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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA. 1GG Qs seater eseas ae amma Som eserenta nl sabe rr quca, genta de cone ede spertia Posada nat ecrsisdae de nde ain Ts crwndido mcd stro do cep, bare da manhi oo ced tad 9 eco da Ante de Haman, Arter © ‘Cent Prof lion Santon Sacha ated a Actes Thabo de Conese eon Prfeners Eene Die Mion reer Ca Cords rer Renata da Sees soe, Ex garden dade be sad Me Tenge cont © cra de so ou de Inv pre ag oe dis tn ume: o po dens cade dow ceondal cE ‘aie le pee ‘Rind Goat de tlbi,sexor dow Cmiahon, menari Slt, de una confide man no Fado e don dete ‘dente pewon De cera meta 60 NiO gf ‘auisibcte'oSings Corn sre’ [| oataverotepdoeotnenciel Tata aa feta de reo comers como poe de Ess, par qe se no wea xa peti ‘oan pnd ube ptencom, Jorge Amado (ixtos entries de ire “Bahia de Tas dezembro 2011 I GG ‘Trabalho de Conclusio de Curso (Gouin de partite de toils os présimos nfomeras, esses textos extraidos de um lio de jorge Amado, se faz presente da primeira & tiima edigio, com- pondo o Editorial. Se referem ao orixé Exu, 0 pa- drociro da Casa, donde vem a maxima da revista em “‘manter os caminhos sempre abertos” Sao tex- tos posticose subjetivos, que no informam, & pri- meira vist, alinha editorial de maneira convencio- nal, mas logo, como diz outra maxima, “para bom entendedor..’ 0 eitor entende: em Exu, as possibi- lidades sion Capa: Ex Vai Rolar: 0 Seakor da Iuprovisacao, Renato da Silveira 2 ‘Questo Edito- rial 4 Myriam Fraga Enirevista 11 As entrevistas da revista 13 Letras 18 Um pouco de historia Poster Capas de Ext 21 Eis Exu 33 Eneruzil Textuais 43 Recorte e cola 49 Exu documento 50 Quase ultima pagina 51 Registro Referencias Utilizadas 4 QUESTAO EDITORIAL O ue normalmente se trata de um pequeno artigo onde se expressa a opiniso e 0 posicona- mento do editor ou coletivo de uma revista, o Editorial, em geral se encontra em destaque nas primeiras paginas de uma publicagdo, Exu, em seu niimero de estreia, de novembro/dezembro de 1987, traz, no lugar desse editorial tradicional, acompanhado de uma fotografia da escultura de ‘Tati Moreno, dois pequenos textos de Jorge Amado. 6c A proposta inicial da revista esté muito clara no editorial, tem uum pouco dessa irreveréncia, da propria poesia (...), tem essa coisa da soltura que se manteve até o final. 99 ‘m editorial aos moldes tradicionais, por assim dizer, s6 aparecen efetivamente nos miimeros 1, 2, 6 € 9, porém, todos os aspectos das revistas carregam em si esse ampliar de horizontes proposto. Exu mio tinha uma politica editorial bem definida, Improvisagio, como diria Myriam Fraga, essa revista, literdria e cultural, foi vitoriosa no campo intelectual, Era uma revista de visionarios. Precisava de recursos financeiros como qualquer outra, mas esse nao era © seu objetivo primaz. Desde o lansamento de seu pri- meiro ntimero, Exu deixou bem: claro em seu editorial de que se ée (Myriam Fraga, entrevista) tratava de uma publicacdo em que 05 caminhos estavam sem- pre abertos, caminhos mui Jos que contemplavam poesi cronicas, poemas, estudos criti cos, ensaios, traducées, reporta- gens, entrevistas e registro das atividades da Fundagao Casa de Jorge Amado compoem a publi- cagio. ‘Um dos nossos grandes intelec- tuais e editor baiano, Pinto de Aguiar, em seus apontamentos, escreveu a sua visio sobre 0 pa- pel do editor, © qual cle acredita que nao deve ser um critico que exerce um julgamento quanto A qualidade da obra, “cabe-lhe, apenas, ajuizamento da obra dentro de uma determinada oricntagio programitica’ (IBL, 1993, p.100). Pinto de Aguiar acreditava que as editoras de- vyiam ser usadas democratica- mente, deixando a opcio para © leitor; a0 editor, cabia uma boa apresentacdo gréfica e uma maior divulgagio possivel, Essa € uma verdade em Exu, tio bem editada graficamente, e com um editorial aberto, democritico, onde tudo era permitido, dentro de certos limites ou orientagio, & claro. Na EXU tudo pode, evidentemente uma grosseria, um ataque a alguma pessoa ndo cabia, ndo tinha também uma politica partidéria, 99 (Myriam Fraga, entrevista) Myriam comenta as dificuldades do escritor 5 na Bahia, desse ser “obstinada” que é, com a dificil tarefa em ter sua obra publicada: 6.6 eenao tem canais por onde fazer ecoar a sua voz. Nao existem editoras, nao existem revistas literdrias, os suplementos de cultura dos jornais sao coisa do passado. E os escritores se perguntam, escrever para que? Se 0 destino natural das obras parece ser um s6: 0 fundo das gavetas. QY (BL, 1993, p.110) » A Oportuna, portanto, a criaggo da Exu, que, ao longo de suas trinta “J eseis edigdes, publicou trabal- hos de escritores consagrados, mas também de outros, inéditos, sendo porta-voz de quem surgia e se afirmando a cada edigio como tum “campo livre para criagio e pensamento’, como bem escrito em editorial por Myriam Fraga bes 2 e 6. Exu respirava arte, Além das capas, que a cada nuimero trazia uma representagio de Exu criada por um artista dife- rente, a revista contava também. com um encarte colorido por onde circularam pinturas, esculturas, litogramas, serigeavuras, desenhos, relevos c fotos, afirmando a sua intencao de permitir em si o pleno intercambio cultural, estreitando 0 lagos com a criacio literiria e as artes plisticas em geral. Mas, assim chama de “verdadel- como Exu é 0 orixé do movimento, wave denise a publicagio também manteve, 20 cianaiamsepi: = ¢ longo dos scus 36 niimeros, as car- ragdes literdrias dos acteristicas da mobilidade, soltura, eatritored baiatiod?™ a brincadeira que permitia novi- (BL, 1983, p.110) dades, experimentagdes e liber- dades. Para Exu nada era proibido, tudo podia quando se tratava de fazer ecoar a linguagem das artes. ste mesmo Pinto de JAguiar con- cedeu entrevista a ‘Myriam Fraga, em 1984, para o jornal A Tarde, edigao de 21 de juno, sobre a ‘questo editorial na Bahia. Na época, nao havia uma editor, uma revista literaria ow um suplemento ey cultural na Bahia. “0 Myriam observa ® due este era (e ainda continua) “um dos muitos mistérios que compiem o quadro da vida cultural biana’, a qual ela ae i Arte: Tridente de Ess, Adaiton Nunes, 2011 * Peto especialmente para este 1 6 ENTREVISTA Myr iam de C. Lima Fr a g a Myriam de Castro Lima Praga ini- ciou suas atividades literérias pub- licando assiduamente em revistas € suplementos literdri Marinhas (1964), Sesmaria (1969), WHO Livro dos Adynata (1973), A itha (1975), O risco na pele e A cidade autora de (1979), As purificagdes ou o sinal de taildo (1981), dentre outros trabalhos. Dona de muitos Titulos e Prémios revela-se uma artesa do verso: sem- pre em busca da forma exata eda | palavra mais fiel. Tamanho prestigio e dedicagdo as letras ¢ a cultura, foi eleita, por unanimidade, membro efe- tivo da Academia de Letras da Bahia em 1985, ocupando a cadeira n° 13, ¢, desde 1986, é Diretora Executiva da Fundagdo Casa de Jorge Amado, instituigao que dirige - como ja disse Jorge Amado - em poesia... mos de paz, pedimos licenga e entramos. Em sua sala, ‘Myriam Fraga nos recebe com toda graca. Vamos conver- sar com uma das maiores poetisas desse pais; ficamos agraciados. Feitas as apresentagdes, sentamos, ligamos a cimera ¢ comegamos a entrevista. E ncontramo-nos com Exu A porta de entrada da Casa, So- O Humberto fazia Por que exw? LARGO Foe toda a pate grfica Exu, porque ele 0 LOURIINHO C 0 Claudius tomava padoeodacsse DA BAHIA ED se conta da edigao, eu 0 Orixa em movi- “SIL E DE SUA. coordenando... E mento, 0 que leva e a outra pessoa era tris. Exuéoorixida | EIGL Anaeen NGSSA conte Eduardo Athaide, sto. EAOAMOR ALIBER~ wei a pessoa que Cc ‘DADE TENDADOS A} yh onte-nos como LAGRES PARA 6 ZE> » P 5 ‘aa reviste, gente nao tinha recur- STE ROBRGRAGRORIRE, SSNs carinho pela revista RAIANAE hojeemidia.. também muito DA O RAMAN: Hawi — i avia uma expres- cecohe reine | BRASIEEIRA* SEGA, siidade vial mito como ela surgiu. Eu, fo 5 Clouds Portugale REM VINDO SE POR _ ‘Kee Humberto Velame fade ate rata trabalhivamosjuntos QE ENTRAR om cicartes... Aueapan na Fundagao Cul- tural do Estado da representando o Exu em cada edicio. comunic Bahia antes mesmo queriamos uma coisa mais i daexisténciada Funda- _solta, mais Kidica. Quando _ A Primeira capa foi essa, tio Casadeorge Amado euvimpra ci Pundagio como simmbolo da