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Importaaante - Gastos Por Alunos e Salários
Importaaante - Gastos Por Alunos e Salários
Relatório Geral
Financiador: CNPq
Salvador, Bahia
Dezembro de 2003
COORDENADOR
PESQUISADORES
Apesar do consenso de que o sistema vigente é falho, a pesquisa empírica sobre o assunto
permanece escassa. Dados sobre a distribuição e a utilização dos recursos financeiros para a
educação, além de serem difíceis de obter, quando estão disponíveis freqüentemente são
desatualizados, incompletos e pouco confiáveis. Isto ocorre em todos os segmentos do
sistema educacional, especialmente no caso de estados e municípios, onde os pesquisadores
são obrigados a confiar em dados fragmentados, coletados em diversas fontes e com pouca
consistência interna. Por causa destes problemas, análises sobre o financiamento da
educação no Brasil têm sido difíceis de realizar e, assim, são raramente efetuadas com a
devida sofisticação.
A pesquisa aqui apresentada foi iniciada em 1991 com o intento de enfrentar esses
problemas de obtenção e de análise de informações, levantando dados financeiros
referentes às três redes de ensino do estado da Bahia (a estadual, a municipal e a particular),
de maneira que nos permite examinar as tendências das receitas e despesas em cada rede e
explicar as variações observadas no que diz respeito ao compromisso de financiar a
educação básica. Como resultado das fases já concluídas da investigação, construímos três
bancos informatizados de dados, tratando, respectivamente, da rede municipal (referentes
aos anos 1990, 1993, 1996 - 1998), da rede estadual (referentes aos anos 1991-1998) e da
rede particular (referentes aos anos 1995 e 1998). Além disso, realizamos estudos de caso
em quatro municípios baianos, cada um representando um comportamento financeiro
distinto, buscando compreender melhor, através de dados qualitativos, as tendências
destacadas por nossas análise quantitativas.
Neste sentido, é importante enfatizar que, desde o início desta pesquisa, nossa preocupação
primordial não tem sido com a construção dos bancos em si, mas, sim, com a análise
sistemática dos dados armazenados. Nosso intento é examinar as tendências das receitas e
das despesas educacionais em cada uma das redes de ensino (municipal, estadual e
particular), tanto de forma quantitativa como qualitativa. Mais especificamente, nosso foco
principal tem sido e continuará sendo a identificação dos determinantes do
comprometimento financeiro com a educação básica, com ênfase no ensino fundamental. A
identificação desses determinantes tem sido feita estatisticamente, por meio de um modelo
de regressão que mensura o comprometimento financeiro de três modos distintos e que
inclui como variáveis independentes uma série de fatores sociais e econômicos (para
detalhes, ver Verhine & Plank, 1996). Conforme mencionado acima, iniciamos, no período
1998-1999, uma segunda estratégia, buscando melhor compreender a questão do
comprometimento financeiro através de análises qualitativas de dados oriundos de estudos
de caso.
A partir de agosto de 2000, a pesquisa entrou numa nova fase, sendo aprovada pelo CNPq
para um período de três anos e contemplada com uma Bolsa de Pesquisa (nível 1B). Na
presente fase, buscou-se atualizar e ampliar os bancos já existentes com dados referentes ao
período 1999-2000, aprofundando a análise dos mesmos e aperfeiçoando a dimensão
qualitativa da investigação, através de novos e mais sofisticados estudos de caso. Além
disso, como uma segunda vertente da pesquisa, introduzimos a avaliação, no contexto do
estado da Bahia, do impacto do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Já tendo dados financeiros do
passado, referentes ao ensino público da Bahia e coletando agora dados comparáveis, tanto
quantitativos quanto qualitativos, depois da data de inauguração do Fundo, em março de
1998, foi possível analisar até que ponto a sua implementação tem produzido mudanças por
parte dos governos estadual e municipais do estado quanto ao seu comportamento
financeiro frente à sua rede de ensino.
Desde 1934, as Constituições brasileiras têm incluído dispositivos que fixam a percentagem
dos respectivos orçamentos que os governos federal, estaduais e municipais devem destinar
à educação. Em 1983 foi aprovada a chamada Emenda Calmon que estabeleceu que os
governos de estados e municípios são obrigados a gastar 25% de suas receitas de impostos
e transferências com educação, enquanto o governo federal deve gastar 13% (Gomes,
1992). Esta emenda foi regulamentada pela Lei 7.348, de 24/07/85, e incorporada à
Constituição Federal de 1988, em seu artigo 212, elevando o percentual da União para
18%, com as respectivas definições do que podem ser consideradas receitas e despesas
com a educação. Pela primeira vez, a nova Constituição reconheceu a autonomia do sistema
municipal de ensino, que deixou de ser subordinado às agências dos governos estaduais. A
Constituição de 1988 também delegou às autoridades estaduais e municipais o controle de
fontes importantes de receita previamente gerenciadas pelo governo federal. No entanto,
visto como um todo, o sistema de finanças públicas no Brasil e, mais especificamente, o
financiamento da educação, continua sendo muito centralizado, com os principais impostos
e contribuições recolhidos pela União (Melchior, 1993).
Além do programa de repasse direto às escolas, o FNDE financia, por meio de convênios,
projetos municipais para a melhoria do ensino. Os projetos podem ser feitos para as várias
modalidades de ensino (ensino infantil, ensino fundamental regular e supletivo, educação
especial) e ter como seu objetivo construir, ampliar, reformar e/ou equipar escolas
municipais, bem como realizar treinamentos de professores e adquirir equipamentos e
material didático (Brasil, 1997c). Para obter recursos do FNDE, os municípios
encaminham suas solicitações ao Ministério da Educação (MEC) sob forma de projeto,
onde são avaliados por técnicos a partir de critérios, tanto legais com técnicos, e depois
compatibilizados com os recursos disponíveis. Neste processo, entram em jogo não apenas
o mérito do projeto e o critério de igualdade de oportunidades educacionais, mas também, a
competência do município em preencher os formulários de solicitação e sua força política.
Este último aspecto ajuda a explicar o fato de que, apesar da função redistributiva do
FNDE, seu financiamento tem favorecido de forma desproporcional os estados mais ricos
do país (Gomes & Verhine, 1996; World Bank, 1995).
Existe uma série de razões que explicam por que o sistema de financiamento à educação no
Brasil não é capaz de garantir a todas as crianças acesso à escola com um nível mínimo de
qualidade, dentre essas razões três merecem destaque especial. Em primeiro lugar, apesar
da incorporação, em sucessivas constituições, de dispositivos que obrigam à alocação de
parcelas específicas das receitas públicas para fins educacionais, o sistema de
financiamento da educação, como um todo, ressente-se da falta de regras efetivas que
orientem a distribuição dos recursos. Mais ainda, tais regras, na forma como estão definidas
- incluindo-se as normas constitucionais -, são freqüentemente burladas ou ignoradas,
existindo poucos mecanismos de punição para esses casos. O acesso aos recursos para
educação, portanto, continua dependente de um conjunto de fatores que tipicamente
incluem a região, a riqueza e a vinculação política, mas que freqüentemente excluem a
necessidade ou o esforço por parte de autoridades locais (Plank & Verhine, 1993; Verhine
& Plank, 1996).
Uma segunda razão para o fracasso do sistema de financ iamento à educação em garantir
vagas escolares de qualidade aceitável, em número suficiente, é o fato de ele ser
excessivamente complexo. Aos problemas colocados pela falta de regras transparentes de
decisão para a distribuição dos recursos e pela proliferação de fontes de financiamento
acrescenta-se o fato de que a maioria das fontes de financiamento exige que estado e
municípios solicitem esses recursos para o desenvolvimento de projetos específicos. Como
decorrência, o acesso à informação e a influência política adquirem um valor tremendo na
concorrência pelos recursos. Os municípios rurais mais pobres, distantes de Brasília,
enfrentam sérios obstáculos para tomar conhecimento acerca da disponibilidade de recursos
de determinadas fontes, bem como experimentam grandes dificuldades na hora de atender a
exigências administrativas e contábeis complexas, podendo, portanto, ter negado o acesso
ao apoio financeiro ao qual ostensivamente teriam direito. Para evitar essa possibilidade,
muitos municípios empregam intermediários especializados para facilitar- lhes o acesso às
transferências federais. Segundo depoimento de um então Ministro de Educação, estes
“despachantes” freqüentemente dificultam o processo para as prefeituras, por
desconheceram a realidade local e por lesarem os recursos públicos ao cobrarem 25% do
valor total do projeto de solicitação (Cerqueira, 1996).
Um terceiro motivo para que o sistema de financiamento não tenha se mostrado capaz de
garantir o direito à educação básica decorre da manipulação política em diversos níveis. Os
ministros da Educação tendem a encaminhar recursos para seus estados de origem,
enquanto membros do Congresso Nacional tendem a distribuir bolsas de estudo e “projetos
especiais” para seus redutos eleitorais. Em nível local, os recursos são usados para
recompensar aliados e angariar apoios através de empregos administrativos ou de posições
de ensino ou ainda para contratos de construção ou outros serviços (Marques, 1995). A
intervenção política na administração e financiame nto do sistema de educação tende a
reduzir a qualidade do ensino e a aumentar o seu custo.
Segundo uma avaliação do primeiro ano do Fundef, realizada pelo MEC, os resultados
concretos do Fundo têm sidos altamente positivos (Brasil, 1999). Por exemplo, conforme
estudo do MEC, devido ao Fundef, os municípios brasileiros gastaram 22,7% a mais com o
ensino fundamental em relação ao ano anterior. Os municípios da região nordeste, a parte
mais pobre do país, aumentaram em 87% os recursos financeiros que aplicaram no ensino
fundamental. Um outro benefício marcante do Fundef, no seu primeiro ano, foi um
aumento substancial das matrículas no ensino fundamental. Entre 1997 e 1998, a matrícula
no ensino fundamental público foi acrescida em 6%, chegando-se a alcançar nas regiões
mais pobres níveis bem mais elevados (12,1% no Nordeste e 7,7% no Norte). Destaca-se
que o impacto positivo do Fundef sob as matrículas escolares ocorreu, principalmente, nas
redes municipais. Enquanto estas redes, no seu conjunto, adicionaram 2,7 milhões de
alunos (um aumento de 21,5%), os sistemas estaduais perderam 832 mil estudantes (-4,6%).
Em relação ao sistema estadual, a porcentagem dos alunos matriculados em escolas
municipais aumentou de 37.2% em 1996 para 46.7% em 1998. Outros benefícios do Fundef
assinalados pelo relatório do MEC foram aumentos dos níveis salariais dos professores que
atuam no ensino fundamental público, bem como investimentos maiores na habilitação dos
mesmos, resultando redução, em 15%, do número de professores leigos no país.
Por outro lado, apesar dos avanços assinalados, pode-se dizer que a condução do Fundef
tem sido marcada por dificuldades e limitações, decorrentes tanto da concepção e
mecanismos do Fundo como de circunstâncias mais gerais inerentes ao sistema de
financiamento do ensino (Monlevade & Ferreira, 1997; Davies, 1998; Pinto, 1999). Numa
pesquisa recente, Marcos Bassi afirma que o Fundef representa nada mais do que “um
mecanismo engenhoso” do governo federal, reme tendo o ônus do financiamento do ensino
aos governos subnacionais e mantendo intocado o pano de fundo do ajuste econômico e
fiscal do estado (Bassi, 2001, p. 58)..
Com a crise e os cortes nos gastos públicos, o valor mínimo anual por aluno foi fixado em
um nível muito baixo (R$ 315,00 em 1998 e 1999) , insuficiente não apenas para garantir
um melhor padrão de qualidade do ensino, como, até mesmo, para o próprio cumprimento
da Lei 9.424. Uma vez que essa Lei prevê um valor mínimo nunca inferior “a razão entre a
previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental do ano
anterior, acrescida do total estimado de novas matrículas”, para que a mesma fosse
respeitada, o valor mínimo aluno para 1998 deveria ter ficado em R$ 444,17, conforme
estimativa efetuada por Davies (1998). Por outro lado, o Banco Mundial alega que, em um
país com o nível de desenvolvimento do Brasil, o mínimo necessário para o ensino
fundamental ficaria em torno de US$ 300 por aluno/ano, ou seja, mais do que R$ 600,00
nos tempos de hoje (World Bank, 1995).
