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UNIVERSIDADE DE SAO PAULO - USP INSTITUTO DE FISICA E FACULDADE DE EDUCACAO A SOLUGAO DE PLANCK PARA O PROBLEMA DA RADIACAO DO CORPO NEGRO (PRCN) E O ENSINO DA FISICA QUANTICA ERIKA REGINA MOZENA. COMISSAO EXAMINADORA: PROF. DR. JOAO ZANETIC - IF/USP tg, PROF. DR. CASSIO COSTA LARANJEIRAS ~IF/UnB PROF. DR. LUIS CARLOS DE MENEZES ~ IF/USP Dissertagdo apresentada ao Instituto CTT rnin parte dos requisitos necessarios a obtengio do titulo de Mestre em Ensino de Ciéncias — modalidade Fisica. yo \ eye INSTITUTO DE FISICA Servigo de Biblioteca ef Prof. Alberto Villani = 45. erat Presidente da Comissao de ‘ombo: Pés-Graduacao Interusj@@AULO el £ 2003 FICHA CATALOGRAFICA Preparada pelo Servico de Biblioteca e Informagao do Instituto de Fisica da Universidade de Sao Paulo Mozena, Erika Regina A Solugao de Planck para o Problema da Radiagao do Corpo Negro (PRCN) e o Ensino de Fisica Quantica. S4o Paulo, 2003 Disserta¢ao (Mestrado) Universidade de Sao Paulo Instituto de Fisica. Departamento de Fisica Experimental Orientador: Prof. Dr. Joao Zanetic Area de Concentragao: Ensino de Ciéncias Modalidade Fisica Unitermos: 1. Ensino de Fisica Quantica; 2. Historia da Ciencia; 3. Radiagao do Corpo Negro; 4. Planck. USP/IF/SBI-011/2003 A histéria da fisica no € somente a seqiéncia de descobertas experimentais e observagdes, seguidas pelas suas descrigSes matematicas: é também uma histéria dos conceitos. Para um entendimento do fendmeno a primeira condigdo é a introdugdo de conceitos adequados. Werner Heisenberg Os jovens deveriam ler Hist6ria da Ciéncia porque freqilentemente ensino universitério € extremamente dogmético, nfo mostrando como ela nasceu. Por exemplo, um estudante pode facilmente imaginar que 0 conceito de massa seja simples e intuitivo, o que nfo, corresponde a verdade hist6rica. Mario Schenberg ‘Ao André, o grande e verdadeiro amor da minha vida. MEUS MAIS SINCEROS AGRADECIMENTOS ‘Ao André, que além de compartilhar todos os aspetos da minha vida, também auxiliou de maneira impar na redagio deste, principalmente na elaboragdo e redagHio dos apéndices. A minha querida familia: pais Angelo ¢ Izabel; irmaos Aurea, Michele, Helen, Djo ¢ Bel; os cunhados Heitor, Rogério ¢ Joao ¢ meu querido sobrinho fearo. Agradego a eles simplesmente por tudo e por me compreenderem nesse perfodo complicado do mestrado. ‘Também gostaria imensamente de agradecer & minha querida prima Marisa que corrigiu to gentilmente o abstract para mim. ‘A minha segunda familia: Beatriz, Joo, Odete e Nelson, pelo apoio, incentivo ¢ pelo carinho com que fui recebida, propiciando-me um fecundo pouso para reflextio e trabalho. ‘Ao meu querido orientador Jotio Zanetic, pela opgo e predilecao original pelo tema, pela sua forga, entusiasmo, pelas longas conversas realmente agradaveis ¢ sua liberdade de trabalho. A CAPES, pelo imprescindivel ¢ importante apoio financeiro. ‘A todos os professores do nosso programa, com especial carinho para o Menezes, meu primeiro contato na pés-graduagdo € com o qual aprendi muito sobre o que é ser um educador. ‘Aos colegas do grupo de estudos do Joao Zanetic ¢ aos amigos do corredor de ensino, especialmente & querida amiga Cristina, Luciana, Zé, Alexandre, Bete, Armando, Lilian, Graziela, Walkiria, Marcos, Bete Gaticha, Cristian ¢ Marcelo. A cara Lola, que durante a minha estada em Sao Paulo, ofereceu-me 0 conforto, a dedicagdo ¢ 0 carinho de um verdadeiro lar. ‘Ainda nfo posso deixar de expressar minha gratidio, carinho e reconhecimento & minha orientadora de iniciagdo cientifica na graduag&o Maria José P. Monteiro de Almeida a0s amigos do grupo de Estudos em Ciéncia e Ensino (gepCE-Unicamp). Eles proporcionaram de uma maneira muito agradavel ¢ importante a minha iniciagdo no mundo da pesquisa em ensino de fisica. SUMARIO CONSIDERAGOES INICIAIS. APRESENTAGAO.. I- BREVE HISTORIA INTERNALISTA. 1. A RADIAGAO TERMICA E 0 PROBLEMA DA RADIACAO DO CorPO NEGRO (PRNC) 1.1. Estudos iniciais sobre a radiagdo térmica 1.2. A nocdo de corpo negro e sua equivaléncia com a radiagio de cavidade .. 1.3. Primeiros resultados: a lei de Stefan-Boltzmann e as leis de Wien . : ae 1.4. Alguns desenvolvimentos experimentais envolvendo os primeiros resultados do estudo da radiagao do corpo negro.. : é 25 1.5. O teorema da eqiiparti¢do da energic ae 1.6. O desenvolvimento de Rayleigh e a correedo de Jean: 2. O TRABALHO DE PLANCK. 2.1, Planck e seus trabalhos anteriores a 1900... 2.2, Os artigos de 1900... Ee 3. DESENVOLVIMENTOS POSTERIORES. : ‘ 43.1, Repercussdo e conseqiiéncias da soluedio de Planck para o PRCN... 3.2.0 trabalho de Einstein .vvcsvrservrrnn Be 3.3, Alguns dos trabathos posteriores de Planck... 3.4. O Primeiro Congreso de Solvay. I= 0 FUNCIONAMENTO DA CIENCIA, A EDUCACAO CIENTIFICA E OS MANUAIS DIDATICOS: DISTORCOES PARA A FISICA E 0 SEU ENSINO. 1. O REFERENCIAL TEORICO: A EPISTEMOLOGIA DE THOMAS S. KUHN 1.1. A origem de um novo paradigma: a fisica quéntica cen nEnS7, 2. A CONCEPCAO SOBRE A CIENCIA PROMULGADA PELA EDUCAGAQ CIENTIFICA EOS MANUAIS DIDATICOS 59) 3. A HISTORIA E A FILOSOFIA DA CIENCIA NOS MANUAIS DIDATICOS: ADULTERANDO A FISICA EO SEUENSINO 6 PREPARANDO OS FUTUROS CIENTISTAS E PROFESSORES DE FiSICA TAMBEM PARA EVENTUAIS. REVOLUGOES: DIMINUICAO E FLEXIBILIZAGAO BOS CONTEUDOS, HISTORIA E FILOSOFIA DA CIENCIA... 68 III - 0 ENSINO DO PROBLEMA DA RADIAGAO DO CORPO NEGRO E OS TEXTOS ACADEMICOS. soe 74 1. DIFICULDADES DE ABORDAGEM DO PROBLEMA DA RADIACAO DO CORPO NEGRO (PRN) 74 1.1, Abordagens superficiais. S ae a 1.2.Enfase nos desenvolvimentos tedricos em detrimento aos experimentais 7s 1.3, Distoredes da histéria do PRCN... 2 78 2. O PROBLEMA DA RADIACAO DE CORPO NEGRO EM ALGUNS TEXTOS ACADEMICOS 9 21, Andlise do texto referente ao livro de Eisberg ¢ Resnick (1994) . . 60 2.2. Andlise do texto referente ao livro de Tipler (1981) . é 88 2.3. Comentdrios gerais das andlises .... . 91 1V-UM EXEMPLO DE INOVACAO: A DISCIPLINA EVOLUGAO DOS CONCEITOS DA FISICA 95 1. A DISCIPLINA E SUA DINAMICA. 2. O CONTEUDO E AS INTENGOES DAS NOTAS DE AULA SOBRE O PRC! 3, AS DIFICULDADES DE ABORDAGEM DO PRCN NASNOTAS DE AULA. 4, SUGESTOES PARA AMPLIACAO E MELHORIA DO MATERIAL ... 5, APROFUNDANDO MELHOR 0 SIGNIFICADO E OS OBJETIVOS DA DISCIPLINA V— DISCUSSOES FINAIS: APONTANDO ALGUNS DOS PROBLEMAS DO ENSINO DO PRCN E AMPLIANDO SEU POTENCIAL PEDAGOGICO. 15 VI-BIBLIOGRAFIA. APENDICE I- DERIVAGAO DA LEI DE KIRCHHOFF...... APENDICE 1-0 DESENVOLVIMENTO DE BOLTZMANN NEGRO.. APENDICE IV - ANALISE COMBINATORIA ‘APENDICE V - ATIVIDADE DE ESTUDO E APLICACAO.. RESUMO Este trabalho tem por objetivo estudar e propor alternativas para o ensino do Problema da Radiago do Corpo Negro (PRCN) e sua solugio estabelecida por Planck. Para alcanar esse empreendimento, nosso estudo foi dividido em quatro partes: © Compilamos, a partir da literatura ¢ da leitura de alguns originais, um breve histérico com varias dedugbes fisicas da radiagdo térmica, do PRCN e sua solug&o por Planck. Com isso, além de ganharmos embasamento para as andlises subseqientes, também disponibilizamos um texto para o aprendizado do PRCN por estudantes de fisica, que procura conjugar aspectos conceituais, mateméticos, histéricos e metodol6gicos. «© Tragamos, baseados na epistemologia de Thomas Kuhn, um panorama da educagio cientifica, cujo principal instrumento é o manual didético. Observamos que na busca por sintese € para manter ¢ propagar a visio cumulativa, linear, objetiva e racional da ciéncia, os manuais didéticos distorcem a propria fisica e 0 seu ensino. ‘© Analisamos a abordagem de dois textos sobre 0 PRCN de manuais didaticos de Fisica Moderna, tendo como pano de fundo algumas das dificuldades de abordagem do PRCN apontadas pela literatura. * Contrapomos os problemas das abordagens dominantes a outra que consideramos inovadora: aquela utilizada em parte da disciplina “Evolugao dos Conceitos da Fisica” do Instituto de Fisica da USP — So Paulo, quando ministrada pelo orientador desta dissertacao. Com relagfio ao ensino do PRCN e sua solugao por Planck, a andlise de alguns textos pretensamente diddticos sobre 0 assunto nos mostrou que @ utilizagfo desse contetido para ensinar a quantizagdo de energia nfo esta atingindo seus objetivos. Ao utilizar abordagens superficiais e sintéticas, esses textos promovem distorgdes para a fisica, © fazer cientifico e a sua histéria. ‘A anilise da abordagem do PRCN bastante detalhada na disciplina “Evolugao dos Conceitos da Fisica”, cuja estrutura se aproxima mais aos nossos anseios pedagégicos em contraposigiio as abordagens dominantes que analisamos, nos mostrou que os problemas apontados podem ser minimizados. ‘A partir desses resultados e da nossa pretenstio em formar pesquisadores ¢ professores autOnomos, criticos, reflexivos que possam realmente dominar e aplicar 0 conhecimento fisico, sugerimos, entZio, a ampliagdio da discusstio sobre a radiagdo térmica 0 PRCN para outras disciplinas e dreas do ensino de fisica. ABSTRACT The purpose of this work is to study and propose alternatives to the Black Body Radiation Problem (PRCN in Portuguese) and its solution established by Planck. In order to reach this undertaking, our