Camillo, Plínio. O Namorado Do Papai Ronca

C19n
Camillo, Plínio
TÍTULO / O Namorado do Papai Ronca
São Paulo: Selo Prólogo e Instituto Mundo Mundano, 2012.
192 pp.
ISBN 978-85-99349-78-6
1. Literatura. 2. Literatura Brasileira. 3. Infanto-juvenil.
I. Título. II. Fernanda Carvalho, Renata Nascimento (Editor). III. Camila Briganti (Diagramação e finalização
capa). IV. Luiz Otávio Carvalho (Capa). V. Maria Cláudia Carvalho Mattos. (Revisão Ortográfica) . VI.
Nanete Neves (Revisão Literária. VI). Malu Zoega (Preparação).
CDU – 087.5
Projeto realizado com o apoio do Governo do Estado de São Paulo, Secretaria de Estado da Cultura
Programa de Ação Cultural 2011.
Dedico este: À todas e todos que amo.
À todos e todas que respeito
E, principalmente, à todas e todos que sinto saudades!!
Sumário
Capa
Folha de rosto
Ficha catalográfica
Dedicatória
Sumário
Capítulo I
TERÇA-FEIRA 3 DE AGOSTO
noite
QUARTA-FEIRA 4 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
QUINTA-FEIRA 5 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
SEXTA-FEIRA 6 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
SÁBADO 7 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
DOMINGO 8 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
SEGUNDA-FEIRA 9 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
SÁBADO 14 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
DOMINGO 15 DE AGOSTO
manhã
tarde
noite
Capítulo II
manhã
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
Noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo III
QUARTA-FEIRA 1 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
QUINTA-FEIRA 2 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
SEXTA-FEIRA 3 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
SÁBADO 4 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
DOMINGO 5 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
SEGUNDA-FEIRA 6 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
TERÇA-FEIRA 7 DE SETEMBRO
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo IV
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo V
SEXTA-FEIRA 1 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
SÁBADO 2 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
DOMINGO 3 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
SEGUNDA-FEIRA 4 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
TERÇA-FEIRA 5 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
QUARTA-FEIRA 6 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
QUINTA-FEIRA 7 DE OUTUBRO
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo VI
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
manhã
tarde
noite
manhã
Tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo VII
SEGUNDA-FEIRA 1 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
TERÇA-FEIRA 2 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
QUARTA-FEIRA 3 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
QUINTA-FEIRA 4 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
SEXTA-FEIRA 5 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
SÁBADO 6 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
DOMINGO 7 DE NOVEMBRO
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo VIII
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
manhã
tarde
noite
Capítulo IX
Faltam 30 dias para a mãe de Dante voltar.
Faltam 11 dias para a mãe de Dante voltar. Manhã Insolação depois do futebol.
Falta 1 dia para a mãe de Dante voltar.
É Hoje!
CAPÍTULO I
noite
— O namorado do papai ronca!
— Não está meio exagerando, filho?
— Mãe! O Ademar ronca muito! É sinistro, mãe!
— Dante!?
— Mãe... calma aí... todo mundo aqui do prédio reclama...
— E aí?
— Aí nada! Papai encheu as paredes de cortiça...
— Funcionou?
— Que nada... o ronco vaza...
— Sei...
— Sabe nada... parece a caverna do dragão!
— Num tá meio demais?
Dante acha engraçado conversar com a mãe pelo Skype.
Faz um mês que ela está em Milão! Foi fazer um mestrado em moda, ou dar uma consultoria, ele nunca
sabe bem.
Dante teve que trocar São Paulo, capital, por Procópio, interior.
Em uma noite dessas bateu uma saudade da mãe e de São Paulo. Até chorou baixinho, com a cabeça
coberta. Não queria que o pai ficasse chateado.
Sempre quis morar com Heitor. O querido e velho pai! Sonho de filho quando a mãe dá bronca. Mas São
Paulo era muito melhor!
Sabia que era por pouco tempo, seis meses! Mas...
No aeroporto, mês passado, ele se fez de forte, porém morria de medo. Medo da cidade.
Medo do avião da mãe cair.
Medo da mãe nunca mais voltar. Medo da vida com o pai.
Medo da vida longe da mãe.
Medo do homem alto que tinha um olhar estranho. Medo.
Lembra-se do dia da grande mudança. Com a mãe embarcada, foram de táxi até a rodoviária. Heitor,
como sempre fazia antes de entrar no ônibus, comprou revistas para os dois.
Embarcaram às 11, hora do jogo do Brasil contra a Holanda. Ouviram o jogo pelo rádio do celular.
Dividiram o fone. Pularam com o gol do Robinho.
Ficaram tristes com o gol do holandês. Dante quis trucidar o Felipe Melo.
Decidiu nunca mais torcer pelo Brasil depois do segundo gol. Heitor ficou ouvindo música e Dante leu as
revistas.
PERFIL EM UMA REDE SOCIAL

Bárbara Almeida Neves Data de nascimento:
22.2. Cidade Atual: Milão Itália Cidade Natal:
São Paulo Gênero: Feminino
Idiomas: Português, Inglês e Italiano (tem arranhado o espanhol)
Sobre mim: Sou orgulhosamente a mãe de Dante Almeida Neves. Quero conhecer o
mundo. Sou alguém que tem que matar um dragão por dia com um canivete enferrujado, porém faço isto
sorrindo, alegre e de bem com a vida. O que emociona: Um bom jantar regado a vinho branco.
O que gostaria de dizer: Eu vou!
O que mais? Eu trabalho passeando. Passeio trabalhando.
Ou: Aprendi a gostar de futebol com o meu filho. Até já fui ao Pacaembu. Uma vez, na
saída do jogo, esqueci onde coloquei o meu carro e fiquei mais de duas horas procurando.
Atividades e interesses: Moda e Cinema
Uma frase: “O fracasso é um tempero indispensável ao êxito.” (Truman Capote).
Porque está aqui e não está lá: Quero conhecer o mundo, pelo menos o meu
mundo!!
Informações de contato: http://consultoriabarbara.wordpress.com
Dante assiste sozinho o DVD de O iluminado. Viveu a tensão toda. Subiu no sofá. Afirma que vai ler um
livro do Stephen King.
manhã
Heitor acorda muito cedo e faz a sua ginástica. Acorda o Dante que resmunga muito.
Sua, até então, única amiga na cidade é a Priscila, sobrinha de Ademar, um pouco mais nova, porém
dois palmos maior. Falante, delicada, muito parecida com o tio, um clone. Dante acha que ela é legal!
Priscila insistiu em acompanhá-lo, na primeira semana de aulas, todos os dias até a porta da sua sala.
Na segunda-feira, seu primeiro dia na nova escola, durante o caminho, ela foi dando várias
recomendações.
— O professor de Matemática é muito chato, mas sabe muito! A professora de Inglês tem uma vozinha
fina que irrita e o professor de Espanhol é cheio de fazer gracinha. Louco para fazer trocadilhos. Ele é
“mor” legal.
Até a porta da sala foi tudo bem.
Dante estava “de boa”. Escola é igual em qualquer lugar! Mas quando entrou na classe teve aquele
calafrio de primeira vez.
Meio do ano e todos já tinham feito as suas turmas, suas galeras. Dante ficou procurando um lugar.
Nada no fundo. O fundão com os meninos maiores.
Nada na frente, com mais meninas.
Somente uma carteira vaga bem no meio da sala.
Foi devagar. Meio olhando para a carteira, meio olhando para o chão. Meio olhando para as pessoas e
meio querendo voltar para casa.
Sentou e tomou uma enorme bolinha de papel na nuca! Procurando quem tinha jogado, olhou para trás.
— Que foi?
— Nada.
Sentiu que seria difícil.
tarde
— É da Casa da Milena?
— Sim, quem fala?
— Sou eu, tia Cláudia, o Dante!
— Dante querido, como está?
— Bem e você?
— Estou bem. E sua mãe?
— Tá na Itália, está bem. E a Milena?
— Vou chamar. — muito tempo depois — Dante querido, me enganei: ela saiu!
— Será que vai demorar?
— Não sei .,. quer deixar um recado?
— Sim. Diz “prela” me ligar.
— Digo sim. Beijos.
A tia Cláudia desligou antes do Dante dar o seu número.
Milena Mattos
Data de nascimento: 26.12.
Cidade Atual: São Paulo Cidade Natal: Ribeirão Preto Gênero: Feminino
Idiomas: Português e Inglês Sobre mim: Gosto de meus amigos, de meus familiares e de animais O
que emociona: minha família.
Ídolo ou ídolos: A Beyoncé e a Fergie.
O que gostaria de dizer: “Se toda vez que eu fechar os olhos, ganhasse um beijo seu,
fecharia os olhos eternamente.” O que mais?: “Nossa amizade pode ter várias vírgulas, mas nunca um
ponto final!” Ou: “É fácil dizer eu te amo, o difícil é amar de verdade.”
Por que está aqui e não está lá: Porque meus pais estão!
Atividades e interesses: Cinema, televisão, passear e minha família.
Informações de contato: http://mundodemilena.wordpress.com
noite
Ademar Cruz
Cidade Atual: Procópio Cidade Natal: Dracena Gênero: Masculino
Em um relacionamento sério com: Heitor Neves
Sobre mim: Estudei Direito em Campinas. Gosto de futebol. Não tenho filhos, mas
tenho amados sobrinhos.
O que emociona: Um beijo, um abraço e muitos apertos.
Ídolo: Sean Connery.
O que gostaria de dizer: Oi.
O que mais? Meu maior desejo é morar em Paris, passear em Lisboa e namorar em
Barcelona.
Atividades e interesses: Cozinhar e namorar.
Uma frase: “Todos nós nascemos loucos. Alguns permanecem.” (Samuel Beckett)
Por que está aqui e não está lá: há mais de dez anos vim ser sócio da minha irmã
em um escritório. Gostei da cidade, gostei da calma, gostei do interior. Gostei de mim aqui.
Assiste com Ademar e Heitor ao filme À meia-noite levarei a sua alma. Filme tosco. Pura comédia!
Dante volta do banheiro e flagra o pai e o namorado se beijando. Não foi a primeira vez, mas é muito
engraçado ver os dois disfarçando. Eles dão um pulo. Fingem prestar atenção na televisão.
— Boa noite!
— Boa noite! — respondem em coro.
manhã
Conhece a professora de literatura.
A classe tem que ler o livro Prova de fogo, de Pedro Bandeira. Dante já tinha lido no ano anterior.
— Fazer um resumo é muito fácil, — diz em voz alta. — Em São Paulo, a gente está mais adiantado.
Recebe uma bolinha de papel na nuca.
tarde
Educação Física.
Primeiro os exercícios normais: alongamentos, polichinelos e corridas.
Depois a turma começa a pedir para jogar futsal.
O professor enrola um pouco e manda dividir os times. Como estão duas classes juntas, dá para fazer
três times.
Os três maiores, Alan, Marcelo e Eduardo, começam a escolher. Foi escolhido um.
Foi escolhido outro.
Dante é o ultimo a ser escolhido, fica no time do Eduardo. Ele tem certeza de que está no time mais
fraco.
Joga primeiro o time do Alan contra o do Marcelo. Por tempo: dez minutos. O time do Marcelo ganha.
O time do Eduardo joga contra o perdedor.
Eduardo manda Dante para o gol, que tenta argumentar que é muito baixo. Ninguém ouve.
No vira de cinco minutos já está quatro a zero para o time do Alan. Dante tomou todos os gols de
cobertura.
Eduardo está furioso. Manda outro moleque agarrar no gol e Dante fica na defesa.
Na primeira bola, espirrada na defesa. Dante pega e leva a bola bem devagar, olha o posicionamento
dos companheiros. No meio da quadra, ouve os gritos de Eduardo. Vem um moleque do time do Alan
querendo pegar a bola. Dante dá um elástico e fica sozinho. Resolve acelerar. Vem outro moleque e
Dante dribla fácil, bola no meio das pernas. Fica somente ele e o goleiro. Chuta rasteiro e gol. Quatro a
um para o time do Alan.
Dante comemora.
O time que está ganhando dá a saída, e Dante continua na defesa do adversário.
Alan vai conduzindo a bola, Dante vem por trás e, sem fazer falta, rouba a bola e a lança para Eduardo.
Que deixa a bola pingar e chuta para o gol. O goleirinho deles foge da bola. Quatro a dois. Todos
comemoraram com o Eduardo.
Saída. Chutam para o gol do time do Eduardo. O goleiro dá rebote. Dante pega, Alan encosta e leva um
chapéu humilhante. Dante avança, toca para Eduardo que devolve mais na frente. Dante ameaça um
chutão, porém toca para o Eduardo. Gol. Quatro a três. Ainda dá tempo.
Alan dá a saída, recebe de volta e vai chutar, porém Eduardo tira a bola, Dante corre e
Eduardo não lança. Prefere conduzir e chuta forte, o goleirinho foge e a bola bate no
travessão. Dante mata no peito e chuta. Empatados. O jogo termina. O tira-teima com o time do Alan
será na próxima aula.
— Joga bem, Baixinho!
Na volta para casa, Priscila comenta que Alan tem pernas bonitas. Dante está com o peito doendo.

Heitor Neves
Data de nascimento: 25.2
Cidade Atual: Procópio Cidade Natal: Procópio Gênero: Masculino
Idiomas: português e inglês
Sobre mim: Tenho um filho, Dante, minha fonte de transpiração. Sou professor de
História. Leciono em vários cursos pré-vestibulares. Gosto de ler, passear e ir ao cinema.
Em um relacionamento sério com: Ademar Cruz
O que emociona: A família.
Ídolo ou ídolos: Eduardo Bueno, o Peninha.
O que gostaria de dizer: Eu sou.
O que mais?: Gostaria de não ter cometidos muitos erros. Gostaria de apreciar melhor
os bons caminhos a que fui levado pelos erros. Atividades e interesses: Vegetarianismo (tentando),
atividades físicas, filosofia e história.
Uma frase: “Não ame pela beleza, pois um dia ela acaba. Não ame por admiração, pois
um dia você se decepciona. Ame apenas, pois o tempo nunca pode acabar com um amor sem
explicação”. (Madre Teresa de Calcutá)
Por que está aqui e não está lá: De lá eu saí, há mais de cinco anos. Aqui eu retornei:
aos meus amigos e às minhas mais doces lembranças.
noite
Dante e Heitor apreciam a refeição preparada por Ademar: feijão preto com ve-getais e cogumelos.
Dante percebe que, por baixo da mesa, os dois estão de mãos dadas.
manhã
A professora de História tem uma tarefa para a classe, trabalho em grupo: Contar a história da cidade de
Procópio.
Dante olha para todos. Ninguém se manifesta. Ninguém o convida para fazer parte de um grupo.
Pergunta para a Isalene e ela diz que o seu grupo está lotado. Pergunta para o Paulo e ele diz que o seu
grupo tem muita gente. Pergunta para o Mário e ele diz que o seu grupo tem gente demais. Dante não
pergunta mais.
No final da aula vai falar com a professora.
— Não tem grupo?
— Não.
— Alguém quer fazer o trabalho com o Dante? Silêncio constrangedor.
— Melhor, você pode fazer sozinho! É para sexta que vem, certo?
tarde
Dante navega muito na internet. Conversa com os amigos de São Paulo.
Constata que ainda estava bloqueado por Milena. Adere a novos grupos no Lifebook.
Entra em sites proibidos pelo pai. Apaga todos os históricos. Desfragmenta o micro.
noite
No Skype:
— Tá muito chato aqui!
— Calma
— Todo mundo só quer me lascar.
— Calma...
— Não quero ficar aqui...
— Calma, filho.
— Fácil falar calma, né mãe?
— Filho, lembra que “só devemos nos preocupar com coisas úteis”?
— Sim. E daí?
— “Tudo é inútil”.
— Fácil falar, né?
Dante lê Felicidade não tem cor, de Júlio Braz, para pegar no sono. Só dorme quando termina o livro.
SÁBADO 7 DE AGOSTO
manhã
Heitor acorda muito cedo e faz a sua ginástica.
Acorda Dante, que levanta rápido. Tem coisas para fazer. Nem toma café com Ademar e com Heitor
— Alô, tia Cláudia?
— Dante! Como está querido?
— Bem, e a Milena?
— Ela teve que ir à casa da avó, volta logo.
— Pede para ela me ligar?
— Peço sim. E sua mãe ?
— Está bem. Tchau!
Dante nem pensou em pedir a ajuda do pai. Sabia que ele iria mandar pesquisar, pesquisar e pesquisar.
Pesquisou no Google sobre a cidade:
PROCÓPIO:
Cidade fundada no dia de São Conrado de Constance, 26.11. 1767 e recebe o nome de Vila de São
Conrado de Constance na margem esquerda do rio, localizado aproximadamente onde hoje se situa o
Engenho central, parte da Vila Mattos. A povoação de São Conrado é ligada politicamente a Itu, então
cidade mais próxima. No ano seguinte, a povoação torna-se freguesia. Em 1821 é elevada à condição de
Vila e, em 1823, à condição de cidade ( ...) Faz divisa com São Pedro, Limeira, Santa Bárbara do Oeste,
Americana e Piracicaba. Fonte:procopio.sp.gov.br
É pouco. Precisa de mais!
Mas o que vai fazer? Lembra do avô Luiz.
tarde
— Vô, me fala daqui de Procópio?
— O que quer saber?
— Tenho um trabalho de escola. Vale nota!
— Que trabalho?
— Contar uma história daqui. Qualquer coisa. Conta?
— Quando nasci aqui ainda se chamava São Conrado de Constance. Eu, moleque, fazia todas as
traquinagens. Tomava banho de rio. Caçava passarinho, subia em árvores e desobedecia muito a minha
mãe. Vivia solto no mundo.
— Mas por que a cidade mudou de nome? Não sei por que o senhor está contando isto para mim! O que
tem a ver com a cidade?
— Vou continuar amanhã. Para quando é o seu trabalho?
— Próxima sexta.
— Dá tempo, vamos combinar: eu conto e você escreve. Depois me traz, a gente conversa e
continuamos.
— Mas vô...
— Combinado?
— Combinado.
noite
— Pai, será que o Ademar pode parar de fumar? Deixa aqui fedendo.
— Sei não. Tenho insistido muito, mas ele não fuma aqui em casa.
— Fuma na área de serviço.
— Exagero. Fica não.
— Mas fede cigarro. Não acho legal!
— Vou falar com ele.
Assiste sozinho: Alien o oitavo passageiro, de Ridley Scott. Muito legal! Principalmente na hora que o
bichão sai da barriga do carinha!
DOMINGO 8 DE AGOSTO
manhã
Dante espera intermináveis minutos enquanto o avô se prepara. Muito depois o avô senta-se na varanda.
— Pode continuar?
— Tá. A gente tinha um professor muito bacana: Procópio. Ele tinha vindo de Piracicaba. Era bom
demais, educado, gentil e muito esperto. Sabia fazer de tudo, pescava como ninguém! Fazia arapucas
que nem o pássaro mais sabido conseguia sair e contava muitas histórias. Tinha história de medo, de
fantasma e de rir. Era um bom proseador. Assim que chegou à cidade, enamorou-se pela filha do Seo
Fabiano, um fazendeiro muito rico. O nome da bruxa era Julinha. A mulher era muito feia! Parecia que
estava sempre com dor de barriga. Além de feia, tinha um gênio do demônio, era teimosa, pirracenta,
mal-educada e gostava de humilhar todo mundo. Parecia que tinha o rei na barriga. Era magra feito um
bambu! Tinha uns cabelos que pareciam vassoura de piaçava, mas Procópio estava apaixonado e não
via nada disso. Não cansava de dizer: “Minha bela e pura princesa!” Era só pensar nela que o professor
se babava feito cachorro louco. Julinha passava com aquele narigão empinado.
— Era professor de quê?
— Professor de tudo. Quando a gente ficava maior tinha que ir estudar em outra cidade.
— Sei. Mas por que mudou de nome?
— Fica para amanhã. Quer um suco?
— Tem de uva?
— Vamos ver.
tarde
Heitor e Dante vão passear em Santa Bárbara do Oeste. Vão de ônibus. Andam pela cidade.
Conversam sobre amenidades. Dante diz que a escola está legal.
Heitor diz que o trabalho está indo bem. Tarde de filho e pai.
noite
Heitor, Ademar e Dante assistem Monk e House. Comem uma pizza gigante de mussarela.
Mais tarde, pelo Skype Bárbara conta que, em Roma, visitou o Coliseu e o Vaticano. Também foi a uma
festa na Embaixada Portuguesa.
Ademar ronca!
manhã
Aulas chatas. O dia não passa!
Sinistro é que sempre acha que todo mundo cochicha. Tem vontade de perguntar: Nunca viu, cara de
pavio?
tarde
Cidade pacata. O dia não passa.
Dante só pensa na história do avô e em como iria reescrevê-la.
— No começo se segurava um pouco, mas o amor por Julinha foi aumentando tanto que mal acabava de
dar as aulas, saia correndo e ia para a fazenda do Seo Fabiano.
Ia cortejar a monstra. Seo Fabiano nem pensou muito, era um jeito de desencalhar a megera. A gente
nem podia olhar que ela já soltava um montão de palavrões. Procópio tentava fazer todas as vontades
da moça. Pedia e ele fazia. Logo não queria mais aquilo e ele realizava o seu desejo. Mesmo assim ela
vivia mandando-o embora. Ele não ia e ficava feito uma besta ao lado da moça. Até que um dia, Julinha,
humilhou o professor na frente de todo mundo. Procópio ficou triste, ficou fechado na casa dele uns
pares de dias, não saía para dar aulas e nem para pescar. Não adiantou a gente chamar. Podia bater até
derrubar a porta que não atendia. De fora dava para ouvir um choro baixinho.
— E depois?
— Depois já está tarde. Volte amanhã que continuo a história.
— Mas vô!
— Vai escrevendo.
— Se eu não lembrar?
— O que lembrar é o que importa e depois a professora corrige.
Dante encontra a turma do Rômulo e Remo, gêmeos, filhos da tia Fátima. Estão na rua, andando de
skate de balanço.
Dante vê vários tombos, acrobacias e piruetas. Rômulo vê vários tombos de Dante.
Remo racha de rir.
noite
— A Milena está?
— Dante? Como está querido?
— Bem, tia Cláudia. E a Milena?
— Foi dormir!
— Mas é cedo!
— Ela está meio enjoada. Deixo o recado...
— Obrigado!
— E sua mãe? Como ela está?
Dante assiste Jogos mortais com Heitor e Ademar. Heitor e Ademar saem da sala.
— Pior é o dois. Pior do que o dois é o três. Pior que o três é o quatro. Pior que o quatro eu ainda não
quero ver.
manhã
Dante resmunga que o ronco do Ademar atrapalhou o seu sono. Sonado, escova os dentes com o creme
de barbear.
Na sala de aula, alguém passa uma rasteira em Dante. Cai e todos riem, até a professora de inglês.
Dante não viu quem foi.
tarde
— Continua vô.
— Onde eu estava?
— Julinha tinha dado uma bota no Procópio.
— Bota?
— Dado um fora nele.
— Um dia Praça da Matriz vimos Procópio passando, andava com passos decididos e firmes, estava
indo em direção à casa da cidade de seo Fabiano. Chegou e de fora do sobrado e falou bem alto para
todo mundo ouvir, que iria ficar parado ali, sem se mexer, sem comer, sem falar, sem fazer nada, até que
ela aceitasse se casar com ele. Julinha ouviu tudo e não deu um pio. O mais engraçado é que uma
borboleta cinza pousou bem na ponta do sapato dele. Procópio baixou um pouco os olhos, viu a
borboleta, sorriu e ficou parado. Passou dois dias ali, um canário da terra pousou nele, no ombro e, em
menos de duas horas, fez um ninho. Procópio parecia nem ligar. Não adiantava as pessoas falarem: ele
não respondia. Então o pessoal da cidade tentou falar com a Julinha. Ela expulsou todo mundo à
vassourada. Além da borboleta e do canário, já estava nele uma aranha, que teceu uma teia entre as
pernas dele. O coitado do Procópio era estátua. Aí, nós começamos a andar atrás da Julinha, a gente ia
fazendo a maior algazarra por todo lugar que ela ia, e não adiantava xingar ou tentar bater na gente. Até
na igreja fomos, ficávamos falando baixinho atrás dela. Um dia, o padre expulsou a gente de lá e foi pior!
Ficamos do lado de fora, gritando. Julinha teve que sair da igreja. Meu pai não gostava muito daquilo que
a gente estava fazendo, cansei de levar esfregas, mas se o Procópio não desistia, por que iríamos
desistir? De noite a gente revezava, cada dia um moleque ficava debaixo da janela dela falando: Casa
com o Procópio, a noite inteira. Uma noite, o Zoiodegato, moleque ladino, quase tomou um banho de
água quente que a bruxa jogou. Se não ele fosse esperto, estava escaldado. Sorte não teve o Zinho,
estava falando para ela casar com o Procópio enquanto ela tomava banho e acabou levando uma
sabonetada na testa. Caiu da árvore em que estava trepado, e ficou sentido dores por todo o corpo. Mas,
mesmo lá de baixo, Zinho continuou gritando para a moça. Passou uma semana neste inferno. Para
gente foi até gostoso!