Funda- esempre conversivamos Casa de Jorge Amado), _—¢40,0 Ex de Carybé sobre a possibilidade de _iss0 ficou muito claro que depois fazer uma revista. S6 que _Podia ser feito, porque era ¢#4 capa para fazerléna Fundagio uma instituigdo privada, com um Diitivslate deta city | - wawleetinixGoquetinha, wide porque seria como se fosse uma liberdade inteirade Comesou uma revista oficial... Enés «Tiago eai comegamos com Cala- zans a a pensar essa revista. haver um pouco de cuidado para que nao fique muito “em- baralhado” Porque 0 problema é © seguinte: aimagem tende a absorver a atengio eas vezes 0 texto fica um pouco em segundo plano e a minha discussio sempre foi que a tipologia tinha que ser bem clara, bem ideia de fazer um quadro, que fica para acervo da Fundagio e a gente foto- grafava o quadro e fazia acapa. Tem Calazans, tem Bel Borba e eles estio todos aqui. Eu tenho muita vontade de fazer umaex- *Pe*t*~ posicio sé desses quadros Hf atguma outra pub- de Exu, sio muito bonitos, —jicagao que foi inspira- sio de artistas represen-- dora de Exu? Ou alguma tativos eas capas sio lin-_outra, atualmente, que das... As capas sio muito sea parecida em alguns diferentes umas das outras. aspectos? O que havia de © Claudius tinha muito inovagio na revista? interesse nas artes plisticas 4 gonte sempre sonhava enés temos dois momen- gm fazer a Ext... Mas nio tos de artes plisticas na sei, eu ndo conhego nada Exu, se bem quea revista assim parecido... Eu acho tem arte pra todo canto. que cla é bem diferente. Tem desenhos, tem fotos, Tem caracteristicas assim mas tem esse encarte que de inovacio, por exemplo, erarecorrente eos textos —_gssas brincadeiras grafi- cas... Hoje eu acho até que cram feitos por Claudius isso perturba um poco Portugal. a leitura, as vezes penso, serd que essa coisa que a gente fazia tanta questio, que achava tao bonito, nao dé uma atrapalhacio pro leitor? A letra tinha que ser diferente... Tudo tinha que ser diferente... Era uma brincadeira criativa, ex- perimentamos muito, dos encartes normalmente E ahibridizagao de in- guagens? A hibridizagio das lin- guiagens foi uma intengio desde 0 comeco. Sobre essa hibridizagao, eu acho interessante... Mas tem que Ecos da Semana de 22 ou influéncia de outros movimentos? Eu acho que a gente ja diluiu isso... Talvez, mas talvez um pouquinho, do concretismo, mas nada intencional. Eu acho que © concretismo tem uma base tedrica maravilhosa e tem uma consciéncia muito grande dessa coisa do papel e do uso do papel, como usar 0 papel ea letra, sair daquela dureza e trazer essa criatividade para 0 texto impresso, na letra, no signo... A revista tinha uma equipe fixa? Como era a relagio em Exu? Era uma coisa de amizade, era um grupo de amigos. TTinha que fazer uma capa, tum fazia, 0 outro opinava, 0 outro também, entao nao tinha aquela coisa: “eu sou isso’, todo mundo fazia um pouco, era quase que uma cooperativa, s6 que a gente no tinha a percepgio. Os colaboradores também eram todos amigos, mas muita gente também man- dava coisas pra cé, tinha muito essa ideia do artista jovem, o artista que estava comegando. Como era selecao do que podia co que nio podia na Exu? ‘Na Exu tudo pode. Evi- dentemente, uma gros- seria, um ataque a alguma pessoa nao cabia, nao tinha também uma politica par- tidéria. A proposta inicial da revista se manteve até o fim? ‘A ptoposta inicial da revis- ‘ta esta muito clara no edi- torial, tem um pouco dessa irreveréncia da propria poesia, na verdade foi uma revista dirigida e orga- nizada por poetas - Eue ‘Claudius —, tem essa coisa da soltura que se manteve até o final E jorge...0 quanto ha de Jorge em Exu? Jorge nunca opinou, nunca influenciou.. Quer dizer, influenciou porque ele uma presenca, mas ele nunca chegou pra mim e disse “faca assim, vi pra ci convide falano”, nunca. Jorge Amado era uma pessoa extraordinaria, ela mandava nas coisas as- sim, sem vocé perceber. Ele teve muito medo que a revista comesse os magros orcamentos da Fundagio e depois viu que nao, 0 com- promisso era que a Exu nio interferisse nos orga- mentos da Casa, que eram muito poucos realmente. A Exu era sustentavel. Eu fui muitas vezes atras de re- cursos para a revista... De- pois comecou a sobrar um pouco; a gente comegou a fazer uma pequena colegio que era de pequenos en- saios A revista era vendida? Como era a relacio com 0 anunciante? Nio... Para os anunciantes nao interessava se a revista era vendida e sim que cir- culasse, Em alguns mo- mentos, até, a revista man- teve a Fundagio através de um anuncio grande que nés conseguimos. A gente inclusive diminuiu o ta- manho da revista porque os anunciantes reclama- vam, pois jé tinham um. padrao para os antincios gue aproveitavam, antes ou ficava faltando, ou precisa- va fazer um antincio espe- cifico para Exu. Na cabega da gente visionaria, 0 ideal seria uma revista que nio tivesse antincios, 9 ‘ou que sé tivesse antincios especifi- cos, criados para a revista. Por onde Exu cir- culava? ‘A gente mandava Exu pelos correios gratu- itamente, Nao ia para a banca, nao era uma revista de banca, mas nés tin- hhamos uma grande lista de pessoas que recebiam. ‘A gente também dava, distribuia... Aqui também, na Bahia, havia um maior movi- mento de pessoas de fora, O cor- reio na época nao era tio caro, mas chegou um ponto que comegoua ficar carissimo. A gente até tentou uma vez fazer uma campanha de assinaturas aqui na Bahia, mas s6 duas pessoas assinaram, todo mundo recebia de graga, a gente acostumou mal os Ieitores... Nao tinha uma selegio das pessoas que recebiam, a gente queria que todo mundo lesse, era muito livre, tudo aqui era muito livre. Quantos exemplares? Desde o principio foram trés mil exemplares, mas houve um momento que a 10 gente fez tiragem da Bahia, mais antigo da de cinco mil, mas Bahia’, que é 0 Braulio de ai uma parte enc- Abreu. E um poeta que alhou porque era _veio da revista SAMBA, demais... ele era um alfaiate e era Oo um poeta. Entramos em contexto,na —_contato com Braulio e ele época, era favorév- tinha na época 80 anos... elparaaFundacio Nessa ou fiz porque eu ¢ para a Revista? fiquei impressionada! Nao © contexto na época foi fa- era uma pessoas s6 que fa- vordvel. Nés estavamos tio ia a entrevista, eram duas entusiasmados que acho ou trés pessoas que ent- que a gente fazia qualquer yevistavam e como ele era negocio... Estava muito no ym senhor de 80 anos eu desejo da gente fazer a revista ea gente fez, Parecia facil... Hoje as coisas comegaram a ficar mais dificeis... Era tudo feito ali, por aquelas mesmas pes- soas... O queera fixo na revista? As entrevis- ie, ov eenirtenn O que tinha de fixo tha revista era a en- eevlata nares O documento sé quando tinha alguma coisa esporadica. E, atras, também tinha uma espécie de news- letter, um jornalzinho da Fundacio. As entrevistas, em algumas eu fazia a ab- ertura, em outras, Claudius fazia ou faziamos juntos... Quando eu fui conversar com Jorge, fui convidé-lo pata ser o primeiro entrev- istado, ele disse: “eu acho que vocés deviam comegar com 0 poeta mais velho pensei “ele nao vai poder vir, nés vamos ter que ir na casa dele..”, ai quando cu liguei ele atendeu 0 telefone muito animado e muito firme e disse: “nao precisa vir aqui néo, eu vou ai, eu quero conhecer a Casa de Jorge...; no dia chovia muito, a agua descia por essa ladeira e nés pensando que ele nao viria e esperando... Valdomiro Santana, Ana Rosa Ra- mos, Joao Jorge Amado e Claudius Portugal... E ele veio, chegou aqui com um guarda chuva, deu uma sa- cudida e subiu essas esca- das para fazer a entrevista aqui em cima... E essa foi a primeira entrevista, foi muito legal. Com isso, ele voltou a participar, que foi muito importante para ele também, as pessoas, de- pois de certo tempo, petdem os contatos, as referéncias. Hi um intervalo em quea revista nio foi publicada e de- pois foi retomada... Eram os tiltimos suspiros da Exu? Existiu um inter- valo maior entre um niimero e outra da Exu ja no final que foi um infarto, foi um primeiro infarto! Eram muitas coisas ao mesmo tempo e 1nés tivemos momen- tos aqui na Fundacao que foram muito dificeis... primeiro sinal do fim da Exu foi quando a gente fez dois naimeros em um s6,¢ ai Jorge Amado me disse: “pela minha experiéncia, quando uma revista sai dois ntimeros em um s6, ela esti perto de acabar” € ele achava extraordinario ¢ € uma coisa extraordinétia, uma revista ter chegado a trinta ¢ sete ntimeros... Ela nao desceu o padrio, ela foi... E morreu, acabou, parou, Fechou um ciclo, Como foi terminar com arevista? Uma das razdes porque a Exu parou de circular é que jé estava ultrapassada, tinha que ser em outro estégio. Essa revista é uma revista feita assim, quase que artesanalmente. O que acontece é que a gente teria que estar com projetos, com uma estrutura maior... Eo trabalho fim da funda- ao nao era uma revista literdria, apesar de eu achar muito importante, a gente timha que se debrucar mais no acervo de Jorge Amado, Entao nés direcionamos todas as forgas para isso, para preservacio do acer- Vo, digitalizacao do acervo € com isso a revista ficou muito dificil de fazer, tudo ficou mais dificil de um tempo pra cd, tinha que contratar pes- soas, entao nés paramos com a ideia de depois continuar... Mas eu gosto muito da frase de Hera- lito “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio’, 0 momento da Exu passou, ela pode até vir a acontecer outra vez, mas nao sera nunca essa Exu, que era feita artesanal- mente, recorte aqui, cola 14, nio tinham os recursos que a gente tem... Mas foi assim, uma revista con- struida com muito entu- siasmo, carinho e voce vé pelas pessoas que co- laboravam com a Exu, que la tinha certa amplidao, como Jorge morava na Europa a gente conseguiu através dele varias pessoas que colaboravam. E atnternet hoje, des- empenha bem esse papel de fazer ecoar a vor do escritor ¢ do pocta? Ainda ha lugar para esse tipo de publicagao que foi a Exuz Hoje nao interessaria mais agente fazer uma revista desse tipo. E linda, mas é uma revista que se encer- roti; hoje a Ext seria outra coisa. Para digitalizar colocar no site nado a1 custa nada, mas 0 problema é uma coisa que se chama tempo. ‘Nio falta assunto, nio falta ideia, ndo falta material, nao falta vontade, mas falta tempo e recursos. As vezes eu me sinto assim no limiar de outro tempo, de um mundo novo, é tudo tao rapido... Eu me lembro ainda do primeiro telefone celular que eu comprei que era um tijolo e hoje em dia a primeira coisa que cu fago é ligar o computador, escrava do computador... Telefone enti nem se fala; entao a gente esta ficando dependente dessas tecno- logias todas, Eu mesma estou pensando seriamente em fazer um site, porque vocé faz.um livro e, dai, na internet as coisas circulam, apesar de ser um vicio, é 12 mento fantastico, maravilhoso... Agora 6 livro, como fetiche assim, é outra coisa. En sua entrevista com 0 professor Pinto de Aguiar, para o Jornal A Tarde em 1986, a senhora diz que “um dos muitos mistérios que compdem © quadro da vida cultural baiana é sem duvida al- guma o problema edito- rial, verdadeira caveira- de-burro enterrada na porteira das aspiragbes literarias dos escritores locais”, Esse cendrio ja mudou? O cenario continua 0 mesmo. O analfabetismo na Bahia é muito grande, as pessoas nio leem e as criangas nao sao levadas a ler; agora entio esta cada dia pior, a maior parte das criancas passa o dia todo no computador... Eu nao me conformo que a Bahia nao tenha um mercado editorial, é muito pouco. Agora, tem as instituigdes que mantém suas editoras, como a EDUEBA, a editora da UNEB, UESC... Mas nao tem uma editora comercial, que voce faga um livro de contos e ache quem goste, quem nao goste, quem faga. Eu acredito que é uma coisa cultural da Bahia. Fa- zem alguma coisa de livro, mas eu nao vejo a coisa melhorar. Houve também uma coisa terrivel que foi 0 enfraquecimento das revis- tas literarias... Cregamos ao final da nossa entrevista, gostaria de acrescentar mais al- guma coisa? © que eu acho mais bonito da Exu é essa coisa lidica, voct tratava dos assuntos mais interessantes e as veres até profundos, mas com a coisa da brincadeira grafica que é fantastica, nao sei se ainda ha espaco para isso. Até hoje perguntam quando é que a Exu vai voltar, a Exu nio vai voltar, dle “esta? talvez volte algum dia de outra maneira. AS ENTREVISTAS DA REVISTA 13 Em cada edic20, desde seuLangamento, em 1987, a xu trazia em suas primeiras paginas a secao entrevista. 66 Terfamos uma entrevista que era mais uma entrevista documento, tum registro de pessoas da Bahia como um documento deépoca. 9 g (Claudius Portugal, entrevista) or sugestio de Jorge Amado, esta segio trouxeo | poeta mais antigo da Bahia na época na primeira edicao, Bréulio de Abreu. Essas entrevistas normal- mente eram feitas por mais de uma pessoa. Os textos de apresentacao eram escritos ou por Myriam Fraga ou por Claudius Portugal, quando nao em conjunto. Por vezes, 0s entrevistadores iam ao encontro dos entrevistados, em stias casas ou em outros ambientes; em outras, os ent- revistados concediam entrevista na propria Fundacao. O tom era sempre informal e descontraido. s entrevistas eram feitas, normalmente, por trés AS quatro pessoas - estando sempre entre cles Claudius Portugal e Myriam Fraga -, com a intengio Ponto comum em todas de se ter uma variedade de quest6es e assuntos abor-_ “avssmanain ome dados pelos diferentes entrevistadores. Essas pergun- ‘os entrevistados fazem, em win tas se guiavam, logicamente, por um script prévio, « Primeire momento, uma descrigio de si, contando um pouca de sta, porém era tudo muito solto, as conversas se desenvol- are viam muito “ao sabor do papo”, como citou Claudius Portugal (entrevista) e, também, ao sabor dos inter- esses dos que estavam ali presentes naquele momento. 14 Em dois momentos essas entrevistas ocorreram de maneira nio usual; a primeira, conta Claudius Portugal: 6 Cex tive um entrevistado, que foi Jorge Calmon, que disse que nao queria falar, s6 fazia a entrevista por escrito, nds manda- mos as perguntas para ele e eu coloco na revista isso. g/g (Claudius Portugal, entrevista) Em outro momento, na ocasido da entrevista com José Calasans, Claudius Portugal € ‘Myriam Fraga nao podiam estar presentes por motivos outros; a entrevista foi dada 0s professores Waldir Freitas de Oliveira e Edilene Matos, que eram proximos Fundagao, e que representaram a Ext nese momento. bo Vocé vai ver que ndo tem ninguém novinho. A gente foi buscar quem tinha trajet6ria 99 (Claudius Portugal entrevista) Claudius Portal sevela 0 enirvisado ecto ot Que do saiu, foi Cid Teixeira, ve ono 308 Fea eepsbeads. TC oc30 de 2008, NES pra Casa de see deliv ‘pandas Nia finatizacio das entrevistas, Claudius era 0 responsivel por edita-las, ao tempo em que se revezava com Myriam Fraga na cria- a0 dos textos de aber- tura da sessio. A ideia era documentar, nessa sesso, algumas pes- soas que tinham uma historia, uma trajetéria na Bahia. A lista de nomes era imensa... Os cntrevistaios que circularam pela Exu foram muitos: Wilson Lins, Pierre Verger, Boris Schnaidermann, Helena Parente Cunha, Judith Grossmann, Caetano Veloso, Dias Gomes, entre tantos outros, que falaram para Exu sobre os mais variados assuntos. Ha- via edigdes com mais de uma entrevista, como a edigio casada 16/17, com trés dife- rentes personalidades. Larva D” © momento em que foi pen sada, inventada em wn voo Rio de Janeiro ~ Nova lorque, Exu era o sonko de uma revista que fosse como um laboratério, “uma revista de criagdo litera para poesia, para pro- ‘sae para ensais, mas ndo una revista de resenhas, tana ‘revistadecomentar os wabathos que sairam, nada disso, que a gente queria na revista é que a revista fesse um ‘aldeirdo de eracao.” (Claudlns Portugal, entrevista. Exu serviria, entéo, para antecipar 0 que viria € ndo para reproducir 0 jé feito, Em suas pai ginas circularam autores os mais diversos, al- guns baianos, outros do resto do pais, € cor~ respondentes de diversos cantos do mundo. Na edicio de mimero 16/17, de julholagosto ~ setembrofoutubro de 1990, primeira vez em que a revista aparece com dois mimeros em wm, ela traz 0 seguinte em sew editorial: “Desde 0 seu primeiro niamero, EXU ressatia sua ine tencdo de abrir caminhos de comumicardo. Rewn- indo em seus nimeros 16/17, colaboracdes do Brasil exterior, © editando-as conjuntamonte ~ raducées. estudos.criticos, contes, poesias ~, evidencia ndo 415 9 aleance que vem conseguindo, mas a possi. Dilidade de divulgacdo do que & producido, e sua re- “flexdo hoje, nesta edigao relativa a autores de outros, ‘concretizando-se também um pleno intercémbia cul- tural, esireitando-se os lacos com a criagao