study has been divided in four parts: © We have compiled a brief historic with a lot of physical deductions of the thermal radiation, the PRCN and its Planck’s solution, using the literature and some original papers. This way, we gained structure for the subsequent analysis, and we disposed a text for the physics students learn the PRCN, which intend to conjugate the conceptual, mathematical, historical and methodological aspects. + By using Thomas Kuhn epistemology, we have traced a scientific education panorama, whose main instrument is the didactic manual. We observed that, on its search for synthesis and to maintain and to propagate the cumulative, linear, objective and rational science view, these manuals distort the proper physics and its learning. © We have analyzed the PRCN approach present in two Modern Physics didactic manuals, resting this analysis on the difficulties of the PRCN approach pointed by the literature. © We compared the problems in the dominant approach to another which we consider an innovation: the approach present in part of the Physics Institute (at USP-Sdo Paulo) class “Physics Concepts Evolution”, when it is ministered by this thesis adviser. ‘The analysis of some didactic texts showed us that their objectives (to teach the energy quantization) haven't been reached. When superficial and synthetic approaches are used, these texts distort Physics, the scientific doing and its history. ‘The analysis of the detailed PRCN approach present in the class “Physics Concepts Evolution”, whose structure is closer to our pedagogic wishes compared to the analyzed dominant approach showed us that the pointed problems could be minimized. From these results and our pretension to graduate autonomous, critic and reflexive researchers and teachers, which could actually dominate and apply the physics knowledge, wwe suggest the increase of the thermal radiation and the PRCN discussions to others class and areas of physics teaching. CONSIDERACOES INICIAIS ‘Almejamos fornecer algumas explicagdes sobre os objetivos deste trabalho. Em primeiro lugar, gostariamos de deixar muito claro que este no é um trabalho histérico, de maneira que nfo estamos mostrando nada de novo sobre o PRCN e justamente por essa. razio nio recorremos a leitura de textos originais da ciéncia (embora efetuamos a leitura de alguns), mas sim a historiadores que desenvolveram trabalho sério sobre 0 assunto. Nosso principal intento em delinear neste um breve histérico sobre 0 PRCN € fornecer subsidios para se entender e pensar a histéria e a propria Fisica envolvida no problema, mostrando assim a producio cientifica dos historiadores de uma maneira didatica para um piblico especifico ¢ nao leigo, visando atingir principalmente estudantes de Fisica. Também é importante o leitor estar atento ao fato de que os desenvolvimentos mateméticos ¢ a prépria denominago de constantes que utilizamos neste trabalho foram muitas vezes simplificados para a construgéo de um texto didatico e coerente em si. Por exemplo, muitos cientistas ao trabalharem com um mesmo fendmeno, ou grandeza fisica, podem designé-lo de maneira diferente a outros; procuramos, assim, em cada desenvolvimento deste trabalho, utilizar as grandezas fisicas que julgamos mais apropriadas para a compreensio dos fenémenos, mesmo que estas néo tenham sido as utilizadas historicamente em textos originais. ‘Também este ndo pretende ser apenas um trabalho em defesa do uso da histéria da ciéncia no ensino. Sobre esse assunto existem muitos outros trabalhos, ndo nos cabendo nem mesmo aqui cité-los. Nosso objetivo é diverso. Queremos criticar as abordagens utilizadas no ensino do PRCN, pautadas nos manuais didaticos, e mostrar, com o exemplo da disciplina “Evolugao dos Conceitos da Fisica”, uma abordagem historico-filos6fica que segue a nossa proposta pedagégica para o ensino de fisica. APRESENTACAO Neste trabalho procuramos analisar, avaliar e propor alternativas para o ensino do Problema da Radiagdo de Corpo Negro (PRCN) ¢ sua solugdo por Planck, assunto normalmente introdutério nas disciplinas de Fisica Moderna. A solugo do PRCN por Planck ¢ considerada por muitos como 0 inicio da Fisica Quantica, pois seu trabalho, nessa abordagem, € aquele no qual pela primeira vez foi estabelecida a quantizagdio da energia. Seguindo essa linha de raciocinio, uma gama de manuais didaticos, com contetdo pouco variado, apresenta o PRCN com o objetivo explicito de ensinar ¢ exemplificar a quantizagdo da energia. No entanto, uma anélise mesmo superficial destes relatos, mostrando excessivas distorgdes da historia da ciéncia, além da deturpagao e omissao da termodindmica do trabalho de Planck, coloca 0 assunto como importante tema de estudo e reflexio para a pesquisa em ensino de fisica. Certos da necessidade e importancia deste trabalho, como um mergulho inicial no tema e na sua complexidade, desenvolvemos um estudo sério, mas ainda superficial, da histéria e da fisica da questo. Como resultado, apresentamos no capitulo I um breve hist6rico do PRCN, tendo como referencial a epistemologia de Thomas Kuhn, pensada principalmente a partir da leitura de “A Estrutura das Revolugées Cientificas”. Baseados nessa maneira de interpretar o funcionamento da ciéncia, discutida brevemente no capitulo Il, passamos a analisar a educagdo cientifica, a qual procura divulgar € consolidar os paradigmas vigentes, além de manter e propagar idéias arraigadas sobre 0 fazer cientifico. Como o treino cientifico é realizado principalmente através da resolugao de exercicios semelhantes e modelados da mesma forma, este € principalmente pautado nos manuais didaticos. Ainda no capitulo II discutimos a maneira como esses textos sintetizam e simplificam 0 conhecimento fisico, além de distorcerem a histéria mantendo uma concepgo de ciéncia objetiva, cumulativa, racional e livre de conflitos internos. Apresentamos, também no capitulo Il, nossa visdo ideal de educagao cientifica, Cujo objetivo se baseia na formado de profissionais em ciéncia (pesquisadores ¢ rofessores) aut6nomos, criticos e reflexivos. Almejamos, de certa maneira, preparé-los ara eventuais futuras crises e revolugGes cientificas. Acreditamos que isso seja possivel se © ensino da ciéncia selecionar, flexibilizar e problematizar melhor seus contetidos, diminuindo a importancia dos manuais didéticos ¢ minimizando seus efeitos que julgamos © apontamos como nocivos. a nl Tendo como referencial nossa discussio sobre o funcionamento da educagio cientifica, seus problemas intrinsecos ¢ as principais dificuldades de abordagem do PRCN apontadas pela literatura, procuramos analisar no capitulo IIT como esse tema ¢ tratado nas disciplinas de Fisica Modema. Como a educago cientifica é pautada nos manuais didéticos, a avaliagiio das abordagens sobre 0 PRCN em dois livros nos forneceu um bom diagnéstico desse ensino. Verificamos que este, normalmente, é pautado em abordagens superficiais ¢ sintéticas, as quais ocasionam distorgSes para a ciéncia, o fazer cientifico sua historia. No capitulo IV contrapomos as abordagens dominantes a outra inovadora, que se aproxima mais da nossa proposta pedagdgica discutida no capitulo II. Trata-se da abordagem hist6rico-filoséfica empreendida para 0 PRCN como contetido de parte da disciplina “Evolugo dos Conceitos da Fisica” do Instituto de Fisica da USP - So Paulo, quando ministrada pelo orientador deste trabalho. Procuramos mostrar, através da exposigdo da disciplina e anélise das notas de aula, os objetivos especificos e as estratégias através das quais esta procura enriquecer o ensino da ciéncia. Retomando e encerrando as anilises desenvolvidas a0 longo deste trabalho, empreendemos no capitulo V as discusses finais, delineando os prineipais problemas que detectamos nos manuais didaticos sobre 0 PRCN e sugerindo, baseados na proposta da Gisciplina “Evolugaio dos Conceitos da Fisica”, a modificago ¢ ampliag&o da utilizagao desse tema, que é rico demais para se restringir a introdugo do estudo da fisica moderna. ie I- BREVE HISTORIA INTERNALISTA. Gostarfamos de iniciar este trabalho com algumas consideragées sobre a historia da fisica que nés estamos pensando. Existem diversas concepgées de histéria e no é nosso objetivo discuti-las aqui!. Embora julgamos que os aspectos sociais nfo devam se separar dos aspectos internos na (re)construgdo da histéria da ciéncia, considerar os aspectos sociais envolvidos em nosso tema histérico de estudo consistiria sozinho em um objeto de pesquisa, dada a escassa literatura sobre o assunto. Dessa forma, optamos por discutir de maneira breve, porém com maior profundidade em relag&o ao material que ha disponivel em lingua portuguesa, uma breve historia epistemologica interna’ do Problema da Radiag&o do Corpo Negro (PRCN), através da qual almejamos exemplificar 0 nosso ideal por uma histéria da ciéncia “que procura descobrir, analisar e avaliar como os problemas surgiram, foram investigados, tiveram solugo ou desapareceram de cena”? Embora saibamos que n&o atingimos plenamente os objetivos citados acima, acreditamos que cada uma das nossas tentativas contribui para isso. 1. A radiagio térmica ¢ o Problema da Radiaciio do Corpo Negro (PRNC) Por