Existem muitos outros problemas com o Fundef. Nota-se, por exemplo, que sendo os
coeficientes de participação dos sistemas estaduais e municipais definidos com base nos
dados do censo educacional do ano anterior, as redes de ensino cujas matrículas crescem
rapidamente, de um ano para o outro, terminam sendo prejudicadas. Segundo análise
produzida por Castro (1999), o fato de que o MEC estimou o gasto mínimo por aluno em
1998 com base nas matrículas de 1997 significou que o cálculo não considerou os 1,84
milhões de novos estudantes matriculados em 1998 e não captou as migrações de alunos
entre as redes provocadas pelo Fundef. Como conseqüência, contrária á notícia divulgada
pelo MEC, não houve em 1998 uma disponibilização de gasto mínimo em 1998 de R$315
em todo o País. No Nordeste, o verdadeiro valor por aluno em 1998 foi de R$287, pois
houve um acréscimo de R$1,196 milhões de um ano para o outro. Conforme Castro, o
valor médio do sistema público (municipal + estadual) ficou abaixo dos R$315,00
exatamente nos oito estados beneficiados pela complementação federal, que chegou em
montantes insuficientes para fazer face ao aumento regional médio de matrículas de 12,1%
em 1998. Especialmente afetado pela distorção no cálculo do valor mínimo foram as redes
municipais, onde o crescimento de matriculas tendia a ser marcante. Por exemplo, o valor
aluno/ano no âmbito municipal foi, em media, apenas R$ 198,00 no estado do Pará, R$
216,00 no estado de Minas Gerais e R$ 226,00 no estado da Bahia (Castro, 1999).
A partir dessa discussão referente ao Fundef, acima apresentada, o que fica evidente é a
necessidade de realizar investigações que acompanhem e avaliem o impacto do Fundo e
também das outras iniciativas recentes, com base em procedimentos e critérios
cientificamente construídos. A pesquisa apresentada aqui, baseada em bancos de dados
criados no início da década de 90 e ampliados, desde então, de forma sistemática e regular,
representa uma tentativa de atender a essa necessidade, pelo menos no âmbito do Estado da
Bahia.
OS OBJETIVOS DA FASE FINAL DA PESQUISA: Foco no Fundef
Em relação aos primeiros três objetivos, vale a pena registrar que os anos dos diversos
levantamentos variam de um banco para o outro, dependendo da época em que os dados são
disponibilizados e da periodicidade já adotada no decorrer da pesquisa. Os dados referentes
às redes municipal e estadual são levantados anualmente, porém sofrem um lagtime de um
ano ou mais, devido a atrasos por parte dos órgãos responsáveis, no registro, verificação e
divulgação das informações pertinentes. No caso dos dados sobre a rede particular, o
lagtime é bem menor, mas o processo de conseguir acesso aos mesmos é politicamente
delicado e, por isso, realizamos o levantamento apenas de três em três anos (a partir de
1995).
Assim dito, os objetivos que nortearam a pesquisa a partir de agosto de 2000 foram os
seguintes:
O presente relatório trata de todos os objetivos postos, mas a ênfase principal focaliza os
relativos ao impacto do Fundef.
A METODOLOGIA
O plano geral da pesquisa definiu que deveriam ser realizados estudos de casos sobre: o
estado, o município capital e outros municípios que apresentassem, pelo menos condições
distintas quanto ao percentual da receita própria municipal e quanto ao Fundef (contribui x
recebe).
Nesse sentido, foram escolhidos de forma intencional sete municípios - três grandes e
quatro pequenos - combinando os dois critérios anteriormente mencionados. Como
municípios grandes, os de Vitória da Conquista (262.494 hab.), Camaçari (161.727 hab.) e
Alagoinhas (130.095 hab.); como municípios pequenos, São Sebastião do Passé (39.960
hab.), São Francisco do Conde (26.293hab.), Conceição da Feira (17.514hab.) e
Governador Mangabeira (17.165 hab.). No grupo de municípios grandes, Camaçari perde
com o Fundef e os demais ganham, enquanto no grupo de municípios pequenos São
Francisco do Conde e Conceição da Feira contribuem mais para o Fundo do que recebem,
situação inversa a dos outros municípios desse grupo.
Para a realização das entrevistas do tipo focal, semi-estruturada, um roteiro básico foi
montado para orientar a busca de informações, com questões gerais e outras para atender às
especificidades das instituições / órgãos, cujos entrevistados representavam. As questões
abertas, propostas no roteiro, tinham a função de estimular o entrevistado para que relatasse
de forma ampla e livre sua experiência com o Fundef, contudo o pesquisador a partir das
informações trazidas pelo entrevistado poderia levantar novas questões ou pedir
esclarecimentos para enriquecer o relato. As entrevistas, num total de 55, foram realizadas
em dois períodos, agosto e setembro de 2001 e março a agosto de 2002.
A condução dos estudos de casos seguiu, em cada situação, uma dinâmica própria, contudo
o trabalho de campo tinha sempre início com a coleta de dados quantitativos e o
levantamento da documentação pertinente, envolvendo: documentos jurídicos, documentos
educacionais e documentos financeiros. Concomitantemente, ao levantamento dos dados
quantitativos foram agendadas e realizadas as entrevistas às pessoas-fonte. A realização do
trabalho de campo, principalmente a coleta de dados financeiros sobre as despesas
realizadas, seguindo o detalhamento da planilha, foi uma tarefa limitada por várias
barreiras. Além dos pesquisadores de campo não terem acesso às fontes da Secretaria da
Fazenda, exceto no Município de Vitória da Conquista, os dados levantados pelos técnicos
da Sefaz estavam às vezes incompletos e inconsistentes, o que exigiu vários retornos ao
município. Dados necessários a melhor compreensão do impacto do Fundef na manutenção
e desenvolvimento do ensino não foram obtidos em função de dificuldades técnicas
alegadas pelos informantes, tais como: impossibilidade de desagregar as despesas com os
vários níveis e modalidades de ensino até 2000, salário de professores do ensino
fundamental, despesas com formação/capacitação de docentes e outras despesas. Outras
dificuldades foram encontradas para a coleta dos dados: a “falta de memória” ou seja,
ausência da documentação para consulta; problemas com o agendamento e a realização de
entrevistas com gestores e técnicos das secretarias municipais e estaduais; acesso aos
bancos de dados dos órgãos governamentais.
Os relatórios foram elaborados para os estudos de casos individuais, como para o estudo
comparativo - estado e municípios, sendo este configurado como o Relatório Geral, aqui
apresentado. Para os casos individuais a estrutura do relatório previa: (a) perfil do
município - dados históricos, demográficos, sócio-econômicos, políticos, educacionais
(gerais) e legislação municipal relacionada à educação; (b) impacto do Fundef (em dados) -
análise das finanças; das matrículas, classes, escolas, fluxos; da situação dos professores;
(c) política educacional local frente ao Fundef; (d) o controle da aplicação dos recursos; (e)
peculiaridades locais. Os relatórios dos cinco estudos de caso individuais fazem parte do
anexo do Relatório Geral. Também em anexo encontram-se as planilhas com dados
educacionais e financeiros que integram os bancos de dados acima referidos.
O Estado da Bahia é um dos nove estados da Região Nordeste do Brasil. Possui uma área
de 561.026Km² e limita-se, ao Norte, com os estados Sergipe, Alagoas, Pernambuco e
Piauí; ao Sul, com os Estados Minas Gerais e Espírito Santo; ao Leste com o Oceano
Atlântico e a Oeste com os Estados de Tocantins e Goiás. Dentre seus quatrocentos e
quinze (415) municípios destacam-se: Salvador, Feira de Santana, Vitória da Conquista,
Ilhéus e Itabuna.
Representando a 6ª economia do país, com um PIB de US$ 33,6 bilhões (4,7% do PIB
Nacional e 33% do Nordeste) e renda per capita de US$2.615,00 (SILVA & MEIRELLES,
1999, p. 7), predomina no estado o setor de Comércio e Serviços que, em 1996, foi
responsável por 60,3% da economia do estado. As indústrias baianas se ocupam com
produtos químicos e petro-químicos, alimentares, me talúrgicos, minerais não- metálicos,
bebidas, minerais e madeira. Entre os minérios explorados no estado encontram-se: água
mineral, argila, baritina, calcário, caulim, chumbo, cromo, magnesita, manganês, mármore,
talco, petróleo e gás natural. No setor agropecuário encontra-se o cultivo de algodão, cacau,
coco, laranja, sisal, cana-de-açúcar, cebola, feijão, fumo, mandioca e milho e a criação de
bovinos, suínos e eqüinos.
Tabela 1
Índice de Desenvolvimento Humano e PIB per Capita
1980 a 1996
Tabela 2
População Residente
Brasil - Nordeste - Bahia
A respeito das taxas de analfabetismo na Bahia, observa-se que são mais elevadas na faixa
etária de 50 anos e mais. Apesar da redução percentual que se verifica comparando-se o ano
de 1990 e 1996 com o ano 2000, quase metade (48%) das pessoas nessa faixa etária é
analfabeta. Os menores percentuais de analfabetismo encontram-se na faixa de 15 a 25
anos, como se pode verificar no quadro a seguir. Em todas as faixas etárias consideradas
houve um decréscimo na taxa de analfabetismo ao longo da década de 90.
Tabela 3
Taxa de Analfabetismo por Faixa Etária
Bahia 1990 a 2000
Paralelo à redução das taxas de analfabetismo podem ser analisados os aumentos das taxas
de escolarização bruta e líquida que são mais altas no ensino fundamental. Em 1999, a
escolarização bruta no ensino fundamental foi de 154,9% enquanto o Ensino Médio ficou
em 53,3%. No ano 2001 essas taxas passam a 163,5% e 68,5% respectivamente. A
diferença é ainda mais acentuada quando se analisa a escolarização líquida: no ensino
fundamental passa de 93,3%, em 1999, para 96,2% em 2001, enquanto no ensino médio
passa de 14,2% para 15,9% no mesmo período.
Tabela 4
Taxa de Escolarização
Bahia - 1999 a 2001
Com o aumento das taxas de escolarização aumentam também as taxas de atendimento que,
com a prioridade colocada para o ensino fundamental, são maiores na faixa de 7 a 14 anos.
Entretanto verificam-se aumentos percentuais também na faixa de 15 a 17 anos já que
existe um grande contingente de alunos desta faixa etária que vem sendo atendido com a
oferta do ensino fundamental. Em 1960 somente 50% das crianças de 7 a 14 anos e 15,7%
da faixa de 15 a 17 anos eram atendidas nas escolas baianas. Em 1996 esses percentuais se
elevam para 89,2% e 63,7% e, em 2001 chega-se a 97,3% e 88,0%.
Tabela 5
Taxas de Atendimento
Bahia - 1960 a 2001
As taxas de distorção idade-série na Bahia, em 1996 (70,0%) e em 2000 (64,9%), são mais
elevadas que as médias registradas no Brasil (47,0% e 41,7%), equiparando-se às taxas de
estados como Sergipe (67,2% e 62,0%), Maranhão (66,3% e 62,3% ), Alagoas (67,7% e
63,9%), Paraíba (70,0% e 62,0%) e Piauí (66,1% e 63,5%) e distanciando-se de São Paulo
que, além de apresentar as menores taxas, conseguiu uma das maiores reduções da
distorção idade-série de 1999 (30,5%) para 2000 (19,1%).
Para funcionamento das escolas de ensino fundamental e médio, o Brasil contava, em 1996,
com 1.715.074 professores. Em 1999 esse número passou a ser 1.888.449. Na rede
municipal houve redução do quadro docente para o ensino médio que era formado por
20.957 professores, em 1996, e passou a contar com 16.827 em 1999. No ensino
fundamental houve aumento a cada ano, tanto no total de professores quanto no número de
professores nas redes municipais. No Estado da Bahia verificam-se aumentos nos quadros
docentes do ensino fundamental e médio de 1996 a 1999 e 2001. A Bahia passa de 128.764
professores, em 1996, para 147.908 em 1999 e 162.724 em 2001.
Tabela 6
Percentual de Matrícula no Ensino Fundamental
Em 1998, ano de implantação do Fundef, o Censo Escolar constatou que a Região Nordeste
foi a que abriu o maior núme ro de vagas no Ensino Fundamental com um milhão de novas
matrículas. Isso representa um crescimento de 9,6%. O Estado da Bahia foi o que
apresentou o maior crescimento ao matricular mais 475.078 alunos, como demonstra o
tabela a seguir. De 1997 para 1998 houve um acréscimo de 14,3% na matrícula de 1ª a 4ª
série e 17,9% de 5ª a 8ª série (SILVA & MEIRELLES, 1999, p.36).
Tabela 7
Matrícula no Ensino Fundamental - 1997 e 1998
Os maiores aumentos na matrícula no ensino médio nas escolas baianas aconteceram nos
anos de 1997, 1998 e 1999 em que se registraram aumentos de 16,05%, 15,95% e 17,53%.
De 1994 a 1999 houve um aumento de 80,70% das matrículas. Segundo o documento
Educação em Números - Bahia 2000, “o expressivo incremento anual da matrícula no
ensino médio entre 1994 e 1999 reflete o resultado das medidas voltadas para melhoria do
ensino e, ao mesmo tempo, sinaliza uma maior demanda futura por esse nível de ensino”
(BAHIA 2000, p.17) Os aumentos anuais sucessivos registrados desde 1995, resultam
numa taxa de crescimento 1994/2001 de 137,58%.
Tabela 8
Matrícula Inicial do Ensino Médio
Bahia - 1994-2001
A rede estadual é responsável pela maior parte dos alunos do ensino médio na Bahia
detendo, em 2001, 79,37% da matrícula nesse nível de ensino. As escolas federais têm o
menor número de alunos (0,63% em 2001) e as redes municipal e particular tiveram, em
2001, respectivamente, 12,19% e 7,80% da matrícula no ensino médio do Estado da Bahia.