O avô parou e ficou observando Dante.
— Gosto do jeito que você escreve.
— Até amanhã?
— Até! Fale para o seu pai que vou ligar mais tarde.
noite
— Passa logo.
— Passa não.
— Na volta vou levar uma camiseta do Mazzola.
— Quem?
— Mazzola foi um jogador brasileiro que jogou no Milan, nasceu em Piracicaba.
— Como sabe?
— Pesqusei ....
— Autografada?
— Não.
— Mãe, também quero uma do Costacurta!
— Claro, claro!. Encontro com ele todo dia no café.
— Verdade?
— Não, bobão!
— Para de me chamar de bobão!
— Tá! E a escola?
— Mãe, sou o terceiro menor da minha classe!
— Nem parece que tem doze anos!
— Pareço quantos?
— Parece onze.
— Para mãe!
— E o seu pai, como está?
— Mesmo jeitão, está pensando que é vegetariano.
— É?
— Sei não, Ademar diz que não vai...
— Mande beijos a todos! Falamos amanhã?
— Tá. Beijo.
Enquanto Heitor prepara algumas aulas, Dante assiste Louca obsessão com Ademar. Dante determinou
que será um Stephen King quando crescer.
Ademar não ronca!
manhã
Dante resmunga que é feriado em algum lugar no mundo e que não terá aula. Na escola fica atento: não
tropeça.
Responde todas as perguntas. Geografia é fácil! O professor o elogia.
Dante recebe um bolo de papel na cabeça.
tarde
— Um sábado depois da missa, ela vestiu a sua melhor roupa, o que não adiantou muito pois ficou mais
feia ainda, e foi até onde estava Procópio. Chegou perto dele e disse no seu ouvido, que estava cheio de
formiga: Anda, homem, vamos casar logo! Procópio ouviu e caiu desmaiado. Foi acordar uma semana
depois, já estava atrasado para o casamento. Foram morar na casa de seo Fabiano. O pobre do
Procópio logo se arrependeu, pois a mulher não melhorou nem um tiquinho e começou a comer feito um
boi, diziam que até já tinha comido um boi só durante a lua de mel. Julinha começou a engordar, em
menos de dois meses parecia um elefante de tão gorda que estava. Procópio via tudo sem acreditar.
Começou também a mandar na vida dele, tinha horário para tudo. Se chegava cedo, brigava. Se
chegava tarde, brigava. Se chegava no horário mandado, brigava. Julinha brigava tanto que nem pescar
com a gente ele podia. No final nós e Procópio estávamos arrependidos do que fizemos. A mulher era o
inferno! Uma vez, ele falou que queria ter filhos e ela bateu nele com a tranca da porta. Procópio ficou
um tempão descadeirado, andava mancando. Todo mundo sabia que era por causa da surra, mas dizia
que tinha caído da escada. Outra vez ela teve uma crise de ciúmes no meio da missa de batizado da
filha de Seo Cecílio, apenas porque o infeliz olhou para uma prima do Batistinha. Julinha bateu nele ali
mesmo. Só não o descadeirou de novo por intervenção do padre Gregório e do Seo Fabiano.
— O que mais, vô?
— Outra vez, a bruxa não deixou Procópio ir a uma festa na fazenda de um tio em Nuporanga, ela foi
sozinha. Livre, combinamos que iríamos pescar. Chegamos antes dele no Verde. Afonsinho, que tinha
uns olhos de águia, foi o primeiro a ver Procópio vindo, mas estranhou pois ele parecia estar um pouco
mais alto. Quando chegou perto da gente, nós vimos que estava andando a,pelo menos, três palmos do
chão. Perguntamos o que estava acontecendo, disse que não sabia, mas estava gostando. A gente
naquele dia não pescou. Ficamos brincando com o Procópio que levava cada um de nós nas costas para
passear. Deu até para pegar algumas frutas altas do pomar do Seo Alencar. Cada dia que passava ele
andava mais longe do chão. Quando Julinha chegou, estava a uns dez palmos acima. Viu o marido e
caiu para trás, morreu dura e preta de susto. A cidade toda fingiu tristeza, menos o Procópio e nós, claro.
Dali para frente só foi divertimento e brincadeira, a gente andava por todos os lados da cidade... o resto
conto amanhã.
— Depois da aula eu passo aqui.
noite
Tem que engolir o arroz integral empapado que o pai fez.
— Vai ficar melhor da próxima vez.
Dante reza para que não haja uma “próxima vez”.
manhã
Responde todas as questões de Literatura.
É o primeiro a terminar a “prova surpresa”. Literatura é fácil!
Vê Paulo se preparando para jogar um bolo de papel.
Conta para a professora e ela repreende a classe. Tira meio ponto de todos. Dante percebe os olhares
de raiva.
Antes do início da aula seguinte, recebe vários bolos de papel na nuca.
tarde
Jogo de volta.
Por causa dos tapinhas nas costas sem entusiasmo, Dante percebe que tem a confiança de Eduardo.
Ganham de dois a um.
— Para um baixinho você joga muito bem.
— Valeu!
Dante escuta Paulo falando com Eduardo.
— Mas ele não é meio enjoadinho?
— E daí? Joga um bolão!
Na frente da escola, Dante vê Eduardo e Alan conversando com uma mulher que parece ser mãe de
alguém.
— Minha mãe quer falar com você – chamou o Eduardo. Dante vai perto da mulher.
— Sim?
— Você me é familiar, parece com a Fátima Neves!
— Minha tia.
— Que legal! Eu estudei com ela no Sagrado Coração.
— Que bom.
— Então você é filho da Maria Cândida?
— Não, sou filho do Heitor.
— Heitor?
— É.
— Heitor...
— É sim...
— Heitor!
Ela se despede e sai correndo puxando os moleques. Dante lembra que se esqueceu de perguntar o
nome dela. Encontra o avô dando o passeio do final de tarde. Andam juntos. Param na praça para um
refresco.
— Termina hoje vô?
— Termino. Procópio estava muito feliz, mas tinha as suas dificuldades: dormia no teto da prefeitura, era
o teto mais alto da cidade, e tínhamos que subir no telhado para dar comida para ele. Mas tudo era
brincadeira! Um dia teve uma ventania, ninguém conseguia sair de casa. Fiquei muito preocupado com
Procópio. Quando passou fomos procurá-lo, mas não o encontramos. Nós andamos pela cidade inteira
até que o achamos, segurando-se em uma mangueira. Fizemos alguns curativos e continuamos com a
vida boa. Mas Procópio ficou famoso: vinha gente até da capital para vê-lo andar longe do chão. Teve
gente que achou que era milagre e começaram até a rezar por ele. Como Procópio era muito bom não
disse nada, mas a gente sabia que não gostava daquilo. No dia do aniversário dele, tínhamos arranjado
uma âncora de presente, mas a gente não o encontrou. Procuramos pela cidade toda. Andamos por
todas as fazendas e nada. Um dia a gente desistiu. A cidade até já tinha mudado de nome: chamava-se
PROCÓPIO. Passados mais de dois anos, recebi uma carta. Minha primeira carta. Era de um lugar
chamado Himalaia e era do Procópio! Ele pedia desculpas por ter saído sem se despedir. Queria
conhecer o mundo e foi. No final garantiu que um dia voltaria e eu estou esperando...
— Isto é verdade vô?
— Duvida?
— Não...
— É verdade.
— Tá.
noite
Heitor chega em casa e Dante está escrevendo. Heitor prepara o jantar e Dante está escrevendo.
— Vai falar com sua mãe hoje?
— Não vou, falo amanhã.
— O que está fazendo?
— Trabalho de escola.
— Posso ver?
— Espere um pouco.
Dante entrega o trabalho pensando que o pai colocará um milhão de defeitos e que terá que escrever
tudo de novo.
— Também gosto desta história.
— Já conhecia?
— Já, mas ele tem melhorado com o tempo.
— Então não é verdade?
— Duvida?
— Não.
— Fica então sendo a verdade.
Assiste com Heitor e Ademar o filme Conta Comigo.
— Esse cara é “o cara”!
manhã
Dante entrega o trabalho. História é fácil.
tarde
Passeio de bicicleta com Priscila. Momento de descanso.
— Meu pai é o do meio. A mais velha é a tia Maria Cândida, casada com o tio Treco.
— Sei.
— E o meu tio tem um escritório de engenharia.
— E?
— Depois tem a tia Fátima casada com o tio Rodolfo. Os pais dos gêmeos: Rômulo e
Remo.
Andam.
Priscila vai para a casa de uma amiga.
Dante encontra o pai voltando de bicicleta.
Apostam uma corrida. Heitor ganha. Dante terá que arrumar o quarto antes do jantar.
noite
Conversa amena com a mãe. Ela está muito feliz. Fascinada com a Itália, fascinada com as pessoas.
Fascinada com tudo.
Ademar ronca.
manhã
Dante acordou muito mais cedo e sai para andar de bicicleta com Priscila. Outra parada para descanso.
Priscila tem mais fôlego que Dante.
Dante pergunta se ela sabia por que a cidade se chamava Procópio.
Priscila diz que era por causa do fundador, um grande bandeirante: Procópio Santos Silva.
Dante jura que tirou zero no trabalho em grupo feito individualmente.
— Todo muito me odeia na classe.
— Exagero!
— É não, os moleques nem falam comigo. As meninas também, nem os nerds.
— Bobagem.
— Estou com saudade de São Paulo.
— Sei.
— É muito mais legal do que aqui.
— Sei, mas fazer o quê?
— Aqui é muito chato!
— Tá, mas fazer o quê?
— Num sei.
— Amanhã quer jogar Wii em casa?
— Fazer o quê? Talvez... Vou.
tarde
Vai ao cinema com o pai. Assistem Rocky Balboa.
Dante percebe que algumas pessoas esquisitas olham esquisito para o pai.
Olhares de pessoas que parecem estar sentindo cheiro de um peido muito fedido. Olhares de raiva.
Olhares.
O pai cumprimenta a todos. Eles não respondem.
— Quem são?
— Alguns conhecidos meus.
— Seus amigos?
— Foram.
noite
Ademar faz o jantar: um arroz integral muito bom! Dante gosta desta “próxima vez”.
Ademar ronca baixinho.
manhã
Dante joga bola no campinho da rua de baixo. Time ganha com dois gols de Dante.
tarde
Jogaram Wii a tarde toda na casa de Priscila.
noite
Soube pelo porteiro do prédio que o Timão empatou com o Avaí. Joair Feiticeiro somente andou em
campo.
— O Ademar fumou!
— Não fumou. Pedi a ele.
— Quando foi buscar a pizza: fumou.
— Calma aí, já pedi para ele não fumar aqui em casa e ele está cumprido. O que quer mais?
— A pizza estava fedendo cigarro.
— Tava não.
— Tava sim.
CAPÍTULO II
manhã
Por que foi acordado tão cedo em um domingo?
Prestou atenção nas aulas e nos colegas, não estava com vontade de tropeçar ou levar uma cacetada
na cabeça.
No intervalo combina com os primos, Rômulo e Remo, um passeio. Tarde
daneves diz: Eaaaaaaaai manolo
artporto diz: Faaaaaaaaaaaaaaaala mlk... de boa?
daneves diz: naaaaa paz e ai?
artporto diz: boooom tmb
daneves diz: e se time em, ta maal viu... perdeu novamente, baaaambi. artporto diz: aaaaaaf, e o seu
mano, anda roubando muito para ganhar neh. daneves diz: fiiiiiiiiiica queto mlk... nuussa, to muito bolado
mano.
artporto diz: iiiiiiii ta cm vergonha neh, por issso que muda de assunto... mas o que aconteceu mano?
daneves diz: aaaaaaa, a mii me bloqueou no msn, nem quer mais fala comigo, mó estranho meu.
Eeeeeeeeee ainda to mo excluidão na escola
artporto diz: AAAAAH, então é isso ta apaixonadinho pela miii e ela te deu um balão? Naaa escola, é sim
mano, se é novo, é sempre assim, depois melhora mano. Já eu to rodando na escola, to de recuu,
certeza que eu repito esse ano.
daneves diz: Aaaaaaaaaah, nem to xonadinho nela não, ela é só minha amiga pó e ela ta me ignorando
fico preocupado neh... Aaaah, se nunca foi bem na escola, se é mó burro... Iiiii meu velho ta chamando,
vou ter que sair daqui... Flw
artporto diz: blz mlk, vou falar com a mii, pra vê se ela te desbloqueia ... flw
Mais tarde encontra o pai voltando para casa de bicicleta. Ali mesmo resolvem lanchar. Heitor quer
experimentar um sanduíche novo com queijo tofu.
Dante teme pela sua sanidade estomacal. Lanchonete bem arejada.
Heitor: Sanduiche de queijo tofu com um suco natural de laranja.
Dante: Um hambúrguer com tudo dentro e muito mais em cima e um refrigerante. Comem falando da
vida.
Passa um casal, ambos param e encaram Heitor. Encaram muito tempo. Sentam um pouco distante.
Ficam cochichando entre si.
— O que aconteceu?
— Mastigue devagar filho.
— Não entendi!
— Também não, mastigue devagar, por favor ...
noite
Dante sonha que está em Veneza com Bárbara. Ele rema um caiaque cor de vinho.
manhã
Dante levanta cambaleando e tropeça no criado-mudo. O latejar do dedão o desperta. Aulas chatas.
tarde
Termina a saga Crepúsculo. Acha muito chato!
Não atrapalha dona Antônia na arrumação da casa. Cidade pacata.
O mais estranho é que, para piorar, saiu brigado com Milena. Lembra o dia em que contou que iria
mudar de cidade e do jeito que ela ficou. Achou esquisito ela sair correndo. No mesmo dia constatou que
ela o bloqueou no MSN.
noite
Conversa com a mãe foi rápida. Que bom! Queria falar de outras coisas e ao mesmo tempo não queira
falar.
Sonha que está andando pela Cordilheira dos Andes com Arthur, Milena e Priscila. Há uma avalanche,
somente ele escapa e salva todos.
manhã
Tropeça e cai. As meninas da frente riem.
— Viu fessora, depois vai dizer que foi nóis aqui do fundo, né?
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de cima no campinho da rua de baixo. Ninguém fala muito com ele.
Todo mundo quer estar no mesmo time dele.
Faz a lição vendo televisão e navegando na internet.
noite
— Que mais, mãe?
— Tudo tranquilo?
— Tenho saudade.
— Também.
— Amo você mãe.
— Também te amo.
Dante não ouve ronco nenhum!
manhã
É o primeiro a entrar na sala. Senta. É o ultimo a sair para o intervalo.
É o primeiro a voltar do intervalo. Senta.
É o ultimo a sair da classe. Tropeça e fica gargalhando sozinho.
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de baixo na quadra da rua de cima. Ninguém fala muito com ele. Todo
mundo quer estar no mesmo time.
Espera o pai na praça e ganha a corrida que não teve premiação.
noite
Uma festa surpresa sem ser surpresa para tia Fátima
Estavam todos e todas, menos o Heitor que tinha aula. Até sobrinhos e alguns primos que Dante nunca
tinha visto.
Uma prima, a Aparecida Maria, perguntou pelo pai de Dante. Antes que responda, tia
Maria Cândida olha feio para a prima. Aparecida Maria, encabulada, muda de assunto.
— Tá gostando daqui?
Dante resmunga e enfia três brigadeiros na boca. Caminha para o lado do avô Luiz.
Tio Rodolfo o chamou de lado. Dante já foi esperando a mesma brincadeira de sempre.
— Adivinha o que tenho na mão?
— Não sei, tio!
— Adivinha!
— Um elefante!
— Não vale, você viu o rabinho...
— Adivinha o que cai em pé e corre deitado?

— Chuva, tio!
— Que nada, uma minhoca de paraquedas!
— Adivinha o que cai em pé e corre deitado?

— Uma minhoca de paraquedas, tio!!
— Que nada: chuva!
E sempre saía rindo e recontava a história para todos.
Foi procurar o avô, que come gulosamente um grande pedaço de bolo.
— Seu pai está bem?
— Tá legal!
— Fala que vou telefonar para ele. Quero marcar um almoço na terça.
— Vô, terça o meu pai dá aula em Americana.
— Fala que vou ligar.
— Falo sim.
— Não comenta com sua avó sobre o nosso combinado.
— Por quê?
— Eu e sua avó temos opiniões diferentes sobre alguns assuntos. Respeito as dela, mas tenho as
minhas.
— Mas por que não posso contar?
— Porque é um combinado nosso!
— Mas por quê?
— Porque ela é muito brava!
— Sei, como o meu pai.
O primo Rômulo chama Dante para jogar bola.
— Soube que arrebentou na escola.
— Foi?
— É o que dizem.
— O que falam?
— Que um esquisitinho joga muito! Apostei com o Remo que era você: ganhei!
manhã
Aulas chatas.
Joga conversa fora com Priscila no intervalo. Mais aulas chatas.
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de baixo na quadra. Depois anda de bicicleta pela cidade.
Um pouco depois senta na praça para apreciar a vista. Muito depois encontra o pai.
noite
Bárbara conversa rápido. Tem que estudar.
Queria contar para a mãe que tudo está sem graça, estranho, diferente. É legal viver com o pai, não é
legal a vitamina com gosto de terra que o pai dá. A rinite melhorou, não tem ficado resfriado desde que
chegou. Mas queria estar em São Paulo. Tem vontade que um meteoro caia na no meio da cidade e que
todos, menos ele e os seus, virem zumbis. Tem vontade que somente ele possa resistir aos zumbis, pois
o meteoro é capaz de lhe dar força de catorze homens. Tem vontade que, depois de muita luta, ele
consiga reverter os efeitos do meteoro e volte para São Paulo.
manhã
Dante sai para passear com Netinho, filho mais velho da tia Maria Cândida, a noiva, Abigail, e os
gêmeos.
Vão até Piracicaba.
Andam pela Rua do Porto. Almoçam peixe.
tarde
Na volta.
— A gente podia vir jogar um futebolzinho amanhã! Que tal? — convida o Netinho.
— Vamos!
— Pego você pela manhã.
— Oba!
Noite
Acredita que está sentindo cheiro do cigarro na casa toda. Ademar ronca muito!
manhã
Heitor e Ademar preparam o café da manhã. Netinho se atrasa.
Dante espera mais de meia hora em frente ao seu prédio. Chega e nem se desculpa.
Vão.
Joga futebol com os primos. Faz dois gols e leva uma “paulistinha” do Rômulo. Termina o jogo
mancando.
tarde
Heitor, Ademar, Dante e Priscila vão assistir Alice nos Pais das Maravilhas.
Dante achou “meio colorido” demais, porém gostou. Mas não entendeu nada. Não lembrou da história
que sua mãe lia. Estava diferente.
Ademar e Priscila gostaram. Heitor dormiu de cansaço.
noite
Dante vai lanchar com a avó Salete, o avô Luiz, tia Fátima e os filhos. Na primeira chance tia Fátima
pega o violão.
Ela e o avô Luiz cantam músicas antigas.
Dante acha que o avô tem uma voz muito bonita.
— Já beijou?
— Não, Remo. E você?
— Muito!
— É legal?
— É sim.
No meio da noite Dante acorda sobressaltado. Teve novamente o pesadelo!
manhã
Heitor não faz as suas ginásticas matutinas. Conta que distendeu um músculo da perna esquerda
dormindo.
— Velhice.
Dante Neves
Data de nascimento: 26.11
Cidade Atual: Procópio Cidade Natal: São Paulo Gênero: Masculino.
Sobre mim: Estou morando com o meu pai em Procópio.
O que emociona: Meu Timão. Ídolo ou ídolos: Falcão (futsal), Ronaldinho Gaúcho e Joair, o Feiticeiro.
O que gostaria de dizer: Campeão mundial de futebol pela seleção e pelo Timão.
O que mais? Quero ser jogador de futebol do Timão.
Atividades e interesses: Futebol, futsal, futebol de botão e futebol de areia.
Uma frase: “Aqui tem um bando de louco!”
Por que está aqui e não está lá: Minha mãe está estudando fora. Tenho que morar
algum tempo com o meu pai.
Informações de contato: www.dantefutebol.wordpress.com
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de baixo na quadra.
Depois assiste o repeteco do jogo: Corinthians 6 x São Paulo 3, que foi no Pacaembu. Sergio Luiz fez o
goleiro deles de bobo. Joair Feiticeiro fez um golaço do meio do campo. O Timão passeou em cima dos
bambis!
noite
— Acha que estou mais gorda?
— Não mãe, tá legal!
— Acho que eu engordei.
— Engordou não.
— Engordei sim. Tenho comido muita massa.
— Para mãe, você está legal! Olha, eu até pegava...
— Dante!
— Verdade, pegava sim!
— Que me conta?
— Tudo legal. Conversei com o Arthur outro dia...
— Sim. O que ele conta?
— É o lerdo de sempre...
— Tá bom! Querido, amo você! Até amanhã.
— Beijos mãe.
A mãe estava mais gorda sim, mas Dante, nem sob tortura, iria comentar com ela. É a mãe mais linda do
mundo!
manhã
Aula de Geografia. Dante tentou se controlar, mas começou a responder a todas as perguntas feitas. A
professora agradeceu sem entusiasmo e a classe não vaiou.
tarde
Chove. Internet.
noite
Depois do mesmo pesadelo de sempre, Dante fica olhando para o teto. Por que as palavras mágicas não
funcionam mais?
Por que é que o leite derrama quando ferve? Por que minha mãe está longe?
Por que não pode comer na cama?
Por que não pode comer pavê todos os dias? Por que não pode dormir até mais tarde?
Por que não pode dormir vendo televisão?
Por que não pode ficar na internet mais tempo? Por que o Ademar não para de fumar?
Por que o meu pai não gosta de futebol? Por que o meu pai não sabe dirigir?
Por que o sono não vem? Por que os sinos dobram?
Por que os três mosqueteiros eram quatro? Por que tem azulejo verde?
Por que tem ficado tão irritado com o Ademar?
Por que todo mundo manda nele?
Por que é que as pipocas arrebentam?
Por que é que os queijos suíços têm buracos? Por que minha avó não fala com o meu pai?
manhã
Aula de Literatura. Dante tenta se controlar, mas começa a responder a todas as perguntas feitas. A
professora agradeceu sem entusiasmo e a classe não vaiou.
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de cima no campinho do outro bairro. Jogo valendo uma cesta de
manga.
O time do Dante ganha!
Na segunda manga lambuzada, Dante lembra que não gosta de manga.
noite
— Querido, acho que está exagerando.
— Mãe, você não acredita em mim?
— Acredito, mas pensa, isso vai acabar no final do ano. Logo depois do seu aniversário poderá ir para a
casa da Lucilla no Rio de Janeiro e ficar lá até eu voltar.
— Posso ir amanhã?
— Não.
Assiste ao jogo: Cruzeiro 2 x Corinthians 4 que foi no Mineirão. O técnico do Cruzeiro reclamou do juiz,
como sempre, e afirmou que este campeonato está comprado pelo Timão. Timão tem jogador e não
chorão.
manhã
Dante toma café, escova os dentes, reza e resolve não ir com a camiseta do Timão na escola.
tarde
Tarde chata e o seu time não perdeu.
Espera o seu pai na praça. Apostam uma corrida. Dante vence. Como prêmio: jantarão uma grande
pizza. Meio mussarela e meio calabresa. Massa fina e crocante, igualzinha àquela de São Paulo.
noite
— Fiz um blog.
— Sobre o quê, mãe?
— Sobre moda, minha viagem aqui, minhas considerações, dicas e você!
— Manda o endereço.
— Vou mandar. Leia e peça para o seu pai ler também, suas tias. Divulgue.
— Tá!
— Amanhã vou para o sul da Itália. Não sei se vai dar para falar com você, tá?
— Quando volta?
— Talvez no sábado ou domingo.
— Beijos.
Priscila Guerra Novaes
Cidade Atual: Procópio Cidade Natal: Piracicaba Gênero: Feminino
Sobre mim: Gosto de passear, andar de bicicleta, descobrir novidades e conversar
com todo mundo.
O que emociona: Um dia de sol.
Ídolo ou ídolos: Minha mãe, meu pai e meu tio Ademar.
O que gostaria de dizer: Somos diferentes com direitos iguais.
O que mais? Meu maior desejo é um dia ser advogada, como minha mãe e meu tio.
Atividades e interesses: vôlei e violão.
Uma frase: “O que faz a vida tão especial é o fato de que ela nunca se repetirá.”
(Emily Dickinson)
Por que está aqui e não está lá: Lá não sei onde será, mas será...
Ademar ronca alto. Os vizinhos reclamam para a síndica. A síndica reclama para o pai de Dante.
manhã
Heitor e Ademar acordam cedo e fazem ginástica juntos.
Dante volta triste para casa. Casemiro, um menino que senta atrás dele, no meio da aula de Matemática
perguntou por que ele anda com a “Gorda”.
— Que gorda?
— A gorda da outra sala.
— A Priscila?
— É!
Depois o menino começou a contar que: gordas são todas feias, são mal cheirosas e que somente
servem para “montar”. No recreio, para terror de Dante, Casemiro contou que um conhecido dele adora
montar as gordonas.
Dante teve vontade de brigar com Casemiro.