volta da metade do século XIX, houve um grande desenvolvimento industrial e bélico, de maneira que a indtistria siderirgica expandiu-se de forma acelerada. Contudo esse desenvolvimento esbarrava num fator de dificil controle, porém necessério para melhorar a qualidade da produg&o de ago: precisar a temperatura dos altos fornos siderirgicos*. Um termémetro comum, e mesmo os termopares pouco fariam face as elevadas temperaturas dessas fornalhas®. Uma possivel solugao para esse problema seria utilizar a radiag&o eletromagnética (luz) proveniente do forno para a determinagao da temperatura. Ja era observado o fato de que com o aumento da temperatura, a cor do forno se modificava, passando desde o ' Esse assunto est discutido com bastante profundidade em Zanetic (1989), p. 104. ? Podemos dizer simplificadamente que a historia epistemolégica é aquela pautada em alguma concep¢io filoséfica, ou seja, pautada em uma visio sobre o funcionamento da ciéncia, Entendemos também por historia interna da ciéncia aquela na qual s6 so levados em consideragao os aspects intemnos ¢ intrinsecos dos desenvolvimentos cientificos, sem a andlise das condigées sécio-econdmicas. * Zanetic (1989), p.129. “ Osada (1972), p. 48. * A temperatura necesséria A produgdo de ago é da ordem de 1500 °C, que pode variar conforme a liga. A vermelho, depois para uma tonalidade alaranjada, amarelo, até atingir uma coloragao branco-azulada. Hoje sabemos que um forno ou qualquer objeto aquecido emite um amplo espectro continuo de radiagdo eletromagnética (luzes de diversas cores, inclusive nfo visiveis) e a esse fenémeno damos o nome de “radiagfio térmica”. Conforme a temperatura desse corpo aumenta, a emissio mais intensa ocorre para comprimentos de onda diferentes, dai a mudanga da cor que vemos. Quando o objeto tiver atingido a temperatura do corpo humano, pico de radiagio estaré no infravermelho longo [néo visivel]. O corpo humano irradia também ondas de radio, mas os comprimentos de onda mais curtos e mais energéticos sio sempre mais ficeis de serem detectados e, portanto, tornam-se os mais acentuados. Assim que © objeto atingir a temperatura de aproximadamente 600°C, 0 pico de radiagdio se deslocaré para o infravermelho curto. Nesse ponto, entretanto, a pequena quantidade de radiagfo do lado mais energético do pico torna-se particularmente significativa, pois ela atinge a regio da luz vermelha visivel. A cor do objeto torna-se, entio, vermelho-escura. Este vermelho constitui apenas uma pequena porcentagem da radiag&o total emitida, mas como somos capazes de vé-lo, damos-lhe toda a atengao e dizemos que 0 corpo esta “aquecido ao rubro”. A medida que a temperatura subir ainda mais, 0 pico de radiagaio continua a deslocar-se para comprimentos de onda mais curtos e cada vez mais luz visivel de comprimentos de onda mais ¢ mais curtos é emitida. Embora a luz vermelha seja a mais irradiada, luzes de coloragio alaranjada e amarela so acrescentadas em quantidades menores, mas significativas. A temperatura de 1.000°C, a mistura de cores se nos apresenta de cor alaranjada, e ld pelos 2.000°C, de cor amarela, Isso néo significa que apenas a luz. alaranjada seja irradiada a 1.000°C e apenas amarela a 2.000°C. Se esse fosse 0 caso, seria realmente de esperar que a seguir 0 objeto se apresentasse como “aquecido ao verde”. Mas nao podemos esquecer que 0 que vemos sto misturas de luzes. No momento em que 6.000°C for atingido (a temperatura da superficie do Sol), 0 pico de radiacao estara no amarelo visivel e estaremos recebendo grande quantidade de luz visivel, desde o violeta até © vermelho. Toda a gama de luz visivel do espectro se nos apresenta com cor branca, de sorte que 0 Sol esta “aquecido ao branco”. Para objetos ainda mais quentes do que o Sol, todos os comprimentos de onda de luz. visivel continuam a ser irradiadas ¢ em quantidades ainda mais apreciveis. O pico de radiagdo desloca-se, porém, para o azul, de modo que a mistura nfo é perfeitamente balanceada a nossos olhos e o branco tem um matiz azulado. Tudo isso acontece para os objetos que quando aquecidos emitem © “espectro continuo”, irradiando luz numa ampla faixa de comprimentos de onda. Certas substancias, em condig6es apropriadas, irradiar&o luz de apenas determinados comprimentos de onda. O nitrato de bario irradia uz verde quando aquecido e & por isso usado em fogos de artificio. 4 Podemos entéo dizer que esté “aquecido ao verde”. (Asimov, 1990, p.83- 84) ‘Nio necessariamente a cor que vemos é aquela com emiss&o mais intensa, Pois esta liltima pode ocorrer para um comprimento de onda que nfo enxergamos, j4 que nossos olhos sao adaptados para ver apenas uma pequena faixa do espectro®, Esse fendmeno nao ocorre apenas em altos fornos de siderdrgicas. Todos os corpos emitem radiagao térmica (radiagao emitida devido a sua temperatura). Para os corpos “frios” (4 temperatura ambiente, por exemplo) a maior parte da sua radiagao térmica esté na regio do infravermelho, cuja percepgdo no € possivel aos nossos olhos. Por essa raziio no vemos esses corpos no escuro. S6 podemos vé-los devido a luz visivel (proveniente do sol ou lampadas, por exemplo) que é refletida por eles; embora seja importante salientar que existem alguns materiais que absorvem luz de comprimentos de onda fora da regidio do visivel, emitindo em seguida luz visivel, como o p6 que reveste as paredes das lampadas fluorescentes. Chamamos a vasta gama de comprimentos de onda que um corpo emite de espectro. Podemos representar graficamente, para determinada temperatura, a intensidade da emissdo de um corpo em fungao do seu espectro. Isso é que 0 chamaremos de curvas de distribuigdo de emissdo. Os fenémenos descritos, além de envolverem o eletromagnetismo devido a emissiio de radiagdo eletromagnética, também so objeto de estudo da termodinimica. Todo corpo absorve e emite radiagio do meio que o cerca. Absorvendo a radiagao que sobre ele incide, © corpo estd absorvendo energia. Para que a energia interna do corpo nao aumente progressivamente até o infinito, 0 corpo necesita doar energia, 0 que é feito na forma de energia eletromagnética também. Quando um corpo esta mais frio que 0 meio que o cerca, ele ird se aquecer, pois a taxa de absorgao de radiagfo do corpo é maior que a taxa de emissao (ou seja, 0 corpo absorve mais energia por unidade de tempo do que emite). No equilibrio térmico (ambiente e corpo na mesma temperatura) as taxas de absorgaio e emiss&io so as mesmas para 0 corpo. equilibrio de temperaturas entre os corpos se da pela condugiio também pela radiagdo de calor. A condugdo de calor é determinada pelo gradiente de temperatura em cada ponto enquanto a radiagdo de calor num ponto é caracterizada por varios fatores: pela direg&o, intensidade, ° Podemos situar os limites do espectro visivel entre 430 e 690nm. Contudo é possivel enxergar ‘comprimentos de onda ligeiramente fora desses limites, caso a luz seja suficientemente intensa. Is freqliéncia e polarizagdo de todos os raios que passam pelo ponto, sendo que estes raios so independentes entre si. 7 1.1. Estudos iniciais sobre a radiagaio térmica Historicamente o estudo da radiago térmica desenvolveu-se mais profundamente com a andlise da luz solar e o surgimento da espectroscopia. Podemos afirmar que essa Ultima nasceu no momento em que Newton decodificou a decomposi¢ao da luz branca através do prisma. Durante 0 século XIX a espectroscopia ganhou forga especialmente depois que Joseph von Fraunhofer (1787-1826) inventou o espectrosc6pio, que produzia espectros por um acoplamento entre Iuneta ocular e prismas. Esse dispositive experimental foi melhorado por Gustav Robert Kirchhoff (1824-1887) e Robert Bunsen (1811-1899), na segunda metade do século XIX. Em 1859, os dois chegaram a uma importante lei empirica: todo elemento quimico é caracterizado por um espectro que lhe é proprio. A partir dai ampliou-se 0 estudo da radiago emitida pelo sol: o espectro solar e sua composigg0. No mesmo ano, Kirchhoff procurou estudar a relag&o entre a tadiagao térmica e a temperatura, através do estudo das linhas de Fraunhofer do espectro solar. Ele verificou ser © s6dio um dos constituintes basicos da atmosfera solar. Chegou a esse resultado através da comparacao do espectro solar com 0 produzido pelo sédio incandescente. Esse estudo 0 levou a outro trabalho lido na Academia de Ciéncias de Berlim em dezembro de 1859, 0 qual tratava sobre o problema da emissio e absorg&o de radiago pela matéria. Neste ele mostrava que (...) para raios de mesmo comprimento de onda, & mesma temperatura, a razio do poder de emissio para a capacidade de absorgéio é a mesma para todos os corpos.* Essa proposigao ficou conhecida como a Lei de Kirchhoff, A primeira vista pode Parecer uma proposi¢ao sem muita importancia, mas ela é fundamental e provavelmente instigou as pesquisas sobre o assunto, pois surgia ai um absoluto na natureza. Simplificando, poderiamos dizer que este enunciado revela que a relacdo entre a emissio e absorgao de radiagdo por um corpo para uma dada temperatura é sempre a mesma, independentemente da natureza e constituicHio do corpo”. 