literévia @ cultural. Que os caminhos continuem abertos.” Nesse momento, a revista surge, diferente das anteriores, néo com uma, mas, sim, trés en- trevistas: Alice Raillard. Erhard Engler ¢ Giovanni Ricciardo, tradutores de Jorge Ama- do para o francés, alemao ¢ italiano, respec tivamente. As paginas seguem com poesias em portugues, inglés, alemdo e francés, além de um conto de José Saramago ¢ wn artigo 15 16 de Bernard Lorraine sobre os orixas da Bahia. A edigéo seguinte, mimero 18, de novembro! dezenbro de 1990, foi toda dedicada & poesia baiana. Nela encontramos textos intercala- dos com fotos, figuras, pinturas esculturas, € centre os autores podemos citar Judith Gross- ‘mann, Gilberto Gil, Waly Salomao, Antonio Risério, Florisvalde Mattos, Myriam Fraga, Luiz Vianna, Helena Parente Cunha, Plinio Aguiar, Caetano Veloso e Claudius Portugal. Em aleumas de suas edigdes, Ext publicon, ai nda, poesias inéditas de autores como Silio César Lobo, Fernanda Monteiro, Luiz Vianna, Fétima Machado, Dulee Ferraro, Regina Co- li, Cacilda Laborda ¢ Neide Cortizo, dando vor ao que havia de nove no momento. Além da entrevista, que eva fixa em todos as mimeros da Bxu, havia também, na folha do meio da re- vista, wm espaco dedicado a Jorge Amado: “aa pigina miolo da revista era Jorge Amado, ia buscar no acervo que Jorge escreveu (.) eram cofsas pub- Ticadas em revistas, publicadas em jomais, mas que ‘fieam no tempo." (Claudius Portugal em entrevista). Na Exu tudo podia ¢ isso estava presente na sua variedacle de textos ¢ assuntos. Como indi- cava 0 editorial desde 0 comeco, 05 caminhos estavan sempre abertos para inovar, camin- hos esses, livres para criagéo € pensamento. a poesia, portanto, reclama a sensibilidade deixada de Jado pela dinamica cada vez mais acelerada de nossa socie- dade, como lembra Antonio Brasileiro (2002), que também entende o seu poder libertadors libertacio do sentido existencial das coisas do cotidiano, que cla- ma por mudangas na percep¢ao do enxergar o mundo, de uma percepgéo enquanto forma; um mar de possibilidades. Se para Paz (1993) nao se deve econo- mizar poemas, em Exu ha tantos ‘em abundancia... Exu derrama poemas “como a jarra que verte ovinho ea gua” (PAZ, 1993). Jevelara verdade, tio maleu ane esquecida e tio escon- meio i logica complexs, s cada ver mais do mundo; ver. defende o autor ~ a funcio da poesis, inde esta que é~ J wo Tl CAST r poctas cm as, om Pree em M poesia. 20 UM POUCO DE HISTORIA 's primeiras revistas brasileiras foram editadas no exterior devido a al- guns fatores como falta de vontade politica, peso da censura e maci¢a populagao analfabeta do pais, que foram determinantes para a criago de um periodismo sediado no estrangeiro. J4 editada no Brasil, a Revista da Sociedade Filomatica, iniciativa da Faculdade de Direito de Sao Paulo, foi o primeiro de muitos outros tftulos que se seguiram com imensa variedade temitica, fazendo desse tipo de publica¢ao objeto imprescindivel do cotidiano a partir da virada do século XIX para o XX. Ente faxes que con- tribuiram para a importancia hist6rica do periodismo, podemos citar 0 carfiter de Tepresentagao ¢ legitima- Gao de individuos, grupos & ideias, e sua eficdcia quanto a divulgagao das informa- Goes de vanguarda, O leque temético das revistas, que atingiu a sociedade como um todo, colaborou também: para o surgimento de comu- nidades leitoras nessa mesma época. As revistas, que, ainda hoje, permanecem como parte integrante do cotidiano do homem contemporaneo, so cada vez mais numerosas € tratam dos assuntos mais variados. Na década de 1970, que antecedeu o momento de criagao da revista Exu, 0 Brasil viveu um movimento. fértil de revistas literdrias, com publicagées ecléticas em praticamente todos os estados do pais. Essas revis- tas representaram um papel importante na difusdo da literatura, se constituindo como veiculo eficaz a an- unciar todos os movimentos literdtios, manifestos e no- vas tendéncias. Verdadeiros toques de despertar. Anos de perplexidade e medo, 08 70 registraram, através de suas revistas, as incertezas diante de um quadro cultural, social, politica e econémico em grande ‘mutacao, especialmente se considerarmos as contradigées ue tais mudangas produzem em paises como os nossos, patses subdesenvolvidos, para usar um termo em desuso. (CAMARGO, 2008) Se periédicos, como a Re- vista Civilizaao Brasileira, deixaram de existir, por outro lado, o clima da Dita- dura Militar, principalmente a partir de 1968, fez nascer uma imprensa altemativa que, com direcionamento politico de esquerda, movi- mentou o cenétio cultural nesses anos turbulentos. Camargo (2008) cita O Pas- quim, Opiniao, Movimento, Beijo e Ex como locais de resisténcia de produtores através de material literario e cultural. (Cirrenesmarcine Justamente a censura con- feria o sucesso das publi- cages de resisténcia. Tais tevistas e cademos, afirma ‘Camargo, terao papel de preencher um vazio que "nfio se referia a situagaio politica concreta contra a qual se tentava lutar, mas registrava a angdistia dos novos tempos sem proje- tos" (p. 2), mas de extrema pulsao cultural, que insitava ocardter de vanguarda das publicagoes. Camargo identifica al- gumas revistas em que se percebem estilos que ulira- passam a nogao de publica- Gao linear sobre literatura. A primeira tratada pela autora, intitulada José, foi langada em 1976 e findada dois anos depois, em sua décima edigao. Era feita por figuras de profissdes como poeta, jornalista, professor e ensaista, cujas divergén- cias intemas promoveram a multiplicidade de colab- oradores € textos dos mais variados campos da cultura, ‘como os concretistas Har- oldo ¢ Augusto de Campos, © 0s contrarios a essa linha, 0s lfricos draméticos Ana Cristina Cesar e Geraldo Cameiro. Esta revista an- dava, de maneira geral, em esteira modemista, trazia transcrigao de debates que tratavam da "falta de con- senso sobre o valor literdrio e as dificuldades no julgamento da produgao recente" (CA- MARGO, 2008, p. 3), além de momentos metalinguis cos, convidando Salviano Santiago e Ferreira Gullar. Em eset, novamente 0 concretismo aparece como caracteristica, mesmo esta revista tendo surgido com vistas ao resgate da literatura, contra a cultura de massa ea censura. Defendia, também, © que Camargo chama de "antiquado nacionalismo", 0 que acabou trazendo mais do que literatura nacional, mas um didlogo com a literatura latino-americana, contra a dominaggo europeia ¢ norte- americana. Dessa mistura, surgiram experimentagdes que conferiram a Escrita diversidade de linguagens da literatura; promovia também. concursos edivul- 21 gava novos autores, N. Bahia, uma re- vista surge no mes- mo perfodo de Escri- ta; Codigo, langada em Salvador, é considerada por Camargo como uma das filtimas revistas na linha concretista. O préprio titulo da revista remontava ao poema visual homonimo de Augusto de Campos, e que era usada como logomarca_ da publicacao, Camargo mostra que esta liga¢ao foi mais que uma tendéncia estilistica ou homenagem: segundo pesquisa realizada por Eduard Marquardt (apud CAMARGO, 2008, p. 6), era o proprio Augusto de Campos que controlava, de ‘Sao Paulo, o direcionamento de Cédigo. Assim, tanto como espago concretista, promovia a "fusdo da alta cultura e da misica popular" (p. 6), através de diélogo com 0 tropicalismo, em seus 12 nameros publicados até o inicio da década de 90.18? i suiaen” a ntre 1985 e 1989, o pais comeca a respirar 93 democracia. O Presidente da Reptiblica, pela primeira vez, apds um longo periodo de governo militar, é um civil, José Sarney. © Brasil vive um momento ainda critico, de sucessivas crises, alta inflagao e fracassados planos econémicos. Destaca-se no campo cultural a criagio do Ministério da Cultura em 1985, apés um tempo prolongado de “ausén- cias” do Estado neste campo, como analisa Albino Rubim, em seu estudo Politicas Piblicas de Cultura no Brasil e na Bahia, de 2007. Entendia-se que 0 Brasil nao poderia pre- scindir de uma “politica nacional de cultura, condizente com ‘05 novos tempos e com o desenvolvimento ja alcangado pelo pais” segundo o Decreto que o originou; “mas, simultanea- mente, introduz um mecanismo que solapa em grande me- dida uma atuagao cultural mais consistente do Estado” que, como aponta o citado pesquisador, aconteceu quando “a Lei Sarney (Lei 7.505, de 02 de julho de 1986) e as subsequentes leis de incentivo cultura, através da isengao fiscal, retiram 0 poder de decisio do Estado e colocam a deliberagao nas mios da iniciativa privada, ainda que o recurso econémico usado seja majoritariamente publico”. Nesse tempo, Na Ba- hia, durante 0 Governo Waldir Pires, destaca-se a criagio tardia da Secretaria Estadual de Cultura, diferente do que aconteceu em outros Estados brasileiros. Mas Rubim (2007, p.5) aponta que os periodos que sucedem, apés 89, so tam- bém de muita instabilidade no campo cultural, a comegar com “o aff neoliberal de Collor [que] desmonta, como um barbaro, quase todas as instituigdes culturais do pais’, en- quanto que a Secretaria Estadual de Cultura é acoplada a0 setor de turismo, compondo a Secretaria de Cultura e Tur- ismo, no terceiro Governo de Anténio Carlos Magalhies. 