Tabela 9
Matrícula no Ensino Médio por Dependência Administrativa
Bahia - 1995 a 2001
Tabela 10
Rendimento e Movimento Escolar do EF na Bahia
1998/1999
Cabe mencionar que existem no Estado da Bahia, pelos dados do INEP referentes ao ano
2000, 49 instituições de ensino superior que oferecem 348 cursos para 89.191 graduandos.
O maior contingente de matrícula em cursos de graduação fica com as 43 instituições
privadas que oferecem 140 cursos para 39.239 alunos. O ensino superior público é
oferecido pelas redes federal e estadual. Existem duas (2) instituições federais que
oferecem 62 cursos para 19.170 alunos e quatro (4) instituições estaduais que oferecem 146
cursos para 30.782 graduandos. As instituições estaduais contam com o maior número de
docentes e com o maior percentual de mestres (36,3%). As instituições federais têm o
menor número de alunos por professor (9,6) e o maior percentual de doutores (24,2%). Os
menores percentuais de mestres (30,1%) e de doutores (7,9%) e o maior número de alunos
por professor (16,9) encontram-se nas instituições particulares.
No que diz respeito ao perfil do estado, ainda merece atenção a questão da legislação. A
legislação educacional nacional deve orientar o planejamento e a ação governamental em
suas diversas instâncias, podendo, no entanto estados e municípios estabelecer legislação
própria sobre matéria educacional desde que não transgrida os princípios da lei maior. No
que diz respeito ao Estado da Bahia, foram identificadas como principais documentos
legais a Constituição do Estado, a Lei Orgânica do Ensino e as Resoluções do Conselho
Estadual de Educação.
A Constituição Estadual prevê a elaboração de Leis para dispor sobre o sistema estadual de
ensino (Art. 247) e estabelecer o Plano Estadual de Educação, “de duração plurianual,
proposto pelo Poder Executivo, com vistas à articulação e ao desenvolvimento do ensino
em seus diversos níveis e à integração das ações do Poder Público, que conduzam aos
objetivos previstos na Constituição Federal.” (Art. 250). A Constituição Baiana destaca em
um dos seus artigos “os valores da religião afro-brasileira” , determinando ser dever do
Estado a preservação e garantia da integridade, respeitabilidade e permanência desses
valores. Estabelece ainda a “adequação dos programas de ensino das disciplinas de
geografia, história, comunicação e expressão, estudos sociais e educação artística à
realidade histórica afro-brasileira, nos estabelecimentos estaduais de 1º, 2º e 3º graus”
(Inciso IV Art.275).
A posição do Consed no período que antecede à criação do Fundef pode ser melhor
compreendida através do depoimento de um de seus participantes, o Secretário de
Educação da Bahia (1995-1999), no qual enfatiza as preocupações desses gestores com a
questão da remuneração do professor, descreve as tensões entre o MEC e o Consed e entre
os próprios estados para a formulação do projeto do Fundo e os resultados finais dessa
negociação.
Com o Fundef, o Estado da Bahia passou a perder recursos com as transferências para os
municípios. Contudo, o Secretário de Educação da época entendia essa questão como
plenamente administrável, considerando que parte da rede estadual, principalmente da 1ª a
4ª série do ensino fundamental já era mantida praticamente pelos municípios, que
contratavam professores, uma vez que o estado estava com problemas relativos à realização
de concursos e basicamente 100% do pessoal de apoio era do município. Assim sendo, em
reunião com a participação de representantes da SEC/BA, Sefaz/Ba e com o apoio do
próprio Governo do Estado foi definido: (a) que seria oportuno transferir as escolas
estaduais de 1ª a 4ª série do ensino fundamental para os municípios; (b) que deveriam ser
realizadas negociações com cada município para o dimensionamento da quantidade de
unidades escolares a serem transferidas. Nesse processo de negociação sabe-se que foram
estabelecidos alguns critérios, como: escolas rurais e escolas urbanas estaduais de até
quatro salas passariam para os municípios. Assim, numa primeira etapa o projeto inicial de
implantação do Fundef definiu que 1.643 escolas da primeira etapa do ensino fundamental
seriam municipalizadas.
Outras questões também foram negociadas. Como alguns municípios mantinham escolas de
ensino médio e de educação profissional - magistério, a partir da implantação do Fundef
desejavam transferir esses cursos para o estado. Neste caso, a negociação envolvia um
“esquema de compensação”. Para que o município continuasse com seus cursos de nível
médio, o estado repassaria mais dez turmas de ensino fundamental. Quanto à educação
infantil foi toda municipalizada. Em síntese, nesse primeiro momento, o esquema de
municipalização envolveu: a educação infantil, parte do ensino fundamental,
especificamente o primeiro segmento desse nível da educação básica e não contemplou a
transferência do ensino médio municipal para a rede estadual. Esta resistência dos gestores
em absorver na rede estadual o ensino de nível médio municipal pode ser entendida como
uma forma de proteção às perdas de recursos. Nesse caso, o estado estaria passando para o
município alunos que garantiriam a ampliação da receita municipal e por outro lado, estaria
absorvendo alunos que não representavam entrada de recursos e sim despesas. Contudo, é
bom lembrar que o município também estava recebendo do estado, os alunos da educação
infantil que também não participam do Fundo.
O Estado da Bahia, sem dúvida, perdeu dinheiro, mas ele utilizou um próprio
dispositivo que existia na legislação, que permitia que o estado obtivesse aquele
mesmo valor repassado para os municípios, junto ao governo federal sob forma de
financiamento de longo prazo, para que o caixa do estado não sofresse tanto com as
transferências. (Gestor da Educação, 08 / 02).
Dados fornecidos pelo MEC sobre a distribuição dos recursos financeiros do Fundef
revelam que, em 1998, o Fundo na Bahia absorveu recursos na ordem de R$742 milhões,
com os governos estadual, municipais e federal contribuindo, respectivamente, com 53%,
31% e 16% do total (Brasil, 2000). A distribuição da receita, por outro lado, favoreceu
fortemente as redes municipais, que ficaram, no seu conjunto, com 52% do valor total,
representando um ganho em relação a sua contribuição de quase R$195 milhões. Cada
município baiano recebeu do Fundef, em média, R$267,87/aluno do Fundo do Estado mais
R$47,13/aluno do Governo Federal. Para a grande maioria deles (89,9%), o valor total
recebido representou um ganho em relação ao que eles iriam receber naquele ano se o
Fundef não existisse. Por outro lado, de acordo com dados relatados por Verhine (2000),
este ganho relativo não significa, necessariamente, que os municípios gastaram mais no
ensino fundamental em 1998 do que no ano anterior, uma vez que em 1997 praticamente
todos eles aplicaram, neste nível de ensino, mais do que 15% da sua receita tributária.
Segundo Verhine, os dados revelam que o repasse do Fundef em 1998 foi maior do que o
dispêndio total no ensino fundamental para aproximadamente a metade dos municípios
baianos (54,3%). Houve um ganho médio global, neste sentido, de 13%, embora seja
importante registrar que 32 municípios do estado (inclusive o maior deles, Salvador)
acabaram recebendo do Fundef menos do que a metade daquilo que gastaram no EF no ano
anterior. Através de análise de correlação, Verhine (2000) verificou que os municípios que
mais se beneficiaram com o Fundef, em relação ao seu comprometimento financeiro com
EF em 1997, tenderam a ser os que são mais distantes da capital, menos populosos, menos
urbanizados (medido através da relação população/área geográfica) e que apresentam
menor grau de riqueza (mensurado através do ICMS per capita).
Os dados referentes ao Fundef da Bahia para os anos 1999 e 2000 evidenciaram tendências
similares aos do ano de 1998. Conforme demonstrado na Figura 1, o valor do Fundo
cresceu em 19,6% entre 1998 e 1999 e em mais 11,0% entre 1999 e 2000, chegando, neste
ano, a um valor total de quase R$1,2 bilhão. A Figura 1 também ilustra a composição do
Fundo: o principal, derivado da receita de tributos do estado e dos municípios, e a
complementação da União. Observa-se que durante o período 1998-2000, a
complementação da União foi o componente do Fundo que teve o maior percentual de
aumento (Complementação: 64,2%; Principal: 26,6%), indicando que o crescimento dos
recursos do Fundef gerados pelo conjunto do estado não acompanhou o crescimento das
matriculas nas redes de ensino fundamental público, tornando cada vez mais difícil o
atendimento, por parte das redes baianas, do gasto aluno/ano exigido pela legislação.
Como resultado, a complementação chegou a constituir 20,1% do total do Fundo em 2000,
representando, em valores absolutos, a maior complementação recebida por uma unidade
federativa. Por outro lado, quando se estima o valor da complementação em forma relativa
(em termos de valor/aluno), a Bahia fica em terceiro lugar entre os estados mais
beneficiados, atrás do Maranhão e Pará, conforme revelado pela Figura 2.
1400
1200
236,4
1000
R$ MILHÕES
215,1
800 143,9
600
742,1 844,5 939,6
400
200
0
1998 1999 2000
FONTE: MEC - BALANÇO DO FUNDEF 1998 - COMPLEMENTAÇÃO
2000 PRINCIPAL
250
200
150
100
50
0
AL BA CE MA PA PB PE PI
TOTAL (EM MILHÕES R$)
FONTE: MEC - BALANÇO DO FUNDEF ESTADOS
POR ALUNO (EM REAIS)
Figura 2: Complementação Total (em R$ milhões) e por Aluno (em R$), da
União ao Fundef, por UF - 2000.
A Figura 3 indica que, com o crescimento do Fundo entre 1998 e 2000, a distribuição dos
seus recursos de forma favorável aos municípios em relação ao estado ficou cada vez mais
acentuada. Em 2000, os municípios receberam 60,6% do valor total distribuído pelo Fundo
enquanto contribuíram com apenas 26,6%, ganhando, assim, um valor liquido de R$ 379
milhões. O estado, por outro lado, perdeu R$ 142,9 milhões naquele ano, ao contribuir com
um montante quase duas vezes maior do que o dos municípios e ao receber de volta menos
do que 40% dos recursos totais do Fundo. Assim, a perda liquida do estado em 2000 foi
quase três vezes maior do que a perda (R$48 milhões) que o mesmo sofreu em 1998, ano
da implantação do Fundef.
1400
RECEITA
VALORES EM R$ MILHÕES
1200
RECEITA
1000 CONTRIBUIÇÃO 463,4
RECEITA CONTRIBUIÇÃO 407,5
800 CONTRIBUIÇÃO
422,8
538,9 606,3
600
471,7 712,6
400 652,2
200 462,2 333,3
270,4 305,6
0
1998 1998 1999 1999 2000 2000
Com os ganhos dos municípios em relação ao estado sendo cada vez maiores, o número de
municípios perdedores na Bahia reduziu-se substancialmente nos primeiros três anos do
Fundef, passando de 48 (cerca de 12% do total no estado) em 1998 para apenas oito em
2000. Estes oito, caracterizados por ter uma receita relativamente grande em relação ao
número de alunos matriculados na sua rede de ensino fundamental, inclui o município de
Salvador (por ter um índice de municipalização muito baixo) e alguns municípios ao seu
redor, como Camaçari, Madre de Deus, São Francisco de Conde, que têm uma situação
peculiar por serem beneficiados com uma receita oriunda da exploração do petróleo.
13 8
100% 48
80%
60% 407
407
367
40%
20%
0%
1998 1999 2000
ANOS PERDEM
FONTE: MEC - BALANÇO DO FUNDEF 1998 - 2000 GANHAM
Nessa perspectiva, avaliar o impacto do Fundef é, dentre outros aspectos, analisar sua
repercussão em relação a pelo menos três dos seus objetivos: a eqüidade no gasto aluno do
ensino fundamental, verificando se o valor mínimo a ser gasto por aluno é realmente
executado, a ampliação da matrícula do ensino fundamental visando sua universalização e
a valorização do magistério expressa através da melhoria do salário do professor e da sua
qualificação.
Essa análise em relação ao Estado da Bahia, nos aspectos assinalados, toma como unidades
de investigação o próprio Estado, o município capital, Salvador, e os municípios de Vitória
da Conquista, Alagoinhas, São Sebastião do Passé e Governador Mangabeira, selecionados
conforme os critérios explicitados no item Metodologia. Esses municípios representam
cerca de 22,0% da população do Estado, tendo, com exceção de Governador Mangabeira,
uma característica em comum, a forte urbanização: mais de 70% da população desses
municípios é urbana, enquanto em Governador Mangabeira essa taxa é de apenas 38,9%.
No ano de 2000, esses cinco municípios matricularam em suas redes 159.145 alunos no
ensino fundamental, o que corresponde a cerca de 5,6% do total de matrículas efetuadas na
rede de ensino pública, estadual e municipal.