7 Planck, Theory of Heat, citado por Albuquerque (1988). * Jammer (1966), p.2. Citado por Zanetic (1999), p. 102. * Fleming (2001, p.4) acredita que a aplicagio da lei de Kirchhoff que mais teria interessado a ele mesmo setia 0 fato de comprovar um resultado anterior seu: um corpo nao emite uma freqéncia que nfo absorva. 16 Para chegar a essa concluséo enunciada acima, Kirchhoff calculou as condig6es de equilfbrio para a troca de radiagio entre duas placas paralelas infinitas, revestidas por superficies refletoras ideais do lado de fora. Kirchhoff assumiu que a primeira placa (1) absorveria ¢ emitiria radiagio somente de comprimento de onda A, restrigdio no imposta & segunda (2). Com esse artificio o problema se restringia apenas a troca de radiagao com comprimento de onda ) entre as duas placas, j4 que outros comprimentos de onda seriam reabsorvidos pela segunda placa apés repetidas reflexdes. Como no equilfbrio a energia absorvida é igual A energia emitida, o que pressupde uma temperatura constante ¢ igual para ambas as placas, Kirchhoff chegou ao seguinte resultado, que exprime matematicamente sua lei!°: Pa. Pa Og ay Em que P12 € 0 poder emissivo (a energia irradiada no comprimento de onda 4 por unidade de tempo!) para a primeira placa, e ay, € 0 poder absorvente”? (a fragdo da energia absorvida da radiagdo incidente com comprimento de onda 2). Os simbolos Pz, e 42, cotrespondem as mesmas grandezas para a segunda placa. Essa lei expressa a caracteristica dos corpos de que quanto maior a fragiio de energia que ele absorve, mais ele emite, j4 que a razo (1) tem um valor constante.'? Simultaneamente as publicagdes de Kirchhoff, Balfour Stewart (1828-1887) estabeleceu independentemente a validade dessa lei baseado em medidas experimentais'*. Como ressalta Fleming (2001, p.4-5), é importante, ao se estudar a histéria do estudo da radiago térmica, estar atento ao fato de que Kirchhoff descreveu a radiagaio sempre sob a forma de raios, o que nfo fazemos atualmente, Hé também o aspecto de que © problema do equilibrio da radiagéo com a matéria envolve calor radiante e luz, na época coisas distintas. Os trabalhos de Maxwell, que propuseram a luz como radiagio eletromagnética dentro de um certo intervalo de freqiiéncias, apareceram gradualmente entre os anos de 1860 e 1865, enquanto que o grande trabalho de Kirchhoff foi publicado '° 0 desenvolvimento completo dessa lei esté no apéndice I 1 Note que poder emissivo é uma medida de poténcia (energia por tempo). ” A nomenclatura em portugués para as grandezas fisicas descritas foi extraida de Gibert (1982). Em Segré (1987) a grandeza nomeada em nosso texto como poder absorvente & descrita como poder de absoredo. '® Para o estudo do corpo negro isso é importante, pois com uma absoredo total (a,=1), sua emissio ‘maxima, Portanto o corpo negro seria um emissor ideal. 7 em 1860. Nada se sabia entio da natureza eletromagnética da luz e era corrente o pensamento de que a luz s6 existia no intervalo visivel, sendo a radiagao térmica outro fendmeno fisico. ‘Também € importante ter em mente que o processo e a resolugdo do problema da tadiagdio do corpo negro, foram desenvolvidos sob a crenga (ou diivida) da existéncia do ter, o qual era parte integrante dos desenvolvimentos te6ricos, principalmente porque a radiagdio se propagava pelo éter € no interior da cavidade também existia esse “fluido etéreo”. No entanto, em nenhum dos desenvolvimentos histéricos que estudamos os autores discutiram essa questo. A auséncia da nogdo de éter, por exemplo, na solugao de Planck do PRCN foi motivo de criticas na época. 1.2. A nogio de corpo negro e sua equivaléncia com a radiagao de cavidade Em 1860, Kirchhoff introduziu a nogao idealizada de corpo perfeitamente negro, ou corpo negro. Para facilitar a compreensao desta idéia, vamos recapitular alguns conceitos basicos da fisica. Podemos dizer (numa anélise macroscépica) que quando a luz incide sobre qualquer superficie trés fendmenos podem ocorrer (mesmo simultaneamente): parte da luz € refletida pelo objeto, outra parte é absorvida e ainda ha a possibilidade de outra parte ser transmitida pela superficie. Quando vemos um objeto que no é uma fonte priméria de luz, nossos olhos captam a luz visivel que foi refletida por este. Assim, quanto mais luz 0 objeto absorver ou transmitir, menos ele ird refletir e menos luz chegaré aos nossos olhos oriunda do objeto. Dessa maneira, veremos o objeto cada vez mais escuro. Se toda luz visivel que incidisse num corpo fosse absorvida pelo mesmo e nada fosse Tefletido, esse objeto seria perfeitamente preto. A nogao de corpo negro, no entanto, é um pouco mais sofisticada, pois um corpo negro € aquele que absorve toda a radiago que sobre ele incide, visivel ou nao, sem reflexdo ou transmissio; ou seja, a taxa de absorgéio de radiagdo € igual a 1 (100%), por isso a analogia com um objeto preto, que absorve toda a luz visivel, sendo o preto a auséncia de cor. A diferenga esta no fato de que o corpo perfeitamente negro nao absorve apenas a radia¢aio na regiéio do visivel, mas todo o espectro’, '* Jammer (1966), p.4. ' Newton j havia falado em corpo negro em seu livro Optica: “os corpos negros conservariam o calor mais. Facilmente da luz que aqueles de outras cores”. Citado por Jammer (1966), p. 4, nota 10. a E importante notar que essa nogio é uma idealizago, pois corpos perfeitamente negros no existem'®. Como Trigg (1971) afirma: “este tipo de idealizagdo é bastante comum na ciéncia, e & especialmente vdlida quando, como serd visto ser verdadeiro no presente caso, a situacdo ideal pode ser aproximada na realidade” (p.5). No caso do corpo negro, sua_idealizac&o provavelmente’” foi baseada no fato de que, independentemente da sua constituig4o, a sua emisso (ou seja, 0 seu espectro) seria sempre a mesma, Também ha o aspecto de que como 0 corpo negro absorve toda a tadiago que sobre ele incide (poder de absorgao a;=1), pela lei de Kirchhoff a sua emisso é méxima, sendo assim um emissor ideal. Portanto, a nog&o de corpo negro se mostrava como um absoluto na fisica, fato que Ievou muitos cientistas a estudar o assunto com afinco, principalmente Planck'®, Com relagzio 4 aproximagiio com a realidade na pesquisa da radiago de corpo negro, encontré-la-emos no Sol. Podemos aproximé-lo para um corpo negro pois a radiago que sobre ele incide passa por reflexdes sucessivas sendo quase que completamente absorvida. No entanto, com relago & emissio, 0 Sol nfo possui um espectro continuo como o de um corpo negro, pois apresenta algumas linhas escuras, conhecidas como linhas de Fraunhofer, que representam os comprimentos de onda absorvidos pelos dtomos presentes nas camadas mais exteriores do Sol. O primeiro a observar tais linhas foi William Hyde Wollaston (1766-1828) em 1802. Em 1814, Fraunhofer contou cerca de 574 dessas linhas no espectro solar e identificou varias delas por letras. Planck sugeria que um corpo negro deveria satisfazer trés condigdes independentes, reforgando 0 caréter sofisticado dessa nogao: Primeira, 0 corpo deve ter uma superficie negra a fim de permitir que os raios incidentes entrem sem reflexio. Desde que, em geral, as propriedades de uma superficie dependem dos dois corpos que est’io em contato, esta condigo mostra que a propriedade de negrume aplicada a um corpo depende néo somente da natureza do corpo, mas também daquela do meio contiguo. Um corpo que € negro relativamente ao ar © Por definigao poderfamos considerar um buraco negro como um corpo negro. No entanto, uma discuss mais aprofundada sobre o assunto deveria analisar se a emiss4o de um buraco negro fornece um espectro de corpo negro, discussdo que foge ao escopo deste trabalho. "” Dizemos provavelmente, pois essa afirmagio nao se encontra explicitamente em nenhuma literatura que consultamos. Essa é uma inferéncia que fizemos a partir do estudo que realizamos. '® Conforme o proprio Planck narra em sua autobigrafia sobre a radiago do corpo negro: “.. radiagio, em todas suas propriedades incluindo sua distribuigo espectral de energia, nao depende da narureza dos corpos, mas somente e exclusivamente da temperatura. Portanto, esta assim chamada distribuigdo normal de energia espectral representa algo absoluto, ¢ uma vez que eu sempre considerei a procura por absoluto como o principal objetivo de toda a atividade cientifica, eu ansiosamente me pus a trabalhar” (p. 34-35). 