24 rpanizagio niio governamental ¢ sem fins lucrativos, a Fundagiio oO: de Jorge Amado foi instituida por Decreto em 2 de julho de 1986 — data de aniversétio de Zélia Gattai -, em cetiménia no Palécio do Planalto, pelo Presidente da Reptiblica, José Samey. Na solenidade, como relata em seu livro de memérias, publicado em 1992, Navegagiio de Cabotagem, Jorge Amado, ao agradecer, disse: 6 6, ) esperar que a Casa ndo se transformasse num museu, fosse real- mente centro de cultura para o estudo da fiteratura baiana e do romance Brasileiro, trabalhiasse em conjunto com os outros organismos culturais, J» JZ Amado acrescenta que, sendo “apenas personagem?” na Casa, niio se deix- aria envolver em sua administragdo e nem no planejamento das tarefas; ao se referir 4 doagio, pelo escritor James Amado, da escultura de Exu, eriagio de Tati Moreno, colocou a Fundagio sob a protegio e os cuidados de Exu que, assim, em suas palavras, foi “entregue ao seu desvelo’ 25 otha da poetisa Myriam Fraga para a Diretoria Jpida por Jorge Amado com e Airecutiva da Casa foi recel satisiagdo, apesar de se invadir de remorsos ao pontuar que de mil dificuldades [e que] ela “vive amarrada as cadeias * costas essa tal de Fundagéo”. Essa combatente pemavel —niio ha quem possa duvidar ~ permaneee ate 2 da Fundagao e, certamente, se ainda estivesse dizendo mais ou menos 0 que carrega na hoje a fient: vivo, Jorge Amado estaria disse na época Cc omove-se Jorge: Myriam hora delegare in potas de lazer e fins de se jimns no Ihe sobra tempo ipeny is nada, em sua ita sansivel para evar avante Aula © cir condigdes taaliter atura e a arte na aia. Ble diz que Zetia Galt sua esposa, nem se Mn estar certa que Tait © faz com praze, eit 4: poeta é combat ne. #5 eificuldades no a fam, 20 contritio, a seduzem” 26 propdsito funda- mental da Fundagio Casa de Jorge Amado, de preservar 0 rico e in- estimavel acervo dese grande romancista, ¢ alta- mente sedutor, a comegar pela histéria em torno do surgimento da Funda- aio em que Jorge Amado acusa Zélia Gattai de ser a responsavel pela existén- cia da Casa. Isso porque, quando ele comegou a se desfazer do acervo, pri- . meito doando para qrisme e forte 2 to bibliotecas publicas F ireias Zéla, a quem no Brasil ¢, depois, Joye confessa, eM a“ a Academia de Le- Jyemnérias: “aprendi tras da Bahia, passou jo adianta dis- oi Myriam Fraga, pot a ser assediado por gyjir com Zéli@®, FH ajtq de 1984, do propostas de universi- perco sempre, ‘anos antes da fundagao, dades americanas que 43 agora Mh TN forgo a neoessidade desejavam receber 0 i ae acevo em dovglo, 4 SNE de fin a Ei vo do e50 proposta era tentadora, ee da Fundagao vinha dariam a seu acervo o vendo articulada, desde merecido cuidado. Torge nif, pelo propio Jorge estava quase decidido a ‘Amado, como relata a pes- enttegar ao estrangeito, dora Goldstein em , sadora seriam documentos, corre- a satudo “O Brasil Best spondéneias, livros, fotos, Horde Jorge Amado”. de diplomas... Eis que Zélia ne 2003. Com 0 apoio do eS itor da Universidade Fed- eral da Bahia, Germano Tabacof, que mais tarde viria presidit a ermal oa tos que estay Berra Sosa no Rio Vermelho. Jorge: 9 9 ‘Amado conta que J@ na * hravia ugar por onde tle —o! car tantos livr' 2003) Esse acervo 86 sairé do Brasil, da Bahia, 27 as foi mesmo em 1987, no ano seguinte a sua ofi- cializagio, a 7 de margo, que a Casa, enfim, foi “ofi- cializada” & moda baiana: “mais de vinte mil pes- soas lotavam 0 Pelourinho na noite da inauguragaio”, relata Jorge Amado em Navegagio de Cabotagem. Foi uma grande festa na cidade, com a participagio de figuras politicas de peso como o Presidente da Republica, José Samey, os Ministros, da Cultura, Celso Furtado, e 0 da Comunicagio, Anténio Carlos Magalhiies, além do Governador do Estado, Joo Durval Cameito (Waldir Pires ainda no havia tomado posse). Uma festa sincrética, como niio poderia deixar de ser, com muita misica e religiosidade, sob as béngios da agua benta de Dom Timéteo a pomba branca do babalorixa Luiz da Mutigoca, juntamente com a presenga de Dori- val Caymi,, Gilberto Gil, Grande Otelo, Eutchenko e diversos axés eilés, maes e filhas-de-santo, que vieram para a celebragiio. ¢ ¢ Sob a grande placa das trds racas que se misturaram, os indios, os negros ¢ os Grancos, arte de Carybé, erguido diante da Casa, Exu preside 0 destino da Fundacao, ali foi plantado o fundamento na noite de inauguracdo. 9 9 (Giecho extraido de Navegagio de Cabotagem, 2008) 28 Exu, desenho de Carybé, conselheiro da Fundagio, é 0 simbolo da Casa, Oo a pedido de Jorge Amado. Conta Myriam Fraga que, mesmo an- tes da fundagiio, a maior preocupagiio dele, dentre tantas coisas urgentes a serem feitas, era assentar logo o Exu, a escultura em ferro de autoria de Tati Moreno que fora presenteada por James Amado ¢ (4 ~ Manda assentaro Eu. Ele dari seguranca d Casa. O povo respeita 0 Exu e winguém ousaré fazer mal contra a Fundacito. Fala logo com Carybé e combina com Stela 9 9 (Grech extraida do site da Fundayio Casa de Jorge Amado) arybé, conselheiro da Fundacao, se encartegou de combinar com a Yalorixa Stela de Oxossi, o dia ¢ a hora mais propicia para assen- tar, o mais discretamente possivel, 0 Exu na encnuwzilhada da Ladeira do Pelourinho, ‘ascia, entio, na porta da Casa. Exu Funda- &, para Jorge, dentre go Casa de Jorge tantas qualidades, p Amado em um mo- © “orixa em movi- mento privilegiado, mento, amigo de % quando tudo _parecia um bafafa, de uma : confluir para uma nova confustio, mas, realidade cultural, onde 0 no fundo, ex- modelo de integragao pro- celente pessoa” posto pela obra de Jorge Amado ganhava o mundo, impulsionado pelas brisas de otimismo que agitavam 0 chamado Centro Histori- co. (Revista Exu Entrevistas, 2008) Pelourinho, antes um lugar abandonado & marginalizaglo © a prostituigao junto a ‘smonumentos & casarées em uinas, enfao re- conhecido peka UNESCO como ppatriménio da Tmmanidade, vivia um momento otimista, com) propostas de revitalizagaio que visavan {rans formar a area em wn grande complexe huristico cultural. A vontade de Jorge Amado em no transformar a Casa elf UN THUSeX mas sim, um centro de cultura vivo © “atuante, estava em sintoriia COM 9 futuro ‘préspero do Centro Historico ide Salvador. A Fundagio Casa de Jorge vAmado, num belo easardo azul é, pois, a pedra fundamental da refor- ‘ma do Pelourinho, come bem Tembra a pesquisadora Goldstein (2003). ‘Umna Casa de prestigio, por ‘onde, em suas portas, numa transcendéncia entre o real e oimaginarlo, ja passaram ymttitos personagens de Jorge. Bs nobre tarefa da Fundagiio: nfo 86 preservar 0 ee ae ele deixou, mas de ser, também, um local ces ne le estudos sobre a arte e a literatura baianas, pe ago de encontros culturais. “Se for de paz, ode 1” € o lema da Casa que Myriam Fraga define a un lugar ne em que tudo ac . acontece, em que todos se encontram le que é] atenta a todas 9 as manifestagées culturais, aberta aos ventos di os dit C C convivéncia, encrucilfada de destinos diversos, confluéncia de contrdénos que se unem mu fim Me ima Bahia mistica e profana. (echo eta (echo exe do sit da Funagho Cas de Jonge Amada) é 2! »"DpD iante de tantos dé s desafi ve teece jos que a Casa encontrava — e ainda isso as que é uma doce aventura!) — Myriam Fi —_— B 1am Fraga e Ch jaudius Portugal — que também fazi: ae ‘a parte da Fundagiio -, acompanhados d to Vellame e Eduardo Athayde. —_ apresentaram a J jorge Amado essa ssa tal de revista E 3u. Eis o que relata nosso Jorge Amad ado em