica com anorexia. Vocês lembram aquela aluna lá (da outra escola), quase
17.5 PA
morreu. Era essa doença.
18.5 PC PB, viu? Esses regimes que você faz? Para de comer, aí não aguenta e come.
19.5 PB Tem que ser com nutricionista mesmo.
20.5 PD Ai PB (risos), a gente sabe e daí não faz.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Quadro 27 - Transcrição dos enunciados 21.5 a 34.5 do episódio relevante 5 (ER5) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
21.5 PA A nossa tabela está errada, tinha que ter mais os carboidratos.
22.5 PD É porque eles fornecem mais energia, mas teria que ser porções menores.
23.5.5 PA Mas aqui no simulador aparece mais a questão da energia.
24.5 PB Olha! É a mesma coisa que elas estão dizendo.
25.5 PD O quê?
26.5 PB PB olha atentamente para o
27.5 PD outro grupo de professoras e
28.5 PC aponta,
PD olha para a PB com
expressão de surpresa.
PC olha atentamente para a PD,
29.5 PA
apoiando o rosto com a mão.
PA volta-se para a direita e olha
atentamente para o outro grupo.
30.5 PB Do simulador, ele trabalha mais o gasto de energia.
É. Elas disseram que o simulador dá para trabalhar o balanço energético. Aí a questão dos
31.5 PA
alimentos do local, da cultura, do sabor, não daria.
Ah sim, isso é verdade. Por isso que tem que ver bem o jogo, o simulador antes, para
32.5 PD
saber o que dá para trabalhar.
33.5 PC Aí teria que ser antes de colocar o planejamento no sistema, e nunca dá tempo.
É o contrário, acaba muitas vezes escolhendo o recurso aqui da STE, depois que mandou o
34.5 PB
planejamento.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
processos de objetivação (RADFORD, 2017c), por meio dos quais as professoras passaram a
agir de forma solidária, com base no respeito e cuidado com o outro. (RADFORD, 2014b).
Nesse contexto, o simulador pode ser visto como “um meio semiótico de
objetivação”, que, segundo Radford (2002, 2003), faz parte do grupo de objetos e ferramentas
usados intencionalmente para atingir os objetivos da atividade AEA, sendo fundamentais nos
processos de objetivação.
Nas interações registradas nos enunciados 23.5 a 31.5 (Quadro 27), a professora PA
percebeu uma limitação do simulador quanto ao objetivo de trabalhar o tema alimentação
saudável de uma forma ampla, restringindo-se ao balanço energético. Tal percepção é
reforçada e compartilhada pela professora PB, quando ela percebe que o outro grupo de
professores esá discutindo a mesma limitação, conforme evidenciado nos enunciados gestuais
26.5 a 29.5 (Quadro 27).
A partir dessas interações, as professoras PD, PB e PC discutem a importância de
conhecer o artefato tecnológico no momento do planejamento das aulas, concluindo que, na
prátic,a o tempo é um fator que restringe tal prática (32.5 a 34.5; Quadro 27). Elas referiam-se
ao planejamento de aulas que deve ser inserido no sistema de planejamento online da
Secretaria de Educação, de acordo com cronograma estabelecido previamente. Esse
cronograma não permite um tempo hábil para planejar o uso dos artefatos tecnológicos
digitais a partir de suas potencialidades e restrições. Dessa forma, elas inserem os artefatos
nas aulas planejadas, sem conhecê-los. As professoras têm consciência desse problema, porém
não aprofundam a discussão sobre as formas de resolvê-lo, preocupando-se e esforçando-se
para executar o cronograma e as ações determinadas pelos especialistas da Secretaria de
Educação. Segundo Contreras (2002), essa dificuldade do professor de refletir sobre a prática
está relacionada ao processo de proletarização do professor.
A realização de atividades formativas baseadas no labor conjunto propicia um espaço
de reflexão crítica do professor sobre a sua prática (RADFORD, 2016a). Essas reflexões
podem levá-lo a superar a alienação presente nas atividades realizadas na escola tradicional,
com ênfase na transmissão de informação e no individualismo. Esses espaços de reflexão
crítica, no contexto da formação de professores, podem conduzir, segundo Pavan e Backes
(2016), a um processo de desproletarização da prática docente. Esse processo poderá ocorrer
por meio da abertura de espaços para práticas de ensino que “sejam capazes de destruir a
lógica da dominação dentro e fora das escolas” (Giroux, 1997, p. 203).
Na sequência, após o enunciado 34.5, as professoras formularam a seguinte resposta:
Não foi semelhante. Perda de peso, diminuição do percentual de gordura e
133
Após realizar a simulação com base na lista de alimentos não saudáveis, foram
registrados os enunciados 1.6 a 3.6 (Quadro 28), em que as professoras PB e PC interagiram a
fim de explicar o resultado da simulação. Nesses enunciados, vê-se novamente o simulador e
também os gestos da professora PC (enunciado 3.3) sendo meios semióticos de objetivação,
pois são essenciais na produção de significados (RADFORD, 2002, 2003).
Quadro 28 - Transcrição dos enunciados 1.6 a 10.6 do episódio relevante 6 (ER6) da atividade 1.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.6 PB Aqui, deu certo com o que a gente pensou.
É, porque olha só, o que a gente colocou na lista de alimentos não saudáveis, só porcaria,
2.6 PC
muita gordura e lanche e fritura. Quero ver não engordar.
7.6 PC
A PC movimenta as mãos na
vertical.
A PB levanta um pouco a blusa e
8.6 PB olha para a barriga.
Ao fazer essa reflexão, as professoras também estão refletindo sobre o seu papel na
formação de um aluno crítico. Ao entender que é uma falha não associar o que elas dizem
sobre alimentação saudável a uma explicação sobre os efeitos do tipo de alimentos que são
consumidos sobre a saúde, as professoras reconhecem que fazem apenas uma discussão
superficial sobre o tema, o que não poderia provocar uma mudança na ação dos alunos. Esse
tipo de reflexão, que ainda não evidencia a necessidade de trabalhar o tema em uma
perspectiva coletiva, expõe características de um professor reflexivo, pois está voltada para a
ponderação com ênfase na solução de problemas individuais (CONTRERAS, 2002).
Após as reflexões das professoras PB e PD, foram registrados os enunciados 13.6 e
14.6 (Quadro 28). Nesses enunciados, as professoras PC e PD fazem uma reflexão focada na
importância da formação e na metodologia utilizada para trabalhar o conteúdo, calcada em
questões-problema e no labor conjunto. Essas reflexões sugerem que a proposta da atividade
AEA1, visando propiciar que as professoras vivenciassem uma experiência não tradicional de
atividade, diferente do que elas fazem na sala de aula, pode estimular a reflexão sobre as
atividades que elas realizam com os alunos. Esse fato pode ser entendido, no cenário dessa
formação, como o início de uma reflexão para a superação da racionalidade técnica, presente
no contexto em que as professoras atuam. Do mesmo modo, para a superação do modelo do
professor especialista técnico (CONTRERAS, 2002), quando passarem a considerar
atividades AEA que podem levar a novas formas de produção de saber e na formação de
sujeitos críticos e éticos, que agem movidos pela coletividade.
A comparação da resposta que as professoras elaboraram antes da simulação com a
resposta posterior (Quadro 29) evidencia que elas conseguiram produzir uma resposta mais
completa com base nos saberes científicos sobre o balanço energético associados à
alimentação.
digital foi feito no contexto de uma atividade. Essa forma de uso propiciou a problematização
dos resultados, a discussão e a reflexão das professoras por meio do trabalho conjunto, uma
vez que, de acordo com a TO (RADFORD, 2017a,) o que media o saber/conhecimento e
ser/subjetividade é a atividade (labor conjunto).
Após o episódio descrito (EP6), as professoras elaboraram um cardápio para uma
alimentação em que o equilíbrio energético da pessoa hipotética fosse mantido (ação 2;
Quadro 20), o que resultaria na manutenção da massa corpórea ao longo do tempo. As
professoras prepararam o cardápio e registraram em uma tabela (Figura 20). Essa ação teve
também a intenção de propiciar a materialização os saberes culturais sobre as ferramentas
para elaboração de tabela no editor de texto e a organização de dados.
A maior facilidade relatada pelas professoras no uso dos artefatos evidencia que,
durante as interações do grupo, elas encontraram-se com os saberes relacionados ao uso do
editor de texto e simulador. Esse encontro somente foi possível porque elas agiram com base
na ética comunitária, mostrando compromisso com a atividade, respeito entre elas e
solidariedade.
Os seis enunciados analisados na publicação de Camilotti e Gobara (2020)
evidenciam reflexões importantes das professoras sobre o papel do professor e do aluno
registradas no momento de socialização da atividade 1. De maneira geral, os principais
resultados dessa análise foram: a) A professora PC fez uma comparação do papel da
formadora na atividade que realizaram e o seu papel junto aos alunos no uso da metodologia
proposta na formação. Ela mostrou-se insegura ao pensar na possibilidade de trabalhar em
conjunto com alunos, fato atribuído ao número de grupos com os quais se envolveria na sala;
b) As professoras PB e PA colocaram em dúvida a possibilidade dos seus alunos trabalharem
em conjunto, a partir da ética comunitária, baseando-se na ideia de que eles querem fazer as
atividades sozinhos; c) A professora formadora (PF) afirmou que estava aprendendo com as
professoras, ou seja, da mesma forma, está produzindo novas subjetividades ao cooperar com
elas e d) As professoras PB e PD fizeram uma reflexão sobre o papel da formadora,
reconhecendo que elas trabalharam com a formadora a fim de superar as dificuldades de
empregar a metodologia proposta na formação.
As ideias das professoras PB e PA estão baseadas na visão que essas professoras têm
dos seus alunos, como sujeitos passivos que recebem o conhecimento, e da sua prática
pedagógica assentada na transmissão de informação (RADFORD, 2019). Essas ideias são
características de um professor especialista técnico (CONTRERAS, 2002), conforme
detectado na etapa diagnóstica da formação.
A afirmação da formadora (PF) denota que ela também é projeto inacabado, um ser
em evolução (RADFORD, 2017c) que vai sendo configurado e produzido no contexto da
atividade (labor conjunto) com o grupo de professores em formação. Tal visão requer uma
superação do papel do formador no contexto da formação continuada de professores
tradicional e uma abertura para reconhecer o outro e reconhecer-se no “outro”. Segundo
Radford (2019, p. 5, tradução nossa), “(…) contra o pano de fundo da cultura e da história,
professores e alunos entram em presença. Entrar em presença refere-se a ideia do aluno como
alguém que, através da atividade na sala de aula, vem ocupar um espaço no mundo social e
ser uma perspectiva nele”.
Embora seja um entendimento inicial, as reflexões das professoras PB e PD sugerem
140
que elas reconhecem que, em uma atividade (labor conjunto), de acordo com a TO, o
professor, que nesse contexto é a formadora, não é concebido como um sujeito que detém a
informação, como no modelo tradicional de educação (RADFORD, 2016a). Na perspectiva da
TO, a formadora é alguém que trabalha em conjunto com o grupo, impregnado do mesmo
objetivo, fazendo-se um membro do grupo, ou seja, trabalha “ombro a ombro” (RADFORD,
2017 b) para buscar a solução da tarefa proposta. Não se trata apenas de ações que são
realizadas juntas para a obtenção das respostas das questões solicitadas, mas da concentração
de energias empreendidas pelos professores/formadores e alunos/professores em formação na
“busca de algo comum” (RADFORD, 2019, p.5, tradução nossa). Essa busca visa atender
uma necessidade coletiva, em que os sujeitos se realizam, “atuam, pensam e sentem juntos”
(RADFORD, 2017c, p.156, tradução nossa).
Quadro 32 - Objeto da atividade AEA2 (Teoria da Objetivação) com foco nos processos de objetivação e
subjetivação.
Foco nos processos de objetivação Foco nos processos de subjetivação
- Encontrar-se com os saberes sobre:
- Produzir novas subjetividades por meio do labor
- Conceitos básicos da TO (saber,
conjunto.
conhecimento, artefato, aprendizagem, labor
Objeto - Refletir criticamente sobre a elaboração de
conjunto e atividade).
atividades AEA com base na estrutura da TO e a
- Editor de texto do laptop e metodologia
prática pedagógica para o ensino de Ciências.
para o ensino de Ciências.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
142
8 Texto “Uma metodologia para o ensino de Ciências baseada no trabalho conjunto “: elaborado pelas autoras
para ser utilizado pelos professores durante o desenvolvimento da atividade AEA2 (módulo 2). Disponível em:
<https://drive.google.com/file/d/1YiWN8lp86Nvq7gC7yISVC6r7T4TZdRur/view?usp=sharing>
9
O termo comunidade de aprendizagem foi usado incialmente na formação baseado no artigo “Elementos de una
teoría cultural de la objetivación (RADFORD, 2006).
143
Quadro 34 - Transcrição dos enunciados 1.1 a 6.1 do episódio relevante 1/2 (ER1/2) da atividade 2.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Tem aluno que não consegue fazer uma atividade assim, desse jeito, mas aí vão trabalhar
1.1 PB
juntos mesmo, não pode dividir as tarefas... se for trabalhar com a TO.
A gente consegue fazer mais tranquilo porque a gente... a gente... está junto, porque fazer
2.1 PD
um troço desse sozinho...
PD
A professora PD comprime a boca e
3.1 arqueia as sobrancelhas, enquanto
mantém os braços cruzados.
Quadro 35 - Transcrição dos enunciados 7.1 a 18.1 do episódio relevante 1/2 (ER1/2) da atividade 2.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Mas do jeito que tá aqui, com essa atividade, você tem que fazer uma pra conseguir fazer
7.1 PA
a outra, força a fazer junto.
8.1 PD É a metodologia que ela usa, TEM que trabalhar em conjunto.
9.1 PA É mesmo (risos), já planeja pensando em forçar a trabalhar junto.
PA
Durante o enunciado 9.1, expressando
10.1 um sorriso, a PA movimenta as mãos
para cima e para baixo.
A PC movimenta as mãos para cima e
para baixo, enquanto sorri.
PC
11.1
Quadro 36 - Transcrição dos enunciados 1.2 a 10.2 do episódio relevante 2/2 (ER2/2) da atividade 2.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.2 PD Atividade é o que foi feito com o artefato, não é?
PD
Ao falar “Atividade” a PD
levanta os braços, apontando
2.2 para cima com o dedo
indicador da mão direita mão
direita, abre a mão esquerda e
olha para cima.
PD
Ao falar “o que é feito com o
artefato”, a PD baixa a mão
direita e aponta para a
3.2 esquerda, fechando a mão
esquerda e olhando para baixo.
realizadas pelo indivíduo. A atividade é o meio pelo qual ocorrem os processos de objetivação
e subjetivação, ou seja, a aprendizagem. De acordo com Radford (2020), a atividade ou labor
conjunto é o meio pelo qual professores e alunos em um esforço coletivo encontram-se e
tomam consciência dos saberes científicos presentes na cultura e constituídos historicamente.
Após a resposta dada pela professora PA definindo atividade, as falas das professoras
PD e PB evidenciam a incompreensão dos conceitos de saber e conhecimento, conforme
registrado nos enunciados 5.2 e 6.2 (Quadro 36). Na fala da PB, quando mencionou o termo
“construção do conhecimento” pode ser observada a influência das ideias do construcionismo
(VALENTE, 2005). A teoria de base construtivista é utilizada pela SED/MS como referencial
nas orientações para uso dos artefatos tecnológicos digitais em sala de aula. A influência dessa
teoria pode ser observada também no enunciado 9.2, quando a PD refere que, na definição de
aprendizagem dada na questão-problema 1, elas definiram aprendizagem como assimilação do
conhecimento (PIAGET, 1996), termo utilizado por Piaget na teoria construtivista.
A influência do construcionismo pode ser observada nos discursos das professoras PB
e PD, mas não o é nas suas práticas pedagógicas, visto que a análise da etapa diagnóstica da
pesquisa-formação evidencia uma prática pedagógica tradicional, baseada na transmissão de
informações. Nessa perspectiva, de acordo com Gadotti (1998), há uma contradição resultante
da coexistência dialética e conflituosa das ideias advindas dessas duas teorias, sendo uma no
campo teórico e outra na prática. Essa contradição evidencia que as formações ofertadas pela
SED/MS não provocaram mudanças na prática pedagógica das professoras.
Na perspectiva da TO, a prática pedagógica centrada na transmissão de saberes
(modelo transmissivo) e as práticas centradas nos alunos (modelo individualista), como o
construcionismo, são alienantes (RADFORD, 2016a). Essa ideia pode ser transposta para a
formação de professores. Enquanto no modelo transmissivo, o professor não se reconhece nas
produções que realiza por meio das ações formativas por serem ideias de outras pessoas, nas
formações baseadas nos modelos individualistas, a produção dos professores é subjetiva e não
é compartilhada entre eles (RADFORD, 2016a; 2020).
Uma proposta de formação continuada e permanente que visa atender as necessidades
dos professores, desenvolvida por meio de uma pesquisa-formação e do labor conjunto é uma
alternativa para a superação da alienação docente presente no contexto da formação e na
prática pedagógica. Isso porque as experiências vivenciadas no contexto formativo podem
influenciar a mudança na prática pedagógica dos professores. Neste sentido, uma formação
baseada nos pressupostos teóricos da TO pode propiciar uma experiência verdadeiramente
democrática aos professores. Essa formação constitui um espaço em que os professores
149
podem expressar suas ideias e posicionar-se criticamente diante do saber que fundamenta as
propostas pedagógicas que lhes são apresentadas. É também uma forma de emancipar-se
coletivamente das práticas pedagógicas alienantes, resultando no desenvolvimento de um
professor intelectual crítico, que volta suas ações para uma dimensão coletiva e
transformadora da escola e da sociedade.
A fala da professora PA no contexto da discussão registrada nas interações do episódio
relevante 2/2 sugere que ela compreendeu melhor os conceitos de saber e conhecimento.
Mesmo afirmando que são conceitos ainda confusos para ela (enunciado 8.2; Quadro 36),
reconhece que a definição elaborada por elas na questão-problema 1 não está correta de
acordo com a TO (enunciado 9.2; Quadro 36).
Considerando a prática pedagógica tradicional das professoras, baseada na transmissão
de informações, é natural a incompreensão inicial de conceitos básicos da TO (saber,
conhecimento, atividade (labor conjunto)) por tratar-se de uma primeira discussão e contato
com o saber científico acerca da Teoria. A aprendizagem de tais conceitos e o uso das ideias
da TO na prática pedagógica requerem a superação da visão das professoras da aprendizagem
como construção do conhecimento e assimilação de conceitos. Requer também a superação da
visão da atividade apenas como um conjunto de ações dos alunos, na qual discutem ideias
elaboradas por outros que não exprimem suas opiniões e anseios, o que Radford denomina
práticas alienantes (RADFORD, 2020, p. 26).
Nas falas seguintes, a influência das ideias do construcionismo pode ser novamente
observada. A professora PD retomou a definição de aprendizagem que o grupo elaborou na
questão-problema 1 e observou que o uso do termo “assimila” deveria ser substituído por
“atualiza”, comparando a atividade ou labor conjunto com a mediação da aprendizagem feita
pelo computador (enunciado 11.2; Quadro 37). Tal comparação é baseada na ideia advinda da
teoria construcionista de que o computador faz a mediação entre o sujeito e o conhecimento
(VALENTE, 2005).
Quadro 37 - Transcrição dos enunciados 11.2 a 17.2 do episódio relevante 2/2 (ER2/2) da atividade 2.
N° do
Profes-
Enun- Transcrição do Enunciado
sora(s)
ciado
Então … aqui na tarefa 2, não pode por que assimila é atualiza?... E a atividade...
11.2 PD
Media... Ah, igual o computador, que medeia né?
12.2 PB Aí já é artefato, o computador é recurso, é artefato.
Isso... na página 2... “a atividade realizada em sala de aula é o processo que media a
atualização do saber, revelado à consciência dos sujeitos na forma de conhecimento,
13.2 PA
sendo que os artefatos, por exemplo os tecnológicos, os signos são partes integrantes
dessa atividade.”
150
PC
PC apoia o rosto com a mão
14.2 direita aberta, cobrindo a
boca, enquanto a PA faz a
leitura do texto.
PC movimenta a mão
PC direita para cima e cobre o
15.2
rosto.
do artefato e o papel mediador da atividade no contexto da TO. Tal incompreensão pode ser
confirmada pelo enunciado verbal 16.2, quando ela reconhece que teria que estudar bastante
(Quadro 37). Embora demonstrem não ter observado os gestos da PC, nenhuma delas deu
atenção para a fala da colega e, na sequência, a PD mudou de assunto propondo que escrevam
a resposta da questão-problema. Nesse momento, as professoras agiram de forma
individualista, pois não se preocuparam com o fato da colega sugerir não compreender os
saberes discutidos pelo grupo. Uma ação com base na ética comunitária requereria que as
professoras olhassem para a colega e retomassem as discussões, ou seja, que se mostrassem
cuidadosas e solidárias (RADFORD, 2014b). Tal fato evidencia que a superação do
individualismo é um processo e não é algo pontual, que ocorre em momentos de labor
conjunto, como os registrados nos episódios relevantes analisados neste trabalho.
Quadro 38 - Reflexão das professoras sobre o papel do professor e a atividade (labor conjunto) na TO.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
1.s PB: Muda até o trabalho do professor, porque se a atividade é a mediadora, o professor não é mais.
2.s PA: A gente não olha mesmo pra essa dimensão... foca no conhecimento sempre.
PA: Mas quando a gente considera a participação... já entra a dimensão do ser também. Mas um
3.s pouco diferente dessa “comunidade de aprendizagem”. Eu vejo mais a participação, se eles fazem a
atividade, o esforço de cada um.
PD: Aí a gente tem que pensar muito bem nessa atividade... porque... gente, ela vai ser a mediadora
4.s e não a gente. Aí vai ter que planejar bem e a gente fica mais acompanhando eles... como elas
fazem.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
visão individualista presente nas práticas pedagógicas alienantes, que são desenvolvidas em
sala de aula e para o desenvolvimento de um professor intelectual crítico (CONTRERAS,
2020).
A tarefa está de acordo com a estrutura da atividade AEA definida pela TO, sendo
possível identificar o objeto, o objetivo e a tarefa. Embora a tarefa compreenda questões que
abordam os saberes sobre vírus (características e doenças), há uma incoerência entre o objeto
154
e o objetivo. O objeto é o encontro com saberes (atualizar) sobre vírus, doenças causadas por
eles e sua prevenção e o objetivo está focado apenas na identificação das doenças causadas
por vírus (Quadro 39). É relevante observar a necessidade da coerência entre objeto e
objetivo, visto que, por meio do objetivo, a atividade move-se em direção ao objeto, que é o
projeto didático do professor relacionado com o encontro dos saberes (RADFORD, 2017b;
2018d), com formas histórico-culturais de pensar e agir.