Tabela 11
Produto Interno Bruto (PIB) e Índices de Desenvolvimento Econômico e Social (IDE e IDS)
Estado da Bahia e Municípios - 1998
A distinta situação econômica desses municípios, expressando sua maior ou menor riqueza,
pode ser melhor observada quando são analisados os dados relativos à receita própria que
expressa a capacidade de arrecadação do município (IPTU, ISS e ITBI) e do Estado (IPVA,
Imposto de Transmissão 'causa mortis', etc), recursos que embora não integrem a cesta do
Fundef são importantes para sinalizar a capacidade de investimento dessas instâncias
governamentais na manutenção e desenvolvimento do ensino .
Essa situação pode ser observada na Tabela 12 que apresenta o percentual de participação
da receita própria na receita total do Estado da Bahia e municípios estudados:
Tabela 12
Percentual da Receita Própria/Receita Total
Estado da Bahia e Municípios
O primeiro ponto que se destaca na análise da Tabela 12, numa perspectiva histórica, diz
respeito à variação da participação da receita própria na composição da receita total seja do
Estado, seja dos municípios, expressando, talvez, o movimento da economia brasileira. O
segundo ponto a destacar, é a situação do município capital em relação aos demais
municípios, pois metade da sua receita total tem como origem a receita diretamente
arrecadada. Os municípios de Vitória da Conquista e Alagoinhas, com mais de cem mil
habitantes cada um, e 86,0% de população urbana, distinguem-se no que diz respeito à sua
capacidade de arrecadação, observando-se a posição de Vitória da Conquista em que a
receita própria, em 2000, representa cerca de 18,0% da receita total e Alagoinhas, 7,30%.
Chama a atenção, a situação de pobreza do município de Governador Mangabeira que
praticamente não tem receita própria, lembrando-se que esse município é
predominantemente rural, na medida em que apenas 38,9% da sua população é urbana.
Esses dados sugerem que o os municípios têm uma baixa capacidade de investimento na
implementação de políticas governamentais, tornando-os então dependentes dos repasses
do Estado e da União. Observe-se, no entanto, que a situação dos municípios estudados
espelha uma situação nacional pois as transferências da União e do Estado representam
para a grande parte dos municípios brasileiros mais do que 90% da receita pública.
Os dados coletados, nos municípios que integram o estudo de caso, evidenciam uma
tendência do Estado da Bahia, quando abordado de forma global, em que os municípios
recebem mais recursos do Fundef do que contribuem. Assim, à exceção do município
capital e do próprio Estado, os casos estudados estão entre os que mais recebem do que
contribuem para o Fundef, observando-se ainda que, dentre eles, o município de Vitória da
Conquista é o mais beneficiado com os repasses do Fundef, se estabelece a razão entre o
percentual de recebimento e o de contribuição. As tabelas 13, 14 e 15 apresentam esses
dados em relação aos anos de 1998, 1999 e 2000, percebendo-se uma certa estabilidade nos
percentuais relativos à contribuição para o Fundef e uma variação em relação aos
percentuais referentes ao recebimento.
Tabela 13
Percentual da Contribuição para o Fundef sobre os 25%
Estado da Bahia e Municípios
Tabe la 14
Percentual do Recebimento do Fundef sobre os 25%
Estado e Municípios
A situação de Vitória da Conquista deve ser melhor discutida pois o município tem o 20º
PIB do Estado da Bahia, estando bem classificado em outros indicadores como o IDE e o
IDS e razoável capacidade de arrecadação dos seus impostos pois nos últimos três anos
cerca de 24,0% da receita total foi proveniente da receita diretamente arrecadada. Assim, a
situação sócio-econômica desse município é bastante superior à do Município de
Governador Mangabeira, por exemplo, que, no entanto tem uma razão
contribuição/recebimento menor que a de Vitória da Conquista.
As despesas com a educação também podem ser analisadas a partir das prestações de contas
elaboradas ao final de cada exercício financeiro, quando as despesas realizadas são
apresentadas por Função e Categoria Econômica, expressando as políticas e ações
governamentais.
Por outro lado, chama a atenção o percentual da despesa realizada, em 2000, com essa
Função no município capital, 5,74%, abaixo do que se destinou às Funções
Administração/Planejamento, Habitação e Urbanismo e Assistência/Previdência (Tabela A7
em anexo). Contudo, tais dados têm que ser analisados com as devidas reservas,
considerando que não se teve acesso a informações que permitissem analisar o
detalhamento dessas despesas, ou seja, compreender o sistema de apropriação de custos por
Função. Para melhor entender essa questão, menciona-se que o município capital lança as
despesas com o custeio da sua rede de ensino no que se refere aos itens limpeza, vigilância,
transporte, manutenção de máquinas copiadoras, telefone, energia elétrica e outras despesas
na Funç ão Administração/Planejamento, o que certamente reduz do ponto de vista formal o
seu investimento na Função Educação e Cultura.
Ainda com relação às despesas relativas à Função Educação e Cultura convém observar que
o Estado da Bahia, e os municípios de Alagoinhas, São Sebastião do Passe e Governador
Mangabeira vêm aumentando, em termos percentuais, progressivamente, sua despesa nesta
Função, ao contrário do município capital e de Vitória da Conquista que apresentam uma
variação tendendo a menor investimento na Função. Mais uma vez, chama-se a atenção
sobre os cuidados que se deve ter na leitura desses dados, pois derivam de lançamentos
contábeis cujo conteúdo não é de conhecimento da equipe de pesquisa.
Uma dimensão de análise a ser explorada diz respeito às despesas realizadas por Categoria
Econômica, ou seja, os percentuais destinados às despesas de “custeio” e “capital”,
esclarecendo-se que a despesa de “custeio” integra a categoria “despesas correntes” e nela
estão apropriadas as despesas com pessoal, consumo e serviços de terceiros e encargos. A
Tabela 17 apresenta esses resultados, permitindo a comparação entre o realizado pelo
Estado da Bahia, o município capital e demais municípios pesquisados.
Tabela 17
Percentual de Despesas do Estado e Municípios por Categorias Econômicas
Estado da Bahia e Municípios
Localização Categoria Econômica 1996 (%) 1997 (%) 1998 (%) 1999 (%) 2000 (%)
Bahia Capital / Total 19,85 17,72 22,78 22,94 23,11
Custeio / Total 73,13 75,68 71,22 66,86 66,62
Pessoal Civil / Total 42,60 41,50 38,32 35,82 17,77
Pessoal Civil / Custeio 58,25 54,84 53,81 53,57 26,67
Salvador Capital / Total 16,37 18,25 20,43 21,52 22,74
Custeio / Total 72,42 57,71 76,91 63,73 67,62
Pessoal Civil / Total 48,24 39,26 65,75 31,48 36,65
Pessoal Civil / Custeio 66,62 68,02 85,48 49,39 54,20
V.da Conquista Capital / Total - - 15,16 8,75 9,86
Custeio / Total 99,27 99,11 56,49 59,31 9,44
Pessoal Civil / Total 84,29 86,38 42,84 40,83 -
Pessoal Civil / Custeio 84,91 87,15 75,84 68,85 -
Capital / Total 0,73 10,88 19,19 7,09 18,43
Alagoinhas
Custeio / Total 99,77 88,68 80,81 92,76 70,90
Pessoal Civil / Total 51,52 49,14 66,60 39,17 32,66
Pessoal Civil / Custeio 51,90 55,41 82,42 42,23 46,07
SSPassé Capital / Total 5,78 4,19 26,69 23,09 19,03
Custeio / Total 94,22 95,66 73,04 76,72 80,02
Pessoal Civil / Total 39,03 40,66 26,57 22,80 20,95
Pessoal Civil / Custeio 41,43 42,50 36,37 29,71 25,92
G.Mangabeira Capital / Total 9,21 15,05 8,49 9,79 4,89
Custeio / Total 89,80 83,93 90,46 89,23 94,47
Pessoal Civil / Total 42,62 43,92 43,75 39,15 31,93
Pessoal Civil / Custeio 47,46 52,33 48,36 43,88 33,80
Fonte: TCE/BA;TCM/BA; Secretarias da Fazenda
Assim, observa-se que o Estado da Bahia vem aumentando, em termos percentuais, sua
despesa de Capital, que em 2000, representou 23,11% do total das despesas. A tendência
observada no município capital e no município de Alagoinhas é de crescimento,
acompanhando o movimento do estado. O município de São Sebastião do Passe tem
elevações e quedas bruscas na sua despesa de Capital, pois em 1996, aplicava 5,78% da sua
receita em despesas de Capital, em 1998, 26,69% e em 2000, 19,03%, oscilação talvez
explicada pela realização de obras em determinados períodos. Quanto ao município de
Governador Mangabeira, a tendência observada é de queda no investimento em despesas de
Capital. Vitória da Conquista apresenta uma situação peculiar em relação aos municípios
pesquisados, embora talvez represente a situação de muitos municípios brasileiros que
empregam seus recursos basicamente nas despesas de custeio. Em 1996 e 1997, o
orçamento desse município era consumido basicamente com o pagamento de pessoal e as
despesas de outros custeios; em 1998 e 1999, o município reservou um percentual ainda
modesto para despesas de Capital, observando-se que ele e Governador Mangabeira são os
municípios que destinam os meno res percentuais do seu orçamento para aplicação em
despesas de Capital.
O Estado da Bahia gastou, em 2000, 26,6% do seu orçamento de Custeio com a despesa de
Pessoal, o que corresponde a 17,7% da sua despesa total. Registre-se que a sua despesa com
Pessoal vem decrescendo ano a ano, pois em 1996, o Estado da Bahia gastava 58,2% do
orçamento de Custeio para pagar Pessoal, absorvendo então 42,6% do orçamento total com
a folha de pagamento de Pessoal. No entanto, embora venha diminuindo sua despesa de
Pessoal, o Estado não vem aumentando o percentual alocado para as despesas de Custeio,
pelo contrário, observa-se uma tendência de queda de 73,1% em 1996 para 66,6% em 2000.
Os dados levantados sugerem que parte da economia realizada com Pessoal e outros
custeios pode ter sido transferida para as despesas de Capital, que vêm crescendo, e para
outras despesas correntes, como as transferências intergovernamentais.
O município capital absorvia em 1996 2/3 do seu orçamento de custeio com as despesas de
Pessoal, chegando a 85,4%, em 1998. A partir de 1999, há um aparente “enxugamento” na
folha de pagamento, pois, em 2000, as despesas com Pessoal passam a representar 54,2%
das despesas de Custeio, 36,6% do orçamento total.
Apenas o município de São Sebastião do Passé forneceu dados que permitem estudar a
aplicação dos recursos em educação, através da execução orçamentária da Secretaria
Municipal de Educação. O município capital forneceu dados parciais que limitam a análise.
No entanto, a análise dos poucos dados obtidos podem sugerir algumas comparações entre
a despesa total e a despesa com uma unidade específica, a do órgão responsável pela gestão
da educação.
O orçamento administrado pela Secretaria de Educação de São Sebastião do Passé aloca
mais de 90,0% dos recursos para despesas de Custeio, sendo que mais de 60,0% dos
recursos destinam-se para pagamento de Pessoal. Desses recursos, em 2000, 80,2% foram
empregados para o pagamento do Pessoal Docente, observando-se que em anos anteriores a
despesa com o pagamento dos docentes absorvia entre 94,8% até 100,0% dos recursos
disponíveis. Como a relação entre a despesa com Pessoal / Custeio é alta, em 2000, 65,9%
dos recursos de Custeio tinham esta finalidade, a Secretaria Municipal investe pouco em
despesas de Capital e na Formação e Capacitação Docente, um dos objetivos do Fundef, no
sentido de valorização do magistério e melhoria da qualidade do ensino.
Localização MDE 1996 R$ (IGP-DI) 1997 R$ (IGP-DI) 1998 R$ (IGP-DI) 1999 R$ (IGP-DI) 2000 R$ (IGP-DI)
Bahia MDE -F 902.304.494,72 1.006.298.278,99 890.116.456,72 951.195.783,50 921.671.843,26
MDE -R 1.693.520.205,10 2.589.536.233,15 3.257.466.459,70 2.670.259.616,50 1.997.356.957,63
Salvador MDE -F 112.758.124,20 121.563.777,69 115.239.466,37 120.052.765,51 120.000.182,67
MDE -R 60.554.418,83 52.220.109,69 42.928.344,69 37.549.052,03 36.696.077,44
V.Conquista MDE -F 7.719.054,47 7.610.743,86 11.769.028,33 15.563.332,73 17.205.031,08
MDE -R 18.365.231,94 17.297.135,04 24.506.746,96 23.139.240,61 25.442.566,73
Alagoinhas MDE -F 2.950.904,50 3.224.676,23 5.020.060,73 5.162.704,17 5.326.238,55
MDE -R 3.763.103,99 4.270.418,11 4.502.588,88 4.984.664,32 6.584.055,63
SSPassé MDE -F 1.203.946,83 1.286.688,65 3.008.609,56 3.155.417,70 2.994.885,98
MDE -R 1.768.899,69 1.824.487,35 3.307.126,87 4.016.510,04 4.073.595,57
Mangabeira MDE -F 603.409,46 735.894,57 1.154.994,73 1.700.956,95 1.475.809,80
MDE -R 978.638,23 1.095.636,57 1.292.882,90 1.738.150,21 2.694.801,66
Fonte: TCE/BA;TCM/BA; Secretarias da Fazenda.