Nave; 2a < gio de Cabotagem © cuand meansacon op ee ee tem polo futuro do orgarismo a revista hove patrimdnio, ser arauto da sulitrata engano tamanfo, & ee revista é uma beleza e ndo custa ‘um centavo aos cofres magérrimos que Mynant admanistra. (trecho extraido de Navegacdo de case 2003) Mis nao A gemorou muito, come disse My der praga em s10ssa enteVst PO wa ganar vida props, 98 (ONT do qutossustentavel, sem jnterferit nos demais projetos da Fundagao, A revista, recebia 0 incentivo fiscal ve Lei Samey e se mantnina com ecurses PrOpHi0s, CHUNGES, sobre- cgposta pata o titulo da revista par fi dela propsia, Mytia Fraga. que alata «que howe cexte momento de hesitagao por conta da forga do ‘nome, mas que 1og0 ro restavant vravidas de que 80 podetia St esse mesmo. Afinal, Exu, ‘orixa do Mov- imento ¢ da comunicagao, © senhor Mos caminthes, © mensageito» fora também o escalhido por Jorge: Ama- do pata set o simbolo da Fundagao, aquele ave, certamente, encurtaria as distancias ¢ abriria 0s caminhos as letras € @ cultura baianas. Ci omsideradoproditodepontapet Casa, a sua porta-Vo2 Exu iniciow eu trabalho no mesmo 270 dainav- gguragio, a0 final de 1987. Segundo conta Myriam Frage (entrevista), @ expectativa em tomo da revista era grande entre 05 @ditoFes © opiblico em geral, “ave viamna inicialva ‘ama oportunidade d& veicular literatura, Ti : as artes e a cultura ivemos alguns contratempos de 0 ae A nepers om eal dicendo gue essoas que escreveram Cassio foi imediat®. porque isso era ‘atin era nome de revista (..) er propésito um nome desses, ainda mais me que aqui as pessoas associam 0 Exu ao dic u ao diabo. (Clandius Portugal, entrevista) ‘4 diria Jorge Amado que o Exu, “de certa maneira ¢ 0 Nao onde s6 existe o Sim”. sim, Ext 1 era € no era ao mesmo tempo uma revista literaria; era um sineretismo de lingua- gens, diga-se do poder dessa revista, Exu era muito mais que uma publicagao literaria, uma publicago de cultwa, uma revista inde- pendente ¢ moderna, ancorada no estudo ¢ na divulgagao da obra de Jorge Amado. Reportagens, entrevistas, ensaios, artigos, contos e poemas de autores brasileiros e de todas as partes do mundo, tex- tos de Jorge Amado nio registrados em livros, artes plasticas e ilus- tragGes fazem parte dessa _publicagio de multiplos géneros e estilos 31 Arte: Exu, Cajila Cad, 2011 * Feito especialmente para ese TCC 32 rinta © seis ntimeros em 10 anos. Entre sua primeira ed- ig@o, do bimestre novembro/dezembro de 1987 e sua tiltima, do trimestre julho! agosto/setembro de 1997, com algumas excepdes, Ex conseguitt seguir uma pe- riodicidade regular, entre trés e quatro imeros por ano ¢ uma estrutura que pouco se alterou. Sua periodic dade era bimestral e assim seguiy do primeiro até 0 mimero 33, de maiofjunho de 1993, quando are~ vista parecia que chegava ao finn. ‘ouve dois momentos, ros, porém denota- dores de que algo nao estava indo muito bem, quando a revista teve dois mimeros que se fundiram. Foram as revistas 16/17, de jul- hofagosto/setembrovoutubro de 1990 € depois as revistas 31/32 de janeiro/margo/abril de 1993. jonta-nos Myriam Fraga (entrevista) ‘que quando Jorge Amado soube | que dois nimeros haviam saido | ‘numa mesma revista, ele pronta- mente entendeu que ela ja estava perto do fim. Jorge Amado estava certo: a revista teve apenas mais lum niimero, o 33, de maia/junho de 1993, entyando num longo periodo de hibemagao, até 1997, ‘quando ressurge com uma perio. spiro derra- deiro. Foram as de mimeros 34, de janeiro‘fevereiro/margo, 35, de abril/maio/junho e, a ultima, 36, de julho/agosto/setembro, ua tiragem era de 3.000 exemplares Houve apenas uma edicao que sait com 5,000, mas no deu muito cer- to, como nos revelou Myriam Fraga em entrevista, Havia ainda o problema da distribuigao, nao era vendida em b cas de revistas, mas, sim, distribuida gratuitamente, por mala direta a agentes formadores de opiniio, entre escritores, jornalistas, instituigdes culturais € cen- tros de educagdo, bem como ao publico em geral. Uma plateia até certo ponto exigente e critica; a linha editorial grd- fica era mantida sempre mum padrao de ‘qualidade muito bem recebido por onde circulava, em varios lugares do pais, objetivo era circular a revista para 0 ‘maior niimero possivel, tanto de pessoas, ‘quanto de lugares. Arte: Ex, Fatima Tose, 1989 * Cedido especialmente para este TCC Ela tina uma distribuicao muito boa, porque elaiapara 0 munde intero; porque todes os fagares que tinhiam tradutores de Jorge, 05 tradutores eram nossos cor respondentes; ¢ em todos os lugares que tinhiam o portugués sendo ensinado, a vista ia, (Cfaudis Portugal, entrevista) Coordenagio Editorial da Exu era formada por Claudius Portugal; a arte era assunto de Avrinnbetotellame:a Redagao por Simone Ribeiro; e o Conselho Editorial, formado por lum grupo de intelectuais de peso: Myriam Fraga, Antonio Risério, Femando da Rocha Peres, Florisvaldo Matos, James Amado, Ildasio Tavares, Evelina Hoisel, Jacques Salah, Jodo Jorge Amado, José Carlos Capinan, Wilson Lins. Mas Myriam Fraga conta (entrevista) que essas funges nao eram rigidamente cumpridas dada a amizade que havia no grupo. “Nao tinha aquela coisa: “eu sou iss0”, todo mundo fazia um pouco, era quase que uma cooperativa” diz. eus correspondentes, brasileiros, eram muitos; entre ilustres, amigos e conhecidos de Jorge Amado, vale a pena cita-los. De Séo Paulo: Adelmir da Cunha Miranda, Haroldo de ‘Campos, José Paulo Paes, Jerusa Pires Ferreira, Boris Schnaiderman, Amaldo Antunes € Ri- cardo Ramos: do Rio de Janeiro: Afianio Coutinho, Sénia Coutinho: Anténio Torres, Eduardo Portela,Femando Sabino, Mario da Silva Brito, Rubem Braga e Bella Jozef: de Brasilia: Luis ‘Turiba e Paloma Amado Costa: do Rio Grande do Sul: Antonio Holhefeldt, Armindo Trev- isan, Moacyr Scliar, Danilo Ucha e Nadia Gotlieb; Além de: Oswaldo Franca Junior (Minas Gerais), Jodo de Jesus Paes Loureiro (Para), Marcus Acyolli Pemambuco), Sérgio de Castro Pinto (Paraiba), Janaina Amado ¢ Haydée Jofri Barroso (Gots) tre os correspondentes intemacionais, so varios os paises; Argentina: José Maria Paolantino; Venezuela: Isabel Allende; Colémbia: Gustavo Bustamonte; México: Miguel Bustos Cerecedo; Estados Unidos: Gregory Rabassa, John Dwyer, Nancy Baden, Rich- ard O’Connor e Tomas Colchie; Franca: Alice Rayard, Francis Combes, Jean Oreechioni ¢ René Depestre; Itilia: Dario Puccini ¢ Luciana Stegano Pichia; Portugal: Alvaro Sak ma, Fernando de Assis Pacheco, José Carlos de Vasconcelos, Luiz Forjaz Trigueiros, Fran- cisco Lyon de Castro e Nuno Lima de Carvalho; Espanha: Xela Arias; Inglaterra: Antonio Olinto; Bulgaria: Theodor Popoff, da ex-Tchecoslovaquia: Pavia Lidmilova; Grécia: Kos- tas Assimacopoulas, da ex-URSS: Jorge Kaluguim e Vera Kuteichicova; Cabo Verde: Jorge Alfama; Angola: Luandino Vieira, Mogambique: Rui Nogar; e, Japdo: Osamu Kumasiro, 33 34 decisio quanto ao fim desse bom ro- mance nao foi facil. Pensavam, na ‘undagio, que seria apenas uma pau- sa para repensar as possibilidades, refazer as propostas e preparar o retorno da publicagio Mas Myriam Fraga, reflexivamente, entendia que, mesmo se voltasse, alguma coisa ficaria perdida no caminho, assim como a inoeéncia de que tudo era possivel... Exu era, assim, uma “adolescente romantica” como Myriam (Revista Exu Ent- revista, 2008, editorial), e para contintar no caminho precisar- ia crescer e se tornar adulta. O carater “artesanal” da revista pre- cisava se profissionalizar. As dificul- dades da época tomaram as coisas dificeis para a Fundagio. O crescimento da Casa a multiplicago de suas atividades, além da busca constante de recursos, tor- naram impossivel a continuidade do projeto. A edigiio de cada nimero era sempre uma grande aventura. A revista teve um fim, mas os caminhos continuam —abertos. Arte: Ess, Felipe Nanni, 2011 * Feito especiaimente para este TCC ENCRUZILHADAS TEXTUAIS 35 CXU “As linguagens sdéo muitas. Desde a revolucdo industrial e, mais recentemente, a revolucado eletrénica, seguida da revolucdéo informatica e digital, o poder multiplicador e o efeito pro- liferativo das linguagens estaéo se ampliando enormemente.” (SANTAELLA, 2001. p. 28) encr uzil hadas t ext uals As linguagens se reelaboram continuamente, nao apenas na medida em que um novo vei- culo de transmissao é inventado, mas também através do “casamento” entre os meios de comu- nicagao. O universo midiatico esta totalmente permeado por hibridizagdes de meios, cddigos e sistemas signicos, que atuam como propul- sores para novos florescimentos das linguagens. 