As questões elaboradas pelas professoras não podem ser caracterizadas como
questões-problema. Elas podem ser respondidas apenas com a busca de informações no vídeo
e texto sugeridos na tarefa, sem a necessidade de uma discussão dos alunos para elaborar a
resposta, visto que estão prontas no texto, basta localizá-las. O mesmo pode ser observado na
proposta de elaborar uma tabela com as doenças causadas por vírus, suas formas de contágio e
prevenção. Embora possibilite a materialização de saberes culturais relacionados à
organização de informações usando tabelas, a partir da leitura do texto e do vídeo, essa ação
necessita apenas de uma busca de informações para ser realizada. É uma ação que não abre
espaço para a discussão e elaboração de uma resposta por meio do labor conjunto.
A atividade AEA planejada pelo professor deve possibilitar o encontro dos alunos com
o saber cultural, em processos de objetivação. Tal encontro não acontece individualmente,
mas coletivamente por meio do labor conjunto (RADFORD, 2017b; 2016a). Assim, deve
proporcionar também a produção de novas subjetividades, em processos de subjetivação, por
meio do labor conjunto do professor e alunos. Não se trata apenas de colocar os alunos para
trabalhar em grupo, como sugere a atividade AEA elaborada pelas professoras. Trata-se de
redefinir as formas de produção do saber e de novas subjetividades, possibilitar ao aluno a
expressão de suas ideias, a sua expressão e o trabalho conjunto de professores e alunos como
um único trabalho (RADFORD, 2017c; 2020). A partir disso, viabilizar formas éticas de
colaboração humana, por meio de posturas éticas e críticas, que levem à superação do
paradigma da propriedade privada e da alienação presente na escola (RADFORD, 2016a,
2020).
A análise do Quadro 39 evidencia que a tarefa foi planejada com ênfase no saber
científico sobre os vírus, não considerando assuntos importantes para a saúde coletiva, como a
vacinação, por exemplo. O tema vacinação é mencionado apenas em uma questão relacionada
à origem das vacinas, quando poderia ser associado à importância da vacinação para a saúde
individual e coletiva, a partir de uma dimensão social. Sobre a dimensão social da
aprendizagem, Radford (2020, p.31, tradução nossa) afirma que “a dimensão social é parte
inteira da aprendizagem. [...], a dimensão de transformação dos alunos e professores, em um
155
fim só”. Neste sentido, o planejamento da atividade AEA não deve focar apenas o saber, como
nas atividades didáticas planejadas a partir da perspectiva do paradigma do ensino tradicional,
mas também o ser, a dimensão social da aprendizagem, com a mesma importância.
Tal abordagem, que enfoca a dimensão do saber científico em detrimento da dimensão
do ser, é característica de uma prática pedagógica baseada na transmissão da informação, no
individualismo e no racionalismo técnico. Está associada ao professor especialista técnico
(CONTRERAS, 2002), conforme evidenciado nas análises dos dados diagnósticos da
pesquisa-formação (Capítulo 2).
De maneira geral, a atividade AEA elaborada pelas professoras evidencia que elas
conseguiram organizá-la de acordo com a estrutura de objeto-objetivo(meta)-tarefa
(RADFORD, 2017b). No entanto, ainda não conseguiram planejar questões-problema que
possam levar o estudante ao encontro do saber científico sobre vírus e a produção de novas
subjetividades por meio do labor conjunto. Isso evidencia que as professoras ainda não se
encontraram com os saberes referentes à metodologia proposta pela TO, baseada no labor
conjunto de alunos e professores. Evidencia também a necessidade de trabalho conjunto da
formadora e professoras para reelaborar a atividade AEA planejada.
O labor conjunto da formadora e professoras em torno da tarefa produzida pelas
professoras poderá propiciar o encontro do grupo com o saber científico sobre a proposta de
ensino e aprendizagem da TO na sala de aula de Ciências. Possibilitará também um
posicionamento crítico das professoras diante do planejamento realizado na escola. Assim, por
meio do labor conjunto, elas (formadora e professoras) poderão expor suas ideias, refletir e
posicionar-se criticamente sobre o planejamento realizado e a necessidade de reelaborá-lo de
forma que possa resultar em uma proposta de atividade AEA. Tal proposta deverá voltar-se
para transformação dos sujeitos por meio da “formação de subjetividades sensíveis a práticas
de posturas éticas e críticas” (RADFORD, 2020, p. 31, tradução nossa).
Quando questionadas via e-mail sobre o motivo de planejarem uma tarefa sobre vírus,
as professoras PC e PB responderam, respectivamente, que: “[...] é um conteúdo que está no
referencial e que temos que trabalhar” (resposta da professora PC) e “Não podemos sair do
referencial porque temos que cumprir o conteúdo do bimestre, então vamos trabalhar os vírus,
para usar a teoria e também já trabalhar o conteúdo exigido pela secretaria” (resposta da
professora PB). Nas suas respostas, elas fizeram referência ao Referencial Curricular de Mato
Grosso do Sul (SED/MS, 2012) vigente no ano de 2018. Essas ponderações evidenciam o
racionalismo técnico presente na prática das professoras, visto que a escolha do conteúdo a ser
trabalhado com os alunos está subordinada a um referencial curricular pensado por outras
156
somente foi possível porque houve o estabelecimento de ações baseadas no labor conjunto.
Pode ser observada também nos enunciados gestuais analisados nos episódios relevantes,
quando elas expressaram suas ideias, dúvidas e sentimentos por meio de gestos e
movimentos. Assim, a aprendizagem das professoras durante a atividade foi evidenciada por
meio da linguagem e dos gestos, sendo que tais evidências não poderiam ser verificadas sem
uma análise semiótica das interações.
Vale ressaltar que as professoras utilizaram o laptop educacional, um dos artefatos
culturais que fizeram parte da atividade, e conseguiram organizar as ideias referentes às
respostas das questões-problema 1 e 2 em um quadro comparativo, conforme o Anexo C,
sendo necessário que materializassem saberes culturais referentes ao uso das ferramentas para
elaboração e formatação de tabelas do editor de texto do laptop (Writer).
O labor conjunto pode ser observado nos momentos em que as professoras expuseram
suas opiniões, respeitaram a opinião das colegas, refletiram criticamente sobre suas práticas,
compartilharam os mesmos objetivos propostos na tarefa, comprometeram-se com a sua
realização e comunicaram-se entre elas e com as formadoras. Nesses momentos, elas
expressaram-se no contexto da formação continuada e permanente da qual participavam, em
um espaço democrático que lhes permitiu refletir sobre as concepções que tinham acerca da
aprendizagem e do papel do professor. Essas reflexões são importantes para a superação da
prática pedagógica alienante.
De maneira geral, a análise da atividade AEA2 evidenciou que houve um movimento
inicial para o encontro com os saberes relacionados aos conceitos básicos da TO, sobretudo
por parte da PA e PB. Pode ser considerado também que a atividade AEA elaborada pelas
professoras não problematizou o conteúdo trabalhado e valorizou o saber científico em
detrimento da dimensão social. Sendo assim, considera-se ainda a necessidade de o grupo
aprofundar a compreensão desses conceitos e no planejamento de atividades AEA, visto que
as professoras estão em processo de tomada de consciência.
Esses resultados nortearam o planejamento da atividade AEA3, que compreendeu o
módulo 3 da formação, e indicaram as seguintes necessidades formativas: aprofundar o
encontro com os saberes referentes aos conceitos básicos da TO; trabalhar em conjunto com
as professoras para reelaborar a atividade AEA de Ciências e inseri-la em um planejamento de
aula com base na TO, promovendo a reflexão crítica sobre o planejamento realizado pelos
professores na escola.
No próximo capítulo, será apresentado o planejamento e desenvolvimento da
atividade AEA3 e AEA4, com a análise de episódios relevantes, que evidenciam momentos de
159
A partir dos resultados da análise da atividade AEA2, cujo objetivo foi discutir
conceitos básicos da TO e refletir criticamente sobre elaboração de atividades AEA, foi
planejada a atividade AEA3, que compreendeu o módulo 3 da etapa de labor conjunto da
pesquisa-formação. Tais resultados indicaram a necessidade de retomar as discussões e
reflexões acerca de conceitos básicos da TO, tendo em vista a importância deles para o uso
dessa teoria nas salas de aula de Ciências. Eles indicaram também a necessidade de reelaborar
a atividade AEA sobre vírus, planejada pelas professoras do grupo 1, no módulo 2. Essa
reelaboração foi realizada por meio do labor conjunto entre professoras e professora
formadora (PF). A atividade AEA elaborada anteriormente apresentou características de um
modelo tradicional de educação, com foco na busca de informações e na aprendizagem de
saberes científicos em detrimento da dimensão do ser.
Com base nas necessidades formativas apontadas por esses resultados, a atividade
AEA3 teve o objetivo de discutir com os professores o planejamento de atividades AEA de
Ciências com uso de artefatos tecnológicos digitais, baseados nos pressupostos da TO.
Buscou-se também retomar e aprofundar conceitos fundamentais da teoria, como saber,
conhecimento, aprendizagem, atividade e labor conjunto, permitindo o encontro com os
saberes para subsidiar o planejamento de atividades a partir de uma dimensão coletiva e social
de acordo com o labor conjunto de professores e alunos.
No Quadro 40, encontra-se o objeto da atividade AEA3, com foco nos processos de
objetivação e subjetivação.
161
Quadro 40 - Objeto na atividade AEA3 (Planejamento e reelaboração de atividade AEA) com foco nos processos
de objetivação e subjetivação.
Foco nos processos de objetivação Foco nos processos de subjetivação
Encontrar-se com os:
- Saberes sobre saber, conhecimento,
- Refletir criticamente sobre o planejamento
aprendizagem, atividade e labor conjunto na
de atividades AEA baseadas na TO;
Objeto perspetiva da TO.
- Produzir novas subjetividades por meio do
- Saberes sobre o editor de texto do laptop e
labor conjunto.
metodologia para o ensino de Ciências.
- Os planejamentos da atividade AEA.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
A tarefa da atividade AEA3 compreendeu duas partes (I e II). A parte I foi constituída
por uma ação e nove questões-problema e, na parte II, foram propostas três ações e dez
questões-problema, totalizando quatro ações e 19 questões, conforme descrito no Quadro 41.
Quadro 41 - Características da tarefa da atividade AEA3 sobre planejamento e reelaboração de atividade AEA.
Ação (A)/Questão-problema (Q) Objetivo(s) e artefato(s) utilizado(s)
Parte I - Rever conceitos básicos da TO.
A1 - Analisar a atividade sobre alimentação saudável realizada no
encontro presencial para responder as questões-problema de 1 a 4.2.
Q1 - Qual o saber em jogo na atividade?
Rever os conceitos básicos da TO
Q1.1 - O que é o saber de acordo com a TO?
discutidos no módulo 2 por meio da
Q2 - Qual o conhecimento relacionado com a atividade?
análise da atividade 1 (módulo 1).
Q2.2 - O que é conhecimento de acordo com a TO?
Artefatos: cópia impressa da
Q3 - Qual o processo de aprendizagem relacionada com a
atividade de ensino e aprendizagem 1
atividade?
(alimentação saudável) e editor de
Q3.1 - O que é aprendizagem de acordo com a TO?
texto do laptop.
Q4 - O que é uma atividade de acordo com a TO?
Q4.1 - Qual a estrutura da atividade sobre alimentação saudável?
Q4.2 - Como deve ser a estrutura de uma atividade de acordo com a
TO?
Parte II – Planejamento da atividade AEA de acordo com a TO.
A2 - Discutir em um grande grupo o planejamento realizado na Refletir sobre o planejamento de
escola, a partir das questões norteadoras: Você tem o hábito de aulas realizado pelos professores na
planejar suas aulas? Como é feito o planejamento? Quais os itens escola.
básicos do planejamento?
A3 - Analisar a atividadeAEA1 sobre alimentação saudável e o
planejamento da atividade AEA3 “Planejamento na perspectiva da
Identificar as caraterísticas do
TO com uso de artefatos tecnológicos”10.
planejamento da atividade AEA1 do
Q5 - Qual foi a duração da atividade?
módulo 2.
Q5.1 - Qual a descrição da atividade? Descreva a atividade em um
Comparar os itens que constituem o
parágrafo.
planejamento realizado pelos
Q5.2 - Qual o tema trabalhado na atividade?
professores na escola e os itens que
Q5.3 - Quais os objetivos da atividade?
constituem um planejamento de
Q5.4 - Quais os conteúdos de aprendizagem?
acordo com a TO.
Q5.5 - Quais os artefatos utilizados na atividade?
Artefatos: cópia impressa da
Q5.6 - Quais os saberes (pré-requisitos) que foram necessários
atividade AEA1 (alimentação
estarem atualizados para realizar a atividade?
saudável), cópia impressa do
Q5.7 - Qual o saber atual (concepções) que provavelmente o aluno
planejamento da atividade AEA3 e
teria antes de realizar a atividade?
editor de texto do laptop.
Q5.8 - Como foi o progresso da atividade (desenvolvimento da
atividade)? Descreva as etapas de acordo com as tarefas realizadas.
10
Planejamento na perspectiva da TO elaborado pelas autoras para ser utilizado pelos professores durante o
desenvolvimento da atividade AEA3 (módulo 3). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1y41jpCjUtpGQcQk8ndyiXmB8CtpWiYKo/view?usp=sharing
162
A tarefa da AEA3 foi planejada considerando o saber atual dos professores e um nível
de complexidade crescente das ações e questões-problema, conforme as orientações da TO
para a configuração das atividades AEA (RADFORD, 2018b). Em relação ao uso dos
artefatos culturais tecnológicos, em particular o laptop educacional, não houve restrições para
apenas usá-lo. O professor teve a liberdade de utilizar o computador da sala de tecnologia.
Essa opção foi dada porque a internet sem fio não chegava até as salas de aula e os laptops
não funcionavam sem estarem conectados à energia, já que as baterias não carregavam mais.
Tais problemas foram detectados na etapa diagnóstica da pesquisa-formação, descrita no
capítulo 2, e durante o desenvolvimento das atividades 1 e 2 do módulo 2.
Foram previstos e realizados dois momentos de socialização entre os grupos, um após
a realização da parte I e outro após a parte II da tarefa. Todas as ações e resoluções das
questões-problema foram realizadas na escola, com exceção da ação 4 que foi desenvolvida a
distância com reuniões virtuais, por grupo individuais, e com a participação da PF.
A próxima seção apresenta a análise do desenvolvimento das interações das
professoras do grupo 1, durante o labor conjunto (atividade), a partir da seleção de quatro
episódios relevantes, e a análise do planejamento reelaborado da atividade AEA sobre vírus.
Para iniciar a análise da AEA3 tem-se o episódio relevante 1/3 (Episódio relevante 1
da atividade 3) com 19 enunciados. Nos Quadros 42 e 43, encontra-se a transcrição dos
enunciados desse episódio relevante.
comparação da atividade realizada em sala de aula pelas professoras, fez uma reflexão que
evidencia a sua compreensão sobre a relevância do trabalho conjunto na atividade AEA ao
afirmar enfaticamente, elevando o tom de voz: “tem o trabalho conjunto ‘mesmo’”.
Quadro 42 - Transcrição dos enunciados 1.1 a 11.1 do episódio relevante 1/3 (ER1/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
É que essa atividade é muito diferente da atividade que a gente fez... ela... ela tem o
1.1 PD
trabalho conjunto MESMO.
2.1 PC Eu vi no texto de novo e no que a professora escreveu (...)
3.1 PD O quê?
No e-mail da devolutiva, ela falou que nós não pensamos na dimensão do ser... que a
4.1 PC
estrutura está certa, mas não pensamos no ser.
Mas é o que a gente faz no planejamento, o que a SED cobra, é conteúdo, mas aí a gente
5.1 PD
põe o aluno em grupo e eles fazem, cada um, um pouco.
Essa é a diferença... o grupo não quer dizer que ele trabalha em conjunto, é um grupo, mas
6.1 PA
cada um faz a atividade individual.
7.1 PC Foi o que a professora disse, ele pode estar no grupo e trabalhar sozinho.
8.1 PB E foi isso que a gente não pensou no planejamento.
9.1 PD Foi.
Vixi! Então, nos grupos que a gente trabalha nas aulas, nem trabalhar as competências
10.1 PB
socioemocionais a gente trabalha.
11.1 PA Se for a colaboração, que a gente viu, não, se ele faz sozinho.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Essa fala da PD traz indícios do encontro da professora com uma nova forma de
refletir e pensar a atividade (RADFORD, 2020). Essa reflexão pode levar à superação da
visão tradicional que ela tinha anteriormente, conforme foi levantado na etapa diagnóstica da
formação (Capítulo 2).
Os enunciados 2.1 e 4.1 evidenciam a responsabilidade da professora PC em relação à
formação. Ela dispôs-se a rever o texto e pensar sobre a devolutiva da PF a respeito do
planejamento realizado por elas no módulo anterior, mesmo não sendo orientado que essas
ações fossem realizadas individualmente e a distância. Ao agir dessa forma, a PC mostrou-se
atenta e disposta a participar da formação e cumprir o compromisso que assumiu com ela e
com as colegas, visto que as ações formativas são desenvolvidas por meio do labor conjunto.
Nesse contexto, a professora PC agiu de acordo com a ética comunitária, evidenciando o
compromisso relacionado ao grupo (RADFORD, 2017c; 2014b).
Nas interações registradas nos enunciados 5.1 a 11.1 (Quadro 42), as professoras
discutiram o planejamento e o trabalho em grupo com os alunos a partir das suas práticas
pedagógica usuais. Nessa discussão, podem ser observadas reflexões críticas a respeito do
planejamento realizado por elas na escola, quando a PD mencionou que a Secretaria de
Educação cobra o planejamento cujo foco “é o conteúdo”. Essa fala da PD evidencia a
164
importância dada à dimensão do saber em detrimento da formação do ser. Nos enunciados 6.1
a 8.1, observa-se também um posicionamento crítico diante dos trabalhos em grupo realizados
por elas com seus alunos. As professoras PA, PB e PC reconheceram o individualismo
presente nos trabalhos em grupo, mesmo quando há proposição de se trabalhar competências
socioemocionais11, como a colaboração na sala de aula (BNCC, 2020).
Por meio do trabalho conjunto realizado pelas professoras para responder as
questões-problemas da tarefa, a produção de novas subjetividades pode ser observada quando
elas refletem sobre o planejamento orientado pela Secretaria de Educação e a prática
pedagógica junto aos alunos. Elas reconhecem o individualismo que permeia tais práticas e
expõem sua opinião crítica diante do currículo desenvolvido na escola. No momento em que
as professoras fazem essas reflexões, elas estão posicionando-se criticamente diante das suas
práticas pedagógicas. E, ao posicionarem-se, elas passam a ocupar um espaço, que foi criado
por elas no processo social estabelecido na atividade formativa (RADFORD, 2020), tornando-
se o que Freire (2004, p. 98) chamou de “presenças no mundo”. Tal posicionamento faz parte
da superação da alienação e do desenvolvimento do perfil de um professor intelectual crítico
(CONTRERAS, 2002), com uma prática voltada para a dimensão social e coletiva.
Na sequência, nos enunciados 12.1 a 19.1 (Quadro 43), as professoras continuaram a
discutir a importância do trabalho conjunto na perspectiva do planejamento da atividade AEA.
Quadro 43 - Transcrição dos enunciados 12.1 a 21.1 do episódio relevante 1/3 (ER1/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
12.1 PC Essa atividade da TO (...)
13.1 PA Atividade mediadora
É. Não tem só que planejar o que vai trabalhar sobre vírus e colocar na estrutura, a meta,
14.1 PC tarefa... tem que pensar em fazer o aluno trabalhar em conjunto, ela tem que ter o trabalho
conjunto mesmo, não é só o grupo... os alunos têm que se ajudar, fazer junto com o grupo.
15.1 PD Olhando para as colegas, PC, com o dedo
indicador da mão direita, toca nos dedos mínimo,
anelar e médio da mão esquerda, sequencialmente,
dizendo “na estrutura”, “a meta” e “tarefa”,
16.1 PC
respectivamente.
A PD observa a PC, com a mão esquerda apoiando
o rosto, a boca aberta e o cenho franzido.
11
As competências socioemocionais são competências não cognitivas previstas no currículo estabelecido na
Base Nacional Curricular Comum (BNCC, 2020), com o objetivo de levar os alunos a aprender a lidar com as
emoções e a trabalhar em equipe.
165
18.1 PD E isso aí é difícil, heim! Eles não querem trabalhar juntos, uns querem fazer tudo, outros nada.
19.1 PA Mas é porque também... a gente não pensa em atividade assim.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
com o saber por meio de formas de colaboração humana em que prevalece a solidariedade, o
respeito e cuidado.
Durante a exposição verbal e gestual da PC (enunciados 14.1 a 17.1; Quadro 43), as
professoras PA e PB observavam-na com atenção, enquanto a expressão da PD, que manteve
o cenho franzido e a boca aberta, denotou espanto em relação à ideia da colega. Tal percepção
é confirmada pela fala da PD no enunciado 18.1 (Quadro 43), quando ela mencionou a
dificuldade dos alunos trabalharem em conjunto, fazendo referência ao individualismo que
permeia as ações dos seus alunos nos trabalhos em grupos, quando disse que “uns querem
fazer tudo, outros nada”. A partir dessa fala da PD, a professora PA disse que os alunos
interagem de forma individualista nos grupos, porque “[...] a gente (as professoras) não pensa
em atividade assim” - referindo-se à atividade como labor conjunto (enunciado 19.1; Quadro
43). Nessa fala, a PA reconhece que o individualismo também está presente na prática
pedagógica das professoras.
Nessas interações (Quadro 43), as professoras PC e PA começaram a discutir
mudanças no planejamento da atividade AEA de forma a privilegiar a sua dimensão objetiva e
subjetiva. O posicionamento das professoras diante dos problemas detectados por elas no
planejamento e no trabalho em grupo com seus alunos, permeados pelo individualismo e com
ênfase no saber, evidenciam o encontro com novas formas de pensar e agir sobre o
planejamento e o movimento para produção de novas subjetividades, com base no saber da
TO.
Além disso, evidencia uma reflexão voltada para a busca de alternativa para que os
alunos passem a laborar em conjunto na sala de aula, por meio do direcionamento do
planejamento para esse fim. As professoras discutiram, nesse momento, a necessidade de
mudanças no planejamento, adequando-o à TO e aproximaram-se de aspectos importantes na
formação de professores intelectuais críticos: a dimensão social da prática pedagógica e o viés
transformador da educação (FREIRE, 1981; 2010). Tais aspectos voltam-se para superação do
individualismo e da alienação com a proposição de novas formas mais democráticas de
produção de saberes e de subjetividades (CONTRERAS, 2002; RADFORD, 2016a),
conforme o referencial teórico que embasa esta pesquisa-formação.
Quadro 44 - Transcrição dos enunciados 1.1 a 4.2 do episódio relevante 2/3 (ER2/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.2 PA Eu mesmo trabalho bastante em grupo com eles... já é um hábito na sala.
2.2 PC Mas o que a gente faz, não é o mesmo trabalho conjunto da TO [o grupo é diferente].
[A gente acha que trabalha...] mas eles não trabalham juntos na verdade, é como a PF
3.2 PD disse... é trabalho em grupo, não em conjunto. Porque eles têm que fazer a atividade junto
mesmo, se ajudando. É, eles não gostam de fazer, não mesmo.