Ia bater nele, mas lembrou do que Heitor sempre fala: “Quem usa as mãos, perde a razão”. Mas também
ele não disse nada, ficou quieto. Devia ter dito alguma coisa.
tarde
Joga bola com o pessoal da rua de cima na quadra da rua de baixo. Seu time perde.
noite
Assiste com Ademar os jogos da segunda divisão da Miannar.
manhã
— Vamos ver um montão de filmes de terror! Quer ver?
— Legal!
—Regina e Quitéria também virão!
— Quem?
— Minhas amigas. Vem?
— Não sei, talvez eu saia com o meu pai.
— Tá.
tarde
Heitor tinha algumas aulas para preparar e a encomenda de uma apostila para fazer. Dante vai à casa
de Priscila e assistem: O massacre da serra elétrica versão um e o Silên-
cio dos inocentes que não é um terror e sim um policial, mas o Ademar diz sempre que foi o filme que ele
“quase morreu” de tanto medo.
Dante e as meninas acham os filmes toscos e sem graça. Porém, o que mexeu foi o vilão do filme:
matador de “gordinhas”.
— Você viu? O “Búfalo Bill” é o mesmo ator que faz o Monk!
— É? O Capitão?
— É ele sim, mais novinho.
A história do Casemiro voltou a incomodar Dante. Ele enrola e espera as meninas irem embora. Depois
conta tudo para Priscila.
— Vou meter uma porrada na cara do moleque.
— Vai não, ele vai ficar muito bravo comigo.
— É um saco! Vou meter uma porrada na cara dele.
— Não acho certo...
— Certo é ficarem falando estas coisas de mim?
— Nada disso é certo, mas não sei o que fazer...
— Também não... mas a vontade é bater no cara...
noite
Bárbara não aparece no Skype.
Dante fica mais de uma hora esperando enquanto ouve os roncos do Ademar. Manda um e-mail para a
mãe.
manhã
Dante acorda quase na hora do almoço.
tarde
Assiste com Ademar o Timão vencer o Vitória da Bahia por dois a um. Joair Feiticeiro ficou até a metade
do segundo tempo, não fez nenhum golzinho, mas a zaga do Vitória tremeu muito. Jansen e Joãozinho
fizeram para o Timão.
Ademar fede cigarro, apesar de não estar fedendo cigarro.
noite
Bárbara não aparece no skype.
Dante fica mais de uma hora esperando, enquanto ouve os roncos do Ademar. Manda um e-mail para a
mãe e uma mensagem pelo Twitter.
manhã
No intervalo.
Priscila chama Casemiro para conversar. Todos percebem que o menino treme de medo. Priscila fala,
fala e fala. Termina e sai.
Casemiro volta cabisbaixo para a roda.
— Queria namorar comigo! Dispensei de boa!
tarde
Dante passeia com Priscila de bicicleta.
noite
Dante fica mais de uma hora esperando, enquanto ouve os roncos do Ademar. Manda um e-mail para a
mãe, uma mensagem pelo Twitter e outra pelo Lifebook.
manhã
Aulas pacatas. Nada acontece. Dante estranha.
tarde
Dante encontra tia Cândida e tia Fátima depois da escola. Almoçam juntos no centro.
— Está gostando da escola?
— E o seu pai?
— E a sua mãe?
— Tem saudades de São Paulo?
— Ele é tão educado!
— E o Ademar?
Saem do restaurante e vão olhar vitrines.
Passam e entram em todas as lojas de sapatos possíveis e imagináveis.
— Fica mais um pouco: esta é a ultima!
— Fafá, veja aquele sapato ali! Que lindo! Estou precisando tanto de um!
— Maria, veja este! É a sua cara!
Na saída da última loja, com uma grande banana split prometida, encontram a mãe do
Eduardo.
— Fátima, como está, linda?
— Gracinha, você está muito bem!
— Sabia que o seu sobrinho é coleguinha do meu filho Eduardo?
— Não sabia — tia Fátima olha com aquele ar de fuzilamento fingido — ele é meio distraído.
— Não sabia que o seu irmão tinha um filho. Quem poderia imaginar?
— Imaginar o quê? — tia Cândida que queria sim, também, uma banana split, entra na conversa:
— O que você quer dizer com isto?
— Nada. Nada. Fátima, me liga! — vai embora.
— Você só tem amiga tonta.
— Era tontinha quando menina e agora ficou tontona.
noite
Dante fica mais de uma hora esperando, enquanto ouve os roncos do Ademar.
Manda um e-mail para a mãe, uma mensagem pelo Twitter, outra pelo Lifebook e liga no celular, que dá
ocupado.
Heitor e Ademar vão deitar cedo. Dante fica pensando na mãe.
CAPÍTULO III
manhã
Hoje é o aniversário do CORINGÃO! Viva o Timão!
A professora de História aproveita a falta do professor de Matemática e entrega os trabalhos.
Dante recebe um dez. Ela conta que ficou maravilhada com a “Lenda do Professor
Procópio”. Ordena que Dante leia.
Dante lê todo orgulhoso, até que percebe os olhares de reprovação da classe. Pausa e volta a ler com
claro desânimo.
Depois, a professora informa que o colégio irá participar do Desfile de Sete de setembro e convoca
Dante, Jaqueline, Marina e Isalene para levarem o Estandarte com o Brasão da Escola. O primeiro
ensaio será à tarde.
Altas gargalhadas.
tarde
Depois do ensaio chato, Dante joga bola na quadra da rua de cima.
noite
Dante assiste o Timão fazer a festa em cima do Vasquinho. Foi sete à zero. Joair Feiticeiro nem quis
fazer gol. Só ficou passando e organizando o meio de campo. Josuel fez três e Marcelo César os outros
quatro. Roberto Dinamite até entrou no campo para comemorar um gol nosso.
Dante tem o mesmo pesadelo desde que seus pais se separaram. Começa igualzinho ao que foi de
verdade: Dante tem cinco anos. Sempre vê os pais conversando, discutindo, mas nunca brigando, nunca
falando alto. Nos últimos tempos, os passeios com a família têm sido raros. Ou sai com o pai: vai ao
cinema, passeia no Parque do Ibirapuera e almoçam lanche. Ou sai com a mãe: comida indiana,
passeios no Shopping Paulista e casa de amigos.
Em um domingo pela manhã, Dante está jogando bola com alguns meninos do prédio. O pai vem vê-los
jogar, fica alguns minutos, Dante percebe que está nervoso.
Heitor tem a mania de, quando nervoso, ficar coçando a palma da mão. Heitor chama Dante:
— Temos que conversar com você.
Vão ao apartamento em silêncio, nada falam no elevador. Dante fica pensando que fez alguma coisa.
Na sala, Bárbara está com os olhos vermelhos.
— Senta, filhinho.
Dante senta e já pensa em chorar:
— Foi sem querer.
— Sem querer o quê?
— Eu fiz sem querer... Desculpa...
— Desculpa de quê?
— Desculpa, pai, mãe. Juro que nunca mais eu faço.
— Faz o quê?
— O que eu fiz.
— O que você fez?
— Num sei, mas não faço mais.
Bárbara se dá conta do fato. Olha assustada para Heitor. Este fica de costas para Dante. Foi a primeira
vez que Dante viu o pai chorar.
— Filho, olhe, a gente tem uma coisa para contar para você. Eu e seu pai gostamos muito um do outro e
amamos muito você, mas... a gente, pensou e percebeu que não quer mais namorar, viver junto.
Entende?
Dante fez que entendia, mas não entendia. Pensava o que ele tinha feito.
— Eu e o seu pai vamos morar em casas separadas. A gente vai se ver, conversar, mas não mais morar
juntos, entendeu?
Outra vez Dante concordou, porém pensava, revirava seus pensamentos tentando ver o que ele tinha
feito.
Não conseguiu e começou a chorar.
— Não chore, tudo vai ficar bem.
— Não chore, tudo vai ser legal.
— Não chore, pense: você vai ter duas casas.
— Não chore, a gente vai sempre estar junto.
O pai e a mãe de Dante tentavam consolá-lo, porém chorava, pois não lembrava o que tinha feito.
O pesadelo continuava daí: os pais de Dante, depois de consolá-lo, entravam no quarto e riam alto e
brincavam. Depois, chegavam com um enorme baú fechado. Dante sabia que todas as suas coisas
estavam ali. Os pais pegavam o baú e jogavam pela janela. Depois rindo, pegavam Dante, o abraçavam,
beijavam e o jogavam também pela janela. Dante sempre acordava caindo.
Um dia, Dante contou para a mãe e ela o levou na psicóloga, que explicou que é normal os filhos se
sentirem culpados pela separação dos pais. Precisava superar.
Dante tinha superado, mas o pesadelo não acabou.
Um dia, tomou coragem e perguntou para o pai qual o motivo dele ter se separado da sua mãe.
— Sabe, filho, a gente deixou de se gostar. Já não estávamos nos dando bem.
— Acho que foi por minha causa. Nunca vi vocês brigarem.
— A gente não brigava, mas o gostar de ficar junto acabou. Mas, por sua causa, a gente se dá bem:
somos os pais do Dante e sempre seremos.
Meses depois, Dante estava ardendo em febre. A mãe já tinha dado banho frio e todos os
medicamentos.
— Mãe, eu queria ter os cabelos encaracolados.
— Filho, acho difícil, Muito difícil!
— Mãe, eu queria ver você e o papai dormindo na mesma cama outra vez...
— Filho, deixa a febre abaixar um pouco que nós vamos procurar uma cabeleira amiga minha, lá em
Santo Amaro. Acho que dará um jeito. Encaracolados, né?
manhã
Dante presencia os meninos de sua classe tirarem sarro de um moleque muito magro no intervalo.
— Zé Palito!
— Pau de virar tripa!
— De frente parece que está de lado e de lado parece que foi embora. Dante agradece aos céus por não
ter sido com ele.
tarde
De: Bárbara Almeida (ban@barbara.com.br)
Enviado em: Quinta Feira, 2 de setembro 10:43
Para: Dante Neves
Assunto: Vida Louca!
Querido e Amado Filho, Desculpas!
Desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas,
desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas,
desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas, desculpas e desculpas.
O mestrado está sendo muito puxado! Tenho que rever conceitos. Novos olhares. Novas visões.
Fui dar uma volta por perto, como lhe disse. Nápoles é linda, parece meio São Paulo, porém um pouco
suja. Havia greve dos lixeiros.
Ali encontrei alguns colegas de curso e fomos até Salto di Fondi. É entre Nápoles e Roma, ficamos em
um camping: Fondi Holiday Camp.
Foi muito legal. Fiquei por lá. Descansei, relaxei e descansei. Até me esqueci da vida! Conheci muita
gente legal. Depois eu te conto. Entre no meu blog, eu postei algumas fotos.
Perdão pela demora. O meu celular quebrou e não há acesso à internet por aqui...
Beijos e amo você muito!!
noite
Dante mostra o e-mail para o pai e para o Ademar. Os dois não falam nada.
— Você conhece a sua mãe: muito atarefada. — depois o pai coça o queixo do mesmo jeito que sempre
coça quando não quer falar alguma coisa.
Ademar vai fumar na outra esquina, aproveita e compra vários dropes de hortelã.
A mãe de Dante teve muito amigos e alguns namorados. Dante acredita que todos foram namorados.
Com o tempo começou a perceber como ela ficava: distraída, cantava e falava sozinha, fazia as unhas e
principalmente cortava o cabelo:
— Enjoei do jeito antigo — ela dizia esperando mais elogios.
Outro fato era que, de um dia para o outro, em todos os lugares que iam estava este “novo amigo
querido da mamãe”. Que era sempre alegre, bem disposto, conversador e atencioso.
— O que vai ser quando crescer?
— Vai me dizer que não gosta de carrinho?
—Torço pelo glorioso São Paulo, e você? Alguns, viu uma ou duas vezes.
Outros, viu mais vezes. Outros, viu menos. Outros, viu até demais!
Somente Edgard e Mauro, Bárbara apresentou como namorados. Eram legais. Mas um dia eles foram
embora.
— Ele não tinha me contado que tinha outra namorada!
— Ele não quer casar.
Dante viu Bárbara chorar por alguns. Ficar aliviada por outros e ficar decepcionada com muitos.
— Filho, a vida é assim: se o ônibus está cheio, espera um pouco que passa outro com muitos lugares
para sentar.
manhã
Na hora do intervalo os meninos da classe de Dante cercaram um garotinho gordo e puxam a cueca
dele.
Dante agradece aos céus por não ter sido com ele.
tarde
Ensaio chato do desfile. Incidentes: Isalene faltou, Maria Fernanda, torceu o pé e a fanfarra desafinou.
Dante revê fotos antigas dele e liga para a Milena, que saiu com umas amigas. Desliga com a costumeira
promessa da tia Cláudia: que ela ligaria assim que voltasse.
noite
Esperando a mãe no Skype assiste com Heitor o Karate Kid.
— E o Ademar?
— Tem muito trabalho.
— Certo.
— E você com ele?
— Eu? Nada. Tudo bem.
— A implicância diminuiu?
— Não implico com ele... Apenas não gosto do cheiro de cigarro...
— O que vamos fazer?
— Nada, é só ele não fumar ...
— Só?
— Só.
manhã
Depois do ensaio para o desfile, Dante joga bola na quadra da escola. Faz dois gols. Comemora
sozinho.
tarde
— Eu fico com tudo!
Dante grita, mesmo querendo falar baixo. O grito é para resolver o falatório.
O almoço foi legal. Estavam todos e os primos Rômulo e Remo. Sempre um implicando com o outro,
contando piadinhas, fazendo gozações até com os pais.
— O que entra duro e sai mole e pingando?
— Tio! Sei não, o que é?
— Macarrão! Pensou em outra coisa, seu safadinho!
Foi bacana almoçar fígado, porém o melhor mesmo era o do Ponto Chic.
Depois da sobremesa a tia Fátima resolveu limpar o escritório do tio Rodolfo. Ele chama de escritório e
ela de bagunça.
Na verdade é o quarto do fundo da casa, cheio de caixas, livros e tralhas que tio Rodolfo insiste em
guardar.
— Tudo o quê?
— Fico com qualquer coisa para vocês pararem de brigar.
Dante tem pavor de briga, discussões e pessoas falando alto com pessoas. Sempre tem a vontade de
resolver.
Mas não havia uma briga e sim ordens da tia para que fizesse isto ou aquilo. Tio Rodolfo resistiu um
pouco. Concordou em jogar a maioria das coisas fora, menos a coleção de gibis do Demolidor. Por isso
começou a discussão acalorada.
— Dan! São revistas velhas!
— Raridades. Raridades!
— Quer mesmo?
— Quero.
Dante sente-se vitorioso. Ele resolveu!
A tia passa um pano úmido nos gibis. São duas caixas grandes.
— Depois você pode jogar fora — diz a tia enquanto o tio admira a sua ex-coleção. Rapidamente tudo
vai para a reciclagem.
— Este é um dos primeiros. É legal, pois conta a origem dele, porém melhora...
— Este é ele com a Viúva Negra; quando comprei, fiquei lendo a noite toda.
— Minha sugestão é que comece dos números mais velhos e depois vá lendo... ele é muito legal.
— Sabia que o signo dele é Sagitário, como você?
noite
— Enjoei do jeito antigo, resolvi mudar. Cortei curtinho.
— E os passeios foram bons?
— Muito bons! Bárbaros. Gostei muito!
— Foi com quem?
Bárbara olha de lado, enrola uma mecha de cabelo, do jeito que sempre faz quando não quer contar algo
importante.
— Eu e alguns colegas do curso...
— O que comprou para mim?
— Para você? Nada!
— Sei, o que mais?
— Nada. E por aí? Seu pai? Ademar? Sua avó?
— Mãe, já contei tudo! Todos bem. Você não tem mais nada para contar?
— Também falei tudo, querido! Preciso ir. Beijos e amo você!
— Também amo você. Mas mãe... não colou aquela história de “acesso à internet”, viu? Dante lê A
Queda de Murdock. Parece um filme, muitas cenas legais, muitas brigas, mui-
tos socos. Uma ex-namorada do Matt, a troco de drogas, vende a sua identidade secreta aos criminosos.
Quem compra é o Rei do Crime, Fisk. Com isso ele atazana a vida do Demolidor. Ele deixa de ser
advogado, perde a casa, perde tudo. Menos a dignidade e a vontade de lutar. Supera tudo, não recupera
a carteira da Ordem, mas auxilia o pessoal menos favorecido da Cozinha do Inferno. Muito legal.
Depois repensa em ser jogador de futebol e advogado.
manhã
O pai insiste que Dante coma granola e outros cereais. Afirma que dará energia para o ensaio do desfile.
Ensaio para o desfile.
Depois, um rápido jogo de futebol. O time de Dante ganha o jogo. Dante não fez nenhum gol.
tarde
Dante pensa que quer que o resto do ano passe rápido!
Ajuda o pai com a louça e liga para Milena, que não estava, tinha ido ver um tio. Liga para Priscila:
combinam andar de bicicleta.
Os dois saem pela cidade.
Ela o convida para uma brincadeira dançante no Tênis Clube no sábado que vem, das
15 às 21hs.
— Vou pedir para o meu pai.
Andam até o mirante da cidade. Dante chega exausto.
— Por que os meninos da minha classe me enchem o saco?
— Que nada, todos querem você no time deles.
— Pra jogar eu sirvo, depois nem falam comigo...
— Talvez porque você pareça um “metido”!
— Mas eu não sou ...
— Mas você parece! Quem não conhece você, acha.
— Mas como?
— Seu jeito de “se achar”.
— Superior?
— Melhor que os outros.
— Não sou não...
— Não é, mas parece...
Voltam em silêncio e com Priscila muito à frente.
noite
Dante dorme muito cedo.
manhã
Dante tem certeza que não é metido e que a molecada é muito chata!
Dante presencia os moleques no intervalo tirarem sarro de uma menina muito branca. Ele agradece aos
céus por ter tomado sol.
tarde
Ensaio com roupa para o desfile.
noite
Heitor obriga Dante a dormir ainda mais cedo: o desfile.
manhã
Está frio e uma garoinha fina. O estandarte que carrega é de papelão e madeira. Está encharcando e
cada vez mais pesado!
Dante treme de frio.
Na esquina da Avenida Luiz Gama com a Avenida Branca Alves Ribeiro, Ademar e Heitor estão vendo o
desfile. Aplaudem e Dante quer um chocolate quente.
tarde
Dante dorme a tarde inteira.
Acorda cansado e com calafrios. Está com febre.
noite
Dante dorme e tem o pesadelo de sempre.
Acorda mais suado, porém a febre parece que está diminuindo. Heitor conta que conversou com Bárbara
e que tudo está bem.
manhã
Dante não vai à escola, fica aos cuidados do avô Luiz.
— Que quer fazer, querido?
— Vou mostrar umas coisas.
Vão até o micro e Dante mostra ao avô vários vídeos do Youtube:
1 O vídeo do Salomão Salomão revoltado Copa 2010 [Oficial] chorando por causa do Brasil ter perdido e
xingando o Felipe Melo. Pior foi a mãe tentando consolar e esquecendo a idade do filho (“Que droga,
você não sabe a minha idade”)
2 Outro muito legal é o “Mataram a Formiguinha Que Dó” [Original]. Mais legal é o outro gêmeo falando:
“Mati!”. Fora os quinhentos “Que dó”
3 Outro que o Vô Luiz chorou de rir foi o “Não fecha a porta, tá? Tranquilo?”. Depois, o avô Luiz sugere
palavras cruzadas.
Dante adorou.
Almoçaram ali, os dois juntos.
tarde
Heitor falta nas aulas da tarde. Jogam Xadrez e Dama.
Visitas da tia Fátima e da tia Cândida.
Toma muito mais chá e tem que vestir muito mais blusas. Não sabe se o calor é da febre ou dos dois
cobertores de lã.
Assiste a um jogo do campeonato russo com o Ademar.
noite
Dante está muito mais disposto e sem febre.
Ficou meio magoado com o empate bobo que o Timão teve com o Atlético Paranaense na Arena da
Baixada. Mas estamos na frente!
— Melhorou filho?
— Tô legal...
— O seu pai contou?
— Contou o quê?
— Não?
— Não o quê?
— Nada...
— Que foi mãe?
— Nada! Preciso falar com o seu pai, chama ele! Por favor.
— Meu pai saiu, foi até a farmácia. Peço para ele ligar depois...
— Diz que vou mandar um e-mail para ele.
— Sobre o quê?
— Depois eu falo. Beijo. Amo você
— Beijos.
Dante pensa que, com certeza, não é uma coisa boa. Sempre quando um começa a empurrar para o
outro já vem bomba. A mais recente foi quando tinha que vir para Procópio.
manhã
Antes de iniciar as aulas, Paulo conta para Dante que vai começar o torneio de futsal na escola e ele já o
inscreveu no seu time.
— Legal. Obrigado.
— Vê se arrebenta, Baixinho.
— Pode deixar.
— Vamos treinar perto de casa. Hoje à tarde, certo?
— Tá.
Percebe que Priscila estava errada: eles acham Dante legal.
No intervalo, um dos moleques começou a implicar com Dante.
— Cara, deixa o baixinho em paz — ordena Paulo.
— Tá...
Dante presencia os moleques tripudiando uma menina com cabelos muitos curtos:
— Joãozinho!!
— Parece o Pikachu!!
Pior que parecia mesmo!
Dante pensa que Priscila está errada.
tarde
Não adianta Dante ter uma ideia para uma jogada, ninguém liga. Apenas funciona quando fala
diretamente com Paulo.
Treinam com seriedade.
O time reserva entra para rachar. As canelas de Dante ficam marcadas.
noite
— Minha mãe falou com você?
— Escreveu e eu respondi.
— O que era?
— Ela vai falar com você.
— O que ele vai falar?
— Você vai ver.
— Posso ir na brincadeira dançante com a Priscila?
— Onde vai ser?
— No Tênis.
— Você está melhor?
— Estou. Posso?
— Que é que você vai falar?
— Nada.
— Mãe! Fez o maior suspense para nada?
— Calma ai...
— Mãe! Que é que é?
— Nada...
— Mãe?
manhã
Aulas chatas.
Dante mandou várias jogadas para o Paulo. Que cada vez que recebia uma mandava um sinal de
positivo.
Priscila está redondamente enganada.
tarde
Almoça com a avó Salete o e o avô Luiz. Sai falando que vai voltar mais tarde para comer o pavê.
Treina, treina e treina. Sai com as canelas roxas.
Dorme no sofá da sala da avó, com um prato de pavê no colo.
noite
Fala rapidamente com a mãe.
Deita cedo. Quer descansar. O treino será pela manhã. Descobriu que o time da classe irá à Brincadeira.
Priscila está cubicamente errada. Nem se importa se o Ademar ronca.
manhã
Treina. Treina. Treina e treina. Canelas roxas e sorriso nos lábios.
Os meninos marcam de se encontrar às duas e meia na frente da casa de Paulo. Dante pedala o mais
rápido que pode.
tarde
Dante toma banho muito rápido. Não lava as orelhas. Dante almoça correndo. Não come o espinafre.
Dante coloca um tênis muito velho e o pai o obriga a por um outro, o azul.
13:45hs. Dante está ansioso na frente da casa do Paulo. Paulo nem tinha tomado banho.
13:46hs Ninguém chegou e Paulo não tomou banho. O pai de Paulo grita com ele. A
mãe de Paulo grita com ele também.
13:54hs Ninguém chegou e Paulo não tomou banho. O pai de Paulo xinga o Paulo. A
mãe de Paulo xinga o menino também.
14:02hs Ninguém chegou e Paulo foi tomar banho. O pai de Paulo continua a gritar com o Paulo. A mãe
do Paulo não.
14:06hs Ninguém chegou e Paulo está tomando banho
14:13hs Ninguém chegou e Paulo já saiu do banho. O pai do Paulo continua a gritar com ele. A mãe do
Paulo sai para ir ao supermercado.
— Quer entrar?
— Fico bem aqui, obrigado...
— Que menino educado! O Paulo devia ser assim...
14:24hs Ninguém chegou e Paulo troca a camisa verde pela vermelha.
14:25hs Ninguém chegou e Paulo troca a camisa vermelha pela rosa.
14:26hs Ninguém chegou e Paulo troca a camisa rosa pela amarela.
14:27hs Ninguém chegou e Paulo troca a calça preta pela azul. O pai do Paulo está assistindo televisão
e tomando cerveja.
14:28hs Ninguém chegou.
14:29hs A molecada chega e entra na casa do Paulo sem bater.
14:30hs O pai do Paulo pede, gritando, que tragam mais cerveja e fechem direito a porta da geladeira.
14:38hs Saem e Dante vai atrás.
Ficam na frente do Tênis. Tiram sarro de todos que entram.
— Olhe aquela ali: está com todas as cores!
— Aquele ali foi a “mamãe que arrumou”.
— Aquela ali é “emo”.
— Aquele ali é um “vara pau”! Entram e ficam ao lado do DJ.
— Essa música é muito ruim!
— O quê?
— Aquela parece o “Friagem” do Ben 10.
— O quê?
— Aquele parece a “Gosma”.
— O quê?
— Aquela está mais feia que o “Macaco-aranha”.
— O quê?
— Olha quem vem vindo: a gorda!
— O quê?