Esses dados indicam duas situações: a primeira, em que o MDE Formal é maior que o
MDE Real, indicando que os recursos orçados não foram totalmente aplicados, ou seja, a
despesa foi menor que a receita, situação do município de Salvador, ao longo da série
pesquisada, e dos municípios de Alagoinhas e Governador Mangabeira em alguns dos anos
examinados. Na segunda situação, o MDE Formal é igual ou menor que o MDE Real,
significando que a receita e a despesa ficaram equilibradas ou que foram investidos mais
recursos além daqueles devidos pela obrigação constitucional. Nessa segunda situação
encontram-se os municípios de Vitória da Conquista, São Sebastião do Passé e o próprio
Estado da Bahia.
Tabela 19
Percentual de Despesas EF/ Receitas Fundef
Estado da Bahia e Municípios
Implantado em 1998, o Fundef deveria garantir que a despesa por aluno do ensino
fundamental fosse de no mínimo R$315,00. A Tabela 20 apresenta a despesa formal por
aluno no período 1998 / 2000, observando-se que em 1998, os municípios de Vitória da
Conquista e Governador Mangabeira não chegaram a atingir o mínimo de R$315,00, valor
que corrigido pelo IGP-DI equivale a R$349,26, situação superada nos anos seguintes,
lembrando-se que a base de dados utilizada para a distribuição dos recursos é a matricula
no ensino fundamental, conforme registrada no censo escolar do ano anterior ao da
distribuição.
Tabela 20
Despesa Formal por Aluno por EF - Recursos do Fundef
Estado da Bahia e Municípios
A avaliação do impacto do Fundef pode ser apreciada se comparados esses dados com a
despesa por aluno em 1996 e 1997, quando o ensino fundamental não contava com esse
aporte de recursos. A Tabela 21 ind ica que os municípios de Vitória da Conquista,
Alagoinhas, São Sebastião do Passé e Governador Mangabeira gastavam por aluno entre
R$136,32 e R$193,05, muito abaixo do valor posteriormente fixado como mínimo
desejável. Nesse sentido, os dados demonstram que o Fundef cumpre uma função
verdadeiramente eficaz no sentido de aumentar o gasto por alunos no ensino fundamental.
Deve-se observar que embora o estado e o município capital contribuam mais para o
Fundef do que recebem (dados das Tabelas 13 e 14), o ensino fundamental por eles mantido
não é prejudicado pois, com o Fundef, 100,0% do que lhes é repassado tem de ser
necessariamente aplicado nesse nível de ensino, enquanto que se não houvesse o Fundo,
apenas 60% dos recursos teriam que ser aplicados no EF. Essa situação fica clara quando os
dados das Tabelas 20 e 21são comparados.
Dados do MEC (2000) sugerem que a implantação do Fundef provocou em todas as regiões
do Brasil uma forte tendência em favor da universalização e da municipalização do ensino.
O mesmo aconteceu, de forma acentuada, no contexto baiano. Como demonstrado na
Tabela 22, a matrícula inicial do ensino fundamental na Bahia cresceu 28,6% entre 1996 e
2000, com um aumento para as redes municipais de nada menos de que 71.4% . Enquanto
isso, as matrículas do sistema estadual decresceram 3,4%, um percentual negativo que teria
sido muito maior se o estado, numa tentativa de assegurar para seus cofres uma fatia maior
do Fundo, não tivesse reclassificado alunos da educação de jovens e adultos (EJA) como
sendo do ensino regular, através do artifício de classes de aceleração. Sendo que as
matrículas das escolas particulares também foram reduzidas (-28.0%), os municípios
baianos, que se responsabilizavam por 45% do total de matrículas do ensino fundamental
em 1996, passaram a absorver 61% das matrículas registradas em 2000. Se considerar
apenas o primeiro segmento do ensino fundamental, em que os municípios concentram seu
esforço, o percentual de matriculas municipalizadas atingiu 73,5% em 2000, comparado
com 54,7% em 1996. Tomando como base os municípios estudados, observa-se que, no
ano 2000, o município capital tem sob sua responsabilidade apenas 21,5% das matrículas
públicas desse nível de ensino, enquanto Vitória da Conquista é responsável por 58,0%,
Alagoinhas, 35,7%, São Sebastião do Passé, 64,6% e Governador Mangabeira, 59,7% das
matrículas do ensino fundamental público.
Tabela 22
Matrícula inicial do ensino fundamental por dependência administrativa
Bahia - 1996-1999
Fica evidente que, na Bahia, o Fundef, em conjunto com outras políticas públicas
complementares, provocou tanto a redistribuição de matrículas entre as diferentes redes
como também um ganho real em prol da democratização do ensino. De fato, entre 1996 e
2000, a taxa de atendimento referente a crianças de 7 a 14 anos subiu de forma
significativa, passando de 87,1% para 96,5% (Ba hia, 2002). Entretanto, os dados sugerem
que o processo de municipalização no Estado da Bahia é ainda limitado, pois a rede
estadual ainda agrega 36% das matriculas do rede pública do ensino fundamental.
70
60
50
40
30
20
10
0
Estado da Salvador Vitória da Alagoinhas S.S.Passé Gov. 1996
Bahia Conquista Mangabeira 2000
Tabela 24
Despesa por Programa - Percentual do Ensino Fundame ntal
Estado da Bahia e Municípios
Pode-se ainda analisar as despesas por Função, com base nos dados apresentados na Tabela
A7(em anexo) que revelam que no orçamento do Estado da Bahia “Administração e
Planejamento” é a Função que consome o maior percentual de recursos alocados para a
Educação, mesmo que a despesa esteja decrescendo ano a ano. O segundo Programa
beneficiado é o relativo ao ensino fundamental que continua absorvendo parcela substancial
de recursos (quase 26,0% em 2000) o que reflete o limitado grau de municipalização do
ensino fundamental na Bahia.
Quanto ao ensino médio, as estatísticas oficiais mostram que a matrícula nesse nível de
ensino vem crescendo, no Brasil e na Bahia. Em relação ao estado como um todo, este
aumento foi de 83,9% entre 1996 e 2000, sendo que para a rede estadual, que responde pela
oferta de cerca de 80% dessas matriculas, o aumento no referido período foi de 117%. No
entanto, os recursos aplicados no ensino médio da rede estadual não têm acompanhado seu
incremento. A Figura 6 permite visualizar a relação entre a matrícula e despesa por aluno
da rede estadual no EM, mostrando o descompasso entre o crescimento do alunado e a
diminuição do investimento com esse nível de ensino.
No que diz respeito ao município capital os dados coletados revelam certa inconsistência
quando comparados entre si. Por exemplo, nos anos de 1996 e 1997, quase o total de
recursos estava alocado em Administração (97,46%), em 1998, 100,00% dos recursos
estavam alocados em dois Programas, Educação Infantil e Ensino Fundamental e em 1999 e
2000, mais de 90,0% dos recursos foram destinados ao Ensino Fundamental. Não foram
obtidas explicações satisfatórias dos órgãos responsáveis pelas informações.
Focalizando a despesa por aluno, os dados coletados devem ser examinados com cautela,
pois as lacunas evidenciadas na Tabela 25 sugerem que as despesas com um determinado
nível de ensino foram lançadas entre as despesas do Ensino Fundamental.
Tabela 25
Despesa Total por Aluno, Segundo os Níveis da Educação Básica
Estado da Bahia e Municípios
Localização Níveis E.Básica 1996 1997 (IGP- 1998 (IGP- 1999 (IGP- 2000 (IGP-
(IGP-DI) DI) R$ DI) R$ DI) R$ DI) R$
R$
Estado da Bahia E.Infantil SI SI SI SI SI
E.Fundamental 258,24 294,88 547,34 436,73 410,30
E.Médio 535,32 725,83 802,40 496,65 377,73
Salvador E. Infantil SI SI 5.678,01 SI 26,16
E.Fundamental 15,43 35,43 209,46 356,27 364,21
E.Médio NO NO NO NO NO
Vitória da Conquista E.Infantil 0,00 0,18 31,30 30,95 43,79
E.Fund/E.Esp 458,21 441,69 400.83 436,37 462,83
E.Médio NO NO NO NO NO
Alagoinhas E.Infantil SI SI SI SI 17,42
E.Fundamental 380,03 418,71 408,24 427,57 538,57
E.Médio SI SI SI SI NO
São Sebastião do E.Infantil 0,64 2,89 130,90 138,78 147,17
Passé
E.Fundamental 333,71 264,94 395,08 480,94 526,26
E.Médio SI SI 6,86 0,25 0,00
G.Mangabeira E.Infantil SI SI SI SI 30,23
E.Fundamental 371,96 453,68 307,83 453,47 545,73
E.Médio SI SI SI SI 20,94
Fonte: TCE/BA;TCM/BA; Sefaz; MEC/INEP;SEC/BA SI - Sem Informação;NO - Não Oferece
Analisando-se esses dados, vê-se que após a implantação do Fundef a despesa total por
aluno do ensino fundamental, mantido pelo Estado da Bahia, ficou acima dos R$315,00 ou
seja de R$349,26 - IGP-DI, definidos como gasto mínimo por aluno. A situação do
município capital é de difícil avaliação considerando a ausência de muitas informações e a
aparente inconsistência das coletadas. Os demais municípios pesquisados demonstram vir, a
partir de 1998, aumentando seus gastos com o ensino fundamental.
Um outro item pode ser utilizado para a análise do Fundef, sob o aspecto da execução
orçamentária, o da relação alunos e despesas por nível de ensino, conforme pode ser
observado através dos dados da Tabela 26.
Tabela 26
Percentual de Alunos e de Despesas por Níveis da Educação Básica
Bahia e Municípios
Localização Níveis EB Alunos / 1996 1997 1998 1999 2000
Desp. (%) (%) (%) (%) (%)
Bahia da Bahia EI Alunos 9,03 6,33 0,97 0,61 0,66
Despesas SI SI SI SI SI
EF Alunos 78,40 79,14 79,92 76,84 73,06
Despesas 75,07 68,86 74,06 74,98 77,52
EM Alunos 12,57 14,53 19,10 27,06 26,28
Despesas 24,93 31,14 25,94 25,02 22,48
Salvador EI EI Alunos 15,98 12,38 4,69 3,50 3,88
Despesas 0,00 0,00 57,18 0,00 0,29
EF Alunos 84,02 87,62 95,31 96,50 96,12
Despesas 100,00 100,00 42,82 100,00 99,71
EM Alunos NO NO NO NO NO
Despesas NO NO NO NO NO
Conquista EI Alunos 34,85 31,70 4,18 7,50 4,01
Conquista
Despesas SI 0,02 0,48 0,55 0,97
EF Alunos 64,91 68,06 95,48 92,43 95,92
Despesas 100,00 99,98 99,51 99,45 99,03
EM Alunos NO NO NO NO NO
Despesas NO NO NO NO NO
Alagoinhas EI Alunos 25,09 14,71 9,25 16,60 18,90
Despesas SI SI SI SI 0,75
EF Alunos 74,91 85,29 90.75 83,40 81,10
Despesas SI SI SI SI 79,04
EM Alunos NO NO NO NO NO
Despesas NO NO NO NO NO
SSPassé EI Alunos 12,28 12,39 9,23 6,92 8,19
Despesas 0,03 0,18 3,54 2,25 2,56
EF Alunos 76,03 75,63 82,58 86,75 87,22
Despesas 99,97 99,82 96,31 97,75 97,44
EM Alunos 11,59 11,98 8,19 6,33 4,59
Despesas 0,00 0,00 0,15 0,00 0,00
G. Mangabeira EI Alunos 26,55 23,53 13,89 16,63 21,62
Despesas SI SI SI SI 1,96
EF Alunos 62,60 61,25 73,12 67,90 59,02
Despesas 100,00 100,00 100,00 100,00 96,82
EM Alunos 10,85 15,22 12,99 15,45 19,36
Despesas SI SI SI SI 1,22
Fonte: Sefaz; MEC/INEP;SEC/BA NO - Não oferece esse nível de EB
SI - Sem Informação
Observa-se também que o Estado vem diminuindo a sua oferta relativa do ensino
fundamental, de 79,92%, em 1998 para 73,06% em 2000 e aumentando de forma sua oferta
de ensino médio. Assim, a participação percentual do ensino médio na oferta do Estado
vem progressivamente aumentando, passando de 12,57%, em 1998, para 26,28% em 2000,
embora os recursos aplicados não tenham crescido na mesma proporção, tendo mesmo
decrescido nos anos pós- implantação do Fundef, conforme já comentado.
Os dados com relação aos municípios de Alagoinhas, São Sebastião do Passé e Governador
Mangabeira indicam que, em 1998, se comparado ao ano anterior, caiu, em termos
relativos, o alunado da educação infantil, mas no ano seguinte o percentual de alunos na
educação infantil cresceu, mantendo-se a tendência em 1999 e 2000. Com relação às
despesas por nível da educação, o ensino fundamental é o que concentra o maior percentual
da despesa.