19 Pode nio sé-lo relativamente a0 vidro, e vice versa. Segunda, 0 corpo negro deve ter uma certa espessura minima dependente do seu poder absorvente, a fim de assegurar que os raios apés passarem para 0 corpo no serfio capazes de deixé-lo de novo num diferente ponto da superficie. Quanto mais absorvente um corpo é, menor o valor dessa espessura minima, enquanto que no caso de corpos com poder absorvente excessivamente pequeno somente uma camada de espessura infinita pode ser considerada negra. Terceira, um corpo negro deve ter um coeficiente de espalhamento excessivamente pequeno. Caso contrario os raios recebidos por ele seriam parcialmente espalhados no interior e podem deixé-lo de novo através da superficie. (Planck, 1959, p.10) Como um corpo negro tem superficie negra, caso ele existisse ¢ estivesse “frio” (Pico de emisstio no infravermelho) nao o veriamos, jé que nenhuma radiagio é refletida Por ele. No entanto, quando aquecido, seu pico de emissao poderia chegar préximo a faixa do visivel, de maneira que o veriamos como uma fonte de luz. Kirchhoff também mostrou que a emissio de radiagiio para um corpo negro é da mesma “qualidade e intensidade”'? que a radiagio dentro de uma cavidade de paredes adiatérmicas” e temperatura 7. Ou seja, ele mostrou que o estudo de um corpo negro Poderia se restringir ao da emissiio de tal cavidade”'. Dessa maneira o estudo da radiagiio de corpo negro aproximava-se ainda mais da realidade. A radiago no interior dessa cavidade tem origem nas paredes da mesma, e segundo TRIGG (1971, p.7) Kirchhoff mostrou que esta radiagéio é isotrépica (a mesma em qualquer diregaio) e homogénea (a mesma em todos os pontos da cavidade). Se a radiagiio fosse mais intensa em alguns pontos que em outros, absorvedores idénticos em pontos distintos teriam temperaturas diferentes e poderiam ser utilizados um como fonte e outro como depésito de uma méquina térmica que produziria trabalho indefinidamente, visto que a radiagdo na cavidade manteria a temperatura dos reservatérios térmicos. Para entendermos melhor a equivaléncia de emissio entre 0 corpo negro e a radiago no interior da cavidade, vamos supor que um corpo nfo negro a temperatura T seja colocado no interior de uma cavidade em equilibrio térmico a mesma temperatura. A energia emitida pelas paredes da cavidade em forma de radiag#o com comprimento de '® Citado por Jammer (1966), p. * Adiatérmica é uma superficie que nfo permite a passagem de radiacdo térmica. * Acreditamos que o objetivo da equivaléncia proposta por Kirchhoff entre corpo negro ¢ a radiagdo de cavidade tenha sido feita com o intuito de facilitar o tratamento matemitico do estudo do corpo negro, assim Como também éalvez facilitar a experimentagio ou mesmo fazer a analogia com os fornos. Essa equivaléncia € importante. Ela facilita 0 célculo, pois no interior da cavidade é possivel obter os modos estacionarios da 20 onda entre 2 e A+dA, por unidade de tempo ¢ drea a temperatura 7, & Ry (radidncia espectral). Como essa radiaglo & homogénea, a energia por unidade de tempo e Area que incide sobre o corpo também é R;. Essa radiagio, entio, é parcialmente absorvida pelo corpo. A fragio de energia absorvida com comprimento de onda A pelo corpo (a, = poder absorvente) depende da temperatura, assim como da composigdo do material da superficie do corpo nfo negro. No equilibrio, as taxas de energia emitida absorvida pelo corpo devem ser iguais. Assim, sendo Ric a radifincia espectral do corpo, temos: Taxa de emissio (t, 4, 4) = Taxa de absoredo (t, 2, A), Ric = a,Ri Q) Agora, suponha que na mesma cavidade € colocado um corpo negro. Nesse caso, a radiago emitida pela cavidade serd totalmente absorvida pelo corpo negro (pois, por sua definigdo, azcy=1). Assim o balango de energia, como feito para 0 caso anterior fica: Racw= Ra (3) Esse resultado mostra que a emissdo de radiagdo no interior da cavidade é equivalente emisstio de um corpo negro. Usando os resultados das equagées (2) e (3) temos entfio que: Racy =F (I, A) =Ric/a, (4) * Ou seja, a partir do conhecimento da emisso (espectro) de um corpo negro F(T,Ay*, e do conhecimento do poder absorvente™ a, de um dado corpo, sua emiss%io espectral Ric podia entéo ser conhecida’*. A partir desse resultado passou entiio a ser Tadiagdo eletromagnética, de maneira que é possivel quantificar a densidade de energia em suas paredes € conseqiientemente a sua emissio. ® Note que a esséncia desse resultado pode também ser extraido diretamente da lei de Kirchhoff’ [equagao (1)] fazendo-se dicy = 1. Essa formulagéo evidencia outra caracteristica importante dos corpos negros, a de que a sua emissdo independe da sua composigao, jé que o poder absorvente do corpo negro (grandeza que ‘“carrega” a informagao do material) tem valor fixo igual a 1. ? Fungo universal que dependia apenas da temperatura e do comprimento de onda. ** Ainda que este dependa do comprimento de onda e da temperatura. * Experimentalmente falando é mais simples 0 processo reverso, ou seja, aquele que busca conhecer a poder absorvente dos materiais (q,) através do conhecimento da fungio de distribuigio do corpo negro e da determinagio de Ric. ai muito importante a determinagfio tanto tedrica como experimental da radiag&o de corpo negro, ou seja, F(T, 4). Embora aparentemente a determinagdo dessa fungio se mostrava ficil, teoricamente exigiria apenas a pericia de um cientista habilidoso, nfo foi o que aconteceu € varias tentativas nao lograram éxito durante o final do século XIX. No entanto esse problema no era considerado de muita gravidade na época, a0 contrério do que muitos autores apontam. Atualmente, denominamos a tentativa de solugo deste como o Problema da Radiago do Corpo Negro (PRCN). Sua importancia esté no fato de que esse problema se mostrou como uma anomalia cuja solugdo nfo se encaixava no escopo da fisica cléssica. Apés longa revolugo cientifica uma nova visio de mundo (paradigma) foi estabelecida: a fisica quintica, 1.3. Primeiros resultados: a lei de Stefan-Boltzmann e as leis de Wien Em 1865, John Tyndall (1820-1893) apresentou um trabalho no qual utilizava um fio de platina aquecido a duas temperaturas diferentes. Ele concluiu que a emissio total de tadiagao do fio a 1200 °C era cerca de 11,7 maior que a emissdo a 525°C. J4 em 1879, Josef Stefan (1835-1893), extraiu desses resultados de Tyndall’ que a emissao era proporcional a 7” (medida em Kelvin). Essa derivagao foi acidental, pois além de puramente empirica, foi baseada em apenas dois dados, e 0 fio aquecido nao correspondia a um corpo negro. Segundo Jammer (1966, p.6), uma moderna repetic&io do experimento de Tyndall forneceu como resultado uma razio de 18,22 ao invés de 11,7. Posteriormente, em 1884, “C. Christiansen sugeriu que pequenos buracos Produzidos em cavidades isotérmicas funcionariam como radiadores de corpo negro, isto 6, agiriam como pequenos pontos completamente negros” (Zanetic, 1999b, p. 107). ‘Nesse mesmo ano, Boltzmann (1844-1906), usando consideragdes termodinamicas € eletromagnéticas para o estudo da cavidade, mostrou que a densidade de energia desta deveria ser proporcional a 7”, tal como o fluxo emitido, formalizando assim o resultado ‘empirico obtido anos antes por Stefan. Para chegar a esse resultado Boltzmann partiu da nog&io de que a presséo da radiag&o (P) seria proporcional a densidade de energia’”. De acordo com a teoria de *°'No trabalho de Arruda (1992), que consultou o original de Stefan, é descrito que esse resultado foi obtido “analisando as observagées sobre a taxa de esfriamento de um grande termémetro de merctirio colhidas por Dulong e Petit” (p.6). ® Boltzmann usou para a dedugio te6rica da lei de Stefan o resultado de A. Bartoli, fisico italiano, que chegou a conclusiio de que a radiago exerce pressto. Em uma experiéncia de pensamento, Bartoli imaginou Maxwell ¢ a estatistica de Krénig’s, Boltzmann chegou & conclusio de que P = 1/3 1 (sendo 1 a densidade de energia radiante) e de que ao se variar o volume da cavidade, hhaveria variagio da temperatura e realizagio de trabalho”. Associando esse “gis de tadiagaio”” a temperatura T e pressiio P, ele chegou’” a utilizando uma notagdo mais moderna)a H=KT (5) sendo x uma constante de proporcionalidade. Conforme mostrado no apéndice II: © em que ¢ representa o fluxo (energia por area ¢ por tempo) de radiag&o que atinge as Paredes da cavidade. A partir deste resultado Boltzmann chegou a seguinte formulago: (or — @) Com a consideragao de que as paredes do corpo negro esttio em equilibrio, o fluxo de radiagio deve ser igual a radiancia total’! R da superficie. Portanto: R=oT4 (8) conhecida hoje como a Jei de Stefan-Boltzmann™2, Utilizando uma linguagem e desenvolvimentos mais modernos vamos tomar 0 brilho B, = B (v,7) como a energia emitida por unidade de freqiléncia no intervalo de va v+dy, por unidade de area, por unidade de Angulo sélido e por unidade de tempo na diregio normal a superficie no interior de um corpo negro temperatura T. A intensidade de radiagaio K; = K(A,7) * & andloga ao brilho, no entanto a anilise é para intervalo de que num proceso ciclico, com a ajuda de espelhos, podia-se transferir o calor na forma de radiagio de um corpo frio para um corpo quente. Uma vez.que a transferéncia de calor exige a produgdo de trabalho (2" lei da termodindmica), ele concluiu que a radiagao deveria, necessariamente, exercer uma certa pressao (Jammer, 1966, p. 7). 