Priscila vem em direção de Dante. Nem dá atenção aos olhares dos moleques.
— Você me deixou esperando.
Dante não sabe o que dizer. Olha para os moleques que riem.
— A gente não combinou nada.
— Combinou sim. Eu convidei você e pensei que viríamos juntos.
— Não combinou.
— Combinou.
— Não combinou. Priscila vai embora.
— Você deu bolo na gorda.
— Dei não.
— Namorado da gorda.
— Sou não.
— É sim!
— Sou não...
— Já beijou a boca gorda da gorda?
— Beijei não.
— Quer beijar?
— Não!
— Cara, deixe o baixinho em paz... Olha, aquele ali parece o “Enormossauro”.
— O quê?
noite
A molecada foi expulsa do salão.
Fizeram brincadeiras indecentes: passaram a mão nas meninas, puxarem as cuecas dos pequenos e
roubaram refrigerantes.
Alguém deu uma ideia.
— Vamos dar um “salve” no baixinho. Todos concordaram, inclusive Paulo.
Dante tentou correr, mas pegaram.
Tapas na cabeça e o deixaram de cueca! Levaram as roupas para fora. Foi uma puta falta de
sacanagem!
Dante corre para o banheiro, porém devido ao pânico, primeiro entra no banheiro feminino e depois, sob
uma gritaria infernal, entra no masculino.
Dante só sai quando um segurança volta com as suas roupas todas sujas de lama.
— Como foi?
— Legal
— O que aconteceu com você?
— Caí em uma poça de água da chuva.
— Mas não choveu.
— Caí em uma poça de chuva sem chuva...
— Encontrou a Priscila lá? Ela estava procurando por você.
— Encontrei sim...
— Dançou bastante?
manhã
Dante resolve ir à missa com os avós.
Depois almoça na casa de tia Cândida. Implora aos anjos para que nenhum dos gêmeos soubesse da
brincadeira dançante.
tarde
Assiste sozinho ao Timão fazer quatro à zero no Grêmio de Porto Alegre.
Ademar saiu com Heitor. Foram em uma exposição de pintores abstratos em Campinas.
— Alô?
— Prita?
— Sim?
— Desculpa.
— De quê?
— Desculpa!
— Não há do que se desculpar.
— Você sabe... desculpa!
— Vou pensar.
— Tá...
noite
— Alô?
— Prita?
— Sim?
— Já desculpou?
— Estou pensando. Você tem a bunda bonitinha!
— Para!
— Morri de rir. Mas acho que foi muito chato!
— Imagine como fiquei... nem sei se vou para a escola amanhã...
— Ademar falou que se fosse ele, iria.
— Você contou para o Ademar?
— Contei... por quê?
— Ele vai contar para o meu pai.
— Acho que não.
— Acho que sim...
— Fica calmo, vou ligar para ele e pedir para não contar...
— E se já contou?
— Peraí que eu já ligo de volta. Minutos que foram anos depois:
— Ademar não contou.
— Jura?
— E disse que são coisas de pai e filho.
— Obrigado.
— Até amanhã, a gente se encontra na escola.
— Se eu for...
manhã
Dante entra na sala de cabeça baixa.
Senta em seu lugar e somente ouve a risada de todos.
No intervalo fica na cantina com a Priscila e a Mariana.
— O jogo é amanhã. Tem treino hoje!
— Tá legal...
tarde
Treino com muito menos caneladas.
Depois, encontro com o avô. Conversam sobre a família, as saudades e sobre o futuro.
noite
Dante não consegue dormir. Pensa na mãe. Pensa no pai. Sonha que perdeu muitos gols.
manhã
As aulas em marcha lenta.
tarde
Antes do jogo, o time titular e reserva se unem, dão as mãos.
— Um por todos!
— Todos por um!
O Rony, do time adversário, quer pegar a bola. Dante esconde bem a bola e a tira do alcance dele. O
marcador é facilmente driblado. Dante leva a bola pela lateral. Joga de cabeça erguida e todos os
companheiros estão marcados. Vai em diagonal para o gol. Júlio, goleiro deles, está pulando daqui para
lá.
Dante prepara o chute, mas perde a bola para Cidinho, do time deles. Bronqueado, corre atrás do
moleque. No meio da quadra, dá um carrinho, pega a bola e a perna do menino. Cidinho cai no chão
chorando.
Dante fala que foi na bola. Todo time vem para cima dele.
Fábio, o grandão deles, chega gritando e empurra Dante, que cai de costas no chão.
— Você é louco!
— É expulsão, seu juiz!
— Vou quebrar a sua cara!
— Seu pai é um “viado”!
Sobe uma raiva. Não quer brigar. Mas o meu pai não é um “viado”, apenas é diferenciado. Porém, as
costas e a cabeça doem.
— É não.
— Sua mãe é uma vaca!
Opa! Fábio não conhece a mãe de Dante! Bárbara já esteve algumas vezes em Procópio, porém nunca
passou mais de dois dias. Por que ele estava falando aquilo?
— É não!
— É sim!
— Grosso!
— Tonto!
— Perna de pau.
O juiz vem e afasta o pessoal.
Dante levanta e encara Fábio. Espera que o time o apoie. Porém, todos estão longe.
— Bobão.
— Você machucou o Cidinho.
— Entrei na bola.
— Mentiroso!
— O que você disse?
— O que você ouviu.
O juiz apita e manda todos circularem.
A discussão continua através de olhares e Dante perde um gol. O jogo termina empatado.
Ademar achou que o jogo foi muito ruim.
Priscila achou que aquele menino de azul é o mais bonito da quadra. Heitor estava dando aulas,
explicava como Napoleão perdeu a guerra.
noite
Dante conta e reconta o jogo para a mãe.
— E aí, alguma novidade?
— E a brincadeira dançante?
— Foi legal...
— Gostou?
— Vamos mudar de assunto. Contei como dei um chapéu no Rony depois que ele xingou você?
manhã
Dante tem boas notas. Porém é mediano em História. Logo a matéria do pai. Pensa em rasgar o boletim.
tarde
Jogam contra o Andorinha e ganham. Dante não entrou no jogo.
— Você é nossa arma secreta!
noite
Recebe uma mensagem destacada da Priscila no Lifebook e adiciona Ademar aos seus amigos
favoritos. Mas Ademar fuma e fede a cigarro.
Vê o Timão destroçar o Fluminense. Quatro à zero. Dois gols do Cesão, um do capitão
Wesley e outro do Manuel Henrique. Joair Feiticeiro se poupou.
Entra no novo blog da mãe: http://consultoriabarbara.wordpress.com e vê várias fotos dela abraçada com
um homem alto.
CAPÍTULO IV
manhã
No intervalo de aulas muitos chatas!
— Por que não entrei?
— O outro time já tinha sacado o seu lance: foi estratégia.
— Jogo melhor que o Flavinho...
— Joga, mas ele marca melhor.
— Vou jogar hoje?
— Num sei...
— Pois se não for pra jogar eu nem vou...
— Olha aqui, Baixinho! Você vai e joga se eu quiser. Se não for arrebento a sua cara, falei?
Todo mundo ouve a ameaça.
Dante abaixa a cabeça e volta para ao lado da Priscila.
tarde
Só no segundo tempo o Dante entra. O time está perdendo da quatro à zero. Todos gritam com ele.
Pedem bolas impossíveis.
Reclamam de tudo e não comemoram o gol que Dante faz. Jogo empatado: prorrogação.
O outro time pega duro em todos. Paulo sai contundido.
Luiz Mário entra, mas fica com medo da bola.
Dante pega a bola na sua área e corre pela lateral. Dribla dois marcadores e não cruza:
chuta. O goleiro espalma para dentro do gol. O time do Dante está nas semifinais.
Dante comemora com a Priscila no meio da quadra.
noite
Heitor pede riqueza de detalhes.
— Carrapeta? O que é carrapeta?
Dante explica ao pai com muita paciência.
— O drible é feito com posse de bola. Quem dribla, procura, com bola, passar por um adversário. Esse
“passar pelo adversário” exige velocidade, outros apenas mudança de direção, outros, criatividade, ginga
etc. Finta, ao contrário do drible, é realizada sem bola.
— Parece um professor, né? — observa Ademar, visivelmente orgulhoso. Priscila afirma que Dante
parecia o Joair, o feiticeiro.
Dante dorme feliz.
manhã
Todos comentam o jogo ganho de virada. Todos foram heróis.
Todos ganharam.
O professor ameaça mandar para a diretoria o fundão todo.
tarde
Ganhando, irão para a final no domingo.
Dante começa jogando. O seu marcador fala que é para ele não folgar, pois o pau vai descer.
Dante passa duas vezes a bola entre as suas pernas, cruza para o Paulo que faz o primeiro gol.
Vira para o segundo tempo, o time de Dante está ganhando de três à dois.
Saída do segundo tempo e o marcador entra firme. Dante leva uma cotovelada na boca, sangra e tem
que ser substituído.
Do banco, Dante vê o jogo empatar.
Em cima do banco, Dante vê o seu time perder o primeiro pênalti.
Na frente do banco, Dante vê outro time também perder um pênalti. Ao lado do banco, Dante vê o seu
time fazer todos os pênaltis.
Em baixo do banco, Dante vê o outro time perder um pênalti.
Estão na final de domingo!
Dante comemora com o time.
noite
Assiste o Corinthians ganhar fácil do Grêmio de Presidente Prudente.
Meio assistindo, meio sonhando Dante se imaginou com a camisa do Corinthians fazendo um gol no
Barcelona.
— Alô?
— Oi Prita?
— O que está fazendo?
— Estou indo dormir...
— Legal, uma prima minha tem um casal de gêmeos e terá que sair amanhã de manhã. Vou tomar conta
dos pestinhas. Eles têm mais ou menos quatro anos: Victor e Victoria, quer ir junto?
— Que legal!. Posso mesmo!
— Se quiser...
— Legal, e o que vai fazer depois?
— Sei não, tem uma Brincadeira Dançante no Tênis...
— Você vai?
— Vamos?
— Priscila! Depois de ter pago o maior King Kong, acha que eu vou?
— Por que não? Estava escuro e quase ninguém viu...
— Sei não...
— Vamos? Por favor!
— Tá, vou falar com o meu pai. Até ...
— Até. Beijinhos.
Antes de deitar, Dante entra no blog da mãe. Novas fotos de lugares, novas fotos de pessoas. Fotos
demais do homem alto e agora ele tem um nome: Alejandro Escobar.
manhã
Os gêmeos são muito bacanas. Falantes e alegres. Victor gosta de brincar de bola, carrinho e “Toy
Story”.
— Eu sou o Buzz Lightyear. “Do infinito e além” — e sai correndo apertando um botão imaginário.
Victoria adora brincar de casinha.
— Eu sou a mamãe. O Dante é o papai. A Prita é a filhinha e o Victor ...
— Sou o Buzz Lightyear.
— Não, o médico...
— O médico é que é o Buzz Lightyear.
Dante se dá melhor com Victória. Ela é mais amorosa.
— Não chora ...
— Eu sei, se a gente chorar muito vem um bichão de noite e come a mão da gente, né?
— Quem disse isto?
— Meu primo...
— Mas não é verdade!
— É sim, eu já vi o bichão.
— Foi?
— Tenho medo, tenho muito medo...
— Olha, vamos lavar suas mãos e o seu rosto que eu conto um segredo ...
— Já lavei! Que segredo?
— Uma palavra mágica que espanta todos os bichões...
— Que palavra é?
— Superfragilisticexpialidocious!!
— Que é isto?
— A palavra mais poderosa para espantar os bichões.
— Dá certo?
— Está vendo algum bichão aqui?
— Não!
— Então! Deu certo!
— Tem certeza?
— Sempre dá certo!
— Super... fragi?
— Superfragilisticexpialidocious.
— Super... fragilistic... expialidocius?
— Legal, fale baixinho para somente os bichões ouvirem...
— Tá...
tarde
Na brincadeira dançante, Dante entra depois de Priscila. Lá encontram Mariana, Isalene, Flávia e Sofia.
Conversam.
Dante olha para todos os lados, teme encontrar os moleques. Depois de muitas músicas, vê que eles
não estão ali.
Dante relaxa ao som de Single Ladies.
Dança com a Mariana. Dança com a Isalene.
Dança com a Flávia e a Sofia.
Dança junto com Priscila. Ela abaixa um pouco e ele fica em uma meia ponta. Conseguem.
Dança novamente com Priscila. Dança com Priscila.
Dança novamente com Priscila.
Uma hora os dois se beijam. Eles ficam um tempo que foi muito bom e curto. Desgrudam.
Dante pega um refrigerante e Priscila vai retocar a maquiagem. Dança com Mariana e Isalene.
Dança com a Flávia. Dança com a Sofia.
noite
— Que foi aquilo?
— Aquilo o quê?
— O beijo, você me beijou!
— Dante! Você é que me beijou!
— Prita! Não foi, você se abaixou e me beijou...
— Se fui eu, tá! Foi tão ruim assim?
— Não... Não! Foi muito bom!
— Também acho...
— E agora? A gente tá namorando?
— Dante! Não! Foi um beijo! Isto a gente pensa depois!
— Depois, quando?
— Depois, tá?
No Google: “O famoso chef de cozinha espanhol Alejandro Escobar, torcedor do Barcelona e dono de
um dos restaurantes mais premiados no mundo todo, afirmou hoje que o atacante brasileiro Joel Luiz,
novo reforço do Milan, é um “gourmet” da bola.”
No Bing: “Alejandro Escobar começou a cozinhar em 1980 devido ao seu emprego como lavador de
pratos no Hotel Playafels em Ibiza. Mais tarde, o chef da cozinha o ensinou a tradicional culinária da
Espanha. Escobar então, se tornou um expoente da gastronomia molecular (assim como o chef britânico
Heston Blumenthal), ousadamente experimentando novas tecnologias e inesperadas texturas e sabores.
O El Pasto fica aberto apenas de abril a setembro, já que Escobar passa os outros seis meses do ano
aperfeiçoando receitas em seu laboratório oficina, Il Workshop, em Milão. Ele é famoso pelo seu menu
degustação de trinta pratos como síntese das artes. Hoje ele é considerado um dos melhores chefs do
mundo e figura como o número 2 no Ranking Europeu de Restaurantes.”
No Uol: “Alejandro Escobar é solteiro, sem filhos, e afirmou para o jornal italiano que gostaria de
conhecer o Brasil e sua culinária”
No Terra: “Nascido em Hospitalet de Liobregat, cidadezinha dos arredores de Barcelona, na Espanha, o
chef catalão Alejandro Escobar é um autodidata sem tradição familiar no ramo e, muito mais por acaso
que por vocação, aos dezoito anos de idade, para ganhar um dinheiro extra nas férias, começou a
trabalhar na cozinha lavando pratos. Em pouco mais de vinte anos de carreira, ele se tornou um mito,
com um séquito de admiradores e seguidores espalhados pelo mundo todo. Seus livros tornaram-se
best-sellers. Mais que uma cozinha de base mediterrânea e concepções futuristas, Escobar gerou uma
nova cultura gastronômica baseada no produto, no trabalho e na técnica. Para a revista Time americana,
ele revolucionará a cozinha do século 21; a Business Week o incluiu entre os 50 líderes das grandes
mudanças na Europa no século passado; Paul Bocuse declara aos quatro ventos que com Escobar se
inicia algo verdadeiramente novo; o grande Jöel Robuchon o considera seu herdeiro natural. Gênio,
mago, surpreendente, instigante, inovador, polêmico. Algum desses adjetivos, quando não todos, sempre
surgem quando o tema é Alejandro Escobar, o chef que vem virando a culinária de cabeça para baixo
com sua cozinha totalmente fora dos padrões conhecidos, batizada de ’desconstruída‘, ou ‘da
desconstrução’.”
Em outra página há uma foto dele com a nova namorada: Bárbara de Almeida.
manhã
Durante o aquecimento, Dante viu na arquibancada a tia Fátima, o tio Rodolfo, a avó
Salete, o avô Luiz, o tio Treco e a tia Cândida.
Fazendo um alongamento, vê o pai chegar com o Ademar. Sentam duas fileiras acima deles. Salete nem
olha para eles. As tias e o tio acenam.
O avô Luiz vai até eles. Abraça demoradamente o filho e o Ademar. Senta ao lado deles. Todos acenam
para Dante.
— Xavi, vamos ganhar!
— Vamos!
— Sabe que não acho você metido?!
— Como?
— Todo mundo diz que você é metido e chato. Mas eu não!
— Todo mundo quem?
— Todo mundo!
— Como?
— Paulo falou que apesar de chato e metido você é muito bom de bola.
— Sou chato?
— Falam!
— Metido?
— Falam!
Os times perfilam na frente da quadra. Ouvem o hino nacional.
Ouvem o hino do estado. Ouvem o hino do município.
Time de azul: Dante, Paulo, Xavier, Mauro e o goleiro Cláudio.
Time de vermelho: Alan, Marcelo, Eduardo, Cosme e o goleiro Callado. Alan encosta em Dante.
— Cada bola, uma pancada. Marcelo encosta em Dante.
— Uma pancada depois da bola. Eduardo encosta em Dante.
— Que tias gostosas você tem! Jogo duro.
Dante percebe que sempre quando recebe a bola tem dois marcadores. Não conseguiu até agora passar
pelos dois.
Alan passa por Xavier, tabela com Marcelo, que devolve para Alan, que chuta. A bola passa por debaixo
das pernas de Júlio. Vermelho 1 x Azul 0.
Dante troca de lugar com Mauro. Recebe a bola no meio de campo e rapidamente passa para o Paulo.
Que lança o Mauro. Gol! Vermelho 1 x Azul 1.
Dante não deixa a bola esquentar no seu pé. Passa. Lança. Marca. Tabela
Vermelho 1 x Azul 2. Vermelho 2 x Azul 2. Vermelho 2 x Azul 3. Vermelho 2 x Azul 4. Vermelho 3 x Azul
4.
Dante ganha uma medalha como melhor jogador em campo. Paulo ergue o troféu de campeão.
Heitor vibra. Todos vibraram.
tarde
Almoço familiar, sem Heitor e Ademar, no Restaurante Polidoro. Dante está feliz, mas também está
deslocado sem o pai.
Dante está apaixonado, mas também está envergonhado.
Dante está saciado, mas também quer comer o pavê de amendoim.
Dante está contente, mas também sabe que acham que é metido e chato. Priscila tem razão.
noite
Jantar de comemoração com Ademar, Heitor e Priscila.
Ademar preparou um gazpacho com sorbet, que é uma sopa fria de tomates; e para sobremesa: pavê de
amendoim.
Dante está feliz, mas também está preocupado com a mãe.
Dante está apaixonado, mas também está envergonhado. Não consegue olhar para
Priscila.
Dante está saciado, mas também quer comer o pavê de amendoim.
Dante está contente, mas também sabe que acham que é metido e chato. Priscila tem razão.
Com a mãe está tudo bem, sem contar a notícia do novo namorado.
manhã
— O que eu faço?
— Primeiro, terá que andar de mãos dadas comigo...
— Prita!
— É! E me chamar para todos ouvirem: “Priscila, minha querida!”
— Verdade?
— Claro que não! Bobão!
— Fala sério, o que eu faço?
— Não sei.
tarde
Navega pela internet. Pesquisa mais sobre o namorado da mãe. Pensa: “Será que ele ronca em
espanhol?”
noite
daneves diz: miii, me desbloqueia vai, quero muito falar com você... daneves diz: mano ela não quer falar
mesmo.
artporto diz: tenta... tenta
daneves diz: vaaai mii, eu sei que ce ta on, eu falei com o arthur e ele disse que se tava. milbarros(: está
online
daneves diz: por favor... fala... artporto diz: tenta... tenta daneves diz: por favor... fala ...
milbarros(: diz: faaaaaaaaaaaala dan, o que você quer?
daneves diz: uééé, queria saber o que aconteceu, se é mó minha amiga, to morrendo de saudades de tu
milbarros(: diz: você sabe o que aconteceu, ce si mudou, e tava muito chato ... daneves diz: vc tb... mas
pq?
milbarros: é o seu jeito reclamão... que tudo o que não tem é melhor ...
daneves diz: como asssim?você brigou comigo antes de eu vir para cá, você já tava esquisita ...
milbarros(: diz: estava nada, não enche vai. ce sabe que você deu mancada por isso que eu tava
estranha
daneves diz: que mancada mii, ce ta fumada, ce ta falando coisas sem sentido milbarros(: diz: não é sem
sentido, é que eu fiquei triste, porque eu ia ficar muito... es-
quece
daneves diz: muuuito...? muito o quê? esquece..., é nada, agora eu to curioso, se sabe que eu sou
curioso, me conta vai!
milbarros(: diz: não é nada, eu já disse que não é nada, bobagem!
daneves diz: me conta vai, eu quero saber milbarros(: diz: esquece vai daan, deixa queto!
daneves diz: me conta mii, eu não vou ri, eu não vou contar pra ninguém milbarros(: diz: não é nada de
verdade booom, to saindo beijinhos daneves diz: sair? se vai aonde? bjs
milbarros(: diz: vou na sorveteria ... com a minha mãe daneves diz: mas sua mãe odeia sorvete
milbarros(: diz: odiava, agora ela mudou xau daneves diz: miii, ce ta fugindo de mim ? é isso ? milbarros(:
está online
artporto diz: fala mano. .falou com ela?
daneves diz: falei ...
artporto diz: tá... tá... me conta, então, do beijão?
manhã
Sem saber o que fazer, Dante resolve somente observar. Foi um dos últimos a entrar na classe. Senta.
Entra a professora de Geografia.
— Geografia é uma ciência, que tem como o objeto de estudo...
Durante a fala da professora, Dante bufa, olha para trás e faz caretas para o ar.
— A professora de São Paulo é muito melhor — diz para si mesmo em voz alta. Balança as pernas e
sente muito sono.
Dante começa a se ver.
tarde
— Alô?
— Quero falar com o Dante!
— Oi Victória, sou eu! Tudo bem?
— Vem na minha casa?
— Vou sim...
— Vem agora?
— Agora não, talvez amanhã!
— Agora.
— Amanhã.
— Que horas?
— Depois do almoço.
— Mãe, que hora é a hora depois do almoço ?... tá... espero... beijos e tchau. Dante sorri para o telefone.
noite
— Nada mais, mãe?
— Nada!
Bárbara já tinha perguntado do jogo. Já tinha feito a dancinha que Dante odeia. Já tinha contado tudo da
Itália e de Milão, menos o que interessa.
— Vai contar ou não?
— O quê meu filho, campeão, artilheiro e ator?
— Mãe, não sou mais criança, todo mundo sabe...
— Sabe o quê?
— Mãe! Do seu namorado!
— Que namorado?
— Peraí mãe...
— Perando...
— Não tem graça, vai contar ou não?
— Tá! Estou saindo com uma pessoa.
— Parece aquela história do gato que subiu no telhado...
— Tá, tá, estou namorando um pouquinho...
— Que legal!
— É muito legal mesmo... O seu pai te contou?
— Descobri sozinho...
— Como?
— Pesquisando. E ele, como é?
— Ele é muito legal...
manhã
Aula de Matemática. Dante percebeu que sabia todas as respostas, porém não quis responder. Falou
apenas algumas vezes que “em São Paulo é melhor!”.
Não fez careta.
Na saída, um homem muito gordo passa em uma bicicleta em frente à escola.
— Daqui a pouco a bunda dele vai engolir a bicicleta.
Dante sentou de rir. Riu até que percebeu que não tinha tanta graça.
tarde
Dante passa na casa da Victoria e do Victor. Brinca de casinha.
Joga futebol! Conta histórias.
— Chovia e o barco de papel descia o rio a toda velocidade. Não vai durar muito tempo pensou o
Soldado sem um braço. Mas, mesmo assim, tentava manter o barco firme, no rumo. Nunca tinha entrado
em um barco. Olhou para trás e viu um enorme tronco de madeira vindo em sua direção. Inclinou o barco
um pouco e o tronco passou raspando pela sua proa. Resolveu ir para o fundo do barco. Dali podia
controlar melhor. Respirou aliviado. Viu um enorme bueiro. Viu um redemoinho e pensou na Bailarina. A
Bailarina dançou para esquecer ele. Dançou a mais para derretê-lo do coração. Muito depois, dançava
apenas pelo gosto de dançar. O Soldado se jogou no fundo do barco. Ficou de cara enfiada no papel.
Lembrou do dia que lhe arrancaram o braço. Daquele dia em diante, sempre era o último a ser escolhido,
mas o primeiro a morrer. Muitas vezes os traídos e outras o inimigo. Um e dois. Três e quatro. Respirou.
Um e dois. Três e quatro. Transpirou. Um e dois. Três e quatro. Inspirou. Um e dois. Três e quatro.