Outros aspectos quantitativos, mas com forte impacto na qualidade do ensino, podem ser
apreciados tais como a relação aluno/turma, aluno/professor, rendimento e movimentação
do aluno, a formação e a remuneração do docente, observando-se a situação antes e depois
da implantação do Fundef.
Embora não se disponha de estudos conclusivos sobre uma possível relação entre o
tamanho das turmas, a organização das classe (seriadas ou multisseriadas) e o rendimento
do aluno pode-se tomar como hipótese de trabalho que turmas menores favorecem o
trabalho pedagógico e melhoram o rendimento escolar. A Tabela 27 apresenta dados sobre
a relação aluno/turma nos casos estudados.
Tabela 27 - Alunos do Ensino Fundamental por Rede e Turma
Estado da Bahia e Municípios
O número de alunos por turma nas redes municipais, com exceção do município de Vitória
da Conquista, sofreu pequena variação para mais em 1998, possivelmente conseqüência do
impacto do Fundef, uma vez que o recebimento dos recursos financeiros está diretamente
associado ao número de matrículas no ensino fundamental. Nota-se que a média por aluno
nos municípios estudados é menor que a média da rede estadual de cada um desses
municípios, embora os dados referentes à media de alunos por turma, se tomado o Estado
da Bahia como um todo, revelem que a rede municipal tem mais alunos por turma que a
rede estadual.
Pode-se examinar também o número de alunos por professor, antes e depois da implantação
do Fundef. Os casos estudados revelam haver em alguns deles uma variação no número de
alunos por professor, se se compara o ano de 1998 ao de 1996, expressando possivelmente
o crescimento da matrícula no Ensino Fundamental a cargo do município. Entretanto, como
os dados obtidos não puderem ser desagregados, ou seja, a matrícula do ensino fundamental
desdobrada em dois grupos, alunos de 1ª a 4ª série e de 5ª a 8ª série, e número de professores
para cada um desses grupos, qualquer análise com esses números deve ser tomada com
reservas. A Tabela 28 apresenta a distribuição por município e dependência administrativa,
além do Estado da Bahia, do número de alunos por professor.
Tabela 28
Alunos do EF por Rede e Professor
Estado da Bahia e Municípios
Localização Rendimento / Redes 1996 (%) 1997 (%) 1998 (%) 1999 (%) 2000 (%)
Abandono
Bahia Aprovação Rede Estadual 67,94 71,36 74,25 71,00 65,86
Rede Municipal 63,44 67,45 69,76 69,07 66,62
Reprovação Rede Estadual 17,07 13,61 10,45 13,41 15,72
Rede Municipal 19,99 16,56 14,00 15,91 16,51
Abandono Rede Estadual 14,99 15,03 15,30 15,59 18,42
Rede Municipal 16,57 15,99 16,24 15,02 16,87
Salvador Aprovação Rede Estadual 65,18 72,85 74,07 68,50 62,40
Rede Municipal 74,88 71,25 68,34 62,97 68,47
Reprovação Rede Estadual 21,96 14,64 11,97 15,39 18,38
Rede Municipal 12,07 13,46 11,44 18,63 13,46
Abandono Rede Estadual 12,86 12,51 13,96 16,11 19,22
Rede Municipal 13,05 15,29 20,22 18,40 18,07
V. Conquista Aprovação Rede Estadual 68,88 72,65 74,58 72,83 69,06
Rede Municipal 73,94 69,21 73,38 66,37 61,23
Reprovação Rede Estadual 14,80 11,49 8,21 11,72 11,89
Rede Municipal 12,96 17,08 9,43 19,28 21,67
Abandono Rede Estadual 16,32 15,86 17,21 15,45 19,05
Rede Municipal 13,10 13,71 17,19 14,35 17,10
Alagoinhas Aprovação Rede Estadual 57,54 65,61 69,83 68,47 55,69
Rede Municipal 54,73 63,83 67,36 75,18 63,85
Reprovação Rede Estadual 16,48 11,70 9,98 12,49 16,72
Rede Municipal 26,38 19,07 21,85 10,95 15,64
Abandono Rede Estadual 16,04 18,61 16,21 14,20 20,48
Rede Municipal 17,87 16,91 16,00 5,47 13,47
SSPassé Aprovação Rede Estadual 66,45 71,82 69,57 74,26 64,31
Rede Municipal 67,92 72,43 69,92 68,12 68,58
Reprovação Rede Estadual 14,87 9,51 9,73 7,88 14,65
Rede Municipal 21,15 15,07 13,23 18,81 19,97
Abandono Rede Estadual 18,68 18,67 20,68 17,86 21,04
Rede Municipal 10,93 12,50 16,86 13,05 11,45
G.Mangabeira Aprovação Rede Estadual 69,40 73,52 78,24 78,49 74,91
Rede Municipal 59,74 68,16 82,05 71,50 71,17
Reprovação Rede Estadual 18,77 13,04 12,73 12,25 13,64
Rede Municipal 23,75 16,86 9,80 17,21 14,83
Abandono Rede Estadual 11,83 13,44 9,03 9,26 11,45
Rede Municipal 16,51 14,98 8,15 11,29 14,00
Fonte: MEC/INEP;SEC/BA
Considerando os dados das tabelas mencionadas, o município capital é o que tem o corpo
docente que melhor atende aos requisitos legais ou seja não tem professores leigos nas
classes de 1ª a 4ª série nem nas de 5ª a 8ª série, seguindo-se o de Vitória da Conquista. No
outro extremo, encontram-se os municípios de Alagoinhas, São Sebastião do Passé e
Governador Mangabeira que ainda têm no seu quadro de pessoal docente um percentual
significativo de professores sem a formação legalmente exigida para nível de ensino ao
qual está vinculado. Deve-se chamar a atenção para os dados relativos ao Estado da Bahia
que ainda tem um percentual de docentes ensinando em classes de 5ª a 8ª série apenas com
o curso de magistério. Também é importante apresentar o percentual de licenciados que
atuam no ensino fundamental. O que se pode observar na Tabela 30 é que esse percentual
vem crescendo lentamente, destacando-se Alagoinhas e Governador Mangabeira como os
municípios com o mais baixo percentual de professores licenciados atuando nas oito séries
do EF.
Tabela 30
Percentual de Docentes Segundo a Habilitação Plena - Licenciatura
Estado da Bahia e Municípios
Tabela 31
Crescimento do Salário Base -1996/2001
Professores do Ensino Fundamental com Formação de Nível Médio - Magistério
Essa mesma análise pode ser feita considerando-se a remuneração do professor de EF,
através de casos individuais. Assim, foram selecionados 4 professores, cada um deles
representando os casos da amostra - estado e municípios, com a exceção do município
capital - levantando-se seu salário base e o total da remuneração relativa ao mês de junho,
durante quatro anos, 1998 a 2000. Dessa forma, através da análise do contracheque de cada
um desses professores pode-se observar as variações em relação ao salário base e ao
vencimento de cada um deles. A Tabela 32 reúne dados sobre a situação de cada um desses
professores. Vê-se que os professores da rede estadual, tomando-se o caso de um deles
como referência, tiveram, em termos percentuais, redução no salário base e vencimento no
período 1998/2000, observando-se a mesma situação em relação ao município de Vitória da
Conquista. Por outro lado, os professores vinculados aos municípios de Alagoinhas, São
Sebastião do Passé e Governador Mangabeira tiveram uma variação positiva em relação ao
vencimento. No entanto, as variações relativas ao salário base são mais interessantes de
serem observadas pois expressam um valor comum aos ocupantes de uma mesma posição
no Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério. Desse ponto de vista, Alagoinhas e
São Sebastião do Passé são os municípios que beneficiaram seus professores com variações
positivas em relação ao salário base, esclarecendo-se, em relação a SSPassé, que esse
aumento expressa a incorporação de determinadas vantagens ao salário base e não o
resultado de um aumento real de salário.
Tabela 32
Crescimento do Salário Base e Vencimento do Professor de EF
Estado da Bahia e Municípios
O conjunto dos dados levantados e analisados neste relatório permitem que, de forma
cautelosa, sejam apresentadas indicações, de caráter avaliativo, sobre o Fundef e sua ação
sobre o EF, mesmo que se considere que a avaliação do impacto de projetos sociais é
sempre complexa pelas razões já mencionadas neste estudo. A primeira observação, a mais
evidente, é que o ensino fundamental está, sem dúvida, recebendo mais recursos após a
implantação do Fundo, como demonstra o aumento no gasto por aluno desse nível de
ensino, muito embora a despesa continue abaixo de um piso que possa ser considerado
adequado para a manutenção e desenvolvimento do ensino fundamental.
Por outro lado, esses mesmos dados indicam que o Fundef tem contribuído para a redução
da matrícula em outros níveis de ensino, como a educação infantil, tendo ainda um impacto
negativo no gasto/aluno do ensino médio. No entanto, o impacto do Fundef não é
homogêneo, variando entre os casos estudados, conforme pode ser constatado se se
compara Salvador e os demais municípios, ou o estado e municípios.
Os dados analisados revelam ainda os limites do Fundef para enfrentar uma questão crucial
do ensino fundamental, a reprovação e o abandono, pois nos casos estudados não foram
observadas variações significativas em relação a essas questões. Pontos importantes a
destacar, qua ndo se avalia o impacto do Fundef, dizem respeito à qualificação docente e ao
seu salário. Os dados sugerem estar em curso a melhoria da formação docente, em que
pese, a existência de percentual significativo de "professores leigos" atuando nos dois
segmentos do ensino fundamental. No que se refere ao salário base do professor, a
promessa do Fundef não foi cumprida, nos casos estudados, pois em alguns casos os
professores tiveram decréscimos, em termos percentuais, em seus salários.
Contudo, a instituição e implantação do Fundef, em que pese o seu impacto reduzido nos
casos estudados, demonstra um procedimento inovador no financiamento do ensino
fundamental com a destinação de recursos vinculados à execução de um determinado
conjunto de despesas claramente definidas e a possibilidade formal do controle social da
aplicação desses recursos. Assim, a avaliação do Fundef como uma política pública de
financiamento da educação não pode ser realizada apenas numa perspectiva quantitativa
pois, mais do que dirigir recursos para o ensino fundamental, o Fundef traduz um
movimento da sociedade brasileira em busca da transformação qualitativa da cultura da
gestão pública.
Ainda, sobre a questão da municipalização, um outro dado destacado pelo entrevistado, diz
respeito aos professores, ou seja, quando é municipalizada uma escola de 1ª a 4ª série do
ensino fundamental, são passados para o município os alunos, os prédios, os equipamentos,
contudo, os professores concursados permanecem na rede estadual. Como a grande maioria,
tem apenas formação de nível médio - magistério, não preenche, portanto os requisitos para
lecionar no segundo segmento do ensino fundamental, tampouco no ensino médio, níveis
da educação básica de responsabilidade do estado. Desta forma, a municipalização estaria
gerando uma categoria de professores na rede estadual, os excedentes.
A situação acima mencionada, isto é, a dos professores excedentes tem sido um dos
argumentos dos gestores estaduais para limitar a municipalização do ensino fundamental,
argumentando que o Estado não pode transferir os professores efetivos para uma outra
instância administrativa, uma vez que a legislação atual não permite essa transferência, nem
pode demiti- los. Segundo informações levantadas na entrevista citada, o Estado da Bahia
está iniciando um processo de negociação com os municípios, de modo que eles assumam o
pagamento do salário dos professores e dos encargos e, em contrapartida, recebem escolas e
alunos do primeiro segmento do ensino fundamental, visando acelerar a municipalização.
Esta ação que transformou a matrícula da EJA (educação de jovens e adulto) em matrícula
da modalidade regular do ensino fundamental, adotada não só pela rede estadual como
também pelas municipais, se, por um lado amorteceu a perda de recursos da RE e
garantiu mais recursos do Fundef para as RM(s), por outro, ampliou a distorção idade-série
existente no sistema. Assim sendo, para corrigir essa defasagem está sendo implementado o
projeto de regularização do fluxo escolar que integra o Programa de Educação na Bahia -
Educar para Vencer. Esse projeto que em 2002 deve estar atingindo 280 municípios está
contribuindo para reduzir a citada distorção, e, segundo projeções da SEC/BA, quando
implementado em todo estado deve liberar mais de 500 mil vagas no ensino fundamental
regular diurno o que, como conseqüência, pode ampliar a matrícula do ensino médio. Com
essa perspectiva, o projeto de regularização do fluxo tem preocupado os gestores
municipais, pois vai gerar diminuição da matrícula do ensino fundamental,
conseqüentemente, perda de receita, assim sendo preferem, a permanência da distorção,
pois essa pode garantir mais recursos para o ensino fundamental. Em síntese, essa discussão
vem mostrar que em matéria de financiamento da educação, “tudo” pode ser decidido e
executado em função da garantia de mais recursos.
Buscando perceber por outra via os impactos do Fundef na perspectiva de ações para a
valorização do magistério, passa-se a destacar as questões relacionadas com a oferta de
oportunidades para a melhoria de qualificação dos docentes do ensino fundamental, bem
como, das políticas estaduais voltadas para a reestruturação da carreira do magistério e
conseqüentemente seus reflexos sobre o salário dos professores.