2 Martins (2000). Jammer (1966), p.7. °° © desenvolvimento de Boltzmann esta apresentado no apéndice II. A radiancia total éa integral da radidnciaespectral em todas as frequéncias, ouseja R= [R, dv. * E importante observar, como aponta Fleming (2001, p.7), que a “existéncia da pressiio de radiagéo, ea veracidade das formulas de Maxwell, s6 viriam a ser comprovadas experimentalmente em 1905, por Lebedev”, * Como algumas bibliografias utilizam B, e outras utilizam K,, procuraremos ao longo do texto utilizar as duas notages, utilizando como principal B,. Note que B, = B (v7) é proporcional a K; = K(A,7), jé que 2 De ave. Como B, dv’ K,, dA, com dv = ht, assim By comprimentos de onda. Note que, pela defini, Racy € proporcional a K, que correspondentemente € proporcional a By. Dessa maneira restringiremos a busca pela equago do corpo negro a busca por By. (ou K}). O primeiro fisico a fornecer uma tentativa coerente de anilise tedrica, obtendo uma fungdo de distribuigao espectral para a radiaglio de corpo negro, foi Wilhelm Wien (1864- 1928) em 1894. Ele inicialmente apenas esbogou a forma desta fungdo, baseando-se nas consideragdes termodindmicas e eletromagnéticas de Boltzmann e chegando a expresso: B=v'elYf) ov K,=2°s0T) ©) Wien notou™ que se fosse reduzido 0 volume da cavidade, como num pistio em movimento, a densidade de energia na cavidade aumentaria, j4 que a radiagao exerceria presstio sobre o pistiio, havendo assim realizago de trabalho durante a compressao. Também 0 movimento das paredes da cavidade ocasionaria uma mudanga no comprimento de onda da radiago refletida por efeito Doppler, jé que neste caso hé uma fonte luminosa (as paredes da cavidade) em movimento. Portanto, Wien concluiu que a mudanga de temperatura também altera a distribuigdo dos comprimentos de onda, de forma que a temperatura sempre esta associada com 0 comprimento de onda. Conforme descreve Trigg (1971), p. 8-9: As conseqiléncias quantitativas disto cram duplas. Primeiro, se sio feitas comparagées de coisas dependentes do comprimento de onda em duas temperaturas diferentes, n&o & exato comparar valores no mesmo comprimento de onda. Em lugar disso, ao se trabalhar na temperatura 7’, deve-se usar para comparacio com o comprimento de onda a na temperatura J um comprimento de onda A’ dado por: AT’=AT Em segundo lugar, as emitancias espectrais [equivalente no nosso texto a K,] para comprimentos de onda correspondentes nesta maneira variam com a temperatura de acordo com a relacdo: Ki Ky =T°/T* (10) Particularmente, se K;, (para uma temperatura fixa 7) tem um valor maximo Kimax no comprimento de onda Amar, entéo os valores de Kymax pata varias temperaturas satisfazem a relacao cujo resultado é conhecido como lei do deslocamento de Wien: * Toda essa discussio sobre a lei de Wien esta exposta em Trigg (1971), p. 8-9. Anacl’ = cons tante ou Te constante (11) Essa lei, portanto, expressa 0 fato de que para a distribuiggo espectral de corpo negro, com © aumento da temperatura, a emissfio sera m4xima para um comprimento de ‘onda menor ¢ vice-versa. A ilustragao abaixo nos permite visualizar o resultado desta lei. No entanto € necessério frisar que essas curvas no existiam na época.>> Rr foMs0-* Wha?) a vaorH) Fig.1: Visualizagiio da lei do deslocamento de Wien Apesar de Wien nfo ter notado, segundo Trigg (1971), essa lei implica na expressio (9). Isso pode ser observado através do ciileulo do méximo dessa fungao. Esse desenvolvimento de Wien facilitou a procura pela resolugo do problema da radiagdo de corpo negro para a fungao g(¥/_) [ou (A7)]. Contudo essa procura comesou a T. se mostrar dificil. Posteriormente, em 1896, Wien, assumindo que a freqiéncia da radiagio emitida por qualquer molécula do corpo negro era uma fungdo da sua velocidade e aplicando a distribuigo de Maxwell-Boltzmann (e, portanto, a mecénica estatistica), chegou a uma expressfo que, embora baseada em argumentos duvidosos’”, foi _verificada experimentalmente em 1897 € 1899, exceto na regio do visivel (grandes comprimentos de onda) e temperaturas de até 4000° C. Esse resultado ficou conhecido como a lei de Wien e teve boa acolhida experimental para a época: * Nao conseguimos através da literatura pesquisada delimitar como foi a evolugio da obtengdo experimental destas curvas, * Fonte: Bisberg (1994), p.21. *” Esse argumento de Wien foi baseado no trabalho de Albert Abraham Michelson (1852-1931) que, em 1887, tentou resolver 0 problema assumindo que a formula de Maxwell para a distribuigdo de velocidades das moléculas num gis também valeria para as moléculas do s6lido que emitia radiagio de corpo negro. 25 (& cas 2) ou B=nve Com a, 7, 8, 1 ¢ cz constantes. Em uma série de papers, entre 1887 e 1899, Planck derivou essa lei através de um desenvolvimento termodinamico, o qual sera discutido ainda nesse capitulo. Atualmente essa formulagao é denominada como a lei de Wien-Planck. 1.4. Alguns desenvolvimentos experimentais envolvendo os primeiros resultados do estudo da radiagio do corpo negro © bolémetro®, instrumento para medir a energia radiante, foi desenvolvido em 1880 por Samuel Pierpoint Langley (1834-1906), através do estudo da absorgiio atmosférica da radiagao solar. Esse aparelho mede a radiago incidente e absorvida por dois fios escurecidos de platina colocados em lados opostos de uma ponte de Wheatstone; com o aumento da temperatura do fio, este tem seu valor de resisténcia alterado. Logo empregado na espectroscopia, 0 bolémetro sé teve importancia fundamental para o estudo da radiagao de corpo negro apés o desenvolvimento de fontes de radiagio adequadas. estudo experimental da radiago do corpo negro foi realmente efetivado com o uso do bolémetro combinado a primeira cavidade isotérmica desenvolvida por Otto Lummer (1860-1925) e Wilhem Wien em 1895." Varios centros de pesquisa passaram entio a se dedicar ao estudo experimental do problema, principalmente o Instituto Imperial Fisico-Técnico de Berlin (Physikalische- Technische Reichsanstalt). A confirmagio da lei de Stefan-Boltzmann foi obtida em 1897 por varios pesquisadores: F. Paschen, O. Lummer, E. Pringheim, C. E. Mendenhall e F. A. Saunders. Lummer e Ernst Pringsheim (1859-1925) em Charlottenburg, Alemanha, utilizaram e ampliaram a noga0 de equivaléncia entre a radiag4o de cavidade e a radiagio de corpo negro, utilizando uma cavidade com um furo pequeno comparado com as dimensdes das paredes. Qualquer radiago que por esse buraco penetra, tem uma probabilidade muito oa e Jique 4, =47/ B,. *? Cuja denominagao ¢ derivada de “BoA = feixe de luz” (Jammer, 1966, p. 5, nota 15). “° Segundo Jammer (1966, p.6), ambos se basearam no teorema da cavidade de Kirchhoff para a construgio desse “corpo negro experimental”. ad Pequena de sair, sofrendo assim miltiplas reflexdes nas paredes dessa cavidade, com alguma taxa de absorgio. Dessa forma & possivel dizer que toda radiago incidente é absorvida pelo corpo, e esse se mostra uma boa aproximagio de um corpo negro. Portanto, pode-se usar a radiaedo oriunda do interior da cavidade e que passa pelo furo como uma amostra de radiag&o de corpo negro*'. Duas cavidades foram usadas, uma de cobre para temperaturas acima de 877 K e uma de ferro para temperaturas de 799 a 1561 K. A cavidade de cobre foi imersa em uma mistura fundida de nitrato de sédio € nitrato de potassio; a temperatura do banho podia ser mantida constante dentro de um ou dois graus durante meia hora pelo controle de uma fonte de gas incandescente. A cavidade de ferro era aquecida por meio de um forno especial de paredes duplas (...) no qual os gases quentes da chama Passavam ao redor da cavidade dentro das paredes internas do forno, depois entre as duas paredes, e entio pelo cano da chaminé. Temperaturas até 755 K eram medidas por meio de termémetros de ‘meretirio; temperaturas maiores, por um termopar. (Trigg, 1971, p.12-13) Lummer e Pringsheim entéo passaram a especular como a emisso espectral do corpo negro variava com o comprimento de onda em uma dada temperatura, ou seja, procuraram obter as curvas de distribuigtio espectral. Os resultados foram publicados em uma série de artigos entre 1899 ¢ 1900. Os procedimentos de medida eram os mesmos, mas agora eles utilizavam um prisma antes de medir a energia, espalhando a luz e fazendo uma varredura das freqiiéncias. ...Vrias cavidades foram usadas, a temperaturas de 85 a 1800 K. As temperaturas mais baixas foram conseguidas pela imersio em ar iquido (85 K), agua fervente (373 K), nitrato de potéssio fundido (por volta de 600 K, dependendo da composigao exata). Altas temperaturas, acima de 1800K, eram obtidas por aquecimento elétrico. (Trigg, 1971, p. 13) Os comprimentos de onda estudados variavam de 1 a 18 microns, regido espectral na qual o vapor de Agua e 0 diéxido de carbono, presentes na atmosfera, absorvem fortemente certos comprimentos de ondas, especialmente em 1.8, 2.7 e 4.5 microns. Isso dificultava as medidas. Para resolver o problema “eles fecharam 0 espectrometro ¢ 0 bolémetro em um container no qual o ar foi secado ¢ quimicamente purificado de diéxido de carbono, de forma que a necesséria corregdo foi grandemente reduzida” (Trigg, 1971, p.14). Também outra complicago ¢ que experimentalmente € sempre necesséria a certificagao de que apenas a radiag&o de interesse atinge o bolémetro. Trigg (1971), p11. ae No primeiro artigo sobre essas medidas, Lummer e Pringsheim procuraram apenas medir 0 Ki max € © Amex Com o intuito de verificar a lei de deslocamento de Wien. Posteriormente Lummer e Pringsheim compararam seus resultados com a lei de Wien. Inicialmente plotaram as curvas da energia em fungio do comprimento de onda para varias temperaturas. Embora a concordéncia com a curva teorica de Wien parecesse satisfatoria & primeira vista, eles testaram os dados experimentais de outra forma. Com a formulagdo de Wien (equagao (12)), K,=¢4% L#) Tomando 0 logaritmo™ de ambos os lados temos: log Ky = log (c, A*) — (c,/AT) loge Ou seja: log Kz = log (c, 4°) — [(c,/d) log e] (1/1) Ou reescrevendo da seguinte forma: FQ) =CG.