Suspirou. Levantou com dificuldade e voltou para a popa. O barco estava se desfazendo. Caiu n’água e
nadou com um braço só... Pulou com um pé só... Sentiu alguma coisa bater no seu lado direito, era uma
enorme ratazana preta. Agarrou com a mão o pelo do animal. Respirou. A chuva parou... A música
parou... A Bailarina olhou para a lembrança dele e sentiu que não sentia a dor de gostar dele do jeito que
gostou. A ratazana deu um salto e caiu de barriga na calçada. Ficaram alguns minutos estatelados no
cimento. O Soldado de um braço a incomodou, ela mordeu, ela pulou e o jogou para longe. A Bailarina
fez um pliê. O Soldado de um braço foi encontrar com a Bailarina. Ele chegou quase seco, pingos
pequenos caíram no chão. Disse oi e sorriu. Ela ainda era linda, mas não sufocava. Ela sentiu dor no pé,
bem na ponta da sapatilha. Deu um salto e relaxou as pernas. Disse oi e sorriu. Ele ainda era gentil, mas
não a fascinava. Ele sorriu e corou. Ainda era fascinante, mas não entorpecia. Ela sorriu e olhou. Ainda
era, mas não como era. Ela disse que não escreveu. Ele disse que não chorou. Ela disse que esqueceu.
Ele mentiu e disse que pensou. Ela mentiu e disse que acreditou. Sorriram. Ela dançou. Ele disse até. O
chão ficou seco logo, pôde continuar a dançar.
— Eu sou uma bailarina.
— Eu sou o Buzz Lightyear.“ Do infinito e além”.
noite
— Sua tia Fátima vai para São Paulo amanhã, quer ir?
— Claro...
— Elas vão ficar até domingo...
— Mas, pai, preciso ficar com elas?
— Sim.
— Peraí.
— Pai, posso ficar na casa do Arthur?
— Não vai atrapalhar?
— Só precisa telefonar para a mãe dele...
— Sei não.
— Pai! Por favor ...
— Qual o nome dela?
— Tia Iva...
— Iva...
— Vai pai, pede, por favor!
Assiste sozinho ao Corinthians ganhar de cinco a um do Santos. Depois vê o DVD do filme O Contador
de Histórias. Achou muito legal.
Pilhado, não dorme.
manhã
Dante, tia Fátima, tia Cândida e avó Salete saem cedo rumo a São Paulo. Fátima e Cândida farão um
curso de Educação Especial.
A avó Salete vai passear. Dante vai matar a saudade.
tarde
Dante e Arthur andam pelos antigos caminhos. Vão ao clube, jogam bola, passam na escola.
— Ano que vem estou de volta.
Combinam encontrar com a Milena no shopping, na praça da alimentação. Milena chega muito depois do
horário combinado.
Dante tem vontade de correr em sua direção. Não vai.
— E aí?
— E aí?
— Tudo bem?
— Tudo bem.
Ela está mais bonita do que lembrava.
Conversam dos amigos passados. Conversam dos amigos presentes. Conversam.
noite
— Você gosta dela?
— Não gosto...
— Gosta sim!
— Gosto... como amiga.
— Vai almoçar na casa dela amanhã?
— Vamos, né?
— Num posso, tenho judô.
— Falta.
— No judô nunca! Vai e depois me conta.
— Contar o quê?
— Se ela beija bem.
Assiste com Arthur e a molecada do prédio o filme Transformes: A vingança dos derrotados. Dante
achou legal os efeitos, mas sem história.
manhã
Acompanha Arthur até a escola.
Depois passeia com a avó pela Avenida Paulista. Chega na hora do almoço na casa de Milena.
Almoçam o pai da Milena, que é um advogado meio famoso, que conta muitas histórias de fórum e júri; a
mãe, tia Iva, muito atenciosa com o Dante e que pergunta muito de Bárbara; Milena e os irmãos mais
novos: Pedro e Tiago, dois pentelhos. Todos querem saber tudo de Procópio.
tarde
As crianças vão para a sala de televisão. Para contentar os irmãos, assistem Kung Fu
Panda.
Terminado, Dante e Milena assistem Ponte para Terabítia.
noite
— Beijou?
— Não.
— Beijou sim!
— Não...
— Beijou, mas não quer me falar. Dante queria ter beijado.
manhã
Arthur e Dante vão ao clube.
Nadam. Jogam bola. Brincam e nadam outra vez. Encontram a Milena.
Almoçam.
tarde
Arthur vai dar uma volta.
— Quem é Priscila?
— Uma amiga.
— Que deixou: “E a gente canta. E a gente dança. E a gente não se cansa. De ser criança. A
gente brinca na nossa velha infância”?
— Amiga minha...
— Sei !
— Ela é sobrinha do Ademar.
— Que Ademar?
— Um amigo do meu pai...
— Um amigo do seu pai? Sei! Mas quem é esta Priscila? Dante começa a suar frio. Não sabe mais como
responder.
— Quem é esta Priscila?
— Sobrinha do Ademar...
— Que Ademar?
— O Ademar é o namorado do meu pai.
— O quê?
— Sobrinha do namorado do meu pai...
— Seu pai é uma bicha??
— Para com isso, meu pai não é bicha não...
— Mas está dizendo que ele tem um namorado.
— Tem sim, e daí?
— Mas se ele não é bicha e tem namorado, o que é que ele é?
— Ele é o meu pai!
— Mas você nunca contou para a gente.
— Ninguém nunca perguntou...
— Sua mãe sabe?
— Claro...
— Meu deus!
— Qual é o problema?
— Seu pai é gay!
— Não vejo problema...
— Como não?
— Não...
— Ele namora um homem!
— Foi uma escolha do meu pai.
— Mas ele é gay...
— Milena, meu pai me contou quando eu tinha mais ou menos seis anos: ele foi franco comigo. Explicou
que por namorar um outro homem ele não era um monstro e nem um mutante. Ele quer ser feliz como
todo mundo, né?
— Gay...
— Ser gay não é uma doença!
— Num sei...
— Não é não...
— Mas ele virou...
— Não vira gay, apenas é.
— Como é?
— Não é fácil para ele.
— Sei. O que as pessoas acham?
— Tem gente que não diz nada, tem gente que critica, tem gente que apoia.
— E você ?
— Não é um problema meu, quero bem o meu pai!
— Num sei.
— Vamos mudar de assunto. Mudam e voltam no assunto.
Voltam e não mudam de assunto. Dante quer falar de outras coisas. Milena quer respostas.
— Eles se beijam na sua frente?
— Ele dorme na sua casa?
— Eles andam de mãos dadas?
— Eles cozinham juntos?
— Quando eles casarem você será o “damo” de honra?
— Quem é a Priscila mesmo?
— Sua mãe namora mulheres?
— Você vai ser gay quando crescer?
— Você já beijou algum menino de lá?
— Você já beijou?
Dante quer beijar a Milena.
noite
Dante sai com as tias e a avó.
Depois de muitas lojas e um café na Casa das Rosas, Salete pede para que vá junto com ela: fazer
companhia.
Dante concorda.
Ele a avó conversam até dormir.
No meio da noite Dante é acordado com alguns choros.
— Que foi vó?
— Nada. Dorme, querido, dorme.
Dante adormece tendo a certeza que a avó está chorando.
manhã
Fazem um café almoçarado em uma padaria.
Dante toma o seu chocolate. Salete apenas um café puro. As tias se fartam no buffet. Dante observa a
avó. Ela sempre foi meio seriona, brincava sim, ria também, mas não como o avô Luiz ou a tia Fátima.
Mas nesta manhã ela está muito mais concentrada.
— Tudo bem, vó?
— Querido, está tudo bem. Dante dorme a viagem toda.
tarde
— Estou com muito ciúme de você!
— Mas por quê? A Milena é só uma amiga de São Paulo.
— Quem é Milena?
— A minha amiga de São Paulo, já contei para você. Aquela que tinha me bloqueado no MSN.
— Num to falando dela, estou falando da Victoria e do Victor.
— Prita, o que têm eles?
— Quando me encontram, só ficam perguntando: “Cadê o Dante?”; “Onde está o
Dante?”; “O Dante já vem?”.
— Gosto deles.
— Vou mais tarde à casa deles, vamos?
— Vou não, vou ficar com o meu pai um pouco. Outro dia.
— Tá, tchau.
— Tchau.
Dante assiste ao Timão arrasar o Internacional no Estádio do Beira Rio junto com Ademar.
Depois foi lanchar com os avós. Lava a louça para a avó.
Joga Dama com o avô.
Aprende a fazer crochê com a avó.
noite
— Você está muito mais bonita mãe!
— Você acha?
— Não sou cego, me conta do Alejandro?
— Um namorico de viagem, está divertido.
— Vai casar com ele?
— Não vou não. Não quero casar mais. E Sampa, como estava?
— Muito legal, fui ao clube. Passei em casa para pegar algumas coisas, está em ordem, a Matilde vai dia
sim, dia não.
— Eu sei, falei com ela na semana passada. Vou nessa. Beijo e amo você.
— Amo você. Beijos.
Pesquisa na internet: Gay, bicha, viado, boiolas, baitola, margarida, kiwi, frutinha, biba, tricha, gaycha,
fresco, pederasta, adé, morde-fronha etc.
manhã
Dante, para distrair, resolve voltar para casa por um caminho diferente. Passa em frente da casa dos
avós. No alpendre viu o avô Luiz cabisbaixo.
— Oi vô!!
Luiz levanta a cabeça e Dante percebe que está muito abatido, olhos vermelhos, parece que está
chorando.
— Que foi?
— Problemas.
— Que problemas?
— Sua avó.
— Brigou com ela?
Luiz cai em um choro sentido.
— Que foi vô?
— Sua avó está doente. Muito doente!
— Que ela tem?
— Câncer nas mamas!
— Sério? O que é isto?
— Dante, não estou com cabeça para conversar. Depois explico.
— Certo vô. Certo. Precisa de alguma coisa?
— Nada, nada, obrigado.
Pesquisa no Google segundo o Instituto nacional do Câncer: “O câncer de mama é provavelmente o
mais temido pelas mulheres, devido à sua alta frequência e, sobretudo, pelos seus efeitos psicológicos,
que afetam a percepção da sexualidade e a própria imagem pessoal. Ele é relativamente raro antes dos
35 anos de idade, mas acima desta faixa etária sua incidência cresce rápida e progressivamente. Este
tipo de câncer representa nos países ocidentais uma das principais causas de morte em mulheres.
Sintomas Os sintomas do câncer de mama palpável são o nódulo ou tumor no seio, acompanhado ou
não de dor mamária. Podem surgir alterações na pele que recobre a mama, como abaulamentos ou
retrações ou um aspecto semelhante à casca de uma laranja. Podem também surgir nódulos palpáveis
na axila”.
tarde
Dante não almoça e chora.
Dante desmarca com Priscila e vai visitar a avó. Chega tentando demonstrar que não sabe de nada.
— Vim ver você!
— Que bom!
— Que me conta?
— Pouca coisa aconteceu de ontem para hoje. Gostou do passeio?
— Foi legal, e você?
— Necessário.
— Sei, mas por quê?
— Quer um chocolate?
— Não, obrigado.
— Vou ao supermercado, que ir junto?
— Vou. Ajudo você.
Dante carrega uma sacola pesada para a avó. Como recompensa, ela faz um bolo de cenoura. Dante
não gosta de bolo de cenoura, mas come para agradar.
noite
— Tem razão, a Fátima também soube ontem. A minha mãe foi a São Paulo e fez várias consultas.
— Mas por que ela está escondendo?
— Para não preocupar.
— O avô Luiz estava chorando muito.Vai ver a avó?
— Vou. Heitor sai.
Meia hora depois, Heitor volta.
Ele entra em seu quarto e Dante percebe que o pai chora muito. Desconfia que a avó não quis falar com
ele.
manhã
Foi à escola sem querer ir.
Pelo menos hoje, não conversa com ninguém, fica em um canto da quadra. Pensa no pai. Pensa na avó.
Pensa na mãe. Pensa nas tias. Pensa na Milena. Pensa na Priscila.
tarde
— “A barata diz que tem sete saias de filó. É mentira da barata, ela tem é uma só. Ah ra ra, iá ro ró, ela
tem é uma só!”
— A Victória tem uma saia de filó. Ela é uma barata.
— Você que é uma barata.
— Sou o Buzz Lightyear.
— Você é um bobão.
— “A barata diz que tem o cabelo cacheado. É mentira da barata, ela tem coco raspado. Ah ra ra, ia ro
ró, ela tem coco raspado!”
— O Victor já raspou a cabeça ...
— Raspei não ...
— Ele nasceu com o coco raspado.
— Nasci não.
— “A barata diz que tem um sapato de fivela. É mentira da barata, o sapato é da mãe dela. Ah ra raá, oh
ró ró, o sapato é da mãe dela!”
— Minha vó tem um sapato muito bonito.
— Ela mora no Paraná e vai me dar um DVD do Buzz Lightyear.
noite
Heitor conta tudo para o Ademar.
Ele acalma o pai do Dante. Precisa ter fé. Tudo vai dar certo. Heitor chora nos braços de Ademar.
Dante vê que a implicância está passando. Heitor pede para Ademar dormir lá. Ademar não está fedendo
cigarro.
Assiste sozinho o filme Premonição 4. Muito ruim. Muito chato!
— Gostei mais do segundo.
manhã
Tentando tornar a vida normal. Dante volta a atentar para as suas atitudes. Porém, logo divaga.
Pensa na Milena. Pensa na Priscila.
Pensa na Mariana, que é muito bonita. Pensa na Flávia, que tem um cheiro bom. Pensa na Alexandra,
que joga um bolão.
Pensa na Cristina, que já tem peitinhos. Pensa na Daniela, que já tem um corpão.
Dante é chamado na diretoria. “O que eu fiz?”
— Você foi convocado para integrar a equipe infantil da escola de futsal. Vamos competir o regional e
acreditamos que você será de grande valia.
Dante volta para a classe exultante. Conta para todo mundo.
Mostra para todos a carta de convocação.
— Parece uma menininha.
— Que você disse Paulo?
— Que você parece uma mariazinha. Uma menininha pulando. Dante respira fundo.
Senta que a raiva vira ira. Levanta.
— Te pego na saída. Paulo sorri.
— Eu que te pego na saída.
Na saída.
Dante está arrependido de ter chamado a briga, não quer brigar. Paulo vem com a turma toda, porém o
diretor chama Paulo. Conversa e Paulo também foi convocado.
Paulo pula e dança. Passa por Dante.
— Quem parece uma menininha agora?
Paulo avança no Dante, mas é contido pelos outros moleques.
— Terá troco.
— Sempre tem um amanhã.
tarde
Dante chama os meninos da rua de baixo para jogar no campinho da rua de cima.
No começo ele parou de pedir tanto a bola. Ficou quieto.
Quieto, viu muitas jogadas que poderiam acontecer se recebesse a bola, mas viu muitas mais se outros,
melhores posicionados, recebessem. Combina com o time que iria sempre pedir a bola, porém iria
apontar para quem estivesse com uma melhor jogada. Quando não apontasse, era para ele mesmo.
Algumas vezes deram certo, outras não. Mas o jogo divertido ficou mais divertido ainda.
noite
Voltando da casa da tia Cândida, um pastor alemão persegue a bicicleta de Dante. Dante foge e despista
o cão.
Para em uma esquina, precisa retomar o fôlego.
— Você é muito burro!
— Mas, mãe. — Dante ouve um som de tapa e um choro.
— É um animal de rabo mesmo! Burro e idiota.
— Mas, mãe. — Dante ouve um choro.
— Como foi perder o dinheiro? Parece que não sei.
— Mas, mãe ... — Dante ouve outro tapa.
— E vem com esta cara de tonto! Não sei se você é uma besta ou está se fazendo de besta.
— Mas, mãe.
— Já sei: você é uma besta se fazendo de besta. E, ainda por cima, grandão deste jeito, mija na cama
todos os dias.
Dante vira e vê Paulo e sua mãe andando. Paulo carrega vários pacotes de supermercado.
Dante vê o Paulo.
Paulo vê que Dante o observa.
Dante finge que não está vendo o Paulo. Pedala mais depressa.
Assiste antes de dormir o filme Coração satânico. Muito legal, muito bom.
— Aquela moça é muito gostosa!
manhã
Foi à escola sem querer ir. Pensa na avó. Pensa nas tias.
Pensa no cachorro. Pensa no Paulo. Pensa na mãe do Paulo. Pensa na sua mãe.
tarde
Dante canta, dança e salta. Passa algumas horas com os pequenos gêmeos. Na volta, ele e Priscila
encontram Paulo e a molecada.
Dante passa ao lado de Paulo que o empurra.
— Vamos tirar a diferença agora.
— Paulo, deixa quieto.
— Você me chama pra briga e depois arrega.
— Não estou a fim.
— Eu estou...
— Fique ficando...
Paulo dá um soco no estômago de Dante. Dante fica de joelhos.
Paulo vai lhe dar um chute no rosto, quando Priscila lhe dá um soco nas costas.
— Não estou brigando com você.
— Mas eu estou, deixa ele quieto.
— Viram só? Ele é uma “menininha” que precisa de segurança, mariazinha mesmo! Paulo e a galerinha
ficam chamando Dante de Mariazinha.
Dante fica com raiva.
— Sou Mariazinha, mas minha mãe não me chama de besta que faz xixi na cama! Paulo para. Todos
olham para ele.
— Mariazinha.
— Quer que eu conte para a sua mãe? Mijão! Gargalham.
Irado, Paulo avança contra Dante. Tropeça e cai de cara no chão. Gargalham.
Paulo fica sem jeito. Todos riem muito. Paulo sai correndo.
noite
Dante se controlou para não contar para o pai que Priscila entrou em uma briga por causa dele.
Quer muito beijar novamente a Priscila.
CAPÍTULO V
manhã
Dante está envergonhado por causa da briga com Paulo. Pensa que foi muita sacanagem usar aquilo.
Mas o Paulo bateu nele. Não deu para aguentar! Pensa que tem que resolver da melhor forma possível.
O mais rápido possível.
E o Paulo faltou à aula.
tarde
Recebe um torpedo do Netinho: “Todos os netos da Salete na casa da minha mãe às 20hs
Reunião somente para os netos!”
Joga bola com a turma de sempre no campo de sempre. Sem muita vontade, pede para sair.
Resolve dar uma volta de bicicleta. Passa mais de quatro vezes na frente da casa do
Paulo. Não encontra o menino. O arrependimento faz a barriga doer.
noite
— Não adianta ficarmos com cara de enterro, temos que fazer algo.
— O que fazer?
— Clinicamente ela está bem cuidada, irá fazer todos os procedimentos, mas tem uma coisa.
— Ela está desanimada!
— Certo, Dante! E com isto fica mais difícil.
— Mas, o que fazer?
— Remo! Não consegui pensar sozinho.
— Que tal levar ela para jantar?
— Ela faz sempre.
— Dançar.
— Ela vai com o vovô!
— Coral!
— Coral? Dante?
— Um coral dos netos. Lembra que nos natais ela fazia vocês cantarem?
— Legal, é uma! Pensei outra coisa também!
Os netos de Salete planejam. Dividem as tarefas. Repassam as etapas. Operação Vovó começa!
manhã
Dante fica grudado na avó. Tinha que dar o paradeiro dela minuto a minuto.
— Foi ao supermercado?
— Fazer o quê?
— Compras, oras! Estão prontos?
— Será no almoço, cole nela...
tarde
Fazia muito tempo que Salete não ria alto. Mas começou por um susto.
Enquanto Salete, Luiz, Dante e Fátima almoçavam, os primos mais a Cândida entraram cantando
“Sandra”, de Gilberto Gil.
— Na primeira noite quando nós chegamos no hospício/E Lair / Lair porque quis me ver e foi lá no
hospício / Salete fez chafé que é um chá de café que eu gosto./ E naquela semana tomar chafé foi um
vício...
Depois cantaram: Viola Enluarada, Andança,Travessia e Domingo no parque. Terminaram dançando ao
som de Odara na calçada da frente.
Todos abraçaram Salete.
Dante sabe, pelo porteiro do prédio, que Joair Feiticeiro só não fez chover no Pacaembu na vitória do
Timão contra o Ceará. Foi de de um à zero, mas ele fez miséria, saiu exausto no final do primeiro tempo.
noite
Salete resiste em sair, quer ficar e assistir a novela.
Vô Luiz foi jogar cartas.
Tia Cândida tinha que fazer um fechamento no escritório do tio Treco. Tia Fátima tinha muitas aulas para
preparar.
Salete e Dante jogam xadrez.
— Vamos comer um lanche no centro?
— Eu mesma faço.
— Não vó, não precisar ter trabalho... vamos... Andam cantarolando até a lanchonete.
A avó conta que no tempo dela, menina, não havia lanchonete. E que ainda se lembra do dia em que
comeu o primeiro hambúrguer. Foi no dia 12 de janeiro de 1970, em uma lanchonete em Piracicaba,
chamada “Karamba’s”.
Na frente de um salão de festa, encontram o Netinho.
— Gostou da surpresa, querida?
— Não precisava...
— Que estão fazendo?
— Indo lanchar. Vamos?
— Boa idéia, estou esperando o Manuel: ele chegando, podemos ir...
— Tá...
Ficam esperando pelo menos uns cinco minutos.
— Coisa! Ele é meio lerdão mesmo, falou que iria entrar e sair...
— Paciência...
— Vó, vamos entrar e chamar ele?
— Vai você. Eu e Dante esperamos aqui...
— Vou não. Ficar na rua à noite é meio perigoso. Vamos? Entra Netinho e se perde no escuro.
Atrás dele vai Dante.
Salete anda devagar no breu. Surpresa!
Festa!
Festa surpresa!
— A melhor avó do mundo!
— Para levantar o astral!
— Para aproveitar a vida!
— Para dançar muito...
— Para você, vovó! Todos estavam ali.
Todos que, em menos de 24 horas, puderam ser convidados e apareceram. Primos, netos. sobrinhos,
amigos de Salete e o marido.
Todos, menos Heitor. Remo era o DJ.
Salete chora. Canta, dança, chora e promete superar. Salete está feliz.
manhã
Dante acorda quase na hora do almoço. Heitor está trabalhando.
Dante conta da festa e da animação da avó.
tarde
Dante assiste a um jogo do campeonato australiano de futebol. Depois assiste o CSI Las
Vegas, Monk e House.
noite
Ademar vem e faz uma boa salada de rúcula com parmesão. Dante lê até dormir.
manhã
— Cara, não estou a fim de conversar.
— Mas, por quê?
— Porque não.
— Pô! Vamos conversar, Paulo?
— Tô fora!
tarde
— Vamos jogar bola, Paulo?
— Tô fora!
noite
— Vamos jogar bola amanhã, Paulo?
— Tô fora!
manhã
Dante insiste. Paulo não quer
Dante volta a sentar em sua carteira e recebe uma bola de papel. Foi o Paulo quem jogou. Dante atira,
porém acerta no Eduardo.
Eduardo pega outra bola e joga, acerta na Isalene. Isalene atira no Eduardo e acerta na Ana.
Ana atira na Isalene, mas acerta na Andréa.
Andréa atira na Maria do Livramento, mas acerta no Dante. Dante atira no Paulo, mas acerta na
Raimunda.
Raimunda, com dois bolinhos de papel, atira no Altair e no Samuel, mas acerta no Xavier e na
professora.
Enquanto isso Vânia atira no Urubatan, mas acerta o Márcio. Márcio atira no Francisco, mas acerta o
Chico.
O diretor entra na sala.
tarde
Meu pai é um idiota!, pensa Dante em cima da árvore. O pai precisava ficar daquele jeito com ele?
O pai precisava colocar castigo? Não tinha feito nada!
Foram todos que fizeram!
Certo, a classe toda foi para diretoria. Levaram dois dias de suspensão. E o pai nem deixou explicar e foi
dando o castigo: “Um mês sem internet!”
— Não vou poder falar com a minha mãe?
— Um mês sem internet, mas pode falar com a sua mãe nos horários combinados!
Não é justo! Não tem culpa. Não fez nada. Além de tomar uma suspensão vai ficar de castigo.
“Quero ir embora. Vou falar com a minha mãe pra eu ir morar com a tia Lucilla no Rio de
Janeiro. Vou embora desta droga de cidade”
Dante vê o Ademar passear calmamente pela praça.
Ele senta em um banco. Pega um cigarro, acende e fuma. Passam alguns minutos.
— Vem?
— Não.
— Seu pai está esperando.
— Não.
— Fiz pavê!
— Vou, mas estou bravo. Ademar, não é justo!
— Então precisa conversar com o seu pai.
— Mas ele não me escuta!
— Com gritaria ninguém se escuta.
— Ademar, juro eu não fiz nada!
— Acredito.
— Mas o meu pai não!
— Tentou explicar?
— Tentei, mas ele não me ouve.
— Fique calmo e depois tente novamente. Explique tudo.
— Mas, e se ele não aceitar?
— Ao menos ele saberá o seu ponto de vista.
— Vou tentar.
— Que bom!
— Vai parar de fumar?
— Uma hora eu vou.
— Que hora?
noite
Heitor pede para que conte com calma sobre a guerra de bolinhas.
Dante respira fundo, toma um gole de chocolate e explica, mas omite o início da guerra. Heitor ouve e
combinam que o castigo está suspenso.
Porém se aprontar outra: a “casa cai”.
manhã
Primeiro dia de suspensão.
Dante acorda no meio da manhã. Toma café e não almoça.
Sai para passear de bicicleta.
— Não devia estar na escola?
— Fui suspenso — Dante conta para o avô todo o caso.
— Seu pai nunca foi suspenso...
— Eu sei, eu sei,
— Mais suas tias eram um inferno, A pior era a Maria Cândida.
tarde
Almoça com os avós.