36 a L cia Santaella, em seu livro Matrizes da Linguagem @ Pensamento: Sonora Visual Verbal (2001), aborda a questo da hibridizagao, ao tempo em que divide e classi- fica as linguagens da seguinte maneir poesia essa classificagao, Santaella deixa claro que as lin— guagens n&o sao puras. Sua corporificacdo depende de entrecruzamentos que acontecem na raiz de sua formagaéo _enquanto expressao, acolhendo - e, muitas vezes, escond- “sendo - tragos que sao originalmente principios de outras linguagens. Isso porque tais principios, regentes das ma— trizes das linguagens ~ 0 acaso do instante sonoroi a cor— poreidade da forma da visualidade: a convengao do discur— so verbal ~ podem nao ser concebidos somente nas formas representativas convencionais: do mesmo modo, uma lin— guagem nao é regida somente pelos principios da matriz que convencionalmente a constitui. Afirma a autora que “a légica da matriz verbal nao quer necessariamente signifi~ car que a linguagem tem de estar manifesta em palavras isto nao quer dizer que a logica verbal nao possa se reali- zar em signos visuais ou sonoros.” (SANTAELLA, 2001, p. 373). ritmica sonora da disposicao do material nas paginas AE a discursividade das imagens de esculturas e foto— grafias s4o alguns dos momentos hibridos, de entrecruza— mento de submodalidades das linguagens que encontramos em analise da revista Exu, Assim como toda linguagem esta ligada a percepgao, os meios hibridos, porque misturam duas ou mais linguagens, acabam também por estimular ou promover mudangas na posicao relativa dos sentidos. ara McLuhan (citado por LUZ, 2009, p. 4), o hibrido éo Pree de dois meios, que constitui um momento de verdade e revelacao, do qual nasce a forma nova. “O mo- mento de encontro dos meios ¢ um momento de liberdade e liberacao do entorpecimento e do transe que eles im- pOem aos nossos sentidos” (LUZ, 2009, p. 4). A partir de uma linha editorial livre, a revista Exu congrega linguagens e articula signos aparentemente opostos, produzindo uma estética singular, rompendo fronteiras e trazendo para a literatura o lidico e o visual. Esse jogo intertextual, que existe entre um texto e outro, e a pluralidade de sentidos evocados através das representacées potticas e pictori- cas dialogam com a leitura do texto artistico. M yam Fraga pontua no primeiro niimero da Exu que “a inten¢ao maior é abrir canais de ae e man , ter os caminhos abertos” (1987.21). é userido) na Obra Aberta de Umberto Eco (2008). cotio one de lin) guagens artisticas diversas, entengamos, com Eco, obra de arte é uma mensagem fundamentalms uma pluralidade de significados que convivem num 56 nificante.” (2008, p. 22). 0 autor entéiide por “obra” o ob: que € dotado de propriedades aaa is definidas 37 38 que permite a coordenacao e o revezamento das interpre— tagoes e o deslocar~se das perspectivas. “Uma obra de arte acabada e fechada ¢ também aberta, pas— sivel de diferentes interpretacées, em cada fruicdo a obra revive dentro de uma perspectiva original.” (2005, p.49). ase estimulo nao é exclusivo da literatura e surge Been de diversos textos interligados, provenien— tes da abertura da obra, e que é fisgado pela sensibilidade do leitor, ocasionando a experiéncia estética. Eco observa que somente a partir do reconhecimento de varias vozes acontece a comunicagao na obra. ada fruidor traz uma Crease existencial concreta, uma sensibilidade particularmente condicio— nada, uma determinada cul- tura, gostos, tendéncias, preconceitos pessoais, de modo que a compreensdo da forma originaria se verifi- ca segundo uma determinada perspectiva individual. (p. X) urante a década de 60, na Dinan. de Costan- ga, Alemanha, o estudo da teoria da recepcdo, embasado no pensamento de Hans Robert Jauss, defende a soberania do leitor na recepcao. 0 autor afirma que qualquer obra de arte s0 sera recriada quando o leitor a legitimar como tal e que é imprescindivel esse olhar do publico leitor. Para Jauss, a experiéncia estética possui um elemento cogni- tivo que requer a neceasidade de compreensdo do que é lido para, consequentemente, 21 como ea apreciar~se 0 texto. eovasTa 8 8 EMLTA M auss acredita que uma obra J 86 alcanga 0 significado de obra-prima quando nos re— conhecemos nela, aceitando os modismos e as condicoes historicas da época, A constatagao de que o modo de ler varia ao longo dos tempos e de que a obra é lida porque @ compreendida, define sua permanéncia devido a recep— gao de um publico que continua fiel aos valores imutaveis nela contidos, Através da teoria da estética da recepgao, pode~se identificar porque algumas obras sao atemporais e confirmam seu sucesso durante décadas, enquanto outras sao facilmente rejeitadas. econ- Riven ° valor do leitor, a revista Exu reune tex- tos oriundos de varias lingua gens artisticas que sugerem novas teorias, novos afetos, abrindo espaco para a formacao de leitores criticos. Ob- serva-se que na escolha dos textos pictoricos da revista, a palavra recebe textura, sai da temporalidade e habita o 39 40 espaco, A palavra ganha a materialidade concreta da arte grafica. “... a letra tinha que ser diferente, tudo tinha que ser diferente, era uma brincadeira criativa, experimenta- mos muito.” (Myriam Fraga, entrevista). Sv @ hibridizacao das linguagens presentes na re- vista Exu, Myriam afirma que foi intencional desde o inicio, mas pontua que, apesar de achar interessante isso que chama de uma “irreveréncia” no uso do papel, existe ainda, para ela, a problematica de que a imagem tende a === 4 ‘ scat agus ape absorver a aten¢ao, 0 que, por vezes, pode deixar xiniutim sjenas i texto em segundo plano. Como poeta, ser de pa— Sitciazaitabs nan lavra que é, Myriam confessa a preocupacdo que mvnsriiturmisnan tices ts udatronn re Be tinha para que a tipologia fosse sempre bem mrrvuimaiam mune erm che oom ane ea ee inSaael Sinccgenemepoee tones ce clara, mas declara que a brincadeira grafica ej owejwmmny sna a forma lidica que a hibridizacao permitiu @ Exu sao fantasticas, Seen tnre ress ro mes e imagem se friccionam em Exu, As il WaPacrke Hmeanasiar Sore ane weeat ‘ 4 i Seen ustragOes entre os textos ndo se constituem, wm nammasmuernicts eee como diz Casa Nova (2008), em simples comentarios “m= Sires | meee sobre eles. Quando o textual se intercruza como nao tex- serene tual (ou pictorico), a ilustracao, pintura ou fotografia nao é meramente aleatoria. Ha uma intencionalidade e tais es— colhas se ancoram no texto literarioi é ele quem nomeia, “num processo de atividade mimética [em que] o ilus~ trador tenta repetir as de- scrigdes que o escritor faz em seu texto” (p. 25). s friccées entre as artes descaracterizam, em Doro a Exu enquanto uma publicacdo unicamente do império do textual - como #40, comumente, as publica- goes literarias. Exu é uma revista hibrida, de diferentes linguagens que se intercruzam e dialogam. XK imagens evocadas designam referentes verbais ou nao verbais, as quais se constituem ressonancias do texto literdrio, num dialogo constante entre texto e ima— gens, As imagens trazidas pela fotografia, pelos figurinos, charges, os selos dos correios, a caricatura, o inicio dos quadrinhos, o cartaz comercial, os livros ilus~ trados, as estampas, o cartao postal etc. apon— tam para grandes rupturas de linguagem. (CASA NOVA, 2008, p. 28) ‘ma imagem vale mais que mil palavras, Uma imagem tem o poder de sintetizar o que foi dito, o que foi escrito, mas pode limitar anossa imagina- do. Casa Nova (p.40) traz Flau- bert (citado por Jurt), que diz: “uma mulher desenhada parece com uma mulher e ponto final. (...) Ao passo que uma mulher por escrito permite sonhar com mil mulheres”, A ilustra— Gao enfeita o texto, traduz ou com- plementa o que foi escrito, E nesse “complementar” ou nessa “traducao” que 0 nao verbal dialoga com o verbal, criando uma ex~ periéncia diferente pela diversidade. Ha uma troca entre imagem e texto: o texto empresta a imagem algo de sua es— 41 42 séncia, ao tempo em que a imagem reforca a ideia contida no texto, traduzindo, ou se desvirtuando completamente, como um contraponto, um outro texto, Nos entrecruza— mentos entre imagens e textos, as suas