Por outro lado, os municípios de Alagoinhas e Salvador não apresentaram seu plano de
formação dos professores não licenciados que atuam na rede municipal.
Salvador e Vitória da Conquista municípios que contam em sua sede com universidades
públicas, apresentaram, maiores percentuais de professores do EF com habilitação em
licenciatura, o que não se confirma em Alagoinhas, que se encontra nesse grupo e está
localizado próximo a Salvador.
Nessa perspectiva, destacou o informante que, a entidade vem atuando junto aos gestores
da educação no sentido de oferecer um suporte para a elaboração desses planos na busca da
realização dos objetivos dos profissionais da educação, contudo não tem obtido êxito nesta
sua luta, uma vez que as secretarias de educação têm optado por contratar empresas de
assessoramento técnico que na verdade não estão trabalhando no sentido de melhorar as
condições de trabalho e de salário dos professores, mas, ao contrário, o que esperam é
garantir seu lucro com o trabalho de assessoria. Ainda, salientou que em muitos municípios,
os documentos elaborados, foram até aprovados, mas ainda não estão implantados.
Sobre as políticas estaduais voltadas para a carreira docente e seus reflexos nos salários,
constatou-se com as informações levantadas que está em vigência a Lei N° 4.694 de 09 de
junho de 1987, que estrutura o plano de carreira do magistério público estadual de 1° e 2°
graus e a lei N° 7.250 de 09 de janeiro de 1998, que altera a carreira de magistério
público estadual de ensino fundamental e médio e fixa os vencimentos básicos da categoria,
definindo quatro níveis da carreia: nível 1 - docentes com formação de nível médio; nível 2
- docentes e especialistas habilitados em licenciatura de curta duração; nível 3 - docentes e
especialistas com titulação de licenciatura plena; nível 4 - docentes e especialistas com
estudos de pós- graduação.
Nesse instrumento legal, de 1998, o piso salarial fixado para o professor nível 1 -
magistério de nível médio, em regime de trabalho de 20 horas, foi de R$140,00, podendo
chegar ao máximo de R$280,00 para o professor pós-graduado, no mesmo regime de
trabalho. Os que têm 40 horas dobram o salário-base, respectivamente, R$ 280,00 e 560,00.
A observação, da Tabela A 4 (em anexo) que mostra o salário-base dos professores,
apresentado anteriormente deixa perceber que os reajustes salariais ocorreram em função da
correção do salário mínimo.
Quanto à questão salarial dos professores das redes municipais, o que se contatou nos
municípios estudados foi uma certa apreensão dos gestores, no que diz respeito à reajustes
salariais mais elevados. Isto porque, considerando que o Fundo tem duração fixada (10
anos), levantam a hipótese de que, ao término deste período, essa política de financiamento
não seja renovada, o que pode gerar uma situação de total inadimplência dos municípios.
Neste caso, alguns gestores adotaram a prática do abono, ou do rateio do saldo dos 60%
destinados ao pagamento dos professores do EF.
Ainda sobre a questão salarial, é importante não deixar de registrar as declarações dos
representantes do Conselho Estadual de Educação (CEE) e da União Nacional dos
Dirigentes Municipais de Educação/BA (Undime/Ba) que ao serem indagados na entrevista
sobre a relação entre o salário dos professores do ensino fundamental e as políticas de
valorização do magistério, expressaram suas observações e críticas:
Por outro lado, o registro de algumas situações, mostra que o Fundef de alguma forma deu
brechas para que os gestores manipulassem situações no sentido de preservarem seus
recursos, em detrimento de uma maior descentralização e municipalização do ensino
fundamental.
Quanto aos o plano de carreira dos profissionais do magistério, ficou constatado que o
movimento docente está buscando nesse momento uma reestruturação dos planos
aprovados em 1998, vez que a prática tem mostrado que os documentos elaborados naquele
momento em nada estão contribuindo para fazer avançar a melhoria da valorização do
magistério, pelo menos, através da melhoria da qualificação e da remuneração.
O decreto referido acima foi de abril de 1998, três meses depois da implantação nacional do
Fundef. A nomeação dos onze conselheiros previstos no Decreto N° 7.277/98 deu-se quase
três meses depois de instituído o Condef, isto é, em 30 de junho de 1998. Nessa primeira
composição, o poder executivo estadual estava representado diretamente por quatro desses
conselheiros (Secretarias da: Educação, Fazenda e Administração; e Procuradoria Geral do
Estado) e ainda contava com o apoio da representação de outros quatro conselheiros
oriundos do CEE, da UPB, de escolas públicas do EF e da DMEC (que ainda não tinha sido
desativada); portanto, mais quatro votos totalizando o pleno controle da agenda do Condef.
Tal composição dos conselheiros, além do atrelamento direto ao gabinete do Secretário de
Educação, configura uma situação expressa pelo poder executivo de não assumir
plenamente as atribuições e finalidade desses Conselhos de Acompanhamento naquilo que
a Lei federal determinou que fosse feito nacionalmente.
No que tange ao Regimento do Condef, este só veio a ser aprovado após um ano e oito
meses, mais precisamente em 16 de fevereiro de 2000, conforme a Resolução n. 001/00,
publicada no Diário Oficial do Estado em 17/02/2000. Entre as competências do Condef, o
Regimento previa as seguintes:
Era para ter reunião do Conselho a cada mês, mas às vezes demorava dois meses,
pois para ter reunião era preciso já ter prestações de contas prontas... (por isso que
demorava). Nas prestações de contas verificamos que o Estado aplicava mais do
que recebia.
No Bahia, o problema de fiscalização e controle do Fundef fica acentuado pelo fato de que
não há um entendimento de quem deve julgar as ações de denuncia encaminhadas ao
Ministério Público do Estado. Conforme entrevista realizada com um dos Promotores de
Justiça, vinculado á Procuradoria Geral de Justiça - Centro de Apoio Operacional às
Promotorias de Justiça do Interior com Atribuição para a Proteção da Moralidade
Administrativa e Patrimônio Público (Caopub) - nenhuma ação referente ao Fundef foi
julgada pela Justiça no âmbito do Estado da Bahia nos últimos quatro anos. Isto porque a
composição do Fundef envolve recursos tanto do Estado como da União. Assim sendo, a
compreensão do Ministério Público do Estado é de que o julgamento de processos deve ser
realizado pela instância federal. A União, por outro lado, não tem atuado nesse sentido por
entender ser esta uma atribuição do Estado e por ter um quadro de pessoal, na Bahia, que é
insuficiente para assumir essa responsabilidade em todo o estado. O Ministério Público do
Estado da Bahia aguarda que o Supremo Tribunal Federal solucione definitivamente o
problema da competência da Justiça Federal para processar e julgar as ações decorrentes da
má aplicação dos recursos do Fundef. Enquanto isso, a tramitação dos processos se
encontra paralisada.
Outro aspecto que vale salientar é o que diz respeito às competências individuais de cada
conselheiro para entender de contabilidade pública, orçamento, balanço e relatório de
prestação de contas, para que possam executar a análise e emitir pareceres sobre as receitas
e despesas do Fundef. Nas entrevistas foram obtidas explicações do tipo:
Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada
ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos,
orçamentos e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo
parecer prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de
Gestão Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.
Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à
participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de
elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.
Esta Lei tem sido a bússola de orientação na ação fiscalizadora externa dos Tribunais de
Contas e do Ministério Público, sobre todas as contas públicas em geral. Contudo, segundo
um assessor técnico do TCM, entrevistado pelos pesquisadores:
(...) Para que se cumpra a Lei, é necessário algo que os municípios têm dificuldade
de fazer, que é o planejamento. Não se tem como cumprir a Lei na aplicação do
Fundef se não há um planejamento do município. Esse acompanhamento ele tem
que ser feito através do controle interno do órgão; ele tem que ter um controle
interno adequado que permita a ele ter uma avaliação de quanto se gastou, de
quanto se tem para gastar.
Por exemplo, a partir da análise do conteúdo das diversas entrevistas realizadas, percebe-se
uma maior participação do sindicato dos professores (APLB - Sindicato e o Simmp de
Vitória da Conquista) nos municípios do interior, com uma atuação mais destacada dos
conselheiros que representam o sindicato, do que no conselho de acompanhamento da
capital do estado. Contudo, e apesar de haver uma representação da CNTE (sindicato) no
conselho estadual de acompanhamento do Fundef, não é no âmbito do estado que se dá uma
atuação mais transparente desse organismo de controle e fiscalização na aplicação dos
recursos carimbados da educação, como determina a Lei de criação do Fundef.
Outro aspecto notado é que nenhum dos conselheiros entrevistados - no interior e na capital
- pronunciaram-se acerca do acompanhamento na realização anual do censo educacional.
No entanto, existe uma série de denúncias na imprensa diária, nas Comissões de Educação
e Cultura do poder legislativo e nos sindicatos de professores sobre a manipulação dos
dados do censo escolar. Essas denúncias dão conta de que o número de alunos matriculados
no ensino fundamental cresce demais no início de cada ano letivo e de que o mais
importante é reter o aluno na escola independentemente do padrão de qualidade do ensino
aí desenvolvido. (Conforme dossiê de denúncias, em três volumes, da APLB - Sindicato).
Não há, também, por parte dos conselheiros uma rotina de fiscalização direta nas escolas do
ensino fundamental para verificar in loco a melhoria, o aproveitamento pedagógico e o
desempenho institucional e acadêmico da aplicação dos recursos do Fundef. Há uma
excessiva preocupação com o número de matrículas, mas não há uma mínima preocupação
com a qualidade dos serviços prestados pela escola do ensino fundamental.
Por último, destaca-se que os dispositivos da Lei de criação do Fundef são cobrados e
fiscalizados pelos órgãos de controle externo tipo Tribunal de Contas. Sobre esta questão,
os exames auditoriais realizados pelo TCE permitiram que fossem apresentadas as
seguintes considerações, acerca da gestão dos recursos do Fundef, no Relatório e Parecer
Prévio de 2001, deste Tribunal:
O que se constatou com a pesquisa é que esse fato não produziu conseqüências, pois a
prestação de contas do estado em 2001 foi aprovada, apesar das considerações apresentadas
em relatório pelo TCE/BA. à Assembléia Legislativa.
RESULTADOS E RECOMENDAÇÕES PRINCIPAIS
Sobre a Cobertura
Se por um lado se tem afirmado que o Fundef estimulou o aumento da matrícula no ensino
fundamental, tendo como elemento motivador a relação matrícula x recursos, por outro,
pode ter inibido o crescimento da educação infantil. Esta hipótese tem como base dois
fatores. O primeiro é a inexistência do vínculo matrícula x recursos para a educação
infantil, o que levou as redes municipais a não absorverem as matrículas desse nível que o
estado deixou de oferecer a partir de 1998. O segundo é o fato da LDB /96 não ter definido
a idade mínima de sete anos para ingresso no ensino fundamental, o que possibilitou
algumas gestões municipais alterarem o registro das estatísticas, passando a contabilizar as
classes de alfabetização (crianças de cinco e meio a seis anos), que antes de 1998 eram
computadas na educação infantil, como classes do ciclo inicial do ensino fundamental, que
envolve a alfabetização. Este remanejamento das estatísticas para ampliar a matrícula do
ensino fundamental também possivelmente ocorreu com as classes de educação de jovens e
adultos (EJA), que quase desapareceram dos registros e passaram a ser computadas como
classes de ensino fundamental regular, com enfoque na aceleração. Estas duas situações de
possível remanejamento de dados podem estar contribuindo para o aumento da matrícula do
ensino fundamental. Isto não significa, entretanto, que não tenha havido uma grande
chamada escolar, sobretudo nas redes municipais e na zona rural, impulsionada pelo
investimento no transporte escolar.
Quanto ao ensino médio, sua matrícula vem crescendo, principalment e na rede estadual.
Contudo, as taxas de escolarização ainda são baixas quando comparadas às do ensino
fundamental, atingindo 15,9% (escolarização liquida) em 2001, enquanto no ensino
fundamental esta taxa era de 96,2%. Ainda com relação ao ensino médio, pode-se levantar
a hipótese de que seu crescimento tenha sido limitado pela falta de incentivo em relação aos
recursos, o que levou os gestores da rede estadual a controlar a municipalização do ensino
fundamental na expectativa de manutenção em sua própria rede dos alunos matriculados no
segundo segmento do ensino fundamental. Esta medida impediu a liberação de espaço
físico e de docentes para a ampliação da oferta do ensino médio. Assim, a idéia de que a
municipalização do ensino fundamental permitiria à rede estadual avançar rapidamente na
oferta do ensino médio não foi plenamente concretizada.
A discussão dos dados de matrícula dos três níveis da educação básica mostra claramente
que essa política de financiamento, que relaciona matrícula a recursos fina nceiros, motivou
as gestões municipais para a busca da melhoria quantitativa, ou seja, da ampliação da oferta
de vagas no ensino fundamental. Contudo, esta política tem tido conseqüências negativas
para educação infantil e o ensino médio. Portanto, recomenda-se ampliar a cobertura do
Fundo visando atender a todo os níveis de educação básica brasileira.