Salete está muito mais animada. Apesar de tudo parece que está rejuvenescendo.
— Está lutando...
noite
Dante pede ao Heitor para que converse com a avó Salete. Heitor resiste, diz que ela não quer falar com
ele.
Dante insiste. Heitor diz que não. Dante insiste e insiste. Heitor nega.
Mesa arrumada, pratos limpos. Vendo televisão. Dante insiste. Heitor diz que não. Dante assiste a vitória
na Arena do Jacaré do Corinthians. Enfiou três no Atlético Mi-
neiro.
Dante insiste. Heitor diz que não. Dante insiste. Heitor diz que não. Dante insiste. Heitor diz que não.
manhã
Segundo e último dia de suspensão. Dante acorda meio pra o fim da manhã.
Toma café e não almoça.
Sai para passear de bicicleta.
Vai no mirante. Vai na pracinha. Passa em frente da casa do Paulo.
tarde
Almoça na casa da tia Fátima.
Ela cuida da cozinha e sai. Tem aulas.
Rômulo e Remo vão dar uma volta pela cidade e depois visitar a avó. Tio Rodolfo está de licença
médica, estafa.
— Qual é o cúmulo da paciência?
— Sei não tio.
— Ver uma corrida de lesmas em câmera lenta.
— Por que o cachorro entrou na igreja?
— Sei não, tio.
— Porque a porta estava aberta.
— Por que um cachorro entrou na igreja e não saiu?

— Sei não, tio.
— Porque ele era um cão pastor.
Dante vai para a pracinha esperar o pai. Voltam devagar para casa.
noite
Dante insiste e insiste.
Heitor por fim desiste: concorda em conversar com a mãe.
— Quando?
— Quando der.
— Quando vai dar?
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó!
manhã
Todos voltam e comentam que a “folga forçada foi muito legal”. Paulo falta.
tarde
Dante passa em frente da casa de Paulo.
Ele o vê sentado. Está com o braço quebrado. Dante vê Paulo.
Paulo vê Dante e o xinga.
— Fora daqui!
noite
— A gente vai sair amanhã cedo e voltar na segunda à noite.
— Legal.
— Que mais?
— O curso está pesadão.
— Falei que fui suspenso?
— Não falou. Mas, por quê?
— Você nunca me liga, não deu para contar.
— Dante, chama o seu pai.
— Mas, mãe... eu explico.
— Não quero ouvir, quero falar com o seu pai.
manhã
Feriado prolongado. Vão para uma fazenda de um amigo de Ademar. Vão: Heitor, Ademar, Priscila e
Dante.
tarde
Andam a cavalo.
Tomam banho de cachoeira. Caminham por muitas trilhas.
Priscila conduz a charrete com maestria. Ademar cozinha bem.
Heitor é fera na mímica.
Dante pega as mangas nos galhos mais altos.
Ademar prepara o jantar.
Priscila brinca com os filhos do Flávio.
Dante acompanha Heitor em uma caminhada pela fazenda.
— Você é gay, pai?
— Como?
— Quero saber se você é gay?
— O que é ser gay, filho?
— Pai! Estou perguntando e não quero responder!
— Filho, sou um homem que adora o filho que tem e que ama outro homem.
— Mas então, é gay!
— Não sei. Sou alguém que gosta do que é.
— Não é gay?
— Filho!
— É, ou não é?
— Sem entender o que você quer dizer não sei responder.
— Então tá: gay é aquele que anda rebolando, fala fino e faz coisas como se fosse uma
mulher.
— Então eu não sou.
— E que também transa com homem.
— Então eu sou.
— Mas você transou com a minha mãe?
— Sim, querendo, gostando dela.
— É ou não é?
— Imagine se é difícil entender, muito mais é viver. Gostei, amei muito a sua mãe. Ficamos juntos muito
tempo. Ficamos juntos querendo ficar. Um dia deixamos de gostar de ficar juntos.
— Eu sei, sempre dizem isto.
— Então, depois comecei a me perceber. Ouvir a mim mesmo. Nunca quis ser uma mulher ou outra
coisa diferente do que sou. Nem sempre tendo focinho de porco, pé de porco, orelha de porco é porco.
— Então o que é?
— Pode ser uma feijoada.
— Então você saiu do armário?
— Nunca estive em um, sou um professor e nem por isto me sinto menor ou menos importante do que
um médico. Sou um homem que ama outro homem, e não me sinto menor e nem pior que outro homem
qualquer.
— Sei.
— Com todas as dificuldades, com as certezas, estou muito mais feliz, tranquilo. Sei que sua avó não
quer falar comigo. Sei que me olham torto, imagino o quanto é difícil para você.
— Mas pai, antes nunca foi! Agora é estranho, meio complicado.
— Imagino.
— Para mim é um problema seu e não meu.
— Para mim não é mais um problema, mas é para você.
— Um pouco.
— Não procure rótulos, gavetas ou encaixes; por sorte, ou azar, somos todos diferentes, com diferentes
olhares, diferentes formas de ver, sorrir e andar. E, principalmente, nem sempre o que é diferente da
gente é ruim.
— Difícil!
— Sim, é.
noite
Priscila acorda no meio da noite assustada.
— O que é isto?
— Seu tio roncando!
— Mas não parece o ronco dele.
— É o ronco do seu tio, quase todos os dias ouço isto...
— Sei lá... pode ser, mas não parece.
manhã
Pela manhã, Dante, Priscila, Flávio e os filhos vão para a cidade mais próxima. Passeiam.
Vão ao Bosque. Passam muito calor!
tarde
Tem que voltar depressa para Procópio: O avô Luiz foi internado. Dante não se interessa pelo jogo do
Corinthians. Pensa no avô.
Muito depois fica sabendo que ganhou de um à zero do Atlético Goianiense. Dante acha que serão
campeões. Não fica nada animado.
noite
Foi apenas um susto.
Avô Luiz passará a noite no hospital. Heitor vai ficar com ele.
— Aproveita e fala com a avó.
— Não é a hora e nem o lugar...
— Tá.
manhã
Maria Cândida acompanha avô Luiz para casa.
Tia Fátima dá uma volta com a avó Salete para espairecer. Dante fica, feito uma barata tonta, sem saber
onde ajudar.
tarde
Heitor dorme depois do almoço.
— Está melhor comigo?
— Estou tentando.
— O que foi?
— Não sei. Você me irritava.
— Ainda irrito?
— Não. Um pouco, às vezes...
— Fazendo o quê?
— Fumando.
— Fumar é uma desculpa. Para mim e para você, não é?
— Sei lá. Talvez...
— No que eu irrito, então?
— Sei lá...
— Tá, quando estiver irritando, fale na hora e vamos resolver, legal?
— Vou tentar...
noite
Dante conta do avô para a mãe.
Bárbara conta do namorado para o filho. Dante conta do pai para Bárbara.
A mãe conta dos passeios para o Dante.
O filho conta do namorado do pai para a mãe. Bárbara conta dos planos para a volta.
O filho está com saudades da mãe. A mãe está com saudades do filho.
manhã
Desde cedo, a casa dos avós está cheia. Primos. Netos. Filhas. Cunhados. Genros. Resolvem fazer um
churrasco.
Tio Treco e Dante vão comprar as carnes.
— Admiro muito o seu pai.
— Por que, tio?
— Pela coragem. Sempre gostei muito dele.
— Também gosto...
— Falo sério. Ele é uma cara que resolveu assumir. Fazer o que acha certo. Fazer o que o coração
manda. Admiro muito ele!
— Acho que eu também .
— E olha: gosto também do Ademar, um cara muito de bem com a vida!
— Ele é legal.
— Sabia que ele é o meu advogado?
— Não.
— É competente, sem ser serião. Um cara batuta.
— Legal...
— Qualquer dia vou sair com eles, tomar algumas cervejas e conversar...
— O meu pai não bebe...
— Mas o Ademar gosta de uma pinguinha, que eu sei...
tarde
Os avós recebem todos os cuidados possíveis. Principalmente dos netos. Final da tarde. Fátima e
Netinho fazem um dueto.
Abigail e Rômulo dançam samba. Remo dança o Rebolation.
Manuel conta piadas junto com o tio Rodolfo. Tio Treco bebe suas cervejinhas.
noite
Dante dorme preocupado e contente.
manhã
Reunião de professores. Dante quer fazer alguma coisa diferente. Resolve ir visitar o
Ademar.
Encontra Ademar lendo alguns processos.
— Gosto da ideia de um dia livre. Fique um pouco por aqui e iremos passear.
tarde
Depois almoçam em uma churrascaria em frente ao escritório. Entre uma picanha e uma maminha
comentam sobre o Timão e que, em breve, serão campeões.
Depois jogam bola.
Dante fica admirado com as habilidades de Ademar.
Ademar o ensina a pedalar e orienta como bater faltas de forma venenosa.
— Como você conheceu meu pai?
— Nós fazemos parte de uma comunidade no Orkut. Nos conhecemos em um encontro.
— Sabe, uma vez a minha mãe estava falando com a tia Lucilla pelo telefone. Ela reclamava que fazia
muito tempo que não namorava. Eu me meti na conversa e falei para ela namorar a minha professora
Silmara.
— E sua mãe?
— Riu muito.
noite
Para admiração de Heitor, preparam um jantar vegetariano. Ademar ensina Dante a fazer pavê com
pasta de amendoim.
manhã
Atividades artísticas na escola.
Outra vez vê o primo Remo dançando Rebolation. Vê Priscila declamando poemas de Edson Cruz.
Vê o Paulo com o braço quebrado.
— Caí da bicicleta...
tarde
Joga bola com a turma da rua de cima na quadra da rua de baixo.
noite
— Falou com a vó?
— Não.
— Quando vai falar?
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, para!
— Fala com a vó!
manhã
Dante acorda muito antes de Heitor. Sozinho, prepara um café da manhã.
— Feliz Dia dos Professores.
tarde
Recado no twitter do Heitor: “Pai, feliz dia dos professores! Falou com a vó?”
Mural de Heitor no Lifebook: “Meu pai: o melhor professor do mundo! Falou com a vó?”
noite
— Não.
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, para!
— Fala com a vó!
CAPÍTULO VI
manhã
Dante toma somente um chocolate morno.
Pega a sua bicicleta e vai circular pelos campinhos.
Em um, os times estão completos. Encontra os avós fazendo alguns alongamentos na praça.
Em outro, não há times. Encontra os avós indo para uma caminhada até o Mirante.
Em outro, há muitos times. Encontra os avós relaxando e fazendo exercícios de respiração.
Encontra Paulo voltando do supermercado.
— E aí?
— Que foi?
— Tudo bem?
— Não enche...
— Quer ajuda?
— Vai tomar...
Dante não vai. Apenas fica vendo Paulo, com o braço quebrado, levar as compras.
— Os treinos começam amanhã para os regionais, você vai? Paulo nem se vira.
tarde
Assiste ao futebol italiano e russo pela televisão. Estoura pipoca.
Passa na casa da avó para comer o pavê prometido e a encontra fazendo alguns exercícios de yoga via
internet.
Assiste ao primeiro tempo do jogo entre o Internacional e o Flamengo. Muito ruim!
noite
Fala mais de uma hora com a Milena. Achou tudo meio choco, meio sem graça. Meio mais ou menos.
Será que ela ainda estava chateada com ele? A vontade de dar um beijo nela voltou.
Com a mãe, conversa dez minutos. Ela disse que estava enjoada, não tinha passado aqueles dias bem.
Mandou beijos a todos e desligou rápido.
manhã
Heitor anda de bicicleta pela cidade.
Dante joga bola. Na volta para casa encontra os avós fazendo outra caminhada para o
Mirante.
Alcança o pai no elevador e combinam que irão almoçar na casa da tia Cândida.
— Não.
— Em breve.
— Breve, quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó.
tarde
Almoço muito divertido. Principalmente as histórias do Tio Treco sobre o tempo que estudava em
Piracicaba.
— Na próxima vez você traz o Ademar.
— Trago sim.
— Ele é o meu advogado, sabia?
— Sei sim.
noite
Fala apenas dez minutos com a mãe. Ela não melhorou. Disse que irá ao médico. O
namorado mandou lembranças.
manhã
No café da manhã.
— Não.
— Em breve.
— Breve, quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó!
No caminho para a escola encontra os avós fazendo alongamento.
Paulo nem olha para o Dante. Nem olha para ninguém. Anda pelos cantos.
— Ele está esquisito.
— Nunca foi bom, mas agora está pior...
— Deixa ele..
— Deixa ele? Ele, justo quem mais pegava no seu pé, Dante?
— Deixa, cada um com seus problemas...
tarde
Primeiro treino da seleção da escola.
O técnico diz que os que estão ali são os melhores, muito bons, mas que ninguém ganha sozinho. Ele
afirma que o futebol é um jogo de equipe, coletivo. Todos ganham, todos perdem e todos empatam.
Falou mais meia hora de como seriam os treinamentos e que o primeiro jogo seria no dia 2 de novembro.
Paulo chegou atrasado. Teve que pagar a prenda com vinte abdominais.
noite
— La seva mare está embarassada.
— O quê?
— Su madre está embarazada.
— O quê?
— Sua madre é incinta.
— Quê?
— Your mother is pregnant.
— Nossa!
Alejandro dá a notícia sorrindo. Antes tinha explicado que Bárbara estava muito enjoada e que foi se
deitar.
Dante agradece, pede licença e sai do skype. Escova os dentes, coloca um pijama limpo e deita. Dante
não consegue pegar no sono.
manhã
— Minha mãe está grávida, Priscila.
— Que legal, né?
— Acho que é...
Dante acha legal. Dante não acha legal.
Dante não sabe o que acha. Dante não sabe o que deve achar.
tarde
Treino de dois toques.
Dante e Paulo treinam bem. Dante e Paulo não se falam.
— Fez a lição de amanhã, Paulo?
— Que lição?
— A pesquisa sobre o Aleijadinho.
— Não vou fazer.
— Quer ajuda?
— Vá se...
Dante não foi. Todos pagam cinquenta polichinelos de castigo por conversar no treino.
noite
Querido Filho, Desculpa.
Não tenho passado muito bem. Devia ter desconfiado!
Fiquei muito brava com o Alejandro. Ele não devia ter contato, mas ficou tão encantado, tão maravilhado
com a notícia que resolveu falar. Quem devia contar era eu!!
Espero que você tenha entendido. Vamos conversar em breve. Deixa eu melhorar.
Amo muito você!
A avó Salete achou Bárbara corajosa por estar grávida. A dona Antônia achou sublime Bárbara estar
grávida.
A tia Cândida achou maravilhoso a Bárbara estar grávida. A tia Fátima achou fascinante a Bárbara estar
grávida.
O Ademar achou formidável a Bárbara estar grávida. O avô Luiz achou admirável a Bárbara estar
grávida. O Heitor achou excelente a Bárbara estar grávida.
O tio Treco achou legal a Bárbara estar grávida.
O tio Rodolfo não achou nada e perguntou o que era um pontinho amarelo em cima do prédio com um
violão?
— É o Cheetos Buarque, tio!
— Él habló con la abuela.
— O que você disse?
— Estou treinando o meu espanhol.
— Escova os dentes e vai dormir, filho.
manhã
Levanta antes do Heitor. Acordou pensando na mãe. Toma banho devagar. Pensa no cozinheiro.
Escova todos os dentes duas vezes. Pensa no seu futuro irmãozinho. Toma o chocolate torcendo para
que seja uma menina.
Para variar, não presta a atenção na aula. Ri de algumas brincadeiras.
Sorri de alguns erros.
Gargalha do jeito do Xavier escrever.
Pensa na Daniela, que joga um bolão. Pensa na Flávia, que já tem peitinhos. Pensa na Cristina, que já
tem um corpão.
Pensa na Mariana, que tem um cheiro bom. Pensa na Alexandra, que é muito bonita. Pensa na Milena,
que é muito dengosa. Pensa na Priscila, que é muito charmosa.
A professora de História lhe fez duas perguntas que não soube responder.
tarde
— Não tem aula hoje à tarde, pai?
— Não...
— Aconteceu algo?
— Não. Vamos almoçar? Almoçam em silencio.
Dante come rápido: tem treino.
O pai ali desequilibrava a sua rotina. Resolve fazer as lições e o pai faz silêncio na sala. Resolve arrumar
o quarto e o pai fica em silêncio no quarto.
— Volto mais tarde...
O pai fez silêncio na cozinha.
— Vamos lanchar depois?
— Pode ser.
Treina forte. O técnico fala para Dante ser menos individualista e para Paulo ficar mais atento ao jogo.
Pagam dez corridas de costas pela quadra.
noite
— Continue.
— Estava dando aula para o terceiro colegial. Uma turma do Colégio Evolutivo que prestarará vestibular
no final do ano. Era uma parte que tem muitas dificuldades. Daí uns quatro do fundão, os mais chatinhos,
levantam a mão. Interrompi a minha explanação esperando que fosse uma questão que ajudasse a
classe. Os alunos pediram para ir ao banheiro. Sorri para não gritar. Respirei e disse que li-beraria assim
que terminasse a explicação. Virei para o micro e fui mudar a tela. Os quatro levantaram, foram até a
lixeira e começaram a mijar.
— Sério, pai?
— Sério.
— Continue,
— Então, Ademar! Fiquei possesso. Era muito desrespeito. Fui até um deles, acho que era o Ferdinand,
segurei o braço dele e disse ”Cara, aqui não é lugar para isso”. O moleque deu um pulo e começou a
gritar: “Viram? Todo mundo viu. Ele me assediou?”
— Assediou?
— Pois é. E começou a urrar que eu tinha pegado nele. Os outros três disseram que viram e a classe
ficou em silêncio. Fiquei sem saber o que fazer. Eles saíram da classe e fiquei feito um dois de paus ali,
querendo que a terra me engolisse.
— E depois pai?
— Sei lá, passados alguns minutos, o diretor veio me chamar. No corredor, aos berros, disse que eu
tinha assediado os rapazes. Tentava acalmá-lo, mas não deu. Ele gritou e ameaçou me prender.
— Nossa!
— Ele não pode fazer isto.
— Sei lá, pensava que podia. Daí veio uma aluna e disse que eu não tinha feito nada. O diretor mandou
a menina calar a boca, mas ela insistiu e mostrou o vídeo que tinha gravado. Estava tudo ali: os meninos
urinando na lixeira, eu intervindo e eles inventando a história.
— Que legal
— O diretor ficou calado, com aquela cara de pôquer. Agradeci a menina e disse que estava me
demitindo.
— E agora?
— Agora, com certeza, a cidade inteira pensa que sou um pedófilo.
— Pai, teve um caso parecido com este no Law & Order SVU.
— Foi?
— Igualzinho.
— E o que aconteceu?
— Acho que o professor morreu, ou se matou, não lembro.
— Legal.
manhã
Dante não vai à aula. Fica em casa com o pai.
Assistem vídeos engraçados no youtube. Ajudam dona Antônia no almoço. Heitor recebe muitos
telefonemas de apoio.
— Em quase vinte anos de magistério nunca fui tão desrespeitado.
— Não é por ter dinheiro não, é falta de educação mesmo!
tarde
No treino, ninguém comenta. Todos olham para Dante. Todos sabem.
No final, o técnico instrui e informa que haverá um jogo-treino no dia seguinte.
— Fala para o seu pai que a gente está apoiando ele, certo?
noite
Todas as escolas em que Heitor lecionava entenderam o ocorrido, porém algumas não querem mais os
serviços dele.
Sua carga de trabalho foi reduzida pela metade.
Heitor ficou muito deprimido e nem quis que Ademar dormisse ali.
— Acabe de ver este filme e vá escovar os dentes, pôr o pijama e dormir.
manhã
Dante acorda antes do Heitor.
— Vou aproveitar mais a manhã livre!
Chocolate rápido, escova os dentes e sai correndo. Está atrasado. Aulas pacatas.
No intervalo, alguns professores chamam Dante de lado e perguntam pelo Heitor.
— Ele está bem. Ligue para ele. Todos pegam o número de telefone.
Chegando em casa Dante constata que ninguém ligou.
Heitor está deitado no sofá, assistindo a um programa de culinária.
tarde
— Vem com o Ademar ver o meu jogo-treino.
— Vou ficar por aqui, tenho coisas para fazer.
— Então vamos lanchar fora depois?
— Acabando o treino me ligue. Quem sabe? Dante vai treinar com o coração apertado.
O jogo é contra o Colégio Assunção.
Começa o treino com: Pedro, Alan, Eduardo, Paulo e Joaquim. Dante é banco e o seu coração apertou
ainda mais.
O primeiro tempo foi difícil, o Colégio Assunção dominou. Fez cinco gols de forma bisonha. O time do
Dante mal viu a cor da bola.
— Me coloca, por favor?
— Vou ver.
Começa o segundo tempo e o técnico não coloca Dante. Todos os outros entram, menos ele. O time
perdeu de doze a seis.
— Moleque! No meu time quem manda sou eu! Você só obedece. Não gosto de menino pedindo para
entrar pensando que é um “Pelé”. Vai ficar no banco, certo?
Errado, mas ele é que e o técnico.
Janta em casa. Janta em silêncio.
noite
— Filho, está começando o seu inferno astral.
— Chii, mãe ... .
— Querido, inferno astral não é só coisas ruim, é mudança.
— Meu pai é que está num inferno.
— Verdade.
A Bárbara achou triste o incidente ocorrido com Heitor.
A Abigail achou inimaginável o incidente ocorrido com Heitor. A Milena achou previsível o incidente
ocorrido com o Heitor.
A Priscila achou “coisa de doido” o incidente ocorrido com o Heitor. A Tia Cândida achou aviltante o
incidente ocorrido com o Heitor.
A Tia Fátima achou revoltante o incidente ocorrido com o Heitor. O Ademar achou indecente o incidente
O Alejandro achou “repugnant” o incidente ocorrido com o Heitor. O avô Luiz achou ignorante o incidente
O Netinho achou retrógrado o incidente ocorrido com o Heitor. O Remo achou esquisito o incidente
O Rômulo achou sinistro o incidente ocorrido com o Heitor.
O tio Rodolfo achou equivocado o incidente ocorrido com o Heitor. O tio Treco achou irritante o incidente
A avó Salete não achou nada e perguntou o que é um pontinho amarelo em cima do prédio.
— Foi cruel, vó. É um fandango suicida.
manhã
Heitor e Ademar saem cedo. Resolvem passar o final de semana em São Paulo.
Dante prefere não ir, apesar de ter vontade de rever Milena. Sugere que fiquem no apartamento da mãe.
Ele ficará com a Priscila.
Joga o futebol de lei. Passa em frente à casa do Paulo.
Fez uma rápida visita aos gêmeos. Passa em frente à casa do Paulo. Joga vídeo game sozinho. Passa
em frente à casa do Paulo.
Brinca de mãe da rua. Passa em frente à casa do Paulo.
tarde
— Que tal irmos na brincadeira hoje?
— Vamos sim.
— Mas posso lhe pedir uma coisa, Dante?
— Sim?
— Estou cansada de passar pelo mesmo caminho.
— Tá.
A brincadeira está lotada. Dante está meio deslocado.
Não quer ficar ali, precisa do seu pai.
Não quer ficar ali, precisa conversar com a mãe. A música toca. Dançar ajuda a pensar.
Dança em uma roda com a Ana Laura, Denise e Roseli. Dança junto com a Maria Eduarda e depois com
a Angélica. Dança uma nova coreografia com as gêmeas Alessandra e Alice. Dança o twist com a Alba,
Maria Ester e Matiko.
Dança muito mais com a Priscila.
noite
Chegam, lancham e assistem televisão.
— Será que vamos namorar?
— Agora, Prita?
— Um dia...
— Não sei...
— Tomara...
— Tomara. Você é muito legal.
— Você também é.
manhã
Dante acorda muito cedo. A casa estava em silêncio. Fica deitado um tempão pensando na vida.
Vai em silêncio para o banheiro.
Na saída toma um susto com a mãe da Prita.
— Bom dia!
— Prita contou que vamos fazer uma festa surpresa para o Ademar na quarta?
— Por cima...
— Heitor vai enrolar o Ademar um pouco e faremos no Maddeer!!
— Legal...
— Que crime fizeram com o seu pai!
— Ele está muito chateado...
— Imagino, pior que ninguém o acusou formalmente, ele não pode cobrar de ninguém. O que ele vai
fazer?
— Não sabe .
tarde
Depois do almoço brinca de pega-pega na rua da casa da Priscila. Brinca de mãe-da-rua. Brinca de pula
sela. Brinca.
Depois festeja o chocolate que o Palmeiras levou do Corinthians: 6 à 3.
noite
Heitor e Ademar chegam amimados de São Paulo.
Dizem que o apartamento está em ordem, bem-cuidado e arrumado. Contam que foram em uma balada
animada que foi até domingo de manhã.
Ademar está um caco. Heitor está animado.
— Dancei até lavar a alma...
— Também dancei...
Heitor e Dante assistem ao filme alemão A onda.
manhã
Prova surpresa de Matemática em dupla. Sorteio da professora: Dante e Paulo.
— Não importa o que você pensa: temos que tirar uma boa nota, certo?
— Certo.
— A primeira questão eu sei fazer.
— Foi fácil...
— Foi sim.