Isto é, eles gostam de dividir a atividade, mas aí eu vejo que é um hábito também. Se eles
já têm o costume de fazer grupos, vai ser mais fácil trabalhar com a TO. A gente vai ter
4.2 PA que conversar, explicar que tem que pensar juntos, esperar o colega, que é todo mundo
fazer, não só um deles... é questão de ir explicando para eles, porque também é novo para
eles.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Quadro 45 - Transcrição dos enunciados 5.2 a 10.2 do episódio relevante 2/3 (ER2/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Para gente é novo, né? Agora, a gente pensa, a gente mesmo faz isso quando tem as
atividades pra fazer (risos). Éeee, agora a gente vê isso... é difícil um grupo que as minhas
5.2 PD
turmas fazem que tem trabalho conjunto mesmo. Eles sempre dividem, um faz uma
coisa... o outro faz outra... tem aquele que não quer fazer, outro quer fazer tudo sozinho.
6.2 PD Ao falar “um faz uma coisa”, a PD faz
7.2 PC um movimento com as mãos paralelas,
iniciando na horizontal até chegar na
vertical.
A PC e a PA olham-se e a PC esboça
8.2 PA um sorriso, demonstrando
cumplicidade entre elas com a PD.
Quando a gente for desenvolver a atividade com eles... eles vão reclamar, mas a gente vai
10.2 PA ter que ir conversando com eles e explicando que tem que ser junto, vai orientando,
depois eles vão se habituando também.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Nos enunciados 1.3 a 4.3 (Quadro 46), a PC afirmou que o planejamento que elas
realizam na escola não permite “pensar nessa dimensão do ser” (enunciado 1.3), enquanto, no
planejamento de uma AEA, é necessário pensar nessa dimensão (enunciado 4.3). A professora
PA disse que a dimensão do ser pode ser trabalhada no momento da atividade (labor conjunto)
em sala de aula (enunciado 2.3). A fala da PA sugere, de forma implícita, que, no
planejamento, poderia não ser abordada essa dimensão, concordando parcialmente com a PC.
Quadro 46 - Transcrição dos enunciados 1.3 a 10.3 do episódio relevante 3/3 (ER3/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.3 PC Mas o planejamento não abre muito para pensar nessa dimensão do ser.
2.3 PA Mas isso a gente faz também na sala de aula, quando faz a atividade.
Só que, no planejamento da atividade da TO, tem que planejar antes também, as tarefas
3.3 PC
têm que trabalhar essa questão (...).
4.3 PA Que foi o que a PF disse pra fazer no planejamento nosso.
E o sistema nem deixa a gente escolher muito... já vem tudo pronto. Por isso que eu acho
5.3 PC
que não abre muito pra gente pensar na atualização do ser.
6.3 PC
7.3 PA A PC comprime os lábios e franze o
cenho enquanto fala.
A PA olha seriamente para a PC.
A PD observa a PA, enquanto apoia o
8.3 PD
rosto com os dedos cruzados.
Eu sei... mas a gente pode fazer na prática isso também, que ajuda. A gente não foge
9.3 PA
totalmente do trabalho conjunto(...).
Mas ela (PC) está falando de trabalhar o conteúdo na dimensão do ser e das tarefas que
10.3 PB
têm que ser problemas e que trabalham o ser, isso tem que planejar antes.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
12
A Secretaria de Educação (SED) disponibiliza um sistema, chamado de Sistema de Planejamento online, em
que as professoras devem registrar o planejamento das aulas.
171
Quadro 47 - Transcrição dos enunciados 11.3 a 16.3 do episódio relevante 3/3 (ER3/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
É... seria melhor... mas se não dá, isso não impede de trabalhar na sala mesmo, pergunta
11.3 PA
para os alunos, conversa, trabalha na sala mesmo (...)
12.3 PA
13.3 PC Durante a fala da PB, a PC movimenta
a cabeça da direita para a esquerda em
sinal de negativa.
A PD mantém os braços cruzados e a
14.3 PD boca entreaberta, olhando seriamente
para a PB.
Sim, PA, o que ela (PC) tá dizendo é que o nosso planejamento já vem de um jeito que
foca no conteúdo, não facilita pra trabalhar o ser... aí pode trabalhar também coisas que
15.3 PD
não estão no pl? Pode, mas vai ser na hora, na sala mesmo e se planejar, pensar antes, fica
mais fácil de trabalhar essa parte com a turma.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Durante a fala do enunciado 11.3, a PA fez o movimento com a mão em sua direção
(enunciado 12.3), demonstrando uma tentativa de argumentar diante das ideias da colega.
Simultaneamente, a PC fez um movimento com a cabeça, evidenciando que ela não estava de
acordo (enunciado 13.3). Esse movimento da PC e a postura da PD (enunciado 14.3), que
mantém os braços cruzados e a boca entreaberta, evidencia que elas discordaram da PA,
embora a PD não tenha se manifestado verbalmente até aquele momento.
Na sequência, pode ser observado um posicionamento crítico da professora PD diante
do planejamento realizado por ela na escola, que enfatiza a dimensão do saber em detrimento
do ser. Ela defende que se, no planejamento, já for pensado em abordar a dimensão do ser, o
trabalho em sala de aula a partir da perspectiva coletiva seria facilitado (enunciado 15.3;
Quadro 47).
De maneira geral, nas interações registradas nesse episódio 3/3 (Quadros 46 e 47), as
professoras PB, PC e PD reconhecem e compreendem que a proposta de trabalhar conteúdos
de Ciências a partir de atividades AEA requer a elaboração de uma tarefa com questões,
problemas e ações que possibilitem o encontro com o saber e a produção de novas
subjetividades por meio do labor conjunto. Essa compreensão relaciona-se à ideia de que o
planejamento das atividades AEA de Ciências deve considerar a dimensão do ser (o vir a ser),
172
além do saber (RADFORD, 2019; 2020), visto que a TO parte de uma concepção de ensino e
aprendizagem que envolve uma dimensão objetiva e uma subjetiva.
Tal compreensão sugere uma mudança na forma de conceber o processo de ensino e
aprendizagem diferente da registrada no início da formação dessas professoras, conforme
pode ser observado nos resultados da etapa diagnóstica (Capítulo 2). Ela indica também um
movimento para a produção de novas subjetividades a partir das quais elas passam a
posicionar-se de maneira crítica diante do modelo de planejamento que lhes é imposto pelo
sistema. Elas colocam-se criticamente diante da forma de planejar que foi pensada por outros
e reconhecem que o sistema privilegia a dimensão do saber científico.
Esse posicionamento crítico das professoras diante do planejamento e o
reconhecimento da importância de considerar a dimensão do ser, a dimensão social, no
planejamento de atividades AEA, são elementos importantes para a superação do
racionalismo técnico e da alienação que permeia suas práticas pedagógicas (RADFORD,
2020; CONTRERAS, 2002). Embora a atividade (labor conjunto) faça-se na sala de aula, não
sendo possível prevê-la antecipadamente, a atividade AEA, que compreende o projeto
didático do professor, deve ser planejada considerando os dois eixos do labor conjunto: “as
formas de produção de saberes e as formas de colaboração humana” (RADFORD, 2020, p.
26, tradução nossa).
Outro aspecto relevante das interações analisadas nesses episódios foram os gestos e
movimentos utilizados pelas professoras para exporem suas opiniões durante as interações.
Esses gestos demonstram a insatisfação com as opiniões opostas do grupo acerca do
planejamento, evidenciando momentos de debate e embate durante a interação. Mesmo após
essas interações, quando as professoras elaboravam a resposta final da questão-problema 6,
essa tensão não se dissipou. A Figura 21 destaca a insatisfação da professora PA, que se
manteve séria, com os braços cruzados, enquanto as professoras PB, PC e PD interagiam para
elaboração da resposta final da questão.
Considerando-se que o grupo não chegou a um consenso, uma ação orientada pela
173
Quadro 48 - Transcrição dos enunciados 1. 4 a 7.4 do episódio relevante 4/3 (ER4/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.4 PF E o que vocês pensaram em planejar para incluir essa dimensão do ser?
A gente pensou em fazer, como na atividade de alimentação saudável... fazer uma pergunta
2.4 PA
de como as medidas para prevenir as doenças são importantes para a comunidade.
3.4 PD Para a coletividade... o coletivo.
Interessante. E tem essas questões que vocês fizeram... na questão 2.1 até 2.5. Vocês
4.4 PF
pensaram se podem trabalhar essa dimensão em alguma delas?
5.4 PA Não.
6.4 PF Essa questão “Qual é a origem das vacinas?”, qual foi o objetivo dela?
7.4 PA Foi, porque é uma forma de prevenção, né? Das doenças que vamos trabalhar em sala.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
174
Quadro 49 - Transcrição dos enunciados 8.4 a 16.4 do episódio relevante 4/3 (ER4/3) da atividade 3.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Hum. E vocês já pensaram nesse problema atual dos pais não estarem levando as crianças
para vacinar. As notícias estão o tempo todo falando disso, é... prorrogando as campanhas
8.4 PF
de vacinação porque muitos pais não levaram os filhos para vacinar. E será que esses pais
têm consciência da importância disso? Como a gente poderia ajudar?
9.4 PC A escola.
10.4 PF Oi? O que PC?
11.4 PC A escola, né? Pode trabalhar com as crianças e eles mesmo vão cobrar os pais.
Isso. De repente podemos trabalhar essa questão da saúde coletiva, nessa perspectiva
12.4 PF
também. Aliar essa questão da vacinação com a saúde coletiva.
Porque a prevenção com a vacina vai prevenir a criança de pegar as doenças e o coletivo
14.4 PA também, a comunidade. Se não vacinar pega a doença, as outras se não vacinam, pegam
também.
15.4 PC Às vezes, uma doença que nem existe mais pode voltar.
175
Isso, nessa linha de pensamento, vocês podem elaborar uma tarefa... ou mais tarefas para
16.4 PF trabalhar a prevenção das doenças e a importância da vacinação... é e na perspectiva da
coletividade.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
alunos e a comunidade como um todo. Essa reflexão evidencia também que PF e professoras
posicionam-se diante do problema e apontam as possibilidades de uma solução por meio da
proposição de atividades AEA que levem os alunos a expressarem suas ideias e também se
posicionarem diante do problema. Neste sentido, o labor conjunto pode levar professores e
alunos a encontrarem o saber e posicionarem-se coletivamente diante dos problemas
apresentados relacionados ao seu contexto. Dessa forma, o labor conjunto apresenta-se como
uma alternativa às atividades alienantes desenvolvidas na escola (RADFORD, 2020; 2017b).
Na sequência, a professora formadora PF sugere que elas elaborem uma “tarefa” ou
mais para trabalhar a prevenção das doenças e a importância da vacinação na perspectiva da
coletividade (enunciado 16.4; Quadro 49). A análise do planejamento da atividade AEA
apresentada, na próxima subseção, evidencia que as professoras refletiram sobre o que foi dito
pela PF. A partir disso, as professoras elaboraram três questões que abordam a importância da
vacinação em uma perspectiva coletiva, considerando a análise da carteira de vacinação dos
alunos.
As questões replanejadas pelas professoras tiveram como base a interação com a PF,
mas mantiveram as ideias trazida por elas. De outra forma, o planejamento final não
expressaria as ideias e opiniões das professoras e elas não se reconheceriam no trabalho
realizado, o que caracterizaria uma atividade formativa alienante, conforme discutido por
Radford (2016a, 2020).
Nesse cenário, fica evidente o papel do formador em formações continuadas e
permanentes baseadas na TO, que é o de trabalhar em conjunto com os professores, como
iguais, sem haver a imposição de ideias ou fomentar uma relação de poder baseada na posse
do conhecimento (RADFORD, 2020; 2017b). Por meio do labor conjunto, professoras e
formadora expressam suas opiniões diante do saber acerca do fazer pedagógico e posicionam-
se criticamente a partir do seu contexto histórico-cultural, produzindo novas subjetividades e
tornando-se “presenças no mundo” (FREIRE, 2004, p. 98). A partir das ideias de Radford
(2016a), pode-se dizer que professoras e formadora têm um empreendimento comum em que
aprendem juntas em um espaço de diálogo democrático afim de transformar suas práticas
pedagógicas.
A quarta ação da atividade 3 (Quadro 41) foi a reelaboração da atividade AEA sobre
vírus planejada no módulo 2, que aconteceu após as discussões do planeamento na forma de
177
labor conjunto com a PF detalhada na subseção 4.2.4. Nessa reelaboração, deveria ser
considerada a estrutura objeto-objetivo-tarefa, o trabalho conjunto de alunos e professoras e o
uso de artefatos tecnológicos digitais. Poderiam ser consideradas também a devolutiva com
sugestões da PF ao planejamento elaborado anteriormente. Foram realizadas duas reuniões
presenciais com o grupo 1, com 50 minutos de duração cada, em que as professoras e PF
trabalharam em conjunto discutindo ideias para reelaboração da atividade AEA na perspectiva
da TO. Nos Quadros 50 e 51, encontram-se o planejamento e reelaboração da atividade AEA
realizados pelas professoras.
saberes sobre vírus, doenças causadas por eles e sua prevenção por meio da vacinação,
enquanto o objetivo está baseado na resolução das questões-problema sobre o conceito de
vírus, as principais doenças causadas por eles e a prevenção por meio da vacinação. Essa foi
uma mudança em relação ao planejamento anterior realizado no módulo 2, visto que havia
incoerência entre o objeto e objetivo, conforme Anexo D. A coerência entre o objeto e
objetivos é um elemento importante a ser observado no planejamento de uma atividade AEA,
visto que é por meio dos objetivos que a atividade move-se em direção ao objeto e, portanto,
ao encontro do saber (RADFORD, 2017b; 2018d). Dessa forma, foi relevante discutir com os
professores em formação que o objeto relaciona-se ao encontro com um determinado saber
científico, enquanto os objetivos devem ser definidos em função desse objeto.
Foram elaboradas 12 questões-problema e quatro ações. Exceto pelas questões-
problemas 4.1 a 4.3, relacionada à ação 4, as demais questões ainda exigem pouca discussão
dos alunos para respondê-las e estão focadas no saber científico presente no vídeo e textos
utilizados na atividade AEA (Quadro 51).
sobre a prevenção de doenças por meio da vacinação, bem como um posicionamento crítico
diante da dimensão social relacionada à vacinação ou a falta dela.
O planejamento dessas questões-problema teve como base as discussões das
professoras e professora formadora, quando trabalharam em conjunto, sobre o baixo número
de crianças vacinadas, conforme registrado no episódio relevante 4/3. As análises evidenciam
que foi a partir do labor conjunto que as professoras posicionaram-se criticamente diante
desse fato e puderam propor mudanças no planejamento, pensando na dimensão do saber e do
ser. Tais análises evidenciam que durante a formação ocorreram indícios dos processos de
objetivação e subjetivação. Esses processos levaram as professoras a pensarem a atividade
AEA de Ciências a partir de uma dimensão social, o que caracteriza o processo de formação
de um professor intelectual crítico e com vistas à superação dos aspectos que caracterizam a
alienação presente em suas práticas pedagógicas (CONTRERAS, 2002; RADFORD, 2016a).
Em uma proposta de pesquisa-formação que tem como objetivo a proposição de uma
metodologia para o ensino de Ciências voltado para formas de produção de saberes e de
cooperação humana não alienantes e a formação de professores intelectuais críticos, é
relevante refletir também sobre uma concepção de educação no âmbito do ensino de Ciências
a partir de uma perspectiva transformadora. Neste sentido, a educação é concebida como
como um “empreendimento político, social, histórico e cultural” (RADFORD, 2017a, p. 97),
voltado para a formação de sujeitos reflexivos, éticos e críticos. Essa perspectiva
transformadora da educação é também discutida por Freire (1979; 2010) a partir da ideia que
a educação que promove uma reflexão crítica de educandos resulta em uma ação
transformadora dos indivíduos no contexto social em que estão inseridos.
Outro aspecto significativo do planejamento das professoras é a proposta de uso dos
artefatos tecnológicos digitais no contexto da atividade AEA. A análise das informações
disponíveis nos Quadros 50 e 51 evidencia que o uso do computador interativo, do laptop
educacional, do editor de texto, do navegador de internet, do texto e do vídeo foi planejado
considerando que esses artefatos fariam parte da atividade (labor conjunto) e possibilitariam a
realização das ações da tarefa. A partir dessa ideia, os artefatos serão parte da atividade dos
indivíduos no desenvolvimento do planejamento realizado pelas professoras e somente no
contexto da atividade poderão “tornar aparente” o saber cultural dos quais são portadores
(RADFORD, 2017b; 2020).
Neste sentido, vê-se uma mudança em relação à visão que as professoras tinham sobre
o uso dos artefatos tecnológicos digitais no ensino de Ciências. No início da pesquisa-
formação, elas viam o artefato como mediador no processo de ensino e aprendizagem e não
181
como parte da atividade mediadora. Essa visão inicial está de acordo com as ideias advindas
do construcionismo (VALENTE, 2005), que embasou as formações que elas participaram
anteriormente, conforme evidenciado nas análises dos dados da etapa diagnóstica da pesquisa-
formação (Capítulo 2).
De maneira geral, a reelaboração do planejamento da atividade AEA evidenciou que
as professoras buscaram problematizar a tarefa proposta, considerando a dimensão social,
conforme observado nas questões-problema sobre vacinação. Embora nem todas as questões
tenham essa característica e parte delas ainda estejam voltadas apenas para o saber científico,
pode-se considerar que houve um avanço na formação das professoras para utilizarem a TO
no ensino de Ciências com seus alunos.
É importante considerar também o histórico formativo das professoras e as suas
práticas pedagógicas baseadas no racionalismo técnico, voltado para um modelo tradicional
de educação em uma escola inserida em um sistema que valoriza o saber e estimula o
individualismo. A superação dessas práticas requer o desenvolvimento de uma visão coletiva,
crítica e ética a respeito das ideias que lhe são impostas e da sua própria ação. Tal superação,
no contexto da formação de professores baseada na TO, é um processo que requer esforço,
compromisso e demanda tempo. Por essa razão, a formação deverá levar à superação do
“paradigma da propriedade privada” (RADFORD, 2016a, p. 265), oportunizando um espaço
de debates, abertura para com os outros, cuidado, responsabilidade e solidariedade. É
necessário também que a formação leve a um posicionamento crítico em relação ao ensino de
Ciências, a partir de formas éticas de colaboração humana e produção de saberes por meio de
ações formativas emancipatórias.
conjunto, bem como o papel dos alunos e professor nesse contexto. Esses objetivos foram
definidos a partir das análises dos resultados do módulo 3 que sugerem a necessidade de
aprofundar as reflexões acerca da dimensão do saber e do ser no contexto da atividade
mediadora. Tais necessidades foram atendidas por meio dessa atividade 4, com estudos de
textos e análise de exemplos hipotéticos de interações de alunos em sala de aula. O objeto da
atividade AEA4 está elencado no Quadro 52, com foco nos processos de objetivação e
subjetivação.
Quadro 52 - Objeto da atividade AEA4 (Conceitos de objetivação, subjetivação e alienação) com foco nos
processos de objetivação e subjetivação.
Foco nos processos de objetivação Foco nos processos de subjetivação
- Refletir sobre o desenvolvimento de atividades
Encontrar-se com os saberes sobre:
AEA em sala de aula, o papel do professor e do
- Subjetivação, objetivação e alienação com
Objeto aluno.
base na TO.
- Produzir novas subjetividades por meio do labor
- O uso do editor de texto do laptop.
conjunto.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
A2 - Analisar dois exemplos hipotéticos de interações - Analisar exemplos hipotéticos de interações dos
durante uma atividade em uma aula de Ciências alunos em sala de aula.
13
Parte do texto traduzido do Capítulo 6 “Ser, Subjetividad y Alienación” (pp. 142-145) publicado em Radford,
L. (2017c). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1-XT72YsKtl8mpHOgV6uuV665a7nQfMmi/view?usp=sharing
14
Parte do texto traduzido do Capítulo 6 “Ser, Subjetividad y Alienación” (pp. 145-149) publicado em Radford,
L. (2017c). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1ahwpEOhjsrXM9MI6XRvdxX8QxVrqQpJ1/view?usp=sharing
184
15
Parte do texto traduzido do Capítulo 6 “Ser, Subjetividad y Alienación” (pp. 149-157) publicado em Radford,
L. (2017c). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1LBR1AfdAKQaTWhBsmWKhYcYvjTwGE3EP/view?usp=sharing
185
Nesta seção, serão analisadas as interações das professoras do grupo 1 por meio da
análise de dois episódios relevantes, que evidenciam momentos de encontro com o saber e a
produção de novas subjetividades durante o labor conjunto para realização da atividade
AEA4. Serão analisados, além disso, enunciados verbais e gestuais que não serão
apresentados no contexto de um episódio relevante, mas que evidenciam reflexões
importantes para a formação do professor intelectual crítico.
16
Parte do texto traduzido do Capítulo 6 “Ser, Subjetividad y Alienación” (pp. 142-145) publicado em Radford,
L. (2017c). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1-XT72YsKtl8mpHOgV6uuV665a7nQfMmi/view?usp=sharing
186
Quadro 54 - Transcrição dos enunciados 1.1 a 4.1 do episódio relevante 1/4 (ER1/4) da atividade 4.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Para mim, é alguma coisa que tem a ver com o objetivo de atualizar o saber, como a
1.1 PA professora disse. Que foi quando os alunos fizeram a simulação certa, eles usaram o
conhecimento científico para fazer a simulação.
problema que tratou dessa definição e que pudesse levar as professoras ao encontro desse
saber.
Quadro 55 - Transcrição dos enunciados 5.1 a 10.1 do episódio relevante 1/4 (ER1/4) da atividade 4.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Eu acho assim ... tem lá no texto do outro módulo.. que quando atualiza o saber tem a
5.1 PC transformação da consciência. Aí, o processo de objetivação atualiza o saber e transforma a
consciência. É isso?
6.1
7.1 PA
É... porque se ele aprendeu, ele usou o conhecimento científico para fazer a simulação
8.1 PA
certa... muda a consciência, né?
9.1 PD (Sim) -
10.1 PA Aí fica todos esses itens que eles usam o conhecimento correto para fazer a simulação.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Quadro 56 - Transcrição dos enunciados 1.2 a 4.2 do episódio relevante 2/4 (ER2/4) da atividade 4.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
A gente falou a questão do objeto, concreto, que estava muito subjetivo, que ele chegou até
1.2 PD
o objeto (...)
A fala da PD (enunciado 1.2) evidencia que ela não conseguia ainda elaborar uma
definição de processo de objetivação de acordo com a TO, como as professoras PA e PC
conseguiram, conforme o registro no episódio relevante 1/4. Por meio do seu gesto
(enunciado 2.2; Quadro 56), a PD tentou explicar para as colegas o movimento que o aluno
faria para chegar ao objeto, que, para ele, é subjetivo e, com a discussão, passaria a ser
concreto. A fala da PD foi interrompida pela PA, quando ela disse que “isso é na objetivação”
(enunciado 4.2; Quadro 56), sugerindo não ter entendido a explicação da colega. Essas
interações mostram que elas ainda estão em processo de objetivação, ou seja, em movimento
para encontrar os saberes relacionados aos conceitos de processos de objetivação e
subjetivação.