singularidades sao preservadas, mesmo atravessando outros suportes (CASA NOVA, 2008, p. 59). xu tem, pelo menos, dois tipos de imagens, Uma imagem E que é lida (textual/verbal) e que, portanto pede para ser compreendidai e outra nao verbal, bidimensional (foto, pintura, desenho), mais ou menos andloga a coisa repre— sentada, e que pede para ser reconhecida. A imagem que é produzi- da pelo texto literario tenta surpreender a imagem vista através da palavra, conforme Casa Nova (p. 61), num dialogo entre traco e letra, numa encruzil- hada de codigos iconi- cos e retéricos. Res— sonancia de signos e artes, “uma espécie de radiacao onde a diferenca advém da sensibilidade do olho que olha, que vé” (p. 65), numa agaéo de aproximagao e didlogo entre os textos que repercute em novos desdobramentos, “o encontro, a aproximagao, o didlogo ou a friccdo de textos realcam as intercessdes, ou seja, os processos de criacao.” (BLANCHOT citado por CASA NOVA, 2008, p. 112) fotografia confere a Exu novas possibilidades no en— Aone de linguagens. Casa Nova (2008, p. 70) diz que para os modernistas, a fotografia apresentava-se como forma de descricao literaria. A leitura de uma foto— grafia “introduz a descontinuidade na continuidade, fa- zendo do termo um sistema de diferencas [em que] ler seria unir o que esta separado e separar o que esta unido”, (OR- TEL citado por CASA NOVA, 2008, p, 106), Quando, na edicaéo de numero 28, a Exu se transforma num album fotografico, nao deixa de ser uma publicagao literaria, haja vista que uma historia ¢ contada, de maneira preponderantemente nao verbal: embora a legenda complemente a informagao, a imagem por si s6, ja diz muito. 66rpyoda arte € ee forma de literatura, porque toda a arte é dizer qualquer coisa”, Assim escreveu Fernando Pessoa (citado por Casa Nova, 2008, p. 87). Visualizando a revista Exu, em que a arte esta semeada por todas as paginas. percebemos uma publicacgao literaria em que todas as formas de dialogos sao possiveis, gragas ao trabalho de diagramagao. 43 44 exto e imagem passam por novos processos engen- drados pelas novas tecnologias, novas midias, mas ha que se considerar ainda essa ligacdo. As possiblidades da computagao grafica que sao desenvolvidas, hoje, permitem que letra e imagem adquiram potencialidades até entéo limitadas”. (CASA NOVA, 2008, p. 80). 8 tipos graficos, em EXU, estao sempre em mutacao, 0:. obedecem a nenhuma regra especifica, apenas, ao que nos diz Myriam: a experimentacao, Se der certo, e isso tem haver com a percep¢ao estética dos editores da re- vista, entao esta aprovado. As brincadeiras sao diver— sas, a diagramagao é livre, a unica regra parece que ¢ ser agradavel visualmente. “L...] a leitura grafica é uma coisa especifica e indepen— dente da leitura semantica. A leitura semantica tem uma continuidade, ela é linear, ela é ordinal, ao passo que a leitura grafica é vertical, ela é emblematica num todo, (DIAS PIMO citado por CASA NOVA, 2008, p. 158) RECORTE E COLA 45 Recorte ¢ colager si. ceasing Reco sagem sio as experiéns Acesso em: 14 de novembro de 2011. CAMPOS, Haroldo de. Depoimentos de Oficina. Sao Paulo: UNIMARCO Editora, 2002. CARDOSO FILHO, Jorge Luis Cunha. 40 anos de estética da recepgio: pesquisas e desdobramentos no ‘meio de comunicacdo. In: Revista Didlogos Possiveis ~ Faculdade Social da Bahia. Ano 6, n. 2, jul-dez, 2007. Disponivel em: . Acesso em 14 de novembro de 2011 FIGURELLI, Roberto. Hans Robert Jauss ea estética da recepeao. Revista Letras. Curitiba (UFPR), v 37, p. 265-285, 1988. GLISSANT, Edouard. Introdugao a uma poética da diversidade. Juiz de Fora: Editora da UFJ, 2005. GOLDSTEIN, Ilana Seltzer. A Fudagdo Casa de Jorge Amado, guardada por Exu. In: O Brasil Best Seller de Jorge Amado. 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Orixa do movimento e da comunicagao, entidade impont speitada, 0 guardiao de todos os caminhos e, “no funde celente pessoa” como escreveu Jorge Amado: sao para as homenagens das capas da revista que leva seu noi 9) forte nome como bem lembrado por Myriam Fraga, em « As trés primeiras capas levam até leitor a arte do artista Carybé - 0 simbolo da F de Jorge Amado. Eram capas simples, Conta-nos Myriam Fraga (entrevista), a) manter essa primeira arte em todas as edigdes seguintes, apenas alterando a cc primeira edigao, de novembro/dezembro de 1987 tras o Exu sob um fundo vermel de janeiro/fevereiro de 1988, os varios Exus de Carybé, sob um fundo preto e at em um fundo de nuve Mas essa ideia de manter o mesmo Exu na capa se transformou, e na quarta edica Carybé abre caminho para outros artistas (com excegao da edigdo especial n° 28, c julho/agosto de 1992 que traz o seu Exu sob um fundo, em tons vermelhos, da fachac da Casa, fotografia de José Carlos Almeida); Eis que surge uma das ideias mais lindz € marcantes da revista, as capas, que ganham a forga expressiva e altamente signif cante com as mais variadas tradugdes do Orixd, criadas por diversos artistas: Emanuel Araujo; Manu; Agnal- Gada artista era convidado para do dos Santos; Jamison Pedra; _retratar o Exu, Sao pinturas e Sérgio Robinovitz; Humberto —_esculturas, de variados taman- __—Cada arte er: Velame; Calazans Neto; Cesér hos e formas, que provocam depois editac Romero; Bel Borda; Jader Re- encantamento por sua beleza par a capa di sende; Maria Adari; Regina criatividade e que hoje fazem _iam nos con Costa; Sante Scaldaferri; Flo- parte do acervo da Fundacao _—_dentre todas riano Teixeira; Juracy Dorea; Casa de Jorge Amado. da Casa, pre Lula Queiroz; Rubem Valen- uma grande ' tim; Leonel Mattos; Chico Lib~ esses quadrc erato; Ramiro Bernabo; Valuizo; — ) Gals (Calazans Neto) resolve doar que hoje se Palito; Justino Maranhao; Ron- para a Casa a obra, dai em diante todo ar -—«acervo da F aldo Martins; Francisco Santos; __ tista passou a doar para a Casa a capa da de Jorge An Mario Cravo; Edson Calmon; revista quanto iss Caetano Dias; Murilo; e Mar- (Cievdus Portgss enteviss) -@contece, cia Abreu. Exu domina todas as verso deste edigées, até a tiltima. as capas da ante e re- uma ex- ele todas me, o seu antrevista. undagao Casa ye a ideia era or de fundo. A ho; a segunda, erceira, o Exu ins, todo azul. io le la Is = a fotografada e fa para estam- a revista, Myr- ta que um dia, + as demandas stende realizar 2xposigao com ds e esculturas encontram no undagao Casa aado. Mas en- > ainda nao dispomos, ao encarte, todas revista Exu, Mee importante relatar aqui, que na revista Exu, este mesmo en- carte onde trazemos as capas, era presente em todas as edigdes, do primeiro ao tltimo numero. O encarte se tratava de um poster em policro— mia e papel diferenciado das demais paginas da revista, Trazia sempre uma arte ~ pinturas, fotografias, es~ culturas, serigrafias... E no verso, um perfil do artista e um texto, com pala— vras muito bem elaboradas, escritas por Claudius Portugal. As excegdes com relagao a esse poster foram as edigdes 18, que falava sobre a propria Fundagao Casa de Jorge Amado e a edig&o especial n° 28 que nao teve encarte, pois tratava de uma edicao especial em comemoragao ao an- iversario de Jorge Amado, contendo apenas fotos. Tree A primeira edigdo trowxe no encarte uma mogo- tipia de Calazans Ni Nos outros ntimet tivemos: Pintura de riano Teixeira (2); pinty- ra de Carybé (3); Jen Augusto (4); foto da e8— cultura de Mario Cravo Filho (5); pintura de Car- los Bastos (6); Litograma de Emanuel Araujo ( pintura de Juarez Para iso (8); pintura de Ly- gia Sampaio (9); pintura em encaustica de Sante Scaldaferri (10); pintura de Mirabeau Sampaio (11); pintura de Rubem Valentim (12); serigra— vura de Jamison Pedra (13); foto da escultura de Tati Moreno (14); pintura de Fernando Coelho (15); bico de pena de Angelo Roberto (16/17); desen— ho de Sérgio Rabinovitz (19); pintura de Vauluizo Bezerra (20); pintura de Maria Adair (21); pintura de Jadir Freire (22): pin— tura de Cesar Romero (23); foto de esculturas de Bel Borba (24); pin- tura de Jader Resende (25); pintura de Lula Queiroz (26); relevo de Chico Liberato (27); pintura de Murilo (28); pintura de Justino Ma~ ranho (30); foto de es~ cultura de Washington Santana (31/32); foto de escultura de Juracy Dérea (33); pintura de Siron Franco (34); pin— tura de Mestre Didi (3! pintura de Celuque (36).

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