Na aula de História, a professora ficou discutindo sobre quem inventou o avião: Santos
Dumont ou os Irmãos Wright.
tarde
Treino pesado. Treino tático.
Dante joga um pouco entre os reservas e um pouco entre os titulares. Na sexta terá outro amistoso com
o Colégio Luz do Sol.
— Edu, não acha que o Dante tem que entrar?
— Acho, mas o técnico não quer. Encontra o Heitor de saída.
— Vai para onde?
— Até o supermercado...
— Posso ir junto?
No setor de hortifrutis.
— E aí alguma novidade?
— Nenhuma, somente algumas aulas pela manhã. Tardes livres.
— Que bom!
— Apareceu a oportunidade de fazer umas apostilas para um cursinho em Franca.
— Legal.
— Sua mãe está bem?
— Ela disse que está engordando.
— Sabia que ela ficou linda na sua gravidez?
— Sério?
— Muito bonita, mesmo!
noite
Navega pela internet.
Está muito cansado! Dorme de luz acesa.
— Superfragilisticexpialidocius.
manhã
Conversa sobre o futebol com o Paulo. Ele, por causa do pai, torce pela Ponte Preta. Combinaram
algumas jogadas para o treino.
— Seu pai te bate muito?
— Vamos mudar de assunto?
Na outra aula de História, discutiram a função da ONU.
tarde
Treino duro. Dante entre os titulares o tempo todo.
No final para relaxar, brincam de “pega-pega-ajuda-ajuda”. Priscila assistiu todo o treino. Dante fica
orgulhoso pela visita.
noite
— Que tal Arieta? Quer dizer feita de pedra.
— Pedra? Sei não!
— Que tal Maitê? Amável?
— Vou pensar. Gostei...
— Que tal Luzia? A iluminada?
— Bom também.
— Que tal Ximena? Quer dizer: pessoa obediente!
— Não!
— Vou pensar mais...
— Está gostando da ideia de ser o irmão mais velho?
— É legal...
— Eu estou um balão...
— Tá não.
— Estou sim.
— Tá não.
— Amo você.
manhã
— O que aconteceu na escola com o seu pai?
— Vamos mudar de assunto.
tarde
O técnico informa quem seria o time titular do amistoso da sexta: Erasmo, Alan, Eduardo, Paulo e Dante.
noite
Com a desculpa de encontrar um amigo que iria oferecer um emprego, Heitor consegue levar Ademar
até o Maddeer.
Está lotado. Clientes. Amigos. Parentes. Conhecidos. Festa do Ademar!
Ele é muito querido. Até o tio Treco está!
— Gosto muito do Ademar e a sua tia Cândida já deve estar chegando. Com a irmã, mãe da Priscila.
Ademar cantou Imagine de John Lennon.
Dois primos de Ademar fizeram um número de comédia com mágica. Dança. Brincadeira. Bolo. Festa!
No Karaokê.
Heitor, Dante e a Priscila cantam Nem vem que não tem do Wilson Simonal. Depois, com o Ademar,
Mamãe passou açúcar em mim.
Priscila e Dante fazem em dueto Uma partida de futebol, do Skank. Dante e Heitor cantam, à moda do
Planet Hemp, Nega do cabelo duro.
Sozinho, Dante interpreta Mulher de fase dos Raimundos e Não tô nem ai. E, antes de arrancarem o
microfone de sua mão, ainda manda um País tropical.
Ademar e Heitor cantam Língua de Caetano Veloso.
— Pai, tive uma ideia!
— Qual?
— Depois eu conto.
manhã
Duas longas aulas de Inglês.
Uma imensa aula de Matemática. Um curto intervalo.
Uma enorme aula de Geografia. E uma infinita aula de Inglês.
— Qual a ideia?
— Perguntei primeiro.
Tarde
Treino leve. Treino tático. Treino de muitas conversas.
— Estejam aqui logo depois da aula. Quero concentração: almoçaremos juntos.
noite
Dante dorme cedo.
Tudo bem por aqui. Tudo bem por lá.
Pensa em jogadas.
manhã
Duas infinitas aulas de Literatura
Uma enorme aula de História. Voltou o tema Tiradentes: “Mártir ou foi o último que correu?”
Um curto intervalo.
Uma animalesca aula de Redação. Tiveram que escrever, no mínimo vinte linhas sobre o Dia Nacional
do Livro.
Uma longa aula de Biologia, quando foi discutido, sem levar a lugar nenhum, o sexo dos anjos.
tarde
O Colégio Luz do Sol veio com o seu tradicional uniforme azul e vermelho. O Colégio do Dante com seu
uniforme branco.
O Luz do Sol irá jogar com: Kauê, Tabajara, Tuim, Douglas e Xerxes
O Colégio do Dante com Erasmo, Alan, Eduardo, Paulo e Dante.
Um grande público assiste ao amistoso com gosto de revanche. Faz mais de cinco anos que o colégio do
Dante não ganha em nenhuma modalidade do Luz do Sol.
Heitor, Ademar e Priscila estão na torcida.
Kauê encosta no Dante e lhe dá um chutinho no calcanhar.
— Sem folga, viu moleque?
Tabajara encosta em Dante, dá-lhe um tapinha na nuca.
— Sem folga, viu moleque?
Tuim, mais baixo do que o Dante.
— Boa sorte!
O time de Dante dá a saída. Alan passa para Paulo, este leva a bola, manda para Alan, que devolve e
Paulo chuta. O goleiro Kauê espalma. Escanteio. Alan bate para Dante, que está fora da área. Com um
sem-pulo chuta. Gol.
Saída do time de Luz do Sol. Tuim recebe a bola de Douglas. Dribla Eduardo e Alan. Chapela o Paulo e
chuta. Gol. Erasmo nem viu a cor da bola.
O primeiro tempo acabou 1x1
Segundo tempo. Nenhuma alteração.
Os dois times atacando e os goleiros defendendo.
Xerxes comete uma falta grave em Dante. Início de uma discussão, logo interrompida pelo juiz. Paulo
bate a falta e o goleiro Kauê agarra.
Segundo tempo termina empatado.
noite
Dante coloca na sua página do Lifebook: “Joguei o tempo todo: sou titular.”
— Depois vá colocar o pijama, escovar os dentes e dormir.
— Falou com a avó?
— Sem enrolação. Dentes, pijama e cama.
— Mas, pai...
— Cama! Você está cansado.
— Não quer ouvir a ideia?
— Amanhã. Dante vai dormir.
Tudo bem por aqui. Tudo bem por lá.
manhã
Dante acorda tarde. Toma o seu chocolate e sai de bicicleta. Encontra os avós nos seus exercícios de
respiração e alongamento.
tarde
No Skype.
— Não acredito.
— Aconteceu.
— Mas, como?
— A gente saiu, fomos à uma festa em Alphaville. Dançamos e rolou...
— Você me traiu!
— Calma lá. Traí nada. Você mesmo disse que não estava namorando ela.
— Mas eu queria!
— Você quer todas, né?
— Mas com a Milena, Arthur?
— Rolou...
— Estão namorando?
— De mãos dadas e tudo...
noite
Ademar, Heitor, Dante e Priscila vão até Campinas assistir à peça: Sonhos de uma noite de Verão.
manhã
Depois de um longo passeio de bicicleta, no Mirante. Dante e Heitor descansam.
— Um blog.
— Como?
— Fazer um blog de História ...
— Sim, mas já tem muitos...
— Será um blog com vídeos de aulas, dúvidas, matérias para o vestibular. Para provas. Você sabe
preparar uma apostila, certo?
— Sei.
— Poderá fazer um vídeo-blog com as aulas.
— Sei. Desenvolva mais...
— Pai, a gente grava um montão de aulas suas. Coisa de, no máximo, cinco minutos. E
coloca no ar. Divulga. Junto material e links de apoio.
— Sei...
— Tipo: “Tudo o que você precisa saber para o vestibular da Unicamp”... ou “Leia, veja e escute”.
— Legal.
— Sim! E tenho certeza que irá bombar! Bombando, poderá viver disto.
— E o equipamento?
— Com o que a gente tem em casa poderá fazer umas aulinhas boas...
— Tô nessa.
tarde
Dante repete a ideia para o Ademar, que acha genial.
Ajuda o pai a navegar. Faz vários testes com a webcam. Coloca várias “gracinhas” do
Ademar no ar.
noite
— Ele quer casar comigo!
— E?
— Quer casar já. Antes de nascer...
— Casar aí? Já?
— Calma, filho. Não aceitei nada... Estamos conversando...
— Você quer casar?
— Não sei...
— Não ou não sei
— Não sei...
Dante assiste Cabo do Medo, de Martin Scorsese. Muito tenso e muito bom.
Dante pensa em si. Pensa na mae. Pensa no pai. Pensa na Milena beijando o Arthur. Pensa nele
beijando Priscila. Pensa que esta demorando a voltar para Sao Paulo.
CAPÍTULO VII
manhã
Heitor acorda mais animado e faz a sua ginástica.
Dante toma rápido o seu café: terá treino de manhã e de tarde.
Heitor acompanha Dante até metade do caminho, resolveu que será o personnal trainer
do Ademar.
— Ele precisa emagrecer!
— E parar de fumar.
— Você vai casar com ele?
— Não, acho que não... Bom treino.
Treino pesado. Muitas movimentações pela quadra. Muitos chutes ao gol. Muitos passes certos. Muitas
prendas “para pagar” por ter errado alguma tática.
Minha mãe vai casar.
— Tá fogo! Meu pai me bate à toa...
— Sei...
— Não sei o que fazer...
— Também...
— Tento fazer o que ele manda, mas não adianta: acho que me odeia. Dante prefere ficar calado. Mais
tarde irá falar com o Heitor.
— Não quer ir almoçar em casa? Depois a gente volta...
— Não posso, meu pai não deixa...
— Por quê?
— Ele proibiu eu de andar com você.
— Mas por quê?
— Por causa do seu pai...
— Mas ele não fez nada com o rapaz, foi mentira...
— Eu sei, mas é porque o seu pai é gay...
Dante prefere ficar calado. Mais tarde irá falar com o Heitor.
tarde
Depois do treino.
— Por que você não fala com o meu pai?
— Porque não.
— Por que?
— Não é da sua conta.
— É sim, é da nossa conta.
A avó caminha mais rapidamente. Dante corre e a alcança.
— Pelo menos é da minha conta.
— Você é criança.
— Vocês estão fazendo um clima muito ruim para a gente. Salete para e respira profundamente.
— Dante, o que seu pai faz é errado. Não está certo.
— Por quê?
— É contra a natureza.
— Não sei. Pode ser.
— Pode ser não: é! É uma abominação.
— O que é?
— Ele ficar com um homem.
— E daí?
— Daí eu não concordo. Eu condeno. Todos condenam.
— Vó, eu não concordo com você. Acho que é uma abominação o que você faz com o meu pai. Tenho
que ficar sem falar com você?
— É diferente. Ele é homem, ou pelo menos, era...
— Você é uma mulher. A minha avó que está deixando a família em uma saia justa.
— Por quê?
— Não sei se todos concordam, ou não, com o meu pai. Mas aceitam. Pelo menos você podia tentar...
— Não.
— Pelo menos conversar.
— Não.
— Fala com o meu pai?
— Não.
— Por favor.
— Não.
noite
Dante lê as revistas do Demolidor e Heitor preparar o roteiro do primeiro programa de
História da web.
— Vamos gravar amanhã?
— Tá, depois do meu jogo?
— Claro. Como você está?
— Acho que vamos ser campeões!
— Tomara!
manhã
Heitor acorda muito mais animado, faz os seus exercícios e vê Dante correndo para o primeiro jogo do
campeonato.
O torneio é muito simples. Uma chave com oito times. Jogam todos contra todos no mesmo horário.
Quem fizer o maior número de pontos, ganha. O ultimo jogo será no dia de aniversário da cidade. Dia de
aniversário do Dante: 26 de novembro.
Faltam dez minutos para começar o jogo e ninguém chegou. Dante está preocupado. Faltam nove
minutos para começar o jogo e ninguém chegou. O técnico e Dante estão preocupados.
Faltam oito minutos para começar o jogo e ninguém chegou. O técnico, Dante e os juízes estão
preocupados.
Faltam sete minutos para começar o jogo e ninguém chegou. Dante, o técnico, os juízes e o time
adversário estão preocupados.
Faltam seis minutos para começar o jogo e ninguém chegou. O técnico foi ligar.
Faltam cinco minutos para começar o jogo e ninguém chegou. O público também está preocupado.
Faltam quatro minutos para começar o jogo e ninguém chegou. Volta o técnico e conversa com os juízes.
Faltam três minutos para começar o jogo e ninguém chegou. O time do Dante perde por WO.
— O que aconteceu?
— Eles estão proibidos de jogar.
— Por quê?
— Por causa do seu pai. Inferno astral.
tarde
Dante não chorou na frente de ninguém. Chora sozinho no quarto, quase debaixo da cama.
noite
manhã
Heitor acorda Dante delicadamente.
— Que conversar?
— Não.
No portão da escola encontra a Priscila.
— Que coisa, né?
— Não quero falar sobre isto.
Entra quieto, de cabeça baixa, na classe. Paulo não o encara.
Dante está com raiva. Quer brigar.
tarde
Quando Dante chegou, o técnico estava falando com alguns pais dos jogadores. A molecada está
desconsolada na arquibancada.
— Meu pai não deixou porque ele disse que não é certo o que seu pai faz.
— Minha mãe não deixou porque é coisa do demo.
— Meu pai não deixou porque é coisa de louco.
— Minha mãe não deixou porque é coisa muito avançada, o que seu pai faz.
— Meu pai não deixou porque não fica bem o filho dele andar com o filho de um viado.
— Minha mãe não deixou porque ele pode me pegar e colocar em um saco.
— Meu pai não deixou porque Deus não quer.
— Minha mãe não deixou porque Deus quer.
— Meu pai não deixou e pronto.
— Superfragilisticexpialidocius. O final do ano está aí!
noite
Heitor coloca o blog no ar. Divulga.
Dante divulga.
Ademar também divulga. Tiveram somente cinco acessos.
— Vai bombar!
— Vai bombar?
— Vai bombar!
Dante conversa com o Arthur. Ele estava certo que iria repetir. Mas está tudo bem. Milena fala que vai
passar e tudo está bem.
— Já decidiu?
— Não, ainda não...
— E o Alejandro?
— Está insistindo ... ele quer.
Hoje não, nesta semana. Todo o meu time não veio jogar. Dd? Não, agora todos me culpam por causa
do namorado do meu pai.
Não compensou e nem consolou, apenas confirmou que o Corinthians é campeão do Brasileirão com
três rodadas de antecedência. Fez quatro a zero no Avaí. O palco foi o Pacaembu.
manhã
Heitor espera Dante sair do banheiro depois de sua ginástica.
— O que posso fazer?
— Nada.
— Lamento, meu filho.
— Não.
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó!
Vai com a camisa do Timão.
Aulas chatas. Professores chatos. Alunos chatos. Todos são chatos.
— Eu sou chato.
— A gorda está emagrecendo!
— Ela está bonita!
— Você gosta dela!
— Você é um chato!
tarde
Dante não foi ao treino.
— Falou com o meu pai?
— Não.
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, pare!
— Fala com o meu pai!
Dante estuda à tarde inteira, semana que vem serão as provas finais.
Heitor freneticamente posta informações, notícias e novas aulas no seu blog. Tem tido
15 acessos por dia.
noite
Dante estuda. Heitor posta. Ademar cozinha e depois ronca muito!
manhã
Heitor pede que Dante passe na casa dos avós depois da escola. O avô Luiz pediu. Aulas chatas.
O pessoal do time está constrangido.
— E aí?
— E aí?
— Tudo bem?
— Não foi treinar ontem, né?
— É...
— Vai hoje?
— Não sei...
Luíza está cada dia mais charmosa. Carolina está cada dia mais vistosa. Dayane está cada dia mais
altiva. Camila está cada dia mais bonita. Cláudia está cada dia mais linda. Paula está cada dia mais alta.
Verônica está cada dia mais graciosa. Mara está cada dia mais engraçada. Marta está cada dia mais
gostosa. Priscila está cada dia mais querida.
tarde
— Como você está?
— Bem, vó; e você?
— Indo... Tenho tido as minhas consultas e tratamentos. Estou melhor, mês que vem vou fazer outros
exames...
— Que bom. O vô Luiz quer falar comigo?
— Não é ele, sou eu que quero.
— Sim?
— Você quer mesmo que eu fale com o seu pai?
— Claro vó! Quero.
— Mesmo que, com as atitudes dele, você esteja sendo prejudicado na escola?
— Claro...
— Certeza?
noite
Dante dorme um pouco menos desasossegado.
manhã
— Primão, como tá?
— Tô legal, Rômulo
— Estou em uma parada legal com o seu pai, sou o câmera dele.
— Tô sabendo.
— Remo tem feito a sonorização. Tá ficando legal...
— Tô sabendo...
— Vai pra onde?
— Andar.
— Vamos bater uma bolinha?
— Tô nessa.
— Bora...
Dante entra na quadra cercado pelo Rômulo e Remo. Os outros moleques começam um alvoroço.
— Temos duas alternativas: ou vocês vão todos apanhar muito de nós três, ou vamos jogar!
Dante, de olhos arregalados, torce para que escolham a segunda alternativa. Jogam muito.
tarde
Almoçam na casa da tia Cândida. Contam e recontam do jogo.
Como o Rômulo ganhou os caras no psicológico. Como Remo conquistou as meninas no filosófico.
Como Dante driblou meio time.
— O que é um pontinho azul e verde pulando no jardim?
— Não sei não tio, o que é?
— É um grilo de calça jeans.
— O que é um pontinho verde em Pernambuco?
— Não sei não tio, o que é?
— É um frevo de quatro folhas.
Dante vai para a sua casa pensando que tem muita coisa de que vai sentir falta em
Procópio. Resolve passar na casa do técnico.
noite
— E o que mais?
— Bem, mãe. Você está me enrolando. Quando começa a fazer perguntas bobas é porque tem uma
coisa para me contar.
— É?
— É, o que é?
— Aceitei o pedido.
— Casamento! Legal...
— Acha mesmo?
— Mãe, eu não acho mais nada! Você achando bom, tudo bem para mim Pelo menos não vão deixar de
jogar comigo por causa do meu padrasto espanhol...
— Dante!
— Brincando...
— Sei. Vai implicar com ele?
— Ele ronca?
— Um pouco, quase nada...
— Ele fuma?
— Não.
— Então eu vou!
— Dante!
— Relaxa, mãe...
— Tem mais: ele quer que nós moremos na Espanha, em Barcelona.
— E eu?
— Pensei que ia querer ficar comigo, mas se quiser ficar em com o seu pai...
— Aqui? Tá louca? Nunca, vou morar em Barcelona! Escovando os dentes, Dante realiza.
— Vou ficar muito longe de meu pai!
manhã
— Não.
— Em breve.
— Breve, quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó.
Dante entra no vestiário.
— Professor, você falou que ele não ia jogar. Se ele jogar o meu pai vai me matar de pancada.
— Professor, posso não ficar.
— Calma, pessoal. Somente vim dar “um salve” para todos.
Silêncio.
— Eu que pedi para sair. Falei com o técnico que estou fora.
— A gente até quer jogar com você, mas...
— Deixa quieto. Vou torcer por todos e, no intervalo, se tiver uma ideia venho contar para vocês. Boa
sorte.
Dão o grito de guerra e entram em campo. Dante assiste ao jogo.
— Vou jogar no Barcelona.
— Onde?
— Prita, pode escrever: vou jogar no Barcelona.
O time do Dante, sem o Dante, ganha de quatro a um.
tarde
Dante e Priscila vão ao cinema. Assistem: Mary e Max Uma amizade diferente.
Priscila chorou. Dante consolou.
Priscila beijou. Dante gostou e beijou novamente.
— Então?
— Então o quê?
— Estamos namorando?
— Sei não. Prita, no final do ano eu vou embora...
— E?
— Vou jogar no Barcelona.
noite
— A gente não acertou tudo, mas minha ideia é no inicio do ano que vem ir para aí, juntar as coisas e
voltar, no máximo, antes do meu aniversário.
— Escolhi um nome.
— Qual?
— Beatriz.
— Gostei.
— Eu sei!
Dante estuda muito, início da semana de provas.
manhã
Prova de Literatura nas duas aulas antes do intervalo. Intervalo curto.
Prova de Redação nas aulas seguintes. Tema: “Como será o meu próximo ano”. É o último a sair.
tarde
— Quer que eu repita?
— Acho que entendi tudo: você está chateado com tudo o que aconteceu na sua escola.
— Sim.
— Mas isto você resolveu. Não está contente, mas resolveu, certo?
— Sim. Vou jogar em outra cidade no ano que vem...
— E aí que pega. Que outra cidade? Ou São Paulo, que você acha que não dá certo, ou em Barcelona...
— Até em Milão, pois o espanhol vive dali para cá.
— Sim, indo para lá, que você acha que é muito legal, você vai ficar muito longe do seu pai...
— Certo, Ademar...
— E também da Priscila...
— Sim...
— Da Milena...
— Deixa quieto, ela está na do Arthur.
— Da Claudinéia...
— Que Claudinéia?
— Não tem nenhuma Claudinéia? Pensei...
— É sério... Ademar...
— E não contou para o seu pai?
— Sim. Falei para minha mãe que eu queria contar. Ela topou.
— Tá. Ficar com ele, nem pensar...
— Ficar com ele, em Procópio, nem pensar!
— E em outro lugar?
— Não sei se ele topa. Apesar de tudo ele gosta muito daqui, tem os pais dele, as irmãs, você!
— E vai ficar longe...
— Mas minha mãe vai ter neném, minha irmãzinha Beatriz, quero estar por perto.
— Sei...
— E?
— Sinuca.
— Novidade?
noite
— Não.
— Em breve.
— Breve quando?
— Dante, pare!
— Fala com o meu pai?

— Não.
— Em breve.
— Breve, quando?
— Dante, pare!
— Fala com a vó.
manhã
Prova de História nas duas aulas antes do intervalo. Intervalo curto.
Prova de Química nas aulas seguintes. É um dos primeiros a sair.
tarde
Sai para andar de bicicleta com a Priscila. Estão meio estranhos, meio esquisitos. Meio desconfortáveis.
Meio apaixonados.
Novos beijos. Novos beijos novos.
— Sapo Cururu / Na beira do rio / Quando o sapo grita, ó maninha! / É que esta com frio. / A
mulher do sapo / É que está lá dentro / Fazendo rendinha, ó maninha! / Pro seu casamento.
— Dante vai casar com a Prita.
— Não! Não, Victor! Dante vai casar comigo. Case você com a Prita.
— Sou o Buzz Lightyear. Do infinito e além.
— Borboletinha / Tá na cozinha / Fazendo chocolate / Para a madrinha / Poti, poti / Perna de pau / Olho
de vidro / E nariz de pica-pau / Pau-pau.
— Eu gosto de chocolate.
— Eu também...
— A minha mãe fala que o chocolate dá dor de barriga na Victória.
— Mas sou eu quem vai casar com o Dante.
— Fui morar numa casinha-nha / Infestada-da de cupim-pim-pim / Saiu de lálálá/ Uma lagartixa-xa /
Olhou pra mim / Olhou pra mim / Olhou pra mim / E fez assim: / Smack... Smack... .
— Na casa que eu e o Dante vamos morar não vai ter lagartixa.
— Sou o Buzz Lightyear. Do infinito e além.
noite
Dante vai dormir cedo.
manhã
Prova de Matemática nas duas aulas antes do intervalo. Intervalo curto.
Prova de Geografia nas aulas seguintes.
tarde
Dante almoça na casa dos avós. No final ajuda a tirar a mesa.
— Não.
— Em breve.
— Breve, quando?
— Dante, pare!
— Fala com o meu pai.
Depois Dante sai de mansinho, deixado os avós namorando.
Duas ruas abaixo, ele encontra com Ademar e Heitor. Vão a uma sorveteria. Mesmo estranhamento de
sempre.
— Não.
— Manera, filho!
noite
— Alejandro gostou do nome Beatriz.
— Que bom!
— Você vai adorar Barcelona!
— Será que ele me consegue um teste lá?
— Imagino que sim...
— Que bom!
— E o seu pai, o que achou?
— Não falei com ele.
— Por quê?
— Vou falar em breve.
— Breve, quando?
— Mãe!
— Fala com o seu pai.
manhã
Prova de Física nas duas aulas antes do intervalo. Intervalo curto.
Prova de Biologia nas aulas seguintes.
tarde
Dante passa nos vestiários para desejar um bom jogo a todos. O time de Dante, sem o Dante, ganha de
dois à zero.
Navega na internet. Vê o blog do Heitor que agora tem muitas visitas.
— Consegui abordar um tema que, tenho certeza, vai cair em muitos vestibulares.
— Pai, precisa falar mais devagar e o som está muito baixo.
— Legal...
noite
Ademar vem com uma proposta de passeio para o final de semana. Dante fica animado,
Heitor e Ademar namoram na cozinha, Dante sai de mansinho.
manhã
Prova de Inglês nas duas aulas antes do intervalo. Intervalo curto.
Prova de Ciências nas aulas seguintes. Dante é um dos primeiros a sair da sala. Viagem até o litoral.