Após a fala da PA, a PD disse que “aqui ele está falando das atitudes” (enunciado 5.2;
Quadro 57), sincronizando e sistematizando sua fala com o movimento das mãos (enunciados
6.2 e 7.2). Nesse momento, a PD referiu-se a um dos textos impressos discutido na ação 2 da
atividade AEA4 apresentada no Quadro 53.
Quadro 57 - Transcrição dos enunciados 5.2 a 12.2 do episódio relevante 2/4 (ER2/4) da atividade 4.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
5.2 PD É..mas aqui ele está falando das atitudes.
Esses enunciados 5.2 a 7.2 (Quadro 57) sugerem que, mesmo não definindo processo
de objetivação corretamente, de acordo com a TO, a professora PD compreende que o
processo de subjetivação diferencia-se dele e está relacionado às atitudes (ações dos sujeitos).
É importante enfatizar que a aprendizagem das professoras nas atividades da formação ocorre
gradualmente, por meio dos processos de objetivação e subjetivação, de maneira diferente e
de forma subjetiva na mente de cada uma delas, pois, de acordo com Radford (2019, p. 08), o
conceito é uma “refração subjetiva do conhecimento na consciência”.
Após a fala da PD, a professora PC complementa dizendo que “aí entra a atualização
do ser” (enunciado 8.2; Quadro 57), mostrando-se atenta à fala das colegas, mesmo mantendo
o olhar voltado para a digitação no laptop, enquanto elas interagiam. Essa característica de
não focar o olhar nas colegas durante as interações parece ser própria da professora PC,
conforme registrado em outros episódios relevantes. Esse fato mostra que as interações no
contexto da pesquisa-formação devem ser analisadas considerando as características de cada
professor, a fim de que as ações formativas possam atender as especificidades de cada um
(LIMA; PINHEIRO, 2005), com vistas à promoção da coletividade.
Nos enunciados 9.2 a 12.2 (Quadro 57), as professoras continuaram o trabalho
conjunto para definir o processo de subjetivação. A PA disse que apenas “atualização do ser”
não bastava para definir processos de subjetivação, fazendo a leitura da definição dada no
texto usado na ação 1 para complementar a resposta (enunciado 9.2). A PC então usou o
exemplo da interação disponibilizada na ação 2 e afirmou que o processo de subjetivação está
relacionado a pensar na coletividade (enunciado 10.2). Na sequência, a PD concordou com as
colegas e a PA apontou para o texto com a definição de subjetivação, dizendo que elas
poderiam formular a resposta a partir da leitura que ela fez (enunciados 11.2 a 12.2).
Após essa interação, as professoras elaboraram a seguinte definição de subjetivação:
“É a atualização do ser, o processo pelo qual nos afirmamos como subjetividades em curso. A
atividade media o ser em subjetividades e o sujeito passa a agir com ética comunitária e
pensar na coletividade, no outro” (Grupo A; Anexo F). Quando se compara essa definição
192
com a resposta elaborada pelas professoras na questão-problema 1.1, baseada no saber atual,
em que elas definiram processos de subjetivação como “Conjunto de ideias que cada ser
possui de acordo com suas experiências e vivencias” (Grupo A; Anexo F), observa-se que as
professoras mudaram a ideia que tinham sobre o que são processos de subjetivação. A
definição elaborada por elas quando trabalhavam em conjunto está bem próxima da definição
da TO, em que processos de subjetivação são entendidos como: “o processo através do qual
nos afirmamos como projetos únicos de vida, como subjetividades em curso” (RADFORD,
2017c, p. 147, tradução nossa) e como aqueles processos nos quais professores e alunos
“coproduzem-se a si mesmos no contexto da cultura e da história [...] chegam a ser presenças
no mundo” (RADFORD, 2020, p. 22, tradução nossa). Assim, essa mudança evidencia que,
por meio do trabalho conjunto, durante a atividade 3, as professoras encontraram-se com o
saber, com base na TO, o que se materializou quando elas puderam elaborar uma definição
coerente e bem próxima àquela estabelecida na teoria.
PD: Aí gente... a gente não olha isso mesmo na sala, essa dimensão do ser, da atualização do ser, do
2.s
sujeito... Os meus (alunos) sempre dividem a atividade.
PA: E aí entra a avaliação... a gente sempre dá nota pelo que ele atualizou no saber, como saber se
3.s ele atualizou o ser... se o aluno não trabalha em grupo, como acontece muito, então, eu não posso
dar nota pra ele. Tem que considerar os dois processos (objetivação e subjetivação).
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quadro 59 - Reflexão das professoras sobre a alienação de acordo com a TO e sobre a formação.
Enun
- Professora/Transcrição
ciado
PG: Então, os nossos alunos... na maioria são ALIENADOS. Até todos, não sei. Nós também
4.s
professores, como professores.
PB: É difícil acontecer isso que acontece aqui nessa formação, da gente sentar e aprender junto. É
raro na verdade, a gente está vendo que hoje a gente consegue perceber a diferença, né? De estar aqui
no grupo aprendendo e de estar em casa sozinho.
PF: E do ponto de vista da formação, a gente também traz essa crítica, da formação baseada na
transmissão de informação ou na formação que propõe a construção do conhecimento pelo professor,
6.s
a gente traz essa crítica de que esse sujeito está alienado, agora eu posso falar isso (risos) porque a
PG atualizou (risos), atualizou e percebeu isso.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
A professora PG, do grupo 2, foi a primeira a reconhecer que os alunos e ela, como
195
professora, são alienados (enunciado 4.s; Quadro 59). Essa fala da professora ocorreu no
contexto de uma discussão sobre os alunos não se reconhecerem no trabalho que realizam em
sala de aula nas tarefas de Ciências baseadas na transmissão de informações. A discussão
partiu da ideia de Radford (2016a) pela qual, no modelo tradicional de educação, o aluno é
alienado do produto do seu trabalho e do seu trabalho.
A partir dessa reflexão, a professora PB interagiu com as colegas do grupo 2 e fez
uma reflexão crítica, comparando as formações continuadas baseadas no individualismo, da
qual participaram, e a pesquisa-formação (enunciado 5.s; Quadro 59). Ela mencionou a
diferença entre aprender no grupo e aprender sozinha, fazendo referência ao trabalho conjunto
e as ações formativas individuais, respectivamente. Baseada nessa mesma ideia, a professora
formadora (PF) fez uma crítica às formações fundamentadas na transmissão de informações,
em que o professor não se reconhece no trabalho que ele realiza e no que produz. A PF
também criticou as formações baseadas na ideia de construção do conhecimento, em que as
produções são subjetivas, que podem ser classificadas como alienantes a partir da ideia de
alienação com base na TO (RADFORD, 2016a; 2020).
Por meio da sua exposição verbal, a PF introduz a ideia de que a alienação pode ser
reconhecida nas ações educativas baseadas na relação de poder, seja no poder do professor,
quando centradas na transmissão do saber, seja no poder do aluno, quando enfatizam o seu
papel central (RADFORD, 2020). Por meio de sua fala, ela direcionou as professoras para
uma definição mais elaborada de alienação, de acordo com a TO. Essa fala da PF evidencia
que foi a partir da interação com as professoras que a formadora trouxe à discussão a
definição de alienação, que traz uma base filosófica marxista que nem todas as professoras
pedagogas conhecem, evitando trazer uma definição pronta para o contexto da formação.
O papel do formador no contexto de uma formação realizada por meio do labor
conjunto e que visa à emancipação coletiva das práticas alienantes deve ser baseado em uma
relação de igualdade com os professores. Esse tipo de relação pode levar à formação de
professores intelectuais críticos, com uma visão crítica da situação em que eles encontram-se
(CONTRERAS, 2002). Pode levar também à superação da relação de poder que existe nas
formações tradicionais em que o formador detém o saber acerca de técnicas e metodologias de
ensino e aprendizagem que direcionam as práticas pedagógicas nas quais os professores não
se reconhecem.
196
Quadro 60 - Objeto da atividade AEA5 (Avaliação da aprendizagem na perspectiva da TO) com foco nos
processos de objetivação e subjetivação.
Foco nos processos de objetivação Foco nos processos de subjetivação
- Encontrar-se com os saberes sobre:
- Avaliação da aprendizagem com base na Teoria da - Refletir criticamente sobre a prática
Objetivação. pedagógica e a avaliação da aprendizagem.
Objeto
- O uso do editor de apresentação e planilha - Produzir novas subjetividades por meio do
eletrônica do laptop educacional e sobre o projetor labor conjunto.
multimídia.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
questões-problema).
A tarefa dessa atividade AEA5 compreendeu quatro ações e treze questões-problema,
conforme sintetizado no Quadro 61. A tarefa foi pensada considerando um nível de
complexidade crescente, a coerência das ações e questões-problema e a promoção do encontro
com os saberes sobre avaliação da aprendizagem por meio do labor conjunto.
17
Texto traduzido e adaptado do artigo “La evaluation desde la Teoría Cultural de la objetivación: una
experiencia com estudiantes de grado octavo relacionados com la transformación del lenguage” (LIMAS;
ALBORNOZ, 2017). Revista Seres, Saberes y Contextos, v. 2, n.1, p. 50 a 58. Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1hYJSofrcfmUEFDMpMsMNe936Jmqalabc/view?usp=sharing
200
18
Parte do texto traduzido do capítulo “On Teachers and Students: an ethical cultural-historical perspective”
publicado em (RADFORD, 2014). Disponível:
https://drive.google.com/file/d/14pEdIhmCs4obrt6rraTTiK1LTtGkqF14/view?usp=sharing
19
Parte do texto traduzido do Capítulo 6 “Ser, Subjetividad y Alienación” (pp. 149-157) publicado em Radford,
L. (2017c). Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1LBR1AfdAKQaTWhBsmWKhYcYvjTwGE3EP/view?usp=sharing
201
realizaram em suas práticas pedagógicas e da avaliação, de acordo com TO. Ademais, serão
apresentados enunciados gestuais e verbais, que foram registrado em diferentes momentos das
interações e, portanto, não compreendem um episódio relevante. Esses enunciados
evidenciam momentos de reflexões críticas durante o labor conjunto, destacando processos de
objetivação e subjetivação, incluindo professoras do grupo 2.
Quadro 62 - Transcrição dos enunciados 1.1 a 6.1 do episódio relevante 1/5 (ER1/5) da atividade 5.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
1.1 PA Por essa pergunta dá pra perceber que a gente não avaliou certo.
2.1 PD Qual?
A que pergunta se observamos os processos de objetivação e subjetivação. A gente olha a
3.1 PA atualização do saber, que é a objetivação e olhamos nas respostas. A gente não olhou o
trabalho conjunto deles (...)
4.1 PD Então... tinha que ver como eles trabalham no grupo também.
5.1 PD
A interação iniciou com a professora PA constatando que elas não haviam realizado
uma avaliação da aprendizagem correta (enunciado 1.1), na atividade sobre vírus
desenvolvida com os alunos no módulo 4. Essa constatação foi atribuída ao fato de não terem
observado o trabalho conjunto e terem contemplado apenas a “atualização do saber, que é a
objetivação” (enunciado 3.1).
202
O uso da expressão “Aaaah!”, dita pela PD em tom de voz elevado (enunciado 4.1
Quadro 62), evidencia que ela chegou a essa conclusão a partir da interação com a colega PA.
A PA também interage por meio de gesto e faz um sinal positivo de concordância para a PD
(5.1; Quadro 62).
Esses enunciados evidenciam que a professora PA passou a compreender que a
aprendizagem envolve processos de objetivação e subjetivação e que a PD parece convencida
que o processo de subjetivação ocorre por meio do trabalho conjunto dos alunos. Essa
reflexão é importante para a compressão das professoras de que a avaliação da aprendizagem
requer a observação dos alunos durante a realização das tarefas. De acordo com Radford
(2013, p. 5, tradução nossa), somente durante o labor conjunto, será possível observar “o
quanto os alunos são solidários com os outros, o compromisso com o grupo e como
contribuem para a resolução da tarefa expondo suas opiniões, ouvindo as opiniões dos outros
e se posicionando criticamente diante das ideias expostas”.
Esse entendimento foi possível graças ao labor conjunto e as ações que elas realizaram
e que subsidiaram as discussões, sendo, portanto, indícios da materialização do saber. Neste
caso, é a avaliação, pois elas realizaram uma reflexão sobre uma situação que havia ocorrido
com os seus alunos (situação concreta) e passaram a tomar consciência desse saber
(RADFORD, 2017a; 2020).
Na sequência, a professora PA reafirma a ideia que, para avaliação da aprendizagem,
devem ser observados tanto os processos de objetivação quanto de subjetivação (enunciados
verbais e gestual 7.1, 8.1 e 11.1; Quadro 63).
Quadro 63 - Transcrição dos enunciados 7.1 a 11.1 do episódio relevante 1/5 (ER1/5) da atividade 5.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
Tem que olhar os dois, a aprendizagem, que é a atualização do ser e do saber. Aí o olhar se
7.1 PA eles trabalham juntos, se tem colaboração... por essa questão aqui, a gente teria que ter
observado isso no processo.
8.1 PA
Se trabalham na coletividade... e isso não dá pra ver depois, nas respostas, tem que ser na aula.
10.1 PD
Éeee... aí tem que observar na hora.
É que, nessa teoria, a avaliação é diferente do que a gente sempre viu. Engloba a objetivação e
11.1 PA
a subjetivação. A avaliação da participação que todo mundo faz ver se ele participa, mas não
203
Durante as discussões para elaboração das respostas das questões-problema 3.1 a 3.4
(Quadro 61; Anexo G), relacionadas à concepção da avaliação da aprendizagem na
perspectiva da TO e uma reflexão sobre a avaliação que os professores realizam na escola, foi
registrado o episódio relevante 2/5, com 12 enunciados. Esses enunciados estão transcritos
nos Quadros 64 e 65.
A fala da professora PC no enunciado 1.2 (Quadro 64) referiu-se ao fato de não
204
Quadro 64 - Transcrição dos enunciados 1.2 a 6.2 do episódio relevante 2/5 (ER2/5) da atividade 5.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
A gente não observou a fundo, depois nós conversamos entre nós, mas a gente não observou
1.2 PC
isso.
O que está falando aí e sobre a concepção de avaliação ( ) a concepção de avaliação nossa é
2.2 PA
igual? [Não]
3.2 PA
4.2 PC A PB balança a cabeça da esquerda
para a direita, em sinal de negativa e
observa a PC. A PC olha para a PA,
esboçando um sorriso, quando
5.2 PB reponde “não”. A PB observa a PA
com o dedo mínimo da mão direita na
boca.
6.2 PC [NÃO].
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Após essa fala da PC, a professora PA afirmou, por meio da fala e do movimento de
negativa da cabeça, que elas têm uma concepção de avaliação diferente da TO (enunciados
2.2 e 3.2; Quadro 64). A PB interagiu demonstrando estar atenta às falas das colegas
(enunciados 4.2 e 5.2; Quadro 64), embora não tenha feito nenhuma exposição verbal.
Nesse momento, pode ser observado que as professoras PA e PC reconhecem que
elas têm uma concepção de avaliação diferente das ideias da TO. Elas sugerem entender que a
avaliação na perspectiva da TO não envolve somente a aprendizagem de conteúdo, mas
também um olhar atento para as ações dos alunos que devem estar pautadas na ética
comunitária. Esse reconhecimento requereu uma postura crítica das professoras diante da
avaliação da aprendizagem e evidencia a produção de novas subjetividades, a partir da tomada
de consciência sobre as práticas individualistas que permeiam a avaliação que realizam junto
aos alunos. De acordo com Freire (1979, p. 17) a “conscientização é o olhar mais crítico
possível da realidade, que a “desvela” para conhecê-la e para conhecer os mitos que enganam
e que ajudam a manter a realidade da estrutura dominante”. Assim, é a partir da tomada de
consciência da sua realidade que as professoras poderão superar o racionalismo técnico que
norteia as avaliações que realizam junto aos alunos, bem como desenvolver um perfil de
professor intelectual crítico.
Nos enunciados seguintes (7.2 a 12.2; Quadro 65), a professora PD manifesta-se
sobre como procederam na atividade que desenvolveram com seus alunos e afirma claramente
que elas tiveram um olhar individualista no momento da avaliação da aprendizagem, sem
205
considerar o grupo de alunos. Ela sincroniza sua fala com movimentos das mãos (enunciado
gestual 8.2), articulando as palavras e os movimentos, representando, por meio dos seus
gestos, a ideia exposta verbalmente para as colegas, que a observavam atentamente.
Quadro 65 - Transcrição dos enunciados 7.2 a 12.2 do episódio relevante 2/5 (ER2/5) da atividade 5.
Enun-
Prof. Transcrição do Enunciado
ciado
A gente não fez avaliação. Sabe por que não? Não... sabe por que não é a mesma? Porque a
7.2 PD
gente não tinha feito avaliação... porque o nosso grupo, a gente viu individualmente (...)
9.2 PC É
A gente não viu no grupo. Nosso olhar não foi um olhar... se o grupo avançou, se o grupo
10.2 PD
(...)
11.2 PB A gente viu cada um né?
12.2 PD O nosso olhar depois foi individual.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
da aprendizagem no âmbito da TO. Ela reconhece que a avaliação realizada na escola enfatiza
o saber científico em detrimento do ser (vir a ser) e desconsidera a dimensão coletiva.
A professoras PD fez, da mesma forma, uma crítica a respeito da avaliação da
participação dos alunos nas aulas, que é realizada na escola (enunciados 2.s Quadro 66).
Segundo ela, essa avaliação, que, em um primeiro momento, parece estar relacionada à
dimensão do ser, tem um caráter individualista, pois ao avaliar os alunos a partir desse critério
(participação) não são consideradas as suas ações relacionadas à dimensão coletiva da
atividade. Nesses enunciados (1.s e 2.s), a PD parece também compreender que, em uma
avaliação baseada na TO, deve ser considerada a ação dos alunos a partir de uma ética em que
prevalece a solidariedade, o respeito e o cuidado com o outro.
Esse posicionamento diante da avaliação da aprendizagem realizada na escola foi
possibilitado pelo desenho da tarefa da atividade AEA5, fundamentada em questões-problema
baseadas nas ações realizadas pelas professoras com seus alunos. Tal desenho propiciou o
encontro com o saber científico sobre avaliação na perspectiva da TO por meio do trabalho
conjunto de professoras e formadora. Neste sentido, a formação continuada e permanente
propiciou uma experiência formativa democrática, baseada na ética comunitária (RADFORD,
1016a). Essa experiência não foi vivenciada pelas professoras durante sua formação inicial e
continuada, ambas baseadas no racionalismo técnico, conforme evidenciaram as análises dos
dados da etapa diagnóstica.
Ainda durante a socialização, conforme o enunciado 3.s (Quadro 66), a professora PB
afirmou que continuava não sabendo como avaliar seus alunos a partir de uma perspectiva
coletiva, considerando a dimensão do ser. O gesto da professora, que bateu no peito durante
sua fala, e sua expressão facial (enunciado 3.s) demonstram que ela reconhece em sua prática
um fazer individualista e que se esforça para mudá-la. Porém, a professora ainda não visualiza
formas concretas de fazer a avaliação da aprendizagem considerando a sua dimensão coletiva.
A maneira como manifesta seus sentimentos evidencia um momento de conflito em que ela
sofre e expressa-se como “um sujeito único, concreto”, um “projeto inacabado” (RADFORD,
2017c, p. 143, tradução nossa) que continuamente configura-se como sujeito (ser) por meio
do labor conjunto na formação.
Outra reflexão importante observada durante o trabalho conjunto no grupo 1 diz
respeito ao reconhecimento das professoras quanto à alienação presente na prática avaliativa
que realizam (enunciados 4.s e 5.s; Quadro 67).
Quadro 67 - Relatos e reflexões das professoras sobre a avaliação que realizam na escola e o labor conjunto com
208
os alunos.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
4.s PD: Ah, a gente usa Libâneo, Luckesi no PPP, sempre cita eles, fala da avaliação... que é processual.
PA: Mas, na verdade, a gente nem conhece bem eles, vocês conhecem? Porque eu, pra falar a
5.s verdade, não saberia agora dizer o que eles falam. Sou meio alienada (risos)... a gente usa porque a
SED usa, mas eu, na verdade, não conheço a fundo.
PE: Porque eles queriam terminar rápido, queriam achar um jeito de copiar as respostas e pronto... e
a gente vê muito a alienação, que a gente falou, eles mesmo querem a resposta pronta pra copiar e
6.s pronto. Daí entra essa questão da atividade, de como colocar os problemas para fazer eles
trabalharem juntos... com alguns grupos foi muito difícil, outros já foi mais tranquilo, eles se
envolveram mais.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quando discutiram sobre qual teoria embasa a avaliação que realizam com os alunos,
a PD mencionou autores que tratam da temática da avaliação escolar, como Libâneo e Luckesi
(enunciados 4.s). As ideias desses autores são utilizadas nos textos do Projeto Político
Pedagógico (PPP) que direciona e organiza a avaliação da aprendizagem na escola. No
contexto dessa discussão, a PA afirma que não conhece, de fato, as ideias desses autores e diz
que: “Sou meio alienada (risos)... a gente usa porque a SED usa, mas eu, na verdade, não
conheço a fundo” (enunciado 5.s)”. A exposição verbal da PA evidencia um posicionamento
crítico, por meio do qual poderá ocorrer a tomada de consciência da alienação que se faz
presente na sua prática. Essa alienação concretiza-se na subordinação dos professores a um
saber que desconhecem, no qual não expressam suas ideias e não se reconhecem, como é
comum nas “pedagogias de transmissão de saberes” (RADFORD, 2020, p. 25, tradução
nossa) presentes na escola tradicional.
Conforme o planejamento da atividade AEA5, a experiência de desenvolver uma
atividade no módulo 4 baseada nas ideias da TO foi socializada com os colegas por meio de
slides elaborados em conjunto pelas professoras (Quadro 61). Durante essa socialização, a
professora PE fez uma reflexão importante sobre os desafios que encontrou durante o labor
conjunto em relação à dificuldade de discutir as questões-problema, procurando respostas
prontas (enunciado 6.s; Quadro 67). A dificuldade observada pela PE representa o desafio que
as professoras têm de mudar essa prática individualista presente nas ações dos alunos. Essa
prática é própria do modelo tradicional de educação que os submete a uma relação de poder,
em que o professor é possuidor do saber (RADFORD, 2020), que lhes é transmito por meio
de tarefas que resultam em produtos nos quais não se expressam. Esse fato mostra a
importância e necessidade de se realizar reflexões sobre formações que preparem os
professores para efetivar com seus alunos atividades baseadas na solidariedade, no respeito e
cuidado com os outros, que propiciem uma reflexão crítica do saber e uma mudança na
209
prática pedagógica.
Neste sentido, a TO oferece uma possibilidade não alienante de ensino e
aprendizagem baseada na atividade ou labor conjunto (RADFORD, 2020; 2017c). Assim
sendo, a mudança na prática pedagógica do professor perpassa por uma nova concepção de
avaliação da aprendizagem. Essa avaliação passa a ser concebida a partir das formas de
produção de saberes e de colaboração humana que ocorrem no labor conjunto de professores e
alunos.
com os alunos favoreceu essa compreensão; elas tiveram necessidade de um instrumento, com
critérios a serem observados para avaliar a aprendizagem nas suas dimensões do ser e do
saber e sentirem-se mais seguras para planejar as tarefas e desenvolver atividades baseadas no
trabalho conjunto com os seus alunos.