+C,x Com F(x) = log Ka Ca = log (c, 4") Cy=—[(c,/A) log e] x=/T obtém-se a equagdo de uma reta. Assim, Lummer ¢ Pringsheim plotaram log K;, (para um A fixo) em fiungao de 1/7, a fim de procurar obter retas. ... A natureza dos argumentos usados para deduzir a formula de Wien era tal que a quantidade c2 deveria ser uma constante da natureza, enquanto c, poderia variar de uma série de observagdes para outra, mas deveria ser constante através de qualquer série [isto , c, “carrega” informagao do material].(Trigg, 1971, p.17) Em outro trabalho Lummer e Pringsheim apresentaram curvas isocromiticas que pareciam linhas retas, mas os valores de c, e c) variavam com o comprimento de onda. Ambos se puseram em diivida sobre a validade da equagaio de Wien. Apenas num terceiro “E necessério tomar cuidado com bibliografias estrangeiras, pois muitas vezes ¢ tomado log como sin6nimo de In. Aqui log 6 0 logaritimo na base 10. trabalho a evidéncia ficou ébvia. Bles concluiram firmemente que a lei de Wien-Planck era invalida. 1.5. O teorema da eqiiipartiao da energia® Em 1845, J. J. Waterston (1811-1883) enviou um paper para a Royal Society em que concluia que “num meio misto a velocidade quadrdtica média é inversamente Proporcional ao peso especifico das moléculas”. Seu trabalho foi veementemente tecusado € considerado sem sentido na época. Entretanto, como estava seguro da importéncia do seu trabalho passou a circuld-lo pessoalmente entre os cientistas. Cinco anos depois, uma curta passagem de seu texto foi lido no 21° encontro da Associagdo Briténica, em que dizia que “equilibrio de pressdo e calor entre dois gases ocorre quando 0 nimero de dtomos em unidade de volume é igual, e a vis viva de cada dtomo é igual”. * Apenas quarenta anos depois, em 1885, seu artigo foi finalmente publicado. Em 1860, Maxwell (provavelmente ciente do trabalho de Waterston) havia dado sua primeira formulagao do teorema da eqiliparti¢ao da energia: “dois diferentes conjuntos de particulas distribuirdo suas velocidades, assim que suas vires vivae forem iguais”."® Inicialmente o resultado de Maxwell sé inclufa particulas perfeitamente esféricas e Posteriormente ele estendeu seu enunciado para o caso de uma mistura de particulas de qualquer forma, além de incluir a rotagao. Em 1868, Boltzmann generalizou o teorema para particulas que néo necessariamente fossem rigidas, mas tinham um numero interno de graus de liberdade, como, por exemplo, a vibrago. Também Maxwell removeu certas restrigdes na interago entre as particulas e mostrou, usando coordenadas Lagrangianas para sistemas com um nimero arbitrério de graus de liberdade, que a eqilipartigaio de energia acontece se ... 0S pontos materiais podem atuar em todas as distancias e de acordo com qualquer lei consistente com a conservagao de energia. A tnica ® O teorema de equipartig#io de energia afirma que num conjunto composto por um grande niimero de particulas idénticas individuais, que se movimentam ao acaso trocando energia entre si através de colisGes, a energia total contida neste sistema ¢ igualmente partithada, em média, por todas particulas. Ou seja, se a energia total é E e se hé a presenca de N particulas, a energia média de cada particula sera E/N. “ Citado por Jammer, 1966, p.12. * Thidem. A palavra vis viva, ou forga viva, carrega de certa maneira o sentido de energia cinética, energia de um corpo em movimento. Esse termo era usado em oposi¢ao a vis morta, associada a um corpo parado no pponto mais alto (energia potencial). * Tbidem, p. 13. Suposi¢go que ¢ necessdria para a prova direta é que o sistema, se deixado neste estado em movimento, iré, mais cedo ou mais tarde, passar através de cada fase que é consistente com a equago de energia.’” Dessa maneira no final do século XIX a eqilipartigao de energia “estava no ar” muitos artigos se ocupavam com esse assunto. Mas havia sérios problemas para efetivar ‘sua compreens&o e aceitagdo, principalmente por que ndo se encaixava nos dados experimentais de calor especifico para um gs.** 1.6. O desenvolvimento de Rayleigh e a corresio de Jeans Em junho de 1900, Lord Rayleigh (1842-1911) tentou resolver 0 PRCN usando a equiparti¢ao de energia. Ele partiu do pressuposto de que na cavidade estariam dispersas ondas estacionérias somente com freqiiéncias fixas, determinadas pela geometria da caixa, ou seja, a radiagdo poderia vibrar somente em freqiiéncias fixas determinadas pelo seu comprimento. Dessa maneira a radiagio na cavidade deveria ser composta pela superposi¢ao de ondas estacionérias possiveis dentro desta. Seria assim necessério efetuar 0 célculo do niimero de diferentes modos de ondas estaciondrias com comprimento de onda entre A e 4+dA por unidade de volume que poderia existir na cavidade. De acordo com a lei de equipartigo de energia, cada um desses modos deve ter a mesma energia média. Essas consideragdes levaram Rayleigh a sua equago (com ky e kz constantes): Ki =k TA ov B,=kv?T (13) Seu resultado nfo € coerente com os resultados experimentais para pequenos comprimentos de onda, pois a curva diverge para altas energias, ou seja, hé uma tendéncia ilimitada para altas freqiiéncias. “Jammer (1966), p. 14. . “* Esse problema s6 foi solucionado com a fisica quantica. ‘Comprimento de onda (1m) Fig.2: Pontos experimentais ¢ leis de radiagao.” Muito posteriormente essa tendéncia levou o nome de catastrofe do ultravioleta®, por Paul Ehrenfest (1880-1933) em 1911. Contudo, na época da publicagio, o artigo de Rayleigh nao chamou muito a ateng&o € nfo existia sentido trégico algum com relagdo aos resultados discrepantes. Em 1905, data posterior a solugo do PRCN por Planck, James Jeans (1877-1946) corrigiu a formulagao de Rayleigh, produzindo a expressio que hoje conhecemos como equagaio de Rayleigh-Jeans. Segundo Whitaker (1979a), Rayleigh nao calculou em sua formulago a constante de proporcionalidade, pois era evidente para ele que a sua expresstio no era satisfatéria. Ele apenas sugeriu “incluir um fator exponencial de corte Para levar a resultados sensatos” (p.109). .. Apesar do seu proeminente papel nos livros-textos de fisica, a formula [de Rayleigh-Jeans] no atuou em nenhuma parte de toda a fase origindria da teoria quéntica. Planck nfo aceitou o teorema da equipartigao como fundamental, e portanto ignorou-o. Provavelmente nem Rayleigh nem Jeans consideravam 0 teorema universalmente valido. A “catdstrofe do ultravioleta” (...) apenas transformou-se num assunto de discusstio numa fase posterior da teoria quantica. (Kragh, 2000, p.33) Segundo Klein (1966) para Jeans nao deveria haver um equilibrio termodinémico da radiag0, 0 que explicaria a inabilidade de se resolver 0 problema da radiagéo do corpo negro com a equipartigao de energia. proprio Jeans, em sua curta descrigao sobre a teoria dos quanta, nfio menciona a contribuigao de Rayleigh e nem mesmo a corregdo que ele proprio realizou (Jeans, 1953). Fonte: Richtmyer (1955). * Pois uma das conseqiéncias do desenvolvimento de Rayleigh, embora nio verificada experimentalmente, seria a de que conforme se aumentasse a freqlléncia em direglo ao ultravioleta no espectro, a energia tenderia a0 infinito. 3 2. O trabalho de Planck 2.1. Planck e seus trabalhos anteriores a 1900 Max Karl Ernst Ludwig Planck (1858-1947) estudou os trabalhos de Clausius ¢ dedicou os primeiros 50 anos da sua carreira aprofundando o significado da segunda lei da termodinémica, principalmente no que diz respeito irreversibilidade. Para Planck a segunda lei era um absoluto e ele acreditava que a pesquisa em fisica era a busca por absolutos, dai seu interesse pelo assunto. Provavelmente devido a sua formagdo e estudo na rea é que Planck no tentou resolver 0 PRCN pelo teorema da eqiiipartigao de energia, ¢ se 0 fizesse certamente chegaria a formulago de Rayleigh. Planck também nao tinha familiaridade com a estatistica de Boltzmann e Gibbs e era avesso a teoria molecular.}! A segunda lei da termodinamica evidencia que a tendéncia natural de um sistema isolado ¢ mudar de tal forma que sua entropia aumente. No estado de equilibrio essa entropia tem um valor maximo. Planck vislumbrou uma possibilidade de estudo da radiagdo de corpo negro através do célculo da entropia de uma cavidade adiatérmica mantida a temperatura constante, uma vez que este sistema configura uma situagdo de equilibrio. Assim ele procurou estudar a situagdo de equilibrio utilizando o cletromagnetismo de Maxwell (emissio de dipolo, modelando a emisséo e absorgao de radiagdo por ressoadores) e a termodinamica. Para tal intento, Planck rejeitou a interpretagdo estatistica da termodinamica de Boltzmann, esperando que esta pudesse ser evitada e que "o principio do aumento da entropia pudesse ser preservado intacto como um teorema rigoroso em alguma teoria mais compreensivel e fundamental” (KLEIN, 1966, p.25). Provavelmente procurando por subsidios para fundamentar o estudo da radiag&o de corpo negro através do célculo da entropia, em marco de 1895, Planck apresentou um trabalho, para a Academia de Ciéncias de Berlim, cuja linha de pesquisa divergia de suas anteriores, € no qual discutia "o problema do espalhamento ressonante de ondas eletromagnéticas planas por um dipolo oscilante de dimensoes pequenas comparadas ao comprimento de onda" (KLEIN, 1966, p.25). Em fevereiro de 1896, Planck + estendeu seus estudos para o amortecimento de radiagfo de seus osciladores carregados, e ele ficou impressionado pela diferenga entre amortecimento de radiagdo e amortecimento por meio da ordinaria resisténcia do oscilador. Amortecimento de radiac&io era um mecanismo 5! Jammer (1966), p-14. 