Ficam em um apartamento de uma advogada amiga de Ademar. tarde
Nadam. Pegam ondas.
Jogam frescobol. Caminham pela areia.
Ademar fica “amigo de infância” do vendedor de cerveja.
Heitor, entre uma onda e outra, faz três séries de 100 abdominais. Dante faz vários gols.
Priscila paquera vários surfistas e Dante tem uma pontinha de ciúmes.
noite
Heitor e Ademar vão deitar cedo.
Priscila e Dante assistem televisão e não se beijam escondidos por medo de serem pegos.
manhã
Heitor e Priscila acordam cedo. Vão caminhar pela praia. Dante e Ademar são acordados com muitos
solavancos.
Nadam. Pegam ondas.
Dante e Priscila se beijam escondidos, mas não estão namorando. Almoçam.
tarde
Dormem.
Nadam. Pegam ondas.
Dante e Priscila não estão namorando, mas se beijam escondidos. Conversam.
noite
Dante e Priscila se beijam escondidos na varanda.
manhã
Voltam cedo. Param em São Paulo. Passeiam.
tarde
Almoçam no Mercadão.
noite
— Falou com o seu pai?
— Não tive tempo...
— Teve sim. Por que não falou?
— Vou falar em breve.
— Breve quando?
— Mãe!
— Fala com o seu pai.
manhã
Feriado. Pela manhã, Dante passeia de bicicleta com o pai pela cidade. Dante deixa o pai vencer a
corrida.
— Não.
— Filho! Calma...
tarde
Jogo fácil. O time do Dante, sem o Dante, faz seis a zero. Importante conseguir um grande saldo de gols.
Mais tarde, Dante joga Dama com a avó. Deixa ela ganhar.
— Não.
— Querido! Calma...
noite
Dante, Priscila e Ademar jogam Wii. Dante ganha.
Heitor recebe um e-mail estranho. Alguém quer conversar sobre o blog.
— Pode ser trote.
— Sim...
CAPÍTULO VIII
manhã
No intervalo.
Paulo chama para o canto.
— Venha ao treinamento hoje.
— Para quê? Não quero jogar.
— Venha, o técnico pediu.
Não desgruda o olhar da Priscila. Percebe que ela também o gruda.
— Precisamos conversar.
— Sobre o quê?
— Discutir a relação.
tarde
Dante vai ao treino.
— Quer jogar um pouco?
— Para quê?
— A gente precisa de mais um e você é do time.
— Para quê?
— Estou pedindo.
— Por quê?
— Quer ou não?
Dante brinca. Não tem mais compromissos com tática ou esquemas. Joga muito feliz!
noite
— Então?
— Então o que, pai?
— Não tem nada para contar para mim?
— Não tenho. Falou com a minha mãe, né?
— Há muito tempo.
— Mas, pai... é difícil para mim, sei lá, ...
— Filho, fique tranquilo. Sei que está sendo barra aqui em Procópio. Entendo também que quer ficar com
a sua mãe, não tem problema nenhum. Vou ficar com saudades! E também poderei conhecer a Europa
quando for visitar você.
— Dante, para!
— Desculpa... Fiquei sem coragem de falar com você.
manhã
Dante recebe as notas das provas. Foi bem, deve passar de ano. Falta somente a avaliação geral.
tarde
Nova brincadeira-treino.
Um lanche na casa dos avós. O avô Luiz trata a avó Salete com o carinho de sempre.
— Não.
— Dante, pare. Eu vou. Você não imagina com é difícil para mim
— E também é difícil para o meu pai, para o avô Luiz, para as tias, para todos nós.
— Vou tentar.
— Quer que eu ligue para ele?
— Não precisa.
noite
Heitor conta que fechou com um o site de aulas pela internet: Inhouse. Este promove cursos e
capacitações com diversos professores. Propuseram para que Heitor migrasse suas aulas do blog para o
site. Heitor topou, mas não com exclusividade. Produziria aulas para eles. Ademar redigiu um contrato
justo, que foi prontamente assinado. Foram comemorar em um restaurante da Rua do Porto, em
Piracicaba.
manhã
— Se entrar na aula e a gente não conversar vou fazer um escândalo.
— Prita! Que é isto?.
— Quero entender. Conversar agora.
— Depois... à tarde. Juro.
Dante divaga muito. Nem imagina o que será a conversa. Nem morto fica em Procópio. Porém vai morrer
de saudades da Priscila. Do pai. Da avó. De todos. Podia levar todos para Barcelona. Melhor: cairiam
dois meteoros em Procópio. Um destruiria a cidade toda. Somente as construções. E outro daria
superpoderes para ele. Principalmente a supervelocidade. Daí era só dar saudade, que viria correndo.
Além de poder cruzar e cabecear.
tarde
Priscila e Dante almoçam juntos na casa dele. Pegam as bicicletas. Pedalam muito até o Mirante.
— E?
— E o quê?
— Como a gente fica?
— Não sei.
— Também não sei.
— Pensei que você soubesse.
— Queria que você soubesse.
— Quer namorar?
— Não sei. Quer?
— Também não sei.
— Você vai embora no ano que vem, né?
— Prita, eu vou! Vou para São Paulo ou vou para a Espanha. Vou para onde minha mãe for.
— Por quê? E o seu pai?
— Vou ter saudade dele como sempre tive, vou ver ele sempre que puder, mas ele quer ficar por aqui e
eu não.
— Nem por mim?
— Não sei, você vem comigo?
— Tá louco? Não! Nunca, minha mãe me mataria...
— Então vamos aproveitar o tempo que a gente tem...
— De onde você tirou isto?
— De um filme, achei muito legal.
— Tá.
— Tá o quê?
— Vamos aproveitar!
Conversam e beijam. Beijam e conversam.
Voltam pedalando bem devagar para aproveitar a companhia.
noite
— Você falou pro meu pai.
— Falei! Sabia que você iria enrolar.
— Mas, mãe...
— Precisava...
— Legal. Vamos morar onde?
— Estamos pensando. De qualquer jeito volto em janeiro e a gente conversa...
— Que mais?
— Eu engordo todos os dias.
— Você está bem!
— E sua avó?
— Ela está reagindo bem ao tratamento, está mais animada... Dante fantasia acordado com a Priscila.
Dante sonha acordado com a Priscila. Dante devaneia acordado com a Priscila. Dante cai no sono com a
luz acesa.
manhã
Os alunos-jogadores são dispensados da aula.
— Tomara que eles se lembrem das jogadas.
tarde
Chega ao ginásio e vê o seu time se aquecendo. O ginásio vai enchendo de gente.
Muitos alunos das duas escolas.
Muitos pais. Muitos tios e alguns olheiros.
— Dizem que, na final, o Falcão vai entregar a taça.
O jogo começa. O coração do Dante vai sair pela boca. O seu time está desatento. Leva mais de dois
gols de jeito bobo.
— Ô, marca o loirinho!
— Marca o loirinho com a cinco!
— Marca!
Não marcaram e o loirinho fez mais um gol. Terminou o primeiro tempo com três a zero.
Dante demora para chegar no vestiário do seu time. Muita gente circulando. Chega e vê o pai do Paulo
dando uma bronca federal em todo o time.
Xinga, fala, briga e chuta a parede. No final, pede garra para todos.
Todos continuaram de cabeça baixa bem depois que o pai do Paulo saiu.
Dante, saindo de trás de um armário, sente a vontade incontrolável de resolver.
— Bobagem gente, é só um jogo! Vamos brincar! Se perder ninguém morre. Se ganharmos, ganhamos!
O seu time levanta um pouquinho a cabeça.
— O cara é um cavalo! — disse o técnico tremendo de medo. Dante acredita que foi pelo seu incentivo
que o time melhorou.
Conseguem ganhar e o loirinho não viu mais a cor da bola. Ficou só de figuração. Olha para o pai do
Paulo e vê que ele também está orgulhoso.
noite
— Vou chamar Priscila para dormir aqui amanhã, certo?
— Não acho legal!
— Por que pai?
— Por que não dá.
— Mas por quê?
— Sei que vocês estão namorando.
— Não estamos...
— Se não estão, enganam bem!
— Se ela for a minha namorada... E daí?
— Daí, rapazinho, ela não pode dormir aqui!
— O seu namorado pode...
— Somos adultos!
— Mas, por quê?
— Como seu pai, não permito que a sua namoradinha durma aqui, entendeu?
— Entendi. Você está fazendo a mesma coisa que a avó, né?
— Como?
— Está fazendo a mesma coisa: sendo hipócrita. Tipo: “Faça o que eu digo”.
— Sou o seu pai!
— Sou o seu filho!
Dante vai dormir sem dizer boa noite.
manhã
Heitor tenta conversar com o filho, mas ele não quer conversa. Responde com monossílabos.
Tio Treco liga convidando para irem até Campinas assistir o jogo do Corinthians contra o Vitória da
Bahia.
— Pelo menos, posso sair com o meu tio?
— Para de ser cínico, filho.
— Posso?
— Pode.
— Obrigado.
tarde
Vão ao jogo: Dante, tio Treco, tio Rodolfo, Rômulo, Remo e o Manuel. Passeiam pela cidade.
Entram no estádio para assistirem a preliminar do time de Júnior do Corinthians contra o Guarani. Que
vence por dois a um.
Jogo principal. É sofrido como sempre, mas o timão vence!
noite
Dante janta na casa do tio Rodolfo e da tia Fátima.
— Por que elefante não pega fogo?
— Sei não tio, por que é?
— Porque ele já é cinza.
— Como se passa um elefante por baixo da porta?
— Sei não tio, como que é?
— Coloca dentro de um envelope.
— O que é que tem dentro do lixo do hospício?
— Sei não tio, o que é?
— Doido varrido.
— Você acredita que algumas ele até inventa?
— Acredito, tia.
Dante dorme na sala assistindo televisão.
manhã
Dante está irritado com o pai. É muita hipocrisia dele. Ainda bem que está acabando!
Vai à missa com a avó. Reza para que janeiro chegue logo.
Ajuda o avô a cuidar do jardim. Torce para que janeiro chegue logo. Almoça com os avós. Deseja que
janeiro chegue logo.
tarde
Entra e, rapidamente, sai de casa. Aspira que janeiro chegue logo. Pega a bicicleta. Ambiciona que
Joga bola no campinho. Faz o possível para que janeiro chegue logo. Passeia pela cidade. Espera que
Joga bola da quadra. Implora que janeiro chegue logo.
noite
— Vamos conversar?
— Depois.
— Tô a fim não.
— Por quê?
— Mãe, o meu pai vai ficar falando bobagens.
— Mas é o seu pai!
— Eu não estou namorando com ninguém... e ele não deixa ela vir dormir aqui... e o namorado dele
pode ...
— Precisam conversar e se entender...
— Mãe, nem quero que a Priscila venha, quero ir embora logo...
— Sei.
— Saco! Ele quer que eu seja viado como ele!
— Dante!
— Que foi?
— Você não imagina o tamanho da bobagem que está dizendo!
— Mas, mãe...
— Filho, você está muito resmungão. Se quiser conversar com o seu pai, vá. Se não quiser, fique na
sua! Mas ficar falando mentiras dele eu não admito!
— Ele fica querendo mandar em mim!
— Ele manda. Vá e converse com o seu pai. Mas, pelo amor de Deus, pare de reclamar e de ficar com
peninha de você.
— Mas, se meu pai fosse diferente, eu não estaria fora do time...
— Talvez se o seu pai fosse diferente, você nem existisse!
— Mas, mãe...
— Filho, seu pai é um homem correto, sério e até chato demais. Ele ama muito você e quer o seu
melhor.
— Mas está sendo injusto comigo...
— Tá. Vá e resolva...
— Mas, mãe...
— Pare de ficar lamentando ou fugindo, e encare de frente!
— Encarar de lado não dá, né?
— Não seja cínico! Preste atenção: converse com o seu pai já. Resolva, de um jeito ou de outro, mas
resolva. E a vida continua. Certo?
manhã
Heitor acorda cedo. Faz sua ginástica. Dante acorda, toma seu chocolate. Não se falam.
Dante sai sem se despedir.
Aulas normais. “Está acabando!”. Intervalo.
Conversas sem sentido com as meninas. Aulas normais. Está acabando!.
Dante encontra Heitor na frente da escola.
— Vamos conversar? Está com fome?
tarde
Vão a um restaurante.
— Desculpa pelo jeito que eu falei.
— Tá...
— Mas não estou pedindo desculpas pelo que eu falei. Discutem. Discordam. Concordam e a comida
esfriou no prato.
Debatem. Desafinam. Esclarecem. Pedem para que requentem a comida. Almoçam.
— Pavê?
— Pudim!
Dante não está namorando a Priscila. Gosta dela. De um jeito diferente. De um jeito novo. Mas não está
namorando. Não quer ficar mais em Procópio e tem medo da vida que terá na Espanha. Quer ver logo o
jeito da irmã, Beatriz, e quer que o pai e a avó conversem.
Heitor quer dar mais aulas e quer que o filho seja feliz. Quer que a Bárbara seja feliz e quer ser muito
feliz com o Ademar.
— Beijei sim...
— Foi bom?
— Pai!
— Foi?
— Foi.
noite
Heitor e Dante jogam no computador. Dante ganha na maioria das vezes.
— Hora de dormir. Escove os dentes.
manhã
Heitor acorda cedo e faz as suas ginásticas.
Dante acorda lentamente. Toma o seu chocolate. Conversam e planejam o dia.
Dante sabe que tudo está bem, mas não é a mesma coisa.
A chateação passou, mas não toda. Superou a tristeza, mas não toda. Fica sempre um restinho no fundo
da xícara.
Alunos do time do Dante são dispensados.
— Precisamos ganhar esta e a outra.
tarde
Dante chega na hora de sempre, com a mesma camisa e calção. Senta no mesmo lugar. Tinha que fazer
tudo o que sempre fez.
— Precisamos ganhar desta vez. Ganhar bem!
Se o time do Dante ganhar do furacão da Escola João Marcos Vento Forte, fica com o mesmo número
de pontos ganhos.
O Furação não fez frente. Passearam alegremente. Cinco a zero. Quase campeões.
noite
Assiste a filmes antigos com a Priscila e depois lancham. Dante a acompanha até em casa.
— Então não vamos namorar?
— Acho que não...
— Eu gosto muito de você.
— Então seremos ficantes ou amigos com benefícios?
— Só quero um beijo, pode ser?
manhã
— Como você está?
— Tudo bem, Ademar.
— Legal!
— Meu pai falou com você...
— Por cima...
— Estamos resolvendo...
— Que bom, aproveite muito a Espanha! Aulas, intervalo e mais aulas.
— Alô?
— Oi?
— Passa em casa depois?
— Passo sim, Prita.
tarde
Dante passa na casa da Prita.
Recebe de presente de aniversário adiantado um livro sobre a Marvel Comics.
— Muito legal!
— Feliz aniversário!
Dante joga ping-pong com Prita.
Ficam conversando sobre o futuro e beijam no presente.
noite
— T’ha agradat el nom de la seva germana petita?
— Gostei sim, e você ?
— Sempre he volgut una filla.
— Vai ser legal…
— I espero que us agradi aquí també...
— Claro que vou! Você conhece mesmo o pessoal do Barcelona?
— Conec a molta gent ... incloent l’equip de futbol ... Et vaig a arribar per a una prova!
— Legal! Muito legal!
— Crec que la seva mare es millor ... Ara pot continuar parlant amb vostè. Bye.
— Até!
— Oi?
— Mãe, ele falou que vou fazer um teste no Barcelona.
— Ouvi sim. Você vai ser um novo Messi.
— Nunca! Vou ser o Dante!
manhã
Dante convence o pai de que não precisa ir à escola. Acompanha o pai nas gravações.
O Remo ajuda muito. Ele grava e edita as aulas. Dante auxilia como contrarregra.
tarde
Participa do último treino.
Brinca e deseja muita sorte para o time.
Passa na casa da avó. Ela não está e o avô Luiz não soube dizer onde ela foi.
noite
Quando Dante chega, não tem ninguém em casa.
Depois chega Ademar.
— Sabe do meu pai?
— Não sei.
Heitor chega muito depois. Está animado.
— Onde você foi, pai?
— Por aí...
— Vá dormir e não se esqueça de escovar os dentes.
— Depois. Vou no MSN falar com a Prita.
manhã
Dante acorda com o celular tocando.
O Arthur deseja um feliz aniversário. Milena liga também e deseja felicidades. Heitor e Ademar fizeram
um belo café da manhã.
— Parabéns!
Durante o café ligam: o avô Luiz, a tia Cândida, a tia Fátima, o tio Rodolfo, o tio Treco e todos os primos.
Chegando ao ginásio, está lotado. Dante não consegue sentar no lugar da sorte. Fica preocupado.
Dante e Priscila se ajeitam o melhor possível.
Começa o jogo.
O outro time joga bem. Mas o time de Dante está melhor. É cá e lá.
Quase no final do primeiro tempo, Paulo faz um gol. Seguram o resultado até o final do primeiro tempo.
O celular do Dante toca. Toca e vibra. Vibra e toca. Está sendo chamado ao vestiário.
— Você vai entrar.
— Mas por quê?
— Porque é do time.
— Porque faz falta.
— Porque é o seu aniversário.
— Mas vai dar encrenca para vocês.
— Que podem fazer mais? Não deixar a gente jogar? O campeonato acaba hoje! Vamos!
— Não trouxe o meu tênis...
— A gorda, digo, a Priscila, já trouxe...
— Tinham combinado com ela?
— Ontem, foi ideia dela e a gente abraçou! Dante entra na quadra.
Vê que estão Heitor, Ademar, a tia Fátima, a avó Salete, o tio Rodolfo, o avô Luiz, a tia
Cândida, o tio Treco e os primos todos.
As pernas de Dante bambeiam. A avó Salete está do lado do seu pai.
— Vamos jogar...
— Vamos brincar...
Com o placar favorecendo o time de Dante, é um jogo solto, objetivo, mas solto. Muitos dribles
desconcertantes. Lançamentos precisos. Tabelinhas maravilhosas. Dante faz dois gols. Paulo mais dois.
Vencem de cinco a um.
O juiz apita final do jogo e todo o time de Dante começa cantar o Parabéns a você e os parentes
acompanham.
O ginásio inteiro canta. Certo que a maioria pensa que é por causa do aniversário da cidade.
Dante disfarça e chora.
tarde
Almoçam na casa dos avós.
Dante vê a avó abraçar o pai muito sem jeito. Vê a tia Fátima trocando receita com
Ademar.
Dante se vê feliz.
Não quer mais ficar em Procópio, mas desgosta dali um pouco menos.
Do Heitor, ganha um livro: Guia politicamente incorreto da História do Brasil, de Leandro
Narloch.
Da tia Fátima e do tio Rodolfo, o DVD do filme Maldito Futebol Clube.
Da tia Cândida e do tio Treco, o livro Corinthians é preto no branco, de Washington
Olivetto e Nirlando Beirão.
Do Manuel, uma camiseta “da hora”.
Dos primos Rômulo e Remo, um DVD com os seus jogos;
Da turma do futsal, muitas mensagens no Lifebook e em outras redes sociais. Do Ademar, um tênis irado
e a promessa que não fumaria mais.
Da Priscila, alguns beijos no alpendre.
noite
— Você e minha vó se acertaram?
— Estamos caminhando. Ouvi o que ela tinha a dizer. Ela ouviu o meu lado. Vamos indo...
— Deram os dedinhos?
— Demos.
— Você chorou?
— Desaguei...
— Minha avó chorou?
— Também. Quase desidratamos!
— Legal...
Da tia Lucilla, a madrinha, ganha um convite para passar dezembro e janeiro no Rio de
Janeiro.
— Felicidades filho!
— Obrigado mãe...
— Tenho duas novidades!
— Serão gêmeas? Bianca e Beatriz?
— Não!
— Que pena...
— Vamos morar em São Paulo!
— Verdade?
— Alejandro resolveu abrir um restaurante no Brasil. Em Sampa!
— Muito legal
— Ficaremos a maior parte do ano aí no Brasil, mas passearemos muito por aqui!
— E o meu teste no Barcelona?
— Filho?
— É o meu sonho!
— Vejo o que posso fazer. Que tal?
— Adorei. E a outra?
— Iremos para o Brasil depois do Natal!
— Depois, quando?
— Dia 27.
CAPÍTULO IX
Dante acorda antes do Heitor. Resolve sair um pouco. Despede-se da cidade. Passou de ano. Não vai
mais viver ali!
O pai e Ademar irão levá-lo ao Rio no dia seguinte. Estará livre dali. Despede-se da escola. Não vou
mais tropeçar!
Dos campinhos. Sou muito bom! Do ginásio. Sou muito bom! Despede-se dos gêmeos.
No Mirante. Respira profundamente. Respira aliviado.
— Acabou!
De um telefone público, faz uma denúncia anônima ao Conselho Tutelar. Conta o abuso que os pais do
Paulo cometem e desliga temendo que o conselheiro não tenha acreditado nele. Tinha que ter feito uma
voz mais grossa.
A tia Lucilla mora em Ipanema e ainda tem que trabalhar alguns dias.
Enquanto isto Ademar, Dante e Heitor visitam os locais turísticos da Cidade Maravilhosa. Andam muito.
Ademar e Heitor voltam exaustos e Dante ainda quer jogar bola na praia.
Praia pela manhã.
Ademar fica “amigo de infância” do vendedor de cerveja.
Heitor, entre uma onda e outra, faz três séries de 100 abdominais. Dante joga bola e aprecia a paisagem.
Na tarde:
Heitor descansa.
Dante e Ademar jogam futebol na areia.
Tia Lucilla está em férias!
Ademar e Heitor voltam para Procópio. Dante se despede com muitas lágrimas.
— Valeu, né filho?
— Valeu...
— Até Ademar...
— Até querido!
Dante não tem muito tempo para curtir a tristeza, tia Lucilla o leva para passar alguns dias em
Saquarema.
Saquarema, lugar divertido nas primeiras cinco horas. Local pacato. Internet é lenta e o celular muitas
vezes não pega, mas tem TV aberta!
De volta ao Rio. Dante conhece uma amiga da tia Lucilla que trabalha no Flamengo. Ela promete que o
levará para um teste no time.
— Quando?
— Breve!
— Breve, quando?
— Dante!
Mãe bem. Pai bem.
Alejandro bem. Ademar bem. Beatriz melhor ainda.
E a Priscila manda um beijo.
Manhã Futebol na praia
Tarde Praia com futebol
Noite Um futebol, meninas passeando e dois mergulhos na água morna.
Faltam 11 dias para a mãe de Dante voltar. Manhã Insolação depois do futebol.
Tarde – Pronto-socorro. Repouso.
Noite Um futebol na televisão.
Manhã Atualiza e turbina o micro da tia Lucilla.
Tarde Passeio no Shopping e cinema.
Noite Roda de samba do amigo da tia Lucilla.
Madrugada Navega na internet. Atualiza o Lifebook. Manda vários cibercartões de Natal. Conversa com
a Priscila. Diz o que está fazendo e ouve o que ela está fazendo. Beijam-se em desejo.
Manhã Futebol na praia. E muitos mergulhos para disfarçar. Tarde Praia com futebol e muitos mergulhos
para aliviar. Noite Um futebol e alguns mergulhos antes de escurecer.
Tia Lucilla vai dormir na casa de um amigo especial. Dante não sai da Internet. Fica a noite toda on line.
Conversa com a Priscila. Amor, ódio, melancia e bolo de cenoura. Beijam-se em desejo, em pensamento
e na tela.
Tia Lucilla e Dante vão a Procópio. Natal em família.
Neste Natal, Ademar consegue convencer a avó Salete: estão dividindo a organização e a produção da
ceia.
Avô Luiz canta.
Heitor dança discoteca com tia Fátima e tia Lucilla. A tia Maria Cândida toca violão.
Tio Treco e tio Rodolfo bebem, contam causos, contam piadas e se divertem.
Os primos ficam pouco, pois têm que ir nas casas dos parentes das namoradas. Dante beija Priscila no
Mirante.
Falta 1 dia para a mãe de Dante voltar.
Dante vai para São Paulo. A nova despedida é muito mais triste! Dante é beijado por
Priscila na frente de todos!
É Hoje!
A mãe está mais linda! Dante chora.
Alguns dias depois que a mãe do Dante chegou.
— Pai, alguma novidade?
— Nenhuma, filho, tudo tranquilo!
— Ademar está bem?
— Peraí que vou fechar a porta, a televisão está atrapalhando.
— Que foi?
— Nada! O Ademar mandou dizer que não fuma mais!
— Eu sei.
— Tenho uma coisa para contar, mas é segredo!
— Fala pai!
— Ademar engordou muito!
— Pai! Para!
— Ele anda muito nervoso.
— Pai! Paciência!
— Tão descontrolado que até queimou o Miojo!
— Pai, que exagero! Ademar odeia Miojo!
— Disse que vai fazer uma academia.
— E o ronco, melhorou?
— Que ronco?

Camillo, Plínio. O Namorado Do Papai Ronca

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— Adivinha o que cai em pé e corre deitado?

— Adivinha o que cai em pé e corre deitado?

— Por que um cachorro entrou na igreja e não saiu?

— Falou com a vó?

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