Esses resultados somados aos resultados das análises do instrumento diagnóstico
avaliativo e do opinário, aplicados após o módulo 5 e analisados na próxima seção,
direcionaram as discussões nas reuniões realizadas na etapa de emancipação coletiva, que
compreendeu a terceira etapa da formação.
saber. Então, automaticamente eu continuava repetindo isso com meus alunos”. Essa resposta
sugere que ela tomou consciência de sua prática tradicional, classificada como alienante
(RADFORD, 2016), e caminha para a sua superação, por meio da produção de novas
subjetividades no contexto das atividades formativas, bem como o faz quanto à superação do
modelo de professor especialista técnico (CONTRERAS, 2002).
Sobre como a formação contribuiu para aprender a usar os artefatos tecnológicos
digitais (laptop e computador), as professoras afirmaram que aprenderam a utilizá-los, citando
o simulador, a internet, a planilha eletrônica (Excel) e o editor de apresentação (editor de
apresentação) - (Quadro 69). Elas também disseram que sabem como usar esses artefatos em
atividades AEA baseadas em problemas (PA) e no trabalho conjunto (PB). As respostas das
professoras PB e PA sugerem, de forma implícita, a importância que elas atribuem ao laptop e
ao computador no contexto de uma atividade AEA. Neste sentido, a visão das professoras
volta-se para o papel atribuído ao artefato no contexto da TO, como um elemento auxiliar de
uma atividade mediadora (RADFORD, 2017b), que contribui para os processos de
objetivação e subjetivação.
O Quadro 70 apresenta uma síntese das reflexões das professoras às questões sobre a
atividade desenvolvida com os alunos a partir da metodologia do trabalho conjunto,
categorizadas em: mudanças na forma de planejar; mudança na participação dos alunos e
preparo para o uso do laptop no trabalho conjunto com os alunos.
Quadro 70 - Reflexões sobre a atividade AEA desenvolvida com os alunos a partir da metodologia do trabalho
conjunto.
Mudanças na: Saberes relacionados ao
Prof. Forma de planejar Participação dos alunos laptop
Algumas ferramentas, (eu)
não sabia onde encontrar e
Cada um de um jeito, mas todos então precisei do apoio da
Observei que, se conseguir
pensaram, agiram e falaram para PROGETEC e dos alunos.
planejar com as professoras
resolver as questões-problema. Percebi que muitas coisas
da minha turma, todos
PA Alguns não quiseram trabalhar precisarei pedir ajuda ainda,
participam e cada um
juntos, mas, com calma, eles mas os alunos resolvem
contribui com o seu jeito de
concordaram. Houve uma interação melhor as dúvidas quando
ser e pensar.
com o todo. estão trabalhando em
conjunto e a gente acaba
aprendendo.
Algumas ferramentas que eu
Percebi a importância de se No início houve resistência, mas
não conhecia e precisei da
trabalhar em grupo para depois observei o quanto eles
ajuda da PP e dos alunos.
planejar, diferente do ficaram solidários um com o outro.
PB Ainda tenho dificuldades e
planejamento onde apenas Houve também uma melhora muito
sinto inseguranças com
estamos juntas no mesmo significativa em relação ao respeito
algumas ferramentas, da
espaço. que devemos ter com o próximo.
planilha por exemplo.
Depois dessa atividade da Após um tempo de interação, eles Tive dificuldades em
PC
formação, comecei a ver começaram a ouvir mais as opiniões encontrar e abrir os arquivos
220
mais o conteúdo que as sem interferir na fala do outro, que eles usaram na atividade.
outras professoras estão diferente do que geralmente Mas, agora, me sinto bem
trabalhando com a turma. acontece. mais segura para usar o
laptop com os alunos, porque
atualizei os saberes.
Eles ainda estão bem intimidados,
Hoje, ao planejar minhas pois não é da nossa prática as
aulas, eu tento inserir o que atividades coletivas e ouvi-los, mas
Tive poucas dúvidas, mas os
PD tenho aprendido sobre a T.O, aos poucos eles têm participado
alunos resolveram.
elaborar problemas e mais ativamente, tanto na atividade
trabalhos em grupo etc. da formação como nas que tento
realizar com eles.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
decisão de datas e horários dos encontros presenciais, a fim de que se sintam parte do
processo e responsáveis por ele.
As professoras afirmaram que, na segunda etapa da formação, faltaram ser
materializados saberes referentes à estrutura da atividade AEA (PA), à definição mais
elaborada dos processos de objetivação e subjetivação (PA, PD), à elaboração do
planejamento a partir de problemas (PC) e à avaliação da aprendizagem (PB e PD) - (Quadro
80). Essas respostas indicaram que esses temas deveriam ser retomados e aprofundados na
etapa de emancipação coletiva, no contexto da elaboração de planejamentos de atividades
AEA e discussões do desenvolvimento das atividades com os alunos. A retomada desses
temas possibilita às professoras identificarem os processos de subjetivação e objetivação e a
refletirem sobre a avaliação na concepção da TO.
De maneira geral, a análise das respostas das professoras às questões do opinário
evidenciaram que, até o final da segunda etapa da formação, elas refletiram sobre as suas
práticas e algumas mudanças ocorreram. Mudanças, sobretudo, no reconhecimento da
importância de considerar-se a dimensão do ser, além da dimensão do saber, nas ações que
desenvolvem com os alunos. As respostas evidenciaram também que elas trabalharam em
conjunto, com base na ética comunitária, encontrando-se com formas de agir e refletir
culturalmente constituídas e produzindo novas subjetividades. O labor conjunto das
professoras levou-as à superação do individualismo e ao uso dos artefatos tecnológicos
digitais com mais segurança. A experiência de planejar e desenvolver uma atividade AEA com
os alunos facilitou a compreensão das professoras sobre a metodologia proposta na formação
e provocou uma mudança na visão do papel do aluno, que, segundo elas, trabalhou junto com
elas nessa experiência.
Tais mudanças somente foram possíveis porque a formação não somente propôs o uso
da metodologia do trabalho conjunto com os alunos, mas também porque as atividades AEA
formativas foram estruturadas a partir dela. Verificou-se que, ao final da segunda etapa da
formação (etapa de labor conjunto), as professoras ainda estavam em processo de formação.
Houve indícios da superação do perfil de professor especialista técnico para o de um professor
intelectual crítico, a fim de emancipar-se das suas práticas tradicionais, baseadas na
transmissão de informações e centradas no professor, que, no início da formação, foram
classificadas como alienantes. Dessa forma, na terceira etapa da formação (emancipação
coletiva), foi necessário retomar os conceitos da TO e aprofundar o planejamento coletivo de
atividades AEA. Foi necessário também estimular a continuidade das reflexões críticas acerca
do modelo educacional vigente e da relação da prática docente com o modelo econômico,
224
fazer e no produto. Esse pensamento está de acordo com a definição de Radford (2016a) a
respeito de alienação, discutida nos estudos da formação, de que, no modelo de educação
transmissivo, o sujeito é alienado do seu trabalho e do produto de seu trabalho, visto que os
objetos que ele produz não são suas expressões. Esse relato da fala da professora PF'
evidencia uma reflexão crítica e o reconhecimento da alienação presente na sua prática
pedagógica, no trabalho realizado e no produto do seu trabalho. Reconhecer esse fato implica
reconhecer que ela apenas executa as ações planejadas por outras pessoas e que não tem o
poder de decidir e planejar sobre as suas ações, o que, de acordo com Contreras (2002), é uma
característica do processo de proletarização do professor.
Nesse contexto, pode-se associar esse processo descrito por Contreras (2002) à
alienação expressa por Radford (2016a), concluindo que o professor especialista técnico é um
professor alienado de sua prática. Conclui-se também que uma formação continuada e
permanente baseada no labor conjunto pode levar à superação dessa condição e à formação de
um professor intelectual crítico. Conforme Giroux (1987 apud Smyth, 1987, p.21), “os
professores podem não ser conscientes da natureza da sua própria alienação […]”. Esta é
precisamente a ideia da teoria crítica: ajudar os professores a desenvolver uma apreciação
crítica da situação na qual se encontram.
De maneira geral, os fatos relatados expressam a ocorrência de mudanças na forma de
agir e pensar das professoras, o que refletiu nas suas práticas pedagógicas, na relação com os
demais professores e alunos e uma postura crítica diante do sistema de ensino. Tais alterações
sugerem que, durante a formação, as professoras encontraram o saber que foram colocados
em movimento pelo labor conjunto (processos de objetivação), e também estão constituindo-
se e transformando-se em sujeitos críticos por meio dos processos de subjetivação
(RADFORD, 2017a; 2017c; 2018). Esses fatos, ademais, indicam indícios da emancipação
das práticas pedagógicas caracterizadas como alienantes por meio do labor conjunto realizado
nas atividades concretas da formação, que permitiram uma reflexão crítica das professoras.
Essa emancipação, de acordo com Radford (2012), não ocorre em um esforço individual, mas
por meio de um projeto social no mundo concreto, onde seres históricos e políticos trabalham
juntos, com a intenção de tornar o mundo um lugar melhor para todos.
No próximo capítulo, serão analisados e discutidos os resultados da etapa de
emancipação coletiva, que compreendeu a terceira etapa da formação, sendo apresentado um
relato sobre a produção de novas subjetividades na visão da formadora-pesquisadora.
231
professores não foram contínuas. Nesse período, foram realizadas reuniões em que foi
discutida a prática pedagógica das professoras e observadas mudanças a partir dos temas
trabalhados nas cinco atividades da etapa de labor conjunto.
As reuniões foram planejadas a partir dos resultados da etapa de labor conjunto e das
discussões das professoras durante a etapa de emancipação coletiva, de acordo com a
metodologia da pesquisa-formação (VOSGERAU, 2012), conforme síntese apresentada na
Figura 24.
20
Apresentação de slides elaborada pelas autoras. Disponível em:
https://drive.google.com/file/d/1Jsh5HELXLOJHKDAHX1XInte6xHk12hTC/view?usp=sharing
233
duas reuniões com cada um dos três grupos de trabalho, ocorridas na escola em agosto e
setembro/2019. Para finalizar a formação, em novembro/2019, efetivou-se uma reunião,
chamada de socialização final, para apresentação e discussão dos resultados da aplicação da
AEA planejada.
alunos e sobre o uso dos artefatos tecnológicos digitais, com ênfase no laptop educacional.
Esses relatos foram baseados nas atividades (labor conjunto) desenvolvidas nas turmas
em que as professoras estavam alocadas no ano letivo de 2019. Essas turmas eram diferentes
das turmas em 2018 (Tabela 3), em que elas desenvolveram a primeira atividade AEA,
planejada durante a etapa de labor conjunto da formação, nos módulos 2 e 3. Vale destacar
que as práticas relatadas pelos professores no 1º semestre de 2019 foram registradas nos
planejamentos postados no Sistema de Planejamento Online da SED e feitas de forma
espontânea, pois não estavam vinculadas a uma exigência da formação.
Tabela 3 - Lotação das professoras nos anos letivos de 2018 e 2019 e regime de trabalho.
Ano em que atuou como professora:
ID Regime de Trabalho
2018 2019
Convocada/40h
PA 4° ano 1° ao 5° ano
(Rede Estadual e Municipal)
Convocada/40h
PB 1° ano 3º ano
(Rede Estadual e Municipal)
Convocada/20h
PC 1° ao 5° ano 4º ano
(Rede Estadual)
PD 1° ao 4° ano 1° ao 5° ano (licença gestante) Concursada/40h (Rede Estadual e Municipal)
PE 4° ano 2º ano Convocada/20h
PF' 4° ano 5º ano Convocada/40h (Rede Estadual e Municipal)
4° ano (apoio) e 2° ano (apoio) e
PG Convocada/40h
Sala de recursos Sala de recursos
1° ano (apoio) 2° ano (apoio)
PH Convocada/40h
6° ano (apoio) 6° ano (apoio)
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Na Tabela 3, pode ser observada uma mudança significativa na lotação das professoras
em 2019, visto que nenhuma pedagoga permaneceu na mesma turma em que estava alocada
em 2018. A professora PA passou a ministrar aulas de Ciências nas turmas do 1º ao 5º ano do
E.F e a professora PD continuou lotada na disciplina de Educação Física nessas turmas,
porém estava em licença maternidade. Esse fato corrobora com a ideia de que, mesmo
havendo uma professora específica para a disciplina de Ciências, foi importante desenvolver a
235
estrutura da TO, é.. com aquela estrutura de objeto, meta, tarefas... e já pensando nessa questão
coletiva da prevenção da dengue. E eles se envolvem bastante.
PE: Aí esse ano foco mais em questões-problemas, até problemas, pensando nessa atualização do
saber, o conteúdo, e também já organizo para trabalhar em conjunto. E tem dado certo, eles vão se
4.s
acostumando, uns são muito resistentes, não gostam e ponto, mas outros percebem que aprendem
melhor e participam mais.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
são indícios de uma mudança na consciência, que ocorreu por meio da produção de
subjetividades no labor conjunto das professoras (RADFORD, 2019; 2020), registrados na
segunda etapa da formação, nos módulos 4 e 5. Nesse cenário formativo, as professoras
tomaram consciência do caráter alienante das atividades que planejavam. De acordo com
Freire (1979), é por meio dessa tomada de consciência da realidade que se desenvolve a
consciência crítica e a possibilidade de atuar para transformá-la.
De maneira geral, os relatos das professoras evidenciam que elas utilizaram a
metodologia de atividades AEA proposta pela TO após o término da segunda etapa da
formação (etapa de labor conjunto). Quando se comparam essas práticas com aquelas
relatadas no início da formação, na etapa diagnóstica, observa-se uma mudança expressiva
relacionada à inclusão do trabalho em grupo na sala de aula, na forma de labor conjunto, bem
como a atenção à dimensão coletiva e social da atividade. Tal comparação sugere que essas
professoras estão em um processo de superação do racionalismo técnico presente nas suas
práticas antes da formação. Além disso, sugere novas formas de reflexões e ações dessas
professoras, que podem vincular-se à emancipação coletiva das práticas alienantes
(RADFORD, 2012) e ao desenvolvimento de um professor intelectual crítico (CONTRERAS,
2002).
Durante as reuniões, as professoras também falaram sobre o uso dos artefatos
tecnológicos digitais (Quadro 74).
Quadro 74 - Relatos das professoras sobre o uso dos artefatos tecnológicos digitais no 1º bimestre/2019.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
PE: O laptop, eu não estou usando desde o ano passado e, agora, sem a PP, fica mais difícil, porque
8.s demora muito até organizar a sala, ligar tudo. A bateria não carrega mais e trava muito. A gente está
usando os computadores daqui.
PA: E tem o problema da internet, aquela internet que tinha no começo não chega mais na sala. Aí
tem que ficar com todos os laptops nas réguas e sem internet, não compensa, melhor vir aqui na STE,
9.s
porque tinha a vantagem de levar para frente, para trás, tirar foto, gravar, mas depois que ficaram
velhos não compensa usar.
PC: Até porque a gente sempre via a tecnologia, nossa, como o mediador do conhecimento. Nos
10.s cursos, a gente até estudava que a aprendizagem tem a ver com a metodologia também, né PP? Mas o
pl (planejamento) era sempre pensando lá na ferramenta (risos).
PA: Agora, eu penso diferente, o recurso, que é o artefato, né? Ele ajuda a fazer a tarefa, o que o meu
11.s
aluno tem que fazer, então uso o que precisa para fazer a tarefa.
PH: Antes a gente tinha medo, eu confesso... eu achava que tinha que trabalhar as ferramentas
(risos). Então, vinha o curso ou a oficina e a gente planejava para trabalhar aquele recurso. Ah... se
12.s
era Google Drive, aí escolhia a ferramenta e, depois, uma atividade, tarefa né? Que encaixasse com
ele.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
internet sem fio não chegava às salas de aula (enunciados 8.s e 9.s). Esses problemas
comprometem a mobilidade do laptop educacional, tida como a grande promessa de inovação
no âmbito do PROUCA (BRASIL, 2010). A não previsão de reposição dos equipamentos, no
Programa, reflete a descontinuidade das políticas públicas na educação brasileira (CANTO et.
al., 2018).
As professoras também mencionaram a extinção da função de PROGETEC, que era
exercida pela professora formadora presencial (PP), justificada pela necessidade de reduzir
gastos pelo Estado, como um dos fatores que impediram o uso dos laptops educacionais nas
atividades com os alunos. A PROGETEC tinha como principal função apoiar os professores
no uso dos recursos tecnológicos digitais disponíveis na escola. A previsão da dificuldade no
uso dessas tecnologias pelos professores da Rede Estadual resultou na contratação dos
Técnicos de Suporte em Tecnologias (TST), com o objetivo de apoiar os professores no que se
refere aos saberes técnicos (SED/MS, 2019b).
O apoio para o uso pedagógico dessas tecnologias, que antes era dividido com o
PROGETEC, ficou sob responsabilidade exclusiva da equipe de coordenação pedagógica das
escolas. Esse contexto extra verbal exemplifica o impacto das decisões de ordem estrutural
administrativa no uso de tecnologias educacionais digitais integradas à novas metodologias de
ensino e aprendizagem. Esse contexto leva à reflexão sobre a importância de incluir não
somente os professores, mas também os coordenadores pedagógicos nas formações
continuadas e permanentes, como ocorreu nessa pesquisa-formação. Tal importância é
enfatizada pelo fato de que as duas coordenadoras pedagógicas da escola desistiram da
participação ainda na etapa diagnóstica (primeira etapa da formação).
Nos enunciados 10.s a 12.s (Quadro 74), as professoras falaram sobre o uso e papel
dos artefatos tecnológicos digitais. A fala da professora PC (enunciado 10.s) sugere uma
mudança na visão que a professora tinha desse artefato, que, antes da formação, era concebido
como mediador do conhecimento, conforme evidenciaram as análises da etapa diagnóstica no
capítulo 2. Nessas falas, pode ser observado também a compreensão da professora PH de que
o artefato “ajuda a fazer a tarefa” (enunciado 11.s). Neste sentido, o planejamento deve ser
elaborado em função do objeto e do projeto didático do professor, mas não do artefato. Essa
compreensão está de acordo com a TO, em que os recursos tecnológicos são concebidos como
artefatos que fazem parte da atividade realizada pelos alunos (RADFORD, 2020; 2018c).
A fala da professora PH (enunciado 12.s), ao mencionar que perdeu o medo, referindo-
se ao uso do artefato tecnológico, indica que a formação contribuiu para esse aspecto
subjetivo da superação desse medo. A metodologia utilizada na formação, baseada no diálogo,
240
não é mais visto como aquele que possui o saber que é transmitido aos alunos, em uma
relação de poder que reproduz as relações da sociedade capitalista (RADFORD, 2016a;
2020), mas como aquele que, ao trabalhar em conjunto com os alunos, em uma atividade
mediadora, encontra-se com o saber constituído historicamente e culturalmente (RADFORD,
2017a).
Durante a discussão sobre atividade de acordo com a TO, as professoras PC e PA
falaram sobre o papel mediador da atividade, em que ocorrem os processos de objetivação e
subjetivação, conforme pode ser observado nos enunciados 16.s e 17.s (Quadro 75). A PA
associou esses processos à aprendizagem (enunciado 17.s). Novamente, esses enunciados
sugerem uma mudança na visão das professoras, que, no início da formação, atribuíam aos
artefatos tecnológicos digitais (laptop e computador) o papel de mediador, conforme análise
dos dados da etapa diagnóstica (Capítulo 2). Ao afirmarem que a aprendizagem envolve não
somente o encontro com o saber científico (dimensão do saber), mas também a dimensão do
ser, o vir a ser, (RADFORD, 2006; 2019), elas parecem superar a concepção que tinham sobre
a aprendizagem. Anteriormente, para essas professoras, a aprendizagem estava relacionada
apenas ao encontro com saberes científicos (a atualização), conforme evidenciaram as
análises iniciais da atividade 2, que foi realizada no módulo 2 da formação (Capítulo 3).
A professora PH, ao referir (enunciado 18.s; Quadro 76) que o trabalho conjunto
não envolve apenas a formação de grupos para cumprir uma tarefa proposta pelo professor,
parece evidenciar a compreensão desse conceito.
corroborou com a ideia da PH, quando afirmou que “[...]sempre trabalho em grupo [...] mas aí
eu percebi que era individualista, não tinha o trabalho conjunto[...]” (enunciado 19.s; Quadro
76). Essas manifestações são indícios da tomada de consciência das professoras sobre suas
práticas alienantes (RADFORD, 2020), baseadas no racionalismo técnico e que enfatizam a
aprendizagem do saber científico e o individualismo.
As falas das professoras evidenciaram uma concepção de atividade mais próxima
da TO, que define a atividade como labor conjunto (RADFORD, 2020). Essa definição não é
a partir de uma concepção funcionalista ou pragmática em que a atividade é concebida
simplesmente como uma cooperação para alcançar algo, um meio simples, mas, como
mencionado anteriormente, “[...] um sistema em movimento [...] uma fonte de vida; um
trabalho conjunto em que atuamos, pensamos e sentimos juntos” (RADFORD, 2017c, p. 156,
tradução nossa).
Essa concepção de trabalho conjunto próxima às ideias da TO pode ser observada
também quando a PC falava sobre a formação e a sua superação do medo de errar (enunciado
20.s; Quadro 76). Neste sentido, o labor conjunto com as colegas professoras e formadora
possibilitou à PC expressar e expor sua opinião sem medo de errar, apoiada na solidariedade e
divisão da responsabilidade do erro com o grupo. Essa forma de agir e interagir dessa
professora foi possível graças à atividade (labor conjunto).
A professora PE não acreditava na TO devido sua prática baseada no individualismo e
no racionalismo técnico (enunciado 21.s; Quadro 76). Porém, a formação propiciou à
professora uma reflexão crítica, levando-a a um processo de superação dessa visão e,
consequentemente, dessa prática pedagógica. Por meio das atividades formativas, na interação
com os alunos, colegas professoras e formadora, ela passou a visualizar na atividade (labor
conjunto) proposta pela TO uma possibilidade de desenvolver uma nova forma de trabalho na
sala de aula.
De acordo com os enunciados 22.s a 24.s (Quadro 77), as professoras PE, PA e PF'
passaram a refletir sobre a forma que elas atuavam, o que sugere uma tomada de consciência
sobre a forma alienante de ensino presente nas suas práticas pedagógicas e nas suas salas de
aula. Tal percepção pode ser associada à tomada de consciência das professoras sobre sua
realidade e constitui-se, conforme Freire (1979), um elemento importante para o
desenvolvimento da consciência crítica, ou seja, para a emancipação coletiva das práticas
pedagógicas alienantes.
243
Quando questionadas sobre como a TO pode ser uma alternativa para superar essa
alienação que elas relataram perceber na prática pedagógica, a professora PA mencionou a
proposição de tarefas, a dimensão coletiva e o trabalhar em conjunto (enunciado 25.s; Quadro
77). Compartilhando essa mesma ideia, a professora PE afirmou que tem esperança na TO
para reverter a situação, referindo-se à reflexão que “[...] o jeito que a gente tá fazendo não tá
dando certo” (enunciado 26.s; Quadro 77).