32 completamente conservativo que no requeria um mecanismo para invocar a transformagao de energia em calor, ou para fornecer outra caracteristica constante do oscilador de forma a descrever esse amortecimento. Planck pensou que isto poderia ter grandes implicagdes Para esta questo fundamental da irreversibilidade e da segunda lei. Como ele colocou "o estudo do amortecimento conservative ‘parece para mim ser de grande importdncia, uma vez que abre a perspectiva de uma Possivel explicagao geral de processos irreversiveis por meio de forcas Conservativas - um problema que exige a pesquisa em fisica tedrica mais urgentemente a cada dia. (KLEIN, 1966, p. 25). No ano seguinte (fevereiro de 1897), Planck deu inicio a um estudo que se estendeu por mais de dois anos sobre a irreversibilidade da radiagéio, procurando assim deduzir a lei de Wien. ++ Ele comegou asseverando que ninguém tinha explicado com sucesso como um sistema governado por interagSes conservativas podia evoluir irreversivelmente para um estado final de equilibrio termodindmico. (...) Planck ent&o anunciou seu préprio programa para derivar a segunda lei da termodinamica para um sistema constituido de radiagdo e osciladores carregados numa cavidade com paredes refletoras. Ele introduziria nenhum amortecimento além do amortecimento da radiag&o, mas tomaria © mecanismo basico para irreversibilidade como sendo a alteragdo da forma da onda eletromagnética pelo processo de espalhamento — sua aparentemente irreversivel conversdo da onda plana incidente para onda esférica emergente, O ultimo objetivo deste programa seria a explicagio da irreversibilidade para sistemas conservativos e, como um valioso subproduto, a determinagao da distribuigao espectral da radiagdo de corpo negro. Planck tinha grandes esperangas: seu objetivo era precisamente correto para um discipulo de Clausius. Teria sido uma espléndida concluséo para seu trabalho em termodindmica, e teria colocado um fim, de uma vez por todas, as afirmagdes de que a segunda lei era meramente uma matéria de probabilidade. (KLEIN, 1966, p.25). Num artigo de maio 1899, Planck apresenta a e 6, duas constantes universais segundo ele. Utilizando dados experimentais para a radiagdo de corpo negro ele calcula esses valores”. Planck percebe que essas constantes, juntamente com a velocidade da luz c € a constante gravitacional G, poderiam servir para definir novas unidades de massa, comprimento, tempo ¢ temperatura, que ele nomeou como "unidades naturais". Segundo ele, essas novas unidades deveriam ser verdadeiras "independentemente dos corpos Particulares ou substancias, deveriam necessariamente reter seu significado por todos os * a= 0,4818 10s. deg (quena verdade era W/k) © b = 6.885 107” cm?p/s (Jammer, 1966, p. 46). tempos e todas as culturas, incluindo extraterrestres e ndo humanas"®, Essas constantes seriam importantes, pois se encaixariam em sua visdo de absoluto. A constante 5 foi logo renomeada (h) e reinterpretada no artigo de dezembro de 1900. A derivacio da lei de Wien Planck fez também varias tentativas e escreveu varios artigos procurando desenvolver uma derivago mais rigorosa da fungao de distribuigo de Wien, aplicando a termodinamica em processos eletromagnéticos. Assim Planck tentou mostrar que “as equacdes de Maxwell-Hertz, quando aplicadas a ressoadores™ com condigdes iniciais arbitrdrias, levariam a processos irreversiveis convergindo para um estado estaciondrio cuja distribui¢do de energia era a da radiagdo de cavidade”*’. Em seu estudo de absorgao e emissdo Planck pensou que tinha encontrado um processo irreversivel na interagdo entre ressoadores absorventes e emissores, Boltzmann foi quem apontou a principal falha nos propésitos de Planck, pois as equagées da eletrodinamica néo podiam produzir uma abordagem monoténica para o equilibrio assim como as equagées da mecénica; ambas precisavam ser complementadas por suposigdes estatisticas. Nada nas equagdes da eletrodinamica proibiria, por exemplo, a inverso do processo de espalhamento de Planck. (KLEIN, 1966, p.25) Finalmente Planck se convenceu de que os processos estatisticos eram necessarios introduziu a hip6tese de “radiagdo natural”, usando o teorema H e de acordo com a qual as vibragdes parciais harménicas compondo uma onda de radiagdo térmica s&o completamente incoerentes. Comparando a emissio e a absoreéo dos ressoadores, Planck obteve como condigées de equilibrio, somente usando principios de eletrodinamica cléssica a equacaio°°: Se yy (14) e * Citado por Klein (1966), p.26. - é ** 4 palavra ressoador atualmente pode ser entendida sem prejuizo conceitual como oscilador. Mantivemos 0 termo ressoador para permanecermos fiéis aos textos originais e sobre o assunto. * Zanetic (1999a), p.117-118. i : © No apéndice III ha um desenvolvimento detalhado desse problema da interagio entre a radiago da cavidade e os ressoadores, no qual chegamos a essa expressio, cof =U(V,T)* a energia média vibracional de um ressoador linear a temperatura Te 4, = 4 (v7) a densidade da radiagdo dentro de uma cavidade & temperatura T por unidade de freqiléncia no intervalo entre ve vidv. A partir desse resultado © da propria lei de Wien (, =v? ac substituigo Planck chegou ao resultado: , por simples (4) U=Cve\T (15) Tomando 0 logaritmo neperiano (base e) de ambos os lados da equagio, lembrando que Jn e = 1, InU =InC +Inv Pine De maneira que z- T+ Holtnc +inv) Planck estava familiarizado da termodinamica que s-4 7 ouseia $= iF du (16) Com S igual a entropia de um ressoador. Assim: sa f-AY au. [Oe a py pv A menos de uma constante aditiva: =~ Fp Uinu-U (nc +invy) Fy lin -I-nc-Inv) Vv Como Ine= 1, Cau) Ss tio 2) a7 Segundo Klein (1966), Planck convenceu-se de que esta definigdo era a unica possivel no sentido de que “se, e somente se, a entropia tivesse essa forma ele poderia +7 Atualmente obtemos o valor de U com eqilipartigao de energia (Jammer, 1966, p.12). cee Provar que a entropia total do sistema aumentava monotonicamente para um valor de equilfbrio”. Dessa maneira, em um certo sentido, Planck completou seu programa, pois “ele realmente usou a segunda lei para fixar a fungdo de entropia e portanto a distribuigiio espectral da radiagéio do corpo negro” (p.26). Utilizando entdo esses principios, Planck chegou inicialmente a sua lei de Wien, que foi publicada em maio de 1899: a aed] j-awiter) Segundo Kangro (1972) d’S/dU? é a variago do aumento da entropia. Apenas para esta Ultima Planck atribuiu um sentido fisico (marco 1900):“a medida numérica da irreversibilidade do processo ou para a no compensada transformacéo de trabalho em calor”. A entropia em si mesma — ele argumentou — ndo tem sentido fisico”®. E importante salientar a circularidade no trabalho de Planck pois ele utilizou a propria lei de Wien para deriva-la pela via da entropia. . Consistente com sua suposig’o com relagdo a irreversibilidade associada com a “radiagao natural”, ele entio mostrou que a “entropia elétrica total” 5, = 5+ [sdV, em que a soma se estende sobre todos 0s osciladores e a integrago sobre todos os elementos de volume dV do campo de radiagiio com densidade de entropia s, é uma fungdo de estado que aumenta com o tempo e alcanga um maximo no equilibrio. Planck agora assumiu que uma pequena porgo de energia passa de um oscilador de freqiéncia v, entropia Se energia U , para outro de freqiiéncia v’, entropia S’ e energia U’. Os principios da entropia e da energia requerem que 5S,=55+6S'=0 © 5U+5U'=0 (Jammer, 1966, p.15) Assim, esse resultado com a equago (17) nos fornece: * Citado por Zanetic (1999b), p.127. aes lec) wee ee) eb ae bv \eCv) py \eCv’ -55(cee) ater) +® Baar) Be ocr) rial we) © Sendo a expresso do lado esquerdo uma constante para todos os osciladores considerados. oy & Sape By '\cv a Tomando o exponencial de ambos os lados: U=Cv exp( pBv) Da comparagdo com eq. (15) temos que p= de maneira que: By U=C oo Vv exp(- T ) Que em combinago com a equaco (14) chega-se a lei de radiagiio de Wien, ee) Logo no inicio de 1900, medidas de Lummer e Pringsheim mostraram que a lei de conforme equagéo (12). 2.2. Os artigos de 1900 Wien nfo se ajustava bem para o intervalo de pequenas freqiiéncias. Nesse ano, muitos cientistas passaram a tentar encontrar novas formulag6es para a fungao de distribuicao. Em margo de 1900 M. Thiesen chegou a algo parecido com o que Rayleigh fez, em Junho de 1900. Em outubro do mesmo ano Lummer e E. Jahnke chegaram a uma equagio que de acordo com a escolha dos parémetros envolvidos, se reduzia ora A expressfio de Wien, ora a de Thiesen, ora a de Rayleigh. Assim parecia que, dependendo da faixa de

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