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Discente: Antônia Fernanda Lima de Araújo

O documentário “Nós que aqui estamos, por vós esperamos”, de Marcelo Masagão,
cujo título faz referência à escritura da entrada do cemitério de Paraibuna, cidade do
interior paulista, narra o que o diretor denomina de “memória do breve século XX”, ou
seja, conta os acontecimentos próprios do século XX, intercalando, num jogo de
imagens, sons e efeitos, as histórias de sujeitos que viveram nesse período para traçar a
narrativa histórica. Esse intrigante nome, assim como traduz com sagacidade o enfoque
da obra, também anuncia que o destino de todos, havendo ou não guerra, é a morte.
Em pouco mais de uma hora, Marcelo Masagão apresenta pequenas e grandes histórias
de pessoas comuns, que tiveram suas existências atravessadas por acontecimentos de
grandes proporções, como as duas grandes guerras, de modo que esses acontecimentos
ajudaram a definir os rumos de suas vidas, por vezes, pondo fim a elas. À medida que a
trama se constrói, a imagem de um cemitério surge e toma forma, remetendo-o aos
sujeitos que nele se encontram silenciados, por vezes atribuindo nomes próprios às
lápides, no esforço de evidenciar que ali não jaz apenas corpos sem vidas, mas sujeitos
diversos e únicos que tiveram suas vidas interrompidas, muitas vezes, pelas guerras.
Assim, a obra se desenvolve construindo uma teia de histórias de diversos sujeitos que,
embora tenham tido suas trajetórias e memórias ofuscadas pelas estatísticas das guerras
ou por qualquer outro quantitativo, eram constituídos de subjetividades e identidades
próprias, bem como protagonizavam os íntimos acontecimentos de suas vidas mesmo
inseridos em cenários adversos, como os de guerra. Para além de números ou bigodes,
eram pessoas que ousavam casar em meio à guerra, capazes de batalhar pela
sobrevivência num lugar como Serra Pelada, que exibiam em seus currículos
habilidades como a de assassinar três professores de Matemática, que faziam bolinhos
de arroz como mais ninguém ou que curtiam o som de Elvis Presley, cheias de gostos,
religiosidades, afetos e modos de existir variados, cada qual com sua subjetividade
singular construída em suas vivências históricas, políticas e sociais. Isto é, a obra
reporta uma humanidade que fez muito mais do que promover as maiores carnificinas
da história, apesar de seu legado seguir profundamente marcado por elas.
Por fim, percebe-se que a concepção do autor de que na guerra há o cruzamento de
diversas histórias individuais, seja de pessoas comuns, quase anônimas, ou de grandes
cientistas e pensadores, leva o telespectador a refletir sobre o quão danoso é o conflito
armado para quem o trava, já que seus efeitos incidem principalmente sobre os que dele
participam - muitas vezes matando-os e apagando suas histórias ou lhes separando
daqueles que amam.

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