Essas falas sugerem que as professoras passaram a compreender que a proposição de
atividades AEA é uma alternativa às práticas individualistas e tecnicistas desenvolvidas na
escola. Tais atividades possibilitam ao aluno encontrar-se com o saber, por meio de novas
formas de cooperação humana, baseadas na coletividade, na solidariedade e no respeito. É
também uma forma de promover um espaço de debates e reflexões críticas (RADFORD,
2016a), que poderão levá-los à superação de tais práticas.
outra para orientar os grupos sobre a elaboração do relato da atividade (labor conjunto) a ser
apresentado na reunião de socialização final. A tarefa foi planejada em conjunto somente
pelas professoras, sem a presença da professora-formadora. Essa proposta foi implementada a
fim de verificar mudanças na prática pedagógica das professoras. Elas agruparam-se de
acordo com o conteúdo a ser abordado no planejamento e as turmas em comum onde
ministravam aulas.
A seguir, apresenta-se a análise de dois planejamentos elaborados respectivamente
pelos grupos A e B, sintetizados nos Quadros 78 e 79. Os planejamentos completos podem ser
consultados nos Anexos H e I.
- A partir da leitura do texto “Qual a diferença da água poluída e da água contaminada” que foi
realizada em sala utilizando o computador da sala de tecnologias, respondam as questões:
3.1 - Qual a diferença de água poluída e água contaminada?
3.2 - Quais consequências da poluição da água vocês observam no seu dia a dia?
Justifique sua resposta.
3.3 - Quais as doenças causadas pela água?
3.4 - O que você pode fazer para evitar as doenças causadas pela poluição da água?
Registrem as respostas em cartões que serão fixadas no cartaz.
Segundo Momento de socialização
Socializar as informações sobre as questões com os todos os grupos e realizar o debate.
Fonte: Organizada pelas autoras a partir do planejamento elaborado pelas professoras do grupo A.
pela água poluída e contaminada e as suas formas de prevenção” (Quadro 78). Foi elaborado
para ser desenvolvido com os alunos do 3º, 4º e 5º anos do E.F, turmas das professoras PB, PC
e PF', respectivamente, em que a professora PA ministra a disciplina de Ciências. Embora esse
tema faça parte do referencial curricular do 4º ano do E.F (SED/MS, 2012), as professoras
optaram por trabalhar também com as turmas do 4º e do 5º ano, pois o conteúdo sobre
poluição e contaminação da água fez parte de um projeto de ensino e aprendizagem
desenvolvido nos anos iniciais do Ensino Fundamental em 2019.
Espera-se que os educandos cheguem à seguinte conclusão: Têm o corpo coberto de penas;
possuem bico; botam ovos; não possuem dentes; possuem ossos. Caso isso não ocorra, poderão
ser apresentadas novas imagens de aves e feitas novamente as perguntas.
Socialização: Cada grupo apresentará as suas respostas, relacionando as aves às suas principais
características.
Fonte: Organizada pelas autoras a partir do planejamento elaborado pelos professores do grupo B.
realidade dos alunos. Essa preocupação pode ser verificada nas questões sobre as
consequências da poluição da água que os alunos observam no seu cotidiano e como eles
poderiam evitar as doenças relacionadas a essa poluição (Quadro 78). A partir da ideia de que
a “dimensão social é parte inteira da aprendizagem”, é “a dimensão da transformação dos
estudantes e professores, é um fim em si” (RADFORD, 2020, p. 31, tradução nossa),
considerá-la no planejamento da tarefa é um aspecto importante. Sobretudo, quando se propõe
um ensino de Ciências voltado para a produção de novas subjetividades que resultem na
mudança na consciência de professores e alunos propostas no planejamento em formas de
ação baseadas em posturas críticas e éticas.
Os professores também consideraram o saber atual dos alunos quando planejaram
questões em que solicitam que eles respondam “contando suas experiências” ao falar sobre a
importância da água para os seres vivos e se ela pode ser prejudicial em alguma situação
(Quadro 78). Também quando perguntam se os alunos conhecem algumas das aves ilustradas
nas imagens apresentadas (Quadro 79). De acordo com Radford (2018b), considerar o que os
alunos já sabem na configuração da tarefa pode garantir o início da reflexão e do diálogo em
torno das questões propostas pelo professor, mesmo que os alunos ainda não possam resolver
todos os problemas que a constituem.
Outro aspecto verificado nos planejamentos sintetizados (Quadros 78 e 79) é a
proposta do uso de artefatos pelos alunos, como o material concreto (cartazes, textos
impressos, lápis de cor) e digital (imagens, editor de texto, vídeo). O uso desses artefatos não
teve papel central nas atividades planejadas pelos professores, mas eles foram pensados para
auxiliar no desenvolvimento das ações propostas na tarefa. Conformo propõe Radford, os
artefatos fazem parte da atividade e, “sendo que o pensamento e a atividade são considerados
aqui como entrelaçados [...] também são considerados como parte do pensamento. São parte
da textura material do pensamento dos indivíduos” (RADFORD, 2020, p. 24, tradução nossa).
De maneira geral, as atividades AEA propostas pelos professores estão de acordo com
a estrutura proposta pela TO e consideram elementos importantes relacionados ao desenho da
atividade, que, de acordo com Radford (2017b; 2018b), são: considerar o saber atual dos
alunos; envolver o uso de artefatos; propor problemas organizados de acordo com uma
unidade conceitual e contextual, com uma complexidade crescente e organizar a aula a fim de
propiciar um espaço de reflexão crítica e interação. A presença de tais elementos no
planejamento dos professores não foi constatada na prática pedagógica investigada na etapa
diagnóstica da pesquisa-formação (Capítulo 2) e no primeiro planejamento de acordo com a
TO realizado no módulo 2 pelas professoras PA, PB e PC (Capítulo 3). Esse fato mostra as
249
evidências de mudanças na forma de planejar dessas professoras. Tais mudanças sugerem uma
nova compreensão delas acerca da necessidade de considerar que o encontro com o saber
científico deve ser propiciado pelos problemas planejados e pelas formas de colaboração
humana que se estabelecem na sala de aula (RADFORD, 2020; 2017b).
Nessa perspectiva, ressalta-se a importância de propor planejamentos coletivos no
contexto das formações continuadas e permanentes de professores que proporcionem
momentos de reflexões acerca da possibilidade do labor conjunto não somente nas salas de
aula, mas nos momentos de planejamento das atividades AEA. Tais momentos poderão
propiciar a discussão de formas de abordar conteúdos de Ciências a partir de uma perspectiva
dialógica, na dimensão social e ética do trabalho docente. O planejamento coletivo poderá
também fomentar atividades AEA multidisciplinares, como observado no planejamento do
grupo B.
É importante também ressaltar que as modificações observadas nos planejamentos
evidenciam mudanças na consciência das professoras, quando comparados aos planejamentos
elaborados no início da formação (Capítulo 2 e 3), nos quais elas enfatizam o saber em
detrimento do ser e de ações coletivas. Essas mudanças podem ser atribuídas às reflexões no
contexto das atividades realizadas na etapa de labor conjunto da formação, em que foram
evidenciados processos de objetivação e subjetivação (módulos 2 a 5; Capítulo 3 a 5). Essas
atividades possibilitaram um espaço de debates em que as professoras puderam expor e
compartilhar suas angústias, dúvidas, sofrimentos, necessidades e desejos.
No contexto dessas atividades formativas, emergiram posicionamentos críticos das
professoras quanto à forma de atuação no planejamento de atividades com ênfase no saber e
no individualismo. As críticas emergiram também diante das exigências impostas a elas em
relação ao seu fazer pedagógico e à sua realidade. Essas reflexões críticas permitiram-lhes
reconhecer a alienação presente nas suas práticas pedagógicas. Além disso, essas alterações
indicam indícios da superação do racionalismo técnico presente no planejamento e da
emancipação coletiva de tais práticas. Tais mudanças contribuem para o desenvolvimento de
um professor intelectual crítico que pauta seu planejamento na dimensão coletiva e social do
ensino de Ciências.
Na sequência, são apresentados os relatos dos professores sobre a atividade
desenvolvida com os alunos a partir dos planejamentos analisados nessa seção.
250
sigla sf (socialização final) a fim de diferenciar dos demais enunciados apresentados neste
trabalho em outros momentos. Em razão de não serem sequenciais, não compreendem
episódios relevantes e são trazidos de acordo com o tema discutido na análise. Os alunos
mencionados pelas professoras nos seus relatos serão nomeados pela letra A, seguido do
número.
Durante a apresentação do relato do grupo B (PE, PF', PG e PH) sobre a atividade
realizada com os alunos, que tratou da segmentação de palavras e frases, aglutinação de
palavras, tipos de aves e suas características, as professoras PI e PC criticaram o texto em que
o grupo registrou o que considerou um momento de subjetivação durante a atividade.
Segundo as professoras do grupo B, “Subjetivação: Quando os alunos resolveram as
atividades propostas e registraram na lousa e no gráfico as suas respostas” (Grupo B; Anexo K
- slide 17). As críticas feitas pelas professores PI e PC e as respostas dadas a elas pela
professora PE estão registradas nos enunciados 1.sf a 5.sf, no Quadro 80.
Quadro 80 - Reflexões das professoras sobre processos de objetivação e subjetivação no contexto da atividade.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
1.sf PI: Você registrou ali a subjetivação como sendo a objetivação, mas depois você falou.
2.sf PI: Era a objetivação, a subjetivação, no caso, era a atualização do ser né?
PC: Alí, alí ó, essa subjetivação é a objetivação e, depois desse slide, passa o outro PE, quando você
3.sf
vai explicar suas respostas, na outra, é a subjetivação, viu. Esse aí é subjetivação.
PC: Eu colocaria que a subjetivação é quando eles trabalharam em conjunto, quando eles trabalharam
ali em grupo, depois se eles (...).
4.sf
A PC une as pontas dos dedos da mão direita quando diz “trabalharam em conjunto” e aproxima as
mãos abertas quando diz “ali em grupo”.
PE: No meu pensamento não. Porque quando eu coloquei assim, que quando os alunos resolveram as
atividades propostas, se eles resolveram, eles resolveram em conjunto, porque visto que eles estavam
em um grupo, entendeu? Talvez faltou essa palavra para vocês entenderem melhor ...., então quando
5.sf os alunos resolveram as atividades propostas, é... eles chegaram naquele consenso de ter realizado a
atividade, onde um é... falo pro outro, não, não é aí, aí tá errado, faltou mais uma letra dessa palavra,
aqui sim que vai ser a separação correta, que estão tudo aglutinado. Então, faltou a palavra, então em
conjunto né, respeitando a opinião do outro, né.
Fonte: Elaborada pelas autoras.
Quadro 81 - Reflexões das professoras sobre processos de objetivação e subjetivação no contexto da atividade.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
PA: Relatamos a A1, né, falando “somos relaxados, sabemos das atitudes corretas, mas fazemos tudo
errado” e ela chegou e falou pra nós no grande grupo, olha hoje nós tomamos uma atitude, nós
6.sf
sabemos que temos que ferver a água, cuidar do nosso asseio, tanto se a gente cuidava como o vizinho
também, então ela falava.
253
PA: E do A2, ele disse assim “eu aprendi que temos que ter essa atitude pra ter saúde [para mim e
para os outros], porque se eu tiver um filtro na minha casa, não vai ser só eu que vou beber água de
lá”.
PC: Na verdade, essa objetivação também tem a subjetivação quando eles trabalharam em grupo,
discutiram em grupo, fizeram, também tem a subjetivação, não é.
formação, a sua dimensão coletiva. Essa mudança aparece na manifestação das professoras,
ao afirmarem que a aprendizagem não tem como foco apenas o saber científico (dimensão do
saber), mas também a formação e configuração do sujeito (dimensão do ser) - (RADFORD,
2017a; 2020).
Tal forma de pensar evidencia que as professoras passaram a considerar, como indício
de aprendizagem, o posicionamento crítico dos alunos diante do conteúdo de Ciências e suas
reflexões em uma perspectiva coletiva, voltada para uma dimensão social do conteúdo. Nessa
visão das professoras, está implícita uma mudança também na concepção do que é o saber
científico, materializada na implementação do planejamento da atividade AEA, visto como
uma potencialidade de reflexão e ação (RADFORD, 2017a). Pode ser observada, ademais,
uma nova forma de trabalho na sala de aula, concebida como um local de debates,
responsabilidade, solidariedade, cuidado e consciência crítica (RADFORD, 2016a).
Ainda durante o relato do grupo A, assim como as professoras PA e PF', a professora
PC relaciona os processos de subjetivação ao trabalho conjunto dos alunos (enunciado 8.sf;
Quadro 81). De acordo com Radford (2017c; 2020), é por meio do labor conjunto, do ouvir a
opinião do outro com respeito e solidariedade, que as novas subjetividades são produzidas e
os sujeitos tomam consciência das formas de pensamento e ações culturalmente constituídas.
Essa mudança identificada na concepção de aprendizagem, registrada no discurso das
professoras (6.sf a 8.sf; Quadro 81) e na prática na atividade desenvolvida com os alunos
salienta os indícios de mudança na consciência após as atividades formativas realizadas na
etapa de labor conjunto da formação. Essa alteração na consciência pode ser considerada um
elemento essencial para que elas proponham e desenvolvam atividades AEA nas aulas de
Ciências, a partir de formas de cooperação humana que podem levar à superação do
individualismo de alunos e professores e da alienação presente na escola (RADFORD, 2016a;
2020).
Durante a apresentação do grupo B, foram registradas reflexões das professoras sobre
o individualismo verificado nas interações dos alunos e o labor conjunto (Quadro 82).
Quadro 82 - Reflexões das professoras sobre o individualismo observado nas interações dos alunos e o labor
conjunto.
Enun-
Professora/Transcrição
ciado
PF': Mas você falou, eles resolveram a atividade em grupo, então foi em conjunto. E aí eu
09.sf pergunto, sempre é assim, sempre que teus alunos estão em grupo, a gente poderia concluir que
houve trabalho conjunto?
PE: Não... nem sempre eles aceitam, né? É a opinião um do outro, né? Até, lá na hora, a gente teve
10.sf que fazer intervenções, porque aquele que já tem uma leitura, já tá mais apropriado da leitura, ele,
igual o A3 mesmo, pode ver que eu até coloquei uma foto dele alí, ele já quis ele mesmo pegar e já
255
ir separando tudo porque ele já sabia, você pode ver que ele leu lá na lousa a frase completa, então
ele já sabia onde colocar, fazer o risquinho ali, a gente teve que intervir que não era só ele, que
tinha o grupo pra responder junto, aí eu peguei a folhinha dele pra passar para o outro colega,
vamos todo mundo tentar. Mas aí, depois, quem visualizou pra ir depois pro computador fazer a
segmentação correta, foi ele.
PH: Eu falo assim, calma A4, vocês têm que entrar num consenso, vocês têm que ouvir seu colega,
deixa seu colega falar também, né... pra vocês entra num é... se uni. E, nós vimos assim que é nítido
né, eles estão acostumados a trabalhar em grupo, mas em conjunto, eles não estão. Então, há uma
briga entre eles, porque você esperar o outro, respeitar o que o outro está pensando, o que vai falar,
porque eles tomam pra si, o que eu estou falando é certo. Então, na hora assim, ficamos assim... eu
olhava para a PI e falava assim, PI do céu... como que pode, né? E eles vão crescendo né, se não... é
de costume né, é uma cultura né, na verdade, né.
PF': Não era porque o A5 estava digitando que a A6 não participava, até na forma de correção, aí
12.sf
ela falou assim é... tem que por vírgula pra não ficar sem sentido o texto.
Fonte: Elaborado pelas autoras.
professores (RADFORD, 2020) foi muito importante para que as professoras reconhecessem
que a atividade AEA deve ser planejada de forma a propiciar a interação dos alunos entre si e
deles com o professor a partir de formas de cooperação humana baseadas no compromisso,
respeito e solidariedade (RADFORD, 2017c; 2020).
Esse entendimento fez-se na tomada de consciência das professoras sobre a realidade
do trabalho realizado por elas e seus alunos em sala de aula. A tomada de consciência ocorreu
na implementação do planejamento e nas reflexões conjuntas na reunião de socialização da
experiência, em que se observam as discussões e posicionamentos das professoras frente as
suas formas de atuação e críticas, após os relatos. Tais posicionamentos revelam mudanças
em relação às suas práticas, pautadas no individualismo e no racionalismo técnico, conforme
evidenciou-se na análise da etapa diagnóstica da formação (Capítulo 2). É a partir dessa
tomada de consciência da realidade que pode desenvolver-se a consciência crítica (FREIRE,
1979), que poderá levar à emancipação dessa prática alienante.
A partir dessa ideia, pode-se dizer que, por meio da formação baseada na TO e do labor
conjunto na formação, parece ter ocorrido a tomada de consciência das professoras.
(RADFORD, 2020). A tomada de consciência, portanto, propiciou uma nova visão acerca do
trabalho em grupo que realizavam com seus alunos e uma nova forma de agir junto a eles,
considerando o desenvolvimento de ações em que prevalecem o cuidado, o respeito e a
solidariedade.
Durante o relato do grupo A, a professora PF' levantou uma questão importante sobre a
organização do trabalho conjunto nos grupos dos alunos, ilustrada na Figura 26. Segundo ela,
“não era porque o A4 estava digitando que a A3 não participava, até na forma de correção, aí
ela (aluna) falou assim é... tem que por vírgula pra não ficar sem sentido o texto” (enunciado
12.sf; Quadro 82). Essa observação da PF' evidencia a sua compreensão do significado de
labor conjunto, em que a divisão do trabalho entre os alunos não significou que eles não
estivessem trabalhando em conjunto. Embora o aluno A4 estivesse envolvido materialmente
na digitação, a aluna A3 também estava envolvida na ação, trabalhando juntos para atingir um
objetivo comum, relacionado ao objetivo da tarefa.
257
Nos enunciados 13.sf e 14.sf (Quadro 83), ainda quando discutiam o individualismo
observado nas ações dos alunos, as professoras PB e PC observaram mudanças na interação
dos alunos. Essas alterações foram constatadas por elas durante a atividade desenvolvida
nessa aula, quando comparada às atividades com os alunos no ano de 2018, em que alguns
não queriam trabalhar de forma conjunta.
professoras.
Neste sentido, durante a formação, foram propostas atividades AEA desenvolvidas por
meio do labor conjunto das professoras e formadora nos encontros presenciais, reuniões,
planejamentos coletivos e nas aulas de Ciências. Na dinâmica da pesquisa-formação
(VOSGERAU, 2012), em que os resultados determinaram o planejamento das ações
formativas, essas atividades visaram atender as necessidades formativas das professoras e
promoveram reflexões críticas acerca da sua prática pedagógica a partir dos pressupostos da
TO.
No Quadro 84, podem ser observadas as reflexões das professoras sobre o
planejamento da atividade AEA e avaliação da aprendizagem.
As análises dos discursos das professoras e das suas práticas, por meio do
planejamento e desenvolvimento da atividade AEA com os alunos, sugerem mudanças quando
comparadas com a prática registrada na etapa diagnóstica (primeira etapa) da pesquisa-
formação. No início da formação, essa prática baseava-se em um modelo tradicional de
educação, centrada no professor, individualista e fundamentada na busca e transmissão de
informação. A ocorrência dessas mudanças também foi observada de maneira processual
durante a etapa de labor conjunto nas ações das professoras PA, PB e PC, nos momentos de
interações no grupo. Nas práticas das professoras PE, PF', PG e PH, as alterações foram
identificadas na comparação dos dados analisados na etapa diagnóstica e na de emancipação
coletiva, visto que esse grupo não foi considerado na análise da segunda etapa da formação
(labor conjunto).
De maneira geral, no final da formação, os relatos das professoras salientam que elas
desenvolveram com seus alunos atividades baseadas em formas de colaboração humana por
meio de ações pautadas na solidariedade, no respeito e cuidado, isto é, ações assentadas na
ética comunitária. No discurso das professoras, registrados durante a apresentação, e no
conteúdo dos slides (Anexos J e K) pode ser observada uma preocupação com a dimensão
social da atividade, ou seja, com as formas de interação e ações dos alunos entre si e delas
com os alunos. Esse relato evidência a superação do racionalismo técnico identificado no
discurso das professoras quando relataram suas práticas pedagógicas no início da formação,
que enfatizava o conteúdo e desprezava a dimensão social do trabalho dos alunos, conforme
evidenciam as análises da etapa diagnóstica (Capítulo 2).
Assim, nos materiais apresentados pelas professoras, na reunião de socialização, que
ilustram suas práticas no final da pesquisa-formação, podem ser observados elementos que
caracterizam um professor com perfil intelectual crítico a partir de um posicionamento crítico
diante da atividade desenvolvida com os alunos. Essa forma de agir das professoras denota
uma tomada de consciência sobre a prática pedagógica alienante que desenvolviam antes da
formação e sugerem indícios da sua superação. Indica também um processo de emancipação
262
coletiva, quando, após um ano das ações formativas propriamente ditas (etapa de labor
conjunto), as professoras pensam na aprendizagem nas aulas de Ciências a partir de uma
dimensão social, coletiva, ética e crítica.
Neste sentido, o processo de tomada de consciência das professoras ocorreu no labor
conjunto, durante as atividades formativas, nos processos de objetivação e subjetivação
(RADFORD, 2017c; 2019; 2020). Ocorreu quando elas sofreram, sentiram e pensaram juntas,
encontrando-se com uma nova concepção do ensino de Ciências baseado na ideia de uma
educação mais democrática e transformadora.
continuadas e permanentes que considerem não somente o encontro com o saber, mas também
que simultaneamente contribuam para a formação do ser. Ou seja, a transformação dos
participantes em sujeitos críticos e éticos, pois somos seres inacabados em constante
transformação presentes no mundo (FREIRE, 2004; RADFORD, 2017c).
O labor conjunto com as professoras durante as atividades formativas levou-me a
consciência de que sou, assim como elas, um sujeito inacabado. No contexto da atividade,
trabalhando junto com as professoras como igual, “ombro a ombro”, pude expressar-me e
ocupar um espaço no mundo, posicionando-me a partir de uma perspectiva coletiva. Vale
ressaltar que o maior desafio no meu processo de tomada de consciência foi reconhecer a
alienação presente na minha prática pedagógica como formadora. O labor conjunto no
contexto da formação levou-me ao encontro com um saber que era estranho para mim, me
contradizia, me objetivava e me colocava a refletir e questionar uma prática na qual eu não me
reconhecia mais no processo de formação e nos seus resultados. Foi esse encontro com os
saberes da TO que me levou à transformação enquanto ser e resultou em mudanças na minha
prática pedagógica. Ou seja, na visão que eu tinha do meu papel como formadora e nas
minhas ações, voltando-me para a coletividade e o labor conjunto.
Assim, a produção de novas subjetividades não foi somente das professoras, mas
também minha, enquanto formadora, pois me permitiu o encontro com uma nova visão do
papel do formador a partir de uma concepção histórica e cultural dos professores em
formação. Permitiu-me também uma nova visão da formação continuada, agora concebida
como uma formação continuada e permanente, como um espaço democrático a partir de uma
perspectiva ética e de transformação social.