O Fundef busca não só a universalização do ensino fundamental, como também uma oferta
de ensino de boa qualidade, através de uma melhor distribuição e alocação dos recursos e
da valorização do magistério. Para a análise do impacto do Fundo, foram destacados neste
estudo alguns indicadores que podem representar a qualidade da oferta do serviço. São eles:
a quantidade de alunos por turma, o gasto aluno/ano, a qualificação dos professores, o
rendimento e a movimentação dos alunos.
Embora não haja estudos conclusivos sobre a questão, para fins desta pesquisa trabalhou-se
com as hipóteses de que classes menores tornam o trabalho do professor mais eficiente,
elevando conseqüentemente o rendimento dos alunos. Procurou-se então verificar o
impacto do Fundef no tamanho das turmas do ensino fundamental. Aqui é importante
registrar que os dados da pesquisa estão agregados, tendo sido calculado para cada ano do
período estudado o número alunos/turma do ensino fundamental, não se obtendo este dado
em relação a cada um dos segmentos - 1ª à 4ª séries e 5ª à 8ª séries. Esta ressalva é
importante, uma vez que estes dois segmentos apresentam características diferenciadas
quanto ao número de professores que atuam em cada turma. Assim, a discussão aqui
desenvolvida está sendo conduzida a partir de dados aproximados.
Os dados coletados mostram que, nos municípios estudados, o número de alunos por turma
praticamente não variou entre 1996 e 2000, sendo que a média não ultrapassou 32
alunos/turma, média considerada adequada para os padrões aceitáveis de qualidade. É
positiva a constância desse número diante do crescimento abrupto das matriculas no
período em questão. Ao que parece, o referido aumento foi acompanhado por
investimento na construção e/ou na ampliação das unidades escolares.
Com relação às despesas por aluno/ano dos níveis de educação infantil e do ensino médio,
não se pode afirmar que o Fundef tenha produzido algum impacto positivo. No ensino
médio, enquanto as matrículas aumentaram após a criação do Fundef, o indicador despesa
por aluno/ano tem decrescido ao longo deste período. Observa-se, no entanto, que em
alguns casos os dados financeiros referentes a esses dois níveis de ensino, não foram
disponibilizados e noutros eles estavam agregados com as despesas do ensino fundamental.
É possível que, a partir de 1998, estejam embut idas no gasto aluno/ano do ensino
fundamental, as despesas com educação infantil, nas redes municipais, e as despesas com
ensino médio, na rede estadual. Essa discussão merece um aprofundamento do estudo, que
vai requerer dos gestores uma atitude mais transparente no que diz respeito a tornar
públicos os dados de receitas e despesas. Aqui, o que se quer destacar é a dificuldade que
os pesquisadores encontraram para ter acesso aos dados financeiros.
Até o ano 2001 as gestões municipais estavam autorizadas a aplicar parte dos recursos da
parcela dos 60% destinada à valorização do magistério na capacitação dos professores
leigos, para habilitação necessária ao exercício das atividades docentes. Assim sendo, a
expectativa era de que fossem identificadas ações que buscassem adequar os quadros
docentes das redes estadual e municipais às exigências legais, ou seja, formação de nível
médio em curso de magistério para o ensino da 1ª à 4ª séries e formação de nível superior
em curso de licenciatura plena para o exercício do magistério da 5ª à 8ª séries do ensino
fundamental. Os dados coletados revelaram, contudo, a presença, em 2000, de professores
sem a habilitação mínima exigida por lei para o exercício do magistério no ensino
fundamental. Salvador e Vitória da Conquista foram os municípios, entre os pesquisados,
que apresentaram o melhor quadro docente no que diz respeito à adequação do grau de
formação ao nível de ensino em que o trabalho docente era exercido. Os outros três
municípios, integrantes do estudo, ainda contavam com um percentual significativo de
professores sem a habilitação requerida. Também na rede estadual foram encontrados
professores com formação de magistério atuando no segundo segmento do ensino
fundamental. No período 98-00, apenas o município de São Sebastião do Passé estava
executando projetos, que buscavam a melhoria de qualificação de seus professores.
Também a gestão estadual, através do Instituto Anísio Teixeira, em convênio com várias
universidades, estava definindo projetos de habilitação, à distância, de professores em
exercício em sua rede. No entanto, estas iniciativas são recentes demais para já terem
surtido efeitos significativos.
Assim, pode-se afirmar que a situação dos quadros docentes ainda era precária no ano
2000, considerando-se a perspectiva de que todos os professores do ensino fundamental
tenham formação de nível superior, em cursos de licenciatura plena. Entre os casos
estudados, Salvador, o município melhor situado, tinha 38,25% de professores licenciados
enquanto Alagoinhas e Governador Mangabeira só contavam, em seus quadros, com 5,66%
e 3,42%, respectivamente. Recomenda-se, portanto, que seja prolongado o período de
capacitação dos professores leigos - findo em 2001 - para que seja assegurada uma maior
participação dos docentes neste processo, com vistas a proporcionar ao alunado uma
melhor qualidade de ensino.
Assim sendo, recomenda-se que seja revisado o valor mínimo a ser gasto por aluno/ano,
apoiado em estudos do custo real do ensino fundamental por aluno/ano, para que mais
recursos sejam investidos na qualificação dos professores, além do financiamento de
estudos qualitativos que investiguem questões específicas relativas à melhoria do ensino.
Recomenda-se, também, que seja respeitada pelo Governo Federal a exigência legal que
prevê um valor mínimo aluno/ano nunca inferior “a razão entre a previsão da receita total
para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental do ano anterior, acrescida do total
estimado de novas matrículas”. Segundo Davies (1998), se a lei fosse respeitada, o valor
mínimo aluno para 1998 deveria ter ficado em R$ 444,17, e não em R$ 315,00.
Sobre os Salários
A melhoria dos salários dos professores, uma das motivações para a criação do Fundef, não
se concretizou plenamente. Ao contrário, os dados coletados mostraram, em três casos
estudados, no período 98-00, um crescimento negativo com relação ao salário-base,
alcançando -21,04% na rede estadual. Por outro lado, no município onde ocorreu o maior
crescimento (31,78%), isto se deu por incorporação ao salário-base dos 25% de atividades
complementares, ocorrendo um reajuste real de apenas 6,78%. As informações levantadas
sinalizam a insatisfação dos professores com seus níveis salariais, existindo no movimento
docente a reivindicação da reformulação dos planos de carreira e remuneração do
magistério. Observou-se na ação dos gestores a prática do abono ou da distribuição do
saldo dos 60%, de uma só vez, a título de gratificação (“rateio”). O que pode parecer falta
de planejamento, na verdade pode ser uma estratégia para não comprometer as finanças do
município, caso o Fundef não permaneça como uma política de financiamento do ensino
fundamental. Inicialmente, os professores ficaram satisfeitos com o abono ou a gratificação,
contudo, já começaram a perceber o efeito negativo desta política em relação às suas
garantias salariais, daí os movimentos reivindicatórios no sentido de revisão dos planos de
carreira e remuneração do magistério.
Segundo a legislação, a fiscalização e o controle social dos recursos do Fundef devem ser
executados pelos Conselhos Estadual e Municipais de Acompanhamento e Controle Social
do Fundef, como também, pelos Tribunais de Contas e pelo Ministério Público. Na Bahia,
os Conselhos Estadual e Municipais de Acompanhamento e Controle Social do Fundef,
seguindo o que determina a legislação, foram formalmente constituídos no estado, bem
como em todos os municípios pesquisados. Contudo, nos estudos de caso, não foi
observada uma ação contínua e plena desses conselhos, pautada nos objetivos propostos.
Também, a pesquisa identificou alguns elementos que foram considerados inibidores ou
que têm funcionado como barreiras às ações desses órgãos de fiscalização, destacando-se,
dentre outros: a presença do secretário de educação como membro e/ou presidente desses
conselhos; a falta de motivação e de interesse do presidente em convocar reuniões; a
deficiência e a insuficiência de informações; a morosidade no fluxo de informações; o
despreparo dos conselheiros para analisar registros contábeis e demonstrativos gerenciais,
bem como para elaborar relatórios e pareceres avaliativos; a dificuldade dos conselheiros
para conciliar o tempo de suas atividades profissionais com o exercício das atividades nos
conselhos; a escolha de conselheiros politicamente comprometidos com os gestores; a falta
de infraestrutura material para o pleno funcionamento de um conselho de fiscalização e
controle; a falta de canais de comunicação e de divulgação; a falta de organização de alguns
segmentos da sociedade que têm participação nesses conselhos.
Dessa forma, os conselheiros não têm conseguido fiscalizar a ação dos gestores, no que diz
respeito à repartição, à transferência e à aplicação dos recursos do Fundo. Assim sendo, a
pesquisa constatou uma distância entre os resultados alcançados e os esperados no que diz
respeito à atuação dos conselhos de acompanhamento e controle, o que mostra a falta de
efetividade do desempenho desses órgãos de fiscalização, bem como sua pouca eficácia no
que se refere ao alcance de objetivos mais gerais, tais como os de controle social, de
representação, de participação e de democratização.
Sobre o controle externo dos recursos do Fundef, o TCE/BA e o TCM/BA têm realizado a
apreciação das contas prestadas, anualmente, pelos órgãos governamentais do estado e dos
municípios, com a finalidade de opinar por sua aprovação ou rejeição. Segundo a pesquisa,
todos os municípios estudados tiveram suas contas aprovadas com ressalvas ou rejeitadas
no período 98-00, exceto o município de Salvador que teve suas contas aprovadas no ano
de 1999. Ainda, com relação às contas aprovadas com ressalva ou rejeitadas, a informação
é de que, em muitas delas, a causa das ressalvas ou da rejeição estava relacionada com a
aplicação dos recursos do Fundef. Quanto ao Estado da Bahia, verificou-se que suas contas
foram aprovadas, apesar do Relatório Prévio - 2001 do TCE/BA ter chamado a atenção
para o fato da Sefaz/Ba transferir os recursos do Fundo da conta específica do Banco do
Brasil para a conta única do tesouro (CUTE), o que, segundo o próprio Tribunal, faz
“desfigurar a própria instituição do Fundef, transformando-o em mera vinculação de
recursos”.
Em caso de rejeição das contas dos governos e havendo indícios de crime contra o
patrimônio público, cabe aos Tribunais de Contas encaminhá- las ao Ministério Público para
a devida investigação e providências cabíve is. Contudo, na Bahia, os processos relativos à
má aplicação dos recursos do Fundef encaminhados ao MP pelo TCM, bem como por
outras organizações não têm sido julgados, pois até o presente momento o Supremo
Tribunal Federal não determinou a instância competente para processar e julgar esses
processos (MP, Of. Nº 03/2002 e Of. Nº 188/2002). Assim sendo, constatou-se através da
pesquisa que a fiscalização dos recursos Fundef ou não tem sido efetivada pelos Conselhos
Estadual e Municipais de Acompanhamento e Controle Social desse Fundo ou quando
executada pelos Tribunais não têm produzido conseqüências.
Considerando as questões apontadas com relação à fiscalização do Fundef, recomenda-se:
(a) que seja desenvolvido um amplo movimento no sentido de envolver todos os
segmentos sociais que integram o Conselho de Acompanhamento e Controle Social
do Fundef na discussão da função desse órgão colegiado, bem como, do papel de
seus representantes nesse conselho;
(b) que os gestores responsáveis pela aplicação dos recursos do Fundef, mantenham
um canal de comunicação direto com o Conselho de Acompanhamento e Controle
e que estabeleçam formas de divulgação, dos dados das receitas e despesas desse
Fundo para a comunidade escolar, para os segmentos da sociedade que participam
desse conselho e para a sociedade em geral;
(c) que os órgãos de gestão dos recursos do Fundef, seguindo o que define a
legislação, mantenham seus recursos em uma conta específica, os quais devem ser
destinados a uma programação também específica no respectivo orçamento;
(d) que os membros desses conselhos sejam preparados para a realização das suas
atividades, de modo a compreender o que são as políticas públicas de
financiamento da educação e a dominar as práticas específicas desses órgãos
colegiados;
(e) que seja revista a composição dos conselhos, na intenção de que o titular da pasta
da educação não integre este órgão colegiado, que deve fiscalizar as ações do
executivo da educação.
(f) que seja incluída na legislação uma previsão de dispensa de carga horária dentro
da jornada de trabalho dos profissionais integrantes de conselhos dessa natureza,
para que possam desempenhar as atividades inerentes à condição de conselheiro.
Como nota conclusiva é importante registrar que, com o Fundef, os municípios estudados
passaram a assumir um papel de maior destaque na oferta dos serviços educacionais,
responsabilizando-se pela educação infantil e uma parte significativa do ensino
fundamental. Contudo, a municipalização ampla, envolvendo todo o ensino fundamental,
exige planejamento e um processo de implantação acompanhado e controlado, buscando,
sobretudo, cumprir a proposta do próprio Fundef de valorização e capacitação do
magistério, para que gradativamente seja alcançada a melhoria da qualidade do ensino
fundamental brasileiro.
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