Essa nova visão do papel do formador e da formação ocorreu devido a uma mudança
de consciência que foi possível somente por meio do labor conjunto com os professores, por
meio de processos de objetivação e subjetivação que levaram a uma contínua transformação
dialética mútua. Essa transformação fez-me e ainda faz questionar a formação individualista
pela qual fui formada e as contradições naturalmente advindas no momento em que passei a
adotar a TO como um novo paradigma teórico para a pesquisa e a formação realizada.
Neste sentido, a formação continuada e permanente baseada na TO tornou-se um
espaço de formação dos professores, mas também da minha formação e levou-me a um
posicionamento crítico diante do currículo da formação de professores baseado no
individualismo e no racionalismo técnico. Nesse espaço, ao longo de dois anos de formação,
junto com os professores, pude interagir, intervir, transformar, sonhar, sofrer, superar-me e
sobretudo sensibilizar-me. Pude, portanto, aprender, produzindo novas subjetividades em um
264
CONSIDERAÇÕES FINAIS
em geral, acontecem nos trabalhos em grupo. Após a reflexão sobre as práticas usuais do
trabalho de grupo, em que não há interação entre os participantes, elas puseram-se a trabalhar
em conjunto por meio de ações éticas, em que demonstraram compromisso com a realização
da atividade, cuidado com as colegas e solidariedade. Foram observados, além disso,
momentos de discordâncias e tensões, que, pela mediação da atividade, viabilizou-se a
produção de novas subjetividades.
Além disso, as análises evidenciam uma mudança nas concepções que as professoras
tinham de saber, conhecimento, atividade e aprendizagem (conceitos básicos da TO). Foi
observada ainda a materialização do saber sobre: processos de objetivação, subjetivação e
alienação, durante o labor conjunto em que as professoras posicionaram-se criticamente
diante das suas práticas pedagógicas e reconheceram a alienação presente em tais práticas.
Elas também reconheceram a necessidade de mudanças em relação ao seu papel na atividade,
ou seja, no labor conjunto, como alguém que atua ombro a ombro com os alunos.
Além disso, foram observados momentos de reflexões críticas das professoras sobre
o planejamento de atividades AEA de Ciências com base na TO. Elas refletiram criticamente
sobre o planejamento realizado por elas na escola, percebendo a ênfase dada à dimensão do
saber e a alienação presente nessa prática, levando-as a não se reconhecerem no ato de
planejar e no resultado de seu trabalho. Nesse contexto, as professoras reconheceram a
importância de planejar tarefas que promovam o labor conjunto na sala de aula, bem como o
encontro com o saber.
Nas etapas de labor conjunto e de emancipação coletiva, as análises dos planejamentos
de atividades AEA elaborados conjuntamente evidenciaram mudanças na forma de planejar
das professoras. Elas consideraram a dimensão social e coletiva nas tarefas planejadas e a
produção de novas subjetividades assentadas em uma perspectiva coletiva, além de questões-
problema que pudessem propiciar o encontro com o saber científico. Tais resultados
evidenciam a importância da elaboração de planejamentos coletivos que possibilitem
momentos de reflexões sobre o labor conjunto por ocasião de planejamento dos professores.
Neste sentido, o planejamento compreendeu um produto coletivo no qual as opiniões e
expressões das professoras convergiram. Os momentos em que os professores planejam
coletivamente, na perspectiva da TO, constituem uma nova forma de planejar atividades AEA
de Ciências, a partir de uma perspectiva dialógica, com base na dimensão social e ética do
trabalho docente.
Após o desenvolvimento dessas atividades AEA com os alunos, foram observados
relatos e reflexões críticas das professoras sobre a forma como elas interagiam com seus
269
alunos e a interação entre eles. Tais reflexões sugerem a tomada de consciência sobre o
individualismo presente nas suas aulas de Ciências, que refletiu na forma como interagiam
com os alunos e em uma conduta voltada a propiciar o labor conjunto delas com os alunos e
entre os alunos. Pode ser observada, ademais, uma crítica acerca do trabalho realizado nas
aulas de Ciências com o reconhecimento de que trabalhar em conjunto não é apenas fazer
grupos, o que resultou em estratégias para desenvolver o labor conjunto em sala de aula e na
preocupação em assegurar a participação de todos os alunos, fundamentada no respeito e na
solidariedade.
Ademais, foi observado um posicionamento crítico das professoras sobre a avaliação
da aprendizagem dos alunos durante o desenvolvimento dessas atividades, na etapa de labor
conjunto, assim como na etapa emancipação coletiva. Elas criticaram a avaliação que
realizavam com ênfase apenas no saber científico e nas ações individuais, sugerindo uma
avaliação que considerasse as ações dos alunos a partir de uma dimensão coletiva, levando em
conta a solidariedade, o compromisso e o respeito para com os colegas. Essa visão da
avaliação da aprendizagem a partir de uma perspectiva coletiva evidencia que a formação
continuada e permanente, no âmbito desta pesquisa, promoveu uma reflexão diante da
avaliação conteudista e individualista característica do modelo de educação tradicional,
possibilitando a sua superação.
A análises indicam ainda que, a partir dos saberes trabalhados na formação, a forma
como os conceitos foram refratados na mente das professoras deu-se de maneira diferente,
visto que o conceito é algo subjetivo. Isso pode estar associado aos contextos extra verbais,
individuais, das professoras que remetem a particularidades nas suas formações e trajetória
profissional. No entanto, no término da formação, todas as professoras demonstraram pensar
suas práticas pedagógicas e agir de uma forma diferente daquela registrada no início.
Um aspecto importante observado no decorrer da pesquisa foi que o uso de artefatos
tecnológicos digitais (laptop, computadores da sala de tecnologias, projetor multimídia, por
exemplo) deixaram de ser concebidos como mediadores da aprendizagem, como observado
no início da formação. Esses artefatos passaram a ser utilizados como parte da atividade, para
realização da tarefa proposta.
De maneira geral, após o término da pesquisa-formação, pode ser observada uma
mudança na concepção que as professoras têm sobre a aprendizagem e a avaliação, passando
a considerar a dimensão do ser (vir a ser) no planejamento e na realização das atividades de
Ciências. Elas compreenderam a importância de observar a dimensão ética presente na ação
do aluno para direcionar o seu planejamento e avaliar a aprendizagem, mostrando-se mais
270
seguras para planejar atividades AEA e trabalhar em conjunto com os alunos. Outra mudança
observada verificou-se na visão que as professoras têm sobre o seu papel e o papel dos alunos,
demonstrando a compreensão de que, no contexto do labor conjunto, seu papel é o de
trabalhar “ombro a ombro”, (RADFORD, 2017c; p. 138), como iguais com os alunos na
produção de saberes e de subjetividades.
Tais mudanças refletiram em atividades mediadoras de Ciências realizadas junto aos
alunos que consideraram a dimensão social da atividade e a coletividade, destacando a
superação do racionalismo técnico e do individualismo observado no início da formação.
Essas mudanças ocorreram por meio de um esforço coletivo que foi expresso no trabalho
conjunto realizado nas atividades sensíveis e concretas da formação. Neste sentido, as
mudanças observadas indicam indícios da emancipação coletiva das práticas pedagógicas
caracterizadas como alienantes. Vale ressaltar que as professoras ainda estão em processo de
emancipação e de superação da alienação presente nas suas práticas pedagógicas, pois o
processo de desenvolvimento de um sujeito crítico, ético e reflexivo é contínuo e incessante,
uma vez que somos seres inacabados em constante transformação, ou seja, somos “um projeto
de vida inacabado e sem fim” (RADFORD, 2017c, p. 143).
As mudanças registradas na prática pedagógica das professoras resultam de mudanças
na consciência delas e evidenciam elementos relacionados ao desenvolvimento de um
professor intelectual crítico (CONTRERAS, 2002), que desenvolve sua prática com ênfase na
dimensão social e transformadora da realidade. Essas modificações partiram de um
posicionamento crítico das professoras diante do currículo, por meio da tomada de
consciência da alienação e do racionalismo técnico presente nas suas práticas. A partir das
ideias de Freire (1979), é possível afirmar que, por meio da tomada de consciência da sua
realidade, as professoras puderam desenvolver uma consciência crítica acerca da sua prática
pedagógica, com possibilidades de modificá-la.
As análises apresentadas confirmam a tese de que uma proposta formativa que discute
o ensino, em particular de Ciências, baseada na ética comunitária e em formas de colaboração
humana, tem potencial para promover a emancipação das práticas pedagógicas alienantes.
Conforme afirma Giroux (1986), ao colocar em prática novas formas de colaboração humana
e de produção de conhecimento, os professores desempenham o importante papel de
promover a emancipação das formas de produção individualistas, como as evidenciadas nas
ações dessas professoras no início da formação. Neste sentido, os resultados obtidos são
indicativos de que a formação permanente e continuada proposta para o grupo de professores
de Ciências dos anos inicias do E.F., por meio do labor conjunto, promoveu mudanças na
271
prática pedagógica delas no sentido de contribuir para a emancipação coletiva das práticas
individualistas, competitivas e subjetivistas, portanto, alienantes, recorrentes na escola
contemporânea.
Os resultados obtidos ao longo desta pesquisa aliados à ideia de que a formação de
professores para a emancipação coletiva das práticas pedagógicas alienantes deve ser contínua
e permanente indicam a possibilidade de pesquisas futuras como continuidade dessa pesquisa-
formação. Considerando que as professoras ainda encontram-se em processo de constituição
de um professor intelectual crítico, faz-se necessário continuar a interação com esse grupo de
professoras, bem como expandir a pesquisa-formação para professores de Ciências dos anos
finais do E.F. (5º ano 9º ano) dessa escola. Tal expansão deve ser considerada também para
professores de Ciências dos anos iniciais e finais do E.F. em outras escolas. Ademais, não
basta somente trabalhar com os professores que atuam em sala de aula. É importante incluir
nesse trabalho, da mesma forma, os técnicos que se ocupam das formações ofertadas pela
Secretaria de Educação, dando-lhes a possibilidade de vivenciar junto aos professores a
experiência democrática propiciada pelo labor conjunto nos contextos de formações
continuadas e permanentes genuinamente transformadoras e emancipatórias.
272
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Ensino Fundamental: o uso do blog aliado ao ensino de ciências. In: 11º Encontro Nacional de
Pesquisadores em Ensino de Ciências - 11º ENPEC, 2017, Florianópolis: Abrapec. Atas 2017
- 11º ENPEC, 2017.
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ensino fundamental: possibilidades e desafios em Canoas-RS. Educação, ciência e cultura, v.
18, n. 1, p. 49-61, 2013.
APÊNDICES
285
Você está sendo convidada (o) a participar de uma pesquisa intitulada “Pesquisa-formação e
Formação Continuada de Professores dos Anos Inicias do Ensino Fundamental: Autonomia Docente
para Uso Pedagógico do Laptop Educacional no Ensino de Ciências”. Decida, por favor, se quer
participar ou não. Tome a decisão sem pressa. Leia cuidadosamente o que segue e pergunte ao
responsável pelo estudo, caso tenha alguma dúvida. Este estudo está sob a responsabilidade da
pesquisadora Dirce Cristiane Camilotti, do Programa de Pós Graduação em Educação da
Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS). A participação é voluntária e a recusa em
participar não prejudicará o (a) convidado (a).
A finalidade desta pesquisa é realizar uma pesquisa-formação com ênfase na formação
continuada de professores do Ensino Fundamental para uso pedagógico do laptop educacional
no Ensino de Ciências Investigativo com foco no desenvolvimento da autonomia docente.
Poderão participar deste estudo os professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental, os
coordenadores pedagógicos e o professor da sala de tecnologias/informática da Escola Estadual
Antônio Nogueira da Fonseca, em Terenos/MS. Serão aplicados questionários e/ou realizadas
entrevistas sobre o uso do laptop educacional no ensino de Ciências. Além dos instrumentos
mencionados, serão realizadas discussões coletivas, oficinas, orientações/análises de planejamentos e
produções dos alunos e observações durante o ensino de Ciências.
Os procedimentos realizados na pesquisa serão entrevista semiestruturada, individual e
gravada em vídeo, no início e no final da pesquisa; encontros presenciais do grupo, gravados em áudio
e vídeo, durante toda pesquisa; observação direta nos encontros e oficinas presenciais, gravadas em
vídeo e fotografadas; aplicação de questionários com questões objetivas e discursivas ao longo da
formação; registro de informações em diário online, no ambiente virtual, no decorrer da pesquisa, com
acesso restrito à pesquisadora e participante; análise dos planejamentos, atividades (presenciais e à
distância) e produções realizados no âmbito da pesquisa.
É garantida a preservação da identidade dos participantes, quando houver transcrição das
entrevistas, atividades individuais e em grupo. Na publicação da análise dos dados, também será
mantido sigilo quanto à identidade do participante.
O acompanhamento e a assistência durante o desenvolvimento da pesquisa serão realizados
presencialmente ou à distância pela pesquisadora-formadora, nos encontros e visitas à escola e por
meio de ambiente virtual, contato telefônico ou e-mail.
Os benefícios da participação na pesquisa-formação serão a capacitação para desenvolver
situações de aprendizagem com uso das tecnologias digitais, especialmente o laptop educacional, com
metodologias inovadoras para o ensino de ciências por meio da mudança da prática pedagógica dos
participantes, bem como possíveis melhorias no desempenho individual e nos processos de ensino e
aprendizagem na escola.
Os riscos e os desconfortos decorrentes da participação na pesquisa são: responder a questões
sensíveis relacionadas à relação do participantes com a equipe de gestão da escola, colegas e
Secretaria de Educação; sentir-se desconfortável ao falar sobre a sua prática pedagógica, ocupação do
tempo do participante para participar das entrevistas e atividades da formação, sentir-se constrangido
ao participar das filmagens e dos registros fotográficos; embaraço ao interagir com as formadoras e os
colegas presencialmente e virtualmente e interferência na rotina dos participantes.
Para evitar e/ou minimizar tais danos, haverá garantia do acesso aos resultados individuais e
coletivos da pesquisa, de local reservado e liberdade para não responder questões ou participar de
atividades que o participante considere constrangedoras, sendo assegurada a confidencialidade, a
privacidade e a proteção da imagem. A pesquisadora tem habilidade ao método de coleta de dados e
estará atenta aos sinais verbais e não verbais de desconforto.
A qualquer momento, o participante poderá desistir de participar, sem qualquer dano ou
ressalva. Se houver algum problema externo, de ordem pessoal, no decorrer da formação, esta
condição também será assegurada. Será garantido o sigilo das informações decorrentes da pesquisa,
acesso individual e restrito ao ambiente virtual e atendimento online e presencial individual, quando
solicitado.
A participação presencial e virtual ocorrerá na escola, que oferecerá a infraestrutura
necessária. Não haverá necessidade de deslocamento ou trabalho extra por parte dos participantes. Não
286
Declaro que li e entendi este formulário de consentimento, todas as minhas dúvidas foram
esclarecidas, e que sou voluntário a tomar parte neste estudo.
_____________________________________________________
Assinatura do participante
Data_____ /_____ /_____ Telefone para contato:
_________________________________________________________
Dirce Cristiane Camilotti (pesquisadora responsável)
Data_____ /_____ /_____ Telefone para contato: 99237-0679
DADOS GERAIS
Nome: Idade:
Formação inicial:
Pós-graduação:
Tempo de serviço:
Escolas em que atua:
Ano do Ens. Fundamental em que atua:
Tempo que utiliza o computador nas suas aulas:
Regime de trabalho (efetivo ou convocado?)
Ciências?
2.3 Você participou de outras formações para uso das tecnologias? Quais?
3. As formações citadas na pergunta 2 (dois) contribuíram para a sua prática com uso das tecnologias?
3.1 Se sim, quais foram as contribuições?
3.2 Se não, por quê?
4. Você acha necessária alguma mudança nas formações das quais participa?
4.1.1Se sim, quais?
5. Quais são as suas expectativas ao participar desta pesquisa-formação em que se propõe um estudo
coletivo para o uso das tecnologias educacionais, com ênfase no laptop educacional, no ensino de
Ciências?
Sinta-se à vontade para falar ou sugerir algo que achou que não foi contemplado na nossa
conversa.
289
1. No laptop educacional, abra o menu iniciar na barra de tarefas, clique em “Escritório” e escolha a
opção “Writer – Editor de texto”.
2. Salve o arquivo com o nome “ação1- seu nome” no formato .odt no seu laptop;
3. A partir da leitura do texto “Ensino de ciências nos anos iniciais do ensino fundamental:
possibilidades e desafios em Canoas-RS” (SOARES et. al., 2013), escreva um pequeno texto sobre a
importância de ensinar Ciências;
4. Na sequência, escolha uma imagem da internet, insira no texto e proponha uma atividade didática
com o objetivo de levar os alunos a entenderem a importância dos saberes científicos para eles.
- Formatação do texto:
a) Formate o texto da seguinte forma:
Clique em formatar > caractere e mude a cor, tamanho e tipo da fonte;
Coloque um plano de fundo no título do texto em negrito (formatar > caractere);
Justifique o texto e centralize o título, em formatar > alinhamento.
Deixe o texto com espaçamento duplo e parágrafo 2 cm clicando em formatar > parágrafo.
b) Configure a página (formatar > página): Superior e inferior 1 cm; Direita e esquerda 2 cm;
c) Insira um cabeçalho com o seu nome (inserir > cabeçalho);
d) Coloque borda na página (formatar > páginas);
e) Insira número de páginas (inserir > campos > n° de página)
f) Insira uma quebra de página e mude de página (inserir > quebra manual > quebra de página);
g) Na segunda página, insira duas colunas, em formatar > colunas;
h) Na coluna da esquerda, insira a figura pesquisada na internet (inserir > figura > de um arquivo);
i) Descreva a atividade didática e coloque o texto na coluna da direita (utilize a tecla enter para
mover o texto);
j) Salve as alterações feitas no seu arquivo (arquivo > salvar);
k) Crie um arquivo PDF a partir do seu arquivo com o mesmo nome (clique no ícone:
na barra de tarefas).
1. Releia com atenção o texto estudado na ação 3 "O Ensino de Ciências nos anos iniciais do ensino
fundamental: possibilidades e desafios em Canoas RS” (SOARES et. al., 2013);
Estrutura da apresentação:
- 2° slide: Produza um pequeno texto sobre a importância da alfabetização científica dos alunos.
Formate o texto:
Texto – formate a cor, estilo e tamanho da letra (formatar > caractere).
Insira uma animação no texto ( selecione o texto, clique em apresentação de slides > animação
personalizada).
Exemplo 1:
Em uma atividade, baseada no trabalho conjunto, realizada com uma turma do 5° (quinto) ano
sobre alimentação saudável foi utilizado o simulador “Alimentação saudável”, do site Phet. A
atividade compreendia três tarefas. Em uma das tarefas, um grupo de dois alunos (João e Isabela)
deveria elaborar uma lista de alimentos saudáveis. O simulador disponibiliza uma lista de diversos
tipos de alimentos, a partir da qual pode ser montado um cardápio. O consumo dos alimentos desse
cardápio pode ser simulado ao longo dos anos por meio de um boneco em que são visualizadas as
variações (ou não) de peso e saúde do coração.
Inicialmente, foi solicitado que elaborassem uma lista apenas com base nos alimentos
disponíveis no simulador, sem montar um cardápio ou simular a alimentação. Na lista elaborada pelo
grupo, foram inseridas basicamente frutas, verduras, legumes e carnes magras. Na sequência, foi
proposto que fosse simulado um cardápio com base na lista elaborada e, depois, analisado se havia
necessidade da reelaboração da lista de alimentos saudáveis.
Durante a simulação com a lista elaborada pelo grupo, o boneco emagreceu muito ao longo
dos anos e morreu. Segue um excerto da interação dos alunos, após a visualização da simulação:
1. João: Ele morreu...
2. Isabela: É... O cardápio está errado. Mas verduras, frutas e legumes são saudáveis e têm nutrientes.
3. João: Mas.... ele morreu.
4. Isabela: Mas eu tenho certeza que esses são alimentos saudáveis, nós já estudamos que são... (ela
bate a palma da mão na mesa).
5. João: (suspira profundamente).
6. Isabela: Agora, eu não sei o que fazer (curva as sobrancelhas), se os alimentos são saudáveis e o
boneco morreu!!!
7. João: Nem eu (suspira profundamente de novo).
Nesse momento, a professora, que observava a conversa, se aproxima e pergunta:
8. Professora: O que houve?
9. Isabela: O boneco morreu! Ficou magrinho e morreu e temos certeza que o alimento é saudável.
10. João: É! Ele morreu!
11. Professora: Deixa ver... (ela olha a lista de alimentos). Mas será que somente a carne, as verduras,
as frutas e os legumes têm todos os nutrientes que precisamos para ficar saudáveis?
12. Isabela: Sim... (comprime os lábios).
13. João: Ah! (aponta o dedo para a tela do laptop), mas minha mãe diz que tenho que comer arroz e
feijão para crescer e ter energia! Então é saudável!
14. Isabela: hummmm (arregala os olhos).
15. Professora: E como podemos verificar se o que a mãe do João disse é verdade?
16. Isabela: Vamos colocar também arroz e feijão no cardápio e “dar para o boneco”, aí simulamos.
17. Professora: Colocariam mais algum alimento?
18. João: Acho que macarrão e batatas também faz bem.
19. Professora: Então façam novamente a simulação com esses alimentos.
20. Isabela: Eu faço! (puxa o laptop para perto)
21. João: É minha vez! Você já mexeu antes! (toma o laptop das mãos de Isabela).
22. Isabela: Não... (comprime os lábios e olha para a professora).
A professora se aproxima calmamente da mesa e diz:
23. Professora: É a vez dele!
24. Isabela: Tá (se aproxima para olhar para a tela do laptop).
Os alunos realizaram novamente a simulação e o boneco manteve o peso e o coração estável
ao longo dos anos. Após observar o resultado da simulação, João disse:
25. João: Tem que ter vários tipos de alimentos para ser uma alimentação saudável.
26. Isabela: É! Os legumes, frutas, verduras e carnes são saudáveis e o feijão, arroz, batata, dão a
energia.
292
Exemplo 2:
Em outra tarefa, na mesma atividade, os alunos discutiam a importância de uma alimentação
saudável para a saúde coletiva. A conclusão da discussão está descrita a seguir:
27. Isabela: Se não temos uma alimentação saudável, ficamos doentes.
28. João: E se ficamos doentes, vamos para o hospital. Se todos ficarem doentes porque não se
alimentam direito, os hospitais ficarão cheios, lotados, e as pessoas que precisariam dos hospitais não
poderão ser atendidas e....
29. Isabela interrompe e complementa: e também será gasto dinheiro com imposto para tratar das
pessoas que adoecem, porque não têm uma alimentação saudável. Esse dinheiro fará falta para aplicar
em outras coisas que as pessoas precisam e cuidar da saúde também.
Exemplo 3.
Durante o desenvolvimento da atividade sobre alimentação saudável, após a apresentação da
atividade pela professora, um grupo com três alunos (Julia, Marcos e Maria), agiu da seguinte forma:
- Dividiram as três tarefas da atividade para que cada um realizasse uma e pudessem terminar a
atividade mais cedo.
- Marcos discordou das colegas quando lhe foi atribuída a tarefa 2 (a mesma citada no exemplo 1 da
tarefa anterior), pois ele queria ficar com a tarefa 1 que considerava mais fácil.
- As colegas não concordaram com a exigência e ele se recusou a realizar, a participar da atividade.
- As meninas, então, se organizaram para realizar uma pesquisa na internet a fim de copiar as respostas
das questões-problema das tarefas, mas decidiram que não realizariam a tarefa 2.
- Julia tinha especial interesse em conseguir encontrar as respostas na internet, sob o argumento de que
precisava de nota na disciplina.
293
- A partir do texto, a seguir, realize uma leitura e responda as questões de 1 (um) a 7 (sete).
Este texto é o exemplo de uma aula de matemática desenvolvida na perspectiva da TO citada no artigo
“Semiose21 e subjetivação: a constituição de sujeitos nas salas de aula de matemática”22 (RADFORD,
2018).
Em uma aula de matemática na pré-escola para crianças de 4 e 5 anos, foi desenvolvida uma
atividade baseada no trabalho conjunto para trabalhar as formas de contar. A atividade foi sobre um
jogo aritmético para duas crianças e teve a intenção de oferecer-lhes uma ocasião para familiarizarem-
se com as formas culturais de contar e pensar os números. Foi distribuído, para cada dupla, uma folha
de plástico contendo duas fileiras de 10 quadrados com espaço suficiente para as crianças colocarem
um pequeno urso de plástico em cada um deles. Uma criança recebeu 10 ursos de uma cor e a outra
criança recebeu 10 ursos de outra cor. Eles também receberam um dado. As crianças começaram o
jogo com as duas fileiras vazias. As regras eram as seguintes: revezando-se, cada criança tinha que
jogar o dado e colocar em sua fileira o número de ursos que correspondia ao número mostrado pela
face superior do dado. O vencedor seria a criança que preenchesse primeiro a fileira. Para preencher a
fileira, o jogador tinha que obter (ao jogar o dado) o número exato de pontos correspondentes ao
número de espaços restantes na sua linha. Para demonstrar as regras, o professor jogou um jogo com
uma criança na frente da classe. Em seguida, a aula foi dividida em grupos de dois.
Segue um fragmento da descrição do jogo entre Carlos e João:
1. João joga o dado e obtém seis pontos. Ele diz "seis!" E coloca seis ursos em sua linha, um urso de cada vez,
contando em voz alta "1, 2, 3, 4, 5, 6."
2. Carlos segue de perto as ações de João; ele conta e diz "seis!" Ele espera que João termine. Então, ele diz
“OK. Minha vez, minha vez!”
3. João responde “OK”. Eu só vou colocar isso [os dados] lá, por agora” e coloca os dados perto da fileira de
Carlos.
4. Carlos pega o dado, joga e diz “Oh! Dois! ”Ele pega um urso de cada vez e coloca-os em sua fileira, enquanto
conta em voz alta "1, 2".
5. João segue as ações de Carlos, contando de perto. João parece ter esquecido quantos ursos já estão na fileira.
Ele tira três ursos da sua fileira e conta aqueles que permanecem, apontando para eles sucessivamente. Ele diz
“1, 2, 3”. Então, ele coloca de volta aqueles que acabou de tirar. Como ele coloca-os de volta um depois do
outro, ele diz “4, 5, 6.” A folha de plástico move-se um pouco; os ursos movem-se dos quadrados e aparecem
colocados incorretamente (vários estão no mesmo quadrado).
6. Enquanto isso, Carlos move os dados para perto da fileira de João e diz: "Ok, é sua vez."
- Até este ponto, as crianças seguem as regras do jogo.
7. João joga o dado novamente e a face superior mostra dois pontos. João não está feliz com o resultado, pega o
dado novamente, põe nas mãos, aperta as mãos vigorosamente e deixa-o cair. Ele pronuncia “Cinco!”. Satisfeito
com o resultado, ele começa a adicionar os ursos enquanto conta “1, 2, 3, 4, 5.”
8. Carlos viu o que João fez, aparentemente sem entender as suas ações. Ele não parece incomodado com o fato
de João ignorar o primeiro resultado (os dados mostraram dois pontos na face superior). Neste momento, uma
criança de outro grupo chama o professor e a atenção de Carlos volta-se para esse grupo. Enquanto isso, João
está ocupado reordenando seus ursos na fileira.
9. Treze segundos depois, a atenção de Carlos volta para João. João ainda está reordenando seus ursos em sua
fileira. Carlos estica o braço e tenta pegar o dado, que fica na frente de João. João impede Carlos de pegar o dado
e diz “Então, é… espere! Ok, é ...
10. Carlos não presta atenção em João e diz: "Ok, minha vez, eu ..." João interrompe e diz “Não, espere! Espere!
Espere!” Depois de algum esforço físico, Carlos consegue pegar o dado.
11. João continua "Então, é 1, 2, 3, 4, 5, 6" e continua a colocar e contar os ursos: “1, 2, 3, 4.” Carlos não presta
atenção ao que João faz. Carlos joga o dado duas vezes.
12. João termina de contar e coloca os braços em uma posição de vitória. Ele diz "Eu venci! Eu venci! Eu venci!
2. A experiência que vivenciou ao longo desta pesquisa-formação influenciou de algum modo sua
prática pedagógica?
- Se sim, de que maneira?
- Se não, justifique sua resposta.
4. Como a pesquisa-formação contribuiu para a sua atualização de saberes relacionados ao uso dos
artefatos tecnológicos (laptop e computador)?
ANEXOS
298
Módulo 2 – Atividade 1
Tarefa 1
Questão 1 - É uma alimentação que fornece nutrientes necessários para o desenvolvimento das
atividades diária, essenciais para o perfeito funcionamento do organismo.
Tarefa 2
Questão 2 - Uma alimentação saudável deve ser baseada em práticas alimentares assumindo a
significação social e cultural dos alimentos como fundamento básico conceitual. A alimentação se dá
em função do consumo de alimentos (e não de nutrientes). Os alimentos têm gosto, cor, forma,
aroma e textura e todos estes componentes precisam ser considerados na abordagem nutricional. Os
nutrientes são importantes contudo, os alimentos não podem ser resumidos a veículos destes. Os
alimentos trazem significações culturais, comportamentais e afetivas singulares que jamais podem ser
desprezadas. O alimento como fonte de prazer também é uma abordagem necessária para promoção
da saúde.
Pesquisa:
Conforme o Portal do Mec , a alimentação saudável deve ser variada, com preferência para o
consumo dos alimentos dos vários grupos, como por exemplo, frutas, verduras e legumes, feijão e
grãos integrais. Dê preferência também aos alimentos regionais ou locais.
Alimentos reguladores, energéticos e construtores. São divisões de a pirâmide alimentar. Na pirâmide
brasileira foram divididas em 8 grupos: cereais, hortaliças, frutas, leguminosas, leite, carnes, ovos,
açucares e óleo.
Balanço energético: É o equilíbrio obtido da parte do total de energia ingerida e o total de energia
gasta pelo organismo em suas atividades diárias. A partir do momento que ocorre a separação da
quantidade de alimentos que devemos ingerir de cada grupo alimentar, para que se tenha um
equilíbrio entre a energia ingerida e a energia gasta.
Tarefa 3
Alimentos saudáveis - Calorias Alimentos não saudáveis - Calorias
Flocos de milho 104 Coca cola 162
Leite desnatado 85 Fatia de pizza 306
Cenoura picada 28 Fast food 1355
Brócolis cozidos 33 ½ Burrito 385
xícara
Couve flor 17 ½ Pizza inteira 1458
xícara
Bife 168 Sand. de manteiga, amend 340
1 ovo 87 Sub sanduíche 459
Morango 55 um Chocolate quente 339
copo
3.1 – Estará sempre nutrida, disposta para atividades diárias e desfrutará de qualidade de vida.
3.2 – Correrá sérios riscos de desenvolver problemas de saúde como: obesidade, hipertensão,
diabetes, doenças coronárias e outros.
Tarefa 4
4.1 – Não foi semelhante. Perda de peso, diminuição do percentual de gordura e consequentemente
diminuição do IMC. Através do equilíbrio na ingestão de carboidratos de baixas calorias, proteínas e
gorduras com o passar do tempo houve perda e peso pois a quantidade de calorias ingeridas eram
menores que a energia gasta. Com o equilíbrio da ingestão de alimentos saudáveis com mais energia,
esta pessoa estará nutrida.
4.2 – Sim. Houve aumento do peso, aumento do percentual de gordura e consequentemente IMC
acima do normal. Porque os alimentos não saudáveis são ricos em carboidratos e gorduras e
300
fornecem mais energia do que uma mulher sedentária gasta. Essa energia não gasta é armazenada na
forma de gordura, que aumenta com o passar dos anos, causando problemas de saúde como pressão
alta, diabetes e doenças coronárias, que a levaram a morte.
Tarefa 5
5.1 – Cardápio para uma alimentação saudável
CARDÁPIO
CAFÉ DA MANHÃ
* Leite desnatado 121 cal
* Fatia de pão 68 cal
* 1 ovo grande 87 cal
LANCHE
* 1 maçã 72 cal
ALMOÇO
*Batata cozida/ou arroz e feijão 286 cal
* couve-flor 17 cal
* cenoura 28 cal
* brócolis 33 cal
* Bife 168 cal
* arroz 196 cal
LANCHE
* Laranja e Fatia de pão 68 cal
JANTA
*Batata cozida/ou arroz e feijão 286 cal
* couve-flor 17 cal
*cenoura 28 cal
* frango 180 cal
* limonada 1 copo 105 cal
* 2 ovos 174 cal
CEIA
*Iogurte natural 155 cal
5.2 - Quando todos do grupo estão se alimentando de maneira adequada, terá mais saúde, e
disposição para fazer suas atividades, sendo mais produtivo com o trabalho e para a coletividade.
Isso previne doenças como obesidade, problemas no coração, hipertensão, gerando menos gastos
com medicação. A economia pode ser convertida em ações do governo para toda a comunidade. Por
exemplo: uma pessoa que tem uma alimentação saudável, tem menos risco de ter problemas de
saúde, será mais produtiva para ela e para a sociedade e necessitará menos da saúde pública
(hospitais, postos de saúde).
301
Módulo 2 – Atividade 2
Questões 1 e 2
Saber É um conceito comprovado É uma potencialidade, presente na cultura,
cientificamente sobre que traz possibilidades de pensar, refletir e
determinado tema ou assunto. resolver problemas.
Conhecimento São as experiências que É a atualização ou materialização deste
adquirimos no nosso dia a dia. saber, que ocorre por meio de uma
atividade mediadora.
Artefato São os instrumentos/objetos que São recursos tecnológicos ou não.
utilizamos no processo do
conhecimento.
Aprendizagem Quando um conceito é Processos sociais de tornar-se ,
apreendido e assimilado por um progressiva e criticamente, conscientes de
indivíduo colocando em prática uma forma codificada de pensar e agir.
de forma autônoma. Aprender a ser.
Atividade Utilizar de maneira prática todo E o processo que media a atualização do
o conhecimento aprendido , saber.
facilitando na resolução dos
problemas diários.
3. Questão-problema:
Quando começamos a resolver as questões problemas atualizando o saber com o conhecimento
científico por meio de pesquisas na internet.
4. Questão-problema:
Lap-top, celular e simulador.
5. Questão-problema:
Sim. Pois ouvimos as diferentes opiniões, respeitamos o saber do outro e teve uma flexibilidade nas
resoluções dos problemas.
6. Questões- Problema:
Objeto: Atualizar a Teoria da Objetivação
Meta: Resolver os conceitos: saber, conhecimento, artefato, aprendizagem e atividade.
302
Atualizar os saberes sobre os vírus, sua prevenção e as doenças causadas pelos vírus.
Em seguida solicitar que assistam ao vídeo: O vídeo “Vírus: inimigos da humanidade” parte
1, fonte: https://www.youtube.com/watch?v=lDSAUlUkJ4k. Usarão o laptop educacional
para assistirem ao vídeo. Após assistirem ao vídeo, questioná-los:
Questões-problema:
2.1) Qual a origem da palavra vírus?
2.2) Quais os tipos de doenças provocadas por vírus citadas no vídeo?
2.3) Qual o tipo de instrumento que permite a observação dos vírus, já que estes são seres
minúsculos?
2.4) Por que os vírus não podem se reproduzir sem atacar uma célula?
2.5) Qual é a origem das vacinas?
Para resolver a questão problema 2 acessar também o link: Usarão o laptop educacional para
acessarem ao link:https://www.todamateria.com.br/doencas-causadas-por-virus/.
Depois de responder, o grupo deverá elaborar uma lista dos nomes das doenças causadas pelo
vírus no editor de texto, com três colunas.
1-Nome da doença.
2- Formas de contágio.
3- Medidas de prevenção.
303
As principais diferença são que o planejamento da SED não permite trabalhar a dimensão do ser.
Tem uma cobrança de trabalhar os conteúdos do bimestre. Não permite que o professor defina as
habilidades e competências, vem uma lista pronta para ser selecionada.
305
1.1 Conjunto de ideias que cada ser possui de acordo com suas experiências e vivencias.
1.2 É um padrão de conceitos estabelecidos, desejando alcançar o objetivo pré estabelecido.
2. Processo de subjetivação:
É a atualização do ser, o processo pelo qual nos afirmamos como subjetividades em curso. A atividade
media o ser em subjetividades e o sujeito passa a agir com ética comunitária e pensar na coletividade,
no outro.
Processo de objetivação:
É a atualização do saber cientifico. Processo em que a atividade media o saber em conhecimento e em
que ocorre mudança na consciência dos alunos.
Os dois são processo de atualização.
Acontecem em um contexto de uma atividade conjunta ao mesmo tempo.
4.1 É quando o aluno não está atento as explicações aos conteúdos que estão sendo abordados.
4.2 Eles procuram se agrupar conforme o ciclo de amizade e na maioria das vezes dois fazem a
pesquisa e os outros só colocam o nome.
1.1 Debate- Através de questionamento do conteúdo estudado, observamos as respostas dos alunos, e
seu entendimento do assunto proposto.
1.2 Sim, de acordo com o PPP com base em Libâneo e Luckesi.
1.3 Através de provas, trabalhos, debates e participação dos alunos nas aulas.
3.1 A avaliação na Teoria da Objetivação vai além da quantificação do saber do aluno, é observado a
posição crítica do trabalho em conjunto, quão bem sucedido foi, quão solidário e responsáveis nós
fomos, quanto a consciência mudou e quão críticos nós estávamos diante do objeto com qual nos
deparamos durante a realização das tarefas.
* A avaliação foi baseada apenas nos comentários dos alunos de maneira individual, bem diferente do
que propõe a avaliação na TO.
3.2
Diferença Semelhanças
Quantitativa Criticidade
Individualismo
Negligência ao ser
3.3 Sim, Levar em conta o ser, suas ações de maneira coletiva observando o processo de objetivação
e a subjetivação.
4.1. Atualizaram o saber quando descobriram e mencionaram que além da gripe existiam outras
doenças causadas por vírus.
Atualizaram o saber ao entender que os vírus eram microorganismo e só poderiam ver visualizados
como o uso do microscópio.
4.2 Atualizaram o ser quando perceberam a importância da vacinação está em dia para a saúde
individual e coletiva (ao observarem as carteiras de vacinação perceberam que todos estavam imunes
as doenças virais).
Atualizaram o ser quando se preocuparam com o outro para que todos participassem na digitação da
atividade.
Turma: 4º Ano A
Duração: 2 aulas
Objeto: Atualizar os saberes sobre as doenças causadas pela água poluída e contaminada, e as formas
de prevenção das doenças causadas pela água.
Atualizar o ser de acordo com a ética comunitária desenvolvendo compromisso, solidariedade,
respeito, ajuda mútua e reconhecimento de que as ações pessoais tenham uma consequência
comunitária.
Meta: Resolver questões- problemas sobre a água contaminada e poluída e as formas de prevenção
das doenças causadas pela água. Desenvolver ações solidárias de acordo com a ética a comunitária.
Reconhecer que as ações pessoais têm uma consequência comunitária.
Tarefa 1
1. Reunidos com seu grupo discutam as seguintes questões-problemas:
1.1 - Qual a importância da água para os seres vivos?
1.2 - Ela pode ser prejudicial em alguma situação?
Deixá-los se manifestarem, contando suas experiências.
Registre no Word suas experiências.
Tarefa 2
2. Assistam ao vídeo “kaua e a lenda das águas 1 e 2. Agora, respondam as questões:
2.1 - O vídeo apresenta vários tipos de poluição. Qual desses tipos de poluição da água que você já
presenciou?
2.2 - Onde foi presenciado?
2.3 - Qual a consequência em virtude da poluição da água?
Registre no editor de texto (Kword) as respostas das questões.
Momento de socialização
Socializar as informações sobre as questões com os grupos dos colegas.
Tarefa 3
3. A partir da leitura do texto “Qual a diferença da água poluída e da água contaminada” que foi
realizada em sala utilizando o computador da ste, respondam as questões:
3.1 - Qual a diferença de água poluída e água contaminada?
3.2 - Quais consequências da poluição da água vocês observam no seu dia a dia?
Justifique sua resposta.
3.3 - Quais as doenças causadas pela água?
3.4 - O que você pode fazer para evitar as doenças causadas pela poluição da água?
Apresentação:
Dar início a aula organizando a turma em pequenos grupos, de modo que estudantes com
diferentes hipóteses de escrita possam trabalhar juntos.
Escrever no cartaz (papel pardo) duas versões de uma adivinha popular já conhecida. Um dos textos
apresentará as palavras aglutinadas (como, por exemplo:
ÉUMPÁSSAROBRASILEIROESEUNOMEDETRÁSPARAFRENTEÉIGUAL?RESPOSTA:ÉAARA
RA!), outro aparecerá levando em consideração a segmentação convencional de palavras (como, por
exemplo: É UM PÁSSARO BRASILEIRO E SEU NOME DE TRÁS PARA FRENTE É IGUAL?
RESPOSTA: É A ARARA!). Escrever as duas versões da adivinha antes do início da aula, como forma
de ganhar tempo.
Tarefa 1
Solicitar que a turma tente ler a primeira versão (texto com palavras aglutinadas) oralmente no grande
grupo. Posteriormente, orientar a leitura também da segunda versão (respeitando a segmentação
adequada das palavras).
Após ouvir as crianças e as suas dificuldades nas leituras realizadas, realizar a leitura das duas versões
da adivinha e questionar sobre as leituras feitas, os sentidos das mesmas, qual foi a mais fácil de
compreender e a mais difícil e quais os motivos que facilitaram ou dificultaram as leituras. Nos
pequenos grupos as crianças devem responder os questionamentos.
Espera-se que as crianças percebam que a dificuldade em ler e compreender a versão aglutinada da
adivinha se deu porque não havia espaços em branco entre as palavras. Caso as crianças não cheguem
ou não exponham essa conclusão, questionar sobre a formatação/disposição das palavras no cartaz nas
duas versões da adivinha trabalhada e sobre a funcionalidade dos espaços em branco entre as palavras.
Conduzir a reflexão sobre como as próprias crianças escreveriam algumas palavras (no caso do texto
sugerido, isso poderia ocorrer com a resposta da adivinha: a arara, considerando que é comum, no
processo de aprendizagem da segmentação convencional de palavras, a escrita do artigo aglutinado ao
substantivo).
Questiona-los sobre a função dos espaços em branco no texto 2, fazendo perguntas como, por
exemplo: “Para que servem os espaços em branco entre as palavras da adivinha?” ou “O que
poderíamos fazer para facilitar a leitura do texto 1 (texto com palavras aglutinadas)?”. Neste momento,
é importante realizar, mais enfaticamente, um comparativo entre as duas versões. Fazer isso, inclusive,
voltando os olhos das crianças para alguma parte do texto. Exemplo:
310
Vamos ver o começo dos textos. Olhando para o texto 1. Como conseguimos saber onde começa uma
palavra e termina outra? E no texto 2?
Depois de ouvir as hipóteses das crianças, pedir que expliquem brevemente o conceito de palavra e a
função dos espaços em branco entre elas. Por exemplo, expor que palavras são pequenas unidades da
língua, que em um texto escrito são separadas por espaços em branco ou por sinais de pontuação e que
os espaços em branco são úteis para facilitar a leitura de um texto, como eles mesmos puderam
perceber.
Após ouvi-los, fazer uma breve explicação, mencionando que os sinais de pontuação que aparecem na
adivinha exemplificada, têm várias funções, como, por exemplo: a interrogação serve para deixar claro
que a frase é uma pergunta, o sinal de dois pontos aparece para esclarecer a resposta da adivinha e o
ponto de exclamação serve para expressar a surpresa da descoberta da solução da adivinha. Explicar
que, na escrita, se enxerga agrupamentos de letras - as palavras - separados por espaços em branco ou
sinais de pontuação, o que não acontece na fala, pois, no texto oral reproduzimos nossas intenções de
acordo com a entonação que damos ao pronunciar frases.
Tarefa 2
Distribuir para as crianças organizadas nos pequenos grupos, versões diferentes impressas de uma
adivinha aglutinada e lápis de escrever colorido para que elas possam discutir sobre a melhor forma de
segmentar as palavras (aqui serão distribuídos apenas uma folha e um lápis por grupo para que os
estudantes marquem o texto somente após as conclusões do grupo em que estão inseridos). Assim,
espera-se que as crianças façam as seguintes marcações, tendo como base o exemplo de adivinha dado
nesta aula.
QUAL O PÁSSARO QUE EM GAIOLA NÃO SE PRENDE, POR MAIS ALTO QUE
ELE VOE PRESO VAI E PRESO VOLTA? RESPOSTA – PAPAGAIO DE PAPEL –
PIPA.
Após as discussões nos pequenos grupos, solicitar que coloquem no texto, os espaços necessários entre
as palavras no laptop educacional e posteriormente compartilhem suas respostas com o restante da
turma, escrevendo na lousa digital suas versões marcadas da adivinha. Abrir espaço para uma breve
discussão sobre as respostas compartilhadas para que cada grupo opine sobre o que mudariam no texto
dos colegas.
Tarefa 3
Apresentar aos grupos imagens de aves existentes no Estado e no Brasil, com o auxílio do computador
interativo, para que possam observar os diferentes tipos de aves existentes, logo após questiona-los:
Vocês conhecem algumas dessas aves? Qual/quais? Já viram pessoalmente?
Organizar juntamente com os alunos um gráfico sobre as principais aves relatadas pelos grupos, para
que observem as aves regionais mais frequentes.
Após a construção do gráfico perguntar aos alunos: Quais são as características das aves? O que elas
tem em comum? As respostas devem ser elaboradas nos pequenos grupos e digitadas no laptop
educacional.
Espera-se que os educandos cheguem à seguinte conclusão: Têm o corpo coberto de penas; possuem
bico; botam ovos; não possuem dentes; possuem ossos. Caso isso não ocorra poderão ser apresentadas
novas imagens de aves e feitas novamente as perguntas.
Socialização
No grande grupo fechar a aula, relacionando as aves às suas principais características durante a
apresentação das respostas de cada pequeno grupo.
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ANEXO J – Relato da atividade de ensino e aprendizagem desenvolvida com os alunos na etapa de emancipação.
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ANEXO K – Relato da atividade de ensino e aprendizagem desenvolvida com os alunos na etapa de emancipação
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